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Copyright© 2023 - Jéssica Oliveira

Edição 01

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métodos eletrônicos ou mecânicos, sem a prévia autorização por escrito da autora, exceto no caso de
breves citações incluídas em revisões críticas e alguns outros usos não-comerciais permitidos pela lei
de direitos autorais.

1. Literatura Brasileira 2. Romance 3.Jovem Adulto 4. Contemporâneo

Revisão
Eduarda Azambuja

Diagramação
B S Oliver

Criação da capa
lchagasdesign
AVISO: Este livro é um romance que tem como pano de fundo a máfia, é
recomendado para maiores de dezoito anos e contém cenas de ação,
violência, palavrões e sexo explícito. Não é um romance dark, embora
possa conter gatilhos para leitores sensíveis. Se espera encontrar cenas de
detalhes sobre as negociações dentro da máfia e burocracias ou torturas,
este livro não corresponderá às suas expectativas.
Sumário
Sinopse
Capítulo 01
Capítulo 02
Capítulo 03
Capítulo 04
Capítulo 05
Capítulo 06
Capítulo 07
Capítulo 08
Capítulo 09
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Epílogo
Sinopse

Ela é a minha esperança.


Ele é o meu pior pesadelo.
Sienna, menina perfeita de sorriso dócil e mente conturbada, acredita ter
recebido um destino pior que a morte: casar-se com o braço-direito do seu
pai, o seu pesadelo encarnado: Romeo Ferraro.

O Subchefe, um homem rico, poderoso e perigoso, com a alma escura e


condenada ao inferno, não esperava render-se aos encantos da jovem, que
viu crescer.

Ela aguardava um monstro que devoraria sua alma, que a quebraria em mil
pedacinhos, contudo, o medo que carregava tornou-se pequeno comparado
aos sentimentos que nasceu pelo homem.

Romeo jurou protegê-la, ele só não imaginava que sua bela esposa guardava
um segredo que quebraria sua família, colocando-o contra quem ele mais
amava, o seu irmão.

Ódio, amor e traição, é o que esse casamento fadado ao fracasso terá que
enfrentar para encontrar a luz no fim da escuridão.
Capítulo 01

ABRIL

Me seguro na barra de madeira escura como se ela fosse a minha


vida. Cada fibra do meu corpo implora para uma pausa, mas me mantenho
rígida, igual a uma estaca, esperando novas instruções.
— Eu quero os calcanhares juntos ao subir. E demi — professor
Morris profere, encontro sua face no espelho e percebo que está de olho nos
meus passos —, alonguem-se no grand plié, Sienna — diz, parando ao meu
lado.
Suor brota em minha nuca, sempre fui dedicada, mas não sou a sua
aluna favorita, ele acha que só estou aqui porque sou rica, o que não é uma
total mentira, mas isso não significa que eu seja um completo desastre.
— Tem se destacado cada vez mais, Santoro.
— Obrigada, senhor Morris. — Termino o movimento com leveza,
vendo os demais se retirarem da sala, e o professor ainda permanece parado
ao meu lado.
— O conservatório foi convidado a se apresentar no Royal Ballet,
em Londres. Estou selecionando os melhores e como tem se destacado cada
vez mais — ele comprime os lábios, fazendo meu corpo se encher de
alegria —, seria uma honra tê-la em nossa turma.
— Eu adoraria — digo, espantada e sem pensar. — Mas preciso
conversar com o meu pai antes — concluo, vendo os olhos do homem se
estreitarem, óbvio que ele não entende, quem entenderia? Uma mulher de
quase vinte anos e ainda precisa da permissão do papai para sair.
— Claro, eu espero sua resposta até a próxima aula. A viagem
durará em torno de duas semanas e ocorrerá em alguns meses. — Assinto
sem medir o tamanho do meu sorriso e deixo a sala com passos largos.
Savio, o meu guarda-costas, se afasta da parede que estava escorado e me
acompanha para fora da escola.

Chegamos à mansão, e Savio ocupa sua posição em frente à


varanda, depois que Fiorella se casou com Franco, não precisei mais ter
segurança dentro da casa, papai sabe que eu jamais tentaria fugir no meio
da noite. Não que isso não tenha passado pela minha cabeça algumas vezes.
Solto meu sobretudo no cabideiro no canto da sala, ficando apenas
de collant preto com as mangas rendadas e uma meia-calça clara. Subo até
o escritório do papai, ansiosa para contar a respeito do convite.
Nem consigo acreditar que me destaquei por mérito próprio, é uma
coisa rara, pois tudo que tenho é por causa do meu sobrenome, o que
dificulta saber quando algo é verdadeiro e como professor Morris não fez
questão de deixar minha casa influenciar em seu julgamento, sei que foi
pelo meu talento.
Bato na porta de carvalho e aguardo. Depois da invasão da Bratva,
papai nunca mais trabalhou fora de casa e, por isso, infelizmente, a mansão
quase nunca está vazia.
A porta se abre e Romeo aparece diante dela, ergo meu queixo para
olhar em seus olhos escuros intensos e profundos como sua alma e, como
em qualquer outro dia, o Subchefe me encara com desinteresse.
— Eu posso entrar? — pergunto, sinalizando para dentro do
escritório.
Ele me dá um aceno de cabeça e se retira da entrada, revelando
meu pai atrás da mesa de mogno escuro.
— O que foi, Sienna? — papai pergunta. Olho por cima do ombro
e Romeo ainda permanece na sala, controlo a necessidade de pedir licença.
— Podemos conversar? — pergunto com um sorriso chocho,
esperando que o Subchefe deixe a sala, mas ele não o faz.
— Seja rápida, temos uma reunião com o Consigliere da Famiglia
em uma hora e precisamos tratar de alguns assuntos ainda.
— Helena virá? — pergunto, ignorando completamente o motivo
de ter vindo até aqui.
— Sim, querida — diz com uma expressão impaciente.
— Conversamos mais tarde — aviso sem conter minha alegria e
deixo o escritório, indo em direção ao meu quarto. Já faz quase dois meses
que não vejo Helena, depois que ela fugiu de Chicago e papai a deu à máfia
nova-iorquina, a casa ficou ainda mais silenciosa.
Converso com as meninas quase sempre por mensagem, mas tenho
a impressão de que estou sobrando no grupo: ambas envolvidas em seus
relacionamentos, estão perto uma da outra e têm assuntos e problemas em
comuns, mexo a cabeça em negação; pensando bem, nada mudou desde que
moravam aqui. Eu sempre sobrei.
Depois do massacre à mansão, Fiorella ficou inacessível, se
afastando de todos. Sempre fico pensando que, se ela tivesse ido comigo
naquela noite para a casa da prima Lilia, as coisas seriam diferentes.
Tomo um banho ligeiro, ando até o meu closet em busca de uma
roupa quente; pelo clima do lado de fora, está chegando uma tempestade.
Escolho um vestido rosé, com mangas compridas e saia de tule, acima dos
joelhos.
Seco meus longos cabelos rapidamente, quero esperá-la em frente
à casa.
No caminho para o primeiro andar, vejo a babá brincando com
Dario em uma sala de recreação, ele pegou toda a essência de Dona, minha
madrasta, com os cabelos pretos e lábios bem curvados.
Atravesso a porta para a varanda e me posiciono ao lado de Dona,
que está abraçada à sua formosa barriguinha, ela me recebe com um sorriso
caloroso e indica com a cabeça o barulho de carro se aproximando.
— Seria perfeito se Ella visse junto — menciono e enxergo Piero
sair de trás de uma pilastra, ganhando toda a minha atenção. Ele é o irmão
mais novo de Romeo e indiscutivelmente é uma versão oposta do Subchefe,
exceto a aparência. Ambos têm o rosto marcado por um maxilar forte,
cabelos escuros, como os olhos, e as sobrancelhas perfeitamente
desenhadas. Porém, no quesito personalidade, a história é outra. Romeo tem
uma reputação inabalável, com a qual me faz temê-lo, ouvi dizer que sente
prazer em matar, em sentir dor e causar dor. Ele não é um homem qualquer,
é um monstro.
Dona cutuca meu braço e me viro para ela um tanto envergonhada,
presumo que estava encarando Piero sem intenção. Quando ele está por
perto, naturalmente consegue minha atenção, preciso começar a disfarçar
melhor isso.
O Consigliere desce do carro e estende a mão para Helena, os
cabelos pretos como ônix caem em ondas até o meio das suas costas. Ela
está linda demais, Ettore não vai resistir por muito tempo, é impossível não
a amar.
Helena mascara sua tensão quando enxerga Piero e anda até nós
com Ettore ao seu lado, com uma expressão fria. Semanas atrás, quando ela
fugiu de Chicago para não ter que ir a um encontro com Piero, não
imaginou que estaria fugindo do seu noivo. Helena não faz ideia desse
detalhe, e não será eu que vou contar, não há mais nada a ser feito.
Dou um abraço apertado em minha amiga, depois Dona, e percebo
que os olhos do Consigliere não se desviam dela.
— Sentimos sua falta, Helena — Dona fala, alisando o seu braço e
se colocando de lado para saudar Ettore.
Entramos a seguir, Piero levou os homens para o escritório do
papai e, no caminho para a sala de descanso, Helena andou como se
quisesse absorver o lugar inteiro, é notório que sente falta daqui.
— Carlo está feliz com a minha visita? — ela pergunta em meio a
um sorriso sem graça enquanto nos sentamos em uma mesa redonda de
vidro.
— Ele não está com raiva de você, Helena — Dona responde,
acariciando gentilmente seu braço em cima da mesa.
Raiva não acho que seja a palavra adequada, decepcionado com
certeza, papai criou Helena desde os treze anos, deu uma vida nova a ela e,
de repente, um dia qualquer, ela foge de casa, deixando um rastro de
bagunça pelo caminho.
— E gostou de saber que se casou com o Consigliere, é um cargo
de grande importância, e estará perto da Fiorella — Dona complementa,
ainda tentando fazê-la relaxar.
— E os meus pertences, jogaram fora?
— Está tudo do jeito que você deixou, podemos embalar se quiser
levar para Nova Iorque — ofereço.
— Eu adoraria ter minhas coisas de volta — avisa com seus olhos
azuis intensos encarando os meus. — Já pediu um marido ao seu pai? —
pergunta, fazendo-me sorrir.
— Acho mais fácil papai me dar uma arma do que um marido. —
A sensação é esta, e às vezes fico decepcionada comigo mesma por querer
que ele me arrume um marido. — Às vezes, sinto que a vida está passando,
e eu estou ficando para trás. Ella está casada e grávida, Dona grávida, até
você está casada. — Helena me olha chocada, e sinto que me expressei de
forma errada. — Você não parecia muito propensa a aceitar um casamento,
Hell.
— E eu não estava, mas, para ser amada nessa vida, não há outra
forma, e olha onde me encontro agora, presa em um casamento sem amor.
Suas palavras descrevem a vida de todas as mulheres na máfia.
— Ele vai te amar, você é a mulher mais persistente que conheço
— falo com um sorriso.
— Isso é muito reconfortante — ela zomba.

Subimos para o quarto de Helena, ela ficou surpresa por ver que
ninguém mexeu em nada, passamos a tarde embalando seus pertences e
conversando sobre seu casamento. Sinceramente eu não entendo por que os
homens gostam de complicar tanto, foi Ettore que colocou Helena nessa
posição, a tornando sua esposa, e agora ele simplesmente quer ignorá-la.
Eu não sei o que faria na situação dela e julgo não descobrir tão
cedo.
Vou até o meu quarto buscar a jaqueta de couro que peguei
emprestado dela, a visto e me vejo no reflexo do espelho, parece uma
versão ousada de mim mesma. Desço ainda a vestindo e, quando estou
chegando na sala de descanso, encontro Ettore estagnado na entrada com as
mãos em punhos.
— Era — Ettore diz de repente e entra na sala, me aproximo para
ver o que está acontecendo. — Não dirija mais nenhuma palavra a minha
esposa, não toque ou olhe para ela, Piero. — Meu queixo cai, ele revelou
para Helena que estavam noivos.
Me afasto, indo em direção a outro corredor quando escuto passos
deles saindo da pequena sala. Piero enlouqueceu, ele não devia ter dito
nada, se Ettore perde a cabeça, certamente ninguém o julgaria por dar uma
surra nele.
— Sienna, tudo bem? — Dona pergunta quando me vê entrar por
um corredor na lateral da cozinha.
— Hã, sim — digo, tirando a jaqueta de couro.
Dona e eu caminhamos para a sala de estar e o casal já está na
porta para partir. Minha amiga está com um sorriso, mas seu corpo
apresenta tensão, agora se é por medo de papai ou do que houve lá em cima,
eu não tenho ideia. E não vejo Piero em lugar algum.
Dou um abraço apertado em Helena e fico surpresa quando me diz
para ficar com a jaqueta. Não argumento, apenas aceito de bom grado.
Entro na casa com minha família e fico sem saber o que fazer, queria
conversar com papai agora, mas ele não está com uma expressão muito boa.
Gostaria de saber a respeito do que foi essa reunião com o Consigliere.
Embora, bem lá no fundo, eu imagine. Rocco, meu irmão, futuro
Capo e desertor. Não me permito seguir nessa linha de raciocínio, ele se pôs
nessa situação, nos abandonou sem pensar duas vezes.
— Dona, peça a Maitê para preparar dois quartos. Romeo e Piero
passarão a noite conosco — papai diz, e um trovão estronda lá fora.
Minha madrasta lhe dá um aceno com a cabeça e volta para a
cozinha, deixo meu pai e o Subchefe na sala de estar e, no caminho para o
meu quarto, enxergo Piero sentado na sala de descanso. Entro no cômodo,
chamando sua atenção, e sua expressão é uma mistura de cão abandonado e
irritação.
Seus olhos encontram os meus, escuros e nebulosos, quando paro a
sua frente.
— O que foi, Sienna? — Sua voz sai num sopro, como se estivesse
tentando conter a fúria.
— Eu ouvi a discussão, se quiser conversar. — Dou de ombro,
soltando a jaqueta da Helena no encosto do sofá, me sentando ao seu lado.
Ele se vira para mim e fita a janela às minhas costas, o ouço
suspirar profundamente. Começo a pensar que não devia estar aqui,
oferecendo um ombro amigo, sendo que tudo que eu desejo é tocá-lo, e não
conversar sobre os sentimentos que ele tem por minha amiga.
Um relâmpago clareia a face dele, fazendo-o me olhar.
— Não sei por que contei que estávamos noivos.
— Para causar discórdia — deduzo, fazendo-o sorrir e até relaxar
no sofá.
— É um bom palpite — diz e me viro para ele, tocando minha
perna na sua, Piero não se move, apenas me encara com atenção. — Seu pai
cortará minha cabeça se souber o que aconteceu, as coisas já estão
complicadas o bastante entre as máfias.
— Eu não direi nada — comento, e as luzes da casa piscam,
tornando-se meia fase, Piero ajeita sua postura, ficando mais próximo, seu
cheiro doce invade meu espaço, me fazendo inspirar fortemente.
— Acho melhor eu ir.
— Passarão a noite conosco — aviso, e as luzes se apagam de vez.
Um trovão estronda lá fora e clareia a sala por inteiro, me causando
um pequeno sobressalto. A mão de Piero segura em minha coxa exposta
pelo vestido, fazendo meu coração quase perder uma batida.
— Tudo bem, é só um trovão — diz, e o calor da sua mão faz me
esquecer de tudo, encontro o seu olhar pela réstia de claridade que entra
pela janela e seus dedos apertam minha coxa, provocando uma bagunça no
meu coração. Ele, como qualquer outro homem da Outfit, sabe que, em
hipótese alguma, devo ser tocada.
— Me desculpe — fala e, antes de perder o seu toque, meus lábios
colam nos seus, pegando-nos de surpresa.
A mão de Piero desliza para dentro do meu vestido enquanto
nossas línguas se enroscam ferozmente. Minha mão segura em seu pulso
quando percebo hesitação dele em me tocar, e o puxo para perto. Seus
dedos me alisam por cima do fino tecido da calcinha, me fazendo quase
arfar. Meu corpo almeja ser tocado por ele, o calor cresce em mim como um
vulcão, dissolvendo completamente o meu lado racional.
Piero se afasta bruscamente, ficando em pé.
— Não dá! Não podemos, e você sabe disso — exclama
entredentes de forma indignada e me deixa sozinha.
Fico sentada no escuro com a sensação de que o sangue dissipou
do meu corpo. E, ao mesmo tempo em que desejo que tudo seja uma
alucinação, tenho certeza de que faria de novo.
Levo a mão aos lábios e sinto o gosto dele em mim, fecho os olhos
e a sensação do seu beijo ainda me aquece a intimidade.
Devia me sentir culpada?
Quem sabe, se alguém tivesse visto, Piero estaria muito ferrado.
— Sienna? — Tenho um sobressalto quando enxergo papai na
entrada da sala.
— Puta merda, você me assustou — praguejo.
— Sabe que eu não gosto que use esse vocabulário — repreende,
entrando e se sentando onde Piero estava minutos atrás.
— Eu sei, me perdoe — balbucio com o coração batendo na
cabeça.
— O que você queria mais cedo? — Papai se vira para mim e a luz
volta, espero não estar com a expressão de pavor.
Demoro segundos para organizar os pensamentos, enquanto ele me
aguarda falar.
— A escola foi convidada para se apresentar no Royal Ballet, em
Londres. E eu fui uma das alunas selecionadas.
— Não — diz simplesmente e se levanta sem me dar mais
explicações.
— Como assim, não? Isso é importante para mim. E você nem
pensou.
— As coisas estão complicadas agora, Sienna, e não a quero longe
de casa.
— E quando tudo não está complicado, pai? — pergunto com o
sangue ruborizando minha face, o que deixa nítido quanto estou irritada. —
É humilhante depender da sua decisão para tudo, e você nem ao menos
tenta se mostrar disposto a pensar. — As palavras desandam para fora de
mim.
— Sienna, eu só quero a sua segurança.
— A sua segurança está me sufocando, pai.
O olhar dele é impenetrável, ele não mudará de opinião, tampouco
parece abalado com minhas palavras. Meus olhos se enchem d’água quando
lhe dou as costas e corro para o meu quarto.
Me sento na cama com uma vontade crescente de quebrar o quarto
inteiro. Todas essas aulas de balé para que, se nunca poderei seguir carreira,
aulas de piano, aulas de línguas estrangeiras, aulas e mais aulas, apenas para
me manter ocupada enquanto a minha vida passa diante dos meus olhos.
Meu corpo treme incontrolável, e a sensação é que meu peito está sendo
pisoteado.
Permaneço deitada, vendo Chicago anoitecer debaixo de trovões e
relâmpagos. Com o estômago embrulhado, me recuso a descer e jantar na
mesma mesa com papai. E não sei como encarar Piero. Ele ficou furioso,
quanta merda para um só dia.
Os trovões acalmaram lá fora, apenas chove em abundância, e o
meu sono ainda não veio. Já passou de uma hora da manhã e meus
pensamentos ruminam a respeito da minha vida, papai controla a todos e
tem um propósito para cada um de seus homens. Havia decidido dar uma
família para Helena, e para mim? Nada. Não aguento mais ficar no segundo
plano de todos. De repente, ouço uma suave batida em minha porta.
— Quem está aí? — Minha voz sai baixa.
A maçaneta gira suavemente e, quando meus olhos se fixam nos
dele, meu coração dispara feito uma sirene dentro do meu peito.
— Piero — balbucio, o vendo entrar, caminho até a porta e os
corredores estão vazios como em qualquer outra noite, fecho-a e me viro
para ele, um pouco desorientada com a situação.
Seus olhos estão em mim, em cada pedaço do meu corpo, e Piero
não tenta disfarçar. Ele dá um passo e está à minha frente, e o meu peito
sobe e desce frenético.
— Já fiz muita loucura na vida, mas essa é como cuspir na cara do
diabo — profere silabicamente e suas mãos me seguram pela cintura, sua
pele na minha é tão quente que chega a doer.
Piero cheira a curva do meu pescoço, me levando arrepios em
lugares inimagináveis. Solto um suspiro de deleite, deslizando a mão por
seu tórax, e seus lábios encontram os meus, mas não me beijam.
— Me mande embora, Sienna — sussurra contra meus lábios,
deslizando uma das mãos para minha bunda e a apertando com força. —
Estou implorando — murmura, e a necessidade de querer sentir o seu toque
é tão imensa que não sou capaz de proferir nada, principalmente sabendo
que isso é uma tremenda loucura.
Minha língua invade sua boca no mesmo beijo urgente de mais
cedo, e os dedos de Piero engatam nas tiras da minha calcinha, a levando
para baixo.
Seus dedos deslizam pelas minhas dobras molhadas, me fazendo
corar.
— Alguém já tocou em você antes? — Seu dedo se detém em meu
clitóris, o massageando.
— Não — sussurro, pois, nesse momento, parece que até o som do
meu coração está causando um estardalhaço. — Mas não quero que pare...
Piero — sibilo, empurrando a pélvis contra sua mão e soltando um gemido
quando ele cobre com seus lábios.
— Aqui não é seguro — diz, e seu dedo desliza para dentro de
mim. Mordo o lábio, sentido meu sexo pulsar loucamente, de uma maneira
que nunca senti na vida. — Preciso voltar para o meu quarto antes que
alguém perceba.
— Não — imponho com o ar preso na garganta. Essa é a maior
loucura que já aconteceu comigo e tenho certeza de que não haverá chances
de isto acontecer novamente. — Quero senti-lo dentro de mim, nem que
seja por um segundo — sussurro sem dar espaço para a razão.
Esta noite, nem que seja por uma fração de segundos, eu ditarei a
minha a vida.
Abro o zíper da calça dele com o coração galopando no peito e,
com sua ajuda, descemos sua calça. Seguro no pau de Piero e uma sensação
avassaladora atravessa o meu corpo.
— Sienna, depois não haverá mais volta — avisa, segurando em
meus pulsos. — E se Carlo souber...
— Ele nunca saberá — afirmo, deslizando o dedo pela base do seu
pau, e o vejo estremecer.
Piero engole minhas palavras tão sedento quanto eu, suas mãos
arrastam o bojo do meu sutiã para baixo e seus lábios sugam o meu mamilo
com força, cubro a boca com força quando soltei um alto gemido.
— Terá que ficar caladinha — sussurra contra a minha pele e volta
a sugar o meu mamilo, fazendo-me contorcer.
Piero me agarra pelas coxas e me conduz para dentro do meu
espaçoso closet, ele me coloca sentada na ponta de um pequeno armário e
se enfia entre as minhas pernas.
— Isso não parece real — comento, tocando em seu corpo.
— Eu sei — sussurra. — Podemos parar agora, isso já é o
suficiente para o seu pai me decapitar mesmo. — Ele me dá um pequeno
sorriso.
— Você é maluco — profiro, agarrando seu quadril com minhas
pernas, sentindo a sua ereção entre nós. — Não pare agora — peço, me
abrindo para ele, e o seu pau ocupa a entrada da minha fenda.
Afasto nossos corpos, me segurando na madeira atrás de mim, e
tenho uma visão plena e esplendorosa da minha boceta engolindo cada
milímetro dele vagorosamente. Mordo o lábio com força pelo alargamento,
com certeza é desconfortável pra cacete, mas nada que me faz querer afastá-
lo, a única coisa que eu quero é que ele se mova.
— Caralho, princesa, que bocetinha apertada. — Piero estremece
com força dentro de mim e, olhando em meus olhos, ele sai lentamente, me
trazendo picos de dor, que ignoro, olhando cada movimento dele. Suas
mãos seguram em minhas coxas tão forte que tenho certeza de que ficarei
com um hematoma amanhã.
— Posso continuar?
— Deve — digo, e os lábios dele grunhem algo felino.
Os dedos de Piero afundam em nossa umidade e a leva em direção
ao meu clitóris. Ele faz pequenas carícias enquanto começa a me possuir e
vai aumentando as estocadas, indo mais e mais fundo, enterrando-se até o
fim. Eu sei que não podemos demorar, mas a sensação é estranhamente
maravilhosa que eu poderia senti-la para o resto da minha vida.
Uma fagulha de prazer acende no meu centro e não consigo conter
um gemido quando ele pressiona meu clitóris com mais precisão, e cada
músculo do meu corpo se contrai de tanta força que chega a doer. Sei que
amanhã estarei plenamente dolorida. Me deito para trás, sem forças,
cobrindo minha boca com as duas mãos e, pelo reflexo da penteadeira, vejo
Piero me levar à libertação.
Meu orgasmo explode, espalhando-se pelo meu abdômen, indo em
direção ao meu ventre. Cubro a boca com as mãos novamente, vendo o meu
peito subir e descer, a sensação é fascinante, dominando o meu corpo
completamente.
— Não posso gozar dentro de você — diz entredentes, como se
estivesse se segurando. — Me deixe gozar na sua boquinha, Sienna —
sussurra com esforço e sai de dentro de mim.
Desço da mesa com as pernas muito bambas, Piero me segura pela
nuca com força e me leva até o seu pau, ele entra na minha boca grosso e
salgado, mas, de forma alguma, ruim.
— Sinta o seu gosto, princesa — diz quando chupo o seu pau sem
o menor manejo —, e agora sinta o meu. — Ele se inclina para frente e seus
olhos buscam os meus quando explode como um jato quente, enchendo
completamente a minha boca, engulo seu sémen com um pouco de
dificuldade, é mais grosso que eu já imaginei que fosse.
Piero me puxa para cima, e me vejo no reflexo do espelho,
completamente nua, e então a ficha cai tão forte quanto a chuva lá fora. Eu
perdi a virgindade dentro de um closet, quero rir, mas não o faço, pois sinto
os dedos de Piero em mim.
— Você precisa ir.
— Eu sei, nos vemos por aí, princesa. — Piero beija meus lábios,
fortemente, como se fosse um adeus, e tenho certeza de que será.
O vejo deixar o quarto tão silencioso quanto entrou, fico indecisa
entre tomar um banho e me deitar, mas, como quero ficar com o cheiro dele
em mim por mais um momento, apenas limpo o seu esperma e o meu
sangue entre minhas coxas e me deito, pensando como será meus dias daqui
para frente.
Capítulo 02
SETEMBRO

