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Universidade Federal da Bahia

Instituto de Psicologia
Psicoterapia II (IPSA10)
Profa. Catiele Paixão

O Caso Fernando

Fernando é casado com Marla há 22 anos. Pai do Leandro, que está com 19 anos.
Hoje, com 45 anos de idade, Fernando é bem-sucedido financeiramente, muito
reconhecido em seu meio profissional e sempre tem uma programação diferente no final
de semana, porque possui uma boa rede de amigos que prezam muito por sua companhia.
Fernando, aparentemente, é um homem realizado.
Mas, mesmo com tudo isso, Fernando toma Lexapro (um antidepressivo), Rivotril
(um ansiolítico, tranquilizante) e Stilnox (um hipnótico, indutor de sono). A primeira vez
que ele tomou um antidepressivo foi quando perdeu o seu pai (avô de Leandro) há 5 anos
atrás. Fernando foi acompanhado por um psiquiatra nesse período porque não conseguia
sair de casa, o trabalho estava se acumulando e estava se isolando até mesmo da família.
Como o psiquiatra entendeu que tratava- se de um luto muito doloroso, receitou um anti-
depressivo para que esta fase pudesse ser superada e Fernando pudesse voltar a trabalhar.
Com a ajuda do antidepressivo, depois de algumas semanas ele voltou a produzir com a
mesma qualidade de antes. Três meses depois da morte de quem amava, ele já voltara a
ser o profissional brilhante de antes.
Enquanto tomava o medicamento, Fernando conseguiu produzir ainda mais do
que antes no trabalho. Ele relata que se aprofundou ainda mais no trabalho como uma
forma de não se concentrar tanto em sua perda e acabou por tornar-se ainda mais
produtivo e reconhecido. Começou a ser ainda mais solicitado do que antes. Mas quando
tentou – após um ano de uso da medicação – reduzir o antidepressivo, começou a
experimentar uma angústia muito forte, crises de ansiedade e uma dificuldade muito
grande para dormir.
Fernando retornou ao psiquiatra e começou a tomar os medicamentos que hoje
ainda utiliza. Ele voltou a ser produtivo, mas agora sofre de uma ansiedade controlada,
embora perene. Percebe que está com um estilo de vida altamente produtivo – no trabalho

Este caso foi desenvolvido e gentilmente compartilhado pelo Prof. Tiago Ferreira.
– mas escasso de momentos de tranquilidade e prazer subjetivo. Nesse ponto, começou a
perguntar a seu filho, Leandro, se na faculdade de psicologia ele havia aprendido algo que
pudesse ajuda-lo. O Leandro, então, o encaminhou para atendimento psicológico.
Em sua primeira sessão de terapia, Fernando disse que se sente um fracassado e
um farsante. Um fracassado porque não consegue levantar da cama para trabalhar sem
a medicação, tendo se tornado igual as pessoas que sempre criticou. Um farsante porque
sempre falou, em casa e no trabalho, como “todas as pessoas sofrem, mas aqueles que
ficam na cama porque estão sofrendo são os perdedores que vão sempre depender dos
vencedores”.
Quando perguntado sobre quando aprendeu este modo de pensar, ele disse que o
pai sempre ajudara muitas pessoas, mas sempre dizia para o filho: “nós precisamos ajudar
porque eles são o tipo de pessoas que sempre vai precisar de ajuda. Mas nós somos aqueles
que não se queixam da vida e batalham. Nós somos aqueles que vencem. Eles são aqueles
que perdem e dependem de nós.”. O pai era ainda mais enfático quando falava da mãe de
Fernando que possuía diagnóstico de Transtorno Afetivo Bipolar: “sua mãe é uma
excelente pessoa, mas nós sempre vamos ter que ajudá-la, porque nós dois somos fortes
o bastante para vencer na vida”.
Fernando disse que, logo após a morte do pai, quando não conseguia sair do quarto
para trabalhar, parecia ver o olhar condescendente do pai com pena dele. E aquela imagem
era a sua maior derrota. Seus pensamentos nesses momentos são “eu não posso ser a
minha mãe!” e “Preciso me livrar dessa angústia para conseguir voltar a ser quem eu era”.
Fernando também contou que tem se tornado mais explosivo com a Marla. Ele
lembra que acordou um dia pensando “a Marla não vai aguentar ficar comigo. Ela precisa
de alguém forte do lado dela” e, não conseguindo levantar da cama, foi tomado de uma
ira muito grande quando a Marla (por uma decisão voluntária) trouxe café na cama para
ele. Fernando lembra que começou a agredi-la verbalmente dizendo que ela estava
perdendo tempo trazendo café para ele quando deveria estar “dando um jeito” no
Leandro, que precisava estudar mais. Durante a sessão, Fernando relatou que sentia um
misto de ira, culpa e medo naquela manhã.

Este caso foi desenvolvido e gentilmente compartilhado pelo Prof. Tiago Ferreira.

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