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Copyright © 2021 – RENATA R.

CORRÊA
Capa e diagramação: ARTESSA (Amandda Bennett)
Revisão: Luiza Eustáquio e Renata R. Corrêa
Todos os direitos reservados

Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as pessoas.


Tudo descrito aqui é fruto da imaginação da autora. Qualquer
semelhança com acontecimentos reais é mera coincidência.
Este texto segue as regras da Nova Ortografia da Língua
Portuguesa. No entanto usa linguagem coloquial nos diálogos, com
intuito de aproximar os leitores da leitura.
Todos os direitos reservados. São proibidos o armazenamento
e/ou a reprodução de qualquer parte dessa obra, através de
quaisquer meios — tangível ou intangível — sem o consentimento
por escrito da autora.
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Penal. Produzir e espalhar PDF é crime. Adquira e-books de
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Copyright © 2021 Renata R. Corrêa
Nota da autora
Sinopse
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Epílogo
Obrigada!
Agradecimentos
Playlist
Biografia
Obras da autora
Redes sociais
Meu vizinho quer casar - sinopse
Querido Sinopse – sinopse
Querido inimigo - Capítulo 1
Querido Inimigo - Capítulo 2
Desde que este enredo me veio à mente, ele me arrebatou.
Fiquei muito envolvida por Leo e Elaine, por tudo que já tinham
passado e pela linda história de amor que nascia entre eles.
Obrigada por dar uma chance a este e-book. Desejo que ele
conquiste seu coração, assim como ganhou o meu.
Ao criar os personagens, peguei vários nomes emprestados de
pessoas muito especiais para mim, que são meus leitores e
parceiros blogueiros, bookstagrammers, que tanto me apoiam e me
ajudam a divulgar meu trabalho.
Dedico essa história a vocês: Elaine Lima, Ébia Mara, Cirllenni
Condados, Érika Patrícia, Scarllat Paraizo, Susy Lidiane, Wesley
Ítalo e Lília Priscila; e a todos os meus leitores que já me
acompanham há muito tempo.

Boa leitura,
Renata.
Enquanto lê, ouça a playlist no Spotify:
https://open.spotify.com/playlist/3C27RBAS22GEIDGYMByePd
?si=LId808hxRJOMkmmcFBZk0Q&dl_branch=1
A realidade pode ser cruel e destruir sonhos, mas, enquanto
houver vida, sempre será possível reconstruí-los.
Leonardo Nóbile, um jovem advogado milionário, um dos
CEOs da operadora de saúde da família, ficou viúvo aos vinte e sete
anos, após um trágico acidente de carro. Por mais que tenha sido
uma fatalidade, o rapaz nunca conseguiu se livrar da culpa e há
cinco anos vivia enclausurado, achando que não merecia ser feliz
de novo. No entanto quando a nova diarista aparece em sua casa,
aos poucos, a garota ingênua e de olhos assustados começa a
romper suas barreiras.
Elaine é uma moça humilde que precisou abandonar os
próprios sonhos para cuidar da mãe com câncer, assumindo as
responsabilidades da casa sozinha, inclusive os serviços de faxina,
que era a única fonte de renda das duas. Ao se ver numa situação
financeira difícil, aceita uma oferta da vizinha para limpar uma
cobertura onde é governanta. Mal sabia ela que se encantaria pelo
novo patrão e que muitas outras surpresas do destino estavam por
vir.
Com o tempo, Elaine e Leo ficam atraídos um pelo outro, mas
quando o desejo fala mais alto, ele confessa que não pode oferecer
a ela mais do que sexo. Doida para perder a virgindade, Nane não
se importa, a princípio, e embarca numa amizade colorida com o
patrão.
Só que nem tudo sai como planejado e os dois acabam se
envolvendo sentimentalmente. Será que o viúvo recluso, que se
dizia um homem sem coração, conseguirá se permitir amar outra
vez?
Embarque nessa deliciosa e envolvente história sobre
segundas chances.
Conteúdo adulto.
A realidade pode ser inimiga dos sonhos.
Desde muito garotinha, apesar da vida simples e muitas vezes
difícil, eu imaginava que um dia as coisas melhorariam. Que eu faria
faculdade, ganharia dinheiro, encontraria um rapaz bom e viveria
uma linda história de amor. Como as que eu lia nos livros e via nos
filmes de romance.
Filha única de mãe solo, éramos muito unidas. Dona Cirlleni
engravidou de mim bastante jovem e foi abandonada pelo
namorado, que não quis nem sequer assumir a paternidade. Nunca
conheci meu pai. Meus avós nos acolheram e, enquanto viveram,
ajudaram-nos de todas as formas. Vovô faleceu quando eu tinha
treze anos, vovó se foi um ano mais tarde. Ficamos eu e minha
mãe.
Sempre moramos em Jacarepaguá e mamãe, que trabalhava
como diarista, tinha muitas clientes na Barra da Tijuca. Aos catorze,
comecei a ajudá-la com as limpezas, no período em que não estava
na escola.
Fui uma aluna dedicada. Acreditava que isso me facilitaria, um
dia, realizar pelo menos parte dos meus sonhos, como o de fazer
faculdade de Direito.
No entanto, como disse no início, a realidade pode ser inimiga
dos sonhos. Pode até mesmo destruí-los. Foi o que aconteceu com
os meus.
Quando eu estava terminando o ensino médio, minha mãe
teve linfoma e passou por um longo e penoso tratamento, que durou
três anos entre remissões e recidivas da doença. Dona Ébia, sua
melhor amiga e nossa vizinha há anos, nos ajudou muito nessa
época. Tive de deixar para lá a minha vontade de continuar
estudando, pois, além de acompanhar mamãe às consultas,
exames, sessões de quimioterapia, de cuidar dela e da casa,
assumi as faxinas em seu lugar, já que precisávamos do dinheiro
para sobrevivermos.
Dona Cirlleni venceu a batalha contra o câncer, mas nunca
mais foi a mesma. Após a doença, ficou parecendo que ela
envelheceu uns dez anos, além de ter perdido a força e a agilidade.
Sem conseguir voltar a trabalhar como diarista, começou a fazer
bolos caseiros, para complementar a nossa renda familiar. Eu a
ajudava a vendê-los para as antigas patroas dela, que passaram a
ser minhas, e também em nossa vizinhança.
Tudo o que nos aconteceu acabou roubando o início da minha
juventude. Perdi o contato com meus ex-colegas, não saía de casa
para nada além do trabalho e da rotina médica da mamãe. Minha
única amiga era minha vizinha Érika. Crescemos juntas e
estudamos na mesma classe até o final do ensino médio. Érika
cursou Enfermagem e logo que se formou conseguiu um emprego
em um hospital na Barra. Enquanto ela seguia a vida, conquistando
tudo o que muitas vezes sonhamos juntas, sentia-me estagnada.
Tinha acabado de chegar de uma faxina, angustiada por ter
sido a última na casa de dona Helena, uma excelente patroa. Eu
limpava seu apartamento duas vezes por semana e ela sempre
pagava um valor a mais do que o acertado, além de comprar os
bolos da mamãe. Professores universitários, ela e o marido
decidiram se mudar para Petrópolis após a aposentadoria. Dona
Helena me disse que me indicou para umas amigas e que esperava
que alguma entrasse em contato comigo e que eu logo arrumasse
outras faxinas para ocupar os dias que vagaram, mesmo assim era
difícil conter a agonia que a situação estava me causando.
— Que carinha de preocupada é essa, meu amor? O que
houve? — mamãe perguntou quando apareci na cozinha.
— Hoje foi o último dia na casa da dona Helena... — Suspirei e
esfreguei o rosto, desolada.
— Calma, filha, tudo vai se ajeitar. Não precisa ficar tão
preocupada assim.
— Espero que a senhora tenha razão. O que ganhávamos já
era muito pouco.
— Você devia voltar a estudar, Nane. Poderia entrar para uma
faculdade e se formar, assim como a Érika conseguiu. Arrumar um
estágio, ganhar melhor, mudar de vida. Eu me sinto muito culpada
por ter parado seus estudos. Era tão dedicada e esforçada, cheia de
sonhos.
— Ah, mãezinha, não se culpe. Fiz o que precisava ser feito na
época. Mas a senhora tem razão. Vou pegar meus livros antigos,
procurar uns materiais na internet e me organizar para voltar a rotina
de estudos. Só que, enquanto isso, eu preciso arrumar pelo menos
mais uma casa pra faxinar.
— Vai aparecer, meu amor. Fique tranquila.
Meu celular tocou, interrompendo nossa conversa. Peguei-o na
bolsa e vi que era uma ligação da Érika. Pedi licença para mamãe e
atendi.
— Oi, Kinha! Como você está? — Esforcei-me para soar
animada ao telefone.
— Oi, Nane. Que vozinha é essa? Aconteceu alguma coisa?
— Pelos questionamentos dela, compreendi que meu esforço não
fora bem-sucedido.
— Lembra que te falei que uma das minhas patroas iria se
mudar do Rio?
— Lembro sim. Hoje foi a última faxina lá?
— Foi e não estou conseguindo conter a angústia de como as
coisas serão daqui pra frente.
— Não fique assim. Tenho certeza de que logo vai conseguir
outra casa pra faxinar e, como eu te disse antes, aproveite o tempo
livre pra estudar e se preparar para a próxima prova do ENEM.
— Minha mãe também acabou de dizer praticamente a mesma
coisa. Juro que me organizarei pra isso, só que não dá pra fazer de
conta que não precisamos do dinheiro que não vai mais entrar.
— Ai, amiga, sinto muito por tudo que passou e está passando.
A vida tem sido dura com vocês, mas acredito que dias melhores
virão. Tenha fé.
— Eu tenho, migs. Se não fosse por minha fé, nem sei como
teria suportado tantas provações.
— Você está precisando se distrair um pouco. Na verdade, te
liguei pra fazer um convite. O pessoal do hospital está combinando
um happy hour amanhã, num barzinho legal na Barra. Topa ir com a
gente?
— Não sei como até hoje não desistiu de me convidar, já que
nunca aceito...
— Você é minha melhor amiga. Já faz um tempo que sua mãe
está melhor e mesmo assim não se permite viver, Nane. Não
consigo me conformar com o fato de ficar enfurnada em casa, de
sair apenas pra trabalhar ou levar tia Cirlleni ao médico. Você só
tem vinte e três anos! Precisa aproveitar a juventude, se distrair,
namorar, perder logo essa virgindade.
— Ah, nem me fale disso! Às vezes penso que vou morrer
virgem.
— Se não fizer nada pra mudar essa situação, é bem capaz
mesmo! E já te falei que não sabe o que está perdendo. Quando
começar a dar, quero ver é conseguir parar! — O jeito engraçado
que ela disse aquilo me fez rir e Érika acabou rindo também. —
Sério, migs, sexo é a melhor coisa do mundo!
— Imagino que seja mesmo. — Suspirei recordando das tantas
vezes que me masturbei pensando em algum ator gato ou mesmo
num personagem de livro.
— E então, vai com a gente amanhã?
— Não posso gastar dinheiro assim agora, sem saber quando
conseguirei substituir as faxinas que fazia na casa da dona Helena.
— Eu pago sua consumação. Vamos, aceite! Será bom pra se
distrair um pouco.
— Imagina. Não vou comer e beber às suas custas.
— Pelo amor de Deus, deixe de ser boba! Eu que ofereci.
— Prometo que vou pensar.
— Ai, Nane, nem sei mais o que fazer com você, viu?
— Só não desista de mim. Juro que algum dia aceitarei seus
convites.
— Jamais desistirei. Bem, preciso voltar ao trabalho. Fique
com Deus. Rezarei para que Ele ilumine seu caminho e que coisas
boas apareçam.
— Obrigada, Kinha. Te amo!
— Eu também amo você.
Despedimo-nos e desligamos.
Voltei à cozinha para perguntar se mamãe precisava de ajuda
e quando ela disse que não, fui tomar banho.
Debaixo do chuveiro, comecei a fazer umas contas mentais e
ao perceber o quanto ficaríamos financeiramente apertadas se eu
não arrumasse logo outra casa para faxinar, não consegui impedir o
choro.
Foi difícil dormir naquela noite e nas que se seguiram. Por
mais que eu tivesse recorrido à todas as pessoas que poderiam ter
algum conhecido precisando de faxineira, nada surgiu para mim.

Tentei aproveitar meu tempo livre para estudar, mas, com a


cabeça cheia de preocupações, estava complicado para me
concentrar.
Uma semana depois, dona Ébia nos fez uma visita. Quando eu
a recebi à porta, com olheiras profundas pelas noites maldormidas e
o semblante abatido por conta da aflição, ela me encarou tão
assustada que logo pensou no pior.
— Ah, meu Deus! O que houve, querida? Cirlleni teve uma
recidiva? — Segurou minhas mãos com carinho, enquanto me
analisava.
— Não. Mamãe está bem. Entre. Ela está no banho. Vamos
nos sentar no sofá. — Fechei a porta e dona Ébia me acompanhou.
— Então o que aconteceu pra te deixar desse jeito? — ela
questionou após nos acomodarmos, cada uma em um sofá. — Está
com uma carinha péssima.
— Dona Helena, uma antiga patroa da mamãe, para quem eu
faxinava duas vezes na semana, se aposentou e se mudou para
Petrópolis. Já faz mais de uma semana e ainda não consegui outro
lugar pra limpar.
— Posso imaginar como isso está tirando seu sossego, aliás,
basta olhar pra você para perceber.
— Além do dinheiro das diárias, ela sempre comprava os bolos
que mamãe faz, então o dinheiro era uma parte importante da nossa
renda. Nem sei como vamos conseguir nos sustentar sem ele.
— Calma, Nane. Acho que vim aqui na hora certa.
— Como assim? A senhora sabe de alguém que esteja
precisando de faxineira, para quem possa me indicar?
— Não só sei, como fiquei responsável por isso. A diarista da
casa do meu patrão se casou e mudou com o marido para o interior.
A cobertura dele é enorme. Sou a governanta e cozinho, como você
sabe, cuido das roupas, mantenho a geladeira e a despensa
abastecidas, usando o cartão que ele me dá para esses gastos, mas
não limpo o apartamento. Nem daria conta de fazer isso tudo.
Ontem ele me pediu que encontrasse outra diarista para ir às
segundas e quintas-feiras.
— Ah, meu bom Pai! Justamente os dias que eu limpava a
casa da dona Helena e que agora tenho disponíveis. A senhora
acha que ele me contrataria?
— Claro que sim! Você é de confiança, sabe fazer uma faxina
como ninguém e estou responsável por encontrar uma nova diarista.
Então, querida, considere-se admitida! Pode começar na quinta-
feira?
— Ah, dona Ébia, claro! Muito obrigada! — Levantei do sofá
que eu estava e fui até ela. Chorando, enchi seu rosto de beijos,
enquanto lágrimas de alívio molhavam o meu.
— O que está acontecendo? — Mamãe apareceu na sala e
nos olhou, confusa.
— Vou faxinar o apartamento do patrão da dona Ébia,
mãezinha!
— Que notícia maravilhosa! Merece até uma comemoração.
Alguém aceita bolo e café?
Eu e dona Ébia dissemos “sim” em coro e acompanhamos
minha mãe até a cozinha.
Enquanto lanchávamos, nossa querida vizinha contou que o
patrão não conseguia superar a morte da esposa. Eu me recordava
de ela já ter nos dito aquilo antes. Há cerca de cinco anos sofreram
um acidente, ele dirigia e um animal atravessou a estrada na frente
do carro, que capotou. A moça morreu na hora ele teve ferimentos
leves. Depois disso, carregando a culpa pelo ocorrido, ele se
fechou.
— Essa história é tão triste. A vida às vezes é muito dura com
certas pessoas — comentei, apiedada pela situação dele.
— Tem razão, querida. A vida nem sempre é fácil e vocês duas
sabem bem disso. Também tiveram suas provações. Mas é
importante se reerguer, se reinventar, se perdoar, caso seja preciso,
para que novas oportunidades de ser feliz apareçam — dona Ébia
falou com muita sabedoria e uma pontinha de tristeza. Dava para
ver como ela gostava do patrão e lamentava o sofrimento dele.
Eu e mamãe concordamos e fiquei pensando naquilo, já que
servia também para mim. Era chegada a hora de me libertar dos
medos que a doença dela trouxe e me permitir viver minha
juventude e me dar uma segunda chance de voltar a sonhar com um
futuro melhor.
A realidade pode destruir sonhos, mas, enquanto houver vida,
sempre será possível reconstruí-los.
Nunca imaginei que ficaria viúvo tão jovem, que teria meus
sonhos destruídos e que seria corroído diariamente por uma culpa
absurda.
Eu tinha vinte e sete anos, a mesma idade que minha esposa,
Lília. Viajávamos para Itaipava, região serrana do Rio de Janeiro,
para passarmos o final de semana em uma casa da minha família.
Estávamos tão felizes e empolgados, tínhamos tantos planos juntos,
tantos sonhos para realizar... Porém quando um cachorro-do-mato
cruzou a estrada, acabei o atropelando e perdendo o controle da
direção. O carro capotou. Lília morreu na hora, eu sobrevivi, mas
não merecia.
Mesmo após cinco anos do acidente que desgraçou minha
vida, eu não conseguia me perdoar pelo que aconteceu. Fui
obrigado a ouvir do meu primo Álvaro, de quem eu e Lília fomos
colegas de faculdade, que se ela o tivesse escolhido ao invés de
mim, anos atrás, quando declarou sua paixão, ainda estaria viva.
Ele me disse isso na Vida Nóbile, operadora de saúde de nossa
família, onde trabalhávamos juntos. Eu já me culpava o suficiente,
não precisava de mais ninguém jogando isso na minha cara, muito
menos o idiota do meu primo.
Suas palavras resultaram em uma discussão ferrenha, que fez
meu sangue ferver. Quando me dei conta, tinha acertado um soco
bem no olho dele. A desavença com Álvaro foi só mais um dos
motivos que me levaram a decidir trabalhar de home office. Na
verdade, eu não queria conviver com mais ninguém. Depois do
acidente, todos me olhavam com piedade, o que só reforçava meu
pesar de não ter mais ao meu lado o grande amor da minha vida e o
remorso que eu carregava por sua morte.
Aos poucos me afastei de todos os meus amigos e me
enclausurei. Só saía de casa para correr na praia e nas ocasiões em
que minha presença física na empresa era imprescindível. Marcelo,
meu único irmão, dois anos mais novo que eu, não se cansava de
tentar me animar e de me fazer me livrar do peso que eu carregava,
repetindo sempre que tinha a oportunidade que o que aconteceu foi
um acidente, uma fatalidade, uma tragédia, que eu não era o
culpado. Depois de algum tempo, tentei me convencer disso, porém
não conseguia. Como me absolver, perdoar-me, se minha amada
esposa estava morta?
Quando meus pais e meus tios decidiram se aposentar, há
dois anos, e deixar a direção da Vida Nóbile, eu, Marcelo e Álvaro
assumimos juntos o cargo de CEO. Sabíamos que esse momento
algum dia chegaria e nos preparamos para ele. Eu e meu primo nos
formamos em Direito, Marcelo em Medicina, se especializando na
área de cardiologia, e nós três fizemos pós-graduação em gestão de
saúde. Desde a época da faculdade já trabalhávamos na Vida
Nóbile, então a transição foi natural e tranquila.
Quando eu e Lília decidimos nos casar, comprei uma cobertura
na Barra da Tijuca, bairro em que morava desde garoto e onde
ficava a sede da nossa empresa. Por mais que tudo no apartamento
me lembrasse a todo instante dela, não tive coragem de me
desfazer do imóvel depois que minha esposa morreu. De uma forma
meio sádica, aceitava o martírio que as recordações me causavam,
como um lembrete constante de que eu não merecia ser feliz.
Mesmo após assumirmos a diretoria, organizei os meus
horários na empresa para que continuasse trabalhando o máximo
possível de home office, pois me tornei tão ranzinza que a presença
de outras pessoas me incomodava.
O tempo passou e cinco anos após ficar viúvo, só quem me
suportava mesmo eram meus pais; Dona Ébia, minha governanta; e
meu irmão.
Gostava da solidão, de tocar músicas melancólicas e de me
punir mentalmente.
Depois de mais um dia de trabalho intenso, servi-me de uma
dose de uísque e sentei ao piano. Deslizei os dedos pelo teclado e
comecei a tocar Moonlight Sonata, do Beethoven.
Dona Ébia entrou na sala, nossos olhares se encontraram,
mas ela não me interrompeu até que eu terminasse.
— Essa música é tão triste, Leo — ela me chamou pelo
apelido, como estava acostumada.
— Por isso gosto dela. Combina comigo. — Tomei um gole da
minha bebida e ela balançou a cabeça em negativa.
— Encontrei a pessoa perfeita pra substituir a Susy. — O
ânimo era perceptível em sua voz.
— Ah, é? — Tentei demonstrar interesse, mas na verdade
pouco me importava com quem seria a nova diarista, desde que
fizesse o serviço direito e que não me importunasse, poderia ser
qualquer uma.
— O nome dela é Elaine, somos vizinhas, é filha de uma
grande amiga minha. Ontem fui visitá-las e soube que estava
procurando mais uma casa pra limpar. Ela faz faxina como ninguém
e é de total confiança.
— Ótimo! Problema resolvido, então. Por favor, a senhora
cuide de tudo o que for preciso, desde combinar horário, o que ela
tem que fazer, até o pagamento.
— Pedi que ela venha amanhã, pode deixar que farei isso. Já
terminei meus afazeres por hoje. O jantar está pronto, depois é só
esquentar. Precisa de mim para mais alguma coisa?
— Não, querida, obrigado. Pode ir pra casa.
Ela assentiu, sorridente, despediu-se e saiu.
Eu continuei com a companhia do meu piano. Toquei Talking to
the moon, do Bruno Mars, uma música que Lília adorava e que
agora refletia tanto como eu me sentia sem ela. Cantei baixinho:

At night when the stars light up my room


(À noite, quando as estrelas iluminam meu quarto)

I sit by myself
(Eu me sento sozinho)

Talking to the Moon


(Conversando com a lua)

Try'na to get to you


(Tentando chegar até você)

In hopes you're on the other side


(Na esperança de que você esteja do outro lado)

Talking to me too
(Conversando comigo também)

Or am I a fool who sits alone talking to the Moon?


(Ou eu sou um tolo que senta sozinho conversando com a
lua?)

Ah, Li, quanta falta sinto de você! Me perdoa, amor. Suspirei,


ao terminar de tocar, tomei um último gole do uísque e fui para o
quarto.
Naquela noite, mais uma vez tive um maldito pesadelo com o
acidente. Nos últimos cinco anos, volta e meia as terríveis
recordações me assombravam nos sonhos.

No dia seguinte, mesmo cansado pela noite maldormida,


acordei bem cedo e fui correr na praia, que naquele horário
geralmente estava deserta. Voltei todo suado para o apartamento,
então tirei a camiseta para fazer minha sessão de abdominais e
flexões de braço.
Estava terminando meus exercícios funcionais quando ouvi
vozes femininas. Uma delas reconheci como sendo da dona Ébia e
a outra deduzi ser da nova diarista. Como minha governanta me
disse que eram vizinhas, imaginei que teriam vindo juntas para o
trabalho.
Ao me levantar do chão, as duas entraram na sala onde eu
estava.
— Bom dia, Leo! — a senhora me olhou sorridente e respondi
ao seu cumprimento. — Esta é a Elaine, minha vizinha de quem te
falei, a nova diarista.
— Seja bem-vinda, Elaine. Tudo que precisar pode resolver
com a dona Ébia, ok? — A jovem que deveria ter pouco mais de
vinte anos, tinha estatura mediana, cabelo castanho-claro e
assustados olhos da mesma cor, assentiu meio sem jeito. — Bem,
vocês duas me deem licença e fiquem à vontade. Vou tomar banho
e começar meu dia de trabalho.
Deixei-as conversando e saí em direção às escadas. Enquanto
subia, pude ouvir minha governanta explicando que eu costumava
trabalhar de home office na maioria dos dias e pediu que a garota
evitasse me incomodar, o que achei ótimo.
Após uma ducha rápida, vesti-me com uma camisa de mangas
compridas e calça jeans e fui para o escritório, localizado no andar
de baixo. Tive uma reunião por videoconferência com Marcelo,
Álvaro e o pessoal do departamento jurídico, depois analisei uns
documentos e resolvi algumas pendências que ficaram do dia
anterior.
Já passava do meio-dia quando ouvi uma batida de leve na
porta.
— Pode entrar — falei alto o suficiente para que fosse ouvido.
— Licença, senhor Leonardo, desculpe incomodar. — Elaine
entrou, desconcertada, passando a mão no cabelo e na roupa,
como se precisasse se ajeitar, ou se não soubesse como agir. —
Dona Ébia pediu pra avisar que o almoço está servido. Eu gostaria
de saber se o senhor já vai almoçar agora e se posso limpar aqui
enquanto isso.
— Obrigado por vir avisar. Já vou comer, sim. Fique à vontade
pra limpar aqui, farei um intervalo de uma hora — informei, ajeitando
os papéis que estavam espalhados sobre a mesa e os guardei na
gaveta, em seguida.
Elaine ficou parada onde estava e pude perceber que me
observava. Porém, quando me levantei e passei por ela, abaixou os
olhos, impedindo nosso contato visual. Ela ainda me dava a
impressão de uma garota assustada.
Parei no banheiro social para lavar as mãos e depois fui até a
sala de jantar. Como de costume desde que ficara viúvo, almocei
sozinho. Há cinco anos a solidão era a minha principal companheira.
Após a refeição, subi para meu quarto, escovei os dentes e deitei na
cama para assistir a algum telejornal. Fiquei ali até findar meu
intervalo de descanso e então retornei ao escritório. Elaine já não
estava lá e o ambiente limpo e organizado, cheirava a produto de
limpeza.
Tive uma tarde cansativa e, no final dela, Marcelo ligou
perguntando se poderia passar para me ver assim que saísse do
consultório. Ele trabalhava de manhã na nossa empresa e à tarde
atendia em uma clínica cardiológica. Como sabia que de nada
adiantava dizer não a ele, concordei.
Terminei o que estava fazendo, desliguei o computador e fui
até a sala de estar, onde ficava o bar e meu piano. Servi-me de uma
dose de uísque e sentei para tocar Moonlight Sonata, do Beethoven.
Estava entregue àquela melodia tão tocante e triste até que
meus olhos foram atraídos por um vulto no corredor. Estiquei o
pescoço para poder ver melhor e fiquei surpreso ao notar a nova
diarista encostada na parede, quietinha e de olhos fechados, imersa
na música que ouvia.
Minha primeira reação foi raiva. Logo me veio uma vontade de
parar de tocar e chamar a atenção dela, que não deveria estar ali
me espreitando. No entanto, muito rápido, esse sentimento foi
substituído por curiosidade. Observei-a melhor pela primeira vez no
dia. Havia certo sofrimento em seu semblante o que me fez ter uma
empatia inesperada. Qual seria a história dela?
Assim que finalizei a sonata, a garota se desencostou da
parede e passou a mão no rosto, como se secasse lágrimas. Ela
tinha chorado me ouvindo tocar? A indagação pairou em minha
mente e me deixou ainda mais intrigado a seu respeito.
Meneei a cabeça tentando não pensar naquilo e comecei a
tocar My immortal, da Evanescence. Era outra música que Lília
amava e que agora dizia muito como eu me sentia sem ela.
Em certo trecho que mexia comigo profundamente, cantei
baixinho junto com toda a minha dor:

These wounds won't seem to heal


(Essas feridas parecem não querer cicatrizar)

This pain is just too real


(Essa dor é muito real)

There's just too much that time cannot erase


(Há simplesmente tantas coisas que o tempo não pode apagar)

Ainda estava tocando minha seleção de canções melancólicas


quando ouvi o interfone. Imaginei que seria Marcelo, mas mesmo
assim continuei. Não demorou para que ele tocasse a campainha da
cobertura, dona Ébia o atendesse e logo ele estivesse me dando
uma bronca.
— Bro, sério, você precisa mudar esse repertório. Essas
músicas tristes não te fazem bem. — Aproximou-se e me deu um
tapinha no ombro, depois foi até o bar se servir. Ao contrário de
mim, que bebia uísque, ele pegou uma latinha de suco no frigobar.
— Elas me lembram do amor da minha vida. — Parei de tocar
e virei para ele, irritado.
— Leo, eu adorava a Lília, todo mundo aliás, mas já faz cinco
anos que ela se foi. Você precisa superar isso, seguir em frente.
Acha mesmo que a Li gostaria de te ver assim? — Ele tomou um
gole do suco e sentou na poltrona marrom, de frente para mim,
prendendo seu olhar ao meu.
— Sei que não... — Suspirei fundo, fechei os olhos e esfreguei
a testa.
— Precisa deixar o passado pra trás, irmão. Está mais do que
na hora.
— E como faço pra esse milagre acontecer, Celo? — Abri as
pálpebras para encará-lo outra vez. — Não tem um dia sequer que
eu não me lembre dela, que não me culpe por sua morte.
— Foi um acidente. Precisa se perdoar. Leo, sei que já fez
terapia e que acha que não adiantou nada e por isso abandonou,
mas sinceramente, mano, não vai conseguir superar o que houve
enfurnado nesse apartamento e tocando essas músicas
depressivas. Por que não volta trabalhar de forma presencial?
Assim pelo menos teria contato com outras pessoas.
— Já me acostumei com o home office e acho que sou muito
mais produtivo trabalhando de casa. — Neguei aquela sugestão
com a cabeça. Fazia de tudo para ir o menos possível até a
empresa e não estava nem um pouco disposto a mudar aquilo,
muito menos a ter que conviver com Álvaro.
— Ok... Mas precisa socializar. Que tal um barzinho no final de
semana? Posso combinar com umas gatas. Sair de casa e paquerar
um pouco vai ser bom pra te distrair. Faz quanto tempo que não
transa?
— Jura que está me perguntando isso? — Tomei um gole da
minha bebida, numa mistura de perplexidade e irritação.
— Quanto tempo, Leo? — Ele apoiou os cotovelos nas coxas e
inclinou o tronco para frente, erguendo uma sobrancelha, inquisidor.
— Um mês, dois, sei lá. Mas que inferno! Que importância tem
isso?
— E aposto que foi com uma garota de programa.
— Sabe bem que prefiro assim. Pago pelo serviço, fico
satisfeito e não preciso fazer de conta que estou interessado em
conversa fiada, nem mentir que vou ligar depois.
— Caralho, mano, você é inacreditável! Tem trinta e dois anos,
é bonitão, rico, bem-sucedido, um verdadeiro “partidão”. Com
certeza haveria uma fila de mulheres loucas para estarem na sua
cama, serem suas namoradas, se ao menos deixasse que elas
soubessem que você existe. Precisa sair de casa, Leo. Ir pra pista,
entende?
— Não estou procurando uma namorada. — Dei de ombros e
tomei mais um gole do uísque.
— Se não quer um relacionamento, eu entendo, já te disse
isso, pois eu mesmo adoro a vida de solteiro, mas pelo menos saia,
curta, aproveite o que há de bom!
— Acho que não tenho mais paciência pra certas coisas.
— Está parecendo um velho ranzinza falando assim. Você vai
sair comigo sábado à noite e vou convidar umas gatas pra irem com
a gente. Não aceitarei sua negativa dessa vez. Combinado?
— Puta que pariu, Celo! Vai ser insistente assim lá nos
infernos! — Fiz cara feia e ele riu.
— Isso é um sim? — Meu irmão me provocou, ainda sorrindo.
— Está bem. Eu me rendo. Vou sair com você no sábado à
noite.
— Não vai se arrepender. Eu prometo.
Assenti, mesmo duvidando muito daquilo.
— Leo, ainda vai precisar de mim hoje? — Dona Ébia
apareceu na sala acompanhada da nova diarista.
— Não, querida. Podem ir.
— Elaine já terminou a faxina e, como somos vizinhas, vou
aproveitar a companhia dela até em casa.
— Claro — concordei achando mesmo uma boa ideia que elas
fossem embora juntas.
— Espero que o senhor tenha ficado satisfeito com a limpeza
— a moça disse, esfregando uma mão na outra, com a cabeça
baixa e o olhar inseguro buscando o meu.
— Estou satisfeito, sim, fique tranquila. Está tudo impecável.
Ela aquiesceu, esboçando um sorriso, então as duas se
despediram de mim e de meu irmão e saíram.
— Bem bonitinha essa sua nova diarista, hein? — Marcelo
comentou quando ouvimos a porta bater.
— Você achou? Não reparei direito nela — menti nem sei por
que, já que tinha a observado quando a peguei me espiando tocar.
Elaine era mesmo muito bonita, além de tímida, enigmática e
sofrida, pelo menos foi o que me pareceu.
— Precisa reparar mais nas mulheres à sua volta, bro.
— Está dizendo para eu dar em cima da minha diarista? —
Encarei-o, horrorizado.
— Claro que não, Zé mané, só estou dizendo pra olhar para os
lados. Espero que não se comporte como um esquisitão sábado.
Meneei a cabeça, contendo a vontade de xingá-lo.
— Bem, só vim ver como você estava e te convidar pra
sairmos. Já vou. — Meu irmão levantou, fiz o mesmo e ele se
despediu de mim com um abraço.
Quando voltei a ficar só, comecei a pensar nas coisas que ele
disse, preocupado por ter aceitado o seu convite. Não tinha dúvidas
que depois de cinco anos sem sair de casa e com uma convivência
restrita com outras pessoas, era bem capaz de me comportar, sim,
como um esquisitão.
Será que ainda dá tempo de dizer que mudei de ideia e que
não vou mais? O pensamento logo foi seguido por outro: Ele viria
até aqui me dar um sermão, com toda a certeza e talvez seja melhor
encarar a saída do que isso.
O primeiro dia de faxina na casa do patrão da dona Ébia foi
tranquilo. O lugar era grande e bem iluminado.
As salas exibiam janelas enormes de vidro temperado, que iam
do chão ao teto, com vista para a praia. Deu certo trabalho para
limpá-las, mas eram lindíssimas.
As paredes tinham um tom clarinho de amarelo, quase branco,
com alguns quadros de paisagens.
Na sala de jantar havia uma mesa retangular de dez lugares,
com um lindo lustre de cristal sobre ela e na sala de visitas ficava
um piano, um bar, e um sofá listrado em tons pastéis, com uma
poltrona marrom de frente a ele.
A sala de TV tinha um aparelho gigantesco, que devia ter
umas 70 polegadas e um sofá daqueles retráteis e reclináveis, de
camurça bege.
Além da beleza e imponência do lugar, fiquei impressionada
com o quanto o senhor Leonardo era um homem alto, másculo e
atraente. Usava uma barba por fazer e ao vê-lo sem camisa e todo
suado, foi impossível não reparar no seu peitoral definido e na
barriga de tanquinho.
Aquela imagem sexy povoou minha mente o dia todo. No
entanto o que mais me chamou a atenção nele foram seus olhos
castanhos que carregavam uma tristeza profunda. Seu sofrimento
ficou ainda mais nítido para mim ao ouvi-lo tocar piano.
Uma música que eu ainda não conhecia, que mais parecia um
lamento, invadiu o meu ser e me fez pensar nas minhas próprias
dores e angústias, no medo que senti todas as vezes que mamãe
teve uma recaída e nos meus sonhos deixados para trás. Fiquei tão
mexida que precisei parar o que estava fazendo. Encostei-me na
parede, para que ele não me visse, fechei os olhos e apreciei aquela
canção melancólica que, de tão triste, era também profunda e linda.
Ao chegar em casa, mamãe quis saber como fora o meu dia
de trabalho e ficou contente ao me ouvir dizer que tinha sido
tranquilo.
Tomei banho, fizemos um lanche juntas e depois fui estudar.
Quando já estava cansada, Érika me ligou. Contei para minha amiga
sobre o meu dia, depois a ouvi falar sobre o dela e, por final, Kinha
me convidou mais uma vez para sair com seus amigos, no sábado.
Decidi aceitar e a deixei tão perplexa que ela ficou muda por alguns
instantes e depois tão empolgada que quase me enlouqueceu.
Estava passando da hora de eu mudar o rumo da minha vida,
voltar a estudar tinha sido o primeiro passo. Sair de casa e conhecer
gente nova, fazer amizades, divertir-me um pouco como qualquer
outra pessoa da minha idade, era o próximo.

Sábado pela manhã, Érika passou na minha casa para


confirmar nosso compromisso e me ajudar a escolher o que usar.
— Migs, você está precisando dar uma renovada nesse
guarda-roupa! — Ela revirava minhas coisas fazendo uma cara
desanimada para cada peça que pegava.
— Tem razão. Nem me lembro quando foi a última vez que
comprei algo para mim.
— Que tal irmos ao shopping agora? Podemos fazer umas
comprinhas e almoçarmos por lá.
— Apesar de ter conseguido um novo apartamento pra faxinar,
não estou podendo gastar assim. Quero economizar para os
estudos.
— Está certa. — Ela deu um suspiro e ficou pensativa. — E se
eu te emprestasse algo? — Arqueou as sobrancelhas, empolgada.
— Vamos lá pra casa dar uma olhada nas minhas roupas. Deixo
você usar a que quiser!
— Jura? — A oferta carinhosa me deixou no mesmo nível de
empolgação que ela.
— Claro! — Ela me puxou para um abraço.
Despedimo-nos de mamãe, que estava deitada no sofá da sala
vendo TV e fomos até a casa da minha amiga, que ficava a poucos
quarteirões dali.
Érika ainda morava com os pais, mas já estava planejando ter
um canto só dela. Ao chegarmos, perguntei por eles e Kinha contou
que aproveitaram que estavam de folga e foram passar o dia na
praia.
Minha amiga praticamente me arrastou pela mão até o seu
quarto e abriu o guarda-roupa.
— Acho que esse vai ficar bem em você. Experimente! — Ela
me entregou um vestido vermelho de uma malha encorpada.
— Uau, que lindo! — Examinei a peça antes de tirar o que
usava, para poder colocá-la.
Érika me ajudou a vesti-lo e soltou o meu cabelo, que estava
preso em um do rabo de cavalo, passando os dedos para ajeitá-lo.
— Ficou um arraso, Nane! Dá uma olhada no espelho.
Ao ver minha imagem refletida, não consegui conter um
sorriso. O vestido moldava meu corpo, fazendo os seios parecerem
maiores, a cintura mais fina e o bumbum mais empinado.
— Meu Deus! Que milagre essa roupa fez comigo? —
Observava-me com perplexidade.
— Sua boba! O vestido só valorizou suas curvas. Você é linda,
suas roupas é que não ajudam em nada a se ver sempre assim.
— Posso usar este, então? — Mal conseguia conter meu
entusiasmo.
— Claro! E, sempre que quiser, pode ficar à vontade para me
pedir alguma coisa emprestada. Agora, que tal fazermos as unhas?
— Excelente ideia! — Troquei-me, enquanto Érika pegou
esmaltes, algodão e acetona.
Voltei para casa pouco mais de uma hora depois, muito
animada e com as unhas maravilhosamente pintadas de um
vermelho num tom mais escuro que o do vestido que usaria à noite.

— Que linda você está, filha! — mamãe elogiou ao entrar no


quarto. Eu terminava de me arrumar.
— Nem pareço comigo! — Arregalei os olhos e ela sorriu. Eu
tinha caprichado na maquiagem. Passei sombra preta esfumada,
lápis, rímel, blush e batom vermelho. — Acha que exagerei,
mãezinha? Tenho medo de estar vulgar.
— Não tem nada de vulgar. Está perfeita, minha filha. Desejo
que aproveite a noite!
— Confesso que estou um pouquinho nervosa. Faz tanto
tempo que não saio pra passear. Nem me lembro qual foi a última
vez que fui a um barzinho.
— Faz muito tempo mesmo, meu amor. Deve ter sido antes de
eu adoecer. Espero que de agora para frente aproveite mais sua
juventude.
— Dentro do possível, eu vou aproveitar, sim, dona Cirlleni!
Estou empolgada com os estudos, determinada a conseguir entrar
para uma faculdade de Direito.
— Tenho certeza de que irá conseguir. Você sempre foi muito
esforçada e inteligente. Mas precisa conciliar isso com um pouco de
diversão. Fiquei feliz por ter decidido sair hoje com a Érika.
— Também estou feliz. Acho que será legal.
O interfone tocou, interrompendo nossa conversa. Mamãe foi
atender, enquanto eu pegava minha bolsa e dava uma última
conferida no visual.
— Que gata! — Kinha falou de forma escandalosa ao me ver.
— Obrigada, amiga. Você também está linda! — Ela usava um
vestido amarelo, justo, que valorizava suas curvas e destacava a
pele negra.
— Bora arrasar? — Ela enlaçou o braço ao meu.
— Bora lá! — concordei sorridente, com a autoestima tão
inflada, por me sentir bonita e sensual, que precisaria tomar cuidado
para não explodir.
Ao despedirmos de mamãe, ela nos desejou um bom proveito
e, de forma brincalhona, disse que nem precisaria pedir que
tivéssemos juízo, porque isso já nos sobrava.
Entramos no Fiat Mobi de Érika e ela conectou o celular ao
som. Logo Dona de mim, da Iza, começou a tocar e nós duas
cantamos junto com a música. Quando chegou o refrão, a
empolgação nos fez elevar o tom de voz. Parecíamos duas malucas
quase gritando:

Me perdi pelo caminho


Mas não paro, não
Já chorei mares e rios
Mas não afogo, não
Sempre dou o meu jeitinho
É bruto, mas é com carinho
Porque Deus me fez assim
Dona de mim
Deixo a minha fé guiar
Sei que um dia chego lá
Porque Deus me fez assim
Dona de mim