Estremeço com força e um grito passa entre meus lábios quando


alcanço o orgasmo. Minha respiração está uma bagunça, igual aos cabelos
de Piero, que se ergue diante das minhas coxas.
Ele sobe até mim e planta um beijo nos meus lábios antes de se
afastar.
— Está na hora de ir, princesa. — Piero se levanta, arrumando os
cabelos e procurando suas roupas no chão do hotel.
Sento-me na cama e deslizo meu vestido rosé tubinho e saia rodada
com agilidade, arrumo as alças e me viro de costas para Piero fechar.
— Nós vemos hoje à noite, na mansão? — Me viro para ele e
começo arrumar o nó da sua gravata.
— Não. Talvez na semana que vem.
— Sinto que me evita sempre depois que nos encontramos — digo,
olhando em seus olhos. — É culpa? — quero saber.
— Dona está de olho em nós, Sienna. — Franzo os olhos, mexendo
a cabeça.
— Se ela soubesse, ou pensasse, falaria comigo. — Piero faz uma
expressão que reprova o que eu penso.
— Mesmo assim, hoje à noite, já tenho compromisso. — Meus
lábios se separam para questionar o que é, mas Piero me puxa, me beijando.
Nos encontramos pelo menos uma vez a cada duas semanas,
sempre em hotéis diferentes, para não correr o risco de alguém nos
descobrir. E, nas poucas horas que passamos juntos, consigo me sentir livre,
sabendo que, por um curto período, tenho as rédeas da minha vida.
Estar com Piero é perfeito, me sinto viva quando estou ao lado
dele. Não conversamos muito, já que o tempo é curto, é uma coisa ou outra,
queria poder ter uma tarde todinha com ele, não me cansaria. Se eu fosse
mais corajosa, pediria que papai nos casasse. Mas isso geraria perguntas
demais, e talvez colocasse Piero em maus lençóis.
Descemos para o saguão do Hotel Confort Snyder. Sem o Savio às
minhas costas, me sinto menos a filha do presidente, recebendo atenção de
todos os cantos. Piero tem o foco total, principalmente das mulheres, o que
já era de se esperar, ele é alto, forte, eloquente, sorriso incrível, com cabelos
sedosos.
Nunca vou me cansar desse homem.
— Piero Ferraro. — Escuto às nossas costas, nos viramos juntos,
parando diante de uma mulher jovial. Seu cabelo loiro perolado está preso
para trás, em um penteado apertado.
— Amelia Sharman — ele saúda a mulher, beijando o dorso da sua
mão.
— Quanto tempo não o vejo — menciona e direciona seu olhar até
mim.
— Amelia, está é minha amiga Sienna — Piero me apresenta com
o sorriso de um ator.
— É um prazer — dizemos em uníssono.
— Foi bom vê-lo, mande um abraço a Romeo — avisa, se
afastando, fazendo meu coração perder uma batida. Se ela conhece os
irmãos Ferraro, quais as chances de ter ligação com a Outfit? Ah, céus, este
é o preço da mentira, viver constantemente com uma pulga atrás da orelha.
— Quem é ela? — pergunto quando nos afastamos.
— A cônsul, ela trabalha para a máfia há algum tempo. Não
precisa ficar com medo, quase não a vemos.
— E por que você disse o meu nome para ela? — digo, passando
pelas portas da entrada do hotel. Se Piero não está preocupado, não devia
ficar, afinal, é o pescoço dele que está na linha de fogo.
— As pessoas conhecem o seu pai, Sienna, se eu mentisse o seu
nome e Amélia visse alguma coluna de jornal falando de você, pareceria
que estamos escondendo alguma coisa.
— E estamos.
— Não se prenda a isso, princesa, é mais fácil as pessoas
acreditarem que nós esbarramos no saguão, do que você ter trepado comigo
em um dos quartos do hotel. Deus abençoe sua inocência — diz e soa como
deboche, — Vá antes que Savio perceba. — Assinto, olhando em seus olhos
gentis, Piero me dá uma piscadela, sorrio.
Atravesso a rua em direção ao Spa, onde o meu segurança acredita
que eu esteja em uma massagem renovadora de três horas, com direito a
banho de lama.
Entro pela saída dos fundos e saúdo a atendente, a quem dou uma
gorjeta generosa para dizer ao meu segurança, caso ele pergunte, que eu
ainda estou respirando e relaxando dentro de uma sala.
Arriscado? Com certeza, Fiorella teria orgulho de mim, sorrio.
Ela teve duas fugas fracassadas. Eu venho saindo há meses e
ninguém descobriu, papai confia em mim, eu sempre soube que era tachada
como a doce, inocente, ingênua, bobinha... até que veio a calhar todos esses
anos de submissão. Ninguém espera o pior de mim.
Pensar na minha irmã me enche de saudades, ela já teve o bebê,
que se chama Stefano, e eu ainda não tive o prazer de conhecer, porque a
situação permanece complicada e papai não quer me deixar ir para longe.
Encontro Savio sentado na recepção do Spa, ele me olha
analiticamente e relaxa quando lhe dou o meu mais doce e inocente sorriso.
Entro na mansão mais relaxada do que se tivesse feito qualquer
outra massagem no Spa, Piero faz mágica em meu corpo. Ele me deixa
maluca, revelando o pior de mim. Aquele sentimento platônico que sentia
por ele no começo acabou, agora é como uma chama quente e ardente, me
consumindo.
Solto minha bolsa no mancebo e me viro para minha família. Dona
está embalando Mady, a mais nova integrante da família, tendo poucos dias
de diferença do meu sobrinho Stefano. E meu pai está sentado, conversando
com Romeo e Teodoro, o Consigliere da Outfit.
Os homens olham em minha direção, lhes dou um sorriso educado
e os noto com a mesma expressão de austeridade.
— Uau, quem morreu? — pergunto, e meu pai suaviza sua
expressão assim como o Consigliere, mas Romeo continua me encarando
quase incisivamente, um olhar que ninguém desejaria receber de um ex-
executor.
— Ninguém, querida — papai diz, mas ainda estou olhando para
Romeo, começo a pensar que ele sabe sobre mim e Piero, e tremo só de
imaginar. Será que ele deletaria o próprio irmão ao seu Chefe?
Peço licença e deixo a sala em silêncio, subo para o meu quarto
com uma pulga atrás da orelha. O Subchefe jamais direcionou aqueles olhos
sombrios e intimidantes a mim por muito tempo, e hoje me contemplou
como um lobo encarando uma ovelhinha.
Mexo a cabeça, espantando Romeo dos meus pensamentos, antes
que outros mais profundos vêm à tona.
Tomo um banho ligeiro, visto algo confortável em meu closet e,
quando entro no quarto, o meu telefone está vibrando na cômoda, é
mensagem da minha irmã. Fiorella, enviando, outra vez, mais 10145 fotos
de Stef, e quase todas nas mesmas posições, terei que comprar um HD
externo para guardar as fotos do meu sobrinho se ela continuar assim.
Sento-me na cama com o telefone ainda em mãos e apago a última
mensagem que Piero me enviou com o endereço do hotel. Deito-me para
trás, lembrando de como ele me abordou em um dos cômodos da casa,
exatamente três semanas depois de tirar minha virgindade. Me entregou um
papel com o seu contato e, quando anoiteceu, enviei uma mensagem com as
expectativas na lua de que pudesse tê-lo novamente. Uma semana depois,
tivemos nosso primeiro encontro... foi intenso, barulhento, incrível. Fecho
os olhos para relembrar e Amelia Sharman manifesta-se em meus
pensamentos; antes de cair em tormento, uma fraca batida soa na porta do
meu quarto.
— Pode entrar — digo, deslizando o telefone para baixo do
travesseiro.
A porta se abre suavemente e papai surge diante dela. Sento-me e
dou-lhe um pequeno sorriso, estranhando sua visita. Ele não costuma vir ao
meu quarto, pelo menos não depois que eu completei treze anos.
Se ele quer alguma coisa da família, sempre discute na mesa de
jantar, ou em seu escritório.
— Tem um minuto? — pergunta e soa gentil, se aproximando de
mim e sentando-se ao meu lado na cama.
— Claro — expresso, analisando seus olhos que escondem
qualquer vestígio que possa revelar a sua visita.
Papai cruza as pernas, deixando o tornozelo sobre o joelho, em
seguida, ajeita o seu relógio de pulso e finalmente seus olhos encontram os
meus. Suponho que, se ele tivesse descoberto algo, não estaria aqui com
doces sorrisos e, por esse motivo, me mantenho calma.
— Diga, papai, está me deixando apreensiva — comento em meio
a um sorriso.
— Eu não fui sincero com sua irmã, o que a fez me odiar ainda
mais. — Franzo os olhos, confusa com suas palavras, papai estreita suas
grossas sobrancelhas, parece até que está retardando a conversa. — Se
casará com Romeo — diz com diligência.
Se casará com Romeo.
Uma pequena frase que me choca até os ossos, roubando meu ar
como se tivesse sido atingida por uma bola de demolição, bagunçando-me
por inteira.
Penso em Romeo, tentando ligar as palavras do meu pai com
aquele olhar de antes, aquele olhar de quem devoraria a ovelhinha e usaria
os ossos para esgaravatar os dentes.
— Sienna. — Papai aperta meu joelho, chamando minha atenção.
Tenho um sobressalto. Me afasto dele, perdida em meu próprio
quarto, agarro-me na penteadeira, sentindo as pernas cederem ao peso do
corpo.
Isso é um pesadelo, tem que ser, belisco minha pele com força,
provocando lágrimas em meus olhos. Papai se levanta da cama, parando à
minha frente.
— Romeo é um bom homem, Sienna — diz, sem tentar parecer
convincente.
— Defina bom, pai? — Um riso involuntário me escapa. — Um
homem que tinha o trabalho de executor até há poucos anos te parece uma
alma misericordiosa agora? — escarneço no máximo da irritação, fazendo-o
estreitar os olhos. Jamais levantei minha voz nem com os empregados, que
dirá com ele, mas isso que está me impondo é demais para mim.
— Não vim até aqui debater, Sienna, a decisão já foi tomada. —
Minha língua desliza pelo contorno dos lábios, amparando uma lágrima.
Papai se afasta de mim e o ouço suspirar, ele não parece satisfeito
com essa decisão e não entendo o que levou a tomá-la assim, tão de repente.
— Por que o Romeo? Ele... ele tem idade para ser meu pai. —
Mexo a cabeça em negação, isso não é nem metade do que quero dizer a ele
e não posso.
— Eu sou o seu pai! — impõe em tom grave, que me faz apertar a
mandíbula a ponto de partir. Papai respira fundo. — Romeo precisa formar
uma família, precisa de herdeiros, e você também.
— Uau. Somos mesmo apenas máquinas reprodutoras para você.
Agora que tem a Mady, arrumou um jeito bem fácil para se livrar de mim.
Pegou o solteiro mais próximo e me deu, como se não passasse de um saco
de lixo. Fiorella estava certa, você também me dá nojo.
— De todos meus filhos, você foi a única que não me decepcionou.
Não comece agora — expressa sem emoção e me deixa no quarto com meu
coração devastado.
Cada fibra do meu corpo treme incontrolável enquanto ando até a
cama. Pensamentos conflitantes surgem em minha mente e um medo que eu
nunca senti antes atravessa meu corpo, alimentando-se da minha alma.
Minhas ações irrefletidas enchem meus lábios de sangue quando
meus dentes perfuram a pele macia do meu braço, dessa vez mais forte e
profundo que nunca, fazendo picos de dor espalhar-se pelo meu corpo.
Merda!
Levanto-me da cama, arranco o vestido e o jogo longe, atravesso o
quarto até o banheiro e vejo pelo espelho que estou mais pálida que o
normal, puxo o rolo de papel higiênico e me sento na tampa da privada
enquanto limpo a estupidez que acabei de fazer. Inferno, com certeza ficará
marcado por semanas e não sei se maquiagem irá cobrir desta vez. Amasso
o papel, que exibe pequenas manchas de sangue, e volto para o quarto,
machucada e magoada.
Deito-me, pensando que esse comportamento não será mais o
suficiente para aplacar o tormento que sinto dentro de mim daqui para a
frente.

Acordo com meu despertador vibrando na cabeceira da cama.


Desligo e tento voltar a dormir, já que estou sem forças, ânimo ou coragem
de deixar o quarto e ver Romeo andando pela casa, ou pior, Piero.
Será que, a esta altura, ele já sabe que estou noiva do seu irmão?
Fico imaginando o que será de nós. De mim. E o que Romeo fará
comigo quando souber que não sou mais pura. Ele vai me comer viva.
Minha cabeça começa a doer com essas dúvidas e outras milhares de
perguntas que surgem em minha mente.
A porta se abre suavemente, revelando uma bandeja com café da
manhã e minha madrasta atrás dela, com o pequeno Dario em suas pernas.
Ele passa à sua frente e corre para cima da minha cama, parando ao meu
lado.
— Como está se sentindo? — Dona pergunta, soltando a bandeja
na cômoda ao lado.
— Péssima. — Não é nada comparado com o que estou sentindo,
mas serve.
— Fiquei tão surpresa quanto você — diz, me estendendo um
pedaço de pão torrado, mas eu rejeito, sem a menor fome. — Precisa se
alimentar.
Mexo a cabeça em discordância, prefiro definhar a seguir em frente
com esse casamento.
— Pode até ser hipocrisia minha, mas agora entendo o que Fiorella
sentiu quando soube que se casaria com Franco.
— Pensei que desejasse um casamento. — Dou-lhe um olhar de
reprovação.
— Desejava também que meu noivo não tivesse idade suficiente
para entrar em uma fila preferencial — escarneço.
— Seja honesta, Sienna, é realmente a idade dele que lhe
incomoda?
Romeo surge em meus pensamentos, seus cabelos pretos carbono
adornam um rosto intenso, de uma beleza selvagem. Ele é enorme, parece
maciço de tão inflexível e é altamente intimidador. Tem vinte anos a mais
que eu, e sua beleza é como a de um vampiro, ele não envelhece, até parece
que se alimenta com o sangue dos nossos inimigos... só que ele não é Piero,
sem contar que jamais imaginei ter qualquer tipo de contato com ele. E o
que presenciei quando era pequena, somado às histórias que ouvi a seu
respeito, é o suficiente para eu saber que não há redenção para a alma
daquele homem.
— Idade, caráter, conduta e, principalmente, o fato de estar
apaixonada pelo seu irmão — desabafo, Dona não é burra, ela sempre
soube sobre minha afeição pelo homem.
— Eu sei, querida — ela diz, hesitante — tentei argumentar com
Carlo a respeito de Piero, mas ele não quis ouvir. Disse que Romeo é o
ideal.
— Não entendo, Dona — expresso, me sentindo incompreendida
—, do nada papai decidiu que precisa me casar e ter herdeiros.
Estremeço só com a ideia de ter algum tipo de contato com Romeo,
que dirá ter filhos. Tudo que sempre sonhei está nas mãos daquele homem,
que me trouxe os piores pesadelos desde pequena.
Dona deixa o meu quarto, mas não leva a bandeja, na esperança de
me fazer comer.
Puxo meu telefone debaixo do travesseiro e envio uma mensagem
a Piero.
Mensagem Sienna: Precisamos conversar.
Reviro o resto da manhã na cama, esperando a mensagem dele.
Começo a ficar impaciente quando minha barriga rosna de fome e a
mordida em meu braço se torna dolorida, impossibilitando ignorá-la,
tomada pela vergonha que ela me faz sentir por não conseguir controlar
esses impulsos.
Coloco um vestido creme, justo e com mangas acima dos cotovelos
e amarro uma cinta preta à cintura. Cansada de esperar a mensagem de
Piero, eu deixo o quarto.
Caminho até a cozinha, que é o lugar mais seguro nessa casa, Deus
me livre cruzar com o meu pai, mas, com a sorte que tenho, capaz de me
encontrar em uma casa com mais de 2 mil metros quadrados.
Me curvo sobre o balcão enquanto belisco um pedaço de brownie,
logo, ouço um ruído de garganta na entrada ao lado, ergo meus olhos,
encontrando os de Piero. Com passos silenciosos, ele caminha até mim e
desliza um pequeno pedaço de papel pela ilha.
— Não me mande mais mensagens — diz baixinho na hora em que
meus dedos se fecham em torno do papel e deixa a cozinha por outra porta
na lateral.
Leio o papel com meu coração quase quebrando minhas costelas
com a intensidade que bate.
Hotel Belvedere, quarto 8, em uma semana.
Amasso o papel com força e deixo a cozinha no sentido oposto de
Piero, entrando em um corredor estreito que levará ao pátio dos fundos,
talvez um pouco de ar me ajude a clarear as ideias. Faço a curva no
corredor e paraliso quando vejo Romeo na outra ponta, longe, mas o
suficiente para me deixar sem ação. Forço-me a caminhar, visto que ele
anda em minha direção tão naturalmente como em qualquer outra tarde.
Meu noivo me olha como se não passasse de uma mosca voando a sua
volta, apenas exibindo que minha presença não significa nada para ele.
O homem para em minha frente, seu rosto anguloso e afiado, digno
de um Deus grego, tem minha total atenção, enquanto mordo minha língua
para que nada estúpido passe pela minha boca. Seu olhar sombrio e letal
desce pelo meu torso, deixando-me desconfortável.
— Está sangrando. — Sua voz soa monótona, mas é tudo menos
isso.
Percorro os olhos até a lateral do meu braço e enxergo uma mancha
de sangue no meu vestido. Meus lábios se separam, provocando-me uma
agitação. Dou as costas para Romeo, sem saber o que dizer, e ando com
passos largos até meu quarto.
Arranco o vestido, o jogando longe, e começo a procurar o kit de
primeiros socorros que escondi em um dos armários.
Santa estupidez, Sienna.
Sento-me na privada e começo a limpar a lesão, me desprezando
por ser fraca, a ponto de não ter controle das minhas ações contra mim
mesma. Eu não devia estar machucada, papai quem devia sofrer por suas
decisões.
Respiro profundamente, pensando em Piero, nos vemos em uma
semana, só preciso manter a cabeça no lugar antes que enlouqueça.
Capítulo 03

— Não pode me evitar para sempre, Sienna — papai diz na hora


em que entro na sala de estar e, antes que eu pudesse me esgueirar para o
andar de cima, ele desce o jornal que cobre o seu rosto.
Para sempre? Não passou nem uma semana.
— Não tenho nada para discutir com o senhor, então, se me der
licença — digo naturalmente, dando as costas para ele.
— Não, não dou. — Minhas narinas inflam com irritação, respiro
fundo e me viro, esboçando uma expressão natural. Se eu começar a dar
chilique agora, ele reforçará a segurança, e tenho certeza de que me
prenderá dentro dessa casa até o dia do casamento.
— O que quer, papai? — Seu semblante se torna casual enquanto
me observa.
— Presumo que não tenha contado a Fiorella sobre o casamento, já
que não recebi nenhuma ligação insolente.
— Nada foi oficializado, não tenho o que dizer. — O olhar que ele
me dá faz-me arrepender amargamente da escolha de palavras.
— Terá um noivado, Sienna, mas nada que você deva se preocupar.
— Por que está me torturando com isso? — Papai suspira,
colocando o jornal dobrado ao seu lado.
— Eu quero a sua felicidade, filha. — Mexo a cabeça e pressiono
os lábios com força, na tentativa de segurar as lágrimas.
— Sua maneira de demonstrar é um pouco controversa, pai.
— Como um ato de boa-fé, deixarei você ir até Nova Iorque para o
aniversário da sua irmã. Franco me ligou a duas noites, ele quer surpreendê-
la, e suponho que isso te deixará feliz também.
Oh, claro, me enviar para lá somente para demonstrar que ainda há
paz e confiança entra as duas máfias com certeza me trará paz de espírito.
— Adoraria ver Fiorella e conhecer meu sobrinho — expresso com
um sorriso afável.
Quem sabe as duas malucas de lá me deem alguma solução.
Subo para o quarto e encontro Dona sentada na minha cama, ao
lado de um vestido cor azul empoeirado. Alcanço seu olhar gentil e não
consigo disfarçar o desgosto.
— Seu pai pediu que eu escolhesse o vestido do noivado para
facilitar.
— Está tudo indo rápido demais, Dona. Rápido demais!
— Para Carlo, não há por que tardar; na mente dele, essa é a forma
de você perceber que não tem saída.
— Nunca imaginei que, quando a minha vez chegasse, eu me
sentiria dessa forma, encurralada, consternada... procurando uma forma de
me livrar de tudo que sempre desejei.
Fugir me vem à mente. Rocco precisou de um massacre para
escapar e, mesmo assim, foi encontrado. Como eu, uma mera garota,
conseguiria me esgueirar das garras da máfia?
A sensação é que meu cérebro irá explodir a qualquer momento.
— Não é com a pessoa que você quer, mas não significa que tem
que ser ruim, Sienna. Você pode se apaixonar por Romeo e ter uma família,
é só se permitir, e terá tudo que sempre sonhou. — Rio, e lágrimas rolam
pelos cantos dos meus olhos.
— Você é a minha família Donna — eu comento, vendo
exatamente como as pessoas me veem: passiva, compreensiva, sem
defeitos... perfeita. Só que, por dentro, me sinto uma fraude, uma marionete
da família Santoro.
— Estarei sempre do seu lado — expressa, acariciando meu braço.
Percorro os olhos pelo vestido em cima da minha cama e subitamente
minha respiração se torna lenta e pesada. — Descanse, à noite, eu volto
para ajudá-la.
Descansar. Rio, até parece que vou conseguir fazer isso. Passei os
últimos dias controlando a ansiedade que me consumia. Não vi nem Piero
ou Romeo na mansão, o que me deu certo alívio e, ao mesmo tempo, uma
sensação de estranheza, as mudanças já estão começando e, enquanto isso,
me sinto de braços cruzados, apenas assistindo e desejando ter mais um
momento com Piero. Quando penso que talvez aquele tenha sido nosso
último encontro, tenho que conter a necessidade crescente em ligar para ele
apenas para ouvir o som da sua voz.
Se papai o escolhesse...
Se eu tivesse pedido um casamento com Piero, como Helena havia
me dito, talvez isso não estivesse acontecendo, ou quem sabe só estaria
antecipando o agora.
Passo o resto do dia confinada, vendo as estrelas surgirem uma a
uma no céu, e a lua brilhar refletindo luz no meu vestido ainda estendido na
cama ao meu lado.
Levanto-me e tomo um banho rapidamente, preciso cobrir o
hematoma do meu braço antes que Dona venha me dar seu apoio
motivacional.
E, falando nela, quando estou terminando de cobrir a mordida, com
base, corretivo e tudo que essas youtubers ensinam, minha madrasta entra
no quarto em um vestido preto simples, mas, ainda assim, fino.
— Quem está lá embaixo? — quero saber.
— Os de sempre, o seu pai, Romeo, Teodoro e Piero. — Só em
ouvir o seu nome, meu coração bate tão alto que acho que vai quebrar
minhas costelas. — Será rápido, ele te entregará o anel de noivado, o
fotógrafo vai tirar uma foto para o jornal Chicago Tribune, o que te livrará
de uma grande festa, e acabou.
Acabou? Isso está longe de acabar.
— Devia contar para Fiorella, quem sabe ela tenha algum conselho
para te dar. — Estalo a língua, tirando a toalha de volta do meu corpo e
pegando o vestido na cama.
— Minha irmã já carregou a cruz dela, não a farei carregar a
minha.
Puxo o vestido da cama e deslizo em meu corpo com desenvoltura,
ainda tentando assimilar esta situação. Há uma semana, estava apenas
contando os dias para ver Piero em um hotel, nesse momento, estou me
tornando noiva do seu irmão.
Perdê-lo, com certeza, doeu bem mais do que qualquer coisa que
Romeo fará comigo quando souber que sua esposa não tem mais honra.
Questiono-me se isso já aconteceu com alguma mulher da Outfit e o que
fizeram com ela caso tenha sido devolvida.
Minha cabeça começa a doer, e sei que não terei mais sossego
daqui para frente.
Paro em frente do espelho, meus cabelos loiros dourados estão
soltos, cobrindo minhas costas e, no meu rosto, passei apenas um brilho
labial enquanto cobria o machucado em meu braço. É o suficiente para esta
tortura. Dona para nas minhas costas para prender as alças de brilhantes no
meu pescoço. O tecido abraça o meu corpo, modelando minhas curvas, seu
decote é reto e, como ele contém uma espécie de espartilho no interior, os
meus peitos pulam para cima, e a sensação é que está tirando o meu ar. E
atrás uma longa cauda de tule illusion presa à minha cintura.
— Não acha exagerado demais? — pergunto, me virando para ela.
— É um noivado — responde com um sorriso doce.
Me viro para frente com medo até de respirar, um movimento em
falso, tenho a impressão de que as alças vão ceder ao peso dos meus seios e
arrebentar.
— Não quero descer, Dona — aviso com um aperto no meu peito,
sufocando-me. — Não vou conseguir mascarar minha infelicidade, todos lá
embaixo sabem que é uma farsa.
A máfia devia fazer um manual para esse tipo de situação.
Tópico 1: Como agir sabendo que se casará com o braço-direito do
seu pai? O homem que você conhece desde garotinha e que apareceu em
seus piores pesadelos.
Tópico 2: Como contar ao seu futuro marido que você deitou e
rolou com o irmão dele durante meses?
— Sienna. — Dona me puxa pelo braço, forçando-me a encará-la,
ela estreita os olhos quando enxerga os meus com lágrimas.
— Precisa mascarar. É assim que resistimos, pelo menos até o dia
do casamento.
— Eu aqui reclamando, e você passou por algo pior que eu, se
casou com o meu pai. — Dona sorri.
— Ele me assustava no começo, mas tudo que é novo é assustador,
até não ser mais.
Firmo as pernas na sandália de salto alto, puxo o ar com esforço,
orando em pensamentos para não desmaiar no meio do caminho. Dona pega
em minha mão, um aperto sólido me passando um pouco de segurança.
— Vamos — digo, caminhando para fora do quarto.
Dona anda ao meu lado, até alcançarmos as escadas, paro quando
enxergo apenas Romeo lá embaixo, ele está sentado no sofá, com os
cotovelos apoiados nos joelhos e seus dedos entrelaçados entre as pernas.
— Disse a Carlo que seria mais fácil se não houvesse plateia. Mas
a foto terá que fazer depois. — Mexo a cabeça em concordância.
— Obrigada, Dona. — Ela se afasta, desaparecendo no corredor
atrás de mim.
Permaneço paralisada, assim como Romeo, ele não se moveu um
centímetro desde que cheguei, gostaria de saber o que ocupa seus
pensamentos. Até esse momento não havia parado para pensar sobre o que
ele está achando a respeito do nosso casamento.
Obrigo-me a me mover, no primeiro degrau que eu piso, sinto os
olhos dele em mim, mas não sou capaz de olhá-lo de volta, não se eu quiser
chegar no primeiro andar em segurança.
Solto o corrimão, forçando-me a erguer a cabeça. Romeo está em
pé agora e sua postura suntuosa parece que ocupa cada canto da sala. Ele
veste um terno azul Oxford com corte inglês, muito elegante, e suas mãos
estão enfiadas no bolso da calça.
— Sienna — profere quase suave, mesmo assim, faz meu coração
se encolher. Encontro o seu olhar. Olhos pretos como uma pedra ônix,
jamais consegui decifrá-los, mas vejo que há emoções sombrias contidas
neles.
— Romeo — balbucio, torcendo para que minha expressão seja tão
neutra quanto à dele. — Vamos nos sentar — ofereço educadamente, com
minha voz ensaiada de porcelana.
Ele se senta ao meu lado, com nossos joelhos se tocando, e não se
afasta, tampouco parece notar esse detalhe, suas mãos repousam inertes em
cima das suas coxas e, em ambos os pulsos, posso ver o início de uma
tatuagem.
— Ouça... — fala com seus olhos penetrantes e inquisidores
pregados em mim, e os músculos do seu maxilar se contorcem na pele
enquanto ele pausa, talvez em busca das palavras certas. — A decisão desse
noivado não partiu de mim, Sienna, e, pelos seus olhos, percebo que não
deseja estar aqui.
— Você deseja? — Romeo inspira.
— O que eu desejo já deixou de importar há muito tempo. — Meu
futuro noivo tira uma caixinha de joia de dentro do paletó e abre em minha
frente. Seus dedos apanham o anel de noivado sem hesitação. É belo como
qualquer outro, o diamante no topo é grande, no formato oval, e o halo está
cercado por uma coroa de pequenos diamantes.
Romeo me estende a mão com a palma virada para cima e
hesitação domina meu corpo, seus olhos cercados por cílios grossos e
longos encontram os meus e repentinamente tremo como uma folha frágil.
Ele não diz nada diante da minha hesitação. Não vendo outra saída, solto o
ar dos pulmões lentamente e coloco minha mão dentro da sua. Seus dedos
se fecham em torno dos meus, e Romeo desliza o anel com tamanha
gentileza que me deixa surpresa.
Um arranhar de garganta chega até nós, fazendo-me afastar do seu
toque. Papai nos olha com uma expressão de satisfação, que me enche de
repulsa. De trás dele, surge um homem com vestimentas casuais e uma
câmera profissional pendurada ao pescoço.
— Uma foto é o suficiente, Juan — papai diz.
O homem se aproxima, analisando minha expressão e, como a
fênix, minha alegria ressurge das cinzas. Dou-lhe o meu mais formoso
sorriso artificial enquanto me ajeito ao lado de Romeo para a foto.
— Parabéns pelo noivado — Juan diz, e Romeo ignora o homem
notoriamente.
— Obrigada — expresso com minha máscara de menina perfeita.
Juan aponta a câmera para nós e abaixa em seguida, pressionando
os lábios.
— Os noivos podem se aproximar um pouco mais — diz,
sinalizando com a mão, e não soa como um pedido. Romeo se aproxima,
percebo que ele também está se sentindo deslocado. — Agora peço que a
noiva posicione a mão no joelho do noivo, para ostentar a aliança, e o noivo
pode colocar a mão na cintura da amada.
Nós olhamos brevemente e apenas assinto para Romeo seguir em
frente, se Juan não tirar logo essa foto, o meu sorriso vai esvaecer e nem por
ordem de Cristo ele voltará.
Os dedos dele se fecham em torno da minha cintura, e um calafrio
repentino corre pelas minhas costas, obrigo-me a ficar paralisada e fecho
minha mão em torno do seu joelho, apontando o luxuoso anel em direção ao
fotógrafo.
— Sorriam — Juan expressa com uma alegria mais falsa que a
minha.
Meu sorriso se mantém congelado, ao contrário da expressão de
Romeo, enquanto eu preciso disfarçar, o seu semblante é de um enterro.
Juan mostra a foto para papai, que assente positivamente para o
homem.
Romeo retira minha mão da sua perna e se ergue, afastando-se de
mim, nesse momento, Dona e o restante dos convidados entram na sala.
Piero é o primeiro que eu vejo, ele está sorrindo, parece verdadeiramente
feliz pelo noivado, assim como o meu pai, e seus olhos não encontram os
meus nem por um segundo.
Um garçom se aproxima, trazendo espumantes em uma bandeja.
Pego uma taça e, como minha irmã fez em seu noivado, viro em um único
gole, recebendo um olhar de papai. Dou-lhe um sorriso de garotinha
perfeita e solto a taça de volta na bandeja.
— Se precisarem de mim, estarei em meu quarto — aviso, dando
as costas a todos.
— Sienna. — A voz do meu pai é firme, tirando-me toda a ação.
— Deixe-a ir — Romeo intervém antes que eu pudesse me virar
para papai, e como não houve objeção de ninguém, não olho para trás,
apenas subo sem pressa para o meu quarto.
Jogo-me na cama, tremendo violentamente, fecho as mãos em
punhos, tentando controlar os batimentos cardíacos, antes que eu perca a
cabeça e ceda aos meus impulsos. Estou noiva, encurralada e morta se esse
casamento seguir em frente.
Capítulo 04

