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Crónica de D.

João I,
de Fernão Lopes

CAP. XI
Assunto: narração dos acontecimentos vividos
em Lisboa, aquando da crise de 1383-85.

Neste capítulo conta-se como o povo de Lisboa foi


ajudar D. João, Mestre de Avis, quando se soube
que a sua vida corria perigo no Paço, onde
estavam a rainha D. Leonor Teles e João Fernandes
Andeiro, fidalgo galego e amante da rainha.
Chegada ao paço, a multidão verificou que o
Mestre de Avis estava vivo, tendo Andeiro sido
morto por ele. Resultaram daí grandes
manifestações de alegria coletiva, expressão do
apoio popular que era dado a D. João enquanto
adversário da rainha regente.
Espaço:

- cidade de Lisboa (espaço central ou


macroespaço);

- pelas ruas de Lisboa, a caminho do Paço e


à janela do Paço (espaços particularizados
ou micro espaços).
Ação: “alvoroço” na cidade de Lisboa e
tomada de armas, apresentado em
gradação crescente:

- apelo à movimentação em diferentes


ruas da cidade “- Matom o Meestre! matom
o Meestre nos Paaços da Rainha” (l. 6); “As
gentes que esto ouviam, saiam aa rua veer
que cousa era” (l. 10)
- agitação do povo: “A gente começou de se
juntar a ele, e era tanta que era estranha cousa de
veer” (l. 27);

- desorientação “das gentes” que entretanto se


juntavam “correndo a pressa pera u deziam que se
esto fazia, por lhe darem vida e escusar morte”.
(ll. 24-25); “Nom cabiam pelas ruas principaes, e
atravessavom logares escuros, desejando cada uũ
de ser o primeiro” (ll. 27-28): “Ali eram ouvidos
braados de desvairadas maneiras.” (l. 35)
- preocupação relativamante à situação do
Mestre, incerteza quanto à sua
segurança: “U matom o Meestre? que é do
Meestre? quem çarrou estas portas?” (l. 34)

- confirmação de que o Mestre está vivo:


“Ali se mostrou o Meestre a ũa grande janela”
(l. 52)

- alegria evidenciada pelo aparecimento


do Mestre: “muitos choravom com prazer de
o veer vivo” (l.68)
«Do alvoroço que foi na cidade cuidando que matavom o Meestre,
e como aló foi Alvoro Paaez e muitas gentes com ele.»

Quatro sequências do capítulo: (o manual usado só contempla


até a linha 90, correspondente à 3ª parte)

1.ª parte 2.ª parte 3.ª parte 4.ª parte

Mobilização A multidão O Mestre O Mestre


da população rodeia de Avis surge é informado
da cidade pelos o Paço à janela acerca do perigo
partidários e ameaça e dirige-se em que se
do Mestre invadi-lo à multidão para encontra o Bispo
de Avis a pacificar de Lisboa

APELO MOVIMENTO CONFLUÊNCIA SEPARAÇÃO


Iminente invasão do Paço.
Clímax do capítulo: aclamação do Mestre.

Iminente inva
Iminente são
invasão
d Paço do Paço

A multidão sente que a vida


do Mestre de Avis está em perigo
e deseja salvá-lo, invadindo o Paço

A multidão força
o aparecimento do Mestre
à janela
Narrador: mostra as emoções
das personagens

Iminente inva
mostra as intenções
Não participante
são d Paço e das personagens
Omnisciente

narra o plano da
morte do
conde Andeiro

Plano da morte do Conde Andeiro ― percurso da mensagem arquitetado


por Álvaro Pais e pelos partidários do Mestre:

Ruas d Anúncio de que A multidão acorre


Pajem Ruas de Lisboa o Mestre corre perigo ao Paço
e Lisboa
PERSONAGENS

 Personagem coletiva (O povo de


Lisboa)
Personagens: a multidão, “como viuva que rei nom tinha”.

1.º momento: indignação, revolta


movimento de e agressão
concentração
Multidão —
personagem coletiva
«as gentes»,
«todos», 2.º momento: alívio, serenidade
«a gente», movimento de e satisfação
«aquelas gentes», dispersão
«as donas da cidade»
Traços caracterizadores do povo de Lisboa:

 Curioso: “As gentes que esto ouviam,


saiam aa rua veer que cousa era” (l. 10);

 Solidário: “se moveram todos com mão


armada, correndo a pressa” (ll. 24-25);

 Unido: “todos feitos duũ coraçom” (l.