— Bora dominar o mundo, amiga! — Érika gritou e começamos


a rir.
Quando chegamos ao barzinho em que ela havia marcado
com os amigos, voltei a ficar nervosa.
— Relaxa, migs! Todo mundo é gente boa. — Kinha falou ao
pegar na minha mão e ver como estava fria e meio trêmula. — Você
está linda e quero que me prometa que vai se divertir.
— Vou tentar.
— Tentar, nada. Vai conseguir!
Assenti e caminhamos juntas até uma turma animada. Minha
amiga cumprimentou os amigos com beijinhos nos rostos e depois
nos apresentou. Eram três rapazes e duas moças.
— Hoje, a noite promete! Já vi um monte de gatinhos aqui. —
Uma das garotas falou.
— Claro que tem, um deles inclusive está bem na sua frente —
o rapaz que estava ao meu lado respondeu.
— Só que você não é para o meu bico, né, Wesley? Já que
joga no mesmo time que eu! — ela retrucou de forma engraçada.
— Detalhe! Mas não pode negar que sou um pedaço de mau
caminho, não é mesmo? — A resposta espirituosa dele fez todos
rirem, inclusive eu.
Logo um garçom se aproximou, deixando um balde com
garrafas de cerveja sobre a mesa.
— Enquanto esperávamos que chegassem, já adiantamos o
pedido. Vocês nos acompanham na cervejinha? — Júlio César, o
mais alto dos homens, foi quem disse.
Eu não estava acostumada a beber, mesmo assim aceitei e ele
encheu um copo para mim.
Ao primeiro gole, a bebida desceu amarga e fiz cara feia.
— Como podem achar isso bom? — deixei o pensamento
escapar em voz alta e mais uma vez todos riram.
— Logo logo você se acostuma ao sabor e aposto que vai até
gostar. — Kinha deu uma piscadela e todos concordaram.
— Vamos lá, então! Quero até ver essa mágica acontecer.
A conversa fluía entre eles, que faziam questão de não me
deixar de fora do papo, sempre perguntando minha opinião sobre
algum novo assunto que começavam. Aos poucos o nervosismo foi
embora e comecei a me sentir mais à vontade. E, para minha
surpresa, no terceiro copo de cerveja eu já estava mesmo achando
que o gosto não era tão ruim quanto à primeira impressão.
— Gata, tem um boy magia ali no canto que não desgruda a
atenção de você. Tive esperança que os olhares curiosos fossem
pra mim, mas conferi bem e na verdade são todinhos seus —
Wesley falou ao meu ouvido, enquanto os demais amigos estavam
em uma conversa acalorada sobre o novo chefe do plantão do
hospital onde trabalhavam juntos.
— Onde? — questionei, achando a informação interessante e
sentindo a cabeça um pouco zonza pelo efeito do álcool.
— Lá na frente, à sua direita. Ah, se o flerte fosse comigo, eu
pegava mesmo! — seu comentário me fez sorrir e virar para olhar
na direção informada.
Pisquei os olhos algumas vezes, achando que estava tendo
uma alucinação.
— Ei, está tudo bem? — Érika questionou, ao notar meu
atordoamento.
— Não pode ser...
— O que não pode ser, Nane? — Ela virou-se para a mesma
direção que eu olhava. — Uau! Que gato! Você conhece aquele
rapaz?
— Aquele é o senhor Leonardo, patrão da dona Ébia, foi para
ele que comecei a fazer faxina.
— Caramba! Como não me contou que o homem era um
verdadeiro deus grego?
— Leonardo... — Wesley se manifestou, pensativo. — Bem
que achei que o conhecia de algum lugar. Aquele gostosão é o viúvo
Leonardo Andrade Nóbile, CEO da operadora de saúde Vida Nóbile,
não é isso? Já o vi em matérias de jornais e revistas. Saiu muita
coisa a respeito dele na época do acidente em que a esposa morreu
e depois quando assumiu a direção da empresa, junto com o irmão
e o primo, eu acho.
— É ele sim — confirmei, pois sabia dessas informações e
apesar de tê-lo visto apenas uma vez, era uma figura marcante
demais para não ser lembrada.
— E por que disse “não pode ser”? — Érika questionou,
franzindo o cenho, confusa.
— Pelo que dona Ébia me disse, ele não sai de casa. Na
verdade, até trabalha de home office, para evitar contato com outras
pessoas. E na quinta-feira, quando estive na sua cobertura, ele me
pareceu tão melancólico! Não esperava encontrá-lo em um bar.
— Reparando bem, ele não parece estar se divertindo nem um
pouco e tem mesmo um semblante triste. Talvez esteja tentando sair
do luto, talvez algum amigo o tenha convencido a vir, como fiz com
você.
— Ou o irmão... — Sem conseguir tirar os olhos de onde ele
estava, acabei percebendo que o rapaz ao seu lado era o mesmo
que o visitou no apartamento. Dona Ébia me contou que seu nome
era Marcelo e que era o irmão mais novo de Leonardo.
— Migs do céu, o cara é lindo, milionário, viúvo, está querendo
sair do luto e você trabalha na casa dele. Parece até história de
livro.
— Amei esse babado todo! Se jogue pra cima do bofe, gata! —
Wesley falou, entusiasmado.
— Vocês estão loucos! Ele jamais olharia pra mim. Sou só a
faxineira.
— Ele está olhando! — Kinha e Wesley falaram em coro.
— Deve estar curioso pensando de onde me conhece. Já que
me viu apenas uma vez, ainda por cima vestida de forma bem
diferente e sem maquiagem. Um homem como ele não se
interessaria por quem eu sou de verdade.
— Deixa de bobagens! Você é uma das pessoas mais
especiais que conheço. Linda por dentro e por fora. Merece o que
há de melhor nesse mundo — Érika falou, segurando minha mão.
— Acabei de te conhecer, mas se a Kinha está dizendo isso,
eu concordo com tudo. — Wesley segurou minha outra mão.
Olhei de um para o outro e depois para a direção em que
Leonardo estava. Ele continuava virado para nós, com uma
expressão séria e ao mesmo tempo curiosa. De repente, para minha
surpresa, ele acenou discretamente. Minha pulsação acelerou e a
sensação de zonzeira ficou tão forte que senti o mundo girar. Ainda
bem que estava sentada e apoiada por Wesley e Érika.
Sem saber o que fazer, sorri e desfiz o contato com a minha
amiga, para erguer a mão e retribuir o cumprimento.
Deus do céu, isso pode não ter significado nada, mas já valeu
à noite!
Por mais de uma vez tive vontade de desistir de sair de casa
com meu irmão, mas compreendendo que talvez ele estivesse certo
quanto a eu precisar socializar mais, mantive nosso compromisso.
Quando a noite de sábado chegou, mesmo sem muito ânimo,
arrumei-me e dirigi até o endereço que Marcelo me passou. Ele se
ofereceu para que fôssemos juntos, mas preferi ir no meu carro,
pois assim, caso desejasse vir embora mais cedo, seria mais fácil.
Logo que cheguei ao local, senti-me incomodado pela música
alta e pelo som de vozes e risadas. Cinco anos levando uma vida de
enclausuramento e solidão foi tempo suficiente para me fazer
esquecer um pouco de como a juventude costumava ser animada e
barulhenta. Marcelo tinha razão, apesar de ter trinta e dois anos,
sentia-me como um velho rabugento.
Meu irmão chegou praticamente junto comigo e me
cumprimentou com entusiasmo.
— Estou feliz demais por ter vindo, Leo! — Abraçou-me, dando
tapinhas nas minhas costas. — Agora desmancha essa cara feia e
tente relaxar. A noite vai ser divertida! — falou ao se afastar e
analisar minha expressão que realmente não devia estar das
melhores.
Anuí, esbocei um sorriso e o acompanhei até a mesa que ele
havia reservado. Um garçom se aproximou e pedimos cervejas.
Pouco depois, as garotas que Celo havia convidado para saírem
conosco, chegaram. Meu irmão levantou para cumprimentá-las e,
apesar de sem a menor vontade, achei que seria educado fazer o
mesmo.
— Leo, essas são a Scarllat e a Veruska. Meninas, esse é o
Leonardo, meu irmão mais velho — Marcelo fez as apresentações e
as moças me cumprimentaram com um beijinho no rosto.
As duas eram muito bonitas. Scarllat tinha a pele clara, olhos
azuis e cabelo preto longo e liso. Era longilínea como uma modelo.
Veruska tinha cabelo loiro cacheado, impressionantes olhos
castanhos tão claros que mais pareciam amarelos, era alta como a
amiga e o decote ousado que usava deixava à mostra grande parte
dos enormes seios, que eu poderia jurar serem siliconados.
— Vamos sentar! — Marcelo chamou e nos acomodamos.
A mesa era quadrada, de quatro lugares. Eu e Celo sentamos
um de frente para o outro e as meninas ocuparam as outras duas
cadeiras. Scarllat parecia bem interessada em meu irmão e sua
linguagem corporal deixava isso evidente. Eu podia notá-la um
pouco inclinada para o lado dele.
— Você também é médico? — Veruska puxou assunto comigo
e antes que eu respondesse, fiquei chocado por ver Marcelo e a
outra garota aos beijos.
Quando aquilo tinha acontecido? Mal nos sentamos. A
impressão que tive foi que eles sequer trocaram duas palavras
antes de se atracarem.
O mundo anda mesmo mudado!
— Não — falei percebendo que a moça me encarava
aguardando uma resposta.
— Trabalha com o quê? — Pode ter sido impressão minha,
mas achei que ela ficou um pouco desapontada com a negativa que
ouviu.
— Sou advogado. Eu e meu irmão, juntos com um primo,
dirigimos a operadora de planos de saúde da nossa família, a Vida
Nóbile. Já ouviu falar?
— Jura? Tipo CEOs? — O desânimo da garota logo foi
substituído por um interesse súbito.
— Isso.
— Uau! Nunca achei que conheceria um na vida real. Adoro ler
livros em que os mocinhos são CEOs.
Sem saber o que falar, optei por fazer um discreto gesto
afirmativo com a cabeça.
— Aliás, o que significa mesmo essa sigla?
— Vem do inglês Chief executive officer, que significa diretor
geral ou presidente, o cargo que está no topo da hierarquia
empresarial.
— Hum, que chique!
Esbocei um sorriso e ergui as sobrancelhas, diante o
deslumbre dela.
Quando Celo e Scarllat se desgrudaram, Veruska questionou a
amiga se ela sabia sobre nosso cargo na Vida Nóbile e as duas
começaram uma conversa acalorada que me deixou entediado, com
vontade de sair correndo e ir direto para minha casa. Marcelo
parecia nem se importar com a empolgação delas, ou até mesmo se
divertir com aquele papo sem noção.
Suspirei fundo e observei o meu redor. Foi quando notei uma
moça de vermelho em uma mesa um pouco à frente. Algo nela
atraiu minha curiosidade. Primeiro porque, de alguma forma, parecia
tão deslocada quanto eu; depois porque tive a impressão de
conhecê-la de algum lugar. De tanto olhar para ela, acabei
reconhecendo-a. Era a minha nova diarista. Estava bem diferente,
mas era ela. Quando notei que também me olhava, achei por bem
fazer um aceno de mão, para que não me considerasse mais
estranho do que de fato eu era.
— Meninos, nós duas vamos ao banheiro, ok? — Scarllat
falou, fazendo com que eu voltasse a atenção para elas.
Eu e Marcelo assentimos, as duas se levantaram e saíram.
Sem que me desse conta, dei mais uma espiada na direção
onde Elaine estava.
— Conhece aquele pessoal? — Marcelo questionou ao
perceber o que eu fazia. — Aquela não é a sua nova diarista? —
Antes mesmo que eu pudesse responder, ele reconheceu a garota
que vira na última vez que esteve em minha casa.
— Sim, é ela.
— Se eu a tinha achado bonita naquele dia, preciso me
retificar agora: a garota é linda. Uau, que transformação!
— Confesso que também estou impressionado.
— Bro, por mais gata e sexy que ela seja, não se esqueça de
que é a sua diarista. Tem mulher demais no mundo pra que se
engrace justamente para o lado dela. Por falar, nisso, não curtiu a
Veruska?
— Não estou me engraçando para o lado de ninguém. Só
fiquei surpreso por ver a garota aqui, ok? E quanto a amiga da sua...
seja lá que for que você e Scarllat tenham um com o outro ainda
não consigo nomear, enfim, de fato não estou interessado na loira.
— E por que não, posso saber? Ela é gata pra caralho e pelo
que vi, está doida para dar pra você. E o melhor de tudo: não vai te
cobrar, ao contrário das acompanhantes de luxo que costuma pagar
pra satisfazer seus desejos carnais.
— Já te disse que prefiro assim porque não quero ter que lidar
com conversinha depois e nem prometer que vou ligar, sabendo que
não farei isso.
— Conversar faz parte dos relacionamentos humanos, sabia?
Deixa de ser esquisitão e dá uma chance pra moça.
Vendo que as duas se aproximavam da mesa, encerrei aquela
conversa.
Bebemos, comemos petiscos e fui obrigado a escutar Veruska
tagarelando sobre coisas que eu nem fazia ideia do que se
tratavam. De tão entediado, volta e meia meu olhar vagava pelo bar
e acabei observando mais um pouco minha diarista. Ao sorrir, ela
apertava as pálpebras e sua face se iluminava, deixando-a ainda
mais bonita.
Quando eu já não estava mais suportando aquela noite, avisei
que iria embora.
— Está cedo. Fica mais um pouco, gato. — Veruska se
inclinou para o meu lado e se aproximou tanto que achei que fosse
me beijar. De fato, era linda, sexy e estava se insinuando para mim,
no entanto não tive a menor vontade de ficar com ela.
— Costumo acordar cedo e já estou cansado. — Levantei e ela
fez o mesmo.
— Espero que possamos nos ver de novo. — Beijou meu rosto
pegando o cantinho da boca.
Esbocei um sorriso e anuí. Despedi-me de meu irmão e de
Scarllat e saí.
Na volta para casa fiquei analisando a noite. Apesar de ter me
sentido entediado e incomodado grande parte dela, não foi tão ruim
quanto eu imaginava que seria. Talvez até pudesse fazer aquilo
outras vezes.
Suspirei fundo e liguei o som, deixando-o baixinho. No rádio
tocava uma música da Pitty. Eu ainda não a conhecia e depois
soube que se chamava Serpente. A letra mexeu comigo.

O acaso
Empurra quem
Se agarra à borda, preso em negação
Solitário na multidão
A sustentação é que a manhã já vem
Logo mais amanhã já vem
Chega dessa pele, é hora de trocar

Talvez fosse mesmo hora de eu mudar.


Quem sabe!

Acordei cedo no domingo para correr na praia e quando


cheguei em casa, depois da minha série de exercícios funcionais,
liguei para meus pais. Sentia saudades deles que quase não vinham
ao Rio. Marcelo ia muito a Itaipava, mas depois do acidente, nunca
mais fui lá, pois já me sentia agoniado só de me imaginar pegando
aquela estrada.
Na segunda-feira, estava terminando meu treino matinal
quando ouvi a porta da sala sendo destrancada. Todo suado,
levantei do chão ao encerrar a série de flexões de braço e dei de
cara com dona Ébia e Elaine. A moça percorreu meu corpo com os
olhos, depois fitou o piso, parecendo envergonhada e pude ver sua
face avermelhar, enquanto ela engolia em seco.
— Bom dia, senhoras. Vou subir pra tomar um banho, pois
daqui a pouco começo a trabalhar.
— Quer que eu prepare seu desjejum? — minha governanta
perguntou, depois de responder ao meu cumprimento.
— Não precisa, querida, eu comi uma banana antes de sair pra
correr, vou só tomar o meu wey protein agora. — Peguei a
garrafinha com o shake que tinha deixado ao meu lado. — Mais
tarde faço um lanche.
Ela aquiesceu, pedi licença e saí em direção às escadas.
O dia foi puxado, tive duas reuniões por videoconferência e
muitos documentos para analisar. Quando dei o expediente por
encerrado, estava exausto. Desliguei o computador, guardei na
gaveta a papelada que tinha impresso, que estava sobre a mesa, e
fui até a sala de estar. Precisava de uma dose de uísque e do meu
piano para poder relaxar.
Sentei de frente ao imponente instrumento e deslizei os dedos
sobre as teclas, pensando no que tocar. Decidi executar Nocturne
Op.9, nº 2, do Chopin. A música não era tão melancólica quanto as
que eu vinha escolhendo nos últimos tempos. Na verdade, eu a
achava relaxante.
Ao tocar as primeiras notas, senti uma paz surpreendente me
invadir. Estava envolvido pela delicada melodia quando notei um
vulto no corredor. Imaginando ser de novo a diarista, espichei-me
para observar melhor e, como o esperado, vi a garota encostada na
parede, de olhos fechados e com uma mão sobre o peito. Seu
semblante estava estampado por um estado de deleite que me fez
esboçar um sorriso. Eu sempre achei a música poderosa, capaz de
mexer com nossas emoções. Tinha um amor especial pelos
clássicos e ela, pelo visto, também os apreciava. Fiquei pensando
se já tinha ouvido aquela canção antes, ou se era a primeira vez.
Quando a música terminou, Elaine desencostou-se da parede,
endireitou o corpo e saiu. Levantei e fui até a janela. Eu tinha uma
vista privilegiada da praia. Fiquei olhando o pôr do sol e as ondas
calmas do mar quebrando na areia.
Sinto tanto a sua falta, Li. Nunca vou te esquecer, meu amor.
Mas preciso seguir em frente, só não sei como fazer isso. De onde
estiver, me ajude a encontrar o caminho do perdão e do recomeço.
Fechei os olhos e suspirei fundo.
— Leo — a voz de dona Ébia me tirou do transe, fazendo-me
abrir as pálpebras e me virar em sua direção —, precisa de mais
alguma coisa? Terminamos nossos afazeres.
— Não. Podem ir. — Olhei dela para Elaine, que estava ao seu
lado.
— Obrigada. Até amanhã, então. Bom descanso — minha
governanta falou.
— Até quinta-feira — a garota disse, de forma tímida,
colocando atrás da orelha uma mecha do cabelo que soltou do rabo
de cavalo.
— Até. Tenham uma boa volta pra casa.
Elas aquiesceram e saíram.
Voltei a olhar pela janela, procurando esvaziar a mente das
preocupações e das angústias.

Nos dias seguintes mantive minha rotina de acordar cedo,


correr na praia, fazer meu treino funcional em casa, trabalhar e
conversar ao telefone com meus pais e meu irmão. Na quinta-feira
ao final da tarde, quando sentei ao piano, toquei de novo a Nocturne
Op.9, nº 2, do Chopin e mais uma vez peguei Elaine parada no
corredor, encostada à parede de olhos fechados, apreciando a
música. Na segunda-feira seguinte aconteceu o mesmo e de
repente, sem que eu entendesse o porquê, comecei a ansiar por
aqueles momentos.
Sair com Érika e seus amigos foi muito bacana, só que depois
da minha amiga ter visto o senhor Leonardo, todas as vezes que
nos falávamos ela perguntava como as coisas entre nós estavam, o
que eu achava engraçado, já que não havia nada entre nós além do
fato de que eu limpava a casa dele.
Na segunda-feira seguinte àquele final de semana em que o
encontrei no bar, até pensei que talvez fosse fazer algum
comentário a respeito de ter me visto lá. No entanto ele nada disse,
o que foi um pouco frustrante, pois reafirmou minha convicção de
que um homem como ele jamais olharia para uma mulher como eu.
Sem dar importância indevida para o ocorrido, cada dia mais,
eu gostava de limpar sua cobertura, primeiro porque o lugar estava
sempre muito organizado e o trabalho era bem tranquilo; segundo
porque as manhãs de segunda e quinta passaram a ser as minhas
preferidas, por conta da visão daquele deus grego sem camisa e
suado, o que andava alimentando minha imaginação, não daria para
negar; e, para concluir, eu era agraciada com lindas canções ao
piano aos finais daquelas tardes. Outra vantagem de trabalhar lá era
que tinha a companhia de dona Ébia para ir e voltar. Nós duas
pegávamos condução juntas e aproveitávamos o trajeto para
conversarmos.
Continuei firme com a minha rotina de estudos, empolgada que
em breve, se me esforçasse o suficiente, poderia mudar o rumo da
minha história.
Na terceira semana limpando a casa do senhor Leonardo,
estava encostada na parede, como vinha fazendo para poder ouvi-lo
tocar, quando ele me pegou no flagra, deixando-me totalmente
desconcertada.
— Gosta de Chopin? — A voz me sobressaltou.
Fiquei quietinha na esperança de que a pergunta não fosse
direcionada a mim, no entanto minha ilusão durou pouco.
— Elaine, venha até aqui.
Caramba! Ah, meu Pai. Ele vai me mandar embora por ser
enxerida.
Com as pernas bambas, as mãos trêmulas e o coração
disparado, caminhei até a sala.
— Me desculpe, eu sei que não deveria estar parada ouvindo o
senhor tocar, afinal de contas não é pra isso que sou paga, mas por
favor não me mande embora. Preciso muito do dinheiro que recebo
limpando sua casa, eu prometo que...
— Ei, acalme-se! Só te fiz uma pergunta. Não vou te mandar
embora porque tem me ouvido tocar.
— Ah, meu Deus. Então não é a primeira vez que me vê
parada ali?
— Não. — Ele me olhava sério. — Gosta de música clássica?
— Eu g-gosto... — gaguejei diante da situação embaraçosa. —
Quero dizer, é claro que já ouvi música clássica antes, em algum
momento da vida, mas não sou uma conhecedora do assunto. —
Mudei o peso do corpo de uma perna para outra e remexi as mãos.
— Mas quando o senhor toca essas canções tão lindas, sinto que
elas invadem o meu ser. Realmente gosto do que ouço. Cada uma
mexe de um jeito diferente com minhas emoções. Desculpe mesmo
se tenho sido impertinente, mas na primeira vez que o ouvi tocando,
fiquei impressionada e fui atraída até aqui, como se estivesse
enfeitiçada por aquela melodia tão intensa, tocante, que mais
parecia um lamento. Depois daquele dia passei a ansiar por essas
ocasiões, sendo surpreendida a cada música nova por um
sentimento diferente. — Quando me dei conta do quanto tinha
tagarelado, senti o rosto esquentar e encarei o chão, desejando que
um buraco se abrisse e eu fosse sugada por ele.
— As músicas têm mesmo esse poder, concordo com você.
Receosa, voltei a encará-lo e aquiesci, esboçando um sorriso.
— Quantos anos você tem?
— Vinte e três — respondi, franzindo o cenho, sem entender a
mudança de assunto.
— Quase não a reconheci aquele dia em que te vi no bar.
Quando olho pra você aqui em casa, me parece uma menina
assustada, achei que mal tivesse passado dos dezoito. Mas naquela
noite parecia tão... diferente.
— Ah... Bem, confesso que eu mesma mal me reconheci
aquela noite. Não tenho costume de sair pra me divertir e muito
menos de me produzir daquele jeito. Não sei por que estou te
contando isso, mas aquele vestido nem era meu. Peguei
emprestado da minha amiga, pois não tinha nada apropriado para a
ocasião e lugar.
— Ficou muito bem nele.
— Obrigada. — Aquela conversa, de repente, me deu um
calorão. Ele estava dizendo que havia reparado em mim e que tinha
me achado... bonita?
— E por que uma garota de vinte e três anos não tem o
costume de sair pra se divertir? — Leonardo tomou um gole de sua
bebida e estreitou as pálpebras, parecendo intrigado.
— Digamos que a vida não tem sido muito fácil pra mim.
— Pelo visto temos algo em comum — ele me interrompeu,
mas tive a impressão de que a fala foi mais uma verbalização dos
seus pensamentos do que qualquer outra coisa. — Por que diz
isso? — questionou em seguida.
— Como qualquer adolescente, eu tinha muitos planos,
sonhos. Sempre fui estudiosa e imaginava que terminaria o ensino
médio e entraria para uma faculdade de Direito. Que me formaria,
conseguiria um bom emprego, ou quem sabe passar em algum
concurso, e que poderia dar para minha mãe e para mim uma vida
mais confortável. Porém, quando eu me preparava para a prova do
ENEM, mamãe adoeceu. Ela teve linfoma. Somos só nós duas no
mundo. Precisei deixar pra lá meus sonhos pra poder cuidar dela.
Inclusive tive que assumir seu trabalho de faxineira, para que
tivéssemos dinheiro em casa. Foi um tratamento sofrido. Três anos
entre recidivas e remissões. Por isso estou aqui agora e não
costumo sair pra me divertir.
— Você é uma garota forte, seu relato me deixou
impressionado. Imagino o quanto esse período tenha sido difícil pra
vocês e lamento que tenha sido obrigada a abrir mão de seus
sonhos. Como sua mãe está agora?
— Ela está bem. Graças a Deus já fazem dois anos desde a
última recidiva. Só que passei esse tempo em alerta. Não tinha
coragem de sair de casa pra me divertir e deixá-la sozinha. A
doença a fragilizou muito. Ela nem conseguiu voltar a fazer faxinas.
— E você, não pensa em voltar a estudar?
— Até pouco tempo achava que precisaria me conformar com
minha realidade, mas nas últimas semanas minha mãe e minha
melhor amiga me convenceram de que ainda posso conseguir tudo
que um dia sonhei pra mim. Voltei a estudar. Estou me preparando
para a próxima prova do ENEM. Espero conseguir uma nota que me
permita entrar numa faculdade pública, já que não tenho dinheiro
pra pagar por uma particular.
— Nem sempre as coisas saem como o planejado. Às vezes a
vida é cruel e, de um momento para outro, pode nos tirar o chão e
levar embora quem a gente ama, nossa fé, nossos sonhos. Mas
saiba que tem a minha admiração. Fico feliz em saber que
conseguiu voltar a sonhar. Eu ainda estou tentando aprender a fazer
isso.
— Sinto muito por sua perda. Dona Ébia me contou. Desejo
mesmo que o senhor consiga encontrar o conforto para suas
angústias e a paz necessária pra seguir em frente. Posso ver o
sofrimento nos seus olhos, imagino que nunca vá se esquecer do
que aconteceu, mas ainda é muito jovem. Merece um recomeço.
Ele anuiu sem desviar a atenção de mim. A ruga que surgiu
entre suas sobrancelhas me fez temer ter ultrapassado um limite
proibido.
— Desculpe se falei demais — pedi, desejando que ele não
mudasse de ideia e resolvesse me dispensar. — Terminei o
trabalho, já estava de saída.
— Tudo bem. Não precisa se desculpar. Boa volta pra casa e
até quinta-feira, Elaine.
— Obrigada. Até quinta!
Ainda com receio das consequências daquela conversa, saí da
sala o mais depressa que consegui e fui até a cozinha.
— O que aconteceu, querida? — dona Ébia perguntou,
avaliando-me, preocupada. — Está pálida e com os olhos
arregalados, parece até que viu fantasma.
— O senhor Leonardo me pegou parada o ouvindo tocar piano.
— Ah, meu Deus, Elaine, o que eu te disse sobre não o
importunar?
— Mas eu não estava importunando. Estava quietinha parada
no corredor, só escutando. Apreciando as músicas lindas que ele
toca.
— Tá, tá, mas o que aconteceu, então?
— Ele pediu que eu me aproximasse e começou a conversar
comigo.
— Mesmo? — Ela franziu o cenho e me analisou, como se eu
tivesse dito algo absurdo.
— Por que a incredulidade?
— É que depois que tudo aconteceu, que Lília morreu, ele não
costuma conversar com quase ninguém. Ele puxou assunto com
você?
Assenti, pensando sobre aquilo. Eu sabia que Leonardo tinha
se tornado recluso e introspectivo depois do ocorrido, mas não
pensei que chegasse a tanto.
— Bem, acho que isso é um bom sinal. Ele saiu com o irmão
outro dia, agora puxou assunto com você, espero que continue
deixando a concha que criou ao redor de si mesmo. Já terminou a
faxina?
— Já, sim.
— Também terminei meus afazeres. Podemos ir embora,
então. — Ela pegou a bolsa e caminhamos em direção à sala para
que avisasse o patrão que já estava indo.
Achando melhor não a acompanhar, segui direto para a porta e
fiquei a aguardando.
No caminho de volta para casa, enquanto dona Ébia contava
de uma receita nova que aprendeu, eu não conseguia parar de
pensar na conversa que tive com o senhor Leonardo, no interesse
em que demonstrou sobre minha vida, na voz grave que eu quase
não ouvia e, principalmente, no fato de ele ter confessado que
reparou em mim aquele dia no bar.
“Estava tão diferente”. “Ficou muito bem nele”. As frases me
vieram à mente e tiveram o mesmo efeito de que eu tivesse ouvido:
“Você estava bonita”.
De repente me dei conta de que talvez Érika tivesse razão e eu
enganada na minha concepção. Talvez um homem como ele
pudesse, sim, olhar para uma mulher como eu.
Posso pelo menos sonhar, não é mesmo?
Na quinta-feira seguinte, assim que encerrei o trabalho e me
dirigia até a sala, encontrei Elaine no corredor, com um balde em
uma mão e um rodo na outra.
— Já está terminando a faxina? — A pergunta saiu sem que
me desse conta.
— Sim. Vou só levar isso pra lavanderia. O senhor precisa de
alguma coisa? Quer que eu limpe o escritório de novo?
— Não. Está tudo em ordem lá e não preciso de nada. É que
estou indo tocar e pensei que talvez quisesse me ouvir. Não tem
mais que se esconder aqui no corredor pra isso, está bem?
— Ah... eu... — Ela franziu o cenho e mudou o peso de uma
perna para outra, parecendo sem jeito e até surpresa com o que eu
disse. — É muito gentil da sua parte, senhor Leonardo, mas não
quero importuná-lo.
— Não vai incomodar de jeito algum e estou convidando. Será
bom ter um pouco de companhia.
— Sendo assim, vou só deixar isso no devido lugar e já volto.
— Seus olhos brilharam e ela deu um sorriso tão lindo que iluminou
sua face. Como uma criança quando ganha um presente
inesperado.
— Tudo bem, estarei lá te esperando. — Elaine saiu em
direção à cozinha e eu fui até a sala.
Servi-me uma dose de uísque e sentei de frente ao piano.
Levantei a tampa e percorri os dedos sobre as teclas, pensando no
que tocar.
Não demorou para que Elaine aparecesse. Ela parou na
entrada da sala, receosa.
— Venha. Não precisa ficar com vergonha. Sente-se. Quer
beber alguma coisa? — Ofereci, observando-a. Estava tensa,
mexendo as mãos, sem jeito, parecendo um animalzinho acuado.
— Vou sentar, mas não quero beber nada, imagina. De
qualquer forma, obrigada por oferecer.
Assenti e tomei um gole do uísque, sem conseguir desviar a
atenção dela.
— Bem, vou tocar uma música que já percebi que você gostou.
Ela se chama Nocturne Op.9, nº 2, do Chopin.
Elaine ficou com a face avermelhada por eu ter mencionado
nas entrelinhas da minha fala que a vi me observando mais de uma
vez, mesmo assim assentiu e me encarou com expectativa.
Logo que comecei a tocar, a garota fechou os olhos e tombou
discretamente a cabeça de lado. Era nítido que apreciava a melodia,
que se sentia mexida por ela.
Eu estava tão desacostumado a tocar na presença de outras
pessoas que a ver ali tão entregue ao momento me deixou
fascinado. Existia em seu semblante uma doçura e uma
ingenuidade que faziam meus olhos não se desgrudarem dela.
Quando encerrei a execução, minha diarista abriu as pálpebras
e me fitou.
— Essa música é linda e você toca muito bem.
— Obrigado pelo elogio e tem razão, essa Nocturne do Chopin
é mesmo muito linda. Bem, mas agora, que tal algo
contemporâneo? Tem alguma música que gosta muito que poderia
ser tocada no piano? Se eu souber tocar, o farei com prazer.
— Curto muito o John Legend. Sabe tocar alguma canção
dele?
— Boa! Ele é ótimo mesmo. Sei, sim.
Parei um pouquinho para recordar das notas de Conversation
in the dark e logo a partitura dela me veio à mente.
— Eu toco e você canta? Conhece a letra?
— Sim, mas meu inglês não é dos melhores.
— Ah, imagina, isso não tem problema.
Comecei a tocar e, vendo que ela permanecia muda, cantei
baixinho o trecho seguinte, para incentivá-la:

I got my eyes on you


(Estou com os meus olhos em você)

And you say that you're not worth it


(E você diz que você não vale a pena)

You get hung up on your flaws


(Você fica presa em suas falhas)

Well, in my eyes you are perfect as you are


(Bem, aos meus olhos, você é perfeita como é)
A tática surtiu efeito, porque quando iniciei o refrão, Elaine cantou
junto:

I will never try to change you, change you


(Eu nunca vou tentar mudar você, mudar você)

I will always want the same you, same you


(Eu sempre vou querer o mesmo que você, o mesmo que você)

Ela era muito afinada. Sua voz ficava mais doce cantando, do
que quando falava e a potência era nítida. Fiquei impressionado.
Cantamos juntos até o final e quando terminei a música, ela
não conseguia parar de sorrir.
— Muito obrigada por isso, senhor Leonardo. Foi muito
especial pra mim. Agora já vou — levantou-se e passou as mãos
sobre a roupa —, dona Ébia também já deve estar terminando o
serviço dela.
— Foi um prazer. Está convidada a me ouvir tocar sempre que
quiser.
— Se não for incomodá-lo, eu aceito a oferta. Não teria jeito
melhor de encerrar um dia de trabalho.
Aquiesci, ela pediu licença e se retirou.
Levantei e fui até a janela, apreciar a vista da praia. Ter tido a
companhia de Elaine por aqueles poucos minutos fora muito
agradável. Marcelo tinha razão, eu precisava reaprender a
socializar, afinal, não era tão difícil assim.

No sábado, aceitei um novo convite do meu irmão para sair.


Mais uma vez a dupla Scarllat e Veruska nos fez companhia. Até me
esforcei para me agradar da loira bonita e sexy que não parava de
se jogar para cima de mim, mas não consegui. Minha única vontade
era voltar para casa, sozinho.
Na segunda-feira, ao final da tarde, mais uma vez convidei
Elaine para me ver tocar e fiz o mesmo na quinta.
Um mês se passou e mantivemos a mesma rotina. De repente,
comecei a ansiar por aqueles momentos. Eram poucos minutos de
convivência, mas eu gostava de admirá-la de olhos fechados,
depois de ouvir sua voz melodiosa cantando e de saber um pouco
mais sobre sua vida. Elaine me contou que continuava estudando
firme, determinada a entrar para uma faculdade de Direito. Falou
que não conheceu o pai e que nunca teve um namoro sério. Essa
última revelação me deixou bem surpreso, afinal, ela tinha vinte e
três anos.
— Está tudo bem, Leo? — Dona Ébia me tirou do devaneio,
certa tarde, estava pensando nas conversas com a diarista.
— Tudo, sim. Por que a pergunta?
— Estou te achando meio aéreo nos últimos dias.
— Tenho pensado muito na vida. — Suspirei e tomei um gole
de uísque, encostando-me na janela.
— Espero que no futuro, querido, porque já passou anos
demais sofrendo pelo passado, não acha?
— Você e Marcelo têm razão. Estou tentando mudar, seguir
em frente, mas tenho a impressão de que avanço um passo e
retrocedo dois.
— Não diga isso. Me deixa contente quando conta que saiu
com seu irmão e tenho visto sua interação com a Elaine. Aliás, fico
feliz que esteja a deixando se aproximar. É bom ter amigos. Só peço
que tome cuidado para não dar a ela a impressão errada das suas
intenções.
— O que a senhora está querendo dizer com isso, dona Ébia?
— Olhei para ela de cenho franzido, confuso.
— Elaine é uma garota boa e muito especial. Mas já passou
por sofrimento demais nessa vida. Além disso, é ingênua, não tem
experiência com relacionamentos, rapazes, essas coisas, entende?
Fico preocupada que ela confunda sua atenção com outro tipo de
interesse e acabe iludida, achando que pode acontecer algo mais
entre vocês.
— Eu gosto da companhia dela, é só isso. Nunca faltei com o
respeito com a garota, não se preocupe.
— Você também é um bom rapaz, filho. Permita-se recomeçar.
Agora que começou a sair da sua ostra, não se feche de novo.
Assim como deixou Elaine se aproximar, permita que outras
pessoas façam isso também. Quem sabe até arrume uma
namorada?
— Não sei se seria capaz de amar outra mulher.
— Lília era maravilhosa, mas não está mais aqui. Você é
jovem, rico, bonito, tem uma vida inteira pela frente. Não acha que
seria bom ter alguém de novo ao seu lado?
— Sinceramente, eu não sei. Não é algo que eu consiga
imaginar.
— Tudo ao seu tempo, Leo. Só continue dando passos para
frente. Está no caminho certo. Bom, eu já terminei o meu serviço.
Precisa de mim para mais alguma coisa hoje?
— Pode ir, querida. Até amanhã.
Ela despediu-se e saiu.
Fiquei pensando em tudo que dona Ébia falou e, naquela noite,
quando deitei para dormir, a imagem de Elaine não saía da minha
cabeça. Seu rosto meigo, o rubor que surgia quando ficava
envergonhada, os sorrisos doces, a voz que mais parecia o canto de
uma sereia.
“Com tanta mulher no mundo, não vai se engraçar bem para o
lado da sua diarista, né?”
“Tome cuidado para não dar a ela a impressão errada de suas
intenções.”
As falas de Marcelo e dona Ébia vieram à minha mente.
— Eu não estou interessado, nela. Só a acho... encantadora,
fascinante e gosto da sua companhia. É só isso — falei em voz alta
e, sem sono, levantei, peguei um copo d’água, vesti um short, pois
costumava dormir nu, e fui para a sacada do quarto.
A noite estava estrelada e o mar agitado, como meus
pensamentos. Respirei fundo, procurando esvaziar a mente,
deixando o barulho das ondas e brisa que soprava meu rosto, aos
poucos, acalmarem-me. Quando me senti mais relaxado, voltei para
a cama, tirei o short antes de deitar, e não demorou para conseguir
pegar no sono.

Tive sonhos estranhos a noite toda. Neles, Elaine limpava a


sala vestida só de lingerie, enquanto eu tocava piano. Estava
excitado, observando-a, mas quando fazia menção de me levantar
para ir até ela, dona Ébia e Marcelo apareciam para me segurar.
Variações desse mesmo sonho se repetiram infinitas vezes,
atormentando-me. Quando o despertador tocou, sentia-me exausto.
Pela primeira vez depois de anos, não levantei para correr na praia.
Desliguei o alarme, virei para o lado e dormi de novo.
Não sei quanto tempo se passou até que ouvi a maçaneta da
porta sendo movimentada. Quando as cortinas foram abertas e a
claridade incomodou meus olhos, sentei na cama para ver o que
acontecia.
— Ah, meu Deus! Me desculpe, senhor Leonardo! Não achei
que estivesse aqui. — Elaine deu um gritinho e falou as palavras de
forma tão apressada que custei para entender.
— Que horas são? — questionei, atordoado, e levantei.
— Já passa das nove. Pensei que estivesse no escritório.
— Não saí pra correr hoje, tive uma noite do cão.
— O senhor está... está... pelado! — Apavorada, observou-me
com os olhos arregalados. O rosto ficou tão vermelho que achei que
a coitada fosse passar mal.
— Eu durmo assim e me desculpe pela “barraca armada”, os
homens costumam ter ereção matinal.
Principalmente quando têm sonhos com garotas vestidas só de
lingerie, meu subconsciente fez questão de me lembrar daquilo. Dei
de ombros, divertindo-me com a situação inusitada e com o
constrangimento da minha diarista. Será que ela nunca tinha visto
um cara nu antes?
— Eu v-vou sair e depois m-mais tarde v-volto. M-me desculpe
mais uma vez por ter entrado sem b-bater. Realmente n-não
imaginei q-que ainda estivesse aqui. — De tão aflita, ela gaguejou
sem parar, depois se retirou o mais rápido que conseguiu.
Fui para o banheiro e liguei a ducha, entrando debaixo da água
morna. Meu pau estava até dolorido de tão duro. Procurei pensar
em trabalho e coisas aleatórias que pudessem fazer a ereção ceder,
mas nada funcionou. A única forma de resolver aquilo seria me
masturbando. Então envolvi o membro ereto com uma mão e com a
outra me apoiei nos azulejos frios. Quando iniciei movimentos de vai
e vem, a imagem de Elaine surgiu à mente, seminua como nos
sonhos. Ao mesmo tempo ingênua e provocante. Bastou aquilo para
me deixar maluco. Acelerei o que fazia, até que meus músculos
retesaram e um orgasmo intenso me dominou.
Bati uma pensando na minha diarista. Que porra foi essa que
acabei de fazer?
Foi difícil tirar da mente a imagem do senhor Leonardo nu e
com uma ereção matinal. Ele não era só bonito e másculo. Era um
verdadeiro deus grego, o pecado personificado.
Naquela noite tive sonhos eróticos com o patrão, que me
fizeram acordar meio desorientada. Não era virgem aos vinte e três
por puritanismo ou por não sentir desejo, mas sim pela falta de
oportunidade de transar. Nunca tive um namorado sério. Na
verdade, desde que mamãe adoecera, eu mal tinha beijado na boca.
Em um estado absurdo de excitação, levei a mão à minha
intimidade e me toquei, imaginando que fosse ele. Quando acelerei
os movimentos, não demorou para meus músculos retesarem, a
visão nublar e eu gozar. Ao invés de me sentir satisfeita, fiquei louca
por mais. Conferindo as horas no celular, pulei da cama e corri para
tomar banho, pois não queria chegar atrasada para a faxina do dia.
No sábado de manhã, Érika me ligou chamando para sair com
ela e Wesley. Imaginando que era uma boa oportunidade de
conhecer alguém interessante, aceitei sem hesitar. À tarde fui até a
sua casa e minha amiga de novo deixou seu guarda-roupa à minha
disposição. Peguei emprestado um macacão preto lindo que só me
fez perceber o quanto realmente eu precisava de coisas novas. O
complicado era sobrar grana para esse tipo de compras. Acabei
contando a ela o incidente da quinta-feira de manhã e Kinha riu
tanto que achei que fosse passar mal.
À noite, minha amiga me buscou de carro. Fomos a um bar na
Barra da Tijuca, onde tocava um sambinha gostoso. O lugar estava
cheio de gente jovem e bonita. Conseguimos uma mesa e, assim
que sentamos, um garçom se aproximou. Pedimos três caipirinhas e
uma cestinha com pastéis.
— Alguma novidade em relação àquele boy magia do seu
patrão? — Wesley perguntou enquanto aguardávamos nossos
pedidos.
— Ela viu o gostosão pelado — Kinha falou antes que eu
tivesse a oportunidade de responder qualquer coisa.
— Como assim? Conte tudo porque agora fiquei curioso. — Os
olhos do rapaz quase saltaram das órbitas de tanta empolgação.
Quando terminei de narrar o acontecido, Wesley estava
boquiaberto.
— Menina, que sorte a sua ter uma visão esplendorosa
dessas! — Ele se abanou, de forma exagerada. — Esse viuvão
deve estar a perigo, precisando de um trato, por que não se oferece
para consolá-lo um pouquinho, hum? — Trombou seu ombro com o
meu.
— Nane, também sou a favor dessa ideia. Já te disse antes,
né? — Foi a vez da minha amiga se manifestar.
— É, garota, jogue um charme pro bofe, seduza aquela delícia
de homem. Aposto que deve ser um vulcão na cama.
— Malucos! — Comecei a rir e balançar a cabeça em negativa.
— Em primeiro lugar, por mais que o ache lindo e muito desejável,
não tenho a menor ideia de como seduzir alguém e, em segundo e
mais importante, o homem em questão é meu patrão e não posso
me dar ao luxo de perder as faxinas que faço lá por me engraçar
para o lado dele.
— Bobagens, aposto que não iria perder nada, só ganhar. E
quanto a não saber seduzir, não tem dessa não, gata. É só deixar
sua sensualidade aflorar. Você é linda, não precisaria se esforçar
muito pra atrair a atenção de qualquer cara hétero — Wesley falou
e, para minha sorte, a conversa foi interrompida pelo garçom
trazendo nossos pedidos.
Fizemos um brinde, depois cada um provou sua bebida e
pegou um pastelzinho para comer.
A noite foi bastante agradável, bebemos, comemos,
conversamos e dançamos, mas infelizmente não achei ninguém
para paquerar. De repente me peguei procurando por ele em cada
rosto que vi. O que estaria fazendo? Teria saído com o irmão outra
vez, ou estaria em casa, solitário, tocando canções melancólicas e
bebendo uísque?
Gostava muito da sua companhia. Dos minutos que
passávamos juntos aos finais de tarde quando eu limpava sua casa.
De ouvi-lo tocar, de responder às suas perguntas sobre mim, por
mais que pouco me contasse a respeito de si mesmo.
Já deitada em minha cama, suspirei com as recordações.
Nunca desejei tanto que uma segunda-feira chegasse logo.

Na segunda-feira, dentro da condução a caminho do trabalho,


mal conseguia me concentrar no que dona Ébia dizia, de tão
ansiosa para chegar à cobertura na Barra e encontrar Leonardo
suado e sem camisa se exercitando na sala. Não conseguia tirá-lo
da cabeça.
No entanto, para minha decepção, ao chegarmos deparei com
ele vestido de terno e gravata. Estava lindíssimo, mas preferiria mil
vezes vê-lo com o peito nu.
Depois de o cumprimentarmos, dona Ébia perguntou se ele iria
para a empresa naquele dia.
— Infelizmente, hoje tenho assuntos que não daria pra resolver
de casa. Não precisa se preocupar com meu almoço — falou para a
governanta e depois me dirigiu o olhar — nem esperarem por mim
no final da tarde. Devo chegar só à noite.
Eu e ela assentimos. Precisei disfarçar para não transparecer
minha frustração, já que, além de não poder admirar seu corpo
sarado, também não teria música ao piano e nem sua companhia no
final da tarde, naqueles poucos minutos que me recompensavam o
dia de trabalho árduo e me alegravam tanto.
— Ah, Leo, antes que me esqueça, terei consulta médica e
exames na próxima quinta-feira. Se importa se eu tirar o dia de
folga? Prometo deixar sua comida preparada na quarta e Elaine
poderia esquentar pra você no dia seguinte, não é mesmo, querida?
— Ela olhou dele para mim.
— Claro. Posso ajudar com o que for preciso quando a
senhora não estiver aqui — respondi sentindo a pulsação acelerar,
só de imaginar que ficaríamos somente ele e eu o dia todo sozinhos
ali.
— Tudo bem. Vá tranquila resolver suas coisas. Precisa
mesmo cuidar da saúde. — Leonardo esboçou um sorriso para ela,
com o semblante gentil.
— Obrigada! — Dona Ébia acariciou a mão dele.
Há mais de um mês trabalhando em sua casa, nunca o tinha
visto dar um sorriso aberto, mostrando os dentes. Tinha a impressão
de que não se permitia ser alegre. Mesmo assim comedido, era
notável seu carinho pela governanta. Peguei-me pensando em
como ele seria antes de a esposa falecer.
— Eu já estava de saída. Tenham um bom dia! — Despediu-se
de nós e deixou a cobertura.
Minha vizinha me explicou o que eu precisaria saber e
providenciar na sua ausência no dia da minha próxima faxina.
Procurei tranquilizá-la, afinal não seria nada difícil cuidar da
alimentação do patrão, já que estaria tudo pronto.
— Pode deixar comigo, dona Ébia! Não tem erro.
— Muito obrigada, Nane. Apesar do Leo ter feito pra mim um
plano de saúde pela operadora dele, eu quase nunca o uso. Deixo
sempre pra depois para marcar minhas consultas médicas e
exames de rotina. Já estava na hora de me preocupar com essas
coisas.
— Tem toda razão. E a senhora já fez tanto por mim e por
mamãe que isso que está pedindo não é nada. Ajudarei com o
maior prazer.
— Você é uma menina de ouro! — Afagou meu rosto e eu
sorri. — Agora vamos cuidar de nossos afazeres.
Aquiesci e fui para a lavanderia.
Procurando evitar pensamentos impertinentes, enfiei a cara no
trabalho e faxinei com a fissura de alguém que tem TOC por
limpeza. No quarto do patrão, parei para observar um porta-retrato
em que ele estava de pé, na praia, ao lado de uma jovem bonita,
alta, de cabelo castanho bem claro, que imaginei ser sua esposa.
Nunca tinha reparado direito naquela foto. Peguei-a para ver melhor.
Eles eram lindos juntos e pareciam muito felizes. O homem que eu
encarava na imagem exibia um sorriso aberto e radiante.
Tão diferente do Leonardo de agora. Como a dor e a tristeza
mudam as pessoas! Suspirei, questionando-me se algum dia ele
seria capaz de deixar outra pessoa entrar em sua vida, em seu
coração. Sentindo o meu apertadinho, coloquei o porta-retrato de
volta ao seu lugar e continuei a faxina.
Eu não deveria ficar pensando no patrão, mas naquela noite
custei para dormir, tomada por recordações que o envolviam,
ansiosa para que quinta-feira chegasse e eu pudesse vê-lo, ouvi-lo
tocar e quem sabe conversarmos um pouco.