Esfrego as palmas das mãos contra o tecido da minha saia lápis,


removendo o suor pela ansiedade, e giro a maçaneta do quarto onde Piero
está me aguardando. Atravesso a porta sem saber o que esperar, depois do
meu noivado com seu irmão, não o vi até agora.
Nossos olhos se encontram, e Piero avança em minha direção,
selando nossos lábios antes que pudesse dizer qualquer coisa, seu beijo é
intenso e ávido enquanto me ergue contra a porta do quarto, se enfiando
entre minhas pernas. Sinto sua ereção crescer contra minha virilha, me
agarro em seus ombros com força, o puxando para mais perto.
Seus lábios descem pelo meu pescoço e sua barba macia me deixa
arrepiada.
— Piero — sussurro enquanto o ajudo remover nossas peças
íntimas.
— Sentiu minha falta, princesa? — murmura com sua face colada
à minha e seus lábios contra meu ouvido.
— Sim — gemo quando entra em mim, forte e profundo, suas
mãos arrastando minha saia para cima.
— Não podemos demorar — avisa e, ditando um ritmo
desenfreado, me possui com tamanha posse, como nunca. Até o seu olhar
está diferente, é frio, intenso e perturbador, combinando perfeitamente com
o meu estado de espírito.
Abraço o pescoço de Piero e vejo minha majestosa aliança pontuar
de trás das costas dele, seu diamante brilha intensamente e sua luz reflete a
minha traição. Romeo surge na minha mente, balanço a cabeça para afastá-
lo. Se fosse em um casamento por amor, isso certamente pulverizaria minha
integridade.
Piero para de repente, buscando meus olhos.
— Está distante — diz contra minha boca, me analisando.
Comprimo os lábios, de fato estava em outro lugar — Pelo amor de Deus,
não me diga que está pensando nele agora. — Piero me solta e se afasta,
arrumando sua calça no lugar.
Meus lábios se separam sem argumento enquanto ajeito minha
saia.
— Tudo que eu tenho feito na última semana é pensar nesse
maldito noivado e em como me livrar dele. É você quem está distante
agindo indiferente, como se isso não o afetasse.
— Nós sabíamos que isso uma hora ia acabar. Carlo não a deixaria
solteira para sempre, Sienna. — Meus lábios se separam diante da sua
ausência de empatia.
— Então, por você, tudo bem eu me casar com Romeo? —
pergunto com uma inquietação se formando dentro de mim.
Piero dá de ombros, e esse gesto não me agrada nem um pouco.
— Nunca teríamos um futuro, princesa, mas casada com Romeo, o
meu acesso a você seria ilimitado.
Mexo a cabeça em negação, isso seria suicídio, aquele homem
deve conhecer mais formas de matar que um psicopata.
— Vamos conversar com o meu pai — digo, me aproximando dele,
— Vamos dizer a verdade, que nos apaixonamos e queremos ficar juntos.
Num segundo, Piero está em minha frente, seus dedos firmes se
fecham em torno dos meus braços e me puxa para perto de si quase tirando
meus pés do chão. Seus olhos que sempre me olharam gentilmente devoram
os meus, sem inclemência, revelando seu verdadeiro monstro oculto.
— Você não é maluca de abrir a porra da boca para o seu pai. — A
severidade em seu tom de voz me fez desejar desaparecer.
— Quando o Romeo perceber que não sou virgem, todos vão saber
— aviso, e seus dedos se fecham com mais força, provocando lágrimas em
meus olhos.
— Pode dizer o que quiser, ninguém acreditará em você, Sienna. A
sua irmã quebrou toda a credibilidade que alguém poderia ter em você. E
Carlo, com certeza, acharia que criou essa história absurda para fugir do
casamento — declara cada palavra soando asperamente.
— E seu irmão, em quem você acha que ele acreditaria? — Piero
cerra o maxilar na mesma intensidade que aperta meus braços, e de repente
me joga para cima da cama.
Abraço meus braços com a sensação dos dedos dele em minha pele
ainda. Piero está impaciente, irreconhecível. Honestamente não sei o que
me levou a pensar que ficaríamos juntos no fim. Todas as vezes que nos
encontramos nunca conversamos sobre o futuro, e ele não me prometeu
nada.
— Mete uma coisa nessa cabecinha, princesa, esse casamento vai
acontecer, e caso Romeo perceba que não é mais a santa que todos pensam,
você vai contar que foi Savio ou qualquer outro segurança que tirou sua
honra. Entendeu?
— Ou o que, Piero? — ouso perguntar, levantando-me do colchão
e me afastando dele.
Seus lábios se curvam em um riso.
— Você não conhece mesmo Romeo, se ele souber que fui eu
quem tirou sua virgindade, terei sorte se ele me der uma morte rápida, mas,
quanto a você, princesa — Piero solta uma risada pelas narinas —, ele vai
devorar a sua alma e vai quebrá-la em mil pedacinhos.
— Ele não pode me matar, papai jamais o perdoaria.
— Então, pior para você. — Meus olhos estão uma profusão de
lágrimas, mal o enxergo em pé em minha frente. Me sento na cama,
amparando a cabeça com as mãos, e ouço um suspirar.
Piero se ajoelha na minha frente, ele segura gentilmente em meus
pulsos e os afasta para me olhar nos olhos. Suas mãos amparam minha face
e seus polegares limpam minhas lágrimas.
— Me perdoe, princesa, eu não devia tê-la tratado dessa maneira.
É, você não devia.
— Tudo bem, você também está assustado — forço-me a dizer
com o resto da empatia que sobrou por ele.
O que eu sinto por Piero não deixará de existir num estalar de
dedo, mas a maneira que ele me tratou agora me faz pensar que não estou
perdendo grande coisa. Romeo me assusta, ele é aquele tipo de homem que
exibe apenas no olhar que deve ser temido. Não há surpresas, pois já sei o
que esperar dele, ao contrário de Piero, uma propaganda engenhosa e
enganosa.

Desço do carro, ansiando por um banho, que certamente não


limpará a bagunça que está meus pensamentos, mas quem saiba tire a
sensação dos dedos imundos de Piero de mim. Passei o caminho
relembrando nossa conversa. No seu tom de voz inflexível, nas palavras
temíveis, e de como ele fez-me sentir pior do que estava antes de vê-lo. Me
aterrorizou de propósito, ele quer que eu sinta medo de Romeo, só que ele
não imagina que eu já tenho o suficiente.
Entro na mansão, chamando atenção de Romeo, que conversa com
dois homens de terno preto, ambos devem estar na casa dos trinta anos, e o
porte físico é de um personal trainer, sem dúvidas.
— Boa tarde — digo sem o mínimo de ânimo e me direciono para
as escadas ao lado.
— Espere. — A voz de Romeo me congela no primeiro degrau.
Por Deus, quero bufar, revirar os olhos, ou até mesmo me jogar no
chão e chorar. Tive um dia péssimo, a minha dose de doçura evaporou com
as lágrimas que derramei naquele quarto de hotel.
— Pois não, Romeo? — pergunto com a mesma indiferença que a
dele.
— O Ezio — diz, apontando para o cara grandão, de cabeça quase
raspada, expondo uma espécie de tatuagem da qual não consigo decifrar —
e o Tito vão te acompanhar amanhã em Nova Iorque.
Encaro Tito, seus olhos castanho-claros, assim como seus cabelos,
me analisam. Os dois homens não trabalham para meu pai, pelo menos eu
nunca os vi antes. Percebo que logo, logo quem tomará as decisões por mim
será Romeo. Não sei o que pensar disso.
Assinto silenciosamente.
— Algo mais? — quero saber.
Romeo faz sinal para os homens saírem e se aproxima de mim,
cautelosamente.
— Ezio será seu segurança particular quando se mudar para a
minha casa.
— Por que não posso ficar com Savio? Ele é da Outfit. — Me ouço
argumentar e quase fico surpresa, mas algo lá no fundo me diz que só não
estou a fim de facilitar.
— Ele é um dos homens do seu pai.
— E daí? — As palavras me escapam.
Pronto, irrite o homem agora, e ele te amordaçará nas núpcias.
Estremeço ao pensar nessa palavra, ser amordaçada será o menor dos meus
problemas.
Romeo estreita os olhos, talvez admirado pelas minhas respostas, a
nossa maior conversa foi em nosso noivado e o diálogo teve mínimas
palavras.
— Estou apenas fazendo a cortesia de te informar, não confunda
minha gentileza com indulgência.
Meus lábios se separam, mas os fecho com força, sentindo as vistas
umedecerem. Parece que estou dentro de um saco de pancada, onde todos
se acham no direito de me golpear.
— Sienna... — Romeo balbucia, mas já estou correndo para o meu
quarto. Bato a porta com força e me escoro contra ela, sentindo meu corpo
tremer.
Só respire.
Apenas respire.
Levo uma mão ao peito, sentindo meu coração trabalhar rápido
demais, e meus dedos deslizam pelo delicado colar de brilhantes que Piero
me deu em meu aniversário de vinte anos, no mês passado, seguro-o com a
intenção de arrancá-lo, mas não o faço, lembro-me de como fiquei feliz em
recebê-lo. Deito-me em minha cama, apenas aguardando o amanhã. Minha
irmã e Helena me darão um pouco de esperança, principalmente Fiorella.
Ela foi capaz de fazer um monstro amar, talvez, um grande talvez, Romeo
seja essa exceção também.
Capítulo 05

O SVU estaciona dentro dos portões da mansão Fiore, e aguardo


Ezio abrir a minha porta, com o coração impaciente. Faz sete meses que não
vejo minha irmã, ela já passou por tanta coisa que me sinto culpada em
levar meus problemas para ela.
Lazzaro é o primeiro que eu vejo, fumando um cigarro diante da
entrada. O segurança exibe um pequeno sorriso quando me vê. No tempo
que ele passou conosco na mansão Santoro, suponho que fui a única que
não o tirou do sério. Fiorella adorava atormentar os seguranças, assim como
Savio, e Helena tentava seduzi-lo a todo custo e, por fim, quase conseguiu.
Sorrio.
— Bom vê-lo, Lazzaro. — Ele assente educadamente, abrindo a
porta para mim.
Atravesso a entrada e sigo o cheiro de comida até a cozinha ao lado
e Franco está vindo em minha direção. O homem que, em outra história, era
para ser meu marido, anda até mim, usando apenas roupas casuais e
carregando um pequeno bebê nos braços.
— Obrigado por vir — diz educadamente e inclina o bebê para
mim. Franco, mesmo em sua forma mais gentil, parece incapaz de mostrar
empatia.
— Estava ansiosa para conhecer essa doçura — expresso, me
aproximando de Stef, e não consigo deixar de ficar encantada. O bebê
dorme um sono profundo, vejo sua carranca notoriamente foi herdada de
Franco, assim como os cabelos escuros que parecem seda de tão sedosos.
— Ele é perfeito — comento, e Franco abre um sorriso, mostrando
todos os dentes e, até em seus olhos, posso ver satisfação.
É, Fiorella transformou mesmo esse homem.
Um ruído com a garganta faz Franco se afastar, revelando Helena,
seus volumosos lábios se curvam em um sorriso, enquanto seus braços
envolvem meu pescoço com firmeza.
— Senti sua falta — ela diz quando se afasta e engata seus braços
em meu quadril, me guiando até a sala principal, que parece um enorme
cercado infantil.
— Onde está Fiorella? — pergunto, olhando em volta, quando me
sento em uma macia poltrona.
— Está no banho — Franco informa enquanto embala o bebê, faço
sinal para ele me alcançá-lo, não viajei de tão longe apenas para olhá-lo.
O Capo da Cosa Nostra me encara hesitante, fazendo-me arquear
uma sobrancelha.
— Prometo não sair correndo — aviso, e seus olhos escurecem.
— Você não alcançaria a porta — diz em meio a um sorriso e solta
Stefano em meus braços.
É tão leve e cheiroso, afundo meu nariz na curva do seu
pescocinho, é puro e perfeito.
— Eu quero um — digo, fazendo-os sorrir.
— Também não me canso de olhá-lo — Helena expressa, nisso
Ettore aparece e a abraça por trás.
— Como você está? — pergunto, depois do que houve com eles,
Hell se manteve afastada por um tempo, acredito que aprendendo a lidar
com o vazio. O amor deles venceu no fim, mas deixou uma ferida que
nenhum dos dois conseguirá remover do coração, a perda de um filho.
Ettore dá um beijo em sua têmpora e se afasta, deixando a sala com
Franco. E minha amiga se aproxima visivelmente bem, porém, assim como
eu, ela pode mascarar perfeitamente o que aflige os pensamentos.
— Estou bem... Estamos bem — se corrige com um sorriso meigo
e se debruça sobre o bebê, seus dedos finos e delicados percorrem a
cabecinha dele com gentileza. — Só não sei como parar de sentir falta de
algo que nunca tive.
— Oh, Hell, o tempo faz milagre.
— Bom, sabemos disso pelo superpai mafioso. — Rimos, passos
soaram nas escadas, Helena gira nos calcanhares, me dando as costas.
— Até que enfim a aniversariante acordou. — Helena se queixa,
abraçando Fiorella apertado, os olhos azuis prateados de minha irmã
encontram os meus e seus lábios se separam como se estivesse vendo um
fantasma.
— Oh... Meu Deus, você está aqui. — Helena solta a Fiorella, e ela
desfila em um vestido laranja floral até mim. Seus lábios arrebitados se
alargam em um sorriso gostoso enquanto empurra a mecha da sua franja
para trás da orelha.
— É seu aniversário, Franco pediu ao papai que eu viesse. E eu
estava muito ansiosa para conhecer essa fofura — digo, cheirando a
cabecinha de Stef.
— Por que não me disse que viria? — ela pergunta e deposita um
beijo em minha bochecha.
— Porque não seria surpresa — Franco diz na entrada de um
corredor, ele anda até minha irmã de forma descontraída, e seus olhos são
apenas dela.
— O almoço está na mesa — a empregada da casa avisa, e Stef
acorda, chorando baixinho. Sua carinha se enruga e instantaneamente ele
fica da cor de uma cereja enquanto bate os bracinhos.
— Vou roubá-lo para mim — digo, apertando meu sobrinho contra
o peito, enquanto o levo até sua mãe.
— Já não tem a Mady para chorar nos seus ouvidos? — Concordo
com um sorriso e lhe entrego o bebê, que para de chorar quase
instantaneamente.
Fico chocada, e Franco também, pois questiona com uma carranca,
segurando Fiorella pela cintura:
— O que você tem que eu não tenho?
— Peitos — o Consigliere responde, nos arrancando risos.
Acompanho Helena e seu marido até a sala de jantar, enquanto Ella
coloca Stefano para dormir. A mesa está pronta com diversos pratos de
comida, com certeza os favoritos de minha irmã, ocupo um dos cinco
lugares, ficando de frente para Hell e Ettore.
— Percebi que está com novos seguranças, o que houve com
Savio? — Helena pergunta, franzindo o cenho.
Meus lábios se abrem para inventar uma desculpa deslavada, não
quero tornar o aniversário de Fiorella um círculo de apoio.
— Está faltando um prato — diz, olhando para Franco, que
enrijece os lábios. — Busque para mim enquanto eu o chamo — pede com
meiguice e lhe dá aquele olhar de pedinchão que funcionava com papai.
E o inferno vai congelar, pois o bastardo obedeceu, e minha irmã,
com toda a certeza, foi buscar o segurança para comemorar seu aniversário.
Meus olhos encontram os de Helena, e ela está mordendo o lábio inferior
enquanto tamborila os dedos na mesa.
Fiorella volta com Lazzaro na mesma hora em que Franco se senta
à ponta da mesa, o segurança se senta ao meu lado, ele é mais alto e forte
que eu imaginava, ficando, assim, tão próxima dele.
Seus olhos encontram os meus de esguelha e lhe dou um sorriso.
Quando me ajeito na cadeira, Fiorella está me encarando com um risinho
diabólico, e tenho certeza de que serei vítima das suas piadinhas. Se
Lazzaro soubesse a necessidade gritante que minha irmã tem de arrumar
uma noiva para ele, sairia correndo desta mesa agora.
Fiorella permanece em pé e sua mão desliza pela nuca de Franco
delicadamente.
— Sou péssima com palavras, já devem ter percebido — comenta
em meio a um sorriso. Franco puxa sua mão e deposita um beijo em seu
dorso. — Estou muito feliz que estejam aqui comigo, e... que caralho de
anel é esse no seu dedo, Sienna? — A voz dela sobe um quarto em
milésimos de segundos.
Assim como todos, meus olhos caem sobre meus dedos, que eu
timidamente escondo embaixo da mesa. Argh, ultrapassei o limite da
burrice dessa vez, devia tê-lo escondido até mais tarde.
— Estou aguardando — minha irmã diz em tom severo, como se
eu tivesse cometido alguma espécie de traição em não ter revelado antes.
— Podemos conversar mais tarde? — sugiro, sem ter para onde
recorrer, pois até Helena, à minha frente, me fita perplexa.
— Não — Fiorella diz, deixando todos tensos. — Você me
escondeu o meu noivado, e o seu noivado... — Ela mexe a cabeça em
negação.
— Fiorella — Franco interrompe e a puxa pelo pulso, aproveito a
distração e saio da mesa sem saber para que caminho seguir, portanto, deixo
a casa em uma saída na lateral, para os fundos.
O pátio é vasto, então, caminho até embaixo de uma árvore. Inalo o
ar quente do verão com força e uma sensação esmagadora machuca o meu
peito. Arruinei minha vida ao me envolver com Piero e agora o primeiro
aniversário em família da minha irmã...
Céus, o que estou fazendo comigo?
Todos esses anos, eu fui perfeita para que Ella pudesse ser
imperfeita, para que não precisasse carregar o peso do nosso sobrenome e
todas as imposições que vêm com ele. E agora que não tenho mais que
carregar esse peso, simplesmente não sei onde me encaixo.
Nunca havia perdido tanto o controle como nessas últimas
semanas. Os impulsos que não aconteciam há anos voltaram a me
atormentar em menos tempo. Um rastro enorme de mentiras, que
honestamente não há como apagar.
— Sienna. — Escuto às minhas costas. Fiorella segura na curva do
meu cotovelo, mas não tenta me virar. — Quem é o homem? — Minha
cabeça cai para frente, junto das lágrimas e um soluço.
Fiorella faz a volta em meu corpo e me abraça com tanta força que
a dor é reconfortante. Me agarro na sua cintura e cedo ao conforto dos seus
braços, deixando partir o peso de semanas de estresse enquanto recebo
pequenas carícias na nuca.
Me afasto dela, sua face é um borrão em meio às minhas lágrimas,
nos viramos, seguindo um choro de bebê, Franco está com Stefano diante
da porta.
— Vamos, eu preciso alimentar Stef e quero saber quem é o
privilegiado que o desgraçado do nosso pai arrumou para você. — Ela pega
em minha mão e guia para dentro da casa. Helena segura o bebê agora, nos
aguardando, e sua expressão não é melhor que a nossa.
Andamos as três para uma sala menor na lateral da casa. Fiorella se
senta em uma grande poltrona de amamentação na cor rosé e estica os pés
em um puff à sua frente.
— Estraguei o seu aniversário — digo, me sentando em um sofá ao
lado de Helena.
— Não estragou nada. Você está aqui comigo, é o melhor presente
que eu poderia ganhar — diz, ajeitando Stef em seu colo e fazendo o choro
do bebê cessar.
— Papai acha que está na hora de Romeo ter herdeiros. — O
semblante de Ella se transforma em uma máscara inflexível, julgo que o que
a impede de surtar comigo é Stef em seu colo.
— Por que Romeo? — Ella pergunta, sua expressão é de
incompreensão e frustração.
— Não tenho ideia, bati a cabeça a semana inteira, tentando
entender o que levou a tomar essa decisão.
— Se fosse apenas por herdeiros, qualquer mulher serviria —
Helena menciona, tentando encontrar algo que não estamos vendo.
— Não volte para Chicago — Fiorella profere com um ar de
seriedade que nunca vi antes. — Fique conosco.
— Franco não permitirá, a paz entre as máfias iria para o espaço e
a matança voltaria — expresso, imaginando o caos que seria.
Fiorella dá de ombros.
— Foda-se a paz deles, Sienna. Não temos que lutar as batalhas
por eles.
— Acha que Romeo não daria um jeito de tê-la de volta? —
Helena pergunta, ela também parece achar um plano falho.
Sorrio com a ideia de ficar. De fato, isso arruinaria o acordo das
máfias, sem dizer que não tem chances de eu conseguir ficar sem uma
matança, Ezio e Tito não deixariam a mansão Fiore por vontade própria, e
isso colocaria em risco a vida de todos nessa casa.
— Deve haver um jeito — minha irmã contesta. Ella inspira com
força, pensativa. O bebê já dormiu, ela ajeita a alça do vestido de volta ao
lugar e o embala no cadeirão.
— Já pensou em dar uma chance ao casamento? Romeo pode não
ser tão jovem quanto Piero, nem tão sorridente e acessível... — Hell fala.
— Ele parece um robô sem emoção, acho que nunca vi aquele
homem sorrir na vida! — Fiorella exclama, recebendo um olhar de
condenação de Helena.
— Descreveu Franco nos primeiros meses de casamento — Hell
rebate, sem dó. — Não significa que Romeo não possa mudar também.
Aceitar ou não o casamento é irrelevante, a união vai acontecer, eu
querendo ou não, como foi com Fiorella, o melhor a fazer é aceitar e
começar a me preocupar em como vou lidar com Romeo quando ele souber
que outro homem pegou o que foi prometido a ele.
— Já pensou como teria sido o seu casamento se tivesse se
entregado ao James naquele quarto de hotel? — pergunto a minha irmã.
Ela aperta os lábios pensativa e diz enquanto encara o pequeno
Stef.
— Acho que Franco me condenaria a viver com o seu lado mais
sombrio. Quando ele arrancou os dedos do James — diz, levando uma mão
ao peito —, a sensação era de que ele queria fazer aquilo comigo, mas não
conseguiria, porque, querendo ou não, já tinha sentimentos por mim.
Escoro a cabeça para trás, letárgica. Eu já vi o lado mais obscuro
de Romeo, e não estou pronta para viver ao lado daquela besta impiedosa.
— Si, só porque meu casamento era um fuzil carregado com
gatilho sensível, não significa que o seu também será — expressa com
arrependimento.
— Eu estava tendo um caso com Piero — revelo, e nem mesmo as
lágrimas de terror invadem meus olhos. Alcancei o fundo do poço, vazio e
sombrio assim como aura do meu futuro marido.
— Oh — as duas expressam em uníssono.
— Digam qualquer coisa, pelo amor de Deus — peço, vendo
ambas em choque.
— Oh, Cristo, por isso aquela pergunta — Ella exprime em uma
forma de xingamento.
— Desde quando? — Helena quer saber, seus olhos azuis
extremamente redondos me encaram arregalados.
— Consolei-o depois do desentendimento que teve com o seu
marido naquela salinha de descanso na mansão Santoro.
— Isso foi há meses! — Ella diz entredentes para não acordar o
bebê.
— Ainda dá tempo de fazer Carlo mudar de ideia, peça para casá-
la com Piero — Helena sugere como se estivesse me dando uma brilhante
ideia.
— Piero não quer, e ele disse que negará qualquer coisa que eu
disser ao papai.
— Desgraçado, maldito! — Ella vocifera, cobrindo as orelhinhas
do bebê, acho formidável. — Fique conosco — exprimi, preocupada.
— Não vou provocar uma matança, porque não consegui ficar com
as pernas fechadas.
— Isso não é justo, e você sabe — Ella diz.
— Eu sei, mas que escolha eu tenho?
— Conte a ele — Helena fala. — Revele a verdade antes do
casamento, talvez ele mesmo cancele tudo, já que ainda nem foi anunciado.
— Ainda... a foto do noivado é para ser divulgada pelo Chicago Tribune na
semana que vem.
— O que você acha, Ella? — pergunto, vendo sua indecisão, eu
não devia largar essa responsabilidade na mão de nenhuma das duas, mas
estou sem saída.
— Se contar agora, ele não poderá te fazer mal, papai pode ser um
infame, mas ele não permitiria, não debaixo dos olhos dele. E se Romeo
quiser manter o noivado, as chances de ele estar enfurecido até o casamento
serão menores.
— Então me desejem sorte.
— Sorte a ele — Hell diz, segurando firme em minha mão.
Relaxo no sofá, ainda não acreditando que farei isso. Tem todas as
chances de dar errado, e não tenho nem como prever como será a reação
dele, todos esses anos na presença do homem, e não conheço uma palavra
que o define... Humm, quem sabe, ambíguo.
Depois de todo o drama, tive uma tarde maravilhosa com as
meninas, e consegui até esquecer, por um curto momento, toda a bagunça
da minha vida e o que me espera assim que voltar a Chicago.
Capítulo 06

