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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO
PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM
PROFA. DRA. DAYENNE KAROLINE CHIMITI PELEGRINI
Nome: Fabio Cassimiro Calzavara Entrega: 05/12/2022

VALOR – 6,0

Avaliação
1. Faça uma análise crítica do filme “Escritores da Liberdade” relacionando os conceitos da
perspectiva histórico-cultural com CENAS DO FILME. Os conceitos a serem trabalhados são:
LINGUAGEM, MEDIAÇÃO, FORMAÇÃO DE CONCEITOS E ADOLESCÊNCIA.
FUNDAMENTAR OS CONCEITOS.

Primeiramente, cabe destacar que a perspectiva histórico-cultural, introduzida na psicologia pelo


bielorrusso Lev Semenovich Vygotsky possui base marxista, ou seja, mostra que as mudanças históricas
causadas na sociedade e na vida material das pessoas produzem mudanças claras na consciência humana e em
seu comportamento. Além disso, Vygotsky também era considerado radical devido a pesquisa insistente sobre
os problemas e a tentativa de alcançar a raiz de todos eles, também por manter-se fiel a um método de
compreensão do psiquismo humano que entende que esse desenvolve-se através das atividades sociais.
(FACCI, 2004).
No filme americano Escritores da Liberdade (Freedon Writers), lançado em 2007 e baseado em uma
série de diários da turma 203 da “Woodrow Wilson Highschool”, uma professora americana (Hilary Swank)
recém-formada inicia seus trabalhos em uma escola periférica dos Estados Unidos, onde se depara com várias
questões sociais que necessitam de uma prática pedagógica diferente. Através desse filme, fica possível
observar determinados aspectos da perspectiva histórico-cultural, principalmente quando fica claro que o
trabalho da professora necessita de uma mudança completa para encontrar espaço em um outro ambiente, um
espaço diferente.
Na primeira cena do filme, quando a Eva ainda criança está em uma loja de artigos diversos, olha para
a boneca branca e remete as características de beleza e graça, e ao olhar para a boneca asteca negra, os adjetivos
variam para força e coragem. Assim, fica claro o conceito de contexto histórico e social trabalhado dentro da
perspectiva histórico-cultural, os indivíduos, mesmo que vivam na mesma época, possuirão uma construção
histórica diferente, que levará a uma interpretação diferente do mundo, consequentemente, a uma interação
também variada (VYGOTSKY, 1984).
A linguagem é considerada o sistema de símbolos mais importante para o desenvolvimento humano.
Através dela, o ser humano é capaz de usar instrumentos auxiliares, superar as ações impulsivas, lidar com o
mundo exterior - mesmo com objetos ausentes - realizar abstrações e generalizações, e a comunicação (uma
das funções da linguagem) permite preservar, transmitir e assimilar informações e experiências, ou seja,
manter um intercambio social (FACCI, 2004; ANJOS e DUARTE, 2016).
Em vários momentos do filme, o conflito entre gangues aparecerá com bastante foco nas diferenças
entre elas. Nestes momentos, pode-se notar a diferença entre a linguagem dos indivíduos, principalmente no
que tange a comunicação e as vestimentas. É através da comunicação que se cria conflitos, mas também
reconciliações. A linguagem expressa de diversas maneiras torna os indivíduos seres humanos, porém, mesmo
que isso coloque todos dentro de uma mesma característica, a linguagem e sua representação é responsável
pela diferenciação entre os humanos.
A mediação, por sua vez, ocorrerá através de um conjunto de signos construídos através da história e
utilizado pelos indivíduos para realizar essa interação com os objetos e outros indivíduos. Ou seja, a
linguagem, explicado acima como o mais importante conjunto de signos, simboliza exatamente essa mediação
que ocorre entre homem e meio. Neste momento, é necessário destacar que as interações gerarão resultados
diferentes uns dos outros, mesmo que a interação realizada por mais de um indivíduo com um mesmo objeto
(VYGOTSKY, 1984; FACCI, 2004).
Em uma das primeiras cenas do filme, na conversa entre a professora Erin Gruwell e a chefe de
departamento Margaret Campbell, ela diz “quando estiverem defendendo um garoto no tribunal, a batalha já
foi perdida, acho que a verdadeira batalha tem que ser trava aqui, na sala de aula” ao dizer que o optou pela
pedagogia ao invés do direito. Nessa cena, é possível compreender o papel do professor no desenvolvimento
da criança e na construção dos signos e símbolos que possibilitarão a mediação desses indivíduos com o meio.
Dessa forma, a escola desenvolverá com muito mais consciência e fundamentação as bases dos alunos,
permitindo que interpretem e interajam com o mundo de uma forma mais positiva.
A mediação, sendo o que possibilita a interação do indivíduo com a realidade, precisa ter base ser
sustentada pela psique formada de um ser humano. Em uma cena, aos 35 minutos de filme, a professora Erin
Gruwell compara um desenho preconceituoso de um aluno que mostra um outro aluno que é negro, Jamal
Hill, disforme e com grandes lábios, aos desenhos que mostravam os judeus durante o holocausto, no governo
nazista de Adolf Hitler. Essa cena mostra como a linguagem expressada é a forma como os outros nos veem
e como é necessário o papel do professor na construção do intelecto e do que é certo e errado, trata-se da
utilização da abstração para conhecer, não sendo necessário o encontro com a realidade.
Martins, Abrantes e Facci (2016) define conceito como “uma abstração que não pode ser descolada
daquilo que lhe confere sentido”, ou seja, um conceito é a realidade expressa através de uma abstração criada
pelo humano. Ainda, é necessário entender que a formação de conceitos é uma atividade da psique humana
que compreende um avanço da realidade, das pessoas e de si mesmo. Além disso, é importante para esta