Na quinta-feira, quando acordei, percebi que o tempo estava


fechado. Até conferi o relógio achando que o despertador tinha
tocado antes da hora. Levantei e fui até a janela. O céu estava
coberto por nuvens escuras.
— Parece que vai chover — mamãe comentou quando entrei
na cozinha e ela já passava o café.
— Verdade. Tomara que essa tempestade que está
ameaçando cair não me pegue no caminho. — Aproximei-me para
beijar sua face.
— Leve guarda-chuva, filha, e um agasalho, para o caso de
esfriar mais tarde.
— Pode deixar que farei isso, mãezinha.
Tomamos o desjejum juntas, terminei de me arrumar e saí.
Infelizmente não tive a sorte que desejei. Quando desci do
ônibus, começou uma forte chuva de vento. Andei o mais rápido que
consegui, mesmo assim me molhei toda. Ainda bem que estava com
sapatilhas de borracha. Poderia secá-las com facilidade depois, já
as minhas roupas...
Ao destrancar a porta da cobertura de Leonardo, ele, que
estava na sala fazendo seus exercícios físicos, olhou-me assustado.
— Minha nossa! Você está encharcada, garota!
— É... eu sei. Logo que desci do ônibus a poucos quarteirões
daqui a tempestade me pegou. Estava com guarda-chuva — ergui o
objeto para mostrá-lo —, mas por conta do vento, ele não adiantou
de nada.
— Não pode trabalhar molhada assim, vai acabar adoecendo.
— Ele se aproximou de mim e pegou a minha mão. — Caramba,
você está gelada. Vamos até o quarto. Enquanto se livra dessas
roupas molhadas e toma um banho quente, vou providenciar algo
pra vestir.
— Imagina, senhor Leonardo, não precisa. — Comecei a
tremer e já nem sabia se era de frio ou pelo constrangimento da
situação.
— Claro que precisa, está tremendo. Venha logo! — Puxou-me
rumo as escadas e me guiou até o quarto de hóspedes.
Abriu o guarda-roupa e pegou uma toalha limpa, branca e bem
felpuda.
— Pegue isso. Entre no banheiro e tire essas roupas
molhadas. Ficarei do lado de fora esperando por elas. Enquanto
toma um banho quente, coloco-as pra lavar e secar. Depois venho
ver algo que dê pra se vestir.
— Não tenho nem como agradecer...
— Não precisa agradecer por nada. Está tudo bem. Agora vá!
Anuí e fiz o que mandou. Já dentro do banheiro, que jamais
imaginei um dia usar, despi-me. Depois abri a porta para entregar
para ele minhas roupas sujas e molhadas.
Usei o sabonete líquido que estava lá para me lavar, bem
como o xampu e o condicionador. Mesmo que o banheiro não fosse
o que ele usava, o cheirinho gostoso de coisa boa e cara era o
mesmo que meu patrão exalava todas as manhãs. Senti como se
estivesse sendo abraçada por ele. Fechei os olhos e apreciei a
gostosa sensação.
Terminei o banho, sequei-me e me enrolei na toalha. Abri a
porta devagarinho, constrangida, pensando que ele me veria
daquela forma.
— Estava no meu closet revirando as roupas pensando no que
poderia te emprestar que não ficaria enorme em você, achei que
talvez encontraria algo da minha esposa, mas faz bastante tempo
que separei as coisas dela e pedi a dona Ébia que enviasse para
doação... Enfim, veja se esse moletom pode te ajudar. Deixei
também chinelos aqui pra te emprestar. Com certeza a numeração é
bem maior do que a que usa, mas é melhor do que ficar descalça.
— Ele me estendeu um conjunto cinza e quando estiquei o braço
para pegá-lo, a toalha se desprendeu de mim e caiu no chão,
deixando-me completamente nua diante dele.
Arregalei as pálpebras, atônita. Paralisada pelo desespero,
não consegui dizer uma palavra sequer, muito menos me abaixar
para resgatar o tecido branco e felpudo que jazia aos meus pés.
Leonardo percorreu meu corpo de cima a baixo com os olhos e
notei seu pomo de adão subir e descer quando ele engoliu em seco.
— Bem, hum-hum — abaixou-se para pegar a toalha e me
devolvê-la —, pelo menos agora estamos quites. — Ele tentou
descontrair o clima tenso, mas me deixou ainda mais envergonhada.
Meu rosto ficou tão quente, que parecia pegar fogo e eu podia
imaginar o quanto estava vermelha.
— Vou sair para que possa se trocar. Te encontro lá embaixo.
Fiz um discreto aceno de cabeça em concordância e o vi virar
as costas e deixar o quarto.
Meu coração parecia querer sair pela boca e as pernas ficaram
trêmulas. Aquele estava sendo um dia bem peculiar e o pior de tudo
é que estava só começando.
Fiquei embasbacado ao ver Elaine nua bem na minha frente. O
corpo dela era lindo. Seios naturais, de tamanho médio e mamilos
rosados, cintura fina, quadril saliente, pelos pubianos curtinhos e
coxas grossas. Tudo isso arrematado por um longo e liso cabelo
castanho molhado e pela face ruborizada, tornava o conjunto um
misto de sensualidade e candura que me deixou excitado.
Precisei disfarçar para que ela não notasse a ereção que
começava a apertar minha calça. Fiz uma brincadeira tentando
descontrair o clima que de repente ficou tenso entre nós e deixei o
quarto o mais rápido que pude. Seria difícil tirar aquela imagem da
minha mente. Ela era muito mais tentadora do que a do sonho que
tive.
Desci as escadas e fui até a sala de estar. Servi-me de uma
dose de uísque e sentei ao piano. Comecei a tocar Conversations in
the dark, do John Legend e fechei os olhos, perdido na bonita
melodia e nas lembranças de quando Elaine cantara a canção
comigo.
Quando abri as pálpebras, a garota me encarava. Não tinha
percebido sua chegada.
As mangas da blusa e as barras da calça estavam dobradas e
ela parecia mais sem jeito do que nunca.
— Vai ser difícil eu trabalhar assim hoje. A roupa ficou enorme
em mim e a calça está toda enrolada na cintura. — Levantou um
pouco a blusa para me mostrar a situação. — Estou tendo que
segurá-la pra não cair. — Fez uma careta bonitinha e ergueu os
ombros, como num pedido de desculpas.
— Tudo bem. Fique tranquila. O apartamento está limpo.
Sente e me faça companhia.
— Não vai trabalhar?
— Tive tantas reuniões cansativas nos últimos dias, que tirei
hoje de folga. Aceita uma bebida?
— Não, obrigada. Não tenho o hábito de beber e deve ser
pouco mais do que nove horas da manhã.
— Tome pelo menos um licor, vai ajudar a te esquentar. —
Levantei e fui até o bar. Servi uma dose de licor de Amarula e
caminhei até ela, que ainda estava parada de pé no mesmo lugar,
para lhe entregá-lo.
— Obrigada, senhor Leonardo, não precisava. Está sendo tão
gentil comigo que nem sei como agradecer. — Ela experimentou a
bebida e vi surpresa em sua expressão. — É muito gostoso! Bem
docinho.
Caralho! Doce e gostosa é você, garota. Pensei, atordoado, ao
vê-la passar a língua sobre os lábios carnudos.
— Não precisa me chamar de senhor, Elaine.
Ela aquiesceu e tomou outro gole do licor, repetindo o
movimento de lamber os lábios em seguida. Dava para ver que não
fazia aquilo como forma de me provocar. O gesto fora ingênuo,
mesmo assim ateou fogo no meu corpo e na minha imaginação. De
repente, fantasiei que sua língua passeava por mim até alcançar o
meu pau. Fazia tanto tempo que não transava que bastou aquela
imagem para meu membro ficar duro outra vez.
— Bem, hum-hum, estava tocando aquela canção do John
Legend que você gosta.
— Eu ouvi quando cheguei à sala. — Sorriu, meio tímida.
— Que tal eu tocá-la de novo e daí você canta pra gente? —
Afastei-me dela, porque era o melhor que podia fazer naquele
momento, antes que cometesse uma loucura.
— Ótima ideia! — Brindou-me com outro sorriso encantador e
tomou mais um gole da sua bebida.
Sentei-me ao piano e comecei a tocar.
Elaine cantou baixinho e deu alguns passos para frente, até
que se apoiou no instrumento, cravando seus lindos olhos castanho-
claros em mim.
Minha pulsação acelerou e engoli em seco. Ela parecia uma
sereia me enfeitiçando e eu já estava rendido aos seus encantos.
Não consegui pensar em outra coisa que não fosse beijá-la com
volúpia, depois fodê-la bem ali em cima do piano.
Caralho, Leonardo, controle-se!
Aos poucos, Elaine pareceu mais à vontade e com isso deixou
sua voz sair potente, confiante e, para acabar com meu juízo,
extremamente sedutora.

I will never try to change you, change you


(Eu nunca vou tentar mudar você, mudar você)

I will always want the same you, same you


(Eu sempre vou querer o mesmo que você, o mesmo que você)
Swear on everything I pray to
(Juro por tudo que é mais sagrado)

That I won't break your heart


(Que eu não vou partir o seu coração)

I'll be there when you get lonely, lonely


(Eu estarei aqui quando você estiver solitário, solitário)

Keep the secrets that you told me, told me


(Vou guardar os segredos que você me contou, me contou)

— Caralho, garota! — Deixei o pensamento escapulir e ela


parou de cantar, para me olhar confusa.
— Fiz alguma coisa de errado? — Franziu o cenho e
desencostou-se do piano. A pergunta saiu baixinho, a voz vacilante,
insegura, receosa.
Tomei um gole de uísque, levantei e fui até ela.
— Não fez nada de errado. Aliás, você é perfeita, Elaine.
Perfeita. — Tomado por um momento de insanidade e pela luxúria,
acariciei seu rosto e sua cintura, eliminando nossa distância.
Minha diarista arfou e umedeceu os lábios. Os olhos sondaram
os meus e depois desceram até minha boca. Ela queria aquilo tanto
quanto eu. Então, sem pensar em mais nada, beijei-a com volúpia.
Talvez devesse ter sido mais delicado, mas o estado de
excitação não me permitia. Minha língua invadiu sua boca,
devorando-a com selvageria. Deslizei a mão que estava em seu
rosto até a nuca e agarrei seu cabelo, erguendo-o, puxando de leve.
Ela gemeu e colou nossos corpos. Meus lábios abandonaram os
seus e correram até o pescoço delicado. Mordisquei e chupei a pele
que cheirava a banho recém-tomado, enquanto uma mão foi parar
na sua bunda arrebitada e a outra invadiu a blusa larga demais até
encontrar os seios. Apalpei um, depois o outro, apertando os
biquinhos enrijecidos, puxando de leve.
Elaine tombou a cabeça para trás e gemeu.
Peguei-a no colo e a sentei sobre o piano. Voltamos a nos
beijar, enquanto nossas mãos afoitas exploravam o corpo um do
outro.
— Tudo que mais quero nesse momento é te foder, garota —
sussurrei em seu ouvido, meio fora de mim.
— Nunca achei que os caras dissessem mesmo isso na vida
real — balbuciou meio torpe, fazendo-me recuar um pouco.
Precisava entendê-la melhor.
— O que você disse? — questionei, encarando-a, um pouco
preocupado com o que ouviria a seguir.
— É que eu adoro ler romances eróticos e neles é comum os
mocinhos dizerem isso para as mocinhas. É muito excitante, mas
não achei que de fato fosse assim na realidade.
— O que você está querendo me dizer, Elaine? — Estreitei as
pálpebras e afundei as mãos no meu cabelo, desorientado.
— Bem, hum-hum, isso que acabamos de fazer foi incrível e
juro que adoraria ser fodida por você — ruborizou ao dizer aquilo —,
mas antes precisa saber de uma coisa.
— Não vai me dizer que...
— Eu sou virgem, Leonardo.
— Caralho, garota!
Foi como se ela tivesse jogado um balde de água fria em mim.
Não dava para simplesmente ignorar a informação e continuar de
onde paramos. Aquilo mudava tudo. Não poderia desvirginá-la,
assim. A garota esperou vinte e três anos por aquele momento.
Merecia que ele fosse especial, com alguém que gostasse e que, de
preferência, correspondesse aos seus sentimentos, e não apenas
estivesse querendo satisfazer desejos carnais.
— Melhor pararmos por aqui. — Com delicadeza, retirei-a de
cima do piano.
— Não, por favor. Eu quero muito isso! — Tentei argumentar
quando percebi que ele estava desistindo de transar comigo.
— Iria se arrepender depois. — Tomou um gole de uísque e foi
até o bar para encher o copo de novo.
— Eu tenho vinte e três anos, nem deveria ser mais virgem,
infelizmente cheguei até aqui assim por circunstâncias que já te
contei antes. Passei anos sem sair de casa, sem ter qualquer
envolvimento romântico, mas isso não significa que eu não tenha
desejos. Eu os tenho. Quero saber como é fazer amor, como é ter
um orgasmo a dois.
— Você disse tudo, Elaine. Falou “fazer amor”. Com certeza é
isso que espera, e não seria o que aconteceria agora.
— Foi só uma forma de falar. Não me importo que não nutra
sentimentos por mim, que só deseje uma transa casual. Eu topo. Eu
quero, Leonardo. Faça sexo comigo! — implorei, desesperada.
Aquela era a melhor chance de eu perder a virgindade e de ter uma
primeira vez maravilhosa. O cara era lindo, gostoso e tinha pegada.
Com certeza não iria me decepcionar.
— Não diga essas coisas que ainda sou capaz de cometer
uma loucura!
— Pois cometa! Depois podemos fingir que nada aconteceu.
Afinal, preciso do emprego e a última coisa que desejaria, seria
perder as faxinas que faço aqui. Por favor, transe comigo. Não tenho
experiência, mas não sou nenhuma santa. Me ensine do que gosta.
Eu aprendo rápido. — Aproximei-me dele e passei as mãos por seu
tórax firme.
Ele me olhou tenso. Parecia travar uma batalha interior.
— Tem certeza de que é isso que quer? — questionou,
deslizando a mão pela minha nuca.
— Absoluta. Me dê uma primeira vez fabulosa e depois
esquecemos o que aconteceu. — Fiquei na pontinha dos pés e
mordisquei seu queixo.
— Ah, menina, como posso resistir a tanta tentação? — Colou
sua boca à minha e me beijou com lascívia, passeando a mão por
meu corpo, arrepiando-me inteira e fazendo minha intimidade latejar.
— Vamos para o quarto — falou quando nossos lábios se
desgrudaram e me puxou em direção às escadas.
Pensei que fôssemos para sua suíte, no entanto ele me levou
de novo para o quarto de hóspedes. Estranhei, mas achei melhor
não falar nada. Leonardo se livrou das minhas roupas e o ajudei a
retirar as dele.
— Você é linda e muito gostosa! — elogiou afastando-se um
pouco para me observar nua.
Estava tão excitada que não tive vergonha daquela vez, pelo
contrário, senti-me sexy e poderosa.
— Sente na cama! — ele ordenou, com os olhos faiscando de
desejo e obedeci.
Leonardo abaixou-se à minha frente e abocanhou um dos
meus seios, estimulando o outro com a mão. Ele lambeu, chupou e
mordiscou meu mamilo sensível. Quase gozei só com aquilo.
Agarrei seu cabelo e gemi, ensandecida.
Depois ele desceu lambendo minha barriga, enquanto as mãos
acariciavam a parte interna das minhas coxas.
Acomodou-se melhor no chão e afastou meus joelhos. Arfei só
de imaginar o que viria a seguir. Será que sexo oral seria tão bom
quanto eu imaginava?
Nem tive tempo de me questionar muito, porque logo seus
lábios e sua língua alcançaram minha intimidade, fazendo miséria
comigo.
Sexo oral era mil vezes melhor do que eu poderia sonhar!
— Deite-se, pequena! — ele mandou e mais uma vez obedeci.
Leonardo ergueu minhas pernas e me fez apoiar os pés na
beirada do colchão. Naquela posição fiquei ainda mais exposta para
ele.
— Visão do paraíso — falou antes de abocanhar meu sexo
outra vez. Chupou-me, babando-me toda. Sua língua habilidosa
explorava cada cantinho de minha intimidade. Meu interior pulsava
de tanto tesão, ansiando ser preenchido por ele.
Quando Leo prendeu meu clitóris de leve entre os dentes, dei
um gritinho de surpresa e excitação.
— Doeu? — Afastou-se um pouco e questionou, preocupado.
— Não. Só fui pega de surpresa. Foi muito bom. Por favor não
pare o que está fazendo.
— Seu desejo é uma ordem, senhorita! — Voltou a me chupar
com intensidade. Sua língua explorava minha entrada, depois
voltava para os pequenos lábios, até atormentar de novo o clitóris.
Tomada pela luxúria, fiquei meio torpe, e balbuciei palavras
desconexas, já fora de mim. De repente meus músculos retesaram,
anunciando a proximidade do clímax. Percebendo meu estado, Leo
intensificou o que fazia. Logo fui arremessada ao céu. Meu corpo
convulsionou de prazer e relaxou em seguida, quando me senti
despencar em queda livre.
— Que delícia! — falei resfolegante e ergui o tronco para
encará-lo.
Leonardo me olhava com seriedade.
— O que foi? — questionei temerosa.
— Eu quero muito transar com você, Elaine, mas não posso
fazer isso.
— Como me diz uma coisa dessas agora, depois de ter me
dado o melhor orgasmo da minha vida?
— Já carrego peso demais na consciência, para ter de lidar
com mais esse.
— Mas não tem que se sentir culpado por nada. Estou aqui de
livre e espontânea vontade. Na verdade, sabemos bem que implorei
por isso. Por favor, não desista agora — choraminguei, desolada,
humilhada. Como ele podia fazer isso comigo? Qual era a diferença
de fazer sexo oral em mim e ir até o final? Um hímen rompido? —
Leo — chamei-o pelo apelido pela primeira vez —, eu quero transar
com você.
— Sinto muito, Elaine. Não posso... não devo.
— Que merda, que merda! Caramba, Leonardo! — Levantei-
me, atordoada. — Bem, vou até a lavanderia ver se a máquina
ainda demora muito pra terminar de lavar e secar minhas roupas. —
Peguei o moletom que ele havia me emprestado e que estava
jogado no chão e o vesti o mais rápido que pude.
Leonardo ficou parado me olhando, o tormento estampado em
seu semblante fechado.
— Com licença — pedi ao passar por ele e deixei o quarto.
Enquanto descia as escadas, lágrimas rolavam por minha face.
Como pude ser tão tola? O que eu estava pensando? Agora só
falta ele me mandar embora, dispensar meus serviços de faxineira.
— Burra, burra, burra, imbecil! — falei ao conferir na máquina
lava e seca que ainda faltava meia hora para minhas roupas ficarem
prontas. Por sorte eram de tecido sintético e o ciclo rápido, em que a
máquina estava programada, levava apenas sessenta minutos.
— Você não é nada disso. — A voz grave me fez virar.
Sem conseguir encará-lo, fitei o chão.
— Ei, olhe pra mim. — Ele se aproximou e ergueu, com
delicadeza, meu queixo com a mão. — Me perdoe se a magoei. Não
foi minha intenção.
Aquiesci, esforçando-me para controlar as lágrimas que já
pinicavam meus olhos outra vez.
— Deve estar com fome. Que tal prepararmos algo para
comermos enquanto aguarda suas roupas ficarem prontas?
— Eu que deveria estar cuidando da sua alimentação hoje,
não o contrário. — Fiz careta e ele acariciou minha face.
— Será um prazer cuidar de você, pequena. Venha. — Passou
o braço forte sobre meus ombros e me guiou até a cozinha.
Pediu que eu sentasse em uma banqueta alta, de frente para o
balcão de granito preto e abriu a geladeira, tirando de lá alguns
ovos.
— Gosta de omelete?
— Gosto. — Mesmo ainda triste pelo acontecido, esbocei um
sorriso, encantada por vê-lo tão cuidadoso comigo.
Fiquei em silêncio, observando-o ao fogão. Poucos minutos
depois ele nos serviu.
— Está uma delícia — elogiei após a primeira garfada.
— É uma das poucas coisas que sei fazer. — Ele deu de
ombros.
— Leo, por favor não me mande embora. Não dispense meu
serviço de faxineira. Preciso muito desse dinheiro — pedi,
encarando-o com aflição, quando terminamos de comer.
— Eu jamais faria isso, fique tranquila.
— Obrigada. E... desculpe meu comportamento hoje. Isso
nunca mais vai se repetir. Eu não deveria ter insistido pra você
transar comigo.
— Não precisa se desculpar. Vamos passar uma borracha
nisso tudo, está bem? Você é uma boa garota, gosto da sua
companhia. Confesso que tenho ansiado pelos finais de tardes das
segundas e quintas-feiras, não quero perder isso. Por favor não se
afaste de mim por conta do que houve entre nós hoje. Acha que
consegue lidar com isso e continuar a ser como éramos antes?
Anuí, com vontade de chorar outra vez. Eu também gostava
muito da companhia dele, mas depois de tê-lo com a boca em
minha intimidade, levando-me à loucura, não seria tão simples
continuar com nossos minutos de convivência, enquanto o ouvia
tocar.
— Tenho dificuldade em fazer amigos, socializar, lidar com
pessoas, mas com você foi tão natural. É a única de quem me
aproximei nos últimos anos. Por favor não se afaste agora.
— Tudo bem. — Pousei a mão sobre a dele.
De repente, o aviso sonoro da máquina lava e seca tocou,
interrompendo o momento.
— Minhas roupas ficaram prontas. Vou me trocar. — Pedi
licença, levantei e fui até à lavanderia.
Depois de trocar as roupas dele pelas minhas e de secar as
sapatilhas de borracha, usando um pano de chão limpo, calcei-as e
retornei à cozinha. Leonardo ainda estava no mesmo lugar.
— Posso começar a faxina pelo escritório, já que não está
trabalhando? — questionei quando nossos olhares se encontraram.
— Não precisa faxinar hoje, a casa realmente está limpa. Vou
te pagar o valor da diária. — Pegou a carteira no bolso, pegou o
dinheiro e me entregou. — Tire o dia de folga. Aproveite pra
descansar e estudar.
— Obrigada, mas não deveria me pagar, então.
— Imagine, faço questão.
— Obrigada, Leo. Aliás, se incomoda de eu chamá-lo assim?
— De jeito, algum. Muito melhor do que senhor Leonardo. —
Ele estreitou as pálpebras e esboçou um sorriso, brincalhão.
— Está certo. Até segunda-feira. — Aproximei-me e beijei seu
rosto.
— Até. — Ele me encarou por um longo instante.
Quando consegui me libertar do nosso contato visual, peguei
minha bolsa e saí.
O tempo lá fora havia melhorado. A tempestade passara, o
que me deixou aliviada. No entanto, dentro de mim, a tormenta
estava só começando.

— O que houve, filha? Não foi trabalhar? — mamãe


questionou quando entrei em casa, aparecendo na sala com um
pano de prato nas mãos e a feição preocupada.
— Fui... é que quando estava descendo do ônibus peguei
aquele temporal que caiu e cheguei à cobertura do senhor Leonardo
completamente encharcada. Como não tinha condições de trabalhar
daquele jeito, ele mandou que eu tomasse um banho quente e me
emprestou uma roupa, enquanto aguardava as minhas serem
lavadas e secas.
— Meu Deus, filha! Que situação... Mas por que não fez a
faxina depois que suas roupas secaram?
— O patrão disse que a casa estava limpa e me deu o dia de
folga, acho que por pena de mim. Mas ainda bem que me pagou por
ter ido até lá. Recebi o valor integral da diária.
— Ah, minha filha, não acho certo uma coisa dessas. Não é
melhor devolver?
— Ele fez questão, mãezinha, além do mais, não estamos
podendo nos dar a esse luxo, não é mesmo?
— É... tem razão. Já que ele quis pagar, melhor aceitar e
deixar pra lá. Está com fome? Estou quase terminando o almoço.
— Fiz um lanche antes de vir embora. A senhora quer ajuda na
cozinha?
— Não precisa, meu amor. Pode ir cuidar das suas coisas.
— Vou aproveitar o restante do dia livre pra estudar.
— Muito bem! Estou gostando de ver a sua dedicação. Tenho
certeza de que será recompensada.
Sorrimos uma para outra e fui tomar banho. Já no meu quarto,
vesti uma roupa confortável, quentinha, e deitei na cama com uma
apostila de português. Estava complicado prestar atenção a tantas
regras gramaticais, pois certas cenas não paravam de atormentar a
minha mente. Só de lembrar da delícia que foi ter aquele homem
lindo e viril me chupando, minha intimidade latejou.
Por que você não foi até o fim, Leo? Por quê? Que momento
mais impróprio para ter crise de consciência!
Eu poderia ter perdido a virgindade. Se sexo oral com ele foi
tão bom, quase enlouquecia só de pensar como seria o resto.
Mas por um lado ele tinha razão, talvez fosse mesmo melhor
fingirmos que nada aconteceu e voltarmos a ser como éramos
antes. Gostava muito de trabalhar em sua casa. Não ficava tão
longe da minha, como a de algumas patroas, era fácil de limpar, eu
tinha a companhia da dona Ébia para ir e voltar e ainda havia os
bônus de vê-lo sem camisa pelas manhãs e de ouvi-lo tocar nos
finais de tarde. Por mais curtos que fossem aqueles momentos que
compartilhávamos, eram sempre muito agradáveis.
Sentindo-me física e emocionalmente exausta, deixei o sono
me dominar e tirei um cochilo.
Acordei algum tempo depois com mamãe batendo de leve na
porta, chamando para almoçar. Mesmo sem muita fome, precisava
me alimentar. Então levantei e fui até a cozinha.

Passei o dia seguinte aérea. Foi difícil trabalhar e pior ainda


estudar. Por mais que me esforçasse, não conseguia parar de
pensar em Leonardo. Em seus beijos selvagens, suas mãos
ousadas e sua boca me dando prazer. Eu estava mesmo ferrada.
Como lidaria com aquilo?
No sábado de manhã, Érika foi me visitar.
— Que carinha é essa, migs? — perguntou, avaliando-me com
o cenho franzido, quando fomos para o meu quarto para podermos
conversar mais à vontade.
Tinha coisas que mamãe não precisava tomar conhecimento.
— Eu beijei o meu patrão — falei baixinho e fiz careta.
— O quê? — Seus olhos quase saltaram das órbitas e ela
ficou boquiaberta. — Como isso aconteceu? Desembucha tudo que
fiquei muito curiosa.
Contei a ela todo o episódio da chuva, desde ter chegado
encharcada na casa do Leonardo, até ele ter me emprestado suas
roupas e me visto nua.
— Uau! Estou cho-ca-da! Quando as coisas têm que
acontecer, o destino dá um jeitinho e o cupido não brinca em
serviço, não! — falou divertida e nós duas rimos. — Foi nessa hora
que rolou o beijo? Vocês transaram, Nane? Pelo amor de Deus me
conte, porque estou prestes a ter um troço aqui.
— Não. Eu quase morri de vergonha, daí ele saiu do quarto
para que me trocasse e disse que me aguardaria no andar de baixo.
Quando cheguei à sala de estar, ele estava tocando piano. Então
me serviu uma dose de licor, dizendo que ajudaria a me esquentar,
e me convidou para cantar a música que ele estava tocando antes,
Conversation in the dark, do John Legend.
— Ah, que romântico! Adoro essa música! E aí, o licor te
esquentou, hum, hum? — Kinha movimentou as sobrancelhas de
um jeito engraçado e esbarrou o ombro no meu.
Estávamos as duas sentadas em minha cama, com as pernas
cruzadas sobre o colchão.
— Bem, não foi exatamente o licor que me esquentou. —
Arregalei os olhos e ela sorriu, encarando-me em expectativa para
ouvir o restante da história. — Sei lá o que aconteceu. Em um
momento eu estava apoiada no piano, cantando enquanto ele
tocava, e no outro só o ouvi soltar um palavrão e se levantar, vindo
feito um predador em minha direção.
— Uhuul, adoro! Conte mais!
— Ele me prensou contra a madeira e tomou minha boca na
dele em um beijo selvagem.
— Caramba! Estou surtada, amiga. Ele tem mesmo cara de
quem tem pegada.
— Ô, e que pegada! Os beijos evoluíram para amassos
lascivos e quando Leo sussurrou em meu ouvido que queria me
foder, quase enlouqueci de tanta excitação.
— Ele disse isso mesmo? Com essas palavras? — Érika era a
empolgação personificada.
— Disse. Nessa hora ele já tinha me erguido do chão e me
sentado sobre o piano.
— E o que você falou?
— Bem, amiga, falei a verdade. Eu queria muito transar com
ele, mas antes Leonardo precisava saber que eu era virgem, né?
— Tem razão. Mas como ele reagiu? Vocês transaram ou não
transaram, porra? Não me mate de curiosidade.
— Primeiro, ele se afastou e disse que a informação mudava
tudo. Depois tentei convencê-lo, dizendo que eu queria muito aquilo.
Daí ele concordou e me levou para o quarto. Amiga, ele fez sexo
oral em mim e foi incrível!
— Aaahh! — Ela deixou escapar um gritinho.
— Só que, sei lá o que houve, de repente ele travou. Afastou-
se e ficou me olhando com seriedade, dizendo que era melhor
pararmos por ali.
— Não, não, não. Não pode ser!
— Se você reagiu assim, imagina eu, amiga! Fiquei arrasada,
sentindo-me humilhada.
— E como essa história termina? Como vocês ficaram depois
disso?
— Saí do quarto e desci as escadas chorando. Fui pra
lavanderia, pois só queria minhas roupas de volta para poder ir
embora. Ao mesmo tempo, tive muito medo de ele dispensar meu
serviço. Sabe como eu preciso da grana, né, Kinha?
— Sei, sim, migs. Mas e aí, ele foi atrás de você?
— Foi. Pediu desculpas dizendo que não teve intenção de me
magoar. Que gostava da minha companhia. Que fazia anos que não
deixava ninguém se aproximar. Foi bem fofo, na verdade.
— Nossa... E agora, como vocês vão ficar em relação ao que
rolou?
— Vamos tentar fingir que nada aconteceu e voltarmos a ser
como antes.
— Poxa, Nane... E como está seu coraçãozinho?
— Estou angustiada. Não consigo parar de pensar nele,
mesmo sabendo que não devo.
— Fique calma. Tenho certeza de que a história de vocês não
acabou ali, que na verdade, está só começando. Só de ele querer
continuar te tendo por perto, já é alguma coisa. Por tudo que já me
contou sobre ele, dá pra notar que é muito machucado pela morte
da esposa. Aposto que não foi até o fim, não porque você ainda é
virgem, mas porque deve ter tido medo de algum envolvimento
sentimental, tanto da sua parte por ele, quanto pelo contrário. O
coração dele ainda deve estar partido, amiga, e pior que isso, deve
estar lacrado, pra não deixar mais ninguém entrar.
— Já faz cinco anos que a esposa dele morreu. Será que esse
luto um dia passa?
— O cara parece estar se esforçando pra isso, né? Não crie
muitas expectativas, pra não ficar ansiosa e sofrendo à toa, mas
também não desista dele. Deixe acontecer. Continue agindo como
antes, sendo a amiga que ele precisa nesse momento. Acredito
mesmo que vocês ainda têm chance. Quem sabe uma reviravolta
ainda os aguarda mais à frente, ãnh?
— Ai, amiga, obrigada pelas palavras carinhosas. Te amo
tanto!
— Eu te amo mais.
Demos um abraço apertado e logo Érika se despediu, dizendo
que tinha muitas coisas para fazer naquele dia.
Depois que minha amiga saiu, criei uma playlist no aplicativo
de streaming, colocando nela as canções que já ouvira Leonardo
tocar, liguei a caixinha de som e fui faxinar minha casa. Mamãe me
ofereceu ajuda, mas recusei, dizendo a ela que fosse descansar.
Enquanto limpava e organizava tudo, um pensamento não saía
da minha mente:
Quem sabe um dia!
Onde eu estava com a minha cabeça? Essa pergunta não
parava de me atormentar, bem como imagens que vinham com ela.
Elaine vestida com meu moletom, apoiada no piano, cantando com
os olhos grudados em mim; ela entregue aos meus beijos famintos,
explorando meu corpo com as mãos inexperientes; eu com a
cabeça entre suas pernas, chupando-a com volúpia, perdido
naquele paraíso. A garota era tão... perfeita! Mas não seria justo
com ela levar até o final aquilo que começamos.
Elaine era uma menina inocente, sonhadora. Eu era quase dez
anos mais velho que ela e não tinha nada para lhe oferecer além de
momentos de prazer. Estava quebrado, fechado, na verdade, já nem
tinha um coração. Não havia espaço para mais ninguém em minha
vida.
Esquentei o almoço que dona Ébia deixara pronto na geladeira
no dia anterior e comi na sala de TV, assistindo a um telejornal.
Depois tirei um cochilo.
Quando acordei, assisti a alguns episódios de uma série de TV
que estava querendo ver fazia tempos. Achei que seria bom tirar o
dia de folga, mas acabei me sentindo entediado. No final da tarde,
imaginando que a praia deveria estar vazia, pois o tempo ficou
nublado o dia todo, vesti uma bermuda, camiseta regata, calcei
meus tênis e fui correr na orla. O vento que soprava meu rosto
estava um pouco frio, mas nem me importei. Precisava do exercício
físico para tentar acalmar a confusão dentro de mim.
Ela é gostosa pra caralho! Meu subconsciente não parava de
me lembrar daquilo.
— Mas não é pra mim! — resmunguei baixinho, aumentando o
ritmo da corrida.
O mar estava tão agitado quanto eu, mas de uma forma
contraditória, o barulho das ondas quebrando na praia me trazia
alívio.
Depois de correr por meia hora, voltei para casa, todo suado.
Encontrei meu irmão na portaria do prédio.
— Onde você tava, Bro? Fiquei preocupado. — Ele me olhava
sério. — Liguei no seu celular duas vezes e não atendeu. Como não
nos falamos hoje, achei melhor vir até aqui.
— Fui correr na praia.
— Caramba! Mesmo com um tempo feio desses? — Franziu o
cenho e balançou a cabeça em negativa, como se questionasse
minha sanidade mental.
— Estava precisando me exercitar. Vamos subir?
Marcelo concordou e foi comigo até a cobertura.
— Quer beber alguma coisa? — perguntei logo que entramos.
— Não, estou de boa. Aliás, mano, não acha que deveria
maneirar com essas suas doses de uísque? Beber todos os dias
não faz bem pra sua saúde.
— E falou o doutor! — retruquei irônico.
— Estou falando sério. Não ia querer ter uma cirrose. Pode
apostar!
— Senta aí. — Indiquei o sofá.
Marcelo se acomodou nele e sentei em uma poltrona à sua
frente.
— O que houve? Sua cara hoje não está das melhores.
— Fiz uma burrada. — Suspirei fundo e enfiei as mãos no
cabelo, recordando dos amassos em Elaine e do sexo oral que fiz
nela.
— E como conseguiu essa proeza enfurnado dentro de casa?
Ou foi na sua volta pela praia agora? — Ele ergueu o tronco para
frente, apoiou os cotovelos nas coxas e o queixo nas mãos unidas.
— Eu beijei a Elaine.
— A sua diarista? — Celo arregalou os olhos.
— A própria.
— Caralho, Leo, mas por que foi fazer isso? Com tanta mulher
no mundo, a própria Veruska doidinha pra ter uma chance com você
e beija a sua funcionária?
— Eu sinceramente nem sei como foi acontecer. Na verdade,
uma sucessão de fatos aleatórios me levou a perder a razão. —
Contei a ele como tudo se desenrolou desde que Elaine chegou de
manhã, toda molhada pela chuva, até a parte em que acabei com a
cabeça enfiada entre suas pernas.
— Você o quê? — Marcelo questionou, perplexo. — Não
acredito que fez sexo oral na garota que é virgem e depois ainda
falou pra ela que precisavam parar por ali. Porra, irmão, imagina
como a coitada deve ter se sentido rejeitada, humilhada, insegura
com a própria feminilidade?
— Eu não pensei por esse lado... — confessei fazendo careta,
preocupado em como o ocorrido poderia afetar a autoconfiança de
Elaine.
— Pois é! E agora só falta querer dispensar o trabalho dela.
— Eu não faria isso, sei o quanto ela e a mãe precisam do
dinheiro.
— É, conseguiu mesmo se meter em uma grande confusão! E
se a menina se apaixonar por você?
— Isso não vai acontecer.
— E se você se apaixonar por ela? Não estou sendo
preconceituoso, mas assumiria um relacionamento com a sua
diarista?
— Não diga bobagens. A classe social de uma pessoa, ou seu
trabalho, não definem quem ela é. Eu jamais me importaria com
uma coisa dessas! Mas sabe bem que meu coração morreu junto
com a Lília. Eu nunca mais vou amar de novo. Não tem espaço pra
outra mulher em minha vida.
— E sou eu que estou dizendo bobagens? Pelo amor de Deus,
Leo! Você dá um passo pra frente e outro pra trás. Dessa forma
nunca vai sair do lugar. É difícil ver o que faz consigo mesmo.
Precisa parar com essa autopunição. Você merece amar e ser
amado de novo.
— Não, irmão. Não mereço nada de bom nessa vida. Deveria
ter morrido no lugar da Li.
— Quanta merda, cacete! Pare com isso! Eu juro que não
aguento mais ouvir essas coisas. Você não merece se martirizar
assim. Foi um acidente, porra! Enfie isso na sua cabeça de uma vez
por todas. Quem é que teria conseguido manter o carro na estrada
no seu lugar? Um bicho atravessou na sua frente, estava dirigindo
dentro da velocidade permitida. Foi uma fatalidade. Infelizmente
desgraças assim acontecem todos os dias.
— Vai embora! Eu quero ficar sozinho.
— Está de brincadeira, né? — Ele riu sem humor e me fitou,
incrédulo.
— Por favor, Celo. Não tive um dia fácil. Quero ficar só.
— Está bem. Eu vou. Mas sabe que voltarei. Afastou-se de
todo mundo, mas eu nunca desistirei de você. Quer queira ou não.
Encarei-o, sem nada dizer, o vi levantar e deixar meu
apartamento.
Quando a porta bateu, fui até o bar, servi-me de uma dose
dupla de uísque, pouco me importando com o meu fígado. Em
seguida sentei ao piano e toquei a canção mais melancólica que
conhecia: Moonlight Sonata.
Terminei a música e bebi como se não houvesse amanhã,
porque era bem aquilo que eu desejava.

— Menino, o que houve? — Dona Ébia me acordou na manhã


seguinte. Eu havia adormecido no sofá.
— Estava afogando as mágoas e acabei pegando no sono
aqui.
— Meu Deus, Leo. Achei que essa fase já tinha passado.
Venha, levante-se! — Ela me estendeu a mão e me ajudou a
levantar. — Vá tomar um banho que farei um café forte pra te ajudar
a curar a ressaca.
— Minha cabeça parece que vai explodir.
— Levarei no quarto pra você daqui a pouco, com um
comprimido de aspirina.
Aquiesci e segui em direção as escadas. Minha boca estava
com um gosto horrível, a cabeça latejava e o corpo parecia pesar
uma tonelada.
Arrastei-me degraus acima e ao chegar à minha suíte, fui
direto para o banheiro e me enfiei debaixo de uma ducha morna.
— Pena que culpa e tristeza não matam — resmunguei,
enquanto me ensaboava.
Depois do banho, escovei os dentes, enrolei-me na toalha e fui
para o quarto.
Minha governanta bateu de leve na porta e entrou logo em
seguida.
— Aqui está, querido. — Dona Ébia me estendeu uma xícara
com café quente. No pires havia também um comprimido branco. —
É o analgésico. Tome tudo e deite um pouco, precisa descansar.
— Já tirei o dia de folga ontem, tenho que trabalhar hoje.
— Descanse pela manhã. Pode deixar que aviso seu irmão e
na hora do almoço venho te acordar. Duvido que seria capaz de
resolver qualquer coisa dos negócios do jeito que está agora.
— O pior é que tem razão — concordei, já que aquela era a
mais pura verdade.
— Estou vendo que a sua garrafa de água está vazia. Vou
enchê-la e trazer pra você.
— Obrigado.
Ela assentiu e deixou o quarto.
Sentei na cama, tomei o café, o comprimido e depois deitei,
enfiando-me debaixo do lençol. Precisava mesmo tentar dormir um
pouco para me recuperar. Poderia ser irresponsável comigo mesmo,
mas não com os negócios da minha família. Se a direção da Vida
Nóbile estava em minhas mãos, nas do Marcelo e do Álvaro, eu
sempre faria a minha parte, jamais os sobrecarregaria assim.
Não demorou para que dona Ébia retornasse com a garrafa de
água. Enchi um copo e tomei de uma vez. Depois deixei o sono me
dominar e apaguei.
Aquela manhã foi perdida, mas trabalhei a tarde toda, lutando
contra o mal-estar, reflexo da bebedeira da noite anterior, e também
com recordações libidinosas com a diarista. Como seria nosso
encontro na segunda-feira? Ela ainda estaria magoada comigo?
Teria pensado em mim tanto quanto pensei nela? As indagações
não cessavam.
Desde que Lília morrera, eu nunca tinha perdido o controle
assim com uma mulher. Só ela mexia comigo a ponto de me tirar o
juízo. No entanto havia algo em Elaine que eu não conseguia
ignorar. Aquele sorriso envergonhado, os olhos curiosos e a voz
melodiosa me fascinavam. Como se não bastasse, provei de seu
beijo intenso e do sabor de sua intimidade. Após saber o quanto era
gostosa, não seria fácil evitar de pensar em tê-la de novo nos meus
braços. Mesmo tendo consciência de que não deveria.
Ela não merece um homem como eu, um cara que já não tem
mais coração.
No domingo à tarde dona Ébia apareceu para uma visita e
acabou me contando que quando chegou para trabalhar na sexta,
encontrou o patrão dormindo no sofá e cheirando à bebida alcóolica.
— Foi muito triste vê-lo daquele jeito. Fazia tempos que
episódios assim não aconteciam — ela comentou após o relato,
fazendo meu coração se sobressaltar.
Será que eu tinha alguma coisa a ver com aquilo?
— A senhora faz ideia do que pode tê-lo deixado assim?
— Eu liguei para Marcelo a fim de avisar que Leo não
conseguiria trabalhar pela manhã e expliquei como o encontrei ao
chegar à cobertura. O irmão resmungou uns palavrões e disse que
não deveria ter discuto com ele. Talvez seja isso.
— Por tudo que contam, esse rapaz deve mesmo ser muito
sofrido — mamãe falou, olhando da amiga para mim e assenti,
engolindo em seco.
Ele era mesmo muito sofrido e cheio de traumas. Não
precisava de mais nada bagunçando sua cabeça atormentada. Era
melhor eu respeitar sua vontade de se sermos apenas amigos e
tentar controlar meu desejo, só assim nenhum de nós dois sairia
machucado.
Suspirei fundo, atraindo a atenção de dois pares de olhos
curiosos.
— Bem, meus amores, vou deixá-las à vontade conversando,
para aproveitar a tarde de folga e estudar um pouco.
Elas assentiram, sorridentes, e me desejaram bons estudos.
No entanto, já no quarto, li a mesma página do livro umas dez
vezes, sem conseguir me concentrar. Minha mente estava ocupada
pela imagem de Leonardo, por seus olhos tristes, por nossos beijos.
Como será que você está agora?
Queria tanto vê-lo e me certificar de que estava bem, que
chegava a sentir uma agonia no peito. Ele não merecia aquele
sofrimento todo. Mesmo não o conhecendo muito bem, não tinha a
menor dúvida de que era um homem bom.
Tive de meditar um pouco para esvaziar a mente. Só depois
disso é que consegui me dedicar aos estudos. No final das contas, a
tarde acabou sendo bem produtiva.

No dia seguinte, como de costume, peguei a condução para o


trabalho na companhia de dona Ébia. Contudo, de tão ansiosa para
rever Leonardo, não conseguia prestar atenção em nada do que
minha querida vizinha dizia. Para não a deixar intrigada com meu
comportamento, de vez em quando acenava com a cabeça,
concordando e esboçava um sorriso, sem fazer a menor ideia de
com o que eu estava concordando.
Ao chegarmos à cobertura, Leonardo se exercitava na sala.
Estava sem camisa e todo suado. Lindo de morrer, uma verdadeira
tentação! Engoli em seco diante à visão magnífica que ele me
proporcionava. Parecia bem, o que me deixou contente.
— Bom dia! — falou ao nos ver.
Retribuímos o cumprimento e logo ele informou que havia
terminado seu treino e que iria tomar banho antes de começar a
trabalhar. Despediu-se de nós e seguiu em direção às escadas.
— Que bom encontrá-lo se exercitando, como o habitual —
dona Ébia comentou, parecendo aliviada.
Concordei e a acompanhei até a cozinha. De lá segui para a
lavanderia, onde peguei o que precisava para começar a faxina.
Por mais que quisesse estar perto dele, passei o dia o
evitando. No final da tarde, quando começou a tocar piano,
conformei-me em ouvir de longe, não me atrevendo a me aproximar
da sala de estar. Uma confusão de sentimentos brigava dentro de
mim, deixando a cabeça zonza. Desejo, admiração, receio,
compaixão. Ele disse que gostava da minha companhia, que queria
que continuássemos a ser como antes, mas não estava sabendo
lidar com aquilo. Como olhar em seus olhos e não ansiar que eles
se incendiassem de novo ao me verem? Como não desejar que sua
boca selvagem tomasse outra vez a minha, sabendo tudo que ela
poderia me fazer sentir?
Estou tão ferrada!
Terminei meus afazeres o mais rápido que consegui e fui até a
cozinha aguardar por dona Ébia.
— Já acabou a faxina? — ela perguntou ao me ver organizar
as coisas na lavanderia e pegar minha bolsa.
— Já, sim. E a senhora?
— Eu também. Vou só avisar o patrão que estamos indo.
— Está bem. Vou o banheiro — inventei para fugir da situação
—, e aguardarei a senhora à porta.
Ela concordou, olhando-me desconfiada, e saiu.

