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CUIDADO DE
ENFERMAGEM EM
PSIQUIATRIA
Introdução
A ocorrência dos transtornos mentais sempre foi motivo de muitas dis-
cussões em razão das características atribuídas a eles ao longo da história,
além das diversas explicações para sua ocorrência. Para que a assistência
aos portadores dessas doenças seja realizada de maneira integral, é
importante que os profissionais de saúde conheçam a evolução histórica
por trás dos diferentes transtornos e como ocorreu a evolução nas teorias
que buscam explicar esses fenômenos.
Neste capítulo, você vai conhecer as bases que buscam explicar a
ocorrência dos transtornos mentais, bem como as diferentes formas de
conduzir e tratar essas doenças.
2 Correntes psiquiátricas e tratamento dos distúrbios mentais
Correntes psiquiátricas
Ao longo do tempo, diferentes áreas tendem a explicar a ocorrência dos trans-
tornos mentais no ser humano, por esse motivo, estes sempre foram permeados
pelos mais diversos conceitos. Na antiguidade, quando não se fazia ciência
como hoje, os fenômenos naturais eram explicados por meio de ideias relacio-
nadas ao sobrenatural, atribuindo sua ocorrência a divindades e outros seres
místicos; eram vistos como sinais de deuses, sinais tanto positivos quanto
negativos, e, por isso, o tratamento tinha como objetivo o controle das forças
sobrenaturais por meio de rituais e outras práticas (BRASIL, 2003). Com a
evolução científica, as bases para elaboração e validação das explicações para
a ocorrência dos transtornos mentais foram se solidificando, levando o mundo
a compreender os transtornos mentais, não mais como era no passado, mas
algo que envolve alterações na homeostase psíquica do indivíduo.
A busca por explicações somáticas para a ocorrência dos transtornos
mentais que identificassem os fatores biológicos causadores dos transtornos
mentais sempre esteve presente na história da psiquiatria (SHORTER, 1997).
Na Grécia Antiga, os estudiosos iniciaram as buscas por explicações fisioló-
gicas para a ocorrência dos transtornos mentais, ainda que, naquela época,
fossem imperativas as explicações sobrenaturais (BRASIL, 2003). No século
V a.C., Hipócrates, consagrado como o “pai da medicina”, considerava que
a doença mental apresentava origem orgânica, desvinculando-a das causas
sobrenaturais, isso em razão da sua teoria de que a vida era mantida pelo
equilíbrio de quatro humores: sangue, fleuma, bílis amarela e bílis negra,
sendo cada uma deles originado no coração, no sistema respiratório, no
fígado e no baço, respectivamente. Sua regulação ocorria de acordo com
as estações do ano e o desequilíbrio na produção desses humores (excesso,
escassez ou falta de interação entre eles) era responsável pelas moléstias que
afligiam a humanidade, dentre elas os transtornos mentais. Desse modo, o
pensamento terapêutico baseava-se na busca pelo equilíbrio dos humores.
Essa explicação ficou conhecida como a Teoria Humoral, representada na
Figura 1.
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Participação profissional
Para que o projeto terapêutico seja estruturado de modo a abranger todas
as demandas apresentadas pelo usuário, é necessário que os profissionais
envolvidos na assistência participem ativamente do processo de constituição,
no entanto, devem entender que para o usuário se sentir, de fato, incentivado
e autônomo, é necessário que as metas a serem alcançadas sejam discutidas
e pactuadas com ele.
Hori e Nascimento (2014, documento on-line), em seu estudo que analisou
a elaboração de um PTS, explicam que “[...] o trabalho em equipe, elemento
essencial para a elaboração pactuada e compartilhada do projeto terapêutico,
implica em compartilhamento de percepções e reflexões entre profissionais de
diferentes áreas do conhecimento na busca pela compreensão da situação ou do
problema em questão”. Embora a formação profissional os prepare para atuar
de maneira individual, é necessário que os profissionais compreendam que o
PTS não pertence a somente uma especialidade, o que poderia fragmentar o
cuidado e dificultar a visualização integral do usuário (SILVA et al., 2013).