resposta dois pontos sobre a formação de conceitos. A primeira é que a formação atinge seu nível superior
ainda na adolescência e para além disso, a educação tem papel fundamental na capacidade humana de criar
conceitos, de realizar abstrações e generalizações. O cerceamento ao acesso a materiais ideativos inviabiliza
o pensamento por conceitos, levando os indivíduos a alienação (ANJOS e DUARTE, 2016; MARTINS,
ABRANTES e FACCI, 2016).
Durante a cena que ocorre na biblioteca, a professora Gruwell solicita a chefe de departamento
Margaret Campbell os livros “O Diário de Anne Frank” para entregar a turma, para que compreendam o que
foi holocausto. A recusa do pedido pela Campbell, devido ao público que será distribuído o livro, mostra
claramente a capacidade dos seres humanos em definir conceitos claros em suas mentes, mesmo que estes não
condiam fielmente com a realidade. Dessa forma, é necessário que na fase escolar a mediação do professor e
de livros ideativos mantenham conceitos mais específicos, limpos de preconceito, permitindo uma conferência
maior com a realidade.
A visita ao Museu da Tolerância e posteriormente o jantar no hotel acompanhado de vários
sobreviventes do holocausto, possibilitou uma expansão do intelecto dos alunos. A criação de vários conceitos
nesse momento é importante não somente pelo conhecimento adquirido como algo passivo, mas esse
conhecimento tende a criar mudanças ativas na vida dessas pessoas, pois confrontam diretamente com a sua
realidade e expande o anseio crítico de insatisfação, que pede por mudança. A cena do Tito encarando as
pinturas pejorativas de judeus no museu, permite observar, ainda, o confronto consigo mesmo.
A adolescência é vista por essa perspectiva de uma forma completamente diferente das outras
perspectivas que observavam essa fase da vida humana como uma fase problemática, para elas, a adolescência
era uma fase rebelde, problemática e complicada e esses fatores eram imutáveis, isto é, todo indivíduo
adolescente será problemático. Dessa forma, na perspectiva histórico-cultural, a adolescência será vista como
uma construção histórica, onde é necessário compreender cada historicidade e meio para entender cada
adolescência, que não é universal, patológica, nem natural (CHECCHIA, 2010).
No início da primeira aula ministrada pela professora Erin Gruwell, dois alunos iniciam um conflito
quando um aluno afirma que outro é “burro”, ao dizer que a turma 203 é a “turma dos burros”.
Complementando com o restante conflituoso da cena, se não fosse compreensível o histórico e o social
daquelas pessoas, a conclusão poderia ser que adolescência é realmente um período problemático, porém, esse
conflito é determinado por uma questão social envolvendo gangues e a problemática racial. Ou seja, a
adolescência não é problemática, mas é nela que a linguagem atinge seu estágio superior, então, os sentimentos
e construções do indivíduo tendem a começar ser muito externados nesse momento.
Uma das construções realizadas pela professora Gruwell no filme, é a realização de uma atividade de
campo com os alunos da turma 203. É interessante trazer destaque para esse momento, pois é muito
importante, principalmente na geografia, que os alunos, na fase da adolescência, entendam o local pela
vivência, mas que a vivência também os permita conhecer o externo, pois as abstrações do externo, quando
nunca vistas como realidade, tornam-se ficções nas mentes dos indivíduos e o que é real torna-se questionável,
pois conhece-se apenas uma realidade.
“Ninguém presta atenção nos adolescentes. Todos pensam que devemos ser felizes só porque somos
jovens. Não veem as guerras que travamos todos os dias [...]”, essa frase é dita por uma aluna no retorno do
semestre. De fato, essa fala resume aquilo explicado por Checchia (2010), como a universalização da
adolescência, que define que todo adolescente passará por essa fase, e essa fase será igual, ou quase igual para
todos os indivíduos. Dessa forma, é interessante avaliar que perspectiva histórico-cultural avalia de outra
maneira essa fase e entende, assim como no filme, que essa não é uma fase problemática, muito menos passível
de universalização, pois cada indivíduo carrega uma historicidade e convívio diferente.
No retorno ao semestre, a professora inicia, sem intenção, o programa “[...] for change”, neste
momento, é interessante ressaltar o aspecto de busca pelo conhecimento na fase da adolescência. No roteiro,
os alunos levantam verba através de diversos eventos para receber na escola a Sra. Miep Gies, a mulher que
deu abrigo a Anne Frank. Esse momento do filme é muito bem trabalhado, pois mostra o esforço de uns e a
contraposição de outros, mas enfim, a realização do evento, que mostra como a educação e a escola pode
transformar a visão de mundo dos alunos. Dessa forma, é possível ressaltar uma das frases mais icônicas de
Paulo Freire, onde ele diz “educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas
transformam o mundo” e ainda unir a citação de Nelson Mandela que diz “a educação é a arma mais poderosa
que você pode usar para mudar o mundo”. Ou seja, a educação, através de sua ação na vida de cada aluno,
tem potencial único para tornar o mundo um lugar melhor ou pior, tudo depende da educação empregada.
O desfecho do filme conta com a busca pela manutenção da professora Erin Gruwell como docente da
original turma 203 e a escrita do livro que baseou a história desse filme “The Freedom Writers Diary” de
1999. Toda a obra pode ser relacionada a perspectiva histórico-cultural, pois é uma vivência completamente
diferente, que resultam em perspectivas totalmente diferentes. O trabalho da professora que guia toda a história
do filme deve ser mostrado e servir de espelho de atuação, uma vez que mostra que a pedagogia é
completamente adaptável e cada estudante tem uma forma de ver o mundo e de se interessar por ele.

