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Para Pessoa, a Infância é o passado irremediavelmente perdido, o tempo longínquo em que era

feliz sem saber que o era, o tempo em que ainda não tinha iniciado a procura de si mesmo e por
isso não se tinha fragmentado. Em muitos poemas o poeta exprime a memória dessa infância
suscitada por estímulos que o lembram do passado, qualquer música, qualquer rumorejo de vento
no arvoredo, qualquer brilho incerto sobre o rio acorda de repente o “sentimento-raiz”, recalcado
mas formidavelmente vivo.
E é a infância que volta inapagável, é a plena realização do prazer visual e auditivo, é cor, é música.
O tempo da infância, porém, é idealizado, sendo apresentado como um símbolo da inconsciência,
ingenuidade, inocência e felicidade (ou seja, uma época dourada que se associa à ausência da dor
de pensar) e do sonho (isto é, do refúgio num mundo de fantasia que permite ao eu libertar-se das
amarras da realidade).
Insatisfeito com o presente e incapaz de o viver em plenitude, o eu poético refugia-se numa
infância idealizada, regra geral, desprovida de experiência biográfica e submetida a um processo de
intelectualização. De facto, trata-se de uma nostalgia imaginada, intelectualmente trabalhada e
literariamente sentida.

Explicação poema:

A primeira estrofe reflete uma interpelação à memória, um diálogo com esta, em que o sujeito se
fragmenta, dialogando com a memória e invocando a imaginação. Temos também presente, ainda
na primeira estrofe, um paradoxo, pois é impossível lembrar-se de algo que nunca aconteceu, o
que remete para a nostalgia da infância, onde há uma memória vaga de algo que até pode nem ter
acontecido, mas, devido ao seu distanciamento temporal, é criada a ideia da sua existência. Vemos
muito presente uma dicotomia entre o passado e o presente, quer na primeira estrofe, quer ao
longo de todo o poema.

A segunda estrofe apresenta o imaginário infantil, nos versos 5 e 6, ao referir-se aos “contos
de fadas”. Nos versos seguintes, é-nos apresentada uma metáfora, que tem várias interpretações
possíveis; refere-se, como todo o poema, ao distanciamento entre a infância e o presente, indo
buscar desta maneira um pouco da temática da dor de pensar, no sentido em que o raciocínio
constante tirou-lhe a inconsciência em que vivia na infância, por isso os seus “cansaços” são
“ateus”, são cansaços inúteis, o sujeito poético não tem força para acreditar em mais e sair desse
ciclo de cansaços, os quais não têm solução.

Na terceira estrofe, começamos com um claro contraste com o que foi dito na estrofe
anterior, sendo usado, mais uma vez, o paradoxo que vimos no segundo verso. É usado o
imperativo, como uma tentativa de voltar aos seus bons dias, através da memória, da nostalgia da
infância já referida anteriormente, e não pela experiência factual. No último verso, para finalizar,
vemos a, tão presente ao longo do poema, dicotomia entre o presente e o passado, ao usar tempos
verbais que assim o indicam; também vemos aqui uma fragmentação do sujeito, pois o “quem” a
que o sujeito poético se refere pode ser interpretado como sendo ele mesmo, ligando assim à
infância feliz e o distanciamento dessa altura.

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