Se passou uma semana desde que voltei de Chicago e ainda não


consegui conversar com Romeo. Troquei mensagens com as meninas
durante a semana, desabafar foi a melhor decisão. O peso ainda está em
meus ombros, contudo, não sinto mais que estou carregando-o sozinha.
Atravesso em frente ao escritório de papai, ignorando seu olhar.
Inspiro com força, parando no meio do corredor, preciso tomar coragem e
pedir esse encontro com Romeo, antes que a data do casamento seja
marcada. Dou exatos três passos atrás e paro diante da entrada com uma
expressão pacífica.
— Sienna — pronuncia meu nome com ânimo.
Papai tenta derrubar o muro que eu ergui entre nós todos os dias na
mesa de jantar, mas não estava pronta para conversar com ele... na verdade,
ainda não estou, só não tenho escolha.
— Sente-se — oferece, apontando a cadeira à sua frente.
— Não — digo, inflexível, vendo-o apertar os lábios. — Se o
senhor permitir, quero marcar um encontro com Romeo. — Papai une as
sobrancelhas, mas disfarça a sua surpresa.
— Não vejo problema nisso — esclarece.
— Ótimo, avise-o quando vê-lo — peço.
— Avise você mesmo — diz, sinalizando para trás de mim.
Olho por cima do ombro e minha expressão quase murcha
imediatamente ao encontrar aqueles olhos pretos, afiados, me olhando de
volta. As minhas bochechas doem quando eu forço um sorriso educado.
— Romeo... — balbucio.
— Eu escutei — ele me corta, fazendo-me cerrar os dentes. Bruto.
Seguro minha língua para não o insultar. — Busco você às sete — profere,
completamente desinteressado.
Meu coração acelera, achei que tivesse mais um tempo para pensar
melhor no que dizer, embora tenha feito milhares de roteiros em minha
mente, com reações diversas de Romeo, nenhum teve um bom final.
— Aproveitando que ambos estão aqui — papai menciona —, se
casam em seis semanas — declara, roubando o ar dos meus pulmões.
Seguro meu queixo com força para ele não cair. As emoções são
algo que eu consigo mascarar facilmente, poderia até ser atriz, mas o
sangue evacuando da minha face é algo impossível de dissimular.
— Eu ainda nem tenho um vestido — digo em tom de reprovação,
e Romeo me encara com a mesma expressão de antes, com indiferença,
minha vontade é de mordê-lo para ver se causo alguma reação diferente
nesse homem.
— Dona irá levá-la para comprar amanhã.
— Não — digo mais áspera que desejava. — Usarei o da mamãe,
só espero ter mais sorte que ela. — Vejo a face do meu pai empalidecer e
deixo o escritório, esperando que ele fique tão péssimo quanto estou.
Volto para o meu quarto, onde tenho passado a maior parte do meu
tempo, ignorando todos nessa casa. Eu tenho mais algumas semanas aqui,
caso Romeo não me devolva.
Deito-me na cama, com saudade de como estava a minha vida,
saudades do balé, que deixei de frequentar assim que papai me proibiu de
fazer a viagem para Londres, até as idas ao clube com a prima Lilia.
A porta abre silenciosamente, fazendo-me despertar. Dona
atravessa o quarto e se senta ao meu lado na cama. Sua expressão é de pura
preocupação.
— Precisa reagir, Sienna. Não pode ficar presa nesse quarto para
sempre.
— Só tenho mais seis semanas para ficar neste quarto, Dona. —
Minha madrasta me olha pesarosa. — Meu pai te mandou aqui? — quero
saber.
— Eu viria de qualquer forma — responde, puxando minha mão e
analisando meu anel de noivado. — Seu pai disse que pediu um encontro
com ele, por que, Sienna?
A ideia de contar a verdade percorre minha mente, e ainda que eu
confie em Dona, não poderia pedir que guarde um segredo desse tamanho
de meu pai.
— Quero conhecer melhor o meu futuro marido. — Seus olhos
demonstram que ela não acreditou numa palavra que eu disse, mas não
contesta.
— Vem, vou te ajudar a escolher um vestido.
Não replico, ergo-me da cama e a sigo para dentro do meu closet.
Dona ignora minhas roupas do dia a dia, vestidos florais, muito rosa e
branco também, e caminha até o outro lado, onde ficam os vestidos de
eventos.
Dona não escolhe muito e puxa um vestido preto, com o decote em
formato de coração e alças grossas, e, na cintura, um cinto da cor nude,
igual à cor da sandália que ela pega logo abaixo.
— Sexy sem ser vulgar — diz com um encolher de ombros e, sem
me dar escolhas, deixa o closet levando a roupa consigo.
Enquanto me arrumo com sua ajuda, vejo o céu adormecer e o
nervosismo despertar, deixando meu estômago inquieto. Oro em
pensamentos para que essa decisão seja mesma a certa.
Passo um batom vermelho, enquanto Dona enfia o último grampo
em meu cabelo, para prender a trança holandesa. Assopro as pequenas
mechas em frente ao meu rosto para o lado e me olho no espelho. Gosto do
que vejo e temo que Romeo também. Se não estivesse em cima da hora,
trocava de roupa. Minha intenção não é atraí-lo, suponho que quanto mais
medonha estiver, seus olhos continuarão me olhando com indiferença.
— Está linda, Si, ele vai se apaixonar — Dona fala tudo que eu
pensei.
Torço o nariz com a ideia de Romeo apaixonado por mim, ele
definitivamente não parece fazer o estilo homem apaixonado.
— Vamos, não devemos deixá-lo esperando — minha madrasta
informa, abrindo a porta do quarto para mim. — Seu pai confia muito nele,
pois até dispensou Sávio mais cedo.
— Ou ele só não se importa mais comigo — declaro, imaginando
que se Romeo quisesse se alimentar de mim naquela mesa de jantar,
ninguém o impedirá.
— Não seja boba, seu pai te ama. — Seguro a vontade de revirar
os olhos e lhe dou um sorriso.
Dona e eu paramos no primeiro degrau da escada, Romeo está
sozinho lá embaixo, de costa para nós, em frente a uma janela. Ele veste um
terno cinza-chumbo, corte italiano e suas mãos novamente estão enfiadas
nos bolsos da calça.
— Se divirta, e não faça nada que Fiorella faria — diz com um
pequeno sorriso.
Se Dona soubesse que estou fazendo exatamente o que aquelas
duas malucas disseram, me amarraria no pé da cama.
Desço sem conseguir distinguir o que estou sentindo, minhas
emoções estão emaranhadas, igual ao meu intestino, indicando que estou
prestes a fazer uma estupidez.
Romeo se vira, aqueles olhos sombrios caem sobre os meus,
analíticos. E, por Deus, a sua expressão é sempre tão bruta, fechada e
sombria que é fácil imaginá-lo matando alguém.
Não forço o sorriso, apesar de toda tensão, os meus lábios se
curvam gentilmente, mas meu futuro marido os ignora, olhando para além
de mim. Me viro e Ezio está na entrada da sala.
— Vamos — Romeo diz e caminha em minha frente.
Grosso!
Queria entender como os irmãos Ferraro conseguem ser tão
parecidos e, ao mesmo tempo, distintos. O que aconteceu com Romeo que o
transformou nesse homem frio e vazio? Foram quinze anos vivendo em sua
presença e eu nunca o ouvi alterar seu tom de voz, perder a linha, ou até
mesmo sorrir.
Ele parece um monstro domesticado.
Sigo Romeo até o seu Rover Velar, preto, e Ezio abre a porta do
passageiro, paro diante dela e ele já está sentado atrás do volante. Romeo se
vira para mim, aguardando, e confesso que não sei o que me impede de sair
correndo.
— Não precisamos ir, Sienna — diz, e sua voz sai
impressionantemente agradável, mas não é isso que me impressiona,
garanto que cada poro do meu corpo exala hesitação, medo, horror, ele sabe
que estou apavorada, e não está tentando piorar a situação.
Tento inutilmente suavizar minha expressão e entro no carro, a
porta bate suavemente e, ainda assim, consegue fazer meu coração acelerar.
— Nunca saí sem segurança — explico com uma meia-verdade.
— Jamais a machucaria, Sienna — diz com uma voz sólida que me
passa uma estranha segurança e começa a dirigir.
— Promete? — Ele me olha e noto que minha pergunta o pega
inesperadamente.
— Prometo — diz e para diante dos portões da mansão que se
abrem lentamente.
Romeo se vira para mim, ele se aproxima de repente, ficando
centímetros da minha face. Seu perfume almiscarado preenche o meu
espaço, e eu me encolho contra o banco de couro, enquanto seus olhos
penetram os meus, e então ele se afasta, puxando o meu cinto de segurança.
— Não adianta eu prometer se você não confia em mim — diz e
começa a dirigir.
Olho pela janela, o céu está escuro e profundo, livre de estrelas.
Relaxo no assento um pouco mais calma, se ele for um homem de palavra,
não me fará nenhum mal.
Descemos em um restaurante no centro da cidade em menos de dez
minutos, Romeo me guia com sua mão em minhas costas, mas com o corpo
afastado, mantendo certo limite de aproximação.
Como passamos o caminho calados, como dois desconhecidos, ou
até mesmo parecendo um casal brigado, aproveitei o momento para pensar
nas palavras certas, acredito que quanto menos enrolar, melhor, talvez nem
espere até o prato principal.
Não há mais como tardar isso, e papai terá que me perdoar quando
tudo estiver acabado.
Olho em volta, ainda o deixando me guiar. O restaurante parece ter
saído de um filme clássico. Paredes claras, com ornamentos intricados e
pequenos candelabros anexados às paredes. Um pouco mais acima, um
mezanino, expondo alguns instrumentos musicais, incluindo quatro
violoncelistas, tocando The Phantom of the Opera.
Fico perplexa com a elegância e a riqueza do restaurante, não que
eu já não tenha visto muito disso em outros lugares, mas esse, em especial,
é diferente, com toda a certeza.
— Que lugar é esse? — pergunto.
— Você não gostou? — indaga, me guiando para uma mesa
redonda, próxima à ampla janela dando vista para a cidade.
— É muito bonito — comento, e não é difícil imaginá-lo nesse
ambiente de aparência arcaica, luz quente e música antiga.
Romeo puxa uma cadeira almofadada azul-turquesa para me sentar
e depois se senta em minha frente.
Está sendo menos bizarro do que achei que seria, o silêncio, de
alguma forma, não é desconfortável, Romeo sempre foi um homem de
poucas palavras, até mesmo à mesa de jantar com papai, e convenhamos, os
dois, com certeza, têm mais assuntos a discutir do que nós dois.
O garçom se aproxima com o cardápio e fazemos os pedidos mais
rápido que eu desejava. O ar do restaurante está ligado e, ainda assim, sinto
gotículas de suor se formarem nas palmas das minhas mãos, seco-as
discretamente na saia do vestido, enquanto Romeo finaliza o pedido com a
escolha de um vinho.
O garçom deixa a mesa, e Romeo direciona aqueles olhos trevosos
em minha direção, estou em cólicas e minha mente parece uma tela branca,
eu não sei por onde começar a falar, nem mesmo por onde iniciar qualquer
assunto.
— Sei por que quis esse encontro, Sienna — declara com uma voz
quase suave, que faz uma sensação de horror percorrer minhas costelas,
tornando minha respiração irregular.
— Sabe? — falo num sopro.
Impossível, se ele soubesse, não estaria nessa calmaria. Ou será
que Piero resolveu contar a verdade antes de mim? Tenho a impressão de
que vou sufocar até o fim dessa noite.
Romeo abre os lábios, mas se cala quando o garçom se aproxima
com nosso vinho.
— Deixe a garrafa — diz e faz sinal para o homem sair.
Romeo serve o vinho, enquanto quase engasgo com meu coração
entalado na garganta, o esperando falar qualquer coisa, esse silêncio está
começando a me fustigar, e tenho a vaga impressão que ele sabe disso.
— Você tentará me persuadir a romper o casamento — profere,
levando a taça de vinho à boca com sua habitual expressão, desinteressado.
Será que é tão óbvio assim?
— Se sabe o que eu pretendia, por que aceitou o convite?
— Para você entender que nada que você faça, fez ou fará mudará
seu destino.
— Nosso destino — corrijo com as mãos em punhos em meu colo.
— Você pode aceitar e facilitar a nossa vida — ele enfatiza —, não
temos que ser inimigos, Sienna...
— E se eu não facilitar? — Seus olhos, se possível, escurecem
ainda mais e, mesmo assim, nenhuma mudança ocorre em suas feições.
— Você não vai me querer como seu inimigo. — Há um tom
sugestivo na voz dele que faz meu coração bater alto.
— Isso é uma ameaça? — pergunto sem alterar a voz, mascarando
o terror e sentindo minhas unhas se enterrarem fundo nas palmas da minha
mão.
— Não, Sienna. — Romeo inspira, parece um tanto farto desse
assunto, e confesso que também estou. — Também não fiquei feliz em
saber que me casaria com você, é jovem, ingênua e inexperiente.
— Engraçado, é oposto do que vejo em você — digo, me
levantando com ímpeto e afastando a cadeira para longe de mim. — Preciso
ir ao banheiro.
— Está sem segurança, então não faça nada que possa te matar.
— Não conseguiria correr tão rápido com esses saltos — aviso e
lhe dou as costas, antes que meu autocontrole vá para o espaço.
Vejo a plaquinha do toalete do outro lado do restaurante, ando até
lá com a sensação de alguém me vigiando, não tenho que olhar para trás
para saber que aqueles olhos trevosos estão cravados em minhas costas.
Suspiro, se fosse mais corajosa, fugiria pela janela como Helena,
mas e depois, para onde eu iria?
Viro em um estreito corredor e meus olhos se arregalam quando
Piero me agarra pelos braços e me empurra contra a parede com força,
batendo minha cabeça, fazendo-a latejar com sua tamanha brutalidade.
— Você perdeu o juízo? — questiono, inerte em suas mãos.
— Eu nunca tive juízo, devia ter notado isso quando entrei no seu
quarto, princesa! — exclama com pura monstruosidade, deixando seu nariz
quase colado ao meu.
— Me solta, está me machucando — falo, afastando minha face o
máximo que consigo da dele. Piero aplica mais força em meus braços e me
puxa da parede, forçando-me a encará-lo.
— Eu sei o que veio fazer aqui, e sugiro que mude de ideia — diz
em tom desafiador.
— Não vou dizer que foi com você, eu prometo. — Piero deixa
uma espécie de riso escapar.
— Não dirá nada até estarem casados.
— Eu não quero esse casamento, e isso talvez o faça cancelar. —
Outro riso, e tenho vontade de socar a cara dele.
— Acredita que só porque um pau entrou na sua boceta ele vai
cancelar o casamento? — Cerro o maxilar com força, desejando arranhar
sua cara e arrancar seus olhos com as unhas. — Você é tão ingênua. — Meu
sangue sobe, explodindo na minha cabeça. — Ninguém em sã consciência a
devolveria, seria um insulto ao seu pai.
Piero me solta, e ainda sinto os dedos dele em meus braços.
— Seja esperta, e eu vou estar do seu lado quando tudo isso passar.
— E por que caralho, em nome de Deus, eu ia querer você ao meu
lado? — Piero dá um passo na minha direção, fazendo-me dar outro atrás.
— Me acha um monstro, adivinha quem foi meu criador? —
pergunta, me dando as costas e deixando o restaurante por outra saída na
lateral.
Minhas costas batem na parede atrás de mim enquanto amparo
minha face, sentindo lágrimas escorrerem entre os dedos. Meu coração está
em frangalhos, ele dói como se, de fato, estivesse levado um golpe. Estou
arruinada e consegui fazer isso por conta própria.
Meus dedos tocam em meu braço, onde Piero me segurou, e a
necessidade de me autoflagelar desperta como um desejo sufocante. Cerro a
mandíbula, olhando em direção às cabines, se eu entrar lá...
— Sienna. — Tomo um susto ao ouvir a voz de Romeo às minhas
costas, seco as lágrimas rapidamente e me viro para ele.
Seus olhos me analisam, e tenho certeza de que estou parecendo a
bandeira da Turquia.
— Por que estava chorando?
— Nada. — Engulo o nó em minha garganta e tento voltar para
nossa mesa, Romeo me pega pelo braço, me paralisando, seus dedos se
mantêm estáticos e seus olhos devoram os meus com intimidação.
— Eu te fiz uma pergunta e quero uma resposta.
— O que disse na mesa me magoou — falo, parecendo mais
patética do que desejava, e puxo meu braço dos seus dedos com facilidade.
— Podemos levar a comida para viagem, por favor?
— Não, vamos jantar e voltar para a mansão — diz, se afastando e
me dando as costas.
Sigo Romeo a um braço de distância, pensando que devia ter
contado a Dona, ela não permitiria esse encontro. Evitaria tanto estresse,
Piero está em meu encalço e acredito que ficará até o dia do casamento.
Nunca desejei tanto que ele sumisse, ou que tivesse mais força e
poder que ele para poder revidar seus ataques.
Romeo está certo, sou jovem, mais ingênua do que eu imaginava e
totalmente sem experiência.
Não sei como irei sobreviver a esse casamento; se Romeo se for
como o Franco, um troglodita, me condenará a viver com o seu lado mais
sombrio.
Sento-me à mesa e nossos pratos já chegaram. Meu estômago está
apertado de nervoso, mas pego os talheres, assim como Romeo, e começo a
comer, se estivermos de boca cheia, não precisamos conversar, o que é
perfeito.
Recordo-me quando Fiorella se casou, eu estava triste e feliz por
ela, teve que se casar com o inimigo para que pudesse haver paz.
Aconselhei-a aceitar e dar uma chance, dar o que ele queria, na
expectativa de que pudesse ter um casamento de verdade, ou que ele pelo
menos não a maltratasse. Se eu não tivesse enfiado os pés pelas mãos, me
entregando a Piero, poderia fazer o mesmo, mas acredito que agora seja
tarde demais para isso.
Não esperamos a sobremesa chegar para ir embora, o caminho de
volta para casa foi tão silencioso quanto o jantar. Romeo desliga o Rover
em frente à mansão, ele relaxa no assento e se vira para mim.
— Lembre-se dessa noite, Sienna, não precisa ser dessa forma.
— Vou lembrar — aviso e desço do carro, grata por estar em
território seguro, penso e soa quase como uma ironia, começo a entender
cada vez mais a ira de minha irmã.
Entro na mansão, papai e Dona estão na sala com Mady e o
pequeno Dario, parece uma família de propaganda de margarina.
— Sienna... — Dona fica em pé.
— Vou me deitar, estou cansada — digo com minha capacidade de
esconder emoções fragmentadas.
— O que aconteceu lá, Sienna? — papai pergunta quando estou no
pé da escada.
Engulo a espécie de bola vulcânica que se formou em minha
garganta e me viro para ele com minha formidável expressão ingênua e o
semblante suave.
— Jantamos e voltamos, nem esperamos a sobremesa — falo com
uma expressão de decepção.
Papai finge que engole minha história, ele é esperto e um bom ator
também. Para que fazermos mais dramas, não é? Nada que aconteça o fará
mudar de ideia.
Subo para o meu quarto e, quando entro, me deparo com o vestido
de casamento que foi da minha mãe estendido em minha cama. Meus olhos
ardem por lágrimas não derramadas enquanto caminho até ele. Deslizo os
dedos pelo cetim italiano, desejando, dessa vez, verdadeiramente, que meu
casamento seja um terço do que foi o dela.
Capítulo 07