Referências:
ANJOS, R. E dos; DUARTE, N. A adolescência inicial: Comunicação intima pessoal, atividade de estudo e formação de conceitos.
In: MARTINS, L. M; ABRANTES, A.A.; FACCI, M.G.D. (ORG.). Periodização histórico-cultural do desenvolvimento psíquico:
do nascimento á velhice. Autores Associados, 2016. p.195-219.

CARVALHO, Maria Vilani Cosme de; IBIAPINA, Ivana Maria Lopes de Melo. A Abordagem histórico-cultural de Lev Vigotski.
In: CARVALHO, M. V. C.(orgas.); Psicologia da educação: teorias do desenvolvimento e da aprendizagem em disucssão.
Fortaleza: Edições UFC, 2009.

CHECCHIA, Ana Karina Amorim. Psicologia e adolescência: uma história marcada pela naturalização do fenômeno. In:
CHECCHIA, Ana Karina Amorim. Adolescência e escolarização: numa perspectiva crítica em psicologia escolar. Campinas:
Editora Alínea, 2010.

LEAL, F. R. G; MASCAGNA, G. C. Adolescência, educação e formação omnilateral. In: MARTINS, L. M; ABRANTES, A.A.;
FACCI, M.G.D. (ORG.). Periodização histórico-cultural do desenvolvimento psíquico: do nascimento á velhice. Autores
Associados, 2016. p.195-219.

MIRANDA, Maria Irene. Conceitos centrais da teoria de Vygotsky e a prática pedagógica. Ensino em Re-Vista, 13(1) : 7-28,
jul.04/jul.05. (texto complementar)

VYGOTSKY, L. S. A Formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.

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