É necessário, ainda, que os profissionais sintam-se instigados em conhecer
o paciente, compreender suas necessidades e sua rotina diária, bem como co-
nhecer como ele vive e interage com seu meio social. Tais habilidades poderão
ser alcançadas com o auxílio da família e outros atores existentes no território,
além de possibilitar a criação de vínculos, importante na condução do projeto.
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Participação do usuário
Considerado o ator principal e fundamental para construção do PTS, o usuário
deve ser ouvido em suas necessidades e reconhecido como indivíduo com
fragilidades e potencialidade. Sua participação garante que ele atue de forma
efetiva na construção do seu projeto, conferindo-lhe autonomia na definição
das metas.
A inclusão do usuário advém de uma série de tentativas frustradas em tratar
os transtornos mentais sem considerar sua individualidade. Tais tentativas
sempre tendem a falhar, uma vez que ao se estabelecer metas e prioridades
sem considerar sua capacidade, estas tornam-se incapazes de serem cumpridas
por ele.
Outro aspecto positivo é a valorização do conhecimento prévio que o usuário
apresenta, o que mostra até onde ele é capaz de deliberar sobre sua condição.
Participação da família
A família é onde o indivíduo aprende a viver em sociedade, portanto, é em
seu meio que ele desenvolve suas habilidades de comunicação e interação
social. Quando um indivíduo adoece, sua família é impactada de diferentes
formas, além de ser a responsável pela condução do tratamento no domicílio.
Portanto, sua participação na elaboração do PTS é fundamental para que os
profissionais reconheçam o apoio que o paciente terá no domicílio, seja no
âmbito físico ou psicológico.
Uma família bem estruturada e preparada para lidar com as adversidades
causadas pelos transtornos mentais é importante nos momentos de fragilidade.
Pesquisas apontam que o vínculo familiar enfraquecido é uma queixa frequen-
temente relatada por pacientes em construção do seu PTS, o que demandaria
intervenção em rede de saúde e intersetorial. No entanto, ao identificar as
fragilidades que ocorrem no seio familiar previamente, os profissionais podem
elaborar estratégias visando a recuperação ou o fortalecimento desses vínculos
(HORI; NASCIMENTO, 2014).
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Terapias medicamentosas e
eletroconvulsivantes e psicoterapias
no tratamento do paciente com transtornos
mentais
Atualmente, as diferentes maneiras de tratar o indivíduo com transtornos
mentais têm como objetivo a redução das repercussões causadas, a promoção
da qualidade de vida, a melhoria das funções psíquicas e o restabelecimento
de sua rotina. A opção pela forma de tratamento mais adequada depende do
diagnóstico que o paciente apresenta, incluindo comorbidades associadas,
bem como suas condições físicas, mentais, sociais e econômicas. Há ainda a
possibilidade de conjugar diferentes formas de tratamento para que se obtenha
melhor resultado.
Terapia medicamentosa
Os psicofármacos, ou fármacos psicotrópicos, desenvolvidos a partir dos anos
50, mudaram radicalmente a falta de perspectivas em relação ao tratamento
dos transtornos mentais que prevalecia naquela época. A ação desses medi-
camentos interfere nas funções do sistema nervoso central, portanto, depende
necessariamente do diagnóstico do transtorno e das manifestações clínicas
que o paciente apresenta. A decisão pelo fármaco mais adequado é tomada
pelo profissional médico, mas para que ela seja feita de maneira assertiva,
a colaboração multiprofissional é importante, pois os demais profissionais,
incluindo os de enfermagem, acompanham o paciente em diferentes momentos,
sendo capazes de apontar os efeitos da medicação no paciente.