Passei os dias tentando evitar pensar em Leonardo e na


quinta-feira, quando achei que conseguiria mais uma vez escapar
do nosso encontro no final da tarde, ele foi até onde eu estava.
— Oi... — cumprimentou esfregando a nuca, parecendo meio
sem jeito.
— Oi. O senhor precisa de alguma coisa?
— Já disse que não tem necessidade de me chamar assim. —
Franziu o cenho, analisando-me. — E não, não preciso de nada. Só
vim saber se já estava terminando seu serviço e convidá-la para me
fazer um pouco de companhia enquanto toco. Senti sua falta na
segunda.
Engoli em seco diante da confissão, sem saber bem ao certo o
que ele queria dizer com aquelas palavras.
— Terminei agora, mas acho que não deveríamos mais...
— Por favor, Elaine, não faça isso comigo. Gosto da sua
companhia.
Seu jeito sofrido me desarmou.
— Está bem. É sempre um prazer te ouvir tocar — concordei
por fim, mas talvez devesse ter escolhido outra forma de dizer
aquilo, porque a palavra prazer me trouxe recordações
impertinentes e pela forma como Leo me encarou e suas pupilas
dilataram, imaginei que teve o mesmo efeito nele. — Bem, hum-
hum, vou até a lavanderia deixar essas coisas e daqui a pouco te
encontro na sala de estar.
Ele concordou e saiu.
Ah, meu Pai! Suspirei fundo tentando me controlar e também
segui meu caminho.
Ajeitei as coisas na lavanderia, sob o olhar atento de dona
Ébia.
— Já terminou? — ela me questionou.
— Já. Vou fazer um pouco de companhia para o senhor
Leonardo, enquanto a senhora termina seus afazeres, está bem?
— Está certo, querida. Na verdade, estranhei por não ter feito
isso na segunda-feira. Aconteceu alguma coisa entre vocês dois na
minha ausência? Tive a impressão de que estava fugindo do patrão.
— Não! — Minha voz saiu um pouco esganiçada, o que só
chamou ainda mais a atenção dela, que estreitou as pálpebras me
avaliando. — Não aconteceu nada, imagina. Só achei que depois
do que a senhora contou, fosse melhor eu me manter longe.
— Leo precisa de amigos, de carinho. Se é só isso que existe
entre vocês, não se afaste dele, Nane.
Aquiesci, desconcertada, pedi licença e me retirei.
Quando apareci na sala, ele parou de tocar e me encarou com
uma feição insondável.
— Já estava achando que não viria.
— Desculpe se demorei. Estava conversando com dona Ébia.
— Quer que eu toque alguma coisa em especial? — ofereceu
tão gentil que aqueceu meu peito.
Notei que não havia nenhum copo de bebida sobre o
instrumento. Talvez aquilo fosse um bom sinal.
— Que tal aquela música clássica que tocou outro dia e achei
linda?
— Esta? — perguntou, após tocar um trechinho.
— Sim, ela mesma! — Bati palminhas leves, como uma
criança empolgada e ele esboçou outro sorriso.
— É linda mesmo! O nome dela é Fantasie in D minor K.397,
do Mozart.
— Por que as músicas clássicas têm esses nomes tão
complicados, com letras e números no final?
— É que além do “nome” — ele fez sinal de aspas com os
dedos —, o título pode ser composto a seguir pelo tipo de música,
por exemplo: sonata, ópera, sinfonia, etc, depois pelo instrumento
para o qual ela foi escrita, e ainda pela tonalidade, como no caso
dessa: dó menor. O número no final é para especificar qual a
canção de um tipo específico, porque geralmente os compositores
compunham várias. Ainda pode haver letras antes dos números.
Quando encontramos a abreviação Op., que vem da palavra Opus
em latim, que quer dizer: obra, significa que a catalogação foi feita
pelo próprio compositor. Quando isso não aconteceu por ele em
vida, mas por algum estudioso do assunto, a letra que encontramos
antes do número é a sigla do catálogo ou do catalogador. Nessa
canção do Mozart, a letra K é de Köchel, um catálogo alemão.
— Uau! Muito interessante tudo isso. Você entende mesmo do
assunto.
— Comecei a fazer aulas de piano ainda na infância. Sou
apaixonado por música!
— É um dom lindo que você tem.
— Bobagem, qualquer um pode aprender a tocar.
— Até acredito que sim, mas não dessa forma. Acho que quem
têm dom pra alguma coisa, aprende com mais facilidade e coloca
sua alma no que faz. Sinto isso de você quando te vejo e te ouço
tocar.
Ele meneou a cabeça, parecendo envergonhado pelo elogio, o
que achei fofo.
— Vou tocar então: Fantasie in D minor K.397, do Mozart —
anunciou em tom solene e eu sorri, toda derretida por ele.
Era difícil demais não me encantar por Leonardo. Ele era tão
fascinante! Seu lado sombrio, tão nítido no olhar triste, ao invés de
me afastar, atraía-me ainda mais. Quando me dei conta, estava
apoiada ao piano, bem perto dele.
O patrão me pegou suspirando e, nesse momento, fitou-me
com seriedade.
Merda!
Engoli em seco e arregalei os olhos, receosa.
— Porra, Elaine! Juro que estou tentando me controlar, mas
desse jeito fica difícil. — Levantou-se e em um instante estava de pé
ao meu lado.
Minha pulsação acelerou e a respiração ficou difícil.
— D-desculpe — gaguejei, sentindo seu calor e o cheiro
másculo.
Cada célula do meu corpo se agitou.
Parecendo um predador, Leonardo passou a mão por minha
nuca e colou sua boca na minha, beijando-me com urgência e
lascívia.
Agarrei-me a ele, desorientada e retribuí com a mesma
intensidade. Minha intimidade latejou com as memórias da sua boca
também ali.
— Caralho, pequena! — Ofegou quando nossos lábios se
desgrudaram e se afastou de mim.
Atormentado, andou de um lado para outro à minha frente,
com as mãos afundadas no cabelo.
— Desculpe meu descontrole. Prometo que não vai acontecer
de novo — disse por fim, quando conseguiu se aquietar um pouco.
— T-tudo bem. Eu quis isso tanto quanto você. Também foi
culpa minha.
— Vamos só esquecer, ok?
Anuí, segurando a vontade de chorar. Se ele me queria tanto
quanto eu o desejava, por que não se permitia? Era sua dor e
aquela culpa absurda que o impediam, ou era eu o problema? Por
ser virgem? Sua diarista?
Preciso tirar esse cara da cabeça! Fechei os olhos e respirei
fundo, tentando me recompor.
— Eu que peço perdão, Leonardo. Prometo que vou respeitar
sua vontade e manter uma distância segura entre nós. — Meu
queixo tremeu e a voz saiu embargada, enquanto eu continuava na
batalha contra o choro.
— Ah, não... Te magoei de novo, não foi? — Estreitou nossa
distância e me envolveu em seus braços fortes, de forma afetuosa.
— Sou mesmo um ogro fodido. Nunca pense que o problema é
você, está bem? Te acho perfeita, linda, esforçada, interessante e
gostosa pra caralho.
Ainda agarrada a ele, deixei um riso sem humor escapar.
— Você não é nenhum ogro fodido, apenas um cara
machucado. Se deixar, posso te ajudar a curar suas feridas. — As
palavras simplesmente escapuliram.
Ele me afastou com gentileza e me encarou.
— Você merece coisa muito melhor que eu.
— Discordo. Ninguém poderia ser melhor que você —
retruquei, tomada de uma ousadia que nem sabia de onde vinha.
— Ah, Elaine... — Afundou outra vez as mãos no cabelo,
deixando-o uma desordem. — Juro que queria poder te dar o que
merece. Mas não posso oferecer o que não tenho.
— Que bobagem é essa? O que você acha que não tem,
Leonardo? — Esforcei muito para não me exaltar e acabar atraindo
a atenção de dona Ébia.
— Um coração — disse aquilo com o semblante tão sofrido e
derrotado, que senti uma pontada na boca do estômago.
— Não diga isso. — Tentei me aproximar, mas ele se afastou.
— É melhor você ir agora.
Neguei com a cabeça, incrédula. Vendo que eu não me movia,
ele pediu licença e se retirou em direção as escadas.
O que eu faço agora com tudo que estou sentindo, meu Deus?
Fui para a suíte e, já no banheiro, enfiei-me debaixo de uma
ducha fria para acalmar os ânimos.
— Por que essa garota mexe tanto comigo? — resmunguei,
irritado com a minha falta de controle.
Precisava ficar longe dela. Eu era um cara fodido, sem
coração, e Elaine não merecia que eu bagunçasse sua vida. Já
sofrera demais e com a melhora da mãe, estava tentando
reencontrar seu caminho. Não podia estragar isso desviando sua
atenção de seus objetivos mais importantes. Não tinha nada para
oferecer. Seria só sexo e por mais que na primeira vez que nos
beijamos ela tenha dito que não se importava, bastava encará-la
para saber que não era verdade. Elaine era sonhadora e me olhava
com ternura e profundidade, como se conseguisse ver até a minha
alma destruída. Acabaria desejando mais de nós. Poderia se
apaixonar e infelizmente não seria correspondida.
Que porra de tesão maldito pela pessoa errada!
Depois de longos minutos procurando me acalmar, enfim saí
do chuveiro um pouco mais tranquilo. Enrolado na toalha, fui para o
quarto e me atirei na cama, fitando o teto.
— Leo, já terminei por hoje. — Ouvi a voz de dona Ébia, após
uma leve batidinha na porta.
— Pode ir, querida. Até amanhã — respondi alto, para que ela
me escutasse.
Ouvi os passos se afastando pelo corredor e aguardei um
tempo. Não queria deixar o quarto correndo o risco de ainda
encontrar a diarista no andar de baixo.
Quando achei que tinha esperado o suficiente, levantei, vesti
uma bermuda e desci.
Fui até o bar, peguei a garrafa de uísque e fiquei encarando-a.
Por sorte, eu ainda conseguia ter domínio sobre a bebida. Apesar
da vontade enorme de virar uma dose dupla, consegui me controlar.
Marcelo tinha razão, era melhor eu maneirar a ingestão de álcool,
antes que me tornasse um alcóolatra e tivesse uma cirrose, ou algo
pior. Não que eu me importasse muito em continuar vivendo ou
morrer, mas não precisava dar trabalho e desgosto para minha
família.
Inferno!
Sentei no sofá, peguei meu celular e liguei para meus pais.
Sentia saudades deles, mas ficava feliz por saber que estavam
levando uma vida mais sossegada. Depois de tantos anos de
trabalho duro dedicados à Vida Nóbile, eles mereciam descanso.
— Oi, filho — mamãe atendeu com a voz doce. — Como você
está?
— Bem. Levando. E como vão as coisas por aí, com a senhora
e o pai?
— Tudo certo e tranquilo. Você é que me preocupa, querido.
Falei com Marcelo ontem e ele me contou que tiveram uma
discussão recente. Não gosto quando se desentendem.
— Não fique preocupada à toa. Foi besteira de irmãos. Eu só
estava tendo um dia ruim e descontei nele. Preciso mesmo ligar pra
me desculpar.
— Faça isso, querido. Marcelo só quer o seu bem, assim como
nós.
— Eu sei. — Suspirei fundo. — O pai está por aí? — Achei
melhor mudar o rumo da conversa.
— Está tomando banho.
— Outra hora eu ligo pra falar com ele, então. Diga que
mandei um abraço.
— Digo sim. Te amamos, filho. Sabe que qualquer coisa que
precisar pode contar com a gente.
— Eu sei. E eu também amo vocês.
Despedimo-nos e encerrei a chamada.
Querendo resolver a desavença com meu irmão, mandei uma
mensagem, pedindo desculpas pelo meu comportamento na última
vez que nos vimos e por tê-lo mandado embora.
Não demorou para que Marcelo respondesse, dizendo que
estava tudo bem e perguntando se eu queria comer pizza e
conversar um pouco.
Concordei e cerca de uma hora depois, ele tocava meu
interfone.
— E aí, Bro? — cumprimentou, sorridente, logo que abri a
porta, espalmando a mão desocupada na minha.
— Hum, o cheiro disso aí está bom, hein? — Apontei para a
caixa que ele carregava. — De que sabor é?
— A moda da casa. — Arregalou os olhos.
— A nossa preferida! — falamos juntos e acabei esboçando
um sorriso.
Era bom perceber que realmente estava tudo bem entre nós.
Entramos e fomos até a cozinha. Lavamos as mãos e cada um
se serviu de dois pedaços e de um copo de suco de uva.
— Como foi na clínica hoje? — perguntei, ao nos
acomodarmos nas banquetas de frente para o balcão.
— Puxado. Hoje a agenda estava lotada.
— Está com cara de cansado. — Observei suas olheiras, o
cabelo bagunçado e o semblante abatido.
— Preciso mesmo descansar. Vou programar umas mini-férias
de uma semana. Estou pensando em levar a gata pra Búzios.
— Ainda está ficando com a Scarllat?
— Tô, cara. Mas não pense que é namoro. Estamos ficando
sem compromisso, tem sido bacana e prazeroso.
— Fico feliz por você.
— Ah, por falar nela, sábado vamos a um barzinho legal na
Lapa. Bora ir com a gente?
— Já vai querer empurrar a Veruska pra cima de mim de
novo?
— Dê uma chance pra garota, mano. Além de gostosona, ela é
gente boa e você sabe bem que está louquinha pra se enfiar na sua
cama.
— Tá maluco se acha que vou transar com ela! A loira tem
cara de quem depois gruda no pé que nem chiclete.
— Bom, Veruska vai com a Scarllat, mas você não é obrigado
a ficar com ela. A noite de sábado não foi feita pra ninguém se
enfurnar sozinho dentro de casa.
— Está bem, vou com vocês. Estou mesmo precisando
espairecer.
— Ainda pensando na diarista? — Ele me avaliou, cauteloso.
— Não sei o que está acontecendo comigo, Celo. Tenho plena
consciência de que eu nunca seria o que Elaine espera de um
homem, mas mesmo assim, não consigo parar de pensar nela e
hoje fiz outra besteira.
— Não vai me dizer que a beijou de novo!
— Beijei. Convidei-a pra me fazer companhia enquanto tocava
piano. Ela ficou lá me olhando com aqueles olhos doces e acabei
perdendo a cabeça. Quando dei por mim, tinha levantado e estava
com a boca grudada na dela.
— Caralho, irmão! Ou para de vez com isso, ou assume que
está interessado nela e a peça em namoro.
— Eu nunca mais vou namorar, nem vou amar outra mulher.
Sabe bem.
— Não quero discutir com você, ok? Mas não fique repetindo
essas coisas, meu irmão. Você continua vivo, precisa se dar uma
chance de seguir em frente.
Respirei fundo, balançando a cabeça em negativa.
— Enfim, um passo de cada vez. Vamos sair no sábado pra
você se distrair um pouco e colocar os pensamentos em ordem.
Depois avalia melhor seus sentimentos pela diarista.
Assenti e, em um silêncio confortável, comemos nossos
pedaços de pizza.

No sábado, como combinado, fui com meu irmão ao tal bar na


Lapa. Apesar do barulho um pouco excessivo para o meu gosto, o
lugar era agradável, a cerveja bem gelada e a comida muito boa.
Veruska, que estava sentada ao meu lado, logo começou a
jogar o seu charme, deixando bem claras as suas intenções comigo.
Ao contrário de antes, daquela vez não a achei tão fútil e irritante. A
conversa fluiu e de repente comecei a pensar que ficar com ela
poderia não ser tão desastroso. Além do mais, precisava tirar Elaine
da minha cabeça e talvez Veruska fosse a distração ideal para
conseguir isso.
Por volta das onze da noite, avisei que estava indo embora.
— Gostaria de um pouco de companhia? — a Loira perguntou
baixinho.
— Seria ótimo.
Ela sorriu e, maliciosa, umedeceu os lábios com a língua.
Ao voltar minha atenção para Marcelo, vi que ele observava a
cena que acabara de se desenrolar à sua frente. Nitidamente
satisfeito, assentiu em concordância.
Eu e Veruska despedimos dele e de Scarllat e deixamos o bar,
caminhando lado a lado até o meu carro.
Destravei o alarme e as porta, abrindo a do passageiro para
que ela entrasse.
— Que cavalheiro! — A moça passou a mão por meu peito,
provocante, e então se acomodou no confortável banco de couro.
No trajeto até à Barra, seguimos conversando amenidades.
Ao chegarmos à minha cobertura, levei-a para a sala de estar.
— Aceita uma bebida? — ofereci, enquanto ela observava ao
redor.
— Já bebi demais por hoje, mas um pouco de vinho seria bem-
vindo agora.
— Perfeito. — Fui ao bar e servi duas taças até a metade.
Também não estava a fim de exagerar na bebida.
— Você toca piano? — ela questionou ao olhar para o
imponente instrumento à sua frente.
— Sim. — Entreguei uma taça para ela.
— Ah, que chique! — Arregalou os olhos, entusiasmada. —
Toca pra mim?
— Agora não, gata. Podemos aproveitar nosso tempo juntos
de maneiras mais interessantes, não acha? — Estreitei ainda mais
nossa distância e tomei um gole do líquido rubro. Era Malbec, um
dos meus preferidos.
— Com toda a certeza, gostosão! Nem imagina o quanto
esperei por esse momento. — Ela também tomou da sua bebida e
em seguida se aproximou, quase colando nossos lábios.
— Melhor deixarmos isso aqui pra evitarmos um acidente. —
Coloquei as duas taças sobre o piano e então a beijei com
selvageria.
Meu corpo logo se acendeu. Esfreguei minha ereção contra o
quadril dela e a garota agarrou minha bunda com as duas mãos,
exigindo mais do nosso contato.
— Vamos para o quarto que estou louco pra me enterrar em
você — falei quando nossos lábios se desgrudaram.
— Uau, é assim que eu gosto! — respondeu resfolegante e me
acompanhou até o andar de cima.
Segui com ela para o quarto de visitas. Era para lá que levava
as garotas com quem transava. Não me sentia à vontade para fazer
isso na cama que fora de Lília.
Despimo-nos afoitos, então a loira se ajoelhou à minha frente e
agarrou meu pau ereto, que latejou em sua mão. Lambeu todo o
comprimento e depois abocanhou o quanto conseguiu, chupando-
me com a habilidade de uma profissional.
Rosnei, desorientado. Agarrei seu cabelo e comecei a
movimentar o quadril de encontro a ela, fodendo sua boca deliciosa
sem piedade.
Quando estava prestes a gozar, impedi que ela continuasse.
— Assim vai acabar cedo com a brincadeira, gata. Melhor ir
com calma! — Puxei-a para cima, beijei-a e a levei até o colchão.
Foi minha vez de fazer sexo oral nela, no entanto, enquanto a
chupava, era em Elaine que pensava.
Aquilo parecia um pesadelo. Tentei tirar da mente a visão da
minha diarista, mas eram seus gemidos que eu ouvia. O rosto
ruborizado e o sorriso lindo que deu quando alcançou o clímax,
preencheram as minhas recordações.
— Ah, que delícia, gostosão! Não para, assim, ah, eu vou
gozar! Aaaahhh! — A loira escandalosa me despertou do transe.
— Caralho! — resmunguei atormentado.
— Isso mesmo, lindão, quero seu caralho bem dentro de mim.
Vem, me fode gostoso! — Veruska me puxou para si.
— Só um instante. — Ainda perturbado, fui até à mesinha de
cabeceira e peguei um preservativo. Coloquei a proteção e me
enterrei na beldade que estava tão louca por aquilo quanto eu.
Com ela por baixo, eu tinha controle da situação. Apoiei suas
pernas no meu peito e agarrei os fartos seios siliconados, enquanto
estocava cada vez mais forte e rápido.
Perdido numa névoa de prazer, outra vez a imagem de Elaine
povoou a minha imaginação. Lembrei do seu corpo nu, quando
deixou a toalha cair sem querer e de como ficou petrificada pelo
pânico, vergonha, timidez, sei lá. Do seu semblante doce todas as
vezes que me ouviu tocar, das nossas conversas, dos beijos
quentes. Era com ela que queria estar transando.
Mas eu não posso! Briguei com meus pensamentos o que me
deixou ainda mais raivoso e me fez investir com mais vigor contra a
garota debaixo de mim.
Olhar para Veruska e ver Elaine, duas mulheres tão diferentes,
chegava a ser assustador.
Afastei, resfolegante e murmurando palavrões.
— Fique de quatro — ordenei e ela obedeceu de bom grado.
Dei um tapa no seu traseiro maravilhoso e a garota soltou um
gritinho.
— Gosto de homem assim com essa pegada forte e bruta.
Bate outra vez!
Fiz o que ela desejava e a penetrei de novo. Fodi a coitada
como um selvagem, mas ela parecia mesmo gostar. Quando gozou,
eu ainda queria mais, então continuei, até que meu corpo todo
retesou e alcancei o clímax também.
— Uau! Você foi perfeito! — falou ao me retirar de seu interior
e sentou de frente para mim.
— Foi uma foda ótima! Que bom que ficou satisfeita. — Retirei
o preservativo, dei um nó e o joguei no lixo próximo à cama. — Se
quiser tomar uma ducha, tem toalhas limpas no banheiro. —
Indiquei a porta e seu olhar acompanhou meu dedo.
— Não quer tomar banho também? — Ergueu uma
sobrancelha, provocante.
— Vou fazer isso na minha suíte.
— Este não é o seu quarto? — Ela me encarou com o cenho
franzido, confusa.
— Não. Fique à vontade. — Levantei, peguei minhas roupas
caídas no chão e saí.
Depois de uma chuveirada rápida, vesti uma bermuda e
retornei ao quarto de hóspedes, onde Veruska estava.
Bati de leve na porta e a ouvir dizer de lá de dentro que eu
poderia entrar. Quando a abri, a loira já colocava sua roupa.
— Vou chamar um carro pelo aplicativo pra te levar em casa.
— Obrigada. Eu realmente gostei da noite, Leonardo. Seria
ótimo se nos víssemos de novo, não acha? — Fitou-me,
esperançosa.
Querendo não ser rude, esbocei um sorriso e fiz um discreto
aceno com a cabeça.
— Seu motorista chegará em cinco minutos, em um Pálio
prata. Anota a placa aí. — Ela pegou o celular e eu ditei as letras e
números. — A corrida já está paga, ok?
— Obrigada pela gentileza. Salva meu telefone, para o caso de
querer me ligar.
Era por esse tipo de coisa que eu preferia contratar uma
profissional. Não precisava lidar com conversinhas pós-sexo, nem
fingir que ligaria depois, quando isso nem me passava pela cabeça.
Por uma questão de educação, anotei o número que ela
informou.
Veruska se aproximou, deu-me um beijo de língua, rápido, mas
quente, então a acompanhei até o andar de baixo, levando-a até a
porta.
Assim que ela saiu, girei a chave e voltei para a sala de estar.
O isolamento acústico da minha cobertura me permitia tocar a
qualquer hora, sem incomodar os vizinhos. Então, precisando aliviar
uma angústia esquisita que apertava meu peito, sentei ao piano e
comecei a tocar o meu repertório mais melancólico. Só que, de
repente, uma outra música me veio à mente: Conversations in the
dark. E com ela, as lembranças de Elaine.
Cansado de lutar contra meu subconsciente, rendi-me a ele e
toquei aquela canção do John Legend que minha diarista tanto
gostava.
Na segunda-feira, quando me preparava para ir trabalhar,
encontrei minha mãe com o semblante apreensivo na cozinha. Além
da preocupação evidente, ela também parecia cansada.
— O que foi, mãezinha? Não está se sentindo bem? —
Aproximei-me para beijá-la e quando senti a alta temperatura da sua
testa, meu coração disparou. — A senhora está com febre.
— Eu sei... — O queixo dela tremeu e seus olhos marejaram.
Ela estava com tanto medo quanto eu.
— Já colocou o termômetro? — Segurei firme em suas mãos,
tentando passar uma força que na verdade eu não tinha. A
possibilidade de uma nova recidiva do linfoma estava me deixando
arrasada.
— Acabei de medir a temperatura, deu 38ºC.
— Tomou um antitérmico?
— Sim, dipirona.
— Certo. Então vamos ao pronto-socorro. A senhora precisa
ser avaliada e fazer exames. Notou alguma íngua pelo corpo?
Ela negou com a cabeça, abatida. De repente parecia ter
envelhecido uns dez anos.
— Não fique assim, dona Cirlleni! Não há de ser nada. —
Puxei-a para um abraço apertado e foi minha vez de lutar contra as
lágrimas. — Vou ligar pra dona Ébia avisando que faltarei ao
serviço.
— Eu posso ir ao hospital sozinha, filha, não quero te
prejudicar mais do que já prejudiquei — falou ao se afastar um
pouquinho para me olhar.
— Não diga bobagens, mamãe, a senhora é e sempre será
minha prioridade. Somos nós duas contra o mundo, não é mesmo?
Ela esboçou um sorriso fraco e aquiesceu.
— Então vou trocar de roupa e pegar minha bolsa enquanto
você toma seu café da manhã e avisa a Ébia.
— Está bem.
Bebi um copo de leite com café e comi um pão com manteiga,
depois liguei para nossa querida vizinha, que me disse para ficar
tranquila que ela avisaria o patrão e que ficaria rezando a Deus para
que a febre da mamãe fosse por qualquer outro motivo sem muita
importância.
Encerrei a ligação e respirei fundo, tentando espantar o medo.
Assim que mamãe apareceu na sala, pedi um carro pelo
aplicativo para nos levar até a UPA mais próxima.
Diferente de dona Ébia, nós não tínhamos plano de saúde e
todo tratamento de mamãe fora feito pela rede pública.
Depois de mais ou menos uma hora que havíamos chegado ao
local, ela foi atendida. Não conhecíamos o plantonista do dia, mas
ele escutou com atenção e paciência todo o relato da doença da
mamãe.
— E já está em remissão há quanto tempo? — ele perguntou,
enquanto fazia anotações no computador.
— Há dois anos — eu e ela respondemos juntas.
— Certo. Deite ali na maca que vou examiná-la, dona Cirlleni.
Minha mãe fez o que o jovem doutor pediu.
Ele ouviu o coração, os pulmões, depois inspecionou o
pescoço, axilas e virilhas, em busca de linfonodos aumentados. Nós
duas já conhecíamos bem aquela rotina.
— Pode descer e sentar de novo na cadeira — falou assim que
terminou a avaliação e a ajudou a sair da maca. — Não encontrei
nenhum sinal de alerta para uma possível recidiva do linfoma, mas é
claro que a febre por si só nos preocupa. No entanto ela pode ser
por vários outros motivos. Pedirei um RX do tórax, exames de
sangue e de urina. Vou deixá-la em observação aqui na unidade até
que eles fiquem prontos, ok?
— Está bem, doutor, muito obrigada — mamãe agradeceu e eu
assenti em concordância.
Deixamos o consultório e fomos para uma sala de espera para
os exames. Uma enfermeira entregou um coletor de urina e indicou
o banheiro. Logo que mamãe voltou, foi chamada para o RX e em
seguida colheram seu sangue.
— Agora é só aguardarmos. Tenho fé em Deus que não vai ser
nada grave, mãezinha.
Ela anuiu e afagou meu rosto. Onde estávamos havia uma TV
ligada e um programa chamou a atenção de mamãe, o que achei
ótimo, pelo menos assim ela se distraía um pouco.
Peguei meu celular para conferir as horas e vi que tinha uma
mensagem de um número desconhecido.
Bom dia, Elaine. Sou o Leonardo. Dona Ébia me contou
sobre sua mãe e fiquei preocupado com vocês, então tomei a
liberdade de pedir seu número, espero que não se importe.
Estão precisando de alguma coisa? Por conta da Vida Nóbile,
tenho contato direto dentro de vários hospitais na cidade,
posso providenciar atendimento pra sua mãe e até uma
ambulância pra buscar vocês, se for preciso.

Fiquei surpresa com aquela mensagem, já que na última vez


que nos encontramos ele me beijou e depois me mandou embora.
Apesar de chateada com seu comportamento, sabia que ele era um
cara complicado. Então tentei relevar e ver o lado bom da coisa: ele
estava preocupado comigo.

Oi, Leo! Muito obrigada pela oferta gentil e generosa. Mamãe


já foi atendida, estamos aguardando os exames ficarem prontos.
Apesar da aflição, por enquanto não estamos precisando de nada.
Assim que eu tiver mais novidades, te informo.

Estarei aqui para o que precisarem. Fiquem bem!


Ele respondeu, encerrando a conversa, sem mencionar o
ocorrido entre nós na quinta. Se eu esperava um pedido de
desculpas, não poderia estar mais errada.

Tentei não ficar pensando naquelas coisas, já tinha


preocupações demais enchendo minha cabeça.
Duas longas horas depois, mamãe foi chamada para
reavaliação.
— Dona Cirlleni, a senhora está com uma infecção leve de
urina. Todos os outros exames vieram normais. Podem ficar
tranquilas.
— Graças a Deus! — nós duas falamos em coro. As palavras
do médico trouxeram um alívio imediato para nossa angústia.
— Vou prescrever um antibiótico oral, que deverá tomar duas
vezes por dia, durante sete dias. Oriento também que beba bastante
líquido e se estiver se sentindo indisposta, faça repouso. Caso a
febre persista por mais de três dias, precisará ser reavaliada, ok?
— Está certo, doutor. Muito obrigada. — Ela sorriu, ao pegar a
receita, e ele se despediu de nós.
Caminhamos até a farmácia mais próxima para já comprarmos
o remédio e por mais que mamãe tenha insistido em que
voltássemos de ônibus para casa, pedi outro carro pelo aplicativo,
para nos levar.

Quando chegamos, enquanto ela tomava banho, fiz macarrão


para nós duas. Mamãe ingeriu o antibiótico, com um pouco de suco,
almoçou e foi deitar.
Lavei a louça, tomei uma chuveirada e também fui para o meu
quarto. Por mais que quisesse estudar, o abalo emocional de mais
cedo me deixou esgotada. Então deitei na cama com o celular nas
mãos. Queria contar para dona Ébia e Leonardo sobre os resultados
dos exames.
Primeiro mandei mensagem para ela, que logo respondeu
dizendo que estava feliz por saber e que nos faria uma visita no final
do dia.
Depois mandei uma mensagem para Leo. Ele também
respondeu na mesma hora e disse que aquela era uma ótima
notícia. Foi sucinto e despediu-se com um “Nos vemos na quinta. Se
precisarem de qualquer coisa, é só falar.”
Apesar da saudade, não sabia como seria reencontrá-lo.
Estava cada vez mais difícil ficar em sua presença e não o desejar.
Pior ainda era ver que ele queria o mesmo, mas me rejeitava.
Suspirei e me agarrei nas almofadas. Não demorou para que o
sono me dominasse.

Acordei duas horas depois. Levantei para ir até a cozinha


tomar água e vi que a porta do quarto de mamãe ainda estava
fechada. Sem querer incomodá-la, evitei fazer barulho e logo voltei
para o meu. Com a disposição renovada, aproveitei para estudar.
Quando mamãe enfim acordou, mais de uma hora depois que
eu, fizemos um lanche juntas. Ela parecia bem melhor do que
estava pela manhã, o que era ótimo.
No finalzinho da tarde, conforme prometido, dona Ébia nos
visitou. Ela e mamãe se abraçaram como se não se vissem há muito
tempo. A amiga a encheu de perguntas e falou que estava muito
feliz por a febre não ter nada a ver com uma possível recidiva do
linfoma. As duas conversaram muito e antes da nossa vizinha ir
embora, ela me disse que na quinta-feira precisaria retornar ao
médico para mostrar os exames que fizera, mas que como a
consulta era à tarde, trabalharia até o horário do almoço.
— Você pode arrumar o café e levar no escritório para o
patrão, por volta das quatro? — ela me perguntou, pousando a mão
sobre a minha
— Claro. Vá tranquila que eu cuido do que for preciso.
Satisfeita, ela se despediu de nós e foi embora.