NOVEMBRO

SEIS SEMANAS DEPOIS

Paro em frente ao espelho assim que a hair stylist termina de


prender a coroa de pérolas interligadas por folhas gregas douradas em cima
do coque baixo que escolhi para o grande dia.
A atmosfera é estranhamente igual à véspera do casamento da
Fiorella.
As meninas estão sentadas em aconchegantes poltronas, usando
encantadores vestidos de madrinha na cor azul-cobalto, assistindo-me
arrumar para a atual realidade. Suas expressões não são melhores que as
minhas, presumo que as duas estejam ansiosas para questionar como foi
minhas últimas semanas, depois que voltei do encontro com Romeo, contei
a elas o desastre que foi e depois me mantive afastada de tudo e de todos, o
meu colchão estava começando a ficar com o formato do meu corpo. Acho
que vi Romeo uma ou duas vezes nessas semanas, acredito que também
estava me evitando.
— Está maravilhosa, Sienna — Dona diz, passando a mão por
minhas costas. — Sua mãe tinha bom gosto — menciona quando me pega
olhando o vestido, quase não tivemos que fazer ajustes nele, fiquei
impressionada por mamãe e eu termos quase a mesma estrutura corpórea.
Ele tem um recorte sereia, renda aplicada no dorso e saia, decote tomara
que caia, suavemente rebordado em pedrarias, e uma leve cauda.
— Obrigada, Dona. — Dou-lhe um sorriso, sentindo que tem uma
pedra de mármore em meu estômago.
— Terá que melhorar esse sorriso — Ella profere, segurando Stef
no colo, o pequeno usa um rico terno preto com gravata borboleta.
— Não sei como você aguentou isso — digo à minha irmã, ela
entrega o bebê a Helena e para às minhas costas.
— As coisas não saíram como eu desejava, e você foi quem mais
me incentivou a tentar fazer dar certo. Use seus conselhos para si mesma e,
independente de vivermos a horas de distância, eu fujo e busco você no
meio da noite se precisar. É só me ligar, Sienna.
— Não me faça chorar agora — peço, mais emotiva que desejava.
A porta abre suavemente, e a babá da Mady enfia a cabeça para
dentro do quarto, chamando a atenção de Dona, ela pede licença e nos deixa
a sós, mas antes ela me lança um olhar de reprimenda, como se eu
conseguisse sair correndo desse hotel rodeado por soldados da máfia.
— Fiorella está certa, se precisar, nós viemos buscá-la — Hell
afirma, se colocando em pé, e seu vestido justo modela uma modesta
barriguinha de gestante.
Meu queixo cai e não faço questão de disfarçar, arrancando um
sorriso dela.
— Eu queria ter contado, mas...
— Não queria me deprimir com sua felicidade — falo, dando um
passo na direção dela, abraçando-a com Stef entre nós. — Você feliz me faz
feliz, Hell, isso é maravilhoso. Está de quantas semanas?
— Onze — diz, segurando minha mão, seus olhos parecem uma
fonte de luz, exibindo toda a sua felicidade.
— Já sabe o que fará nas núpcias? — Ella pergunta de repente, e
tenho a impressão do meu coração caindo no estômago.
Essa pergunta sorveu meu cérebro durante dias, tive seis semanas
para achar uma solução, mas não há, não para mim. Piero disse que Romeo
não me devolverá por causa desse detalhe infame que fode com a vida de
qualquer mulher nascida no berço da máfia, mas ele não disse o que seu
irmão fará quando descobrir.
— Não sei. Fingir um desmaio talvez. — As meninas sorriem.
— Romeo te conhece desde pequena, não o imagino te atacando
contra sua vontade. — A cena que Ella descreve me vem à mente,
deixando-me puramente enjoada.
— Fale com ele, peça para ter paciência. Faça-o se apaixonar e
depois conte sobre a virgindade — Hell diz, atenciosa.
— Não quero que ele goste de mim ou me toque. Eu quero ir para
casa, para o meu quarto, para as minhas coisas — lamento com meus olhos
se enchendo d’água, me sinto uma covarde por isso.
Alguém bate na porta, me viro de costas para secar as lágrimas,
enquanto minha irmã caminha para atendê-la.
— Fiorella. — Ouço a voz de papai, impactado, ele ainda não
conheceu o seu netinho, e a relação dos dois foi esmagada assim que ele a
deixou no altar com Franco. Por mais que Fiorella ame o marido, ela ainda
não o perdoou por ter sido forçada a se casar.
— Veio fazer o mesmo discurso motivador que fez para mim? —
A voz da minha irmã transborda a desprezo e zombaria.
— Você tem uma família e está feliz, não entendo por que todo
esse rancor — papai diz e a porta se fecha assim que me viro.
— Não entende? — Fiorella escarnece, e Helena me dá um olhar
preocupado, — Você nos usa e esconde coisas de nós, e agora está dando
Sienna para um homem que só possui o cargo que tem agora porque
exterminou várias famílias russas que o senhor não teve coragem de fazer.
— Encaro minha irmã petrificada, questionando-me como ela sabe dessas
coisas e por que não me contou?
— Ele é um homem leal, Fiorella, vai proteger sua irmã.
— O senhor devia protegê-la, e a mim — Ella se queixa, e isso
corta meu coração, depois que mamãe faleceu, papai deu tudo dele por nós
duas, só que a posição que ele nos coloca agora faz parecer que ele só
precisava que estivéssemos inteiras para que pudesse nos usar no futuro.
— Você tem um filho, quando ele estiver maior, talvez você me
compreenda filha. — A face de papai é impenetrável, mas seus olhos não
escondem toda a dor que há neles.
Se sofre pelo que fez, por que continua fazendo? Qual é a porra
dos problemas desses Homens de Honra?
Papai se aproxima de Stef. O bebê abre os olhos azuis como um
céu num dia de verão e seguro o polegar do seu avô, tentando levá-lo à
boca, meu pai sorri.
— Ele é forte — papai diz.
— Como a mãe dele. — Todos se viram para Franco na entrada da
porta, o homem está com seu habitual terno inteiramente preto e suas
feições tão sólidas quanto uma rocha, Dona voltou com Mady também e a
situação inteira me faz sentir em um reality show.
— Vamos dar espaço à noiva — Franco anuncia, e minha irmã me
dá um olhar aflito.
— Tudo bem — balbucio, e todos saem, deixando-me a sós com
papai.
Ele se vira e sua expressão se torna cheia de admiração quando me
enxerga no meio do quarto, seus olhos descem pelo meu corpo, e suponho
que seus pensamentos estão em mamãe.
Meu pai é forte e tem os ombros largos, ele está sempre numa
postura inflexível, como se carregasse o mundo nas costas, não consigo
entender como ele suporta o peso de tanta coisa... de tantas mortes e ainda
parecer inquebrável.
— Se algo de ruim acontecer, me prometa, que me aceitará de
volta, ou eu corto meus pulsos assim que a cerimônia acabar. — Meu pai
não consegue disfarçar o choque das minhas palavras.
Seus dedos se fecham em torno dos meus braços delicadamente e
me puxam para perto de si.
— Sienna — sua expressão é uma bagunça —, Romeo não a
machucará.
— Prometa, pai! — exijo com o desconforto subindo pela minha
garganta, meus olhos ardem para derrubar as lágrimas, estou me sentindo à
beira da loucura, nunca pensei em suicídio, mas, se ele prometer, tenho
certeza de que cumprirá.
— Prometo — assegura e me puxa para seus braços, minha
vontade é de empurrá-lo para longe, mas não resisto ao seu conforto, estou
cansada demais para lutar, preciso guardar minhas forças para a cerimônia e
as trezentas pessoas que me aguardam no salão ao lado.
Ele se afasta e se recompõe.
— Você está pronta? — assinto com a respiração pesada.
Papai anda até a porta, mas permaneço paralisada em frente ao
espelho. Minha feição é o oposto do que estou sentindo por dentro, um
gigantesco vazio, apenas escuridão e aflição.
Deixamos o quarto de preparação e saímos para um corredor largo
e branco, a mesma mulher que cuidou dos preparativos do casamento de
Ella anda até nós com um buquê de rosas brancas e um sorriso estampa sua
cara cínica.
— Está linda, Sienna.
— Eu sei — digo, e papai me olha de soslaio, pego o buquê das
mãos dela e me posiciono em frente à uma porta dupla branca.
Sinto-me ligada no automático e, ao mesmo tempo em que eu
quero que tudo termine, não quero, porque daí seremos apenas eu e Romeo
para sempre. As portas se abrem para dentro, e o quarteto de cordas tocam a
marcha nupcial de Felix Mendelssohn.
Os convidados estão em pé, mas não me prendo em seus olhares
insignificantes, tampouco na riqueza de cada detalhe do meu casamento.
Meus olhos estão fixos em meu noivo, sua postura é de um soberano, ele
veste um smoking azul-meia-noite com corte sob medida, esculpindo cada
músculo do seu corpo e, em seu rosto, não há um sorriso, apenas uma
expressão suave, talvez seja o máximo de benevolência que um monstro
assassino como ele consegue demonstrar.
Minha visão periférica tenta porcamente ignorar a presença de
Piero atrás do seu irmão. Seus olhos remetem a uma promessa silenciosa de
que nossa história ainda não acabou.
Percebo que começo a tremer, meus dedos se contraem mesmo me
segurando no braço de papai com força e meus membros quase desistindo
de mim. De repente, a única coisa que me impede de correr para o mais
longe possível é a mão do meu pai sólida em cima da minha.
Os últimos passos são os mais difíceis, a marcha é lenta demais, e
o meu coração parece que dobrou de tamanho, me causando uma sensação
estranha no peito.
Chegamos no altar, a música terminou, e o som imortalizou no
grande salão. Olho para papai, seus olhos azuis estão escuros e severos
encarando Romeo.
— Cumpra com sua palavra — exige quando Romeo estende a
mão para pegar a minha e, como manda as tradições, papai me entrega a
ele.
Romeo lhe dá um aceno consistente e me conduz até o seu lado no
altar. Ergo meu queixo e seu olhar sombrio flagra através de mim,
atravessando meu cerne, prendendo-me como uma presa.
Uma sensação enervante percorre minhas costelas, e o medo do
que pode acontecer comigo num futuro muito próximo se esparrama como
fogo na palha seca.
Viro-me para Fiorella, suas feições estão pacíficas, mas seus olhos
revelam tudo que eu preciso esconder, entrego o buquê a ela e me viro para
Romeo com minha expressão congelada de menina perfeita.
— Senhoras e senhores, estamos aqui presentes para celebrar a
união de Romeo Ferraro e Sienna Santoro.
O padre inicia a cerimônia, e a ficha cai como uma avalanche,
deixando os meus sentimentos como o próprio caos. Toda a esperança que
eu tinha de ter um casamento de verdade foi jogada ao vento. Essa é a
minha realidade. Romeo é a minha realidade.
Minha mente dá um nó e, na mesma hora em que penso nas
palavras de Piero: ele vai devorar a sua alma, vai quebrá-la em mil
pedacinhos, também penso nos conselhos das meninas. Romeo não pode
me quebrar, ele já quebrou e não faz ideia disso.
Completamente absorta em meus pensamentos, fui arrastada de
volta à realidade quando o padre inicia meus votos, nisso, sinto os dedos de
Romeo se entrelaçarem aos meus, seus olhos firmes focam em minha face e
se atenuam, esperando minha resposta.
A palavra não se forma em meus lábios, se eu fosse mais corajosa,
eu o diria.
— Aceito — profiro com um sorriso meigo e lágrimas nos olhos,
parecendo ridiculamente emocionada.
O padre, satisfeito com a encenação, direciona sua atenção para
meu noivo.
— Romeo, você aceita Sienna como sua legítima esposa,
prometendo ser fiel, amá-la e respeitá-la na alegria e na tristeza, na saúde e
na doença, por todos os dias das suas vidas, até que a morte os separe?
— Aceito. — A maciez em sua voz me surpreende.
O padre abençoou nossas alianças e nos ofereceu, percebi que
estava com meus dedos trêmulos assim que a peguei. Trocamos as alianças,
e Romeo depositou um beijo no dorso da minha mão após deslizar o anel de
aro dourado, fazendo-me ficar surpresa e corada na mesma proporção.
— Pelo poder concedido a mim, eu os abençoo e os declaro marido
e mulher. O noivo já pode beijar a noiva.
De repente fico completamente fora do meu elemento, tornando-
me uma estátua petrificada. Os dedos de Romeo alcançam o meu rosto e se
enroscam em minha nuca, seu polegar traceja pela curva do meu queixo, o
elevando para cima à medida que se aproxima para me beijar. Sua língua
entra na minha boca, habilidosa, provando o meu gosto, e nossas línguas se
enroscam. Por um segundo, esqueço completamente que é Romeo e me
sinto culpada por não achar seu beijo ruim. Ele se afasta, e eu corto contato
visual, tendo certeza de que estou vermelha, o que é extremamente ridículo,
pois foi apenas um beijo.
— Senhoras e senhores, é com muito prazer que lhes apresento
Romeo e Sienna Ferraro.
Os padrinhos se aproximam para nos parabenizar, Fiorella me dá
um abraço apertado e se enfia entre mim e Piero, ela o saúda, impedindo
sua passagem, e tenho certeza de que disse algo bem venenoso em seu
ouvido, pois a expressão dele se mortifica por milésimos de segundos.
— Aquele beijo nem pareceu um sacrifício — Hell diz enquanto
me abraça.
Não a repreendo, pois Romeo me estende a mão quando a
Famiglia se aproxima para nos parabenizar. O cara sem orelha, Ettore e
Franco segurando o pequeno Stef, eles apenas nos dão um aperto de mão
sólido, mas os olhos de Franco encontram os meus por mais tempo que
qualquer um e, por alguma razão, tenho uma intuição estranha. Pode
parecer maluquice, mas estou começando a ficar paranoica, a sensação é de
que minha vida é um castelo de cartas que está prestes a desabar.
Capítulo 08

Entramos no salão de festas iluminado pelo leve brilho de centenas


de pequenas lâmpadas penduradas. As mesas dos convidados são redondas
e deve ter, aproximadamente, seis pessoas em cada, vagueio meu olhar por
algumas delas, e percebo que não conheço quase ninguém.
Se eu não estivesse usando esse vestido, garanto que nem metade
saberia dizer quem é a noiva.
Romeo me guia até a nossa mesa para dois, sua mão não
abandonou minha cintura desde que deixamos a cerimônia, tento não ficar
dura com sua aproximação, mas é inevitável, ainda mais com ele parecendo
estar tão confortável.
Ele puxa minha cadeira e depois se senta ao meu lado. A minha
família está dividida por organização criminosa. A Outfit, ao lado esquerdo
de Romeo, contendo papai, Teodoro, Piero, Dona, minha prima Lilia e seu
marido traíra, Antônio, o contador da máfia. E à minha direita, a Cosa
Nostra.
Os olhos de Fiorella não abandonam os meus, assim como os de
Franco não abandonam os dela.
— Não foi tão difícil, foi? — A voz de Romeo soa retórica, me
viro para ele com os lábios pressionados.
— Fácil dizer quando a atenção está inteiramente em cima da
noiva. — Capto o início de um riso, mas ele desaparece quando dois
garçons se aproximam com taças de espumantes e um prato de ceviche de
salmão. Seguro os talheres, olhando para o meu prato e sentindo a boca do
estômago apertada.
— Coma, se não vai passar mal até o fim da noite — Romeo
impõe, olhando para o meu prato intocado.
— É, Deus me livre estragar suas núpcias. — Na mesma hora em
que falo, tenho vontade de morder a língua. Romeo me fita com uma
expressão irresoluta, desvio o olhar, sentindo o sangue do meu rosto inflar.
— Está preocupada com hoje à noite? — Sua voz soa cautelosa e,
ao mesmo tempo, curiosa.
— Não quero falar disso. — Ele suspira e não argumenta.
Tomo o restante do champanhe e relaxo na cadeira com o meu
melhor sorriso. A ansiedade para que essa noite acabe de uma vez está
remoendo o meu peito e tenho certeza de que Piero sente o mesmo que eu,
já que peguei seu olhar em mim vezes demais.

O casamento seguiu sutilmente depois do jantar, as pessoas estão


conversando e passeando pelo salão, algumas famílias importantes até
vieram nos dar felicitações. Romeo me apresentou como sua esposa de uma
forma tão atenciosa que é fácil acreditar que estamos juntos por vontade
própria.
— Não pode ficar sentada a noite inteira — meu noivo diz e soa
mais como uma reprimenda, ele se coloca de pé, estendendo a mão para
mim e, quando centenas de olhos param em nós, não tenho escolha a não
ser pegar em sua mão.
— Somos os noivos, deveríamos fazer o que quiséssemos —
assobio com um sorriso nos lábios, enquanto ele me conduz até o meio do
salão, chamando atenção de todos os convidados.
— Infelizmente hoje temos que dar o que todos querem, mais
tarde, você pode tirar essa máscara de menina feliz e se afundar em
autopiedade.
— Que romântico — expresso, soando muito debochada. Deslizo
as mãos para os ombros de Romeo quando a canção Mariage d'Amour,
começa a tocar. Suas mãos agarram minha cintura, colando nossos corpos.
Elevo o queixo para poder olhar em seus olhos, mas o que me chama
atenção é seu pescoço, parece haver garras tatuadas saindo pelo colarinho
do seu terno, mas é impossível identificar o que seja.
— Cumpra a sua promessa — digo depois de um momento,
Romeo estreita os olhos quando repito o que meu pai disse. — Qual é a
promessa? — Uma sombra cruza sua expressão e meu noivo aperta os
lábios numa fina linha.
— Proteger você. — Travo a mandíbula, insatisfeita.
— Proteger de quem? Nunca estive em perigo.
— Fim da música — Romeo sussurra e beija minha têmpora, ele se
afasta, mas o seguro pela mão, eu quero respostas, papai e ele me devem
isso.
— Teremos tempo para conversar — diz e abre caminho,
revelando Piero, e meu coração acelera, batendo como se fossem hélices de
um helicóptero.
— Posso? — o bastardo pede permissão ao meu noivo.
— Claro, irmão — Romeo profere, sem imaginar o embuste de
irmão que tem.
Piero segura em minha mão e passa a outra para minha cintura, se
mantendo em uma distância respeitosa. Pelo visto, ele tem juízo, mas só o
usa quando lhe convém.
— Você contou para sua irmã — sibila baixinho, iniciando a dança,
os dedos dele esmagam os meus com força, fazendo-me trincar o maxilar.
— É bom saber que sente medo — digo, encontrando o olhar de
Ella do outro lado do salão, ela segura o bebê, e Franco alisa suas costas,
falando algo em seu ouvido.
— Ninguém acreditará nas suas palavras. — Encontro os olhos de
Piero, sentindo um fogo crescente correr pelas minhas veias, farta da sua
obsessão em me atormentar.
— Por que ainda está aqui?
— Eu sou a família dele. — Sinto uma queimação subir pela minha
garganta devido à hipocrisia de Piero. Ele não se importa com Romeo,
queria continuar me comendo mesmo depois do casamento, isso é demais
até para mim, que não sinto nada além de pavor a respeito de Romeo.
Meus lábios se abrem para respondê-lo, mas me calo quando Piero
me gira e Franco está às suas costas.
— Minha vez. — A voz implacável de Franco soa como uma
ordem e, mesmo que a música ainda esteja pela metade, Piero se afasta com
um ar indignado.
— Obrigada — balbucio, sentindo meus olhos ficarem carregados
por lágrimas, Franco suspira baixinho e me estende a mão para começarmos
a dança. Quando seguro nela, sinto algo entre nossos dedos, o encaro
confusa.
— Continue dançando — diz, mais próximo do que deveria. —
Que dedo podre, hein? — replica, comprimindo os lábios.
— Fiorella te contou — afirmo, ainda sem compreender o que
estamos segurando.
— Contou. Agora, o mais importante, isso que está entre nossas
palmas é um ‘Boa Noite, Cinderela’. — Meus lábios se separam, confusa e
chocada — Sorria. — Franco repreende.
— O que eu faço com isso? — pergunto com minha expressão de
porcelana restaurada, Franco me gira e meus olhos encontram os de Romeo,
dançando com Dona, sua expressão nunca esteve tão perceptível como
agora, desconfiança.
— Meio vidro, ele apaga. Inteiro, você fica viúva. Misture com
álcool e dê pra ele tomar. Se ele descobrir o frasco ou você matá-lo, em
hipótese alguma pode envolver a Famiglia. Entende? Não permitirei que
Fiorella te ajude, estará por conta própria.
Balanço a cabeça em concordância. Franco me pega pela cintura e,
quando me gira, deslizo o pequeno frasco para dentro do espartilho do
vestido.
— Por que está me ajudando?
— Sua irmã está preocupada — diz, olhando além de mim, e sei
que seus olhos estão nela.
— O quão ruim acha que vai ser quando Romeo descobrir? — Os
olhos dele se estreitam, nada contente com a minha pergunta, porém, tenho
que saber, Franco será honesto e saberei que não está tentando me
aterrorizar de propósito.
— Depende o quanto ele é ligado nas tradições e no irmão dele. No
entanto, a mentira faz tudo ficar pior. — Meu estômago se contorce, me
lembrando do que ele fez com o filho do governador apenas por Ella ter
mentido.
A música termina, Romeo se aproxima e Franco acena
educadamente para ele e se afasta. Meu peito pesa, sentindo o pequeno
frasco ali, a sensação é de que, a qualquer momento, ele vai saltar para fora.
— Sobre o que conversavam? — Romeo se inclina em minha
direção, me conduzindo em mais uma dança.
— Stefano. Ele é um bebê muito fofo — respondo e, pelo seu
olhar, tenho certeza de que não acreditou.
— Você está monopolizando a noiva — Fiorella cantarola atrás de
Romeo, ele é tão alto que nem a vi chegar.
Minha irmã dá uma piscadinha para ele e me estende a mão.
— Voltamos para Manhattan hoje. Você a terá por todos os dias da
sua vida — ela recita o que o padre disse e reforça seu sorriso convencido.
— Toda sua — ele profere e se afasta. Fiorella ocupa o seu lugar e
começamos a dançar.
— Essa noite parece que não tem fim — sussurro.
— Te entendo — diz com um sorriso fraco.
— Franco me deu uma solução por ora — digo, sem saber se fico
aliviada ou horrorizada em drogar Romeo. — Mas não vou conseguir
enganá-lo por muito tempo.
— Forje o sangue — ela sibila. — Depois que ele estiver drogado,
não se lembrará de nada da noite anterior. É a sua chance, Sienna.
— Meu casamento mal começou e está fadado ao fracasso.
— Franco te deu algum conselho? — Ela enruga os lábios.
— Disse que a mentira faz tudo ficar pior. — Fiorella suspira
audivelmente.
— E faz, mas é fácil falar quando não se é uma jovem, criada sob
as regras da máfia. Sem dúvidas, não foi uma mulher que inventou essa
babaquice asquerosa que temos que nos guardar para nossos maridos
quando eles podem foder metade das putas da cidade antes e depois do
casamento.
— Está certa. Por alguma razão, não consigo pensar direito.
— Dará tudo certo. Aproveite o seu casamento, Romeo parece
atencioso, quem sabe ele possa ser um bom marido.
É tudo que eu desejo.