Segundo Czarnobay et al. (2018, documento on-line), a terapêutica medi-
camentosa envolve diferentes sujeitos:
(Continua)
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(Continuação)
Fonte: Bezchlibnyk-Butler e Jeffries (1999 apud MORENO; MORENO; SOARES, 1999, documento on-line).
Eletroconvulsoterapia
A eletroconvulsoterapia é o único tratamento biológico do século XIX que
ainda é empregado atualmente. Trata-se de uma técnica muito estigmatizada,
em razão das condições desumanas nas quais era aplicada no passado, pois
foi utilizada como forma de repressão aos pacientes com transtornos mentais
e, ainda, como instrumento de tortura. Outros fatores que contribuem para o
estigma existente sobre a eletroconvulsoterapia incluem o desconhecimento
dos profissionais e da população acerca do tratamento, pois uma vez que (re)
conhece seus benefícios, as pessoas passam a se questionar sobre o porquê
de não ser utilizada (BITTENCOURT, 2012).
Sua técnica consiste na utilização de estímulos elétricos para desencadear
uma breve crise convulsiva para fins terapêuticos. É utilizada principalmente
na depressão maior, quando o paciente apresenta resistência à medicação an-
tidepressiva e apresenta resposta mais rápida em relação àquela, desse modo,
pode ser mais eficaz em situações que requerem uma abordagem de urgência
(MACHADO et al., 2018).
Para aplicação da eletroconvulsoterapia, deve haver indicação clínica que
justifique sua utilização, avaliação clínica aprofundada que aborde a gravi-
dade do transtorno e as funções cognitivas do paciente, além disso, deve-se
identificar e tratar, previamente, qualquer condição clínica que contraindique
o tratamento ou ofereça riscos ao paciente. Durante todo esse processo, serão
realizados, ainda, exames complementares e avaliação anestésica. Somente
após essa avaliação o paciente poderá ser submetido ao procedimento.
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(Continua)
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(Continuação)
Efeitos Físicos:
colaterais Dor de cabeça no dia do tratamento.
Náusea e vômito após o anestésico.
Arritmias cardíacas leves no momento da aplicação.
Dor muscular.
Neurológicos:
Confusão mental e delirium na primeira hora após
a convulsão (em alguns pacientes, pode durar por
semanas).
Perda temporária de memória.
Psicoterapias
Os tratamentos envolvendo o uso de psicoterapias tiveram avanços impor-
tantes nos últimos anos. Tratam-se de métodos não invasivos que utilizam
conhecimentos da psicologia para tratar pacientes com transtornos mentais
ou mesmo ajudar pessoas a lidar com seus problemas. Um dos pressupostos
básicos da psicoterapia aborda que cada pessoa é capaz de curar, por si mesma,
o seu próprio sofrimento, podendo isso ser alcançado por meio dessa terapia
realizada com um psicoterapeuta, por meio de ferramentas como a comuni-
cação, o relacionamento entre terapeuta e paciente e o aconselhamento. O
profissional que utiliza a psicoterapia auxilia o paciente a identificar, entender
e dar sentido aos seus conflitos, além de modificar distorções do paciente sobre
sua percepção em pensamento acerca de si e do seu meio, buscando ainda a
melhoria das relações interpessoais (MELLO, 2004).
A psicoterapia pode ser utilizada isoladamente ou conjugada com a terapia
medicamentosa e não somente pessoas com transtornos mentais podem se
submeter a ela. Qualquer indivíduo que necessite de aconselhamentos ou
encontrar respostas interiores para seus problemas pode recorrer ao uso das
psicoterapias. Existem, atualmente, diferentes métodos de se trabalhar com
psicoterapia, os quais estão descritos a seguir (CARLONI, 2011; CARVALHO;
PUPO; MELLO, 2011; FERRAZ; DOELLINGER; COELHO, 2014; SILVA;
BRANCO; MICCIONE, 2015).