À noite, Érika me ligou para saber como fora meu dia de


trabalho na casa do Leonardo. Contei para minha amiga o que tinha
acontecido com mamãe.
— Nossa, Nane, imagino o quanto devam ter ficado
assustadas. Mas graças a Deus não foi nada grave.
— Juro que tudo que eu mais queria é que os próximos anos
passassem rápido, só para completar os cinco sem a doença e ela
ser considerada curada.
— Isso vai acontecer, migs. Pensamento positivo: tia Cirlleni já
está curada! Repita isso todos os dias. As palavras têm poder.
— Às vezes é difícil lidar com o medo. É como se o linfoma
fosse um fantasma nos espiando, prestes a voltar a nos assombrar
a qualquer momento.
— Sei o quanto foi duro tudo pelo que passaram, mas não
repita mais uma coisa dessas, amiga. Jogue só boas vibrações para
o Universo.
— Tem razão, Kinha. — Suspirei e balancei a cabeça, tentando
espantar as recordações da época em que mamãe esteve doente.
— E você, como está?
— Estou ótima! Aliás, sabe quem vi hoje?
— Não faço a mínima ideia.
— Seu cunhado.
— E eu lá tenho isso? Endoideceu, mulher?
— Está bem, não me expressei direito: seu futuro cunhado. O
irmão do seu patrão gostosão. Ele esteve lá no hospital para avaliar
um paciente. Na hora que o vi, tive a impressão que o conhecia,
mas não recordava de onde. Demorou um pouquinho para lembrar
que era o cara que estava ao lado do seu boy no bar e que você
disse que era o irmão dele. Menina, o doutor também é bem gato,
viu? Benza a Deus, que genética boa a dessa família!
— Palhaça! — Nós duas começamos a rir ao telefone.
— Oh, vou desligar agora, se não nos falarmos antes de
quinta, desejo que as coisas entre você e o tal Leonardo Nóbile se
ajeitem e que de preferência esquentem!
— Maluca!
— Falei sério. Beijos e boa sorte, migs. E não se esqueça:
pensamento positivo sempre!
Desligamos e fiquei pensando sobre aquilo. Será mesmo que
se eu enviasse muitas boas vibrações para o Universo, Leonardo
seria capaz de abrir seu coração e me deixar entrar? Se aquilo era
pedir demais, poderia pelo menos me deixar usufruir do seu corpo
gostoso.
Só de lembrar dos beijos lascivos que demos, de suas mãos
passeando por mim e sua cabeça enfiada entre minhas pernas,
levando-me ao céu, fiquei toda agitada.
Que ele queira transar comigo. Que Leonardo me leve pra
cama e vá até o fim. Que eu perca minha virgindade com aquele
deus grego. Mentalizei as frases, de olhos fechados, inspirando e
expirando.
— Está aí, Universo! Agora, por favor, faça a sua mágica
acontecer!
Fiquei me sentindo um verdadeiro idiota por ter tratado Elaine
mal na última vez que nos vimos, ainda mais quando soube que na
segunda-feira precisou ir a um pronto-atendimento médico com a
mãe. A garota já carregava tantas angústias e eu só estava
piorando as coisas para o seu lado.
Nós dois estávamos atraídos um pelo outro, era claro, mas
para mim a questão seria facilmente resolvida com uma foda
selvagem, só que para ela... a garota queria transar e perder a
virgindade, mas como lidaria com isso depois?
Passei os dias tentando não pensar nela, na sua boca gostosa
e no maldito desejo que me consumia, contudo, quanto mais eu me
esforçava, mais as lembranças se tornavam nítidas em minha mente
atormentada.
Na quarta-feira, no final do dia meu irmão passou para me
visitar.
— Que cara é essa? — ele perguntou logo que abri a porta.
— A minha de sempre — respondi sem paciência e nós dois
caminhamos até a sala.
— Quer um café expresso? — perguntei quando ele sentou no
sofá.
— Aceito sim e preciso acrescentar que estou feliz por não o
encontrar bebendo uísque.
— Tô maneirando no álcool. — Fui até a cafeteira elétrica que
pedi a minha governanta para deixar no bar e fiz duas xícaras de
expresso para nós dois.
Entreguei a dele e me acomodei na poltrona à sua frente.
— Tem notícias da mãe da sua diarista?
— Dona Ébia disse que ela não teve mais febre.
— Que ótimo! Isso é um bom sinal.
— Estou pensando em fazer um plano de saúde pra elas.
Muito complicado depender só do SUS.
— Tem razão, mano. Te dou total apoio quanto a isso.
— Na verdade, eu já até imprimi uma proposta, com uma boa
cobertura e sem coparticipação. Amanhã quero mostrar pra Elaine.
Espero que ela e a mãe aceitem a oferta. Depois só vou precisar
dos documentos das duas e as assinaturas.
— Um gesto muito nobre da sua parte.
Fiz um discreto aceno em concordância ao elogio.
— Fechei minha agenda da semana que vem na clínica e
também tirarei uns dias de folga da Vida Nóbile, ok? Como a gente
tinha conversado antes, vou fazer aquela viagem com a Scarllat.
Vamos pra Búzios no sábado.
— Beleza. Pode ir tranquilo que se tivermos que resolver
alguma coisa pessoalmente, eu vou até a empresa.
— Obrigado, Leo. Estou mesmo precisando me desligar um
pouco da rotina louca que ando levando.
— Aproveite pra descansar e curtir sua namorada.
— Não somos namorados. — Ele arqueou uma sobrancelha e
tomou um gole do café.
— Você entendeu. — Também provei do meu.
— Por falar em namoro, Veruska disse para a amiga que está
esperando uma ligação sua.
— Sinto muito em decepcioná-la, mas isso não vai acontecer.
— Caramba, Leo! Deixa de ser rabugento, cara. Dê uma
chance pra ela. Vocês dois podem passar ótimos momentos juntos,
o que vai ajudar a te distrair e relaxar — falou a última parte de
forma maliciosa.
— Não posso negar que o sexo foi ótimo, mas não quero me
envolver, nem alimentar nela falsas esperanças de que poderíamos
ter algo a mais. E sinceramente, Celo, se eu fosse namorar alguém,
não seria a Veruska.
— Seria Elaine? — ele não perdeu a oportunidade de
perguntar.
— Alguém como ela. Elaine é interessante, linda e simples,
esforçada, sonhadora. Estar em sua companhia é sempre
agradável. Além do que, aquele misto de ingenuidade e sex appeal
natural quase me enlouquecem.
— Bro, você tá caidinho pela sua diarista. Deixe de ser trouxa
e se permita viver isso que está nascendo entre vocês. Porque pelo
que me contou, ela também está interessada, não é mesmo?
— Ah, Celo. Tenho muito medo, sabe?
— Do quê, Leo?
— Não ser o que ela espera. Não sei se algum dia vou
conseguir amar outra mulher e Elaine não merece que eu brinque
com seus sentimentos.
— Bem, uma coisa de cada vez. Tenha uma conversa franca
com ela e se ainda assim a garota topar, por que não
experimentarem para verem no que vai dar?
— Prometo que vou pensar no assunto.
— Precisa reaprender a ser leve, irmão. Sinto tanta falta dos
seus sorrisos, das suas risadas, daquele brilho de entusiasmo em
seu olhar, de te ver feliz.
Fechei as pálpebras, inspirei fundo e expirei pesado.
— Permita-se! — falou chamando de volta a minha atenção.
Então levantou e caminhou até minha poltrona.
Levantei também e nos abraçamos.
— Te amo, Leo. Só quero te ver feliz. Deixe o passado pra
trás. Tenho certeza que era o que a Li desejaria pra você.
Senti um aperto no peito e a garganta engasgada. Fazia muito
tempo que eu não chorava, mas naquele momento me senti frágil,
incapaz de dominar as lágrimas, logo elas jorraram de meus olhos.
Abraçado ao meu irmão, senti o corpo chacoalhar pelo pranto.
— Se perdoe e siga em frente, mano. As coisas vão se ajeitar,
desde que você permita que isso aconteça. — Ele se afastou e
beijou minha testa.
Assenti e enxuguei o rosto.
— Obrigado, Celo, por nunca desistir de mim.
— Sempre estarei ao seu lado, para o que precisar, sabe
disso. Agora já vou. O dia foi puxado.
Nós dois nos despedimos e meu irmão foi embora.
Caminhei até a janela e fiquei observando a praia. O vento do
início da noite soprou meu rosto e, de repente, senti uma calmaria
me invadir e algo semelhante à esperança.
Fiquei muito mexido pela conversa com meu irmão. No dia
seguinte, acordei ainda mais cedo que o habitual e fui correr na orla.
Enquanto o vento frio da manhã soprava meu rosto, recordações de
momentos com Elaine invadiram minha mente, agitando todo o meu
ser. Eu queria beijá-la de novo, tê-la em meus braços entregue a
mim.
Não preciso fugir dela, Elaine é adulta, se quiser o mesmo que
eu, por que não irmos até o fim com o que já começamos? Se
acontecer de novo, vou deixar rolar. Vou me permitir.
Fiz os três quilômetros de corrida mais rápido do que o
costume e voltei para a cobertura todo suado e ofegante. Tomei
água e terminei minha série de exercícios antes que dona Ébia e
Elaine chegassem.
Louco por um banho, fui para minha suíte. Depois de uma
ducha rápida e de me vestir para trabalhar, desci as escadas.
Estava no meio do caminho quando ouvi a porta de entrada da
cobertura sendo aberta e as familiares vozes femininas.
— Bom dia, Leo! — a governanta cumprimentou ao entrar e
me ver. A diarista fez o mesmo.
— Bom dia, meninas! — tentei soar brincalhão e parece que
surtiu efeito, pois os sorrisos das duas iluminaram seus semblantes.
— Elaine, eu gostaria de conversar com você um instante.
Poderia me acompanhar até o escritório?
Ela assentiu, meio sem jeito e dona Ébia pediu licença,
informando que iria para a cozinha.
Terminei de descer os degraus e caminhei até a garota que
não desgrudou os olhos curiosos de mim.
— Vamos? — Pousei as mãos em suas costas e, mesmo
sobre o tecido, pude sentir o calor da sua pele, o que me inquietou
de imediato.
Ela aquiesceu e me acompanhou até o local.
— Sente-se! — Indiquei a cadeira de frente à mesa e ocupei a
que estava do outro lado. — Como está a sua mãe? — perguntei
assim que Elaine se acomodou.
— Graças a Deus ela está bem. Não teve mais febre e a
disposição melhorou.
— Isso é ótimo. Posso imaginar a aflição de vocês.
— Por mais que a gente tente se manter otimista, quando
mamãe apresenta qualquer sinal que possa ser indicativo de uma
recidiva do linfoma, a angústia vem na mesma hora.
— Sei que não é fácil lidar com o medo, ainda mais quando é
relacionado a doenças, por essa razão, tomei a liberdade de fazer
uma proposta de plano de saúde pra vocês duas, pois depender só
do SUS é complicado.
— Ah, senhor Leonardo, quero dizer, Leonardo, não precisava
se preocupar com isso. Seria muito bom mesmo termos um plano
de saúde, mas infelizmente não temos condições de arcar com os
custos. — Ela me olhou com tanto pesar que se eu tivesse um
coração, juraria que fora ele o responsável pelo aperto que senti no
peito.
— Desculpe se não fui claro, a proposta na verdade é um
presente. Não precisariam pagar mensalidade. Aqui está, dê uma
olhada. — Peguei os papéis sobre a mesa e os estendi até ela. — O
plano não tem coparticipação, ou seja, quando fizerem consultas
médicas ou exames, não precisarão pagar nada por isso. Também
coloquei uma boa cobertura hospitalar, então se precisarem de
internações, cirurgias ou qualquer procedimento ou exame de alta
complexidade, estarão cobertas.
— Ah, meu Deus, isso é perfeito, mas eu... eu... — ela engoliu
em seco e me olhou atordoada —, não posso aceitar.
— E por que não? Sou um dos donos da Vida Nóbile, você é
minha funcionária, posso muito bem te oferecer isso. Fiz um plano
igual a esse para a dona Ébia.
— É diferente, sou apenas a diarista que vem aqui duas vezes
na semana, não temos vínculo empregatício. Dona Ébia trabalha pra
você de carteira assinada, eu não.
— Elaine, se quiser, posso te contratar também, é só me falar.
— Imagina, vindo aqui duas vezes na semana eu já quase
nem tenho o que limpar, você não precisa de uma faxineira todos os
dias.
— Não preciso, mas te contrataria se assim desejasse. Aliás,
não começamos essa conversa do jeito certo.
— Ah, não? — Ela franziu as sobrancelhas e me encarou,
confusa.
— Eu deveria ter começado te pedindo desculpas pelo meu
comportamento na semana passada. Fui grosseiro ao te mandar
embora daquele jeito, por favor me perdoe, Elaine. É que não sou
muito bom em lidar com pessoas, ainda mais quando a pessoa em
questão mexe comigo de uma forma que não consigo compreender
bem.
— Ah... — Ela sorriu, suavizando o semblante. — Isso foi fofo.
Está perdoado, não se preocupe.
— Pois bem. Leve os contratos com você, converse com sua
mãe e na semana que vem me traga uma cópia de seus
documentos. Se quiser, pode escaneá-los pelo celular e me enviar
por e-mail. Tem o endereço aqui. — Entreguei um cartão meu para
ela.
— Muito obrigada, Leo! Eu não tenho nem como te agradecer
por isso.
— Não precisa agradecer por nada.
— Agora, se me dá licença, vou cuidar dos meus afazeres —
pediu, ao se levantar.
— Claro, fique à vontade. — Já de pé, ela assentiu com um
sorriso estampado no rosto.
Observei-a por um longo instante. Mesmo sem maquiagem e
nos trajes simples, usava uma calça legging preta, blusa tipo bata
amarela e o cabelo amarrado em um rabo de cavalo, era linda e
atraente. A vontade foi de me levantar também, ir até ela e tomar
sua boca na minha. Mas como aquilo seria bem inapropriado para o
momento, controlei-me, e a vi deixar o escritório.
Foi difícil me concentrar no trabalho naquela manhã, mas mal
sabia o que a tarde me reservava.
Apesar de não ter começado o dia de trabalho com a visão
maravilhosa de Leonardo sem camisa e suado, como era o habitual
encontrá-lo ao chegar à cobertura, a manhã foi surpreendente de
uma forma boa. Fiquei feliz pela conversa que tivemos, tanto pela
oferta generosa que ele fez de pagar um plano de saúde para mim e
para mamãe, quanto pelo seu pedido de desculpas. Algo nele
estava diferente, mas não soube identificar. Talvez os olhos... eles
não pareciam tão sombrios e tristes como de costume.
Depois do almoço, dona Ébia cuidou da louça e antes de ir
embora, ela pediu que eu não esquecesse de arrumar o café da
tarde do patrão.
— Pode deixar. Vá tranquila!
— Obrigada, querida. Já vou sair agora porque não quero me
atrasar. No final de semana farei outra visita para Cirlleni.
— Mamãe adora quando a senhora vai lá.
Sorrimos uma para outra, ela se despediu e saiu.
Como eu já tinha terminado a faxina no andar superior, e
lavado todos os banheiros, inclusive o social e o das empregadas,
que ficavam no andar de baixo, fui limpar a sala de visitas.
Achei interessante encontrar a cafeteira elétrica no bar, já que
ela não costumava ficar ali. Pelo visto, Leonardo estava mesmo
mudando, o que era um ótimo sinal.
Depois de cuidar do bar, tirei o pó do piano. Toda vez que
limpava o imponente instrumento, recordava-me dos beijos que Leo
e eu demos encostados ali. Só de lembrar da sua boca quente
devorando a minha e das mãos ousadas passeando por mim, o
corpo todo se agitou. Senti tanto calor que quase precisei me
abanar.
Finalizei a arrumação da sala de estar e parti para a de TV. Ao
terminar lá também, só faltava o escritório. Geralmente ele era o
primeiro lugar que eu limpava, aproveitando enquanto o patrão
tomava seu banho, mas como naquele dia quando cheguei ele já
estava arrumado para trabalhar e logo me pediu que eu o
acompanhasse até o escritório, comecei pelo andar de cima.
Não queria incomodá-lo, então aguardei um pouco para ver se
ele saía de lá. Mas após vinte minutos parada do lado de fora, eu já
estava inquieta, então bati de leve na porta.
— Pode entrar. — Ouvi sua voz grave do lado de dentro.
— Com licença, Leo, só falta faxinar aqui. Quer que eu o
aguarde sair ou posso começar limpando a estante? — perguntei
meio sem graça pela intromissão.
— Ainda tenho que resolver algumas pendências, então pode
entrar.
— Não vou incomodar?
— De forma alguma. Fique à vontade.
— Está bem, então. Obrigada. — Tentei ser o mais licenciosa
possível ao entrar no local carregando uma escada em uma mão e
na outra panos e um balde com água.
— Quer ajuda com isso? — ele ofereceu ao notar o meu
esforço.
— Imagina. — Neguei com a cabeça e fiz uma careta.
— Não me custa nada. — Ele levantou e veio ao meu
encontro, pegando a escada das minhas mãos. — Onde quer que
eu a coloque?
— No canto da direita, por favor.
Ele fez o que pedi, depois voltou para sua cadeira.
Comecei limpando os livros da prateleira mais alta. Eu me
dedicava àquela tarefa a cada quinze dias. Mesmo sobre a escada,
precisava me esticar toda para alcançá-los. A estante de madeira
escura era enorme, ia do chão ao teto e nela haviam exemplares
dos mais variados estilos. Desde títulos técnicos das áreas do
Direito, Gestão de Saúde e Administração de Empresas, a livros de
não ficção, como biografias, e até mesmo ficção. A maioria dos
exemplares desse último estilo eram romances policiais e
suspenses, mas também tinham romances românticos que imaginei
que deveriam ter sido da esposa de Leonardo. Uma estante daquela
era o sonho de consumo de qualquer pessoa apaixonada por leitura.
Limpei os exemplares que estavam na metade direita, de todas as
prateleiras, depois ajeitei a escada no canto esquerdo para
recomeçar o processo.
Ao me espichar para tentar alcançar um volume bem no canto
mais alto, desequilibrei e a escada balançou.
— Ah, meu Deus! — deixei um gritinho desesperado escapar
quando me dei conta da queda iminente.
— Elaine! — Leonardo levantou de supetão e conseguiu me
amparar antes que eu me estatelasse no chão junto com a escada
que agora jazia lá.
Seus braços fortes me seguraram com firmeza quando ouvi o
estrondo do metal se chocando contra o porcelanato chique cor de
creme. Meu coração que já estava disparado pelo susto, chegou a
ficar com os batimentos irregulares por conta da proximidade de
nossas bocas. Eu sentia o calor do corpo dele incendiar o meu.
— Obrigada — consegui dizer, com a voz trêmula.
Nossos olhares grudados um no outro denotavam toda nossa
aflição.
Leo me ajudou a ficar de pé, mas não se soltou de mim. Uma
das mãos foi para minha cintura, por baixo da blusa toda
desconcertada. O contato direto arrepiou minha pele, deixando-me
ainda mais aturdida.
Ele parecia tão mexido com nossa proximidade como eu, o
que ficou evidente quando passou a mão por minha nuca e me
puxou para um beijo luxurioso e possessivo.
Correspondi com o mesmo ímpeto, agarrando-me ainda mais a
ele. Leo me suspendeu do chão e me sentou sobre sua mesa.
Continuamos a nos beijar com devassidão, enquanto as mãos
afoitas e exigentes exploravam o corpo um do outro. Alucinada de
desejo, sentia minha intimidade latejar.
De repente ele desgrudou os lábios dos meus e se afastou um
pouquinho para poder me olhar. A angústia estampava seu
semblante. Só de imaginar que mais uma vez ele iria me rejeitar e
me mandar embora, fiquei apavorada. Estava louca por ele, não
permitiria que aquilo acontecesse mais uma vez.
— Eu quero isso tanto quanto você — falei rápido, meio
atrapalhada por conta da agonia.
— Tem certeza, Elaine? Não estou te prometendo nada, seria
só sexo e não quero te magoar.
— Vai me magoar se mais uma vez me rejeitar. Eu quero
transar com você, Leo, por favor me faça sua, estou consumida pelo
desejo.
— Ah, menina, você me enlouquece! — ele resmungou e
voltou a me beijar com volúpia. — Adoraria te foder aqui em cima da
mesa, mas isso pode ficar para uma outra oportunidade. Merece ter
a primeira vez sobre o conforto de um colchão. Venha, vamos para
o quarto. — Ele me ajudou a descer e me guiou para fora do
escritório.
Eu não estava nem acreditando que aquilo iria mesmo
acontecer. Excitada demais e com receio de que Leo ainda pudesse
mudar de ideia, segui calada de mãos dadas com ele até o andar de
cima. Como da outra vez, levou-me para o quarto de hóspedes.
Ao pararmos de frente para a cama enorme, meu coração
batia tão rápido que achei que passaria mal. Respirei fundo
tentando controlar a ansiedade.
— Está nervosa? — ele questionou baixinho, acariciando meu
rosto.
— Um pouco.
— Gosto de certa brutalidade na cama, mas prometo que
tentarei ser o mais gentil possível com você.
Suas palavras fizeram meu ventre formigar. Aquilo iria mesmo
acontecer. Nós estávamos prestes a transar e, de repente, comecei
a ficar aflita. E se eu fosse péssima de cama?
— Ei, o que foi? Quer desistir?
— Não! — Minha voz saiu meio esganiçada só de pensar
naquela possibilidade.
Leo esboçou um sorriso diante do meu desespero e depois
voltou a ficar sério.
— O que houve, então? Por que essa carinha assustada e
aflita?
— É que... bem, talvez eu não saiba o que fazer pra te
agradar. — Umedeci os lábios com a língua e mudei o peso do
corpo de uma perna para a outra.
— Fique tranquila que eu te ensino. — O esboço de um sorriso
malicioso suavizou seu semblante e os olhos faiscaram de desejo.
— Posso tomar um banho antes? É que além de ter andado de
ônibus, estou toda suada pelo dia de trabalho.
— Claro. Aliás, por que não fazemos isso juntos? — Arqueou
uma sobrancelha e seu tom foi tão sedutor que me deixou toda
mole.
— J-juntos? — gaguejei ao ecoar sua fala.
— Podemos começar as preliminares debaixo do chuveiro,
aposto que você vai gostar.
— Ah... — Sorri, nervosa e concordei com a cabeça.
Leo pegou duas toalhas limpas no armário e me levou até o
banheiro.
Ligou a ducha e tirou a roupa. Toda ela.
Fiquei embasbacada o olhando nu. Eu já o tinha visto pelado
antes, mas era sempre um choque para mim me deparar com
aquele corpo que parecia ter sido esculpido a mão, ainda mais com
o majestoso membro ereto, que naquele instante chegou a me
deixar preocupada se caberia em mim.
— Fique tranquila que vai caber — ele comentou em tom
zombeteiro ao perceber para onde eu olhava.
Sem graça por sido pega em flagrante, levei as mãos ao rosto
que, de tão quente que estava, com certeza exibia um rubor intenso.
— Não precisa ter vergonha de nada. — Ele removeu minhas
mãos com delicadeza. — Quero que se sinta à vontade, confortável
e, acima de tudo, excitada.
Aquiesci, encantada com suas palavras, e respirei fundo,
procurando me acalmar.
Leo me ajudou a me despir, sem pressa e depois soltou meu
cabelo.
— Linda! Você é perfeita, Elaine. — O elogio aqueceu meu
corpo e minha alma.
Entramos debaixo da ducha morna e ele começou a me
ensaboar, dispensando a bucha. Suas mãos não só me limpavam,
mas me acariciavam e estimulavam. Ele se posicionou por trás de
mim e quando os dedos habilidosos apertaram meus mamilos, gemi,
manhosa, tombando a cabeça contra seu peito duro como rocha.
— Está gostoso? — sussurrou a pergunta ao meu ouvido e
mordiscou o lóbulo da orelha.
— Muito — respondi, gemendo outra vez.
Ele manteve uma das mãos cuidando dos seios e a outra foi
parar na minha intimidade.
— Ah... — Meu corpo todo se contraiu ao seu toque.
— Afaste as pernas mais um pouco — ordenou e eu obedeci.
Louca para senti-lo melhor.
Leo me lavou com cuidado. Depois começou a fazer
movimentos mais vigorosos e rápidos sobre meu clitóris. Aquilo era
muito bom, mil vezes melhor do que quando era minha mão a me
masturbar.
Quando a mente já estava nublada e eu senti o clímax se
aproximar, ele me penetrou com um dedo. Ardeu um pouquinho ao
entrar, mas o desconforto mínimo em nada se comparava ao prazer
que ele me proporcionava. Rebolei, inclinando o quadril em direção
à sua mão, querendo mais.
— Safadinha, gostosa! — grunhiu e me penetrou com mais um
dedo, fazendo movimentos circulares dentro de mim, como se assim
procurasse me alargar, preparar-me para recebê-lo depois.
Em seguida, iniciou movimentos de entrada e saída cada vez
mais rápidos.
Ensandecida de prazer, não demorou para que eu gozasse.
— Isso foi delicioso! — balbuciei, meio torpe.
— E estamos só começando. — Virou-me para si e me beijou
com devoção.
Com nossos corpos colados, podia sentir seu membro rijo
pulsando contra minha barriga. Ele tinha me feito gozar, merecia
que eu retribuísse à mesma altura.
Quando nossos lábios se desgrudaram, afastei-me um pouco e
segurei sua ereção.
— Porra, Elaine... — Leo deixou um rosnado escapar, o que
me fez olhá-lo maliciosa e sorrir satisfeita.
Seu pênis era quente, grosso e firme. Achei delicioso senti-lo
pulsando em minha mão. Fiquei o admirando, a cabeça rosada, as
veias saltadas no comprimento e, de repente, senti uma vontade
insana de prová-lo.
— Posso te chupar?
— Claro, pequena, vou adorar sentir essa boca deliciosa no
meu pau.
Apesar de insegura, já que nunca tinha feito aquilo, ajoelhei-
me à sua frente. Sem saber ao certo como agir, passei a língua
sobre a cabeça e deslizei pela generosa extensão.
— Ah, que delícia! — Ele agarrou meu cabelo, segurando-o
como se fosse um rabo de cavalo.
Fiz um movimento de vai e vem com as mãos e depois o
abocanhei até o máximo que consegui. Comecei a chupar meio
tímida, receosa que não estivesse fazendo do jeito certo, se é que
tinha jeito certo para aquilo, mas ao senti-lo pulsar na minha boca, a
excitação me dominou. Deixei os receios de lado e o chupei com
luxúria. Sentir-me liberta e devassa foi incrível, o que me fez ficar
cada vez mais confiante.
Leo resmungava elogios e palavrões de forma quase
incompreensível, enquanto mantinha uma mão firme agarrada ao
meu cabelo.
— Se não parar agora, vou gozar nessa sua boca perfeita e
talvez seja demais pra sua primeira vez — ele tentou me alertar,
mas nem liguei. Queria experimentar aquilo.
Quando grunhiu alto e seu líquido quente me invadiu, a puta
que vive dentro de cada mulher despertou em mim e engoli tudo, até
a última gota.
Leo me puxou para cima e me beijou com selvageria.
— Vamos pra cama — chamou ao desligar o chuveiro.
Nós nos secamos com as toalhas que ele havia deixado
penduradas nos ganchos ao lado da porta do box e seguimos nus
para o quarto.
— Deite de barriga pra cima — ordenou e eu obedeci. —
Agora é a minha vez de te saborear, pequena.
Só de recordar como aquilo era bom, uma onda de excitação
me percorreu.
Ele dobrou meus joelhos e fastou as pernas, posicionando a
cabeça entre elas.
Soprou a região, surpreendendo-me com o ato, que aliás foi
bem interessante e gostoso, e logo começou a me chupar. A língua
experiente explorou minha intimidade com maestria, levando-me à
loucura. Leo chupou e lambeu os lábios vaginais, depois o clitóris.
Prendeu-o entre os dentes de leve, fazendo-me dar um gritinho,
depois soltou e repetiu a ação. A língua ousada invadiu minha
entrada, simulando uma penetração e aquilo foi delicioso!
Eu gemia descontrolada e agarrava sua cabeça, erguendo o
quadril, forçando-me em sua direção. Depois ele voltou a chupar o
clitóris e introduziu dois dedos na minha vagina que pulsava
freneticamente. Quando eu estava prestes a gozar, Leo parou o que
fazia.
— Aonde você vai? — questionei desorientada.
— Calma, pequena, só vou pegar uma camisinha. — Aquele
esboço de sorriso malicioso surgiu outra vez, deixando-o ainda mais
lindo.
Sem demora, Leo pegou o preservativo na gaveta da mesinha
de cabeceira, rasgou o envelope laminado e desenrolou a proteção
sobre o glorioso membro ereto.
— Isso pode doer um pouquinho, está bem? — alertou ao se
posicionar entre minhas pernas.
Assenti e ele fez outra coisa que me surpreendeu, bateu com o
pênis sobre meu clitóris.
— Ahhhh... — gemi alto, ansiosa pelo que estava por vir.
Em seguida Leo esfregou a cabeça grossa na minha entrada e
forçou de leve.
— Minha nossa, não vai caber! — resmunguei, apavorada.
— Calma. Vai caber sim. — Ele se afastou, chupou-me mais
um pouco, depois introduziu dois dedos, movimentando-os como se
me alargasse, da mesma forma que fizera no banheiro.
Então voltou a posicionar a ereção na entrada e me penetrou
aos poucos. Devagar, conquistando centímetro a centímetro. Senti
um desconforto enorme no início, parecia mesmo que não iria caber
ali, mas logo que sua extensão foi me invadindo e minhas paredes
se acomodando a elas, uma sensação gostosa começou a substituir
a dor.
— Está tudo bem? — ele questionou quando estava
completamente acomodado dentro de mim.
— Tudo — respondi ofegante.
— Ótimo! — começou a entrar e a sair devagar.
Ergui um pouco o quadril e tentei acompanhar o seu ritmo,
rebolando para receber suas investidas cautelosas.
— Hum, que delícia. Pode ir mais rápido.
— Você que manda, estou aqui pra te satisfazer. — Acelerou
as estocadas, que ficaram cada vez mais rápidas, fortes e fundas.
Eu gemia e choramingava. Nunca tinha sentido tanto prazer na
vida, aquilo era perfeito.
Leo abaixou o tronco para beijar minha boca. Com uma das
mãos ele se apoiava no colchão, com a outra estimulava meus
seios.
— Caralho, Elaine, você é gostosa demais, garota! — rosnou
ao afastar os lábios dos meus.
Voltou a erguer o tronco e enquanto investia contra mim cada
vez mais alucinado, levou uma mão ao meu clitóris e começou a
massageá-lo.
O estímulo extra fez meu corpo todo retesar, anunciando a
proximidade do clímax. Quando minha visão nublou, senti-me
levitar, depois despenquei em queda livre em um orgasmo intenso.
Minha vagina apertou o pênis de Leonardo e logo ele também
alcançou o ápice do prazer, desabando ao meu lado na cama.
— Obrigada por me dar uma primeira vez perfeita! — Acariciei
seu rosto suado.
— O prazer também foi meu! — Beijou-me a testa e depois a
boca. Ao contrário de todos os outros beijos que demos, sempre tão
vorazes, aquele foi lento e terno, o que encheu meu coração de
esperança.
Eu tinha concordado que seria só sexo, ele mesmo me disse
que não estava me prometendo nada, mas talvez pudéssemos
repetir outras vezes o que acabamos de fazer e se algum dia aquilo
viesse a significar algo mais, não poderia negar que acharia lindo!
Afaguei o cabelo, ainda úmido, de Elaine, que exalava o cheiro
do meu xampu. Ela estava aninhada em meus braços e me
surpreendi com o quão confortável me senti daquele jeito. Desde
que ficara viúvo, era a primeira vez que eu me permitia deitar
abraçado a uma mulher de forma carinhosa e despreocupada após
o sexo. Geralmente algo semelhante a culpa me fazia me afastar o
mais rápido possível.
— Estou com fome e você também deve estar. Que tal
tomarmos um banho e descermos para comer alguma coisa juntos?
— Afastei-me dela um pouco, para olhá-la melhor. Estava linda com
um sorriso mole de satisfação e o rosto ainda um pouco ruborizado.
— Adoraria, mas já tá ficando tarde e não gosto de andar de
ônibus sozinha à noite, tenho um pouco de medo.
— Você mora em Jacarepaguá, não é?
— Sim, sou vizinha da dona Ébia.
— Fica mais um pouco e me faça companhia, eu te levo em
casa depois.
— Imagina, não vou te dar um trabalho desses.
— Deixa de bobagens, eu que ofereci. Não será trabalho
nenhum.
— Está bem. Vou só avisar a minha mãe, então. Preciso pegar
o celular na minha bolsa lá na lavanderia.
— Deixa pra fazer isso quando descermos. — Levantei e
estendi a mão para ela. — Venha, vamos tomar uma ducha!
Ela assentiu e a ajudei a levantar também.
Ensaboei seu corpo, aproveitando para acariciá-la e Elaine fez
o mesmo comigo. Minha vontade era de recomeçarmos tudo, mas
imaginei que ela estivesse dolorida, então controlei minha excitação.
Depois de nos secarmos, ela vestiu a roupa que estava antes,
eu coloquei apenas uma bermuda e descemos de mãos dadas.
— O que acha de um sanduíche de queijo, presunto, alface e
tomate? — sugeri ao entrarmos na cozinha.
— Excelente ideia! Deixa que eu preparo. Dona Ébia me
encarregou de cuidar do seu lanche.
— Posso muito bem fazer isso, não se preocupe. Aproveite pra
avisar sua mãe que irá chegar mais tarde.
Ela ficou parada e franziu as sobrancelhas, olhando-me com
uma cara engraçada.
— O que foi?
— Nada... é só que...
— Fala. — Encarei-a, curioso, após pegar na geladeira as
coisas de que que precisava.
— Você diz que não tem coração, mas na verdade tudo que
faz prova o contrário. É gentil, preocupado, generoso.
— Elaine... — Suas palavras me deixaram em alerta. Não
queria dar a ela falsas esperanças. — Não sou esse cara que está
imaginando. Não quero que se envolva por uma fantasia a meu
respeito, ok? Você concordou...
— Desculpa. — Ela me interrompeu. — Eu sei que foi só sexo.
Maravilhoso, aliás — riu, sem humor, irritada —, mas não precisa
ficar receoso com medo de que eu deseje ser sua namorada. Sei
bem o meu lugar. É claro que um cara como você não se envolveria
dessa forma com uma garota como eu.
— Ei — caminhei até ela —, não é nada disso. — Acariciei seu
rosto. — O que eu falei antes nada tem a ver com diferença social.
Você é uma garota incrível e gostosa pra caralho. Com certeza o
homem que a tiver como namorada será um grande sortudo.
Confesso que queria ser esse cara, mas desde que fiquei viúvo, não
consigo me envolver com ninguém.
Elaine engoliu em seco e piscou várias vezes, contendo
lágrimas que brotaram em seus olhos.
— Já faz tanto tempo, Leo. Mesmo que não seja comigo, você
merece um recomeço. — Foi a vez dela me fazer um carinho no
rosto e de mexer com sentimentos que eu nem me recordava mais
como era ter.
Sem saber o que fazer, envolvi-a em um abraço apertado e
beijei sua testa.
— Você é diferente de todas as outras com quem transei
nesse tempo. Não sou tolo pra negar que existe algo especial entre
nós. Não quero perder isso, mas também não sei se consigo ir além.
— Não estou te cobrando nada — ela falou baixinho e beijou
meu peito nu.
— Elaine — afastei-a um pouco para que nossos olhares se
conectassem. — E se a gente continuasse fazendo isso, digo...
— Transando sem compromisso? Tipo uma amizade colorida?
— ela concluiu meu raciocínio e na mesma hora me dei conta do
quanto aquilo era absurdo.
— Desculpa. Eu não devia nem ter pensado que aceita...
— Eu topo! — ela me interrompeu de novo, surpreendendo-
me.
— Tem certeza?
— Tenho. Somos dois adultos, podemos lidar com isso e
continuarmos assim enquanto for bom para ambas as partes.
— Ok. — Beijei sua testa. — Ficamos combinados, então.
— Certo. Agora só pra eu saber e poder organizar as coisas na
minha cabeça, com que frequência faríamos sexo? — Ela franziu o
cenho, pensativa. — Como vamos saber que o outro está fim de
transar? E como faremos isso sem que dona Ébia fique sabendo?
— Com você, pequena, eu sempre estarei a fim. — Ergui uma
sobrancelha, provocante. — Mas tem razão, não seria bom
fazermos isso nos dias em que vier trabalhar. Podemos combinar
um encontro aqui em casa nos finais de semana? Aos sábados
ficaria bom pra você?
— Acho melhor aos domingos à tarde. Assim não
levantaríamos suspeitas. — Ela me olhou com uma expressão tão
traquina e empolgada que não consegui conter um sorriso. — Ah,
meu Deus!
— O quê? — questionei confuso.
— Leonardo Nóbile acaba de me dar um sorriso mostrando os
dentes! — Bateu palminhas feito uma criança feliz.
— Qual é? Eu sempre sorrio assim. Não?
— É claro que não. É sempre algo que só ergue discretamente
o cantinho dos lábios. Quase um sorriso Monalisa.
— Boba! — Balancei a cabeça em negativa.
— É bom te ver mais leve. Bem, vai lá cuidar dos nossos
sanduíches enquanto ligo pra mamãe. — Deu-me um selinho e foi
até a lavanderia.
Após comermos, convidei Elaine para ir até a sala de visitas
me ouvir tocar piano. Ela sentou comigo no banco de frente ao
instrumento e enquanto toquei Conversations in the dark, ela cantou
com aquela voz doce e potente que faria páreo para qualquer
profissional.
A companhia dela me trazia paz, sentia-me muito bem ao seu
lado. Estava contente com nosso acordo. Achava mesmo que
poderia dar certo. Não era exatamente assim que meu irmão e
Scarlatt se relacionavam?
Mais tarde, quando a levava para sua casa, perguntei como
andavam seus estudos.
— Até que estou conseguindo estudar bastante. Vou prestar a
prova do ENEM agora em julho. Como falta apenas um mês, talvez
não tenha tantas chances, mas será um bom treino para a do final
do ano.
— Admiro sua garra, seu esforço e dedicação. Tenho certeza
de que dará certo e não vai demorar pra ser minha colega de
profissão.
— Achei muito chique isso que falou: colega de profissão. Já
me senti a advogada. — Deu ênfase nas duas últimas palavras,
divertida.
— Vai conquistar tudo que deseja, Elaine. Pode acreditar!
Ela pousou a mão sobre a minha e apertou, dando-me um
sorriso de gratidão.
— É aqui. — Avisou ao chegarmos onde morava. — Muito
obrigada por ter me trazido e por tudo mais que rolou hoje. —
Prendeu o lábio inferior entre os dentes, ficando sexy sem fazer
esforço.
— Não precisa agradecer por nada. A propósito, nossos
encontros já começam no próximo domingo?
— Por mim, fica perfeito. Confesso que não vejo a hora de
repetirmos aquilo tudo. — Arregalou os olhos, tentando descontrair
o que acabara de falar.
— Eu também, pequena. Foi delicioso! Te vejo no domingo,
então. A gente se fala por mensagem para combinarmos o horário,
pode ser?
— Combinado! Boa noite, Leo. — Beijou-me os lábios com
suavidade e desceu.
Fiquei a observando entrar. Só depois dei a partida e coloquei
o carro em movimento.
Talvez eu nunca mais fosse amar outra mulher, nem sequer
conseguir namorar, mas estava animado com o acordo de amizade
colorida com Elaine. Por mais que não merecesse ser feliz, era algo
semelhante a isso que estava sentindo naquele momento.
Nunca imaginei que teria uma primeira vez tão perfeita! Por
mais que esperar para perder a virgindade não tenha sido algo
planejado, também não foi em vão.
Leonardo não era apenas um cara lindo, gostoso, mais velho e
experiente, ele sabia muito bem como proporcionar prazer a uma
mulher. Quando percebi que estava querendo propor algo como
uma amizade colorida e logo que deixou aquilo pairar no ar pareceu
se arrepender, num ímpeto de coragem e ousadia, completei sua
frase. E para minha alegria, ficamos combinados que levaríamos
aquilo adiante.
Eu tinha plena consciência de que a chance de sair daquela
história com meu pobre coraçãozinho despedaçado era enorme,
pois já gostava do patrão muito mais do que deveria. Ainda assim,
era melhor correr o risco do que me privar de estar de novo nos
braços daquele deus do sexo.
Entrei em casa suspirando e só me dei conta disso quando
mamãe me questionou se estava tudo bem comigo.
— Tudo ótimo, mãezinha — respondi tentando disfarçar toda a
agitação que se passava dentro de mim.
— Está com uma carinha boa. Aconteceu alguma coisa
diferente?
Será que as mães tinham alguma espécie de radar que
alertava quando as filhas perdiam a virgindade?
— N-não — acabei gaguejando o que só fez com que ela me
olhasse ainda mais desconfiada. — E a senhora, como passou o
dia? — achei melhor tirar o foco da conversa de mim.
— Passei bem. Fiz um bolo pra você levar para a Suleide
amanhã, quando for fazer a faxina, ela me ligou encomendando.
— Que ótimo! Pode deixar que levo sim. Aliás, falando em
coisas ótimas, tenho uma novidade que a senhora nem vai
acreditar! — Arregalei os olhos, empolgada.
— Ah, é? Então vamos até a cozinha fazer um lanche e você
me conta enquanto come.
— Estou sem fome. Comi lá na casa do senhor Leonardo
antes de sair. Vamos sentar aqui no sofá mesmo.
Nós duas nos acomodamos de frente uma para a outra.
— E qual é a novidade, meu amor? — mamãe questionou
segurando minhas mãos.
— A senhora sabe que o patrão é um dos donos da Vida
Nóbile, né? Aquela operadora de saúde famosa.
— Sim. Ébia já comentou algo a respeito.
— Ele nos ofereceu um plano de saúde de lá, sem custo
nenhum.
— Ah, meu Deus, isso seria lindo! Mas não podemos aceitar
uma oferta dessas, podemos?
— Minha primeira reação foi exatamente como a da senhora,
mas daí o Leo me disse que eu era sua funcionária e que ele fazia
questão. Que inclusive tinha feito um plano bem parecido para dona
Ébia. Trouxe os papéis pra assinarmos. — Abri a bolsa e os retirei,
entregando para ela.
— Nossa, filha, estou até emocionada! Não posso reclamar do
SUS, pois todo o meu tratamento foi feito por ele, mas sabemos da
dificuldade que às vezes é conseguir atendimento e exames. Ter um
plano de saúde é uma tranquilidade que todo mundo gostaria de ter.
— Agora nós teremos, mãezinha! — Puxei-a para um abraço
apertado.
— Vou fazer um bolo bem gostoso de presente para o seu
patrão. Daí você leva na segunda-feira.
— Boa ideia! Aliás, hum-hum. — Raspei a garganta
arquitetando o plano perfeito para nosso encontro sem ter que
mentir para minha mãe que iria para outro lugar. — Posso levar no
domingo. Estarei de folga e já queria dar um passeio pela Barra,
mesmo.
— Estou feliz com seu ânimo em sair de casa. Vou torcer pra
que numa dessas voltas acabe arrumando um namorado.
— N-namorado?
— Já está com vinte três anos, filha. Está na hora, não acha?
— É, hum-hum, bem, seria ótimo arrumar um namorado, mãe.
Vou deixar os papéis para a senhora dar uma olhada, enquanto isso
tomarei banho. — Levantei, com receio de que ela tivesse mesmo
um sexto sentido e acabasse, de alguma forma misteriosa,
desconfiada do que eu e o patrão fizemos.
Mamãe assentiu, sorridente, e eu saí da sala o mais rápido
possível.
À noite, liguei para Érika, louca para conversar com ela e
dividir com alguém o que tinha acontecido. No entanto Kinha estava
de plantão e disse que precisou pegar outros extras. Por conta do
afastamento de um colega, minha amiga trabalharia todo o final de
semana.
Foi difícil dormir naquele dia e nos dois que se seguiram.
No domingo pela manhã, Leo me mandou uma mensagem
perguntando se eu gostaria de almoçar com ele. A ideia era
tentadora, contudo seria mais complicado explicar isso para mamãe,
então achei melhor almoçar com ela e sair logo depois. Dessa
forma, deixei combinado com ele que chegaria à cobertura por volta
das 14h.

Quer que eu te busque?


Ele ofereceu logo após visualizar minha mensagem.

Não tem necessidade, mas muito obrigada por oferecer.

Vou mandar um Uber te pegar, então.

Não precisa, mesmo. Posso ir de ônibus.

Faço questão. Assim que eu chamar o carro pelo


aplicativo, te envio as informações do modelo, placa e o horário
certo que vai passar aí.

Está bem. Muito obrigada. Até mais tarde!


Encerrei nossa troca de mensagens com o coração disparado.
Não estava nem acreditando que iria para o apartamento dele com o
intuito de passarmos a tarde transando.
Deixei o celular sobre a cama e abri o guarda-roupa. Érika
tinha toda razão, eu precisava fazer umas compras. Nem sequer
uma lingerie sensual eu possuía.
Devia ter pensado nisso!
Vasculhei a gaveta de calcinhas com a esperança de que
milagrosamente algo bonito e, quem sabe, até um pouco sexy
surgisse ali. Claro que não tive essa sorte. Com descrença, analisei
um conjunto de algodão todo branco. Pelo menos era um dos mais
novos que eu tinha.
— Vai ter que ser você, camarada! — falei para o objeto
inanimado tentando lembrar como eu ficava vestida com ele.
Joguei-o sobre a cama e passei para a parte mais difícil ainda:
encontrar uma roupa adequada.
Leonardo estava acostumado a me ver de calça legging e de
regata, mas isso quando eu ia trabalhar. Precisava me arrumar pelo
menos um pouco para aparecer lá num domingo à tarde, ainda mais
querendo sexo.
Acabei escolhendo um vestido curto de malha, com estampa
floral e fundo branco. Ele tinha um decote discreto tanto na frente
quanto nas costas e a saia levemente rodada.
Com a decisão tomada, fui até a cozinha ajudar a minha mãe a
fazer o almoço.
— Hmmm, que cheiro delicioso! — comentei ao vê-la derramar
calda de chocolate sobre um bolo que parecia ser de cenoura.
— Esse é o bolo para levar para seu patrão, mas fiz outro pra
gente também. Já sabe a que horas irá até lá?
— Falei com ele há pouco, sairei daqui por volta das 14h. Vou
de Uber.
— Está ótimo. Até lá isso aqui já vai ter esfriado e a cobertura
endurecido. Espero que ele goste! Diga que fiz de coração.
— Pode deixar, mãezinha. Aposto que ele vai gostar. Seus
bolos são os mais gostosos do mundo.
— Exagerada! — Ela sorriu, lisonjeada.
Preparamos o almoço juntas e logo que terminei de comer,
tomei banho e fui me arrumar.
Coloquei a lingerie e o vestido que escolhi mais cedo, deixei o
cabelo molhado e solto, aplicando nele um creme para pentear, com
o intuito de que formasse ondas quando secasse ao natural. Passei
uma maquiagem suave e um pouco de perfume. Calcei sandálias de
salto médio quadrado, bonitas e confortáveis, e peguei uma bolsa
pequena, de alça transversal, que combinava com elas.
Assim que dei uma última olhada no espelho, ouvi o alerta de
mensagens do meu celular. Conferi sem demora. Era Leo passando
as informações do carro que iria me pegar e avisando que ele
chegaria em dez minutos. Antes de sair do quarto, peguei os
contratos assinados que estavam dentro de um envelope de papel
pardo sobre a mesinha de cabeceira. No dia anterior eu fotografei os
documentos e enviei para o e-mail que estava no cartão que o
patrão me entregara.
— Que linda, filha! — mamãe falou ao me ver entrar na sala.
— Obrigada. — Dei uma voltinha à sua frente, exibindo-me,
alegre.
— Já está de saída?
— Estou sim.
— Coloquei o bolo na embalagem descartável, vou buscar. —
Ela foi rapinho até a cozinha e voltou.
— Devo chegar antes de anoitecer, está bem?
— Vá, tranquila, meu amor. E aproveite seu passeio depois.
Ébia acabou de me mandar uma mensagem dizendo que virá
passar a tarde comigo.
— Que ótimo! Ela tinha me dito mesmo que viria visitá-la. Já
vou, então. Fique com Deus.
— Vá com Ele, também, filha.
Despedi-me com um beijo no rosto dela e saí. Assim que abri a
porta, o carro com as descrições que Leonardo me passara parou
em frente ao portão de grades.
Como o trânsito estava tranquilo, o trajeto até à cobertura
levou cerca de vinte minutos.
Mesmo tendo as chaves de lá, pedi ao porteiro que me
anunciasse. Ele, que já me conhecia, cumprimentou-me sorridente e
logo autorizou minha entrada.
Enquanto o elevador subia, eu sentia a pulsação acelerar por
conta da expectativa de tudo que estava por vir.
As portas de metal se abriram e caminhei com as pernas meio
moles.
— Oi. Uau, você está linda! — Leo elogiou ao me atender.
— Que bom que gostou, me arrumei pra você. — Sorri sem
jeito, nervosa. — Ah, minha mãe mandou te entregar este bolo.
Disse que fez de todo coração, em agradecimento a oferta generosa
de nos pagar um plano de saúde. Aliás, trouxe também os papéis
assinados.
— Não precisava, mas agradeça a ela por mim.
— É de cenoura — informei ao entregar o bolo para ele.
— O meu preferido. — Sorriu mostrando os dentes, fazendo
meu coração errar uma batida.
Aquele homem sorrindo de verdade era a coisa mais linda do
mundo!
— Vamos entrar — disse em seguida e se afastou para me dar
passagem.
Fechou a porta atrás de mim e o acompanhei até a cozinha,
onde ele deixou o bolo.
— Aqui está o contrato assinado. — Entreguei o envelope para
ele.
— Ótimo. Depois levo para o escritório. — Deixou-o sobre o
balcão. — Agora o que acha de irmos pro quarto? — Inclinou-se
para beijar o meu pescoço e deslizou uma mão possessiva pela
minha cintura, aquecendo-me num instante.
— Claro. Foi pra isso que eu vim até aqui, não é mesmo? —
Prendi o lábio inferior entre os dentes, sentindo-me ofegante pela
excitação.
— Ah, Elaine, você me tira o juízo, garota! — Tomou minha
boca na dele em um beijo urgente e selvagem.
A mão que estava na minha cintura desceu para a bunda,
enquanto a outra foi parar na nuca, agarrando e suspendendo de
leve meu cabelo.
— Pensando bem — falou quando nossos lábios se afastaram
—, acho que vou começar aqui mesmo. Depois a gente sobe, ok?
Assenti meio desnorteada pela luxúria, sem saber ao certo
com o que eu estava concordando.
— Como te disse antes, gosto de sexo um pouco bruto. Acha
que ainda preciso ser delicado com você? — O desejo era nítido em
seus olhos castanhos que pareciam faiscar, bem como no tom de
voz, mais grave e rouco que o habitual.
— Não sou de cristal, Leo, não vou quebrar se me pegar com
força. Agora que já não existe a questão da virgindade entre nós,
me mostre como gosta de transar.
— Caralho, pequena, falando desse jeito me deixa ainda mais
louco do que já estou. — Beijou-me outra vez com voracidade.
Depois desceu a boca por meu colo, abaixou o decote do
vestido, junto com o sutiã, expondo o seio, que abocanhou, faminto.
Chupou e mordiscou um, então fez o mesmo com o outro.
Apoiei-me na bancada, pois de tão mole que estava, poderia
simplesmente despencar no chão.
— Gostosa — rosnou e continuou um caminho descendente.
Abaixou-se, ficando de joelhos à minha frente. Ergueu a saia
do vestido e lambeu minhas coxas.
— Afaste as pernas um pouco, pequena.
Fiz o que ele ordenou, já sentindo minha vagina pulsar.
Leonardo beijou sobre minha calcinha, depois segurou o
tecido, juntando-o, e começou a puxá-lo, para um lado e para outro,
fazendo-o roçar no meu clitóris. Aquilo foi inesperado e muito
gostoso.
Gemi, inclinando o quadril em sua direção.
— Safadinha! — grunhiu e abaixou a peça branca de algodão.
Ergui os pés para que ele pudesse me livrar dela.
Leo suspendeu uma perna minha, fazendo com que eu a
apoiasse sobre seu ombro, expondo-me para ele.
Agarrei seu cabelo e ele começou a me chupar com a
habilidade que eu já conhecia bem.
Quando eu estava prestes a gozar, levantou-se e me virou de
costas. Puxou meu vestido de uma vez para cima, retirando-o e o
jogou ao chão. Em seguida, desferiu um tapa em meu traseiro.
Dei um gritinho de susto e de tesão.
— Doeu? — sussurrou ao meu ouvido e mordiscou o lóbulo da
orelha.
— Não. Foi bem gostoso, na verdade.
— Que bom, se eu fizer algo que não goste, é só falar que não
repito, ok?
— Ok.
— Ainda bem que peguei um preservativo e coloquei no bolso
da bermuda, porque quero te comer agora, assim de costas pra
mim, está bem?
— Estou muito excitada, faça o que você quiser, mas me dê
um orgasmo. É tudo que quero agora — balbuciei as palavras, já
meio torpe.
— Seu desejo é uma ordem, pequena.
Ouvi o barulho do invólucro laminado sendo rasgado. Ele mal
colocou a proteção e me penetrou de uma vez. Bruto, forte, fundo.
Gritei e gemi, descontrolada. Arrebitando a bunda para ele.
— Rebola gostoso no meu pau, vai! — pediu e eu obedeci.
Agarrado em meus quadris, ele estocava sem piedade,
levando nossos corpos ao limite. Atingi o ápice do prazer num
orgasmo intenso e logo Leo também gozou, gemendo alto, numa
espécie de rosnado.
Ele saiu de mim e me virei para encará-lo. Mais uma vez ele
sorria mostrando os dentes, com a face suada e avermelhada e um
olhar lânguido de satisfação.
— Você é perfeita! — Beijou meus lábios com ternura e me
deu um abraço apertado. Foi gostoso sentir o coração dele tão
acelerado quanto o meu.
Ao nos afastarmos, ele tirou a camisinha, deu um nó e a
descartou na lixeira.
— Que tal um banho e depois começarmos tudo de novo?
— Vamos nessa! — Peguei meu vestido e minha calcinha e o
acompanhei até o andar de cima.
Aquela tarde foi longa e muito prazerosa!
Elaine me surpreendia a todo instante. Adorava ver como ela
ficava solta na hora do sexo, como tinha vontade de experimentar
coisas novas e gostava mais ainda de ver seu rosto suado e
ruborizado, com um sorriso mole de satisfação, depois.
Na segunda-feira, quando ela chegou para trabalhar,
acompanhada de dona Ébia, e percorreu meu peito nu com um
olhar malicioso, prendendo o lábio inferior entre os dentes, quase
perdi a razão. Minha vontade foi de tomar sua boca na minha,
depois levá-la para o quarto e repetir todas as delícias que fizemos
na tarde anterior.
Cumprimentei-as e subi para minha suíte o mais rápido que
consegui, controlando o homem das cavernas que queria despertar
em mim, ir até a garota, jogá-la sobre meus ombros e levá-la
comigo.
— Porra, isso vai ser mais complicado do que supus —
resmunguei já debaixo do chuveiro.
Foi difícil me concentrar no trabalho naquele dia e no meio da
manhã, quando Elaine apareceu no escritório, perdi a batalha que
estava travando comigo mesmo.
— Com licença, Leo, posso entrar? Dona Ébia pediu que eu
trouxesse seu café — ela falou, após bater de leve na porta e
entreabri-la.
— Claro, entre. — Levantei e fui até ela para a ajudar.
Assim que passou, fechei a porta, peguei a bandeja de suas
mãos e a levei até a mesa.
— Vi que ela colocou um pedaço do bolo da mamãe aí.
— Que ótimo! Ele está delicioso. Ontem depois que você foi
embora, eu o experimentei. Agradeça a sua mãe por mim.
— Pode deixar. Ela ficará feliz em saber que gostou.
— A propósito, já está tudo certo com o plano de saúde de
vocês. Devem receber as carteirinhas na próxima semana. E não há
nenhum prazo de carência para consultas e exames, ok?
— Obrigada, Leo. Nunca serei capaz de agradecê-lo o
suficiente pelo que está fazendo por nós.
— Não que seja necessário, mas existem maneiras bem
interessantes de você me agradecer — falei de forma sedutora,
estreitando nossa distância, com os olhos grudados na boca rosada
e carnuda de Elaine.
— Não deveríamos... — Ela ficou ofegante e a voz saiu fraca.
— Por que não? Você não está a fim?
— Imagina, não é isso. Mas é que estamos em horário de
trabalho, tenho muita coisa pra fazer e também não quero te
atrapalhar.
— Não vou conseguir me concentrar em nada se não te beijar
agora mesmo.
— Ah, minha nossa! — Arfou quando passei uma mão em sua
cintura e a outra na sua nuca, reivindicando-a para mim.
Beijei-a com urgência e Elaine correspondeu com a mesma
intensidade.
— Ah, pequena, domingo está longe demais. Eu quero você
agora. — Enfiei a mão dentro da sua calça legging passando os
dedos por debaixo da calcinha até encontrar seu sexo.
Massageei o ponto sensível, sentindo-o intumescer ao meu
toque. Elaine gemeu, tombando a cabeça para trás.
— Afaste as pernas — ordenei e ela obedeceu. Então penetrei
sua vagina com o dedo médio. Ela estava quente, molhada e
pulsante. — Você quer isso tanto quanto eu — constatei, trazendo
sua cabeça de novo para perto da minha, encarando-a aflito de
tanto desejo.
— Eu quero! Me coma agora, Leo. Forte e bruto como você
gosta.
— Cacete, menina! Você será minha perdição. — Abaixei suas
calças e a virei de costas.
Elaine se apoiou na mesa e arrebitou bem a bunda para mim,
alucinando-me ainda mais.
Peguei um preservativo que havia colocado no bolso, como se
previsse que algo assim pudesse acontecer, rasguei o envelope,
libertei minha ereção, revestindo-a em seguida e a penetrei de uma
vez, forte e fundo, em uma estocada vigorosa.
Elaine gemeu e rebolou contra meu pau.
— Gostosa! — Dei um tapa naquele traseiro delicioso.
Com uma mão me segurei em seu quadril e com a outra
agarrei seu cabelo, puxando-o de leve. Por mais que aparentemente
a dominasse, no fundo estava a cada segundo mais rendido por ela.
Algo se agitou dentro de mim. Tesão duelando com a culpa,
despertando meu lado mais selvagem e sombrio. Quanto mais me
dava conta de como gostava de Elaine, mais me sentia irritado
comigo mesmo por permitir que aquilo acontecesse, e mais fortes
minhas investidas ficavam.
Não demorou para que ela estremecesse e atingisse o clímax.
Fora de mim, continuei investindo como um animal descontrolado e
raivoso.
Eu não mereço ser feliz! Não mereço nada de bom! Martirizei-
me, descontando na minha diarista a fúria e a culpa que me
assolavam.
Quando, por fim, gozei também, saí dela e me livrei da
camisinha.
Elaine continuou na mesma posição, apoiada na mesa.
— Eu te machuquei? — Virei-a para analisá-la, atormentado
com aquela possibilidade. Eu não merecia ser feliz, mas ela também
não merecia minha violência. — Desculpa se fui muito bruto, Elaine,
eu perdi a cabeça. — Puxei-a para um abraço apertado.
— Você não me machucou, mas senti que estava descontando
sua raiva em mim. — Ela se afastou para me encarar com o
semblante sério e os olhos marejados. — Acha errado o que está
acontecendo entre nós? Está se martirizando por isso, Leo?
— Ah, pequena, eu... me perdoa! Não sei lidar com o que
estou sentindo e não tenho o direito de bagunçar sua cabeça, sua
vida, nem magoar seu coração. Acho melhor pararmos por aqui.
Essa história de amizade colorida não vai dar certo. De um jeito ou
de outro vou acabar te machucando.
Ela fez um discreto aceno de concordância, suspendeu a calça
e se recompôs.
— Tudo bem. Talvez seja mesmo melhor assim. — Olhou-me
zangada e triste, deixando-me ainda mais aturdido. — Com licença,
vou terminar meus afazeres.
Logo que ela saiu do escritório, eu me senti um merda.
Que porra eu fui fazer?
Custei a me concentrar no que precisava e no final da tarde,
quando dei o expediente por encerrado, troquei de roupa e fui correr
na praia. Era aquilo ou encher a cara de uísque. Precisava de
alguma coisa que ajudasse a aplacar aquela agonia dentro de mim.
Quando retornei para a cobertura, para minha sorte, Elaine e
dona Ébia já tinham ido embora.
Depois de uma ducha morna, fui até a sala tocar piano. Escolhi
as canções mais lamuriosas que eu conhecia. A solidão e a
melancolia eram minhas melhores companhias.

Na quinta-feira, a fim de evitar um encontro com minha


diarista, decidi ir trabalhar presencialmente, além do mais, tinha
prometido para Marcelo que cuidaria do que fosse preciso na Vida
Nóbile na sua ausência.
O dia foi puxado o que ajudou a manter minha mente ocupada,
e só não foi melhor porque acabei tendo uma discussão com meu
primo logo pela manhã.
— A que devemos a honra da sua presença, já que o bonitão
se acha melhor que todo mundo e trabalha de casa? — Ele
apareceu, sem ser convidado, na sala que eu dividia com Marcelo e
que havia sido dos nossos pais.
— Não encha o saco, Álvaro, e me deixe em paz! Veio até aqui
só pra me aporrinhar ou precisa de alguma coisa?
— Ao contrário de você, eu me importo com a Vida Nóbile e
estou sempre por aqui. Sinceramente, Leo, por que ainda insiste em
fazer parte da diretoria? Eu e Marcelo carregamos essa empresa
nas costas, por que não reconhece isso e se afasta de vez?
— Tá de brincadeira, né? Trabalhar de home office não
significa que não me importe com nossos negócios. Cumpro minha
carga horária como vocês, aliás, trabalho até mais que o Marcelo
que só faz meio período. Levo isso aqui com a devida
responsabilidade. Não sou um moleque!
— Acha mesmo que não? Apesar dos trinta e dois anos, se
comporta, sim, como um menino mimado que não consegue superar
a porra daquele acidente.
— A porra do acidente que matou a minha mulher! —
esbravejei, sentindo o sangue ferver.
— Lília deveria ter escolhido a mim e não a você. Eu a amava
e se estivesse comigo ainda estaria viva.
— Ah, de novo isso, seu desgraçado? — Caminhei feito um
louco até ele e o agarrei pelo colarinho. — E depois eu é que sou
um menino mimado? Lília nunca correspondeu aos seus
sentimentos, seu idiota!
— Será que não?
— Não me faça arrebentar a sua cara de novo. Dê o fora
daqui! Agora! — gritei, ao empurrá-lo em direção à porta.
Álvaro ainda deu um sorrisinho cínico antes de sair.
Maldito! Soquei a mesa e me joguei na cadeira.
Inspirei fundo e expirei pesado várias vezes, procurando me
acalmar.
Depois daquele episódio desnecessário, o dia transcorreu bem
e acabou sendo bastante produtivo.
Quando voltei para casa e percebi que já estava vazia, ao
invés de ficar aliviado, senti uma angústia esquisita apertar meu
peito.
Tomei banho e depois deitei na cama com o celular na mão.
Fiquei com vontade de mandar uma mensagem para Elaine e pedir
perdão mais uma vez e que voltássemos com o nosso lance de
amizade colorida. Só que seria uma péssima decisão. Faltava
menos de um mês para ela prestar a prova do ENEM e a última
coisa que precisava era de um fodido como eu ferrando sua cabeça.
Ela merecia fazer uma boa nota e conseguir entrar para a tão
sonhada faculdade de Direito. Elaine merecia um mundo de
conquistas e não seria eu a atrapalhá-la.
No domingo, Marcelo voltou de viagem e passou para me ver.
— Que cara é essa, irmão? Está com olheiras profundas.
Parece que faz dias que não dorme direito. Aconteceu alguma
coisa? — ele questionou com o semblante preocupado, logo que
abri a porta.
— Realmente não tenho dormido direito.
— Quer conversar sobre isso? Talvez falar lhe ajude de
alguma forma.
— Tem razão, mano. Vamos até a sala. Vou fazer café, daí te
conto tudo enquanto o tomamos.
Ele me acompanhou e depois que preparei duas xícaras de
expresso, na cafeteira que continuava no bar, acomodamo-nos no
sofá.
— Desembucha, bro, sou todo ouvidos!
— Fiz merda!
— Isso já deu para perceber. Tem a ver com a sua diarista?
Assenti e suspirei fundo. Depois de tomar um gole da bebida
quente, relatei para o meu irmão os últimos acontecimentos.
— Caralho, Leo! Mas e aí? Você não vai conversar com ela e
dizer que está arrependido?
— Estou mesmo arrependido, mas não posso fazer isso agora.
Ela precisa de paz para se concentrar nos estudos e assim se sair
bem na prova.
— Irmão, você acha mesmo que depois de tudo o que
aconteceu a garota vai estar em paz? Tá de brincadeira comigo, né?
— E o que acha que eu devo fazer, então?
— O que o seu coração estiver pedindo.
— Como se eu tivesse um! — Ri, sem humor.
— Deixe de ser trouxa, todo mundo tem um e o seu, na
verdade, é dos grandes. Mas enfim, o que quis dizer é pra fazer o
que a sua consciência mandar.
— Mas é justamente ela que está me obrigando a me manter
longe.
— Leo, meu querido irmão, se gosta dessa moça do tanto que
parece e quer que ela esteja bem e equilibrada para manter o foco
no que precisa, trate logo de se resolver com ela. Peça desculpas e
assuma que quer continuar com o envolvimento que estavam tendo.
— Tenho minhas dúvidas se isso seria certo.
— É o que você quer?
Assenti, pois não conseguiria negar aquilo.
— Então é o certo, cara. Talvez ela mesma nem queira mais se
envolver com você, mas acho que precisam pelo menos conversar.
— Vou pensar sobre isso e amanhã eu decido o que falar com
ela.
— Lembre-se do que eu já te disse antes: permita-se!
Terminamos nosso café, ele se despediu, dizendo que estava
cansado da viagem, e foi embora.
Fiquei sozinho com a agitação dos meus pensamentos.
O que eu faço agora? O que você quer de nós, Elaine? Sente
minha falta, ou está melhor sem mim?
Eu sabia que deveria esquecer Leonardo, mas estava difícil
tirá-lo da cabeça. De alguma forma, ele gostava de mim, mas não
se permitia se envolver. Eu deveria seguir em frente, concentrar-me
nos estudos e na prova do ENEM que se aproximava, mas toda vez
que fechava os olhos, recordava do seu semblante triste e
atormentado.
Que merda! Revirei na cama de um lado para o outro na noite
seguinte, agitada demais para conseguir dormir.
Levantei mais cedo que o costume no sábado, sentindo-me um
trapo. Precisando espairecer, fui caminhar na pracinha perto de
casa. Minha mãe ainda não tinha acordado, então evitei fazer
barulho.
Ao retornar, estava ainda mais agitada do que quando saí.
Se eu não conversar com alguém sobre o que estou sentindo,
vou ficar louca!
Peguei o celular e liguei para Érika. Ela atendeu meio
sonolenta, ainda devia estar na cama, mas quando eu disse que
precisava desabafar, minha querida amiga pediu que eu fosse até
sua casa. Deixei um bilhete avisando mamãe e saí de novo.
— Oi, Nane! Entre. O que aconteceu? — ela perguntou, ao
atender a porta, olhando-me preocupada, ainda vestida de pijamas.
— Seus pais estão em casa?
— Não, estamos sozinhas, fique tranquila. Eles acabaram de
sair para irem ao supermercado, devem demorar para voltar. —
Venha, vamos até a cozinha. Vou preparar um café e a gente
conversa.
— Eu te acordei quando liguei?
— Acordou. Esqueci de colocar o celular no silencioso ao
deitar, mas não tem problema. Pela sua voz, percebi que estava
agoniada, precisando conversar, por isso pedi que viesse logo,
afinal, amigas são pra essas horas, né? Sente aí e me conte o que
aconteceu. Tem a ver com o patrão gostosão?
— Tem. Nós transamos na quinta e de novo no domingo.
— Não acreditoooo! E me conta isso só agora, cachorra?
— Desculpa, amiga, até tentei falar antes, mas coincidiu com
aqueles plantões malucos seus emendados um no outro.
— Afff... nem me lembre! Ainda bem que vou receber hora
extra. Mas e aí, como foi?
— Foi perfeito! — Suspirei com as recordações.
— Mas por que essa aflição, então? O que rolou depois?
— Transamos na quinta à tarde. Dona Ébia precisou sair mais
cedo para ir ao médico, daí ficamos sozinhos no apartamento. Fui
limpar a estante dele e quando a escada balançou e eu estava
prestes a cair, Leo me pegou no colo. Daí acabamos nos beijando e
fomos parar na cama. Depois combinamos um lance de amizade
colorida.
— Adoro!
— Também achei que era uma boa ideia, pelo menos assim eu
poderia transar com ele de novo, porque vou te contar uma coisa:
que delícia de homem!
— Uhul! Feliz demais por sua primeira vez ter sido incrível.
Toda mulher merece ser bem comida.
— Nesse quesito não posso reclamar de nada. — Abanei-me e
nós duas rimos. — Daí combinamos de nos encontrarmos no
domingo. Passamos a tarde juntos e foi melhor ainda do que da
primeira vez.
— Poxa, amiga, parece que estava indo tudo tão bem, quando
foi que a coisa desandou?
— Na segunda-feira acabamos nos agarrando no escritório
dele e enquanto me fodia, ele ficou mais raivoso do que o habitual.
Daí me pediu desculpas e disse que não poderia continuar com
aquilo. Amiga, parecia que ele estava se culpando por se envolver
comigo e se puniu e me puniu também por estar sendo bom. Como
se ele não merecesse, não pudesse ser feliz, entende?
— Caramba, migs, que maluquice! Mas e agora? Como vocês
ficarão?
— Não existe mais nós. Na quinta ele foi trabalhar presencial e
já te contei que ele costuma fazer home office, né?
— Já sim. Acha que ele saiu de casa para evitar te ver?
— Acho. — Suspirei fundo, desanimada. — Eu deveria
esquecer tudo isso, sabe? Fazer de conta que nunca aconteceu e
seguir com a minha vida, mas está difícil não pensar nele. Fiquei
irritada, magoada até, na hora que Leo disse que deveríamos parar
por ali, mas meu coração aperta quando recordo do sofrimento
estampado em seu semblante.
— Caramba, Nane! Olha, dê tempo ao tempo. Sinceramente,
migs, acho que a história de vocês está só começando. Mas o cara
pelo visto é bem machucado pelas coisas que aconteceram no
passado. Sente culpa só de pensar em ser feliz. Muito louco isso,
porque já tem anos que a esposa morreu e foi um acidente, né?
— Foi sim. Ele estava dirigindo, capotou quando um animal
cruzou a estrada e ele perdeu a direção.
— É... o bonitão não está conseguindo superar o trauma.
— Não mesmo. Qualquer outra no meu lugar cairia logo fora,
né?
— Depende. O que o seu coração diz?
— Para eu não me afastar.
— Então, pronto, amiga. É isso que deve fazer. Respeite a
decisão dele, mas continue por perto. Uma hora as barreiras que
Leonardo criou se romperão.
— Nem imagino como será nosso encontro na segunda-feira.
Se é que ele estará em casa.
— Mantenha a calma e não fique pensando muito nisso. Deixe
acontecer.
— Vou tentar!
— Ah, antes que eu me esqueça, Wesley pediu pra te convidar
para uma noite de sushi no apartamento dele hoje. Ele fez um curso
e está todo animado para nos mostrar suas habilidades com a
culinária japonesa.
— Ah, que fofo! Adoro sushi e fico muito honrada com o
convite. No mais, será bom para espairecer.
— Te pego às oito, então. Pode ser?
— Pode sim. Ficarei te esperando. Agora vou embora que hoje
é dia da faxina lá em casa. Dona Cirlleni já deve estar me
esperando para começarmos a limpeza.
— Ela está bem?
— Está sim, graças a Deus!
— Mande um beijo por mim.
— Pode deixar. Até mais tarde, Kinha.
— Até!
Despedi-me dela com um abraço e saí.
Na volta para casa, segui pensando na nossa conversa. O
melhor a fazer era mesmo dar tempo ao tempo.