Partirmos da festa quase uma hora da manhã, uma grande parte de


mim se sente quebrada, passei as cinco horas do meu casamento
imaginando como terminaria minhas núpcias.
Depois do incidente com Fiorella no dia seguinte do seu
casamento, Romeo decidiu que seria melhor passarmos as núpcias em casa.
Soube disso antes de deixarmos a festa, fiquei um pouco aliviada, pois teria
mais um momento antes de drogar um homem com quase dois metros de
altura, de preferência sem matá-lo. Romeo sempre foi cordial comigo, mas
não desejo sua morte, ainda. Estamos chegando na mansão Ferraro, o
nervosismo está batendo com força no meu estômago.
Depois que atravessamos os portões, fiquei observando a vastidão
do pátio, está um breu, o céu acinzentado com nuvens carregadas cobrindo
a lua deixa tudo ainda mais sinistro.
Romeo se aproxima da minha futura casa, do meu novo lar, o que
eu sinto agora é incompreensível, nunca me mudei, nem quando os russos
invadiram a mansão. Aperto os olhos para ter certeza do que estou
enxergando, mesmo com os holofotes clareando ao redor, fico em dúvida
em relação à sua cor, preta. O térreo contém uma garagem aberta com
espaço para dois carros e, ao lado, uma escada branca, que leva ao primeiro
andar, ela tem o telhado embutido e o seu formato é de um retângulo
extenso o suficiente para sumir na escuridão do pátio e, em cima, o segundo
andar, um quadrado proeminente, rodeado por paredes de vidro, sua luz
amarelada está acesa, revelando o que eu acredito que seja a suíte.
Romeo estaciona, e não o aguardo abrir a porta para mim, preciso
de ar puro. Meu futuro marido me olha do outro lado do carro, esperando eu
dar os primeiros passos.
Não sei de onde tiro coragem e, com passos incertos, eu ando até o
Romeo.
— Tudo bem? — sonda, com uma expressão quase natural.
— Meus pés doem — admito, mesmo sabendo que ele não se
referia ao meu estado físico, mas o que poderia dizer? Reflito e de repente
Romeo me pega nos braços com tanta facilidade que me assusta, fico dura
como granito, sentindo meu coração se expandir e apertar o frasco contra o
espartilho do vestido de noiva.
— Não precisa fazer isso — digo num sopro, olhando-o debaixo.
Seus olhos encontram os meus escuros e profundos, como a
própria escuridão de Hades e adornam minha face como se houvesse garras
me tocando. Engulo o repentino desconforto se alastrando em minha barriga
e tento ridiculamente relaxar.
— Tudo bem, sou um homem de tradições — profere, e suas
palavras caem como chumbo em meu peito, que se encolhe, impedindo-me
de respirar direito.
Estou completamente e irrevogavelmente fodida.
Romeo desliza o polegar por uma fechadura digital e a tranca faz
um suave clique, se abrindo para nós, ele a empurra e atravessamos.
Capítulo 09

As luzes se acendem, revelando a beleza extraordinária dela. À


minha direita, uma sala de estar com um sofá para mais de cinco pessoas na
cor preta, como também as duas poltronas quadradas ao meio e, no centro,
uma pequena mesa de vidro em cima de um tapete cinza-claro.
Romeo atravessa a casa comigo ainda em seu colo e sobe uma
larga escada feito por granizo escuro e o guarda-corpo de vidro, vislumbro
o início da cozinha ao fim da casa antes de ele virar e nos levar ao andar
superior.
Tudo aqui é preto, preto e mais preto, me sinto na casa de um super
vilão da Pixar, mas é tão estilosa e aberta que, de forma alguma, se torna
feia.
— Sua casa é muito linda — falo, admirando uma parede enorme
de livros, atrás de uma sala menor com divãs e almofadas quadradas no
chão.
— Agora é sua casa também, Sienna.
Minha casa. Reflito e meus pensamentos param na mansão
Santoro, de repente a saudade se torna esmagadora.
— Poderá ver sua família sempre que quiser — avisa e dobra em
um curto corredor, ele sobe alguns degraus em direção a uma porta aberta
para trás, revelando o nosso quarto.
Romeo me solta na entrada do quarto, caminho para dentro com
passos pequenos, absorvendo o ambiente. O cômodo é amplo, fazendo a
cama ao centro parecer pequena, o teto é alto, parece feito para um gigante
e contém uma claraboia em cima da cama. É inigualável.
Me sento na cama e, encarando a lareira, eu removo os meus
sapatos, quase gemo em satisfação quando meus pés tocam o tapete
felpudo.
Romeo permanece em pé diante da porta, sinto seus olhos em mim
e não sei como encará-lo. Está na hora de colocar o plano de Ella em ação,
e só Deus sabe como os planos da minha irmã têm uma porcentagem
imensa para darem errado.
Como eu queria que fosse uma coisa fácil de se resolver apenas
conversando, mas Romeo não é só um homem de tradições, ele é um
Homem de Honra, o que deixa tudo muito pior.
Me levanto e, antes de me virar para ele, procuro por alguma
bebida no ambiente. Localizo o que parece ser uma garrafa de uísque em
cima de uma mesa de centro na extremidade do quarto, perto da parede de
vidro.
Agora, como farei para enfiar a droga lá é uma ótima pergunta.
Me viro e Romeo está sem o paletó e sua gravata desfeita em frente
ao peito. Ele dá um passo em minha direção, e dou um involuntário para
trás, suas sobrancelhas se unem sutilmente enquanto analisam a situação.
— Eu... eu preciso de um banho — gaguejo, falando mais rápido
do que desejo, e caminho em direção à porta ao lado direito da lareira.
— Aí fica o closet — profere, me olhando quase com uma cara de
tédio.
Dou as costas para ele, abrindo outra porta, à esquerda da lareira.
Tranco-a e me escoro contra ela, sentindo o coração desenfreado. O
banheiro é proporcional ao restante da casa, enorme e em preto, exceto pela
banheira branca. Preciso de um banho antes que eu sufoque dentro desse
vestido, tiro o frasco dos seios e o coloco em cima da pia.
Me encaro no amplo espelho, minha expressão alienada me assusta
um pouco. Começo a remover os grampos sem muita paciência e tenho uma
sensação de alívio quando termino.
Inferno, nunca imaginei que passaria minha lua de mel assim,
escondida em um banheiro e tendo que tirar essa parafernália da minha
cabeça sozinha. Idealizei demais um casamento perfeito e joguei tudo fora
porque não consegui esperar. Me viro de costas para o espelho e encaro a
sequência de elegantes botões de cristal que descem até minha cintura.
De repente começo a rir. A única forma de eu sair desse vestido é
Romeo abrindo ou cortando-o com uma tesoura. Abro as gavetas, cogitando
a hipótese de descer o fio sobre o delicado tecido, até lembrar o motivo pelo
qual usei. Não posso fazer isso com o vestido da minha mãe.
Jogo a cabeça para trás, sentindo involuntariamente meu corpo
tremer. Respiro profundamente, escondo o frasco de drogas em um armário
bem atrás de uma pilha de papel higiênico e não espero ter coragem para
deixar o banheiro.
Romeo está deitado com as pernas para fora da cama e as mãos
atrás da cabeça. Faço um ruído com a garganta, chamando sua atenção, ele
se senta, e meus olhos involuntariamente descem pelo seu tronco nu, ele
removeu a camisa e seu corpo é um mapa tatuado, do qual eu não consigo
desviar.
Nunca vi ou sequer o imaginei sem roupas, ele, obviamente, parece
muito forte por baixo dos ternos, no entanto, sem eles, indubitavelmente se
iguala ao próprio Cratos, a personificação da força e do poder.
Romeo fica em pé, e meu olhar se ergue com ele, ignoro o calor em
minhas bochechas e forço-me a ficar paralisada quando ele dá passos
confiantes em minha direção.
— Eu ia me oferecer para abrir, mas fiquei com medo que saísse
correndo. — Sua voz soa monótona e sarcástica quando para às minhas
costas.
— Isso não tem graça — rebato, olhando por cima do ombro, mas
não o enxergo, pois Romeo joga meus cabelos para frente.
— Sabe o que não tem graça — diz, abrindo os botões do meu
vestido, enquanto seguro a parte da frente com os braços cruzados rente ao
corpo —, você se afastar quando, visivelmente, seu olhar exibe que quer
outra coisa.
— Não sei do que está falando — profiro, sentindo o sangue
salpicar minhas bochechas.
Romeo emite uma espécie de riso pelas narinas. Seu peito sólido e
tórrido cola em minhas costas e a impressão é de que vou queimar se ele
não se afastar. Meu noivo segura em meus pulsos ainda atrás de mim,
minhas mãos se fecham em punhos quando ele as descruza, não meço força
com ele, pois jamais ganharia.
Ele puxa meu vestido para baixo, deixando-me apenas de calcinha
e liga de renda branca com uma faixa de cetim azul delicado. Aperto os
lábios com força, desejando abrir um buraco e sumir. Inquestionavelmente,
nunca devia ter saído do banheiro.
Romeo se abaixa, sua respiração fria em minha nádega esquerda
me faz quase hiperventilar. Seus dedos percorrem minha coxa e, quase de
maneira imperceptível, desliza a liga até meu calcanhar, me provocando um
arrepio, e depois me gira para ele, que permanece apoiado em um joelho.
Seus olhos inquisidores encontram os meus e sua aparência é a de
um anjo no íntimo da escuridão. Os dedos dele engatam nas laterais da
minha calcinha, engulo em seco quando a arrasta para baixo, meu primeiro
reflexo é cobrir meu sexo, mas estou com as mãos em punhos e as unhas
enterradas nas palmas da mão.
Romeo se ergue com o maxilar cerrado, me afasto, percebendo seu
olhar se tornar obscuro e selvagem.
— Romeo — sussurro, e ele encontra meu olhar.
— Vá — impõe com um tom de voz indescritível.
Dou exatos dois passos atrás e me viro, caminhando para o
banheiro. Me prendo outra vez e, com o coração acelerado, entro debaixo
do jato d’água, pensando no que fazer quando sair do banho.
Depois daquela cena, eu não sei qual será a sua reação na hora em
que voltar para o quarto.
Talvez deva pedir algo para comer antes de ele partir para cima de
mim e, enquanto ele desce, eu batizo um drink. Comprimo os lábios,
considerando a ideia insana e orando a Deus para que me proteja.
Depois de um longo banho, me sinto preparada para sair. Me
enrolo em uma toalha quando percebo que não trouxe roupa alguma
comigo.
Santa inteligência, Sienna.
Abro a porta do banheiro e a luz do quarto está desligada, Romeo
deitado de bruços, bem no centro da cama. Permaneço paralisada no batente
da porta, analisando a situação.
Ele dormiu... por que ele dormiu?
Ruminando essa pergunta, ando com passos cuidadosos até o
closet, de um lado, todos os ternos e camisas pendurados de forma
impecável e, do outro lado, vazio.
Porra, cadê as minhas roupas?
E esse dia só piora.
Escolho uma camisa qualquer e a visto com pressa, o tecido desce
cobrindo perto dos meus joelhos e fecho os botões até a altura dos seios. Me
encaro em um grande espelho no fim do closet e continuo me sentindo
inteiramente nua sem a calcinha.
Volto para o quarto, Romeo permanece na mesma posição, com um
edredom acinzentado cobrindo seu traseiro, deixando somente as tatuagens
visíveis. Me aproximo da cama, apenas com a luz da claraboia e das
paredes de vidros iluminando o quarto, e deslizo para a ponta do colchão.
Solto o ar lentamente, desejando por fim adormecer, fecho os olhos
querendo esquecer e enterrar bem no fundo de mim toda a situação de hoje.
E, então, Romeo me cobre, fazendo meu coração reverberar.
Sua mão desliza pela minha cintura, deixando-me sem ar, e sobe
em direção ao meu seio, me puxando contra a fornalha que é o seu corpo.
— Não te forçarei a nada, Sienna, mas também não vou te esperar
para sempre.
Ele se afasta, levando meu sono consigo. Sou incapaz de impedir o
colapso que se apossa de mim e quebra tudo em seu caminho, as lágrimas
surgem em meus olhos, e não consigo segurá-las. Enquanto elas escorrem
silenciosas, a necessidade de me torturar me come de dentro para fora.
Capítulo 10

Desperto quando me viro e quase escorrego para fora da cama.


Sienna está colada em mim, invadindo o meu espaço completamente. Para
quem estava com tanto medo, ela parece bem à vontade agora. Deslizo os
fios loiros cor de mel que cobrem metade do seu rosto para trás, revelando
um semblante suave, um pescoço delicado e esguio e uma pele imaculada,
que consigo ver até as pequenas veias rosadas em suas pálpebras.
No momento em que Carlo me informou que me casaria com sua
filha, eu ri, algo que não costumo fazer, porque achei que fosse uma
pegadinha, até entender o que levou tomar aquela decisão. Precaução.
Vi essa garota crescer, nunca a vislumbrei com malícia, nem
quando começou a ter curvas acentuadas. Sienna é bonita, delicada e tem
uma postura impecável, mas é o tipo de mulher que parece dar tédio.
Encaro o relógio da cabeceira, são quase nove da manhã e estou
exausto, mas preciso de um banho. Essa madrugada, levei mais tempo que o
normal para dormir, Sienna chorou em silêncio até adormecer, e só então eu
consegui.
Me levanto devagar para não a acordar, seria bom mais um
momento de paz antes de vê-la perambulando pela casa com o medo
estampado em seu rosto. Nunca fiz mal a ela, não entendo por que me olha
como se eu fosse o diabo.
Sienna se mexe, levantando uma perna por cima da coberta, ela
veste uma camisa minha, que se enrolou em sua cintura, não deixando nada
para a imaginação, meu pau semiduro ganha vida, meu demônio interior
acorda com fome e o desejo de saciá-lo falaria mais alto, se não fosse a
tediosa filha do Chefe.
Tomo um longo banho e, quando entro no quarto, ela está em uma
posição bem mais explícita. Respiro fundo e cubro seu corpo, antes que eu
acabe fazendo algo que devia ter feito ontem. Consumar a porra do
casamento.
Seu olhar de súplica depois que a despi surge em minha mente,
fazendo-me apertar a mandíbula, nunca precisei pegar uma mulher à força,
mas confesso que ontem me deu vontade.
Visto uma calça de moletom e uma camisa preta sem estampa e
desço. Tenho o dia de folga, admito que pagaria pra trabalhar e não ter que
passar o dia com Sienna.
Chego na cozinha e Piero está sentado à ilha, tomando café, com
algumas malas no chão ao seu lado. Meu irmão se vira quando percebe
minha presença às suas costas.
— Carlo me pediu que trouxesse os pertences de Sienna — explica
quando faço a volta na cozinha e me sirvo com um pouco de café da
cafeteira.
— E seu apartamento fica pronto quando?
— Duas semanas, talvez menos.
Piero mora comigo desde que fugimos de Apúlia, no sul da Itália,
ele só tinha sete anos na época, e eu, aos vinte e um, não passava de um
merdinha sem noção. Cuidar do meu irmão, posso considerar a tarefa mais
difícil que já tive, muitas vezes desejei matá-lo para ter um momento de
paz. Nós passamos por uma miséria do caralho, vivíamos o inferno na terra,
até eu começar a trabalhar para Carlo, quatro anos depois.
Minha função era simples, matar. Eu sempre tive talento para o
caos, matar e mutilar nunca foram um problema, metade dos homens que
eliminava os considerava bastardos imundos e corruptos, não valiam o
próprio ar que respiravam.
Foram tantos anos nessa função, que, depois de um tempo,
comecei a me questionar se seria capaz de fazer algo que não fosse matar.
E, então, Carlo me fez o seu braço-direito, e eu senti que faria parte de algo
maior.
Sua confiança levou a esse casamento, a Sienna, e por mais que
meus sentimentos pela garota sejam menos que nada, ela se tornou o meu
bem mais precioso, prometi protegê-la e farei com minha vida se for
necessário.
— Fique até quando precisar — aviso.
— Será que é uma boa ideia? — ele sonda, noto preocupação em
sua expressão.
— A Barbie provavelmente ficará presa no quarto até perceber que
não tem volta — digo, e Piero ri, foi ele quem a apelidou quando tinha uns
vinte anos. Sienna sabe desde pequena disfarçar suas emoções, mas elas
afloravam quando via Piero na sua adolescência. Era patético pra caralho,
até eu notar que Piero dava corda para menina, ela só tinha quatorze anos,
mas ele sempre foi um desgraçado que se excita com o perigo. O peguei e
avisei que arrancaria seus membros se encostasse em um fio de cabelo dela.
Carlo jamais o perdoaria e ainda me faria o matar como punição.
— Ela não tentou fugir, já é grande coisa.
— Não vamos descartar a hipótese, ela teve uma conversa discreta
com o Capo de Nova Iorque. — respondo.
— Franco Fiore não seria tão ousado em sequestrar Sienna.
— Talvez, mas Fiorella faria qualquer coisa para ter a irmã por
perto — digo, terminando o meu café e, quando olho para cima, Sienna está
nos olhando do segundo andar, sua expressão é de ódio, isso eu conheço
bem, mas nunca tinha visto na face dela. Piero se vira para trás em sua
direção, deixando-a numa posição rígida, ela dá dois passos atrás e se retira,
pisando firme, pois escuto seus passos sólidos daqui.
— É impressão minha ou a Barbie se transformou na Annabelle —
Piero zomba quando deixo a ilha e pego as malas de Sienna do chão.
— Se case à força e depois conversamos — digo, indo para o
segundo andar.
Sienna está sentada na cama, de costas. Solto as malas na entrada
do quarto e elas causam um som seco ao cair no chão, ela olha por cima do
ombro e me ignora.
Dou a volta na cama com a sensação de que peguei outra criança
para criar.
— Qual o problema? — pergunto sem amaciar a voz, e sai mais
rude do que pretendia.
— O que seu irmão faz aqui? — pergunta em tom moderado e me
olha com a expressão inalterada.
— Ele mora aqui — informo, e sua máscara se quebra. — Ele irá
embora em poucos dias — concluo, vendo seu maxilar ficar rígido. Sienna
olha para as mãos enfiadas entre as pernas inquietas.
— Não acho ideal ele ficar aqui — diz depois de um momento,
alcançando o meu olhar. — Quero privacidade na minha casa. Ele me viu
assim — profere, apontando para o seu corpo. — Estou sem roupa íntima
— diz com as bochechas coradas.
— Ele não tem visão de raio-x — exprimo inspiro com força. —
Piero ficará mais alguns dias, se precisar de outra coisa para melhorar sua
permanência, me avise.
— Menos sarcasmos seria bom — entoa com um olhar visceral.
Respiro profundamente sentindo minha paciência escapar e, antes que eu
cometa uma besteira, deixo o quarto.
Capítulo 11

Minha cabeça é uma panela de pressão prestes a explodir, se eu


descer e encontrar Piero lá embaixo, honestamente, não sei o que sou capaz
de fazer. Só sei de uma coisa, preciso me assegurar que ele saia dessa casa o
quanto antes, foda-se se ele morava aqui. Ele perdeu o direito a essa casa
quando me tornei esposa de Romeo.
Como sou estúpida! Quando ele disse que seu acesso a mim seria
ilimitado, não imaginei que passaríamos muito tempo na mesma casa.
Arrasto minhas malas para o closet, mais tarde, quando conhecer
os empregados, pedirei que guardem minhas roupas, só então poderei tirar
aquele frasco de ‘Boa Noite, Cinderela’ do banheiro e esconder em um
lugar seguro, até eu ter um plano mais adequado.
Visto rapidamente uma calcinha e coloco um vestido curto, tricot
maxi sweater, na cor rosé e ombro caído, visto também polainas de crochê
creme, que sobem até altura das minhas coxas, e as amarro com cordão.
Olho para minha face em frente ao espelho, ignorando as olheiras
profundas, que fazem meus olhos azuis parecerem faróis, e prendo para trás
a primeira camada de cabelo, das laterais da cabeça.
Me sinto extremamente deslocada com minhas roupas. Nessa casa,
é tudo tão preto, cinza e escuro que me faz sentir esquisita, como se tivesse
algo errado comigo, e não com o ambiente fúnebre.
Talvez um pouco de cor melhore, um quadro, algumas flores, uma
parede colorida...
Caminho para fora do quarto com minha barriga roncando, passo
diante de algumas portas sem ter noção do que há atrás de cada uma delas e
paro em frente à sala de descanso, vislumbrando a extensa parede de livros
e, ao seu lado, um piano escuro, camuflado pelos outros móveis.
Me aproximo do guarda-corpo de vidro antes de descer e espio o
andar inferior. Enxergo somente Romeo na cozinha, conversando com duas
mulheres, uma com mais idade, vestindo um avental e touquinha na cabeça,
a outra é jovem, cabelos pretos como carbono, acima dos ombros, estilo bob
cut repicado e uma franja que cobre sua testa. Suas vestimentas se
enquadram com a casa, jeans preto, coturnos, e uma blusa branca simples
sem mangas, deixando à mostra tatuagens em seus braços, nem de longe ela
parece ser uma empregada.
Procuro pelo bastardo do meu cunhado e, como não o encontro,
desço chamando atenção das mulheres, Romeo se vira em seguida e, como
sempre, ele consegue me congelar no lugar com seu olhar, sua postura passa
de relaxada para inflexível, como se não pudesse agir naturalmente em
minha presença.
— Está com fome? — ele questiona.
— Estou — digo, sentindo-me um animal de circo com os três me
analisando.
— Sienna, Agnes é minha governanta. — A senhora dá um sorriso
caloroso.
— Nossa — corrijo com um sorriso suave.
— E Maeve é sua filha. — Ele sinaliza a garota gótica, ela acena
brevemente com a cabeça.
— É um prazer conhecê-las — saúdo com cortesia.
— Vou preparar o seu café, senhora — Agnes diz, ela parece tão
perdida quanto eu.
— Obrigada — falo, me direcionando para Maeve enquanto
caminho até a ilha, — Quando estiver com tempo livre, preciso que
organize as minhas roupas no closet.
A garota me lança um olhar indiferente, enquanto sua mãe a olha
por cima do ombro, com um sorriso forçado e um olhar de súplica.
— A Maeve não trabalha para nós — Romeo explica, fazendo-me
juntar as sobrancelhas.
— Então, o que ela faz aqui? — pergunto, sem compreender.
— Está sendo rude — Romeo diz em tom de reprovação, parando
ao meu lado.
— Foi só uma pergunta — respondo no mesmo tom dele.
— Ela cursa universidade na parte da tarde e, durante as manhãs,
estuda e faz companhia para Agnes.
— Entendi — falo e me viro quando ouço um estampido atrás de
mim, com meu coração acelerado, mas é apenas Ezio com mais bagagens.
— Quantas malas ainda faltam? — Romeo questiona, vendo quatro
aos seus pés.
— Seis, senhor. — Meu marido me olha, e o vejo inspirar.
Ezio se retira em silêncio, me viro para frente e percebo que está
apenas Agnes na cozinha.
— Ontem, quando entramos, você usou a digital, como eu faço
para sair da casa?
— Peça para um deles abrir.
— Por que não posso ter acesso? — Romeo cruza os braços e
comprime os lábios levemente. — Ah, Deus, você acha que vou fugir —
deduzo.
Ele me dá um olhar feio, e tenho vontade de rir.
— Você não quer estar aqui, por que não fugiria?
— Você não me quer aqui, por que se importa? — Seu olhar se
torna duro, e sei que minhas perguntas estão o importunando.
— Você é minha agora, e eu cuido do que me pertence, se quisesse
fugir, devia ter feito antes do casamento.
— Eu não quero fugir! — exclamo, e seu olhar dedura sua
surpresa. — Eu só preciso de tempo para me acostumar com a casa e com
você... — Mordo a pontinha do lábio inferior. — Nos víamos quase todos
os dias, mas eu não sei nada a seu respeito.
Agnes solta um prato com um sanduíche e um copo de suco de
melancia na minha frente e se retira em seguida.
— O que quer saber? — pergunta quando dou uma mordida no
sanduíche.
Tudo.
— Por que nunca se casou?
Ele tem quarenta anos, a maioria dos homens nessa idade já está
casado e começando a trocar o nome dos filhos, e não é nem pela falta de
memória, e, sim, pela quantidade de herdeiros.
— Não achava apropriado ter uma família com o cargo que
exercia.
— E depois? Mudou de cargo já faz anos — comento.
— E ainda não acho apropriado. Ao longo dos anos, adquiri mais
inimigos que amigos, e você é o meu ponto fraco agora.
— Por que meu pai nos casou?
— Porque ele tem mais inimigos que eu. — Romeo se afasta, sem
mais explicações.
— E sua família?
— Você conhece, Piero. — Ele junta minhas malas e sobe para o
andar superior.
Suspiro insatisfeita, ainda tinha mais uma porção de perguntas para
fazer.
Termino de comer e deixo a louça na pia, na subida para o meu
quarto, vejo Maeve esparramada em uma das almofadas, com um notebook
entre as pernas. Seus olhos castanhos dourados alcançam os meus e sua
expressão de indiferença permanece.
Entro em meu quarto e meu telefone está tocando dentro da minha
bolsa, entre as malas que Romeo subiu.
Há mais de dez chamadas perdidas das meninas, fecho a porta do
quarto e atendo a ligação.
— Estou viva — declaro.
— E por que não atende a porcaria do telefone? — Fiorella ruge.
— Achei que tivesse acontecido algo de ruim com você.
— Não aconteceu nada. Nadinha. Nada.
— Nada? Nada? — Ri de como sua voz afinou.
— Ele não vai me obrigar, mas também não vai me esperar para
sempre, palavras dele.
— Promessas vazias, Franco disse basicamente a mesma coisa, e
não aconteceu nada. Fico feliz que esteja bem.
— É — falo e minha voz soa incerta.
— O que houve, Sienna?
— Piero ficará conosco por alguns dias — declaro e preciso afastar
o telefone para abafar os berros de indignação da minha irmã, pelo menos
uma de nós pode extrapolar.
— Esse cara é doente, se ele não tem medo nem do próprio irmão,
você precisa tomar cuidado.
— Eu vou, não se preocupe comigo.
— Impossível, Si — ela lamenta e pergunta: — E o resto está de
boa?
— Me sinto na casa da Família Adams, só que quadrada e
sofisticada. — Rimos.
— Quero fotos — pede e logo ouço Stef começar a chorar.
Me despeço de Fiorella, olhando pela janela, não havia notado até
agora que tenho uma floresta no quintal. O pátio é mais extenso do que
parecia noite passada. Avisto também um pergolado fechado com paredes
de vidros e, no interior, possivelmente uma majestosa jacuzzi.
Decido descer, quem sabe posso ajudar Agnes a preparar o almoço,
tenho que encontrar uma rotina, já que eu tinha era aguardar os dias passar
para me encontrar com Piero, e depois que soube do casamento com
Romeo, meus últimos dias foram de pura depressão em cima da cama.
No caminho, antes de alcançar a sala de descanso, me aproximo de
uma porta aberta, é o escritório de Romeo, ele está sentado atrás de uma
mesa, e sua expressão é mais relaxada daquela que usou para me esperar no
altar. Maeve está em pé em sua frente, falando de coisas sobre as quais não
compreendo.
Meu telefone apita, chamando atenção dos dois, desvio o olhar
para tela e me afasto da sala, desejando poder cavar um buraco e me
enterrar nele. Entro no quarto e fecho a porta, depois me enfio nas cobertas,
sentindo algo estranho em meu âmago.
Respiro fundo, ignorando essa sensação, e respondo à mensagem
de Dona.
Mensagem Sienna: Estou bem, Dona.
Deslizo o telefone para baixo do travesseiro e rolo na cama até o
lado de Romeo, seu perfume masculino e viril flutua em meu nariz e, por
instinto, jogo o travesseiro para os pés da cama e puxo a coberta entre
minhas pernas.
Romeo estava certo, se eu tivesse como, fugia, é meu primeiro dia,
e parece que estou fazendo uma visita à fábrica de Willy Wonka, nada faz
sentido, nós não fazemos sentido.