31);
 Dinâmico: “Deles braadavom por lenha,
e que veese lume pera poerem fogo aos
Paaços”, “outros tragiam carqueija…” (l.
38-44);

 Poderoso: “que fosse sua mercee de se


mostrar aaquelas gentes, doutra guisa
poderiam quebrar as portas, ou lhe poer o
fogo, e entrando assi dentro per força,
nom lhe poderiam depois tolher de fazer o
que quisessem.” (l. 50-52)
MESTRE- personagem individual

Traços caracterizadores:

 É querido, respeitado e seguido pelo


povo (“ca filho é del-Rei dom Pedro” (l. 20);
“Acorramos ao Meestre, amigos, acorramos
ao Meestre que matam sem porquê!” (l. 26);
 Objeto de preocupação (“- U matom o
Meestre? quem çarrou estas portas?” (l. 34);
“Pois se vivo é, mostrae-no-lo e vee-lo-
emos.” (l. 47)
• Populista — aparece à janela, pois
pretende obter o apoio da população;
• Gentil — dirige-se à multidão com termos
afáveis;
• Humano — pretende salvar o Bispo de
Lisboa;
• Carismático — consegue liderar a revolta
contra a fação castelhana;
• Desejado — a população de Lisboa acorre
para o salvar, pois associa-o ao seu pai, D.
Pedro I, e à ideia de independência.
Outras personagens (individuais):

- O “Paje” (criado) do Mestre;


- Álvaro Pais (esses dois cumprem o plano
no exterior);

- O Conde João Fernandes Andeiro (morto


pelo Mestre);
- A rainha D. Leonor Teles (a “aleivosa”).
A cidade de Lisboa,
também referida no
título do capítulo
pode ser considerada
uma personagem,
já que é sugerido que
ela se vai afirmando
como algo mais que
um espaço, com a
dimensão coletiva do
povo que lá vive.
Características do estilo de Fernão Lopes:

- Pormenor/ rigor, descrição minuciosa,


visualismo das situações descritas:

“Soarom as vozes do arroído pela cidade ouvindo todos


braadar que matavom o Meestre; e assi como viuva
que rei nom tiinha, e como se lhe este ficara em logo
de marido, se moverom todos com mão armada,
correndo a pressa pera u deziam que se esto fazia, por
lhe darem vida e escusar morte. Alvaro Paaez nom
quedava d’ir pera alà, braadando a todos:
- Acorramos ao Meestre, amigos, acorramos ao
Meestre que matam sem porquê!” (ll. 22- 26)
Sensações ao serviço da narração:

 Sensações auditivas: “Ali eram ouvidos


braados de desvairadas maneiras.” (l. 35);
“braadavom por lenha” (l. 38); “era o arroido
atam grande que se nom entendiam uũs com
os outros” (l. 40-41)

 Sensação visual: “ũas viinham com feixes


de lenha, outras tragiam carqueija pera
acender o fogo” (l. 42-43)
 Presença de discurso direto: “- U matom o
Meestre? Quem çarrou estas portas?”(l. 34)

 Utilização do imperfeito do indicativo (“estava”;


“saiam”) e do gerúndio (“braadando”;
começando”).

 Utilização de verbos declarativos (“disserom”;


“perguntando”; “responder”).

 Coloquialismo: uso do imperativo e da 2ª pessoa


do plural (“Acorramos”; “apacificae vos”)
Uso de vários recursos expressivos:

- Comparações:”segundo usança daquel tempo” (l.


15); “e como se lhe este ficara em logo” (l. 23);

- Comparações / personificações inusitadas: “e


assi como viuva que rei nom tinha” (ll. 22-23);

- Metáforas: “se moverom todos com mão armada”


(ll. 23- 24); “E per voontade de Deos, todos feitos duũ
coraçom” (l. 31);

- Enumerações (ll. 10 e seguintes)

- Adjetivação: ““desvairadas” (l. 35); “espantosas” (l.


32)
• Utilização de verbos de movimento (“moverom”;
“correndo”);

•Emprego de advérbios expressivos: “rijamente”;


“claramente”;

• Campo lexical relacionado com movimento ou


ruído (“galope”; “alvoroço”; “vozes”; “arroido”);

• Descrição de espaços de forma gradual (rua,


janela do Paço).

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