No horário combinado, Érika passou para me buscar.


Seguimos ouvindo Iza no rádio do carro e quando chegamos
ao prédio de Wesley, assim que nossa entrada foi autorizada,
subimos e ele nos recebeu à porta.
— Que bom que você veio, gata! — Wesley me cumprimentou
com um abraço e um beijinho no rosto. Depois fez o mesmo com
Érika.
— Obrigada pelo convite. Adoro sushi! Além disso, confesso
que já estava com saudades de você.
— Eu também de você! Espero que goste dos que preparei.
Vamos entrar!
Eu e Érika o acompanhamos e Wesley orientou que nos
sentássemos os três à mesa.
Assim que nos acomodamos, ele serviu copinhos com saquê e
entregou um para cada uma de nós.
— Brindemos à vida, à amizade, ao amor e às oportunidades!
— Ergueu o dele em nossa direção e tilintamos.
À nossa frente estava uma linda travessa em formato de barco,
cheia de sushis.
— Fiquem à vontade para se servirem. Temos hossomaki de
salmão cru e também de manga e pepino, e hot rol de salmão
grelhado com cream cheese.
— Hmmm, que delícia! Quero comer de todos! — comentei
empolgada e Érika se manifestou, dizendo “eu também!”.
Nós três nos servimos e começamos a comer.
— Parabéns, amigo, você arrasou. Estão maravilhosos! —
Kinha comentou e eu concordei.
— Ah, obrigado, meninas, fico muito feliz que tenham gostado!
Seguimos tomando saquê, comendo sushi e conversando.
Acabei contando para Wesley o que rolou entre mim e Leo e, assim
como minha amiga, ele disse que achava que ainda tinha muita
coisa para acontecer entre nós, mas que o melhor era mesmo dar
tempo ao tempo.
A noite foi muito agradável. Voltei para casa me sentido mais
em paz.
Consegui manter a mente focada nos estudos no domingo,
mas na segunda-feira, ao chegar à cobertura e dar de cara com
Leonardo já vestido para trabalhar, meu peito se apertou. Será que
ele sairia de novo de casa para fugir de mim?
Na segunda-feira, acordei mais cedo que o costume, decidido
a conversar com Elaine. Fui correr na praia, fiz meu treino funcional
e quando ela chegou para trabalhar, eu já tinha tomado banho e a
estava aguardando na sala.
— Bom dia! — cumprimentei ela e dona Ébia. — Eu gostaria
de falar um instante a sós com você, Elaine. Poderia me
acompanhar até o escritório?
— Claro. — Ela assentiu e me olhou receosa.
— Se me dão licença, meninos, vou cuidar dos meus afazeres.
— Dona Ébia se retirou e eu guiei minha diarista até meu local de
trabalho.
Assim que entramos, fechei a porta e pedi que ela sentasse.
Ao invés de ocupar minha cadeira giratória, sentei ao lado dela.
— Como passou o final de semana? — perguntei, grudando
meus olhos nos seus.
— Bem. E você?
— Sendo honesto, agoniado. Sem conseguir te tirar da
cabeça.
Ela engoliu em seco e remexeu as mãos.
— Elaine, me desculpe pelo que aconteceu na semana
passada. Sei que sou um cara complicado, mas a última coisa que
quero é te magoar ou te atrapalhar com seus objetivos de vida. Eu
deveria me manter longe, não acho certo te envolver na bagunça
que eu sou, mas estou sentindo tanto a sua falta! — Segurei suas
mãos, que estavam frias. — Se ainda quiser, se achar que deve,
poderíamos reatar o que estávamos tendo?
— Ah, Leo... — Ela tremeu o queixo e fiquei com medo que
começasse a chorar.
Que merda eu estava fazendo com a garota?
— Desculpe. Eu não deveria estar dizendo essas coisas, não é
mesmo?
— Não — ela respondeu fazendo meu peito apertar. — Não é
isso. Na verdade... também senti sua falta, Leo.
— E o que me diz quanto a voltarmos a...
— Termos uma amizade colorida? — ela completou a frase e
esboçou um sorriso.
— Bem... isso, sim.
— Certo. Eu quero, mas com uma condição.
— Diga! — Aflito, acariciei seu rosto. Disposto a concordar
com qualquer coisa para voltar a tê-la em meus braços.
— Quero que prometa que não vai se martirizar pelo que
acontecer entre nós. Que não vai se culpar e nem descontar sua
fúria em mim. Por mais que ache que não merece ser feliz de novo,
você é digno disso! Ok?
— Aquilo que aconteceu na segunda passada, não vai se
repetir de novo. Prometo!
— Está bem. Ficamos combinados, então.
— Obrigado por me dar essa chance. — Beijei-lhe os lábios
com ternura e afaguei seu cabelo. — Vem passar o domingo
comigo? Digo, o dia todo. A gente poderia ir à praia cedinho, depois
almoçarmos juntos e passarmos a tarde transando, o que acha da
ideia?
— Perfeita! É um convite irrecusável. — Virou o rosto para
beijar a palma da minha mão. — Agora deixa eu ir cuidar da casa.
— Me faz companhia no final da tarde, enquanto toco piano?
— Vou adorar isso! — Ela levantou, beijou minha testa e
caminhou em direção à porta.
Fiquei a observando deixar o escritório, sentindo um frenesi
tomar conta de mim. Eu era um fodido, mas ela ainda me queria!

Naquele fim de tarde, tive o prazer de ter a companhia de


Elaine enquanto tocava piano. Ao nos despedimos, roubei-lhe um
beijo que, apesar de rápido, foi quente e deixou meu corpo em
chamas.
Esperei ansiosamente pelo domingo. Assim que acordei, bem
cedo, mandei mensagem para ela, oferecendo-me para buscá-la e
aproveitei para lembrá-la de pegar um biquíni. Elaine recusou no
início, porém acabou aceitando.
— Bom dia, pequena! Preparada pra passar o dia inteiro
comigo? — perguntei, logo que ela entrou no carro.
— Bom dia! Preparada e empolgada! E você?
— Também estou animado, acho que será bem bacana.
Vamos aproveitar que ainda é cedo pra curtir a praia vazia?
— Sim. Já vim até com o biquíni por baixo da roupa e trouxe
outra na bolsa pra poder me trocar depois.
— Se depender de mim, só vai precisar dela na hora de voltar
pra casa. — Dei uma piscadela safada para ela, que sorriu e se
aproximou para beijar meus lábios com suavidade.
Voltamos para a Barra, estacionei o carro na garagem do
prédio, peguei as toalhas que deixara no banco de trás e fomos a pé
para a praia. Caminhamos um pouco, depois entramos no mar, que
estava gelado.
— Meu Deus, está muito frio! — Elaine deu um gritinho e se
encolheu toda. Estava linda no pequeno traje de banho vermelho.
— Deixa que eu te esquento! — Fui até ela e a envolvi em
meus braços. Beijei-a com voracidade, passeando as mãos por seu
corpo gostoso.
— Acho melhor voltarmos para o seu apartamento antes que
sejamos presos por atentado ao pudor.
— Tem razão, mesmo porque já estou louco pra me enterrar
em você.
— Tarado! — Prendeu o lábio inferior entre os dentes e me
olhou com malícia.
— Quem manda ser tão gostosa? — Dei mais um beijo nela,
saímos da água, secamo-nos e voltamos para o meu apartamento.
Ao chegarmos ao prédio, peguei a chave do carro que deixei
na portaria e fomos até a garagem resgatar nossas coisas: meu
celular e minha carteira e a bolsa dela, depois seguimos direto para
a cobertura.
Subimos de mãos dadas até a suíte de hóspedes e tomamos
banho juntos, já iniciando as preliminares debaixo do chuveiro.
— Quero ver você se tocando — falei quando voltamos para o
quarto e ela deitou nua na cama.
— Não! — Negou também com a cabeça e fez uma cara
engraçada, numa mistura de constrangimento e desespero.
— Por que não? — Sentei na poltrona de frente a ela. — Vou
adorar assistir a essa cena daqui. Faria isso por mim? — Deslizei a
mão pelo meu membro que, desde nossas carícias no banheiro, já
estava ereto.
— Não vai achar isso estranho?
— Nem um pouco. Na verdade, será bem excitante!
— Poderia pelo menos colocar uma música antes?
— Claro, pequena, tudo o que você quiser.
Pedi a Alexa, a inteligência artificial da Amazon, que abrisse no
meu serviço de streaming uma playlist que eu criara no dia anterior,
com as músicas que eu tocara ao piano para Elaine.
Depois fechei a parte fina das cortinas, diminuindo um pouco a
claridade do quarto, com o intuito de deixar a pequena mais à
vontade.
Minha diarista me olhou insegura, mas após respirar fundo,
acariciou os próprios seios, de forma meio tímida, mas tão sexy que
me fez ofegar.
— Linda! — elogiei, incentivando-a a continuar.
Ela se acomodou melhor, recostada nos travesseiros, dobrou
os joelhos e afastou as pernas. A visão foi tão erótica que tive de me
controlar para não ir até lá.
— Você é gostosa demais! — rosnei entredentes e ela me deu
um sorriso safado.
Então uma das mãos escorregou até sua intimidade e ela
começou a massagear seu ponto sensível. Fechou as pálpebras e
gemeu baixinho.
— Olhe pra mim — pedi, hipnotizado pela cena que se
desenrolava à minha frente.
A pequena obedeceu, levou os dedos à boca para molhá-los e
voltou a se tocar.
— Caralho! Você é perfeita demais. Afaste mais as pernas e
introduza um dedo na sua vagina.
Ela fez o que pedi e gemeu mais uma vez, manhosa,
tombando de leve a cabeça para trás. Depois endireitou o pescoço e
voltou a me encarar. Manteve a palma da mão sobre a vulva e seu
dedo médio entrava e saía da vagina, num movimento ritmado. A
outra mão acariciava os seios. Elaine me fitava com lascívia e
quando estremeceu, ao atingir o clímax, um sorriso mole brotou em
seus lábios.
— Agora é a minha vez de te dar prazer — falei com a voz
rouca de desejo e, como um predador diante à mais deliciosa presa,
fui até ela e a beijei com devassidão.
Ao abandonar seus lábios, minha boca percorreu um caminho
descendente. Chupei seu pescoço, colo, seios, barriga, até alcançar
sua intimidade. Lambuzei-me com seu gozo, então me afastei
apenas para colocar o preservativo e logo voltei, enterrando-me de
uma vez em seu interior quente, que latejava, apertando meu pau.
Ficamos naquela posição por um tempo, depois a coloquei de
quatro e a penetrei novamente.
— Que delícia! Pode ir mais rápido e mais forte, eu gosto —
balbuciou, meio fora de si.
— Você que manda, pequena! — Fiz o que ela queria e não
demorou para que atingisse o clímax outra vez, levando-me
consigo.
Desabamos suados e ofegantes na cama, virados de lado, de
frente um para o outro. Livrei-me do preservativo e a encarei,
embasbacado. Estava linda com o rosto ruborizado e a feição
satisfeita.
— Transar com você é sempre incrível! — comentou,
acariciando meu rosto.
— Sou um sortudo por tê-la em minha cama. — Dei um beijo
suave em seus lábios, depois a puxei para mim, aconchegando-a
em meu peito.
Relaxados, acabamos pegando no sono.
Sonhei com o dia do acidente. Eu subia a serra para Itaipava,
o rádio do carro estava ligado, tocava Bruno Mars e Lília cantarolava
junto com a música. Estávamos felizes. De repente, um animal
atravessou a estrada, perdi o controle da direção. Ouvi o grito
desesperado da minha esposa, depois tudo foi uma sequência de
estrondos e solavancos, enquanto o carro capotava.
— Nãããão! — gritei horrorizado.
— Leo, acorda, você está tendo um pesadelo. — A voz
preocupada de Elaine me fez despertar. Abri as pálpebras e ela
acariciou meu rosto. — Está tudo bem, foi só um sonho ruim.
— Ah, pequena, eu nunca vou esquecer aquele acidente. Faz
cinco anos que volta e meia sonho com o que aconteceu naquela
noite. — Uma agonia me invadiu. Tomado pelo remorso, pesar e
saudade, fiquei tão vulnerável que não consegui conter as lágrimas.
— Eu sinto muito, Leo. — Ela me puxou para si e me acolheu
em seus braços, acariciando-me as costas e o cabelo. — Pode
chorar, extravase essa dor que o consome. Estou aqui com você —
falava baixinho, com a voz doce. — Foi mesmo uma tragédia, mas
como disse, foi um acidente. Você não teve culpa de nada. É um
homem bom, merece se livrar desse remorso.
Enquanto ela me acalentava, aos poucos meu tormento foi
amenizando, até que consegui parar de chorar.
— Obrigado. Fiquei muito revoltado com Deus depois de tudo
que houve, perdi minha fé, a alegria, a esperança. Mas você tem
sido uma espécie de anjo em minha vida. Talvez Ele tenha dado um
jeito de fazer nossos destinos se cruzarem — falei ao me afastar um
pouquinho para que pudéssemos nos olhar.
— Estou feliz por tê-lo conhecido, Leo. — Beijou meus lábios
com suavidade. — Você também tem sido algo do tipo pra mim. Me
deu um trabalho quando eu já estava me desesperando atrás de
outras casas para limpar, um plano de saúde para mim e mamãe e
as melhores transas que uma mulher poderia sonhar ter — falou a
última parte de forma maliciosa, passeando as mãos pelo meu peito
nu.
— Gostosa! Pensando bem, já não sei se é uma anjinha ou
uma diabinha. — Mordisquei seu queixo e em seguida chupei seu
pescoço.
— Posso ser o que você quiser. — Mudou nossas posições na
cama, colocando-me deitado de barriga para cima e sentou sobre
meu quadril, rebolando, provocante.
— Mulher insaciável — rosnei, sentindo meu pau despertar e
agarrei sua cintura, pressionando-a para baixo, para senti-la melhor.
— Agora que você me mostrou o quanto sexo é bom, fiquei
viciada.
— Viciada em sexo ou em mim? — questionei, apalpando os
seios empinados.
— Nos dois! — Elaine se esfregou mais uma vez contra meu
membro e então abaixou o tronco para me beijar na boca.
Recomeçamos tudo e quando nós dois gozamos juntos,
nossas barrigas reclamaram de fome.
— Vou pedir comida pra gente — informei, resfolegante. — Daí
enquanto esperamos, tomamos banho.
— Será que dá tempo de uma rapidinha debaixo do chuveiro?
— A pergunta feita em tom travesso me fez sorrir.
— Desse jeito você vai acabar comigo. — Arregalei os olhos,
em falso espanto e ela riu.
— Estava só te testando. Também preciso de um descanso. —
Mostrou a língua e deu uma piscadela.
— Já estava ficando com medo de se tornar um monstrinho,
uma ninfomaníaca — comentei em tom zombeteiro.
— Quem manda ser tão gostoso! Estou saciada por agora,
mas podemos repetir essas delícias todas mais tarde.
— Mais tarde... com toda certeza vou querer te foder de novo
mais tarde, pequena. — Levantei-me e a puxei comigo.
Quando ela passou à minha frente, em direção ao banheiro,
dei um tapa em sua bunda. Elaine soltou um gritinho e seguiu
rebolando.
Não tinha dúvidas de que aquela garota seria a minha
perdição.

Pouco depois que saímos do banheiro, nossa comida chegou.


Vesti só uma bermuda, colocando um preservativo no bolso, por
precaução, e emprestei uma camiseta para Elaine. Ela ficou muito
sexy só com a minha peça de roupa. Almoçamos e tomamos
sorvete.
— Toca um pouco pra gente? — pediu ao terminarmos a
sobremesa.
— Claro. Vamos até a sala de visitas. — Levantei e estendi a
mão para ela.
Caminhamos de mãos dadas e pedi que sentasse ao meu
lado, no banco de frente ao instrumento.
Toquei Fantasie in D minor K.397, do Mozart; Nocturne Op.9,
nº 2, do Chopin; e Conversations in the dark, do John Legend.
Cantamos juntos a última e, ao final, demos um beijo lento, terno e
sensual.
Depois fizemos pipoca e fomos para a sala de TV. Assistimos
a um filme que tinha algumas cenas quentes e ficamos tão
excitados que acabamos transando no sofá.
Passamos um dia delicioso juntos e quando a deixei em casa e
voltei sozinho para a cobertura, senti um vazio esquisito no peito.
Queria que Elaine ainda estivesse ali comigo.
A amizade colorida com Leo ia muito bem. Passamos as
semanas seguintes disfarçando na frente de dona Ébia que
tínhamos qualquer coisa um com o outro, mas roubando alguns
beijos aos finais das tardes das segundas e quintas quando eu fazia
companhia para ele ao tocar piano. Nossos encontros aos domingos
seguiam deliciosos. O sexo era sempre incrível e quente, mas havia
algo maior, estávamos cada vez mais conectados. Existia uma
cumplicidade inegável entre nós.
Mamãe já estava desconfiada de que minhas saídas eram, na
verdade, para me encontrar com algum rapaz, mas achei melhor
não revelar a ela que o motivo do meu sorriso bobo era meu patrão.
Continuei estudando firme e quando julho chegou, fiz uma
excelente prova do ENEM. A nota alta me permitiu entrar para o
curso de Direito em uma faculdade estadual.
Mamãe, Érika e dona Ébia organizaram uma festinha lá em
casa para comemorarem comigo. Minha amiga convidou Wesley, o
que achei ótimo. Todos estavam tão felizes quanto eu por minha
conquista.
As comemorações não paravam. Leo também ficou muito
contente pela minha aprovação e me chamou para jantar fora em
um restaurante chique no sábado seguinte. Quando aleguei que não
teria roupa para acompanhá-lo em um lugar assim, ele disse que eu
não me preocupasse com aquilo.
— Filha, fizeram uma entrega pra você hoje à tarde — mamãe
contou quando cheguei, após a faxina da dona Suleide.
— Ah, é? Não estava esperando nada...
— Deixei a caixa na sua cama.
— Obrigada, mãezinha, vou lá ver o que é. — Dei um beijo
nela e saí curiosa em direção ao quarto.
A tal caixa era grande e envolta por uma fita de cetim
vermelha. Quando a abri, não consegui conter as lágrimas de
emoção. Dentro dela havia um vestido preto, de renda. Peguei a
peça de marca cara e coloquei na frente do meu corpo. Tinha um
modelo estilo tubinho e ia até a altura dos joelhos, com uma fenda
na parte de trás. Era lindo e muito chique. Ainda havia um par de
sapatos de salto alto fino na mesma cor e uma lingerie de renda
vermelha, muito bonita e sexy, cheia de transparências.
Por baixo de tudo estava um bilhete que eu quase nem notei.
Com o coração sobressaltado, peguei-o para ler.

Pequena, como eu disse que não precisava se preocupar com


o que vestir amanhã à noite, tomei a liberdade de comprar esses
presentes para você. Espero que tenha gostado. Estou ansioso pra
te ver com eles.
Beijos,
Leo.

— Ah, meu Deus! — Dei um gritinho de empolgação.


— Quem te mandou o presente, filha? E o que era? — mamãe
quis saber, quase me matando de susto ao aparecer no meu quarto
sem fazer barulho.
Escondi a lingerie debaixo do travesseiro e me virei para ela.
— Olha que lindos, mãe! — Mostrei o vestido e os sapatos.
— Nossa, lindos mesmo! Parece coisa fina. Quem te deu? Seu
namorado secreto?
— Eu não tenho namorado secreto — resmunguei, sem
conseguir encará-la.
— Então por que não me apresenta o rapaz com quem está
saindo?
— Bem... porque... porque... hum-hum, como a senhora
mesma disse, estamos só saindo. Ainda não é nada sério. Se virar
namoro, prometo que o trarei aqui.
— Filha, estou um pouco preocupada com você. Fico muito
feliz de te ver alegre, saindo, suspirando apaixonada, mas estou
com receio de que esteja se envolvendo com quem não deveria.
— C-como? — Arregalei os olhos, assustada. Será que ela
suspeitava que meus encontros eram com meu patrão?
— Está envolvida com algum homem casado, Nane?
— Casado?! — Não consegui conter o riso diante de suas
suspeitas.
— Qual a graça? Isso é sério, filha. Não te quero envolvida em
encrenca — ralhou, brava.
— Fique tranquila, mãezinha. — Deixei os presentes sobre a
cama e segurei suas mãos. — Jamais me envolveria com um
homem comprometido.
— Fico aliviada por ouvir isso. Sei que não tenho direito de
invadir sua intimidade assim, mas saiba que não precisa ter receio
de me contar nada.
Aquiesci e dei um abraço nela.
Quando mamãe deixou o quarto, mandei uma mensagem para
Leo agradecendo os presentes e dizendo que tinha adorado tudo.
Ele respondeu na mesma hora, escrevendo que ficava feliz por eu
ter gostado e que me buscaria por volta de 20h30 no dia seguinte.

No sábado, já acordei empolgada e fui caminhar na praça


perto de casa. Logo que cheguei, ajudei mamãe com a faxina e
depois do almoço comecei a me preparar para a noite. Coloquei a
depilação em dia, fiz as unhas e uma hidratação poderosa no
cabelo.
Érika apareceu para me visitar quando eu tinha acabado de
enxaguar o creme.
— Meu Deus, que vestido maravilhoso! — comentou ao sentar
na minha cama e eu mostrar os presentes para ela. — Será que é
hoje que o gato vai te pedir em namoro?
— Ah, Kinha, juro que adoraria ouvir isso dele, mas estou
perdendo as esperanças. Faz quase dois meses desde que
começamos a transar e, pelo visto, Leo só quer mesmo ficar no
lance da amizade colorida.
— Foda! Porque pelo que me conta, vocês dois têm uma
ligação muito mais forte do que carnal, né?
— Temos sim. Cada dia que passa me sinto mais conectada a
ele e percebo que se abre mais, me mostra mais de si, mas... —
suspirei pesarosa —, acho que Leo nunca vai assumir outra mulher,
entende?
— Caramba! Um porre, isso. Achei que o gato fosse conseguir
deixar o luto, a culpa, essa coisa toda para trás e seguir em frente,
só que parece que está mais difícil do que supus.
— Nem me fale! Mas também não posso reclamar. Eu aceitei
essa situação e gosto muito de estar com ele. Vou levando
enquanto achar que vale a pena.
— Você merece um namorado que queira te exibir pra todo
mundo.
— Merecemos, migs! E você, ainda está saindo com o carinha
novo que conheceu naquela festa que foi com seus amigos?
Fazia três semanas que Érika tinha ficado com um rapaz que
descreveu como o mais gostoso e lindo com quem já esteve.
— Ele me chamou pra sair hoje. Também estamos nessa de
ficar sem compromisso.
— Que tenhamos uma boa noite de sábado com nossos boys!
— falei empolgada.
— Boa e muito quente! — ela completou e começamos a rir.
Fomos para a cozinha e fizemos um lanche com a mamãe.
Depois que Érika foi embora, tomei banho e comecei a me arrumar.
Às 20h Leo me mandou uma mensagem dizendo que estava
saindo de casa para me buscar. Menos de meia hora depois ele
chegou.
— Uau, você está ainda mais linda! — elogiou quando entrei
em seu carro.
— Obrigada. Estou mesmo me sentindo demais nesse vestido
e com esses sapatos.
— Colocou também a lingerie que te dei? — Estreitou as
pálpebras e umedeceu os lábios, malicioso.
— Uhum. — Aproximei-me e dei um selinho em seus lábios. —
Espero que goste do que vai ver.
— Já estou ansioso por isso. — Ele afastou meu cabelo e
mordiscou o pescoço, lambendo a pele em seguida, arrepiando-me
por inteira. — Quero muito te comer, mas primeiro vamos jantar em
grande estilo. Você merece! — Ajeitou-se no banco do motorista.
Fiz o mesmo, colocamos os cintos, ele deu a partida no motor
e saímos.
Leo me levou a um restaurante muito chique, com uma
decoração elegante e romântica. O local exibia lustres enormes de
cristal e sobre as mesas haviam castiçais altos com velas acesas e
vasinhos de flores cor de champanhe e rosa.
Fomos recebidos pela hostess que nos encaminhou até o local
reservado para nós. Leo puxou a cadeira para que eu sentasse e se
acomodou de frente a mim.
A moça nos entregou os cardápios e disse que logo um
garçom viria anotar nossos pedidos.
Imaginei que o restaurante fosse caro, mas ao ver os preços
dos pratos, tive até uma vertigem.
— O que foi? Ficou pálida de repente. Não está se sentindo
bem? — Leo questionou com o semblante preocupado.
— Esses valores são absurdos! — respondi baixinho, com
receio de que outras pessoas ouvissem.
— Não se preocupe com isso, ok? — Ele sorriu e acariciou
minha mão sobre a mesa. — Eu posso pagar e você merece. Faz
parte do meu presente pela entrada na faculdade.
— Ah, Leo, você é tão... perfeito!
— Com certeza estou longe disso. Mas você me faz bem,
Elaine. Ao seu lado me sinto um cara melhor.
Sorrimos com cumplicidade e logo um garçom se aproximou
perguntando se já sabíamos o que queríamos. Percebendo que eu
seria incapaz de escolher qualquer coisa daquele cardápio, Leo fez
os pedidos por nós dois: um vinho branco frisante argentino, risoto
de palmito com alho-poró e filé de truta com molho de camarão.
Apesar de tanto a bebida quanto a comida estarem deliciosas
e o lugar ser lindo e aconchegante, ainda assim achei os valores
cobrados muito altos. Para aproveitar a noite sem culpa, procurei
não ficar pensando naquilo.
Depois do jantar, Leo me levou para seu apartamento.
Tomamos licor e ele tocou piano para nós.
— Durma aqui esta noite — pediu, surpreendendo-me.
— Eu não trouxe escova de dentes, nem outra roupa pra me
trocar. — Encarei-o, perplexa pelo convite.
— Pode usar a minha e amanhã cedo eu te levo pra sua casa.
Te quero pelada na cama, mas depois do sexo, se gostar de dormir
vestida, posso te emprestar uma camiseta. — Acariciou meu rosto.
Ainda estávamos sentados lado a lado no banco de frente ao piano.
— Fique comigo, pequena.
Seu jeito carinhoso e o olhar ardente me hipnotizaram. Eu
seria capaz de concordar com qualquer coisa que ele dissesse
naquele momento.
— Está bem, eu fico. Vou só avisar minha mãe.
Ele assentiu e eu levantei para pegar o celular na bolsa.
— Vamos para o quarto — Leo chamou quando encerrei a
ligação.
Aquiesci e entrelacei os dedos aos dele.
No mais íntimos de mim, desejei que ele me levasse para o
seu quarto, mas para minha decepção, mais uma vez me guiou para
o de hóspedes.
— Eu já volto — falou quando sentei na cama.
Leo saiu e logo voltou trazendo a escova de dentes, creme
dental e uma camiseta limpa. Deixou as coisas no armário e pediu
que eu ficasse de pé.
Enquanto beijava meu pescoço, abriu o zíper do vestido.
Livrou-se dele e se afastou para me olhar.
— Maravilhosa! — comentou, observando-me de cima a baixo.
Sentindo-me sexy e poderosa, dei uma voltinha à sua frente.
Então Leo me pegou no colo e me colocou na cama. Deitou
por cima de mim e me beijou com paixão.
Naquela noite o sexo foi mais calmo e terno, mas ainda assim
intenso e delicioso. Tomamos banho juntos depois, escovei os
dentes com a escova dele e vesti sua camiseta. Dormimos
abraçadinhos.
Enquanto o ouvia ressonar e o sono já chegava para mim
também, dei-me conta de que meu coração já era todo dele e o que
mais queria era ter o seu também.
Logo que as aulas de Elaine começaram, não demorou para
que eu notasse como ela parecia mais cansada do que antes.
— Você parece exausta — comentei, enquanto ela me fazia
companhia no final de uma tarde de quinta, era a segunda semana
dela na faculdade.
— Estou muito feliz por estar cursando Direito, só que por
receio de andar sozinha de ônibus à noite, arrumei um transporte
escolar e até que a van deixa todo mundo em casa, estou chegando
muito tarde e ainda preciso fazer os trabalhos da faculdade antes de
dormir, já que no dia seguinte levanto cedo pra trabalhar.
— Quantas horas você tem dormido por noite?
— Umas quatro, no máximo.
— Desse jeito vai acabar doente, pequena. — Observei-a,
preocupado.
— Mas não tem outra maneira, eu preciso do que ganho com
as faxinas. Aliás, talvez tenhamos que passar nossos encontros
para uma vez a cada quinze dias. Pois quando eu tiver que estudar
para as provas, ou até mesmo fazer algum trabalho para o curso,
vou ter que aproveitar os finais de semana pra estudar.
— Claro. Fique tranquila. A última coisa que quero é te
atrapalhar.
Ela aquiesceu e sorriu.
— Vou lá ver se dona Ébia já terminou. Não podemos atrasar
pra ir embora. Quando chegar em casa ainda preciso tomar um
banho antes da aula.
Anuí, ela se despediu de mim com um selinho nos lábios e
saiu.
Fiquei muito inquieto com a situação de Elaine. Era esforçada
e merecia o que estava lutando tanto para conquistar, mas não
aguentaria aquela rotina pesada por muito tempo.
Preciso ajudá-la de alguma forma.

Sem conseguir tirar da cabeça que eu precisava encontrar


alguma maneira de ajudar Elaine, acabei tendo uma ideia: oferecer
a ela um estágio de quatro horas diárias na Vida Nóbile. Precisaria
conversar com Marcelo e Álvaro antes, mas apesar de não me dar
bem com meu primo, não achava que ele se oporia àquilo.
Depois da minha corrida matinal na praia e de fazer meu treino
em casa, mandei mensagens para eles pedindo uma reunião por
videoconferência. Para meu irmão, expliquei antes o que eu queria e
ele me deu seu total apoio.
Conseguimos marcar a reunião para às 10h. Álvaro fez pouco
caso da situação inicialmente, no entanto depois acabou
concordando, dizendo que o setor jurídico estava mesmo
precisando de mais um estagiário. Com a aceitação dos dois, só
faltava fazer a oferta para Elaine.
Sem aguentar esperar até o domingo, mandei mensagem para
ela perguntando se eu poderia buscá-la depois da aula e
convidando-a para passar a noite comigo.
Elaine respondeu que topava, desde que eu a levasse em
casa no outro dia cedo. Adoraria passar o sábado com ela, mas
entendia que tinha suas obrigações, então concordei e pedi que me
enviasse o endereço da faculdade.
Meu dia foi cheio e quando dei o expediente por encerrado,
comecei a contar as horas para a noite.
Às 22h30 eu já estava no local que me passou. Aguardei
pouco mais de dez minutos até vê-la deixar os portões.
De calça jeans, blusinha regata, cabelo solto e carinha de
cansada, ela logo viu meu carro e veio na direção dele.
— Oi, boa noite! — cumprimentou ao entrar e me deu um
selinho nos lábios.
— Boa noite, pequena! Como foi a aula?
— Foi legal. No final das contas você ter querido se encontrar
comigo hoje foi ótimo, pois terei um trabalho pra entregar na
segunda e quero aproveitar o sábado e o domingo para fazê-lo, já
que agora estou acabada, nem se eu quisesse conseguiria me
concentrar. Não dou conta de mais nada esta noite.
— De nada mesmo? — questionei malicioso e afastei seu
cabelo do pescoço, mordiscando a pele exposta.
— Bem, para isso, acho que ainda me sobra um pouco de
energia — respondeu no mesmo tom provocante que o meu.
— Se quiser ficar quietinha, não tem problema. Prometo te
poupar e trabalhar por nós dois. Não vai nem precisar se mexer
para alcançar o céu. Eu sempre te levo até lá, não é mesmo?
— Convencido!
— Vai querer negar?
— Seria impossível fazer isso. — Sorrimos um para o outro
com cumplicidade, dei a partida e seguimos em direção à Barra.

— Está com fome? Pedi uma pizza pra gente, entregaram


antes de eu sair — falei logo que chegamos à cobertura.
— Estou esfomeada! Mas primeiro preciso ir ao banheiro.
— Claro. Fique à vontade. Vou ajeitar as coisas na mesa de
jantar pra gente. Prefere suco ou vinho?
— Hoje mereço uma taça de vinho!
— Perfeito. — Dei um beijo nela e fui em direção à cozinha.
Quando Elaine apareceu na sala de jantar eu já tinha
organizado tudo.
— Tenho uma proposta pra te fazer — falei após nos
sentarmos e servir vinho para nós dois.
— Ah, é? — Ela me olhou curiosa. — Que tipo de proposta,
senhor Leonardo Nóbile? — Tomou um gole do vinho e eu fiz o
mesmo. — Não vai me dizer agora que curte sadomasoquismo ou
aqueles lances de suruba, né?
— O quê? — Comecei a rir e quase engasguei. — Que
cabecinha indecente você tem, pequena!
— Nem acredito que estou presenciando uma risada sua. Que
delícia!
— Você tira o melhor de mim. — Fui sincero e segurei a mão
dela sobre a mesa.
Elaine me deu seu mais doce sorriso e me olhou com tanta
ternura que aqueceu meu peito.
— Você me faz tão bem, pequena, que estou sempre
imaginando em como retribuir. Por isso pensei em uma forma de te
ajudar e acabei tendo uma ideia. Conversei com meu irmão e meu
primo Álvaro e estamos te oferecendo um estágio no setor jurídico
da Vida Nóbile, com carga horária de quatro horas por dia. Assim
você já começa a ter experiência de trabalho na sua área e terá
mais tempo para estudar, sem se desgastar tanto.
— Ah, Leo... — A voz dela embargou, o queixo tremeu e os
olhos lacrimejaram. — Você é tão bom pra mim!
— Aceita a oferta?
— Claro! Ela saiu da cadeira que estava e sentou no meu colo,
enchendo meu rosto de beijos. — Obrigada, obrigada, obrigada!
Tem noção do quanto está me ajudando com isso?
Assenti, comovido com sua emoção.
— Te esperamos lá na empresa na segunda-feira cedo para
acertarmos os detalhes do estágio.
— Então já não preciso vir fazer faxina na semana que vem?
Neguei com a cabeça e afaguei o cabelo dela, admirando-a.
— E quem vai limpar sua casa?
— Não se preocupe com isso. Dona Ébia vai encontrar
alguém.
— Quase não acredito em tudo que está acontecendo. Há
poucos meses eu estava totalmente sem esperanças e, de repente,
tudo começou a mudar.
— Tenho certeza de que você vai conquistar tudo que deseja.
— Dei um beijo suave em seus lábios.
— Jamais serei capaz de agradecer isso. — Ela me deu mais
um beijo e saiu do meu colo para voltar a ocupar a cadeira em que
estava.
— O sexo safado que fazemos já paga tudo! — comentei,
brincalhão e ela riu.
Depois de comermos, fomos para o quarto de hóspedes.
Apesar da vontade louca de fodê-la, o cansaço era nítido em seu
semblante. Escovamos os dentes, emprestei uma camiseta para ela
e a puxei para a cama, deitando de conchinha.
— Não quer transar? — perguntou com a voz sonolenta,
virando o rosto para me olhar.
— Vamos descansar. Amanhã a gente cuida disso antes de eu
te levar.
Ela deu um sorrisinho travesso, fechou as pálpebras e logo
estava ressonando.
Com uma sensação gostosa de paz, beijei seu pescoço,
aconcheguei-me mais a ela e logo dormi também.
Eu não conseguia conter minha felicidade e empolgação em
poder largar as faxinas e começar a estagiar na Vida Nóbile na área
que eu estava estudando.
Contei a novidade para mamãe assim que cheguei em casa no
sábado de manhã.
— Que maravilha, filha! Mas ficou sabendo disso quando?
Encontrou o senhor Leonardo ontem à noite?
— Ele, hum-hum... — Raspei a garganta pensando no que
inventar. Não sabia por que, mas ainda não tinha conseguido contar
para mamãe que era o patrão o meu amante secreto. — Ele me
ligou ontem, quando eu estava chegando à faculdade.
— Estou muito feliz por você, meu amor! Merece tudo que está
acontecendo.
— Obrigada, mãezinha!
— E seu namorado, vai me apresentar quando? — Voltou a
insistir no assunto que eu vivia fugindo.
— Em breve! Agora vou trocar de roupa para começarmos a
faxina. Preciso acabar mais cedo, porque tenho trabalho da
faculdade para fazer.
— Vai cuidar das suas coisas, filha. Estou me sentindo bem,
limpo a casa sozinha.
— Tem certeza, mãe?
— Absoluta!
— Vou limpar meu quarto, então, antes de começar a estudar,
pelo menos assim ajudo um pouco.
— Está ótimo, meu amor. — Ela me deu um beijo e fui colocar
uma roupa mais confortável.

À tarde, Érika ligou, contando que o lance com o novo paquera


tinha chegado ao fim e me convidou para sair com ela e Wesley.
Declinei do convite, explicando que precisava estudar e aproveitei
para falar sobre o estágio na Vida Nóbile. Minha amiga me
parabenizou, mostrando-se tão empolgada quanto eu.
No final do dia, dando-me conta de que não tinha roupas
apropriadas para usar no meu novo trabalho, fui ao shopping mais
perto de casa. Tinha economizado um dinheirinho nos últimos dois
meses, então consegui encontrar, numa loja de departamentos,
peças sociais, que apesar dos preços acessíveis, eram versáteis e
bonitas. Escolhi um blazer, duas calças e duas saias lápis, três
camisetes e três blusinhas, uma de cetim e as outras de crepe.
Daria para variar as peças e assim teria roupa suficiente para usar a
semana toda. Ainda levei dois vestidos para usar quando fosse
passear ou me encontrar com Leo e algumas lingeries.
No domingo, dona Ébia nos fez uma visita e também contei a
novidade para ela.
— Que maravilha, Nane! Leo é um rapaz muito bom, fico feliz
por essa amizade de vocês e por ele estar te ajudando. Já vou
começar a procurar alguém pra te substituir. Começa quando no
estágio?
— Vou à empresa amanhã para acertar tudo direitinho. Nesta
semana já não irei mais fazer as faxinas, me perdoe por deixá-la na
mão assim de última hora.
— Tudo bem, querida, não se preocupe com isso. Estou feliz
demais por você!
Deixei-a conversando com mamãe e fui para o quarto terminar
o meu trabalho.