Só quando acordo, percebo que havia adormecido, não lembro de


os domingos serem tão longos quando vivia na mansão Santoro. Olho para
o céu e o crepúsculo se espalha pela imensidão, fazendo-o parecer um
paraíso.
Romeo está em pé diante da parede de vidro, vestindo um traje
social, mas sem o paletó.
— Pensei que não fosse acordar — diz, se virando para mim e
soltando o drink na mesinha de centro. Sua camisa está aberta e a gravata
desfeita em frente ao tórax.
— Vai sair? — pergunto, sentando-me e focando em seus olhos.
— Já saí. Deve estar com fome, perdeu o almoço. — Ele anda em
minha direção, seus olhos quentes nunca abandonam os meus, quero
desviar, mas não posso, pois tenho certeza para onde iria olhar.
— Um pouco — admito, e Romeo para na minha frente, fazendo
sombra em meu rosto, meus olhos traidores não resistem e descem,
vislumbrando seus músculos rígidos. O calor que surge em meu pescoço
subindo em direção às minhas bochechas é irreal.
Qual é a porra do problema comigo? São apenas músculos.
— Levanta — Romeo diz firme, chamando minha atenção, balanço
a cabeça em negação, incapaz de olhar em seus olhos.
Ele segura em meu queixo e me força a encará-lo, seus olhos estão
escuros e sedutores.
Sinto o desconforto subir pelo meu peito e ficar entalado ali
quando ele me empurra para trás, me prendendo na cama pela garganta.
Travo a mandíbula e uma corrente de medo atravessa o meu corpo,
bloqueando cada partícula do meu elemento.
Romeo enfia um joelho entre as minhas pernas, impedindo-me de
fechá-las. Sua língua desliza lentamente para dentro da minha boca e a
explora, só então ele solta minha garganta.
Sua boca abandona a minha e desce em direção ao meu pescoço.
— Romeo — sussurro com a sensação de que meu coração vai sair
do peito.
— Eu não vou entrar em você — sussurra em meu ouvido,
deixando-me inteiramente arrepiada —, agora me beije de volta.
Confio em suas palavras, mas não em suas ações, sinto o seu pau
duro contra minha virilha, mas antes que a culpa por mentir consuma minha
mente, eu retribuo o seu beijo.
A mão dele vagueia explorando meu corpo, e um maldito sinal de
alerta repercute minha mente. Seus lábios deixam os meus e descem
beijando meu pescoço, Romeo empurra para baixo o vestido com caimento
no ombro, expondo meus seios, ele cheira a minha pele e sua respiração em
meu mamilo o deixa firme.
— Você cheira a pêssego — afirma e sua língua desliza pela aréola
e depois o abocanha, me provando.
Me contorço involuntariamente, meus dedos tocam seu abdômen
sólido com a intenção de empurrá-lo, as coisas estão indo de zero a cem,
muito rápido. Mas não o faço, pois Romeo prende meus braços rente à
cabeça, e suas mãos firmes em meus pulsos me mostram que, se ele
quisesse me devorar, ele o faria sem muito esforço.
Seu joelho sobe um pouco, pressionando meu clitóris, gemo, e seus
olhos escuros encontram os meus. Tento afastá-lo com as pernas. Isso não
irá acabar bem para mim, penso, e ele espalma o outro seio, o aperta com
força, depois suga e se deleita. Sua perna flexiona mais a minha boceta,
mostrando-me o quanto estou molhada e, mesmo com a mandíbula travada,
ofego, sentindo-me uma cadela por estar roçando em sua perna, mas é
inevitável.
De repente o desejo desperta em mim, quero me tocar, quero que
ele me toque, quero sentir o seu pau ocupando cada pedacinho de mim...
gemo alto, arqueando as costas no colchão, tento afastá-lo outra vez, isso
será o meu fim.
— Quando parar de me afastar, quero que esfregue sua boceta no
meu rosto com o mesmo desejo de agora — diz com uma voz áspera no
meu ouvido, tornando os meus batimentos uma loucura. Não há espaço para
a razão, o prazer se alastra como fogo, me incendiando de dentro para fora.
Ele belisca meu mamilo, eu grito e gozo na mesma hora. Romeo se
afasta. Minha respiração está acelerada e de repente tudo fica turvo, porque
me sento rápido demais. Puxo minha roupa de volta ao lugar, sentindo-me
constrangida e muito suja.
— Quer conversar sobre isso? — ele pergunta, sentado ao meu
lado, seus olhos estão em mim, mas eu os evito.
— Por que eu iria querer falar disso? — indago com as
sobrancelhas unidas, ainda olhando para baixo, girando minha aliança no
dedo, então lembro que, aos olhos dele, ainda sou uma garota intocada. Não
sei nem como consegui esquecer isso por um segundo.
— Não precisa ter vergonha de mim, Sienna. — Alcanço o seu
olhar atento, se isso chegar acontecer de novo, não sei se terei forças para
pará-lo.
— Ainda não estou pronta — falo baixo.
Não até eu resolver a questão da virgindade. Revelar a verdade
parece a opção mais viável do que o drogar e o enganar. Se eu tivesse pelo
menos uma garantia de que ele não devoraria minha alma logo depois, faria
isso agora.
Piero abriu os meus olhos da pior forma, me tratou como uma
princesa e depois, quando as coisas complicaram, mostrou sua outra face.
Não quero conhecer o lado sombrio de Romeo, não sem ter algo para contê-
lo.
— Vamos descer — declara, removendo a gravata e a jogando na
cama.
Inspiro firme e sigo Romeo, o cheiro de comida atinge em cheio
meu estômago, que se transforma em pedra no instante em que enxergo
Piero no andar superior. Aquele boçal se vira para trás com um riso cravado
nos lábios.
— Boa noite! — ele saúda alto, levando uma garrafa de cerveja à
boca, Romeo se vira para mim quando chega no último degrau, e esboço
meu sorriso de porcelana.
— Aqui não tem que fingir alegria Sienna — profere, me
esperando, e meu sorriso se esvai, pelo menos não vou precisar fingir
felicidade na frente do Piero.
Andamos até a sala de jantar, Romeo se senta na ponta, e eu, à sua
esquerda. Não demora muito para o estrupício do seu irmão se juntar a nós,
sentando-se à minha frente. Evito encarar Piero, minha expressão é de quem
deseja escalpelá-lo vivo, não tenho certeza se conseguiria esconder isso de
Romeo.
— O que achou do seu novo lar? — Piero pergunta, forçando-me a
olhá-lo. Sua expressão despreocupada me dá vontade de arrancá-la a tapa
da sua cara.
— Diferente de tudo que já vi — balbucio sem muita vontade e a
governanta entra na sala de jantar ao lado de sua filha, carregando nossos
pratos. Pensei que ela não trabalhasse aqui, mas, aparentemente, ela só não
trabalha para mim.
— Parece delicioso, Agnes — menciono, olhando para o bolo de
carne ao lado dos aspargos e a cenoura. A senhora me dá um sorriso gentil e
se retiram.
— Vou buscar um vinho — Romeo avisa, acredito que apenas por
educação, e nos deixa só.
— Pare de ser apática, ou ele vai começar a nos fazer perguntas —
sibila entre os dentes.
— Quer simpatia? Saia da minha casa.
— Eu tentei, ele insistiu para que eu ficasse. — Piero dá de
ombros, como se não pudesse fazer nada para mudar isso.
— Ele é seu irmão Piero — falo, desacreditada. — Você me dá
nojo.
— O que te dá nojo, Sienna? — Romeo pergunta com duas taças
em uma mão e uma garrafa de vinho na outra.
— Casu Marzu — Piero responde, franzindo o nariz com nojo, ele
é um ótimo mentiroso, desgraçado.
— Hum, provei uma vez em Palermo. — Agora também torço o
nariz, Romeo junta os lábios numa espécie de riso.
— Não é tão ruim quanto parece. — Ele serve as taças e me
entrega uma.
— Como é Palermo? — pergunto, ignorando completamente Piero
à mesa.
O que me deixa tranquila é que esse animal sabe o seu lugar
quando Romeo está por perto.

Saio do banho e deslizo uma camisola branca de renda nos seios e


o caimento em tule, foi a menos sexy que Dona colocou na mala. Lembro-
me que fui eu quem escolheu as de Fiorella, coloquei as mais ousadas, pelo
visto, Dona fez o mesmo comigo.
Entro no quarto, e ele já está na cama, escorado contra uma
montanha de travesseiros mexendo no telefone, atravesso o cômodo com
passos largos e deslizo para baixo da coberta. Romeo desliga a luz do
abajur, ele não força proximidade, apenas me dá as costas, como na noite
passada.
Quando ficamos noivos, estava tão obcecada em tentar me livrar
dele que não consigo enxergar o que me fez mudar de ideia agora. Além do
óbvio, não ter para onde fugir. Mas sempre tive um medo irreal dele, cresci
o idealizando como o mal encarnado, só que eu não sou mais uma
menininha, e Romeo não parece ser mais o monstro que eu alimentei em
minha mente.
Capítulo 12

Entro no closet e minhas malas permanecem no chão. Suspiro,


procurando o que vestir para descer tomar café da manhã. Deslizo em uma
calça jeans e a prendo com um cinto dourado da Gucci, coloco uma básica
de lã preta, com gola alta, e botas altas de cano baixo da mesma cor.
É segunda, quem sabe Romeo me leve até a mansão Santoro com
ele. Enfio meu telefone no bolso e desço depressa, sentindo o cheiro de
café, ele está sentado à mesa, vestido socialmente para sair.
Ele se vira quando estou descendo o último degrau e me analisa
por mais tempo que o de costume.
— Bom dia — digo alto, o suficiente para Agnes e sua filha
escutarem e me sento ao lado de Romeo com um sorriso luminoso.
— O que você quer, Sienna? — pergunta, levando a xícara de café
à boca.
— Ir com você para a mansão Santoro — respondo, e ele acena
negativamente, com os lábios comprimidos, minha expressão de decepção
fica evidente.
— Sua casa é aqui, tem que se acostumar.
— Você disse que poderia ver a minha família sempre que quisesse
— relembro-o.
— Só faz um dia que está aqui — repreende.
— E o que espera que eu faça o dia todo?
— Pode arrumar o closet. — Dou-lhe um olhar desdenhoso, — Ou
ir às compras. — Romeo desliza um cartão preto da Amex pela ilha.
— Se eu comprar mais roupas, teremos que expandir o closet —
profiro, insatisfeita.
— Não precisa trocar sua rotina, porque mudou de casa — Piero
responde atrás de nós, provocando uma forte agitação no meu âmago, e
Romeo parece concordar com o bastardo, porque não faz ideia de que no
meu tempo livre eu passava horas montada em seu irmão.
— Temos que ir, se precisar de algo, peça a Agnes, ou ao Ezio. —
Lhe dou um aceno.
Olho os dois partirem em silêncio e, quando me viro, Maeve está
com os olhos em mim.
— A senhora gostaria de algo diferente para o café? — Agnes quer
saber.
— Não, obrigada. — Arrasto um dos pratos de panquecas até a
minha frente.
— Se precisar de mim, estarei em seu quarto, eu só não fui ontem
porque a senhora dormiu a maior parte da tarde — explica de uma forma
envergonhada, e percebo que sua filha está de olho em nós.
— Tudo bem, Agnes. — A mulher sobe enquanto continuo
tomando o meu café.
Depois do café, vaguei pela casa taciturna, procurando qualquer
coisa para fazer, e percebi que não há fotos, retratos de Romeo e Piero ou
nada que indique um passado deles, como pertences que adquirimos ao
longo dos anos. Subo para o quarto com a curiosidade aflorada em minha
mente, meu marido tem quarenta anos e tudo aponta que ele odeia o
passado ou esconde algo nele.
Entro no closet e Agnes está perdida entre as roupas, ela para de
dobrar uma peça, me dando atenção.
— Senhora.
— Por favor, não me chama de senhora, me faz sentir tão...
— Velha? — questiona e sorrimos.
Se tem alguém que deve saber sobre a vida do meu marido é a
empregada.
— Agnes, você já deve saber que esse casamento foi arranjado —
comento, vendo sua expressão endurecer, pego um vestido e começo a
ajudá-la.
— Sim — diz, com certeza incomodada com o assunto.
— Quero sua ajuda para conhecê-lo melhor — expresso com meu
sorriso de menina perfeita. — Quero saber dos seus gostos, música, comida,
livros, você deve trabalhar para ele há anos.
— Há dezessete anos, senhora — menciona e fica pensativa, com
certeza ponderando se deve ou não seguir adiante. — O senhor Ferraro
gosta de silêncio, livros thrillers, blues, jazz, e piano...
— Ele sabe tocar? — interrompo, curiosa, ela confirma com um
aceno e um sorriso. — Você conhece alguém da família, além de Piero? —
pergunto sem mostrar muito interesse enquanto coloco um vestido de festa
no cabide.
— Não, senhora.
— Onde ficam os itens pessoais, como fotos?
— Isso você vai ter que perguntar a ele. — Assinto, totalmente
insatisfeita.
Continuo ajudando Agnes por mais um momento, falando sobre
coisas aleatórias. Ela me contou que é viúva e Maeve é sua única filha,
disse com orgulho que a garota está concluindo o ensino superior em
Direito aos vinte e três anos.
Não sei como, mas consegui descobrir mais a respeito da filha da
empregada do que meu próprio marido.
Aproveito que meu telefone está tocando e deixo o closet para
atendê-lo.
— Você está mesmo preocupada — respondo com um sorriso,
escorada no corredor do quarto.
— Sim, você é minha irmã e está casada com uma arma letal.
— Ele não é tão ruim quanto parece — respondo e nem acredito
que isso saiu dos meus lábios.
— Humm, de onde surgiu essa empatia? Até onde me lembro, há
duas noites, você abominava Romeo.
— Eu quero um casamento de verdade, Ella. Quero ser feliz como
você e Helena, mesmo que seja com ele.
— O que tem em mente?
— A verdade, mas ainda não posso, não sem ter algo para contê-lo.
— É bom ter uma carta na manga — ela apoia, mas, invés de ficar
aliviada, fico nauseada, quero encontrar algo para usar contra meu marido,
caso ele se volte contra mim.
Me despeço de Fiorella, questionando-me que espécie de
casamento é esse? Eu errei, pelo menos na visão dos homens da máfia.
Cometi um erro tão pequeno, mas, para eles, me tornei uma mulher com
menos valor, menos honrada.
Limpo minha mente, antes que esses pensamentos me consumam.
E, quando viro o corredor, encontro Maeve em uma posição rígida em
frente ao guarda-corpo de vidro. Desde que cheguei, a garota não dirigiu
uma palavra a mim, mas anda pela minha casa se sentindo mais à vontade
que eu.
Ela se vira para mim quando me aproximo e seu semblante é de
inquietação.
— Tudo bem? — pergunto.
— Na verdade, não. — A voz dela é contida. — Escutei sua
conversa com minha mãe e não vou deixar você metê-la em confusão.
Nem tento esconder minha surpresa, apenas junto as sobrancelhas
em desentendimento.
— Perdão, mas como eu colocaria Agnes no meio de uma
confusão?
— Você faz pergunta demais e Romeo não gosta disso. Devia
conversar com ele se quer conhecê-lo melhor.
As palavras me fogem da boca e, por um momento, não sei como
me portar diante disso. Ela me colocou no meu lugar dentro da minha
própria casa? E ela nem errada está, e isso me enfurece. Eu devia conversar
com Romeo e não comer pelas beiradas como a merda de um roedor.
— Tudo bem, Maeve — a expressão da garota suaviza —, agora
vamos falar sobre limites. Esta é a minha casa, você não é bem-vinda em
meu quarto e, enquanto Agnes estiver aos meus serviços, terei o tipo de
conversa que eu quiser com ela. E, caso ela se sinta incomodada, estarei
disposta a escutá-la. Estou fazendo a cortesia de te aceitar aqui, não
confunda minha gentileza com indulgência — pronuncio as últimas
palavras que Romeo usou comigo, elas me abalaram naquele momento e
espero que provoque metade do efeito que elas causaram em mim.
Deixo a garota processando minha resposta e ando até a grande
parede de livros, ouço passos na escada, mas não me viro para confirmar
que ela está indo embora. Vagueio os olhos pela estante e puxo o primeiro
livro que me chama atenção, O Silêncio dos Inocentes.
Me aconchego em uma das poltronas, e a cada duas páginas lidas,
percebo que preciso voltar uma, pois minha mente está em outro lugar.
A conversa com Maeve me deixou inquieta, talvez devesse ter
segurado a língua, afinal, ela só estava preocupada com a mãe dela.
Amanhã, quem sabe, tento mostrar a ela que não temos que ser inimigas,
adoraria ter alguém para conversar, e temos quase a mesma idade, devemos
ter algo em comum.

O dia passou mais rápido que o anterior quando parei de me


martirizar e foquei na história, comi uns biscoitos, tomei chá da tarde.
Agnes e eu fizemos a sobremesa favorita de Romeo, torta de maçã com
crosta crocante.
Conquistá-lo pela barriga não será tão eficiente como sexualmente,
mas quero que veja que estou tentando e perceba que a porta pode ficar
aberta que eu não sairei correndo.
Enquanto a torta assa, eu subo para o meu quarto, aproveito que
Agnes está ocupada, pego o frasco de droga no armário do banheiro e
procuro em meu closet impecável e arrumado um lugar para escondê-lo.
Na seção de arte, onde estão minhas roupas e acessórios de ballet,
encontro uma caixinha de música com uma bailarina presa em cima.
Ganhei da minha mãe quando comecei as aulas de balé, aos cinco
anos. A caixinha tem um fundo falso, onde eu guardava meus sentimentos
escritos em papéis.
Foi uma das orientações que a psicóloga passou a Fiorella antes de
ela tentar suicídio. Funcionou comigo por um tempo, até eu perceber que a
caixinha era pequena demais para tudo que eu estava sentindo.
Encontrar Fiorella caída aos pés da cama, depois de uma overdose,
não foi o ápice da minha infância. Tive a sorte de não presenciar o massacre
da mansão, mas horas depois, através de uma janela quebrada, eu
testemunhei meu marido abrir um homem de ponta a ponta com uma faca, o
assisti enfiar a mão no interior do homem e arrancar as entranhas do seu
elemento com um puxão. Naquele momento, assustada e perturbada, aos
dez anos, tive certeza de que Romeo abrigava um monstro.
Ali meus piores pesadelos começaram, o que eu sentia era grande
demais para que conseguisse entender sozinha, mas forcei-me a engolir a
necessidade de atenção, pois, para mim, os meus traumas não eram nada
comparados aos de Ella.
Não lembro como me autoflagelar começou a me trazer paz
mental, a dor física me entorpecia por um tempo, e aquele sofrimento
agudo, que fustigava cada segundo dos meus pensamentos, se tornava mais
suportável.
— Sienna. — Sinto minha alma sair do corpo e voltar quando ouço
Romeo atrás de mim, fecho a caixinha, provocando um baixo estampido.
Ele para ao meu lado e seus olhos vagam até minhas mãos.
— Ganhei da minha mãe — menciono comovente, abrindo a
gaveta de sapatilhas de ballet e guardando a caixinha ali.
— Como foi o seu dia? — ele pergunta, e seus olhos tão escuros
quanto ébanos penetram os meus especulativos. Sua expressão, eu desisti de
tentar decifrá-la. Romeo parece, noventa e nove por cento das vezes,
carrancudo. E tenho certeza de que ele não veio até o closet só para saber
como foi o meu dia, não sou ingênua a esse ponto.
— Agnes e eu fizemos uma torta de maçã para você — profiro
suave e com o sorriso contido e muito bem fingido, pois Romeo já sabe que
o outro é completamente falso.
Sua postura não se altera em nada, o que me deixa irritada.
— Por que está aqui? — pergunto, calma, olhando para o closet à
nossa volta. Romeo inspira e remove o paletó, soltando em cima de um puff
oval.
— Está xeretando onde não devia, Sienna — entoa, deixando-me
possuída, aquela cachorra foi direto nele. Meu coração bate forte, em ritmo
descompassado.
— Uau. A filha da empregada sussurra em seu ouvido, e você sobe
com quatro pedras sem nem me dar o benefício da dúvida. — Sua
expressão endurece ainda mais se possível.
— Maeve não mente, ela não tem motivos — declara, me deixando
magoada, está na cara que estou sobrando, a minha palavra não vale nada
perto das dela.
— Você não é acessível, Romeo. Eu só queria conhecê-lo melhor,
obrigada por poupar meu trabalho e esforço.
— Já me conhece o suficiente. — Dou-lhe as costas e saio do
closet, desacreditada que eu queria tentar me aproximar desse brutamontes.
— Sienna. — A voz dele me atravessa, áspera e firme, fazendo-me parar
com as mãos em punhos. — Aonde vai?
Me viro, com a mandíbula tão apertada que parece que vai partir.
— Ficar longe de você — profiro, irritada, e não aguardo sua
repreensão, deixo o quarto mais rápido que consigo.
Sou ousada e não insana para continuar uma discussão com
Romeo. Chego no andar inferior e Piero está sentado em uma poltrona entre
a sala e a cozinha, tomando uma cerveja.
— Achei que levaria mais tempo para tirá-lo do sério — profere
enquanto caminho até a ilha, com as mãos em punhos, sentindo que a
qualquer momento minhas palmas começaram a sangrar, pela agressividade
das minhas unhas.
Olho à minha volta, procurando algum canto para me esconder,
aqui é a minha casa, devia me sentir segura, mas não posso ficar no quarto
com Romeo, pelo menos não agora. A sala está com o bastardo do Piero e,
na cozinha, o que me enfurece cegamente, Maeve e sua mãe.
A mulher me fita com uma expressão preocupada, dou-lhe um
sorriso para que se mantenha calma. Pego a torta inteira de maçã e a garrafa
de vinho aberta de cima da ilha e me viro para Piero.
— Abra a porta — ordeno entre os dentes.
— Aonde vai?
Ficar longe de vocês.
— Não é da sua conta — profiro e adiciono —, agora!
Piero se levanta nem um pouco contente e anda comigo em direção
à saída, ele desliza a digital pelo pequeno aparelho e ela se abre facilmente.
— Vê-se não enche a cara e sai falando asneira por aí.
— É tudo que eu mais desejo — sibilo, passando pela porta, o frio
atinge meu corpo em cheio, quase recobro o juízo, mas me recuso a ficar na
mesma casa que eles.
Capítulo 13