Na segunda-feira, sem querer me atrasar, acordei mais cedo


que o costume. Tomei o café da manhã e depois de um banho
rápido e de escovar os dentes, escolhi para vestir uma saia lápis
cinza-chumbo, e uma camisete rosa-claro. Sequei o cabelo e o
prendi em uma trança lateral, passei uma maquiagem suave e
conferi se todos os documentos que eu precisaria estavam na bolsa.
— Que elegante, filha! Fico até emocionada de te ver vestida
assim. Está com cara de advogada famosa — mamãe comentou
quando voltei para a sala.
— Ai, mãezinha, só a senhora mesmo! Também gostei do
visual, mas confesso que estou um pouquinho nervosa.
— Vai dar tudo certo, meu amor, fique tranquila!
— Já vou sair, pois não quero me atrasar.
— Está bem, filha. Boa Sorte com tudo lá.
Agradeci e me despedi dela com um beijo no rosto.
Assim que cheguei à Vida Nóbile, anunciei-me. A recepcionista
orientou que eu aguardasse em uma sala de espera. Estava com as
mãos frias e o coração disparado, mas ao avistar Leonardo de longe
e vê-lo sorrindo para mim, a ansiedade abrandou.
Levantei e ele foi até onde eu estava.
— Está muito elegante — comentou, após me olhar de cima a
baixo.
— Obrigada.
— Vou te levar até o departamento de recursos humanos. Me
acompanhe, por favor. — Ele pousou a mão nas minhas costas e
seu calor me aqueceu.
Antes que começássemos a andar, um rapaz parou à nossa
frente.
— Você deve ser a nova estagiária. — Ele também me olhou
de cima abaixo, mas ao contrário do efeito que Leo causou em mim,
sua atitude foi inapropriada e me deixou constrangida. — Prazer,
sou o Álvaro, um dos diretores da empresa. — Estendeu-me a mão.
— Muito prazer, senhor Álvaro. Eu sou a Elaine. Obrigada pela
oportunidade.
— Imagina! Agora entendo bem o porquê de Leonardo ter
insistido tanto. — Mais uma vez ele me olhou de uma forma que me
deixou desconfortável e notei sua sobrancelha esquerda se arquear,
de um jeito cínico, quando ele reparou na mão do primo pousada
em minhas costas.
— Bom dia, Álvaro! — O tom de Leo não foi nada cortês. —
Agora se nos dá licença, vou levar Elaine até o RH para fazer o
acerto do estágio.
— Está certo. Seja bem-vinda! Nos vemos por aí.
Assenti, esboçando um sorriso e acompanhei Leo pelo
corredor.
— É impressão minha, ou você e seu primo não se dão muito
bem? — perguntei baixinho, olhando-o de lado.
— Álvaro é um babaca.
— Bem, isso deu para perceber. — Arregalei os olhos e nós
dois sorrimos.
Ao chegarmos ao departamento de Recursos Humanos, Leo
me apresentou para o responsável e depois se despediu, dizendo
que passaria a manhã na empresa. Pediu que eu fosse até sua sala
antes de ir embora.
Cerca de uma hora depois, estava tudo certo com meu
estágio. Começaria a trabalhar de fato no dia seguinte. Conforme
Leo me dissera antes, a carga horária era de quatro horas diárias e,
para minha surpresa e alegria, o salário bem maior do que eu
conseguia tirar com as faxinas. Fiquei tão empolgada que precisei
me conter para não parecer uma maluca.
Ao sair de lá, voltei até a recepção e informei que o senhor
Leonardo gostaria de falar comigo antes de eu ir embora.
A moça pediu que eu aguardasse um instante e, depois de
fazer uma ligação, levou-me até a sala do patrão.
Na porta estava escrito: Diretoria e, abaixo, os nomes dele e
do irmão.
Ela bateu de leve antes de abrir e me anunciar. Depois pediu
licença e se retirou.
— Entre! — ele chamou enquanto levantava para vir ao meu
encontro. — Deu tudo certo?
— Sim. Já começo amanhã.
— Que ótimo!
— Então essa é a sua sala? — Olhei, curiosa, ao redor.
Haviam duas mesas grandes, de madeira escura e tampo de
vidro, que ficavam de frente uma para a outra, em extremidades
opostas, e ainda um sofá de couro sintético preto de dois lugares,
com uma mesinha de apoio ao lado dele.
As paredes eram de um cinza clarinho e na que estava
encostado o sofá, havia uma pintura abstrata em tons de amarelo,
azul e vermelho.
— Bem, muito mais do meu irmão do que minha, já que quase
não venho aqui. Aliás, Marcelo teve um imprevisto hoje e não pôde
vir trabalhar, mas pediu que eu te desse as boas-vindas.
— Obrigada! Seu irmão parece ser gente boa.
— Ele é o melhor cara que eu conheço.
— Se for como você, tenho certeza que sim.
Leo me olhou por um longo instante, depois diminuiu nossa
distância e me beijou.
Apesar de surpreendida com o gesto, correspondi, pois estava
tão louca por aquilo quanto ele.
Quando nossos lábios se desgrudaram, sem querer atrapalhar
seu trabalho, despedi-me.
Leo me levou até a porta e, ao abri-la, demos de cara com
Álvaro.
— Elaine... — ele falou meu nome e olhou de mim para o
primo, erguendo a sobrancelha, como fizera mais cedo. — Começa
quando?
— Amanhã — respondi, constrangida com o flagrante. Pelo
ardor do beijo de instantes antes, minha boca deveria estar tão
avermelhada quanto a de Leo, denunciando o que acabáramos de
fazer.
— Certo. Se precisar de qualquer coisa, não hesite em falar
comigo, já que meu primo quase nunca vem por aqui.
Leo se remexeu ao meu lado, ao ouvir a alfinetada de Álvaro.
Aquiesci, ele e o primo se encararam como se estivessem
prestes a entrar num ringue de luta, depois ele me disse um “até
amanhã” e saiu.
— Mantenha-se longe desse cretino! — Leo me virou para si.
— Se ele fizer qualquer gracinha pra cima de você, me avise —
disse aquilo me olhando com seriedade. A fúria nítida no brilho
faiscante de seus olhos e no maxilar tenso.
— Não precisa se preocupar, já sou grandinha, eu sei me
cuidar. — Dei uma piscadela, tentando descontrair o clima.
Consegui meu intuito, pois ele esboçou um sorriso e balançou
a cabeça em negativa.
— Vou sentir a sua falta lá em casa — confessou em um
sussurro.
— Se quiser me encontrar durante a semana, é só vir até aqui
— falei no mesmo tom baixinho, contendo-me pra não o acariciar.
— Não duvide que eu faça isso, pequena. Vá me dando
notícias do trabalho, por favor. Não hesite em falar comigo sobre
nada, está bem?
— Pode deixar! Mais uma vez obrigada pelo estágio.
— Não precisa agradecer. Nos vemos no domingo?
— Mais próximo do final de semana eu confirmo com você.
— Certo.
Despedimo-nos e saí.
Na volta para casa, fiquei pensando que também sentiria muita
falta do convívio com Leo nos finais de tarde das segundas e
quintas.
No dia seguinte, comecei de fato a trabalhar. No início fiquei
me sentindo como um peixe fora d’água. Além de não conhecer
ninguém, não entendia sobre planos de saúde. Um dos funcionários
me deu alguns materiais para ler, bem como orientações
importantes sobre as funções do setor. Ao final da semana eu já
estava mais ambientada àquela dinâmica.
Eu e Leo nos falamos duas vezes por telefone naqueles dias.
Apesar de louca para vê-lo, na sexta um professor pediu que
fizéssemos outro trabalho enorme para entregarmos na segunda-
feira. Infelizmente precisei cancelar meu encontro com Leo.
No final de semana seguinte, mamãe teve um mal-estar e fui
com ela a um pronto-atendimento. Mais uma vez não pude me
encontrar com meu patrão e a saudade começou a apertar.
Na segunda-feira seguinte, quando encerrei meu turno, mandei
uma mensagem para ele:

Estou com saudades. Será que não tem nenhum assunto


urgente que exija sua presença na empresa esta semana?

Ah, pequena, também estou louco pra te ver! Almoça


comigo? Te pego aí agora e te levo em casa depois.

Vou adorar! Já terminei meu expediente. Vou para a portaria te


esperar, então.

Em quinze minutos eu chego aí. Até daqui a pouco!


Conforme combinado, pouco tempo depois Leo passou para
me buscar e me levou a um restaurante ali perto.
Quando parou o carro no estacionamento, tirei o cinto e pulei
para seu colo, beijando-o com o desespero que a saudade exigia.
Só não transamos ali mesmo porque um segurança do local,
notando a movimentação suspeita dentro do veículo, aproximou-se.
— Caralho, você me enlouquece, pequena! — Leo me colocou
de volta no meu banco e se recompôs. — Vamos descer antes que
o cara bata na janela.
Assenti, sorrindo, ajeitei-me e saímos.
Estava difícil lidar com a distância e com a falta que eu sentia
dele. Se ao menos Leo me assumisse como namorada, as coisas
seriam um pouco mais simples para a gente. Poderíamos ter mais
encontros no horário de almoço e de vez em quando eu poderia
passar para vê-lo ao sair do trabalho, já que ele morava lá perto,
sem me preocupar com o que dona Ébia iria achar daquilo.
Suspirei fundo e apertei sua mão desejando que ele
compreendesse minhas angústias e querendo saber de verdade
como se sentia em relação a nós. Será que tínhamos futuro juntos?
Quando estava entrando com Elaine no restaurante, dei de
cara com a última pessoa que imaginava encontrar ali.
— Oi, Leo! Quanto tempo!
— Como vai, Veruska?
— Ótima! Aguardava certa ligação, mas agora entendo porque
não aconteceu. — A loira fez cara de quem não gostou do que viu e
mediu minha acompanhante de cima a baixo.
Fiquei sem reação diante àquele comentário inoportuno e,
notando a situação embaraçosa, Elaine apertou minha mão e
sussurrou um “vamos procurar uma mesa?”.
Virei-me para ela e assenti.
— Bem, se nos dá licença, estamos com fome e vamos
procurar um lugar pra sentar.
— Claro, gato. E, se cansar da comida sem sal e quiser algo
apimentado, tem meu telefone. — Umedeceu os lábios com a
língua, olhando-me de forma provocante e saiu.
— Uau! A comida sem sal sou eu? — Elaine perguntou
baixinho, olhando-me com uma cara engraçada.
— Desculpe por isso, pequena!
— A loira peituda é bem bonita e gostosona mesmo, dá pra
entender porque você transou com ela.
— Foi um pouco antes de começarmos a ficar juntos, ok? Não
quero que ache que estou transando com você e com outras.
— Tudo bem, Leo. Afinal, não temos compromisso, não é
mesmo? — Percebi a mágoa em seu olhar e no tom de voz.
— Vamos sentar — chamei e ela assentiu.
Guiei-a até uma mesa desocupada e, assim que nos
acomodamos, achei melhor retomar o assunto.
— Elaine, gosto muito de você, do que temos, mas nunca te
prometi mais nada do que isso.
— Eu sei... — Ela engoliu em seco e parecia se controlar para
não chorar.
— Juro que queria ser diferente, mas eu não consigo.
— Não consegue ou não quer? — Ergueu discretamente o
queixo e me olhou inquisidora.
— Não posso, pequena. Sinto muito, de verdade.
— Sabe, Leo, achei que conseguiria lidar com o tipo de
envolvimento que estamos tendo. Senti muito a sua fala esses dias
e logo que nos vimos hoje, estava justamente pensando sobre isso.
Eu concordei com essa coisa de amizade colorida, mas quero mais
de nós dois.
— E se eu não puder te dar? — Acariciei a mão dela sobre a
mesa.
— Então talvez seja a hora de pararmos e cada um seguir seu
rumo. — Seus olhos marejaram e os lábios tremeram.
— Não me deixe, Elaine! — supliquei baixinho, atormentado
pela ideia de perdê-la.
— Achei que queria o mesmo que você, que só sexo bastaria.
No início foi assim, mas se eu disser que nada mudou, estaria
mentindo pra mim mesma. A cada dia que passa eu me apego mais.
A verdade é que eu me apaixonei por você, Leo. Não quero apenas
um romance casual.
— Eu não posso, Elaine, não consigo namorar. Acho que
nunca vou amar outra mulher. Tenho sido egoísta ao manter nosso
envolvimento. Desde o princípio sabia que você merecia muito mais
do que eu podia te dar.
— Então é assim que acaba? — Uma lágrima transbordou,
rolando por sua face.
Minha vontade foi de me levantar e envolver Elaine em meus
braços. De pedir que esquecesse tudo que eu tinha acabado de
falar, mas não seria justo com ela. A pequena era a mulher mais
especial que conheci nos últimos anos e merecia ser feliz ao lado de
alguém que correspondesse seus sentimentos.
— Vou sentir falta de nós dois — foi a única coisa que eu
consegui dizer.
— Eu perdi a fome. Vou pra casa. — Puxou a mão,
desfazendo nosso contato. — Obrigada por tudo, Leo. Jamais vou
esquecer o que fez por mim. — Mais lágrimas rolaram por seu rosto
lindo, que naquele momento deixava transparecer toda sua tristeza
e decepção.
Ela enxugou a face com as mãos, levantou e saiu.
Fiquei paralisado, sentado naquela cadeira, culpando-me por
fazê-la sofrer. Tive vontade de ir atrás dela, mas me controlei. Não
tínhamos futuro, talvez fosse o melhor mesmo acabarmos logo com
o que estávamos tendo.
Assim como ela, eu também perdi a fome. Atordoado, levantei
e fui embora.
Cheguei em casa e fui direto para o bar. Eu necessitava de
uma dose de uísque para conseguir aguentar a tarde de trabalho.
— Precisa de alguma coisa, Leo? — Dona Ébia surgiu na sala
e me avaliou, atenta.
Olhei para ela e neguei com a cabeça.
— Está abatido. Almoçou fora?
— Acabei perdendo a fome.
— Se quiser posso preparar algo leve pra comer. Precisa se
alimentar.
— Obrigado, querida. Acho que nada desceria agora, estou...
— Esfreguei a garganta e o peito, sentindo tudo dentro de mim se
apertar, não consegui terminar a frase.
— Aconteceu alguma coisa? Quer conversar?
Mais uma vez neguei com a cabeça.
— Tudo bem, então. Vou fazer uma sopa, quem sabe consiga
comer pelo menos um pouquinho, hum?
Agradeci, ela pediu licença e se retirou.
Sentei ao piando e toquei a Moonlight Sonata, do Beethoven.
Nem a canção melancólica foi capaz de abrandar a minha angústia.
Que droga! O que eu faço agora?
Após cerca de meia hora, dona Ébia avisou que a sopa estava
pronta. Consegui tomar um pouco e fui trabalhar depois.
Aquele dia foi terrível e a noite pior ainda. Tive um pesadelo
com o acidente e outro em que a pequena tentava se aproximar de
mim, mas não conseguia. Como se algo a puxasse para trás.
Acordei agitado e com uma sensação ruim.
Durante os dias que se seguiram, por vezes tive vontade de
mandar mensagem para Elaine, cheguei a digitar e apagar várias.
Não achei que sofreria pelo nosso rompimento, mas a verdade é
que aquilo estava acabando comigo. Mesmo sabendo que não
devia, voltei a beber. Precisava encontrar uma forma de esquecê-la,
mas estava difícil. Passei o final de semana sozinho em casa.
Marcelo me ligou, chamando para sair, mas não tinha a menor
vontade de ver ninguém.
Na terça-feira seguinte, no final da tarde, meu irmão foi me
visitar.
— E aí, bro, como vai? Aconteceu alguma coisa entre você e
Elaine? Encontrei com ela hoje cedo na Vida Nóbile e a achei triste
e abatida. Agora chego aqui e te vejo com a mesma cara. Vocês
brigaram?
— Terminamos com o lance da amizade colorida na semana
passada.
— Também terminei com a Scarllat. Saí com ela, a Veruska e o
Álvaro no final de semana e acabei me dando conta de que aquilo já
estava indo longe demais. Se continuássemos juntos, não ia
demorar para ela começar a falar em namoro e quando eu me
desse conta, estaria com uma aliança no dedo. Gosto da garota,
acho-a linda, divertida, gostosa pra caralho, mas sinceramente, a
última coisa que quero agora é compromisso sério. Mas olha pra
mim! Ao contrário de você, estou de boa com o rompimento.
— O que está querendo dizer?
— Que eu curtia estar com a Scarllat, mas não passava disso,
entende? Agora pela sua cara e a da Elaine, havia algo mais entre
vocês, não é mesmo? Se estão sofrendo por estarem longe um do
outro, por que terminaram?
— Ah, irmão... — esfreguei as mãos no rosto, aturdido —, ela
disse que se apaixonou e que queria mais de nós.
— Sei... e pelo jeito, você também está apaixonado.
— Não estou apaixonado! — resmunguei, irritado.
— E por que acha que está desse jeito, então?
— Sei lá! Estou com saudade dela, eu gostava do que a gente
tinha.
— Como você consegue ser tão cego desse jeito?
— E o que não estou vendo? — Olhei para ele, confuso.
— Cara, você quer a garota e ela te quer. Ao contrário de mim,
já foi casado e curte esse lance de relacionamento sério. Só não
está se permitindo, porque acha que não deve, que não merece ser
feliz com outra pessoa, por conta do que aconteceu com a Li e
blábláblá...
— Não mereço mesmo e por mais que goste da Elaine, eu
nunca a amaria.
— Será que não? Caramba, Leo! Olha, eu te entendo, o que
aconteceu no passado foi uma tragédia, mas ficar dizendo essas
baboseiras já está irritante. Deixa de ser trouxa e vai atrás da
garota. Destranque esse coração, abra-o para ela e diga que quer
namorar, que também deseja mais de vocês dois.
— E se de fato eu não for capaz de amar de novo? Elaine
pode até estar sofrendo, mas logo vai me esquecer e encontrar
alguém melhor que eu. E se reato o que temos só para iludir a
garota e daqui a pouco me dar conta de que nunca serei o que ela
espera?
— Que caralho de pensamento é esse, mano? Porra! Se tem
tantas dúvidas assim, melhor mesmo deixar a moça seguir em
frente. Mas, oh, volte pra terapia. Você está precisando. Muito!
Suspirei fundo e neguei com a cabeça.
— Eu já vou, a qualquer hora que quiser conversar, é só
chamar, viu?
— Obrigado, Celo!
Despedimo-nos e ele saiu.
Fiquei refletindo sobre tudo o que dissemos e recordando
meus momentos com Elaine. Por mais que a desejasse de volta em
minha vida, não podia tomar uma atitude intempestiva, só para
magoá-la de novo mais à frente.
Fiquei desolada pelo rompimento com Leo. Por mais que
tentasse me convencer de que tinha sido melhor assim, não estava
sendo fácil lidar com meus sentimentos e com a falta que sentia
dele.
Duas semanas depois, fiquei sabendo que teria uma festa na
empresa. Apesar de ter recebido o convite, achava que seria melhor
não ir, pois queria evitar um possível encontro com o patrão.
No sábado do dia do evento, Érika passou lá em casa cedo.
Minha amiga já sabia de tudo e discordava da minha opinião.
— Migs, sinceramente, acho que você deveria ir, sim, e
mostrar para aquele bonitão que mesmo sem ele, está bem,
seguindo com a vida.
— Mas eu não estou, amiga. Continuo arrasada, essa é a
verdade.
— Ah, Nane, eu sinto muito mesmo que as coisas entre vocês
tenham acabado desse jeito. Mas em relação a festa, vá. Será bom
pra se enturmar mais com o pessoal do trabalho e se divertir um
pouco. Talvez o Leonardo nem compareça.
— Eu ficaria deslocada, ainda não sou muito próxima de
ninguém lá.
— Te deram dois convites?
— Sim.
— Se quiser, eu vou com você!
— Ah, não sei...
— Vai ser legal! Quem sabe a gente não acabe conhecendo
uns gatinhos por lá, hein? Precisa sair para espairecer.
— Tem razão. A faculdade está me consumindo. Seria mesmo
bom poder me distrair um pouco e também acho que a chance de
Leo ir é bem pequena.
— A que horas é?
— Às nove da noite.
— Beleza. Eu venho te buscar um pouco antes. Combinado,
então? — Ela segurou firme em minhas mãos.
— Combinado! — Sorrimos com cumplicidade.

Às 20h45h, Érika passou para me buscar. Coloquei o vestido


preto de renda e os sapatos que tinha ganhado de Leonardo,
porque eram minhas peças mais bonitas, caprichei na maquiagem e
deixei o cabelo solto, fazendo umas ondas com o babyliss.
— Está linda, filha! Andava tristinha nas últimas semanas, fico
feliz que vá sair um pouco.
— Nem queria ir, mas Kinha me convenceu.
— Bom proveito para vocês!
— Obrigada, mãezinha.
Despedi-me dela com um beijo e saí.

Fomos umas das primeiras a chegarem. O evento aconteceu


em um salão de festas dentro da própria Vida Nóbile. O lugar estava
decorado de forma elegante em tons de vermelho e branco, as
cores da empresa.
— Muito chique, isso aqui, gostei! — Érika comentou, olhando
ao redor.
Logo outras pessoas foram chegando e alguns colegas do
meu setor vieram me cumprimentar.
Garçons passavam servindo bebidas, canapés e salgadinhos.
Eu e Érika pegamos uma taça de frisante cada e experimentamos
as comidinhas que estavam deliciosas.
Por volta das 22h, vi Álvaro chegar, acompanhado da moça
loira que tive o desprazer de encontrar no restaurante, no dia que eu
e Leo rompemos.
Eles pararam para conversar com algumas pessoas e quando
vi que ele caminhava na minha direção, tive vontade de sair
correndo.
— Boa noite, senhoritas! Está muito elegante, Elaine! — O
diretor falou ao parar à nossa frente, com a loira ao lado.
— Obrigada. A festa está ótima, tudo de muito bom gosto. —
Achei por bem mudar logo o foco da conversa.
— Verdade, a equipe organizadora dos eventos sempre
capricha. Bem, vamos dar mais uma volta, fiquem à vontade.
Aquiesci e a loira me encarou com um ódio que fez um arrepio
ruim percorrer minha coluna.
— Meu Deus, quem era aquela? A mulher estava te fuzilando
com o olhar.
— Um ex-affair, ou sei lá o que, do Leonardo.
— Ah, agora entendi o clima tenso que rolou aqui. Mas
esquece, amiga, bora aproveitar que bem estou vendo uns gatinhos.
Quem são aqueles? — Apontou na direção da entrada.
— Os rapazes da T.I. — mal respondi e meu coração disparou,
ao ver Leonardo chegando, na companhia do irmão. — Ele veio...
— Fique calma e aja com naturalidade, amiga.
— Vou tentar. — Respirei fundo e desviei o olhar antes que ele
me flagrasse o observando.
Por mais que eu tenha tentado não me abalar, a presença de
Leo me desestabilizou. Com o intuito de tentar controlar a agitação
que se fez dentro de mim, na hora seguinte, bebi mais do que devia.
— Boa noite, meninas! — Marcelo se aproximou de nós e
cumprimentou alegre.
Em alerta, olhei atrás dele para ver se Leonardo também
estava por perto, mas não o encontrei.
— Boa noite! — eu e Érika respondemos juntas.
— Estão gostando da festa?
— Sim. Está tudo perfeito — comentei e ele assentiu,
satisfeito.
— Você não trabalha aqui, mas tenho a impressão que te
conheço de algum lugar — ele falou para Érika.
— Realmente não trabalho aqui, vim como acompanhante da
Nane, somos amigas desde a infância. Meu nome é Érika, sou
enfermeira. Já nos encontramos há um tempo no hospital. Eu
estava de plantão e você foi ver um paciente internado.
— Verdade! Bem que achei seu rosto familiar.
— Desculpe interromper a conversa, mas é que eu preciso ir
ao banheiro. Vem comigo, Kinha? Ou prefere ficar me esperando?
— Pode ir tranquila. Eu fico aqui fazendo companhia pra ela —
Marcelo falou, gentil.
Olhei para minha amiga que acenou concordando. Apertada
para fazer xixi, pedi licença e deixei os dois.
Quando já saía do banheiro, Álvaro me interpelou.
— Elaine... — ele falou com a voz mole de quem já tinha
bebido demais e segurou meu braço. — Está muito linda, elegante e
sexy hoje. Agora entendo o que meu primo viu em você. Desde a
hora que te notei nesta noite, fiquei louco pra te beijar. — Ele me
empurrou contra a parede e me prendeu.
— Por favor, senhor Álvaro, me solte. O senhor bebeu demais
e não está se dando conta do que faz.
— Não vou soltar, gatinha, na verdade quero mesmo é te
agarrar assim. — Pressionou o corpo contra o meu e lambeu o meu
pescoço. — Me dá um beijo, vai. — Me manteve presa entre ele e a
parede e segurou meu queixo.
— Não! Eu não quero! Me solte! — gritei exasperada e tentei
empurrá-lo, mas ele era muito mais forte do que eu.
Quando achei que não escaparia daquela situação, ouvi a voz
grave de Leonardo.
— Solte a garota agora! Ela disse não, porra! — Ele agarrou o
primo pela gola do paletó e o puxou para trás, livrando-me dele.
— Ei, qual é? Acha que só você pode provar a gostosinha?
— Some daqui, Álvaro, antes que eu arrebente a sua cara, e
fique bem longe dela!
— Já estou saindo, não precisa ficar nervosinho. — O babaca
se afastou de nós.
— Está tudo bem com você? Ele te machucou?
— Está tudo bem. Obrigada por... me salvar — falei as duas
últimas palavras em tom zombeteiro e Leo sorriu.
— Elaine, eu...
— O quê? — insisti quando ele hesitou.
Estava com tantas saudades que tê-lo assim tão perto me
deixou atordoada. Queria saber se Leo se sentia da mesma forma.
Se ainda pensava em mim.
— Eu só... você... — Afundou as mãos no cabelo, deixando-o
uma desordem. — Não é nada... — Seus olhos grudaram nos meus
e pude ver o mesmo tormento que me assolava estampado em seu
semblante.
Achei que ele falaria algo sobre nós, no entanto apenas pediu
licença e se retirou, deixando-me ali sozinha, com o coração
descompassado. Eu o queria de volta, tanto, mas tanto que chegava
a doer.
Controlando a vontade de chorar, fui até o bar. Eu precisava
com urgência de mais uma bebida.
Assim que o bartender me entregou meu drinque, a tal
Veruska, não tinha esquecido o nome da loira siliconada, parou ao
meu lado.
— Aproveitando a festa? — perguntou, avaliando-me de cima
a baixo.
Sem paciência para aquilo, já meio tonta e com a cabeça
dolorida, deixei a bebida sobre o balcão, fechei os olhos e
massageei as têmporas.
— Desculpa se estou te incomodando, só quis ser educada.
Tchauzinho! — a garota falou, fazendo-me abrir as pálpebras a
tempo de vê-la dar um sorriso cínico, virar as costas e sair.
Que noite, meu Deus! Deveria ter ficado em casa!
Peguei meu drinque de volta, dei um longo gole, respirei fundo
e fui até onde Érika estava. Ao perceber que ela e Marcelo
dançavam e, não me sentindo muito bem, fui até um canto onde
haviam vários pufes e sentei.
Continuei bebendo, enquanto observava as pessoas. Todos
pareciam tão felizes.
Será que só eu estou triste? Por que você não me quer, Leo?
Por quê?
— Desculpe pelo ocorrido agora há pouco. — Álvaro parou à
minha frente, fazendo-me erguer os olhos para encará-lo. De
repente as luzes me ofuscaram e senti o corpo meio dormente.
— Tudo bem. Já esqueci.
— Parece tristinha, o que foi? Posso te fazer companhia?
Tentei responder que preferia ficar sozinha, mas não consegui
pronunciar as palavras, como se a língua estivesse embolada dentro
da boca.
Talvez achando que meu silêncio fora um sinal de
concordância, Álvaro sentou ao meu lado.
Exausta daquela noite, só queria ir embora, mas Érika parecia
estar se divertindo, então me conformei em ficar ali sentada ao lado
da última pessoa que gostaria de ter por perto.
Zonza de um jeito estranho, vaguei o olhar pelo salão, até que
uma cena a alguns metros à frente chamou minha atenção.
Não acredito nisso! Meu peito apertou ao ver Leonardo aos
beijos com Veruska. Tudo bem que ele não me quisesse mais, mas
precisava ficar com a garota na festa sabendo que eu estava lá e
acabaria vendo?
Lágrimas de dor, raiva e humilhação banharam meu rosto.
— Ei, o que foi? — Álvaro me encarou preocupado e não
demorou para que percebesse para onde eu olhava. — Ah... Por
essa eu também não esperava.
Suas palavras só me fizeram chorar mais.
— Shhh.... não fique assim. O idiota do meu primo não merece
suas lágrimas e aquela lá veio comigo e se agarrou a ele. É uma
vadia mesmo! — Puxou-me para um abraço.
Quando senti seus lábios nos meus, tentei abrir os olhos, mas
tudo que vi foi escuridão. Um zunido alto apitou em meus ouvidos e
depois nem escutei, nem vi mais nada, apaguei.
Fiquei mexido ao ver Elaine na festa, linda com o vestido e os
sapatos que lhe dei. Estava morrendo de saudades, mas apesar da
minha vontade de ir até ela e conversar, esforcei-me para me
manter longe. Era o melhor para nós dois. No entanto, ao ver meu
primo tentando agarrá-la a força, meu sangue ferveu e quase soquei
a cara dele.
Mesmo depois do ocorrido, vendo como ela estava fragilizada,
não fui capaz de ficar perto dela. Se eu ficasse, acabaria falando ou
fazendo coisas de que me arrependeria depois. Então me afastei o
mais rápido que pude.
Estava entediado na festa e quando já pensava em ir embora,
Veruska se aproximou de mim.
— Oi, gato! O que está fazendo aí sozinho? — Ela parou à
minha frente e alisou meu peitoral.
— Não veio com o Álvaro, Veruska?
— Vim, sim, mas sabe bem que é você que eu quero, não é
mesmo?
— Não sei de nada, garota, dá um tempo.
— Poxa, achei que tivesse curtido ficar comigo. Se tiver
esquecido como foi bom, eu posso te lembrar. — A maluca chegou
mais perto e colou nossos lábios. Agarrando-me pela nuca, invadiu
minha boca com sua língua maliciosa.
— Pare com isso! — Afastei-a, irritado.
— O que foi? Por que não me quer? Se for por conta daquela
menina sem sal e sem açúcar, dá uma olhadinha naquilo ali. — Ela
apontou um canto.
Quando vi Elaine aos beijos com Álvaro, mal pude acreditar.
Que grande idiota era eu! Mais cedo quase esmurrei a cara do meu
primo porque achei que ele estava tentando agarrá-la à força, mas
pelo jeito a situação não tinha sido bem como imaginei. Se fosse,
ela não estaria tão à vontade em seus braços.
Não acredito nisso!
— Esquece aquela garota, gostosão. Fique comigo.
— Tem toda razão. Vamos dar o fora daqui! — Puxei-a pela
mão em direção a saída e ela me acompanhou de bom grado.
Sentindo a raiva me consumir, dirigi feito louco até a cobertura
e quando cheguei, atraquei-me com fúria à Veruska.
Com uma selvageria além do habitual, quase rasguei as
roupas da garota ao despi-la.
— Adoro essa brutalidade, gato! Vem, me foda com força
como naquele dia!
As palavras fizeram um sinal de alarme soar dentro de mim.
Eu estava irado, mas nenhuma garota merecia ser usada daquela
forma, apenas para descontar minha raiva e tentar tirar outra da
cabeça.
Como se ela me queimasse, afastei-a de mim e afundei as
mãos no cabelo, pondo-me a andar de um lado para outro à sua
frente, atordoado.
— O que foi, gostosão?
— Desculpe, Veruska, mas não vai rolar. Por favor se
recomponha, vou pedir um carro pra te levar em casa.
— Você está de brincadeira, né? Não quer transar comigo por
conta daquelazinha? A uma hora dessas ela deve estar na cama do
seu primo.
— Elaine não é assim. Ela gosta de mim, não faria isso.
— Gato, ela não está em condições de ver o que está fazendo.
— Por que disse isso?
— Deixa pra lá! — Pegou o vestido caído no chão, colocou-o
de volta e ajeitou o cabelo com a mão. — Melhor eu ir agora. Depois
a gente se fala. Não precisa pedir um motorista pra mim, eu mesma
peço. Até mais. — Aproximou-se, deu um selinho nos meus lábios e
saiu.
— Que merda de noite! — resmunguei ao ouvir a porta bater.
Será que Elaine estaria mesmo na cama com Álvaro?
Ela tinha dito que gostava de mim. Será que conseguiu me
esquecer assim tão rápido?
Eu me esforcei para me manter longe, para não pensar nela,
para fazer o que achava que era o certo, mas a verdade é que
estava louco de saudades. Pensava que nunca mais amaria outra
mulher, no entanto o que sentia pela pequena esmagava meu peito
e acabava com o meu sossego.
Tirei o paletó, afrouxei a gravata e quando me preparava para
me servir uma dose de uísque, meu celular tocou.
Fiquei preocupado em quem poderia ser a uma hora daquelas,
então me apressei para atender. Pelo visor vi que era Marcelo quem
chamava.
— Alô.
— Leo, onde você está, cara?
— Desculpa ter saído sem avisar, mano. Estou em casa.
Aconteceu alguma coisa? Está com a voz aflita.
— Elaine passou mal na festa.
— O quê?
— Ela desmaiou, a princípio achamos que tinha bebido
demais, ajudei a amiga a trazê-la aqui para o hospital em que
trabalha. Mas o plantonista me chamou a atenção para as pupilas
mióticas, ou seja: pequenas, e os batimentos cardíacos diminuídos.
— O que isso quer dizer, Celo? Como ela está?
— O quadro clínico não condiz com alta ingestão de álcool, ela
parece ter sido drogada com boa noite cinderela, ou algo do tipo.
Continua desacordada, mas está monitorizada. Colheram exames e
estão correndo soro na veia para hidratá-la e também diminuir a
concentração das drogas no sangue.
— Puta que pariu! Eu vou matar o Álvaro! Onde vocês estão?
Me passe o endereço que daqui a pouco chego aí.
— É um hospital aqui na Barra, vou te mandar a localização
por mensagem.
Agradeci e despedi do meu irmão.
Já dentro do carro, estava com tanta raiva, que ao invés de ir
direto para o hospital, fui parar na cobertura do meu primo.
Esperava que ele já tivesse voltado da festa.
— O que foi? — ele perguntou, olhando-me receoso, logo que
abriu a porta.
— Eu vou te matar, Álvaro! O que você fez com a Elaine?
— Eu não fiz nada!
— Nada? Como tem a cara de pau de dizer isso? — Eu o
agarrei pelo colarinho da camisa.
— Porra, Leo, eu juro! Eu estava bêbado, ainda estou, na
verdade, ela também e quando a menina te viu beijando a Veruska,
ela começou a chorar e eu só a consolei.
— A consolou? Eu vi a sua boca grudada na dela, seu cretino!
— esbravejei, sem soltá-lo.
— Bem, eu confesso que não resisti àquele momento de
fragilidade. Ela ficou sexy pra caralho chorando, o que não é algo
comum, então quando me dei conta eu tinha colado meus lábios aos
dela, mas nem deu para aproveitar nada, pois logo desmaiou.
— O que você colocou na bebida dela, Álvaro?
— Não pus nada, tá maluco? Me solte! — Ele se livrou das
minhas mãos.
— Elaine está agora no hospital e estão suspeitando de que
ela foi drogada com algo como o boa noite cinderela.
— Cacete! Isso é sério?
— E eu estou com cara de quem está brincando?
— Leo, isso é muito grave. Eu jamais faria algo assim. Juro!
— Se não foi você, quem foi?
— Pode ter sido qualquer pessoa, sei lá, porra!
— Deixe de ser idiota, ninguém faria uma coisa dessas sem o
propósito de ficar com ela. — Afundei as mãos no cabelo,
desorientado.
— Ou com a intenção de tirá-la de circulação para poder ficar
com você.
— A gente nem estava junto. — Franzi o cenho, refletindo
sobre o que ele falou. — A não ser que... caralho! Só pode ter sido a
Veruska. Ela me agarrou e depois me mostrou que você e Elaine
estavam se beijando.
— Me Deus! Você acha que ela seria tão louca a esse ponto?
— Vamos descobrir isso agora. — Peguei o celular no bolso e
liguei para a garota, colocando no viva-voz.
— Oi, gato, mudou de ideia?
— Mudei de ideia uma ova! O que você fez essa noite, porra?
Você drogou a Elaine?
— Ai, deixa de ser exagerado, gostosão. Digamos que eu só
dei um empurrãozinho para o destino. Vi que estavam separados,
ela tinha bebido demais e Álvaro parecia interessado nela, eu tinha
o contexto perfeito para te fazer enxergar que ela não era pra você.
Não dava para perder a oportunidade.
— Veruska, se algo mais grave acontecer com Elaine por
conta do que você fez, eu te persigo até o inferno, mas acabo com a
sua raça, entendeu? Quero que suma da minha vida e da dela!
— E da minha também, garota maluca! — Álvaro se
manifestou.
— Nossa, estão muito nervosinhos... — Desliguei o telefone na
cara dela.
— Como Elaine está? — Álvaro perguntou em seguida.
— Inconsciente. Eles colheram exames e a estão
monitorizando.
— Sinto muito por tudo isso, afinal, levei Veruska pra festa. Eu
e você temos nossas desavenças, ainda me ressinto por Lília ter te
escolhido e não a mim, pela morte dela... — Fez uma pausa e
respirou fundo. — Dei mesmo em cima da Elaine hoje, confesso.
Achei que seria divertido ficar com a garota que você gosta. Era só
pra te implicar, mas não sou nenhum lunático. Jamais desejaria que
essa situação tivesse chegado a este ponto. Foi mal!
— Álvaro, nada disso faz sentido, entende? Essa sua
implicância comigo é ridícula! Lília nunca correspondeu aos seus
sentimentos. Ela está morta e, por mais que tenha sido um acidente,
não há um dia sequer que eu não me culpe por isso. E Elaine... ela
foi a única que consegui deixar entrar na minha vida desde que
fiquei viúvo e mesmo assim eu achava que não a merecia. Mas quer
saber, eu a quero tanto como ela me quer. E espero que ela acorde
para eu poder dizer isso a ela.
— Poxa, Leo, eu não sabia que era sério assim... — Olhou-me
desconcertado. — Elaine vai acordar e você poderá dizer isso a ela.
Vocês vão se entender.
Aquiesci e dei dois tapinhas no ombro dele.
— Você vai para o hospital agora?
— Vou. Estava indo pra lá, quando fiz esse desvio de caminho.
Precisava saber o que tinha acontecido.
— Vai dar tudo certo, cara. Por favor, mande notícias.
Assenti e saí.
No caminho até o hospital, fiz algo que há muito tempo não
fazia: rezei.
Tudo que eu mais queria era que Elaine ficasse bem, tive
muito medo de que algo mais grave acontecesse a ela.
Quando cheguei e soube que ainda estava inconsciente, não
consegui voltar para casa. Por mais que minha presença ali não
adiantasse de nada naquele momento, eu fiquei. Só sairia depois
que ela acordasse, que me certificasse de que estava fora de perigo
e que pudéssemos conversar. Desejava que minha pequena me
perdoasse e me aceitasse de volta. Eu estava apaixonado por ela.
Como não tinha enxergado isso antes?
Acordei sentindo a cabeça zonza e o corpo dolorido. Lembrava
da festa na empresa, de Leo me defendendo do Álvaro, depois da
Veruska me abordando no bar, de ver Érika e Marcelo dançando e
de... mais nada. Não sabia como tinha ido embora e nem onde
estava naquele momento. A claridade ofuscou a minha visão e
precisei fazer um esforço enorme para sentar.
— Nane, que bom que você acordou! Vou chamar o médico —
Érika falou, olhando-me com uma expressão agoniada.
— Médico? Onde estou? O que aconteceu?
— Estamos no hospital onde trabalho. Te trouxemos pra cá
ontem, depois de ter passado mal.
— Não consigo me lembrar como a festa terminou. Só sei que
de repente eu senti um mal-estar esquisito, mas depois disso não
me recordo de nada.
— Ai, amiga, você não vai nem acreditar, mas a tal loira, ex-
affair do Leonardo, colocou boa noite cinderela na sua bebida. Ela
mesma confessou isso a ele, aquela cretina! Podia ter te matado!
— Santo Deus! Mas por que ela fez isso? — questionei
incrédula com a informação, aquilo era muito sério.
— Primeiro porque é louca, né migs? Afinal, que pessoa
normal anda por aí com esse tipo de droga na bolsa? Depois, pelo
que o bonitão do seu patrão falou, ela confessou que se viu diante
do cenário perfeito para separar vocês de vez e ficar com ele.
— Nossa! Isso é muito surreal!
— É sim, amiga, parece até coisa de filme. Mas o que importa
é que você acordou e está bem. Vou chamar o plantonista para te
examinar, assim ficaremos mais tranquilas, ok?
— Mamãe sabe o que aconteceu? — questionei, preocupada.
— Achei melhor não contar. Liguei para ela e disse que você
dormiria lá em casa. Depois avisei meus pais sobre a situação.
Fiquei com medo do que a notícia poderia desencadear na tia
Cirlleni.
— Fez bem, amiga. Obrigada!
— Agora fique quietinha aí que vou chamar o doutor Erasmo.
Assenti e ela deixou o quarto.
Poucos minutos depois, um jovem médico apareceu. Fez um
monte de perguntas, analisou minhas pupilas, usando uma
lanterninha, depois verificou meus dados vitais no monitor.
— O exame toxicológico só ficará pronto daqui dois dias, mas
como soubemos que colocaram boa noite cinderela na sua bebida,
temos ideia de quais drogas foram usadas. O risco maior nesses
casos acontece logo após as primeiras horas da ingestão do
composto, que pode levar a uma depressão cardiorrespiratória
grave. O perigo já passou. Você vai querer chamar a polícia e fazer
um boletim de ocorrência?
— Não. Só quero esquecer tudo o que aconteceu.
— Certo. Vou deixar a sua alta assinada, então. Recomendo
que tire o dia para repousar e tome bastante líquido.
— Está bem, pode deixar que farei isso. Obrigada.
Ele esboçou um sorriso, anuiu e deixou o quarto.
— Nane, o Leo passou a noite aqui, na sala de espera. Pediu
que eu o avisasse assim que você acordasse, pois queria conversar
contigo. Posso ir até lá chamá-lo?
— Tudo bem. Só me dá um pouco de água antes? Minha boca
está seca e com um gosto horrível.
— Aqui está. — Ela me entregou um copinho. — Vou
aproveitar pra pedir seu desjejum.
Agradeci e minha amiga saiu.
Alguns minutos depois, Leo apareceu no quarto. Estava com a
roupa que usara na festa, mas sem o paletó e a gravata. O cabelo
bagunçado e o semblante abatido, com olheiras escuras, chamaram
minha atenção. Além de visivelmente cansado, ele parecia
preocupado.
— Oi. Como está se sentindo? — Aproximou-se da cama e
segurou minha mão.
— Esquisita. Meio grogue, sem conseguir me lembrar do que
aconteceu.
— Eu sinto muito, pequena.
— Não foi sua culpa, imagina.
— Se eu não tivesse me envolvido com aquela louca, nada
disso teria acontecido.
— Pode parar! Já carrega remorso demais nas costas. Fiquei
assustada ao saber do que Veruska foi capaz, mas não teria como
você prever uma coisa dessas.
— Eu disse a ela que a caçarei até no inferno se não sumir de
nossas vidas. Acho que agora ela desaparece, mas se quiser
prestar queixas, podemos fazer um boletim de ocorrência.
— Não. Deixe isso pra lá.
— Elaine, não imagina o quanto fiquei angustiado lá fora, com
medo do que pudesse te acontecer.
— Já passou. Isso tudo foi uma loucura, mas o importante é
que estou bem.
— Eu tive muito tempo pra pensar em nós dois, no que você
representa pra mim e no que quero. — Ele afagou meu cabelo, os
olhos aflitos grudados nos meus.
— E a que conclusão chegou? — perguntei, com uma pontinha
de esperança brotando no peito.
— Que fui um idiota! Eu tive medo de te deixar entrar na minha
vida e de nunca conseguir corresponder aos seus sentimentos, não
ser o cara que você merecia ter ao lado. Mas o fato é que eu já
estava completamente rendido, apaixonado, só não conseguia
enxergar. Achava que não merecia a chance de ser feliz de novo,
por tudo que aconteceu no meu passado. Mas você, Marcelo, meus
pais e dona Ébia, tinham razão: todo mundo merece uma segunda
chance. Me perdoa, Elaine. Volte pra mim. Seja minha namorada.
Engoli em seco e pisquei várias vezes, com os olhos
marejados, mal acreditando no que ouvia, com receio de ser só um
delírio.
— Pelo amor de Deus, fale alguma coisa, mulher! — ele
suplicou, angustiado e eu comecei a rir.
— Juro que estava aqui na dúvida se isso está acontecendo ou
se seria algum tipo de alucinação, ainda pelo efeito das drogas.
— Estou aqui de verdade e acabei de me declarar pra você.
Quer namorar comigo, pequena?
— Ah, como desejei ouvir isso! Eu quero, sim, ser a sua
namorada, Leonardo Nóbile!
Ele sorriu, emocionado e me deu um beijo suave nos lábios.
Fomos interrompidos pela copeira levando meu café da manhã. Leo
pegou a bandeja e me ajudou a colocá-la no colo.
— Deixa eu te levar lá pra casa, depois da sua alta, e cuidar de
você — pediu quando terminei meu desjejum.
— Adoraria, mas minha mãe vai ficar preocupada. Aliás, por
falar nisso, ela vai querer te conhecer. Já vinha querendo saber
quem era meu amante secreto, quando estávamos tendo aquele
lance da amizade colorida.
— Então eu te levo em casa, você me apresenta a ela e depois
pegamos suas coisas e volta comigo para a cobertura. O que acha?
Vou trabalhar presencialmente amanhã, se estiver se sentindo bem
e completamente recuperada, podemos ir juntos para a Vida Nóbile.
— Mamãe acha que estou dormindo na casa da Érika. Não
quero que ela saiba o que aconteceu, pois tenho medo de que
preocupações assim possam fazer mal à sua saúde. Então, vou
embora com minha amiga e daí você também pode ir em casa,
descansar um pouco, tomar banho e trocar essa roupa e me buscar
mais tarde. Poderia ir almoçar com a gente lá em casa, ao meio-dia,
que tal?
— Perfeito, pequena. Ficamos combinados assim, então.

Após a alta, fui embora com Kinha, que estava mais


empolgada do que eu com o pedido de namoro que recebi do Leo.
— Ai, amiga, sabia que vocês dois ainda teriam um final feliz!
— Eu quis tanto isso, mas já achava que nem iria acontecer.
Parece até que estou sonhando!
— Por falar em sonho, que pesadelo você viveu ontem à noite,
hein? Caramba! Até agora estou chocada com o que houve. Aliás,
antes de ir embora, Marcelo mandou te pedir desculpas, dizendo
que foi ele que apresentou a tal Veruska para o irmão.
— Não foi culpa dele. Às vezes é difícil conhecermos de
verdade as pessoas, né?
— Tem razão, migs.
— Olha, só quero esquecer isso e virar a página.
— Está certa. Até porque, os próximos capítulos da sua
história lhe reservam muitas coisas boas.
— Que assim seja! — Sorrimos com cumplicidade e seguimos
o restante do caminho até em casa cantarolando juntas com as
músicas da Iza, que tocavam no som do carro.

— Como foi a festa ontem, filha? — mamãe perguntou, logo


que entrei.
— Digamos que foi... cheia de surpresas. Aliás, tenho uma
novidade para contar.
— Ah, é? Então conte logo, porque fiquei curiosa.
— Estou namorando, mãezinha. Agora é oficial.
— Que notícia boa, meu amor! É o rapaz misterioso com quem
andava saindo? Posso ao menos saber o nome dele?
— Ele mesmo. Pode sim, e não só o nome. Quero que o
conheça, dona Cirlleni. Espero que não se importe, mas o chamei
pra almoçar com a gente hoje. Meu namorado é o Leonardo Nóbile,
meu patrão.
— Bem que até cheguei a desconfiar que seria ele! Ébia me
disse que vocês tinham ficado amigos. Depois teve toda aquela
generosidade dele quando nos deu os planos de saúde e ainda
arrumou o estágio pra você.
— A senhora sabe do passado do Leo, né? Aquela tragédia
toda fez com que tivesse dificuldades em se envolver de novo com
outra pessoa. Por isso demorou tanto para enxergar o que sente por
mim e me assumir como namorada.
— Dá pra compreender. Bem, se você está feliz, eu também
fico. O que acha que devemos fazer de almoço?
— Que tal uma lasanha? Eu sei que ele gosta.
— Ótimo, bom que é fácil de preparar.
— Vou me trocar e já venho ajudar. Ah, depois do almoço vou
com ele para a cobertura e passarei a noite lá, está bem? Amanhã
iremos juntos para o trabalho.
— Tudo bem, filha.
Sorri para ela e fui para o quarto.

No horário combinado, Leo apareceu com flores para mim e


mamãe. Dona Cirlleni nem conseguiu disfarçar seu encantamento
pelo genro. A conversa fluiu fácil e agradável.
Logo depois do almoço, despedimo-nos dela e fui com ele para
a cobertura.
Adorei almoçar com Elaine e a mãe. Apesar de simples, a casa
delas era aconchegante e as duas me deixaram muito à vontade.
Depois da refeição, levei minha namorada para a cobertura. Pensar
na pequena dessa forma deixava uma sensação gostosa no meu
peito. Jamais imaginei que outra mulher desempenharia esse papel
na minha vida.
— Vamos para o quarto? — propus logo que entramos,
acariciando seu rosto.
— Esqueceu que o médico me orientou fazer repouso? —
questionou, dengosa.
— Não esqueci, mas confesso que estou louco de saudades
de te ter em meus braços. Se deixar, prometo ser delicado e fazer
todo o trabalho por nós dois. — Meu tom de voz saiu rouco,
carregado de desejo.
— Também estou com saudades de transar com você. — Ela
passeou as mãos pelo meu tórax e ficou na ponta dos pés para me
dar um beijo suave nos lábios.
— Hoje faremos amor, pequena. — Beijei sua testa com
carinho. — Venha! — Entrelacei nossos dedos e a guiei para o
andar de cima.
Quando parei de frente a porta do meu quarto, ela me olhou
surpresa.
— Tem certeza? — Receio estampou o seu semblante.
— Absoluta. Eu te amo, Elaine. Mentiria se dissesse que me
perdoei pelo que aconteceu com Lília. Talvez eu nunca consiga me
livrar desse remorso. Mas também não vou mais negar o que sinto
por você e como a quero em minha vida. Sem ressalvas. Quero ser
pra você o melhor homem que eu puder. A melhor versão de mim
mesmo, porque é isso que desperta em mim.
— Ah, Leo! — Sua voz embargou, o queixo tremeu e os olhos
marejaram. — Eu também te amo tanto! Quando começamos a nos
envolver, eu sabia que deveria proteger meu coração, que você
tinha seus traumas e que não estava me prometendo nada. Mas,
mesmo sem querer, foi me conquistando aos poucos, até que me vi
completamente apaixonada, desejando mais de nós dois. Estou
muito feliz por ter me deixado entrar aqui. — Ela tocou meu peito, no
local do coração.
— Obrigado por não ter desistido de mim, mesmo quando eu
me afastei. — Envolvi-a em um abraço apertado.
— Tentei te esquecer, mas foi impossível, pois já estava
entranhado em todo o meu ser.
— Aconteceu o mesmo comigo. Achei que o certo seria me
afastar, que você merecia alguém melhor que eu, mas não consegui
te arrancar de dentro de mim, pequena. Você é minha luz e não
quero mais viver na escuridão.
— Que lindo! Estou encantada com esse lado todo romântico,
louca para ver como será na cama — sussurrou ao meu ouvido e
ficou na pontinha dos pés para mordiscar minha orelha, acendendo
meu corpo inteiro.
— Estou ansioso pra te mostrar. Venha! — Levei-a para dentro
do quarto. — Aliás. Sente e aguarde um instante.
Ela sorriu e fez o que pedi.
Fui até o closet para procurar umas velas aromáticas que
Marcelo tinha me dado no ano anterior, dizendo que seriam ótimas
para deixar o clima romântico com a próxima garota que eu
começasse a sair. Havia chegado a hora de usá-las.
Voltei ao quarto, acendi as pequenas chamas e fechei as
cortinas.
— Olha só! Confesso que não esperava por isso. — Os olhos
de Elaine brilharam de entusiasmo.
— Fico feliz por surpreendê-la! — Fui até ela e dei um beijo
suave em seus lábios. — Depois coloquei para tocar a playlist que
criei pensando nela.
A primeira canção foi Conversations in the dark, do John
Legend.
— Antes eu gostava dessa música e a achava linda, mas
agora ela é muito especial pra mim, porque sempre que a ouço,
lembro de nós dois — Elaine falou, quando sentei ao seu lado na
cama.
— Ela também se tornou muito especial pra mim. —
Adaptando a letra pra nós dois: eu é que achava que não valia a
pena, porque estava preso em minhas falhas, tinha dificuldade em
me permitir ser feliz de novo. Mas você me mostrou que eu mereço
essa segunda chance. Você é perfeita pra mim, pequena. Eu
sempre vou querer o mesmo que você e juro pelo que é mais
sagrado, que não vou partir seu coração.
— Ah, Leo! Seu lado bruto era sexy, mas seu lado romântico
está me derretendo toda. Me beija e faça amor comigo!
— Seu desejo é uma ordem, namorada!
Tomei sua boca na minha, sem pressa. A língua pedindo
passagem, explorando a dela num ritmo sensual e lento. Depois
desci beijando o queixo, pescoço, colo, enquanto minhas mãos
acariciavam seus seios.
Ajudei-a a tirar a roupa, depois ela fez o mesmo comigo. Elaine
deitou de barriga para cima e eu fiquei sobre ela. Chupei os seios
empinados, sentindo os mamilos enrijecerem com o contato com a
minha língua.
Meu pau já estava duro, então esfreguei a ereção contra o
sexo dela. Elaine enlaçou as pernas em meu quadril e rebolou,
deixando-me ainda com mais tesão. Ela era toda deliciosa.
Com os lábios, segui um caminho descendente, beijando a
barriga, continuando para baixo até alcançar sua intimidade.
Chupei-a sem pressa, saboreando-a, levando-a ao limite.
Agarrada ao meu cabelo, ela gemia, manhosa e rebolava na
minha cara. Sem parar o que fazia, penetrei-a com dois dedos, que
deslizaram facilmente para seu interior, pois já estava bem
lubrificada, pronta para me receber. Iniciei movimentos de entrada e
saída, cada vez mais vigorosos, enquanto a língua trabalhava em
seu clitóris.
Quando Elaine estava prestes a gozar, afastei-me para pegar
um preservativo, mas só então me dei conta de que eles estavam
no outro quarto.
— O que foi? — ela questionou meio atordoada.
— Não tenho camisinhas aqui.
— Por mim, tudo bem, não estou no meu período fértil e nunca
fiquei com outro cara.
— Nunca transei sem proteção e a última mulher com quem fiz
sexo foi você.
— Então está tudo certo. Vem cá! Te quero dentro de mim. —
Puxou-me e a penetrei lentamente. Ela moveu os quadris,
recebendo-me. — Que delícia, Leo! — balbuciou, meio torpe.
— Você é deliciosa, pequena. — Acomodei-me por completo
em seu interior e apoiado nos antebraços, entrelacei nossos dedos.
— Eu te amo! — sussurrei e a beijei com um misto de lascívia e
ternura. Movendo-me para frente e para trás, entrando e saindo
daquele paraíso quente e úmido.
— Eu também te amo!
Aos poucos, aumentei o ritmo das investidas, até que a senti
estremecer. Beijei-a de novo e ela gemeu em minha boca, ao
alcançar o ápice do prazer. Sua vagina apertou tanto o meu pau,
que gozei logo em seguida.
Saí dela e deitei ao seu lado, aconchegando-a junto a mim
— Foi maravilhoso! — Beijou meu peito nu.
— Foi perfeito. — Afaguei seu cabelo e as costas. — Agora
vamos dormir um pouco, você precisa descansar.
Ela aquiesceu e logo depois a ouvi ressonar.

Acordamos já era noite. Pedi comida pra gente e tomamos


banho, enquanto a esperávamos chegar. Após jantarmos,
assistimos a um pouco de TV e, ainda cansados, resolvemos deitar
mais cedo.
No dia seguinte, quando saímos para trabalhar, encontramos
dona Ébia chegando.
— Bom dia! Que coisa mais linda ver os dois com esses
sorrisos nos rostos. Cirlleni me contou que estão namorando. —
Minha governanta nos olhava com satisfação.
— É verdade. Estou muito feliz com o que está acontecendo
entre nós. — Olhei dela para Elaine. — Aliás, dona Ébia, vamos
para a Vida Nóbile agora, mas viremos almoçar, está bem?
— Pode deixar que prepararei algo bem gostoso pra vocês! Já
tomaram o café da manhã?
— Já sim — foi a vez de Elaine responder. — Já estávamos de
saída.
— Então, bom trabalho! Vejo vocês mais tarde.
Despedimo-nos e deixei a cobertura em companhia da minha
namorada.

Ao chegarmos à empresa, algumas pessoas nos abordaram


para perguntarem como Elaine estava, pois a viram passar mal na
festa. Sem desejar que aquilo virasse assunto para fofoca, ela se
limitou a dizer que estava tudo bem.
Álvaro chegou logo depois e disse que gostaria de conversar
conosco, então sugeri que fôssemos os três até minha sala.
— Eu preciso te pedir desculpas pelo meu comportamento,
Elaine. Eu tinha bebido demais e acabei passando dos limites com
você — meu primo falou para minha namorada, assim que fechei a
porta.
— Vamos só esquecer o que aconteceu sábado à noite — ela
respondeu, meio sem jeito.
— Você está bem? — ele ainda quis saber.
— Estou sim. Obrigada por perguntar.
— Certo. Era só isso mesmo que eu queria dizer e claro, se
precisar de qualquer coisa, pode contar comigo.
Ela assentiu, ele se despediu de nós e deixou a sala. Quando
ele saía, Marcelo chegou.
— E aí, casal? Tudo bem com vocês? — ele nos
cumprimentou alegre.
— Estamos ótimos e você tem razão, agora somos mesmo um
casal. Pedi Elaine em namoro e ela aceitou — contei, empolgado.
— Que maravilha, mano! Fico feliz demais com a notícia! —
Ele me deu um abraço e depois abraçou Elaine também. — Ele já
estava caidinho por você fazia tempos, viu? — falou para ela. — Só
demorou um pouco além da conta pra perceber.
Elaine sorriu e me olhou com ternura.
— Bem, cambada, o amor é lindo, mas bora trabalhar, né? —
Marcelo espalmou as mãos e nós três rimos.
— Vou para o meu setor. Tenham uma boa manhã de trabalho,
rapazes! — ela falou, depois se despediu de mim com um selinho
nos lábios.
— Assim que encerrar seu expediente, passe aqui para irmos
almoçar juntos, está bem? — pedi e ela assentiu, depois deixou a
sala.
— Que coisa boa te ver assim, mano! — Marcelo comentou,
enquanto ocupava o seu lugar.
Assenti, sem conseguir conter um sorriso. Estava muito feliz e
animado com o namoro.

Eu e Elaine almoçamos na cobertura e combinamos de fazer


isso todos os dias, já que ela trabalhava só pela manhã e a empresa
ficava perto.
Na terça-feira, enquanto corria na praia, dei-me conta de que
já era hora de voltar a trabalhar pelo menos um período de forma
presencial. Seria bom, não só por saber que estaria na empresa e
poderia ajudar Elaine caso precisasse de alguma coisa, mas
também para voltar a conviver com outras pessoas.
Então, depois dos meus exercícios funcionais, tomei banho e
me vesti para sair para trabalhar. Em casa eu usava apenas camisa
social, no entanto quando ia para a empresa, colocava o terno
completo.
Antes de sair, avisei dona Ébia que a partir daquele dia
trabalharia todas as manhãs de forma presencial. Ela me
parabenizou e disse que estava feliz e orgulhosa de mim.
Eu também estava contente com as mudanças. Demorou para
perceber como precisava delas.
Ao chegar à Vida Nóbile, estava ansioso para ver Elaine e
contar a ela minha decisão. Entrei no elevador e quando as portas
começaram a fechar, uma mão delicada fez com que recuassem.
— Bom dia, pequena! — falei, ao me deparar com minha
namorada. Estava linda, vestida de saia lápis, camisa branca e um
blazer azul-marinho acinturado.
— Leo?! — Olhou-me com espanto. — Resolveu trabalhar
presencialmente hoje de novo?
— Não só hoje. Decidi que virei à empresa todas as manhãs.
— Ah, meu amor, que notícia maravilhosa! — Ela entrou e me
deu um abraço.
— Começar os dias assim não tem preço. — Apertei o botão
para que as portas fechassem e me aproximei dela, sedutor. —
Você está tão sexy vestida assim que minha vontade é de fodê-la
aqui dentro, agora mesmo.
— Seria uma aventura e tanto, namorado — arfou,
visivelmente excitada —, mas com certeza a câmera de segurança
filmaria tudo, ou as portas se abririam e alguém nos pegaria em
flagrante. E depois do que aconteceu na festa, já dei motivos
demais para falarem de mim. Basta de escândalos, não é mesmo?
— Ela beijou meus lábios com suavidade e se afastou.
— Não custava tentar! — Dei de ombros e ela riu.

Passamos a nos encontrar todas as manhãs, quando


chegávamos à empresa, depois almoçávamos juntos na cobertura e
quando Elaine não tinha provas ou trabalhos da faculdade para
entregar, ainda curtíamos o final de semana inteiro, grudados um no
outro. Eu tocava para ela, minha pequena cantava para mim. Às
vezes fazíamos amor de forma terna e lenta; em outras,
transávamos com selvageria. A vida estava ótima e eu já conseguia
vislumbrar um futuro melhor ainda.
O tempo só fez com que eu e Elaine nos tornássemos cada
vez mais unidos. Continuávamos almoçando juntos todos os dias e
curtindo os finais de semana na cobertura, na praia da Barra, ou em
pequenas viagens. Fomos para Angra, Paraty e Búzios. Apesar de
achar o clima da região serrana muito romântico, não me sentia
preparado para pegar aquelas estradas outra vez.
Quando minha pequena tinha algum trabalho da faculdade ou
precisava estudar para provas, eu a ajudava com prazer. Na
empresa o pessoal do departamento jurídico era só elogios para ela,
o que me deixava todo orgulhoso. Tinha certeza de que seria uma
advogada brilhante.
Não demorou para que dona Ébia encontrasse outra diarista
para substituir Elaine. Magnólia era uma conhecida dela e estava
procurando mais casas para limpar, então minha governanta fez o
convite. A senhora de cinquenta e poucos anos, negra e franzina,
exibia sempre um sorrisão no rosto.
Quando eu e Elaine já estávamos namorando há três meses,
meus pais vieram ao Rio e fizemos um jantar no meu apartamento
para recebê-los. Os dois a trataram bem e se mostraram muito
contentes e empolgados por me verem em um novo relacionamento
e, acima de tudo, feliz.
Marcelo continuava aproveitando a solteirice como um
verdadeiro playboy. O máximo que ficava com a mesma mulher era
um mês, segundo ele, um período seguro para não se permitir
envolver. Eu achava aquilo tudo uma besteira e suspeitava de que
no dia que a pessoa certa aparecesse, ele não conseguiria escapar
de um compromisso.
Quando eu e Elaine fizemos seis meses de namoro, tudo que
eu mais queria era passar o resto da minha vida ao seu lado. Foi
então que decidi pedi-la em casamento. Saí para comprar um anel
de noivado e solicitei que dona Ébia me ajudasse a preparar um
jantar romântico.
Busquei a pequena em casa e assim que chegamos à
cobertura, orientei que aguardasse à porta um instante. Entrei e
acendi as velas.
— Prontinho, meu amor, agora pode entrar. — Entrelacei
nossos dedos e a guiei até a sala de jantar.
— Que lindo! Estamos comemorando algo especial? — Virou-
se para mim e me encarou, curiosa.
— Elaine Barbosa... — Ajoelhei-me à sua frente e peguei a
caixinha no bolso.
— Ah, meu Deus! — Ela arregalou os olhos, que ficaram
marejados de imediato, e levou a mão à boca.
— Eu te amo, como jamais achei que seria capaz outra vez.
Você me mostrou que eu podia ser feliz de novo e tem iluminado
minha vida desde que entrou nela. Esses seis meses foram
maravilhosos e já não consigo imaginar um futuro em que não
esteja ao meu lado. Quer casar comigo, pequena? Me daria a honra
de ser minha esposa?
— Ah, Leo, eu te amo, tanto! Vem cá! — Ela me puxou para
cima e me beijou, apaixonada.
— Isso é um sim? — questionei, brincalhão, quando nossos
lábios se afastaram.
— Sim! Mil vezes sim! Sempre sonhei em viver uma história
linda de amor, como as dos livros e filmes, mas teve uma época em
minha vida que todos os meus sonhos ficaram para trás e cheguei a
duvidar de que isso algum dia aconteceria. Mas daí você apareceu.
E mesmo sofrido, deixou-me aproximar, conquistou-me aos poucos.
Tivemos nossas dificuldades, no começo, mas faz seis meses que
durmo e acordo sorrindo, simplesmente porque tenho você comigo.
Tudo que mais quero é um futuro ao seu lado. Será um prazer ser
sua esposa. Eu te amo, Leonardo Andrade Nóbile!
Beijei-a outra vez e depois coloquei o anel em seu dedo.
— Está com muita fome? — perguntei, malicioso e mordisquei
seu pescoço, satisfeito por ver a pele arrepiar.
— Mais de você do que de comida. Vamos para o quarto. O
jantar pode esperar um pouco.
— Mulher perfeita! — Peguei-a no colo e a levei assim escada
acima.
Fizemos sexo selvagem da primeira vez e, num segundo
round, amamo-nos lentamente. Terminamos suados, satisfeitos e
famintos. Então tomamos banho juntos e descemos para jantar,
vestidos com roupões.
Aquela foi uma noite longa e deliciosa. Como eu esperava que
fosse o resto de nossas vidas.
Ao ficar viúvo, senti na pele como a realidade podia ser inimiga
dos sonhos, destruí-los em uma fração de segundos. Parte de mim
morreu junto com Lília. Achava mesmo que não merecia voltar a ser
feliz. Deixei que o remorso e a dor me atirassem à escuridão, que só
foi iluminada quando Elaine surgiu em minha vida.
Jamais esqueceria minha primeira esposa, uma mulher
extraordinária. Mas depois que a pequena apareceu, aos poucos
comecei a aceitar que podia, sim, ter um recomeço, que era
merecedor daquilo. Por mais que nunca conseguisse me absolver
por completo da culpa pelo acidente do passado, havia um futuro
pela frente e eu já não tinha dúvidas de que ele seria lindo!

Fiquei muito feliz e emocionada com o pedido de casamento.


Eu também já não conseguia imaginar um futuro em que Leo não
estivesse ao meu lado.
Minha vida tinha tomado um novo rumo desde que ele
aparecera. Quando a gente começa a mudar e acredita que dias
melhores virão, parece mesmo que o Universo conspira a nosso
favor.
Quando mamãe adoeceu, o linfoma não levou apenas a saúde
dela, mas também meus sonhos. Passamos anos difíceis, nos quais
por vezes tivemos muito medo. Mas graças a Deus ela já estava há
mais de trinta meses em remissão e eu tinha fé de que aquela
batalha, enfim, seria vencida. Faltava um tempo para ela ser
considerada curada, já que isso só era dado como certo após cinco
anos sem a doença, mas no fundo do meu coração eu sentia que
iríamos comemorar a vitória.
Terminei o primeiro semestre da faculdade muito empolgada.
Depois que comecei o estágio na Vida Nóbile, estava sendo
tranquilo conciliar o trabalho e o curso. Além disso, sempre que
podia, Leo me ajudava a estudar.
E por falar nele, nunca imaginei que namorar pudesse ser tão
bom e descomplicado. Nosso início foi meio esquisito, mas depois
que assumimos o relacionamento, o envolvimento se tornou
harmonioso e natural. Cada dia mais unidos e com uma
cumplicidade enorme, jamais discutíamos. Nosso precioso tempo
era aproveitado de formas muito mais interessantes e gostosas. A
conversa, o sexo, os passeios, tudo com ele era maravilhoso.
Estava muito feliz pelo noivado e já fazendo planos para o
casamento, que marcamos para um ano depois. Para
comemorarmos nossa decisão, resolvemos fazer um jantar na
cobertura. Estavam presentes: mamãe, dona Ébia, Érika, Wesley,
meus sogros, Marcelo e Álvaro.
Depois do incidente naquela festa, Leo e o primo se acertaram
de vez e se reaproximaram. No final das contas, percebi que Álvaro
não era nenhum babaca, como me pareceu às primeiras
impressões, na verdade me parecia um cara perdido, que ainda
buscava se encontrar.
Durante a recepção, que aconteceu em um clima harmonioso,
duas coisas me chamaram a atenção e me fizeram pensar que
talvez outras histórias estivessem apenas começando.
Primeiro, percebi uma troca de olhares fortuitos e curiosos
entre Wesley e Álvaro, que conversavam como se já se
conhecessem de longa data. Podia ser apenas coisa da minha
cabeça, mas senti uma faísca ali.
Depois, ao entrar na cozinha para encher a garrafa de água,
peguei minha amiga e meu cunhado em um beijo pra lá de quente.
Sem querer interromper o momento, saí de fininho.
— Você não ia buscar água, amor? — Leo me olhou confuso,
ao me ver retornar para a sala de jantar com a garrafa vazia.
— Ia, mas isso pode ficar para depois. — Coloquei o objeto
sobre a mesa e enlacei seu pescoço, dando-lhe um beijo suave nos
lábios, em seguida.
— Está me escondendo alguma coisa, pequena? — sussurrou
a pergunta em meu ouvido.
— Acabei de flagrar Érika e Marcelo se beijando e não quis
interromper o lance dos dois — respondi baixinho, em tom
conspiratório.
— Hum, interessante! Será que sua amiga conseguirá fisgar o
coração do solteiro mais convicto de toda a Barra?
— Quem sabe! Uma coisa que cheguei à conclusão nos
últimos meses é que, em se tratando do amor e das artimanhas do
cupido, tudo pode acontecer!
— Tem razão! A gente que o diga, não é?
Assenti sorridente e dissemos “eu te amo”, um para o outro, ao
mesmo tempo.
Sem nos importarmos se tinha alguém nos observando, demos
um beijo apaixonado.
Bem mais tarde, depois que todos se despediram e nos
deixaram a sós, fomos para o quarto e fizemos amor, primeiro de
forma selvagem, depois lentamente, como já vinha se tornando uma
rotina. Deliciosa, por sinal!
Antes de nos conhecermos, muitas coisas ruins e difíceis nos
aconteceram. Mas, enfim, a vida entrou nos eixos e eu já não tinha
a menor dúvida de que os próximos capítulos de nossa história
seriam lindos!
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indique para uma amiga ou amigo e poste sobre o que achou da
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adorar ver! Meu instagram é @renata_rcorrea e meu facebook é
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Se é a primeira vez que está lendo algo meu, gostou deste romance
e da minha escrita, deixo como dicas para suas próximas leituras
Querido inimigo e Meu vizinho quer casar. Confira as sinopses
no final e leia os dois primeiros capítulos de Querido inimigo.

Beijos,
Renata.
Sempre e em primeiro lugar, agradeço a Deus o dom da
escrita e por me permitir realizar meus sonhos.
Ao meu marido pelo apoio, incentivo, compreensão e por ter
me dado uma família linda.
Aos meus leitores queridos do meu grupo do whatsapp, vocês
são demais! Obrigada por se empolgarem tanto quanto eu com
minhas histórias! Espero tê-los sempre perto de mim.
E a todos os meus leitores, os que me leem há muito tempo e
os que estão chegando agora, vocês fazem tudo isso ter sentido!
Agradeço às minhas queridas amigas escritoras pelo
companheirismo nessa jornada, por escutarem meus desabafos, por
me apoiarem, celebrarem comigo minhas conquistas e sempre me
ensinarem algo. Especialmente à Nathany Teixeira, Cris Barbosa,
Beatriz Cortes, Christine King, Evellyn Miller, Edna Nunes e Tyanne
Maia. Ainda à Mari Sales e as autoras do Desafio Mari Sales, grupo
tão bacana onde dividimos tantas experiências engrandecedoras.
Um muito obrigada aos meus parceiros de blogs e instagrams,
o apoio de vocês é fundamental! Em especial, agradeço à Elaine
Lima, do IG @jornalizando, por além de ter emprestado seu nome
para minha protagonista, ainda ter tirado um tempinho para ler esse
texto em primeira-mão. Sua leitura beta e seus comentários foram
valiosos, querida! Sou muito feliz por tê-la ao meu lado nessa
jornada literária.
Ainda agradeço à minha assessora Amandda, da Artessa
Assessoria Literária, pela capa maravilhosa, diagramação e pelo
suporte que dá ao meu trabalho.
Não poderia deixar de agradecer ao meu agente Felipe
Colbert, por cuidar tão bem da minha carreira e por estar sempre
atento às melhores oportunidades. É uma honra fazer parte de seu
time!
Moonlight Sonata — Beethoven.
Talking to the moon — Bruno Mars
My immortal — Evanescence.
Dona de mim – Iza
Serpente – Pitty
Nocturne Op.9, nº 2 – Chopin
Conversations in the dark – John Legend
Fantasie in D minor K.397 – Mozart

Ouça no Spotify:
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si=LId808hxRJOMkmmcFBZk0Q&dl_branch=1
Pisciana, dramática e chocólatra assumida. Renata dos Reis
Corrêa nasceu em 04/03/1981, em Guimarânia, interior de Minas
Gerais, e há mais de vinte anos mora em Uberlândia com o marido
e os dois filhos, um casal de gêmeos.
É médica oftalmologista por formação, leitora voraz e uma
apaixonada pela escrita. Começou a escrever ainda adolescente,
mas só em 2014 entrou de vez para o mundo literário, ao criar seu
primeiro romance, história que começou como parte de um
tratamento para síndrome de Burnout que teve na época. Romântica
incorrigível, procura sempre passar uma mensagem de esperança
com seus textos, destacando o poder da figura feminina. Já publicou
25 títulos, dentre livros digitais e impressos, que vão desde o drama,
passando pela comédia romântica, até a literatura erótica, sendo 15
romances, além de contos, novelas e crônicas. Só na Amazon suas
histórias somam milhões de leituras.
Contra todas as probabilidades – romance
As coisas não são bem assim – romance
Amores e desamores – contos
Crônicas reunidas – crônicas
De repente, tudo muda – romance
Impossível não te amar – romance
Um Natal inesquecível – conto
Um rock star em meu destino – conto
Nicolas Petrari – romance
Aquiles Petrari – novela
Mais que um olhar – romance
Poder e sedução – conto
Max – novela
Sorte ou azar? – romance
Proibido amor – novela
Safado amor – novela
Em direção ao CEO – romance
Box Irresistíveis paixões (Proibido amor, Safado amor e Bandido
amor) – novelas
Tentação de viúvo – romance
Tudo pra mim – romance
O bebê do meu melhor amigo – romance
Cansei de ser a mulher-maravilha – romance
Meu vizinho quer casar – romance
Querido inimigo – romance
Sem coração: A virgem e o CEO viúvo – romance
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Sinopse:
O jovem milionário Roberto Nobre Aravantes quer casar. Na
verdade, ele precisa disso.
No auge dos seus trinta anos, o que o engenheiro civil,
herdeiro da famosa construtora Aravantes & Toledo, mais quer é
continuar aproveitando a vida loucamente. Ele fugia de
relacionamentos até sua mãe ficar obcecada em lhe arrumar uma
esposa, insistindo em que sossegue e lhe dê netos, perpetuando a
família. Cansado do cerco da matriarca, tem uma ideia genial: casar
por contrato de conveniência. Ao decidir reformar sua luxuosa
cobertura e se mudar para um apartamento no segundo andar,
conhece a mulher perfeita para seus planos.
Ítala, de repente, viu seu mundo desmoronar. Tudo que ela
queria era uma luz no fim do túnel, uma mudança drástica em sua
vida que a fizesse voltar a ter esperanças. Ao conhecer o novo
vizinho, Beto, recebe uma proposta inusitada que poderia ser a
solução imediata para seus problemas. Decide, então, embarcar
naquela loucura.
Será que o relacionamento por contrato continuará sendo falso
depois de se conhecerem melhor e perceberem que, além de
possuírem afinidades improváveis, o desejo começou os rondar?
Venha se apaixonar por essa história quente e divertida!
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Sinopse:

Elon é um jovem milionário, herdeiro da famosa marca de


sapatos e bolsas Couto & Gutierrez. Ainda na adolescência, mudou-
se para os EUA para estudar e acabou ficando por lá, levando uma
vida boêmia, curtindo tudo o que o dinheiro podia lhe proporcionar.
Até que um telefonema do pai alterou o rumo de sua história.
Quando Apolo Gutierrez exige que o filho retorne ao Brasil para
assumir suas responsabilidades, Elon se dá conta de que passou
muitos anos perdido e já não sabe direito quem é e o que quer.
Vendo na imposição do pai a oportunidade de tentar se reencontrar,
retorna para São Paulo.
Raika é uma jovem humilde e batalhadora, filha dos
funcionários da mansão dos Couto Gutierrez. Um drama familiar fez
com que na adolescência ela fosse viver com uma tia no interior.
Aos vinte anos, quando os patrões do pai oferecem a ela um
emprego, agarra-se àquela oportunidade de mudar de vida e retorna
a São Paulo. Tudo que Raika mais deseja é vencer na vida,
encontrar um grande amor, como o que os pais viveram, e arrancar
do peito traumas que a sufocam.
Raika e Elon eram inimigos de infância e depois de dez anos
sem se verem, não esperavam que o destino fosse os colocar de
novo um no caminho do outro. Quando ela é obrigada a ajudá-lo a
se inteirar dos negócios na Couto & Gutierrez, tudo entre eles muda.
No lugar da velha implicância, surgem novos sentimentos, como
admiração e algo mais profundo e perturbador: desejo. Sem que
sequer percebam, acabam se tornando o apoio que precisavam,
mas serão capazes de deixar o passado para trás e se entregarem
à paixão? Conseguirão encontrar o que buscam?

Aventure-se nessa deliciosa história!


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Capítulo 1

Elon

Quando papai me ligou pela terceira vez na semana insistindo


que eu voltasse para o Brasil, comecei a considerar aquela
possibilidade.
Adorava a vida que levava nos Estados Unidos e
principalmente o que o dinheiro me proporcionava lá.
No entanto, como filho único, compreendia que em algum
momento precisaria assumir responsabilidades com os negócios da
nossa empresa.
Meus pais, Sabrina Couto e Apolo Gutierrez, que vieram de
famílias humildes, construíram juntos um verdadeiro império. Meu
avô paterno era sapateiro e ensinou o ofício para o único filho
homem. Papai, que começou a trabalhar com ele ainda menino,
apaixonou-se pela sapataria. Mesmo tendo depois cursado Ciências
Contábeis, ainda desejava um dia ajudar vovô a alavancar seu
pequeno negócio.
Conheceu minha mãe na época da faculdade. Ela cursava
Pedagogia. Apesar da escolha do curso, a paixão de mamãe era a
moda. Após se casarem, insatisfeitos com seus trabalhos, tiveram a
ideia de criar uma pequena fábrica de sapatos. Mamãe desenhava
os modelos, papai e vovô os produziam, depois de prontos os
vendiam em uma lojinha própria.
Tudo começou de forma artesanal. Não tinham muito dinheiro
para investir e priorizavam matérias-primas de qualidade, então não
sobrava nada para publicidade. No entanto os primeiros clientes
amaram os calçados e indicaram para outras pessoas e assim, de
boca a boca, a marca Couto & Gutierrez foi ficando conhecida.
Em dois anos, o lucro crescente permitiu que contratassem
novos funcionários, inclusive um representante comercial, e também
puderam comprar maquinário apropriado. Além dos sapatos,
passaram a fazer bolsas. E com a produção em maior escala,
começaram a ter seus produtos vendidos em lojas por toda região
da Grande São Paulo.
Quando eu nasci, quatro anos depois de criarem a empresa,
minha família já tinha uma boa condição de vida, mas ainda não
erámos ricos.
A guinada rumo ao sucesso empresarial só veio em 2001.
Nessa época eu tinha seis anos. A semana de moda Morumbi
Fashion Week, passou a se chamar São Paulo Fashion Week e a
Couto & Gutierrez recebeu um convite, de uma grife de roupas
famosas, para expor os sapatos e bolsas da nova coleção no desfile
dela.
A visibilidade foi tamanha que não só aumentou a procura por
nossos produtos, como atraiu a atenção de um investidor
estrangeiro, o americano Richard Foster. Com a nova sociedade, a
empresa cresceu ainda mais.
Quando completei dez anos, meus pais decidiram comprar
uma mansão no Jardim Paulista e vovô foi morar conosco. Ele já
estava doente e pouco depois faleceu por complicações de
problemas cardíacos. Apesar da saudade, era reconfortante pensar
que ele teve o prazer de ver o sucesso da empresa que ajudou a
criar.
Ao nos mudarmos, além de manter a diarista que já tinha há
anos, mamãe contratou um casal para trabalhar para nós. Roney
cuidava do jardim, da piscina e servia como motorista, sempre que
necessário. A esposa dele, Celeste, cozinhava e se tornou uma
espécie de governanta, tomando conta de tudo. Eles moravam
numa casinha nos fundos da propriedade e tinham uma filha cinco
anos mais nova que eu, chamada Raika.
Sem ter com quem ficar enquanto os pais trabalhavam, eu
meio que fui encarregado de cuidar da pestinha, todos os dias ao
voltarmos da escola. Nós dois estudávamos de manhã e nunca
imaginei que minhas tardes se tornariam tão longas.
Eu era caladão e a garota uma tagarela. A menina não parava
de falar um segundo e simplesmente não me deixava em paz. Não
demorou uma semana para eu começar a odiá-la. A convivência foi
ficando insuportável e passei a implicar com Raika o tempo todo. Só
queria um pouco de sossego, mas a criatura grudava em mim como
se fosse minha sombra.
O tempo passou e aos poucos Raika também começou a me
odiar, o que era nítido em cada olhar mortal que me lançava. A parte
boa foi que ela acabou se afastando um pouco de mim, mesmo
assim não perdíamos a oportunidade de nos infernizarmos.
Transformamo-nos em dois inimigos de infância.
Aos dezesseis anos, consegui convencer meus pais a me
deixarem concluir o ensino médio nos EUA. Richard e Mary, sua
esposa, ofereceram sua casa para eu ficar e prometeram aos sócios
e amigos que cuidariam de mim.
Um ano depois, recebi a triste notícia que Celeste falecera.
Nas vezes que retornei ao Brasil, nessa década que passei no
exterior, nunca mais encontrei minha “querida inimiga”. Raika, após
a morte da mãe, foi morar com uma tia no interior. Nossos caminhos
seguiram rumos diferentes.
A Couto & Gutierrez ganhou o mundo, rendendo à nossa
família e à Foster uma verdadeira fortuna, que eu sabia muito bem
aproveitar.
Ao completar a maioridade, papai alugou para mim um
apartamento em Nova York, onde eu cursava faculdade de
Administração, com foco em gestão de negócios, na Universidade
de Columbia.
Terminei os estudos sem a menor pressa para começar a
trabalhar, queria mesmo era curtir a vida e tudo que o dinheiro podia
me proporcionar. Entretanto a insistência do senhor Apolo Gutierrez
me fez repensar minhas atitudes. Era chegada a hora de assumir
minhas responsabilidades.
Só que primeiro me despediria em grande estilo.

***

No final de semana seguinte àquela ligação, combinei com


meus amigos de irmos para a 10ak, uma casa noturna famosa em
Nova York que conheci devido aos contatos do pessoal do mundo
da moda.
— Então você vai mesmo voltar para o Brasil? — John,
questionou, olhando-me com pesar.
— Já é tempo de eu criar um pouco de juízo, cara. Mas
prometo vir passear pelo menos uma vez ao ano e será um prazer
recebê-los por lá.
— Sou louco para conhecer o Brasil e suas belezas naturais.
— Deu ênfase nas últimas palavras, deixando bem claro que não
falava apenas da natureza, mas também das mulheres, o que me
fez balançar a cabeça em negativa e sorrir. — Assim que der, farei
uma visita a você.
— E eu vou junto! — David tratou logo de dizer.
— Vai ser divertido ter vocês por lá. — Suspirei já sentindo
uma saudade antecipada dos dois.
Como mudei ainda adolescente para os Estados Unidos,
afastei-me dos poucos amigos que tinha no Brasil, só continua
falando com Isaac e Yan. Dez anos era muito tempo longe da minha
antiga vida e isso me deixava um pouco receoso em relação a como
seria meu retorno.
— Oi, rapazes! — Um coro de vozes femininas me tirou do
devaneio.
Três modelos que já desfilaram representando a marca Couto
& Gutierrez, e de quem acabei ficando próximo, juntaram-se a nós.
Estavam lindas e vestidas de forma provocante.
— Oi, gatas! — cumprimentei-as com um beijo no rosto e
meus amigos fizeram o mesmo.
— Alguma comemoração especial? — Amber apontou para a
champanhe no balde de gelo.
— Hoje é minha despedida daqui, vou voltar para o Brasil. —
Alisei sua cintura fina, sedutor.
— Hum, que pena, vai deixar saudades. — Fez beicinho e
percorreu as mãos pelo meu peitoral.
— Assim espero. — Dei uma piscadela safada e ela umedeceu
os lábios, em um convite luxurioso.
— Vamos tornar essa noite inesquecível! — disse, decidida, e
me beijou a boca com volúpia.
Correspondi com o mesmo desejo, passeando minhas mãos
por seu corpo esguio.
Quando o beijo terminou, pedi ao garçom mais taças e servi as
garotas. John ficou com a Kimberly e David com a Chelsea.
Bebemos, dançamos e ao final da noite, Amber foi comigo para meu
apartamento.
Assim que entramos e tranquei a porta, ela parou à minha
frente e retirou o vestido, ficando só de lingerie vermelha.
Estreitei nossa distância e a beijei com luxúria. A garota
correspondeu com o mesmo desejo.
A noite terminaria muito bem, com sexo casual quente, como
eu curtia. Melhor despedida, impossível!
***

No domingo almocei com Richard e a esposa para me


despedir e agradecer por tudo que fizeram por mim quando cheguei
aos Estados Unidos.
— Sentirei sua falta, Elon, mas sei bem como Apolo já não via
a hora do seu retorno.
— Acho que o velho já estava perdendo as esperanças de que
eu criasse juízo — brinquei, enquanto ele e Mary sorriram. — Estou
empolgado para voltar, mas ao mesmo tempo receoso.
— Está preocupado com o quê? — Olhou-me, intrigado.
— Acabei me acomodando por aqui, nunca me interessei de
fato em como funciona a empresa. A verdade é que não sei quase
nada sobre a Couto & Gutierrez que vá muito além de que
fabricamos calçados e bolsas caras.
— Fique calmo, tenho certeza de que irá aprender tudo que
precisa para nos fazer continuar prosperando. Eu mesmo não sei
muita coisa, apesar de ter entrado de sócio, sou apenas um
investidor, quem sempre cuidou de tudo foram Sabrina e Apolo, não
é mesmo, amor? — Virou-se para a esposa que assentiu,
concordando.
— Vai dar tudo certo, Elon. Acreditamos em você. — Mary deu
um sorriso acolhedor. — E venha nos visitar de vez em quando.
— Pode deixar que virei. Sentirei muitas saudades de vocês,
de meus amigos e de tudo aqui em Nova York. Sei que minha volta
ao Brasil é necessária, porém não será um retorno fácil. Passei
anos curtindo a vida sem me preocupar com nada e agora parece
que já nem sei quem sou, o que quero e como será meu futuro.
— Pode ter a certeza de que cada resposta virá no seu tempo
certo, querido. — Mary acariciou minha mão sobre a mesa.
Anui, emocionado. Estive perdido por muito tempo, era
chegada a hora de me encontrar.
Capítulo 2
Raika

Às vésperas de minha formatura, parei para refletir sobre a


vida. Nunca imaginei que fosse passar por tantas coisas difíceis, tão
nova. Nasci em Pedra Bela, interior de São Paulo, uma cidadezinha
bem pacata. Quando eu tinha cinco anos, papai e mamãe
resolveram arriscar a sorte na capital, em busca de mais
oportunidades para eles e para mim. Com a recomendação de um
amigo da família, conseguiram um emprego em uma mansão. Fiquei
empolgada em pensar que moraria na cidade grande, no entanto
não demorou para eu compreender que a realidade seria um pouco
mais dura do que a fantasia que criara.
O filho dos patrões, Elon, cinco anos mais velho que eu, era
minha única companhia durante as tardes. Apesar da diferença de
idade, achei que poderíamos, quem sabe, tornarmo-nos grandes
amigos. Só que o garoto parecia não tolerar minha presença. Por
mais que eu tentasse de todas as formas conversar ou convencê-lo
a brincar do que quer que fosse, ele recusava. Como se não
bastasse, passou a implicar comigo. Suas tolices me irritavam e
quando me dei conta, já o odiava com todas as minhas forças.
Os anos passaram e crescemos dispostos a infernizar a vida
um do outro. Quando ele entrou na puberdade, ficou ainda mais
insuportável. Por sorte, ao completar dezesseis, foi morar no
exterior.
Um ano depois, quando a paz reinava na mansão e eu
começava a fazer amizades, meu mundo desmoronou de vez.
Eu tinha que entregar um trabalho na escola, mas precisava
comprar algumas coisas para concluí-lo. Minha mãe estava gripada,
mesmo assim, alegando se sentir bem, não hesitou em pedir a tarde
de folga para sair comigo. Quando retornávamos, uma forte chuva
nos pegou desprevenidas.
Chegamos à mansão encharcadas. No dia seguinte, mamãe
acordou com febre alta. Não me recordava de vê-la tão mal, o que
me deixou assustada. Papai a levou a um pronto-atendimento. Ela
precisou ficar internada e, para nosso desespero, ao invés de
melhorar, piorou a cada dia, apesar das medicações. Acabou sendo
transferida para a UTI e foi intubada.
Aquilo tudo parecia um pesadelo. Eu me sentia culpada, pois
se não fosse o maldito trabalho da escola, mamãe não teria pegado
aquela chuva e não teria piorado. Rezei todas as orações que
conhecia, implorando a Deus que a curasse. Eu tinha só onze anos,
meus pais eram tudo para mim, não conseguia nem imaginar como
seria crescer sem dona Celeste por perto.
Infelizmente nem sempre nossas preces são atendidas.
Mamãe morreu uma semana depois. Receber aquela notícia foi
como ter alguém abrindo meu peito e arrancando um pedaço do
meu coração, sem anestesia. Fiquei inconsolável e papai, tão
arrasado quanto eu.
Tia Rosângela, que ainda morava em Pedra Bela, ofereceu
para cuidar de mim. Aos doze anos, retornei a viver na pequena
cidade onde nasci. Chorava todos os dias de saudades de mamãe,
que nunca mais veria, e de papai, que nas suas folgas ia até lá me
visitar. Além disso, desenvolvi um pânico de tempestades. Era
começar a chover mais forte, que o pavor e o remorso me
assolavam.
O sofrimento nos faz amadurecer antes do tempo. Não queria
que minha tia me considerasse um fardo, então, ainda uma criança,
já era responsável com os estudos, ajudava nos afazeres
domésticos e aos dezesseis comecei a trabalhar numa lojinha de
roupas.
O tempo passou, mas nem culpa que eu carregava pela morte
da mamãe, nem o trauma de temporais nunca me abandonaram.
Eu queria muito continuar estudando quando terminasse o
ensino médio, fazer faculdade e um dia voltar a viver em São Paulo.
Para tanto, economizava e guardava o máximo que podia do meu
salário.
Algumas pessoas são como anjos em nossas vidas e assim
foram para mim e papai, dona Sabrina Couto e o senhor Apolo
Gutierrez.
Eles se ofereceram para pagar uma faculdade EAD para mim
e quando eu já cursava o último ano, convidaram-me para estagiar
na Couto & Gutierrez. Providenciaram o que foi necessário para
minha transferência do curso de EAD para presencial e permitiram
que eu voltasse a morar com papai na propriedade da mansão.
Aprendi muito trabalhando para eles, esforcei-me para ser a
melhor estagiária possível e assim que concluí a faculdade, fui
efetivada. Com o novo salário, pude alugar um apartamento.
Convidei papai para ir morar comigo, mas ele alegou que estava na
hora de eu alçar voo e ter o meu próprio canto.
Mudei-me algumas semanas antes da formatura.
Quando a data se aproximou, a única colega da turma com
quem eu conversava, Flaviana, ligou dizendo que ficaria feliz com
minha presença na festa. Ela era da comissão organizadora do
evento, e mesmo eu não participando, eles me ofereceram dois
convites para ir ao baile. Eu disse que pensaria com carinho, mas já
tinha decidido não ir.
— Flor, tem certeza de que não quer que eu te acompanhe na
festa? — Tadeu, um designer de modas da Couto & Gutierrez, de
quem acabei me tornando uma grande amiga, perguntou pela
décima vez, inconformado com minha decisão de não participar do
baile.
— Tenho sim, amore, no sábado você e Raul farão um ano de
namoro e eu jamais iria atrapalhar essa comemoração.
— Ok, não vou insistir mais. Mas sabe bem o que eu penso de
como anda levando a vida, não é mesmo?
— Eu sei... — Fiz uma careta, como se sentisse dor. Já
havíamos tido aquela conversa uma centena de vezes. — Prometo
que vou tentar me socializar mais, sair para curtir, essa coisa toda.
— Quero ver, hein? Não vou largar do seu pé. Não tem o
menor cabimento uma mulher linda e jovem como você, ter um
único amigo, euzinho, por sinal, e viver entocada em casa. Está
perdendo a vida, flor. O tempo não volta atrás.
Suspirei fundo e anuí. Ele tinha razão. Eu só não fazia a menor
ideia de como mudar. Passei oito anos vivendo numa cidade
minúscula, onde tive apenas dois namoradinhos, nada sério. Voltei
para São Paulo determinada a não perder a chance que me estava
sendo ofertada, então passei um ano com a cara enfiada nos
estudos e no trabalho. Minha vida social era inexistente.
— Vai dar tudo certo! — Ele me deu um abraço apertado. —
Meu horário do cafezinho terminou, vou voltar para o trabalho.
Depois a gente se fala.
Despedimo-nos e fiquei o observando seguir pelo corredor, em
sua camisa rosa-claro, que contrastava de forma bonita com a pele
negra. Magro e só um pouco mais alto que eu quando estava de
saltos, achava-o lindo e carismático, não foi à toa que nos tornamos
amigos tão rapidamente. Impossível não gostar dele.

***

Depois do trabalho fui direto para meu apartamento. Tomei


banho, fiz um lanche e liguei para papai.
— Oi, filha! Como foi seu dia?
— Foi bom, bastante produtivo. E o do senhor?
— Foi bom, mais agitado do que o habitual. Elon está voltando
dos Estados Unidos e dona Sabrina resolveu redecorar o quarto
dele e preparar uma recepção.
— Está voltando pra ficar? — questionei me dando conta de
que fazia uns dez anos que não nos víamos.
Será que ainda continua irritante? O pensamento brincou em
minha mente.
— Sim, está vindo de vez. Seu Apolo já tem um tempo que
vem falando que o filho precisa assumir responsabilidades na
empresa para que um dia possa ocupar seu lugar na direção dos
negócios. Ele está bem animado com o retorno de Elon.
— Imagino que sim.
— E o que decidiu em relação ao baile, filha? Não quer mesmo
ir? Eu poderia te acompanhar.
— Não quero não, paizinho. Na verdade, convivi com a turma
por pouco tempo, já que fiz os três primeiros anos do curso à
distância, e não fiquei muito próxima de ninguém. Como o senhor
sabe, eu mesma nem paguei para participar do baile. Meus colegas
levarão amigos e familiares. Aqueles dois convites que ganhei do
comitê organizador da festa foi só por educação da parte deles...
— Justamente porque tiveram a consideração e gentileza de
convidá-la, acho que deveria ir. Além do mais, é sua formatura
também, você é uma garota muito esforçada, merece comemorar
essa vitória. Se mudar de ideia, estarei à disposição.
— Obrigada, pai. Eu te amo, sabia?
— Claro que sim! — Seu tom brincalhão nos fez rir. — E a
recíproca é verdadeira, minha garotinha.
— Faz tempo que não sou mais uma garotinha... — Foi a
minha vez de brincar.
— Para mim, sempre será. Tenho muito orgulho de você, filha,
e sua mãe também estaria muito orgulhosa de ver a mulher
determinada e forte que se tornou.
— Ah, pai... tenho tantas saudades dela. — Minha voz ficou
embargada pela emoção.
— Eu também, meu amor, eu também.
Despedimo-nos e fui para meu quarto. Atirei-me na cama,
mas, apesar do cansaço, não conseguia dormir. Fiquei revirando de
um lado para o outro. Será que minha mãe estaria mesmo
orgulhosa de mim? O que acharia da minha decisão de não ir ao
baile?
Era para a senhora ainda estar aqui, mãezinha... Me perdoe
por tê-la feito sair e acabar pegando aquela chuva. Sinto tanto a sua
falta.
As lágrimas transbordaram, molhando meu rosto. Chorei até
pegar no sono.

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