Quarenta e oito horas e já sinto vontade de matá-la, só para ter o


resquício da minha vida de volta.
Sienna é uma boa impostora, me pego às vezes diante dos meus
olhos sem saber quando está fingindo. A sensação é que metade do tempo
ela escolhe como quer ser vista, sua postura de garota honrosa e simplória
com largos sorrisos que poderiam iluminar uma cidade é só uma máscara
para o que quer que ela esconde dentro de si.
Seu método de demonstrar aproximação me cheira a outra coisa,
ela está tramando, e por que e para quem é o que vou descobrir. Aquela
conversa que ela teve com Franco Fiore não sai da minha cabeça, ninguém
fica tão tenso durante uma conversa sobre bebês.
Minha mente fica nublada, refletindo sobre as inúmeras formas que
eu conseguiria arrancar a verdade dela, mas todas terminariam com Sienna
sangrando no quarto branco.
Tomo um banho e desço sem o mínimo de vontade, ainda preciso
consertar a bagunça das duas. Conheço Maeve desde criança, é uma boa
garota, inteligente e confiável, já passou por muita coisa ruim, ela sabe o
seu lugar. Quero acreditar que ela só contou sobre o interrogatório de
Sienna a Agnes por preocupação.
Não gosto de delatores, mas também não gosto de ninguém
investigando o meu passado.
— Onde ela está? — pergunto a Piero, assistindo ao jogo do
Chicago Bears atirado no sofá da sala principal.
— Saiu, com uma torta e uma garrafa de vinho. — Ele dá um
risinho. — A Barbie tem pavio curto.
— Não devia tê-la deixado sair.
— Ela não é minha esposa, não obedeceria.
— Romeo, posso falar com você? — Ouço às minhas costas uma
voz moderada e preocupada.
— Agora não, Maeve — profiro, ignorando a garota e subo para o
escritório. Abro as câmeras de vigilância do pátio no notebook e vejo as
luzes do pergolado acessas, acesso às imagens da sala e enxergo Sienna
dentro da jacuzzi, brincando com a garrafa de vinho.
Sento-me e fico olhando-a por um momento, totalmente alheia,
Sienna entorna um gole no bico da garrafa e depois a solta ao lado quase
vazia. Ela vira as palmas das mãos para cima e fica olhando-as por mais um
momento.
Seu cabelo está preso para cima em um coque, ela escora a cabeça
para trás na borda da jacuzzi, e imerge na água. As bolhas não me deixam
enxergá-la.
— Encontrou-a? — Piero se escora contra o batente da porta.
— Jacuzzi.
— Acho uma boa deixá-la ficar bêbada? — pergunta, abrindo os
botões da camisa.
Olho para a tela do notebook e Sienna ainda não emergiu, uma
pessoa sem treinamento consegue ficar até dois minutos sem respirar, uma
bêbada, bem menos.
— Não, provavelmente ela é uma bêbada chorona — respondo
ficando em pé, — Vou buscá-la.
— Você se preocupa com ela, irmão — Piero afirma quando deixo
o escritório.
— Ela é uma Ferraro agora — profiro, dando as costas para ele.
Deixo a casa e o frio de novembro atravessa meus ossos, ando com
passos largos, passando por alguns seguranças distribuídos ao longo do
pátio, até ao pergolado. Ezio está escorado na parede, fumando um cigarro,
ele me dá um aceno.
— Está liberado — aviso, ele não me aguarda entrar para subir.
Arrasto a porta de vidro para o lado e a atravesso, Sienna está de
bruços na jacuzzi, agora sem as bolhas, seus braços estão cruzados sobre a
borda, onde seu queixo está apoiado. Seus olhos abrem na hora em que
fecho a porta com excesso de força.
Sienna enrijece, ela fica em pé e se afasta da borda com as mãos
nos seios, fazendo-me juntar as sobrancelhas sutilmente, seus olhos
vagueiam pela sala, possivelmente localizando a toalha, que está na outra
extremidade, além do deck de madeira que cerca a jacuzzi.
Me aproximo e pego do chão a garrafa vazia, olho para Sienna, ela
está com uma expressão severa e um olhar presunçoso que ninguém levaria
a sério.
— Tomou um Château Lafite sozinha — profiro em tom de
censura, e seus olhos azuis cristalinos nublam enquanto ela torce os lábios.
— E nem era tão bom! — exclama, indiferente e com a língua
enrolada.
— Deve ser porque é feito para degustar, e não para entornar como
uma porca bêbada. — Os lábios dela se separam brevemente, mas se
fecham firmes iguais aos seus punhos, e sua expressão reflete a dor por um
momento.
— Se veio até aqui para me insultar, cumpriu seu propósito, já
pode ir — sibila cada palavra e se vira de costas, seu corpo esguio
imaculado como uma tela branca afunda lentamente na jacuzzi.
Respiro profundamente. Quando ficamos noivos, eu soube que
teria que ter paciência. Ela é diferente de todas as mulheres que já estive, é
jovem demais, é inexperiente em tudo que não esteja relacionado a um
cartão de crédito. Só não imaginei que conseguiria consumir o meu bom
senso em um recorde de tempo.
Taí mais um motivo de não ter me casado, não sei lidar com
dramas, nunca me envolvi tempo demais para criar laços. Quando percebia
que tinha mais diálogo que sexo, eu me afastava, mas, com Sienna, eu não
tenho essa opção, porque não tem como se afastar de algo que não está
próximo e pela promessa que fiz ao Carlo.
Tiro as roupas, ficando de cueca, e entro na jacuzzi, Sienna me
olha por cima do ombro.
— O que está fazendo? — ela balbucia.
— Você queria conversar, estou aqui. Vire-se — exijo, mas ela não
o faz.
— O que te faz pensar que ainda quero conversar com você?
Sienna bêbada não é chorona, é respondona em um nível ousado.
— Está fazendo pirraça — profiro, ela se vira com a expressão
severa.
— Estou no meu direito de ficar chateada, Romeo — entoa e, com
os olhos fixos nos meus, impõe: — E Maeve terá que arrumar outro lugar
para passar as horas livres, não a quero por perto, não confio nela.
— Eu confio — emito, e indignação estampa a sua face.
— E em mim, Romeo? — Sua voz é comedida.
— Não. — Sua decepção é visível, mas o seu comportamento não
me deixa baixar a guarda.
Sienna morde o lábio inferior com força, ela fica em pé e a água
desliza pelas suaves curvas em seu corpo.
— Se Maeve ficar, bem-vindo ao seu inferno — ela garante
ríspida, com os olhos desafiadores grudados nos meus, levando minha
tolerância ao limite. Ela se vira para subir os degraus da jacuzzi, mas,
quando me dou conta, já estou com ela deitada no chão do deck, suas
pernas agitadas tentam me empurrar, sem eficiência. Pego em seus punhos e
os seguro para trás, rente aos seus ombros no chão.
— O que você sabe sobre inferno, Sienna? — Aqueles olhos
deslumbrantes se arregalaram com o medo injetado em cada fibra rígida do
seu corpo, fazendo-me afrouxar o aperto em seus pulsos. — Nunca meteu
os pezinhos de principessa em uma favela, passou fome, frio. Você não
sabe o que é o inferno, não queira descobrir.
— Está falando de quem? — Seu olhar de constrangimento desvia
dos meus.
— Agnes e Maeve — digo e me afasto, vendo sua respiração sair
em um assobio lento.
Sienna desliza para dentro da jacuzzi novamente e seus olhos não
encontram os meus nem por um segundo.
— Antes de começar a trabalhar para o seu pai, eu morava em um
parque de trailers. — Lembranças do tempo que passei naquele buraco de
rato invadem minha mente, expondo o pior de mim, eu literalmente matava
para ter o que comer, espanto os pensamentos, — Agnes cuidava de Piero,
enquanto eu conseguia dinheiro para sobreviver. Levou anos até eu
conseguir tudo que tenho agora, e eu mataria para não ter que voltar para
aquele lugar.
O silêncio é um manto pesado que se estende entre nós dois.
Sienna está pensativa, o que é bom, espero não precisar colocar juízo em
sua cabeça de outra forma.
Seu olhar encontra o meu cauteloso.
— Entendo ela ter ficado com medo, mas eu não sou a vilã aqui, e
não vou permitir que ela me confronte ou me espione dentro da minha casa.
Avise-a para que fique longe dos meus olhos — diz com um a voz profunda
e decidida. Sienna se levanta, e meus olhos ficam pregados em seu corpo,
vislumbrando as gotas escorrendo pela perfeição da sua pele.
Nunca a desejei até noite passada. Meu pau poderia quebrar de tão
duro que ficou quando senti a pele macia dos seus seios em meus lábios,
seus gemidos profundos e contidos em meu ouvido, ou até mesmo quando
ela tentava resistir fracassadamente. Sienna gostou tanto que se desfez em
segundos com o mínimo de contato, seu medo é irreal, talvez deva mostrar
isso aos poucos.
— Espere.
— O que foi? — Ela se vira nos últimos degraus da jacuzzi.
Fico em pé, seu olhar percorre pelo meu corpo e, ao mesmo tempo
em que suas bochechas coram, Sienna enrijece ao me ver duro.
Às vezes a impressão que ela me passa é de que eu pretendo
amarrá-la, amordaçá-la e sodomizá-la, fico excitado com a ideia, que é
particularmente suja, mas consigo nos idealizar perfeitamente nesta
situação.
Em poucos passos, estou na sua frente, Sienna permanece no
último degrau e, mesmo com os meus 1,93 de altura, ela ainda precisa
erguer a cabeça para encontrar os meus olhos.
Ela ruboriza ainda mais quando deslizo por sua barriga chapada
uma mão até altura dos seus seios, olho para eles e lembro do seu cheiro, do
seu gosto.
— Não precisa ter medo de mim, pêssego. — Suas sobrancelhas,
que estão juntas, moldando sua expressão apreensiva, se suavizam por uma
fração de segundos.
Seguro em seu seio, ele pesa ocupando toda a minha mão, Sienna
fica tensa na hora em que o aperto e abocanho, sugando o seu mamilo. A
outra mão escorrega pelas costas dela, acariciando o limiar da sua cintura.
— Romeo. — Meu nome passa como uma súplica pela sua boca, e
suas unhas cravam em meus ombros com força, me empurrando para trás,
mas nunca me pedindo para parar.
Ao mesmo tempo em que ela quer se entregar, parece haver algo
mais forte que a impede. Tenho vontade de rompê-la, mas isso a quebraria e
ela jamais me deixaria tocá-la outra vez.
Olho para ela, procurando qualquer vestígio de rejeição, e enxergo
seus enormes olhos de oceano, profundos e vazios, escondendo o que
percorre em sua mente.
— Quer que eu confie em você, terá que confiar em mim, como
ontem à noite.
Hesitação parece percorrer cada pulso do seu corpo. Seus lábios
abrem moderadamente, mas Sienna não diz uma palavra, ela se inclina na
minha direção e me beija lentamente.
Envolvo-a em meus braços, ela é leve como uma pluma. Com seu
peito colado ao meu, me permiti sentir seu coração bater em um ritmo
frenético. Coloco Sienna sentada no piso do deck, ela se apoia para trás sob
os cotovelos. Quando abro suas pernas com as mãos, Sienna não tenta
fechá-las por mais tensa que esteja, nem mesmo quando tracejo as mãos
sentindo a maciez do interior das suas coxas. Ela segura em um dos meus
pulsos quando me aproximo da sua pequena boceta rosada e parcialmente
depilada.
O fato de ela ser virgem não me excita tanto quanto a vontade que
estou de me enterrar nela, as coisas seriam bem mais fáceis se sua inocência
não complicasse tudo. O meu pau está mais consistente que uma rocha, se
não a foder em breve, minhas bolas vão rebentar.
Me desvencilho dos seus dedos e elevo sua perna até meu ombro,
Sienna é uma excelente bailarina, já a vi dançando através das janelas da
mansão, parece uma pluma voando ao vento, uma flexibilidade apreciável,
poderia ter se tornado profissional se não pertencesse à máfia e agora a
mim.
Acaricio sua perna vagarosamente e desço, beijando-a da altura do
tornozelo até o ápice das suas coxas.
Ela treme quando planto um beijo em sua pele, repito o gesto na
outra coxa, deixando-a arrepiada. Encontro seu olhar congelado por um
segundo e começo a dar pequenas mordidas e chupadas em volta da sua
boceta. Sienna fica com as pernas tensas em meus ombros. Deslizo a mão
pela sua barriga chapada, até alcançar seu mamilo entumecidos, o torço
com os nós dos dedos, e ela abafa um gemido.
— Não se contenha, pêssego — profiro e mergulho minha língua
na sua entrada molhada, pronta para mim. Provo o gosto da sua excitação e
preciso de autocontrole para não baixar a cueca e me enterrar na sua carne
quente e macia. Subo até seu clitóris, dando leves pinceladas em seu nervo
duro. Quero que Sienna se desmanche em minha boca, e veja que isso é só a
ponta do iceberg.
Torço seus mamilos com força quando sugo seu clitóris. Sienna
choraminga, e suas pernas abraçam meu pescoço com força. Não preciso de
muito para perceber que as ondas de prazer já correm pelo seu corpo.
Ainda não, pêssego.
Círculo o seu nervo inchado lentamente com o polegar e escorrego
um dedo na sua boceta, sentindo sua entrada pulsando para mim, sugando o
meu dedo.
— Ohhh, Romeo... — ela geme —, por favor... não. — Suas
palavras contrariam seus atos.
— Não? — pergunto, apertando seu clitóris, ela se contorce com o
ar preso, deslizo outro dedo e sua fenda os aperta como garrotes.
Sienna me encara com seus olhos arregalados, retiro os dedos e
bato duro dentro dela, sentindo sua umidade espalhar pela minha mão. Ela
geme tão alto que leva ondas de calor pelo meu corpo.
— Isso não vai tirar sua virgindade, pode relaxar — informo, e sua
expressão é uma bagunça, me aproximo, cobrindo seu corpo com o meu.
Prendo seu mamilo com os dentes e mamo em seu seio, ainda
batendo duro nela com os dedos, em um ritmo não tão profundo, mas o
suficiente para ela empurrar o quadril contra meus golpes, sussurrando
suaves e profundos oh, Romeo.
Agora pode gozar, pêssego.
Sienna se contorce com força, sua mão cobrindo a minha e
repetimos juntos os movimentos mais lentamente, seus olhos estão abertos,
vislumbrando os meus, ela treme como as asas de uma borboleta em um
vendaval e sucumbe embaixo de mim. Suas unhas se enterram no dorso da
minha mão e, com um grito em êxtase, um fluido quente esguicha da sua
vagina, encharcando todo meu antebraço.
De repente ela fica contida como uma estátua, olhando o meu
braço.
— Ahhh, Deus, eu urinei em você. — Sienna junta as pernas com
força e cobre o rosto com as mãos.
Sua inocência é admirável.
— Hey. — Seguro em seus pulsos, fazendo-a me encarar e sua
expressão é de constrangimento e choque. — Você ejaculou, isso é incrível
pra caralho. — Admito que estou orgulhoso por ela ter se permitido.
— Você está sorrindo — ela afirma, parece surpresa.
— Eu sorrio, pêssego, só para o que me convém.
— Por que me chama assim?
— O seu cheiro, a sua pele e o seu gosto, pêssego, me lembram de
um. — Um sorriso fácil ilumina o seu rosto e repentinamente não sinto
mais vontade de matá-la.
Capítulo 14

Desperto, abraçada nas pernas com uma cólica me partindo ao


meio. Sento-me com as mãos no abdômen e vejo Romeo deixar o closet,
prendendo uma arma no coldre, por baixo do colete.
— Você está bem? — pergunta, enquanto caminho para o banheiro,
sentindo minhas entranhas desejando sair de mim.
— Cólica — aviso e bato a porta do banheiro, tiro minha calcinha
e um fluxo de sangue escorre pela minha coxa.
Maldita menstruação!
Há meses que não menstruo. Assim que passei a me encontrar com
Piero, ele começou a me dar pílulas contraceptivas, a cartela encerrou há
algumas semanas e não vi motivo para voltar a tomá-las, até agora.
Não sei se Romeo me permitiria usar o método, ainda que não
estejamos fazendo o sexo apropriado para engravidar, esse casamento tem
como propósito gerar herdeiros, pelo menos foi isso que papai disse, mas
não confio mais nas palavras dele. E temo confiar nas de Romeo.
Ontem, na jacuzzi, ele me fez sentir à beira do abismo. Ao mesmo
tempo em que tentava afastá-lo, ansiava para que ele ultrapassasse todas as
barreiras e me fodesse com toda a sua força. Estou permitindo que ele faça
coisas que me dava repulsa só de imaginar, estamos dando um passo por
vez, jamais pressupus que Romeo me trataria com cordialidade.
Em termos de máfia, o que me dá nojo é que, quando nos casamos,
eu me tornei dele. Não prometi a minha resignação, mas Carlo o fez por
mim, e Romeo não ter me usurpado me mostrou que ele também abriga um
homem de caráter.
Depois de inserir um coletor menstrual, visto somente um vestido
de manga comprida da cor terracota e uma meia-calça de pelúcia. Quando
chego no andar inferior, está somente Agnes. Não ver a cara da Maeve
parece que reduz 1% da minha cólica.
— Bom dia, senhora — Agnes saúda quando me sento à ilha, e
logo desliza uma xícara de chá de camomila quentinho na minha frente. —
Senhor Ferraro pediu que eu fizesse um chá para sua cólica.
Não consigo disfarçar minha alegria, Romeo se importa.
— Obrigada — digo com um sorriso de orelha a orelha.
— Senhora — a empregada se curva diante do balcão com o
semblante de culpa —, sobre ontem, eu queria me desculpar pela Maeve,
ela...
— Tudo bem, Agnes, Romeo já esclareceu tudo — menciono,
bebericando o chá, ficando um pouco cheia de todos protegerem essa
garota.

O dia sucedeu sem desordem, quando voltei para o meu quarto, vi


Maeve em um dos cômodos com a porta entreaberta, estudando. É uma
pena, podíamos ter sido amigas, mas ela fez as coisas ficarem estranhas, e
não vou tolerar que me faça sentir mal, ou culpada dentro da minha própria
casa.
Pego meu notebook do closet, achei que papai não fosse me
permitir trazê-lo, quando ele casou Fiorella, tirou até o telefone dela. Me
deito na cama com zero vontade de fazer alguma coisa, até pensar parece
exaustivo, acredito que metade desse incômodo seja da garrafa de vinho
que tomei noite passada.
Me aconchego nos travesseiros e coloco para rodar a segunda
temporada de Bridgerton.
Acordo com meu notebook desligado e o barulhinho do chuveiro
ligado. Olho pela claraboia e já está anoitecendo, devo ter apagado depois
do almoço, logo no fim da série.
Me sento, sentindo-me drogada, caminho até o banheiro para lavar
o meu rosto, Romeo está tomando banho com o vidro do box aberto, meus
olhos percorrem a quantidade de cicatrizes que ele tem ao longo das costas,
deixando várias falhas na sua monstruosa tatuagem de caveira.
Acharia horrenda se não o deixasse tão viril.
— Está melhor? — ele pergunta por cima do ombro, enquanto me
aproximo da pia para lavar o rosto.
Balanço a cabeça em negação.
— Não, mas vou ficar em sete dias — esclareço, Romeo se vira
para mim e o vislumbro nu pelo reflexo do espelho pela primeira vez desde
que nos casamos. Viro o rosto, nitidamente corada e horrorizada com o
tamanho do seu comprimento semiduro. Romeo enrola uma toalha na
cintura e deixa o banheiro com passos calmos.
Até que a menstruação veio a calhar, serão sete dias sem tentativa
de sexo, de repente me sinto culpada por esse pensamento. Volto para o
quarto e ele já está usando uma calça de moletom, sem camisa.
— Farei uma viagem na semana que vem — ele diz, fico
encarando-o por um momento, mas, aparentemente, essa é toda a
informação que ele me dará.
— Posso perguntar para onde?
— Não. — Aperto os lábios.
— Tem a ver com Rocco? — O semblante de Romeo se fecha.
— Não — diz firme e soa convincente, o que me leva a pensar que
ele está mentindo. — Vamos deixar uma coisa clara, Sienna, não a quero
envolvida nos meus assuntos de trabalho.
— Ele é meu irmão — contesto.
— Ele é um traidor acima de tudo, e você não devia ter
conhecimento dessa informação. Contou a alguém?
— Ahm, fiz um post no Instagram — escarneço, deixando sua
expressão feroz. — Acha que sou estúpida a esse ponto?
— Acho que devia cuidar como fala comigo.
— Me desculpe — sussurro com minha melhor expressão pesarosa
e deixo Romeo sozinho no quarto, não fico mortificada com suas palavras,
parece ridículo e talvez precoce, mas não tenho mais aquele medo irracional
que sentia por ele.
Jantamos nós três e Piero, por incrível que pareça, não tentou puxar
assunto, ele mal me olhou nos olhos, mas, quando olhou, captei algo
diferente, algo umbroso que fez o meu couro cabeludo eriçar, e então a
ficha caiu, seremos apenas eu e ele na mansão durante a viagem de Romeo.
Meu estômago se contrai e as cólicas me fustigam com força.
Romeo desliza ao meu lado na cama, apenas de cueca boxer preta,
ele desliga a luz do abajur e me dá as costas, indiferente, como das outras
vezes. Fico inquieta, não devia ter pensado naquele bastardo incorrigível
bem na hora de dormir. Meu peito aperta pensando em como sair dessa
situação.
Fale a verdade. — Penso.
Claro, porque a verdade não geraria um caos do caralho —
ironizo.
— Sienna. — A voz de Romeo é de advertência, ele se vira e me
olha pela luz tênue que entra da claraboia.
— Me leva com você — peço sem ponderar, ele avalia o meu rosto
por um momento.
— Sabe que eu não posso. — Sua voz é fria, o oposto da sua mão
que corre pela minha barriga nua. Romeo acaricia meu abdômen
lentamente, fazendo-me relaxar.
— Então me deixe ficar na mansão com papai e Dona.
— Do que tem medo, Sienna?
Piero.
— Ainda não me adaptei aqui, e será solitário sem você — digo
sentimentalista, mas a expressão dele não se altera em nada.
— Mais um motivo para que fique, não deixarei nada de ruim
acontecer com você, pêssego — ele adiciona minimamente suave e me
puxa para o calor do seu corpo.
Me viro para Romeo, quero olhar em seus olhos, mas estou abaixo
do seu queixo, com a garganta dele a centímetros de distância, um cheiro
suave penetra meu olfato, aproximo-me do seu peito e enterro meu nariz na
curva do seu pescoço, inspiro com força, tentando consumi-lo de alguma
forma.
Romeo não se mexe, apenas faz longas carícias em minhas costas
até eu adormecer.

Me sento aos pés da cama, vendo Romeo arrumar uma mala de


mão. A semana avançou muito rápido, e a ansiedade de saber que estarei a
sós com Piero aumentou na mesma intensidade que os olhares discretos
dele durante o jantar.
— Pode me dizer pelo menos quanto tempo vai ficar fora? —
pergunto quando sai do closet com o terceiro terno.
— Pouco — fala, dobrando a peça e enfiando na mala.
— Quando vai confiar em mim? — Romeo fecha a mala e me fita,
assumindo uma postura dura.
— Acredite, eu quero, mas sua necessidade patológica de agradar a
todos não me deixa.
— O quê? Eu não sinto necessidade de agradar a todos! —
exclamo, incrédula.
— Sente, pêssego. — Ele amolece a voz e isso me irrita. — Sua
irmã está casada com o Chefe de outra máfia, vocês se amam e, sem querer,
você pode dizer coisas.
— Então, para ter sua confiança, preciso romper os laços com
minha irmã, é isso?
Romeo inspira e puxa a mala de cima da cama.
— Você não pode me pedir o que não me dá.
Ele se afasta, indo para sua viagem. Ao longo dessa semana,
durante as noites com Romeo, consegui me sentir mais confortável. Sem
condições de ter qualquer contato sexual, não o fez se afastar, ele nem de
longe faz o tipo falante, mas consegui sentir que estava tentando.
Romeo para no batente da porta e se vira.
— Pode visitar sua família, mas quero que durma em casa. —
Assinto.
Me deito para trás na cama, e a sensação de abandono pesa em
meu coração, santa carência. Acho que nunca fiquei sozinha, se papai
viajasse, sempre tinha as meninas ou Dona por perto. Aqui estou
completamente sozinha e só Deus sabe por quanto tempo.
Estou faminta, já se passaram umas quatro horas desde que Romeo
foi para sua viagem e não tive coragem de deixar o quarto. Aguardo
impaciente o relógio de cabeceira marcar sete e meia da noite para descer.
Nesse horário, está apenas Agnes limpando a cozinha para poder ir para
casa.
Sinto meu coração acelerar enquanto caminho com passos largos
até o guarda-corpo da sala de descanso. Espio lá embaixo e a empregada
está terminando a louça da janta e sua filha está sentada à ilha, escrevendo
algo em um caderno.
Desço as escadas, chamando atenção delas.
— Senhora, pensei que fosse descer mais tarde e guardei um prato
no micro-ondas — explica, e sua filha começa a juntar os pertences,
provavelmente para sumir da minha vista.
— Lamento, acabei perdendo a hora — explico.
— Tudo bem, Agnes, Sienna consegue esquentar o próprio prato.
— Meu coração cai no estômago quando me viro e enxergo Piero vir da
sala.
Tenho a impressão de ter visto Maeve revirar os olhos e não tenho
certeza se foi por minha causa.
Me sento na banqueta e o bastardo desliza ao meu lado, ele tem um
sorriso presunçoso quando olha para mim e sua mão pega em minha coxa
de repente, provocando-me um pequeno sobressalto.
— Te aguardo lá fora, mãe — Maeve fala, e seguro na mão dela
com mais força que desejava.
— Fique, por favor. — Piero aperta minha coxa, provocando um
tremor em meu corpo, reforço o sorriso de porcelana que com certeza
garotas como ela odeiam, e vejo seu semblante se tornar um ponto de
interrogação. — Está tarde, podem dormir no quarto de hóspede. — A mão
dele abandona minha coxa e pega a garrafa de cerveja de cima da ilha.
— Ou Ezio pode levá-las — Piero sugere, e não consigo esconder
meu asco por ele.
— Acho que não podemos negar algo para a esposa do chefe. —
Maeve dá de ombros e se senta na banqueta outra vez, o meu coração sobe
de volta ao peito.
Agnes solta a comida em minha frente, o meu estômago deu um
nó, mas como mesmo assim, não quero correr o risco de precisar descer
durante a madrugada.
Piero se retira, deixando apenas as mulheres. Começo a comer em
silêncio, enquanto Maeve volta para seus deveres. Se ela percebeu algo em
meu estado alterado, não deixou transparecer.
Pergunto o quão estranho seria se eu pedisse para Ezio escoltar a
porta do meu quarto. Não vou conseguir me esquivar daquele animal por
muito tempo.
— Nunca estive sozinha — digo, chamando atenção das duas —,
essa casa me assusta um pouco — confesso uma verdade parcial, o que me
assusta são os monstros que habitam nela. — Será que podem ficar até
Romeo voltar?
Elas se entreolham por um breve momento.
— Nós ficamos — Maeve fala. — Mas talvez Piero não goste. —
Ela dá de ombros.
— Ele não manda mais aqui.
— Então alguém precisa avisar a ele. — Maeve soa sarcástica e
sua mãe lhe dá um olhar de reprovação.
Sinto meu coração começar a se acalmar, dou boa-noite às duas e
subo, quem sabe amanhã faça uma visita a Dona, tenho saudade de casa, da
minha paz e da tranquilidade, se bem que, se eu for lá, tenho mais chance
de encontrar Piero pelos corredores. Não sei o que farei se ele quiser me dar
carona de volta para casa.
Céus, estou ficando paranoica.
Dobro o corredor para o meu quarto e meus pés refreiam quando
encontro Piero escorado do lado de fora, seus olhos pretos como nanquim
se enterram em minha alma e me prendem ali como se tivessem mãos
invisíveis me contendo no lugar.
— Não devia estar aqui. — Minha voz soa alarmada.
— Devia relaxar, princesa. — Ele dá um passo em minha direção.
— Não quero te fazer mal, você tem guardado nosso segredo tão bem, mas
gostaria de saber o que falou ao Romeo nas núpcias. Como você o enganou,
princesa?
— Não te devo explicações, Piero, devia ficar grato por ter salvado
o seu rabo. — Ele dá um risinho.
— Não salvou, porque ele ainda não te comeu — entoa parado na
minha frente. Piero não tem como saber disso, tem? A não ser que Romeo
tenha contado a ele, o que acho pouco improvável.
— Vá se tratar, Piero — digo e passo por ele, Piero me empurra em
direção à parede da frente e me prende com seu corpo.
— Não fale comigo como se eu fosse maluco — profere
asperamente, pressionando minha face contra a parede fria.
— Me solte ou vou gritar — aviso, sentindo sua ereção em minha
bunda.
— Grita — sussura em meu ouvido, aliviando o aperto da minha
cabeça. — Eu assisti aos dois na jacuzzi pelas câmeras internas. Tenho o
vídeo aqui se estiver curiosa de como fica quando está excitada. — Devia
ficar envergonhada, mas tudo que sinto é um ódio profundo por ele.
— Piero, me solta, Agnes e Maeve podem subir a qualquer
momento — digo com as lágrimas escorrendo na altura do queixo, e o
desgraçado parece ficar ainda mais excitado.
— Nossa conversa ainda não acabou, princesa. Nós... estamos
longe de acabar. — Ele planta um beijo em minha têmpora e se afasta,
deixando-me aos pedaços contra a parede. Minhas pernas viraram gelatinas,
preciso de um segundo para me recompor e reorganizar os pensamentos.
Preciso me livrar de Piero.
Capítulo 15

Passei a noite em claro, olhando para a porta trancada,


perguntando-me se Piero conseguiria passar por ela durante a madrugada. O
que me deu tempo para pensar em como poderia me livrar dele. Matá-lo
levará minha alma direto para o inferno, mas o que Piero faz comigo, o jeito
que ele me trata, me faz pensar que já estou nele. Nunca desejei tanto a
morte de alguém como a dele.
Ontem à noite foi só o resquício do que ele pretende fazer comigo
antes que Romeo volte de viagem. Contar ao meu marido seria a melhor
saída, mas deduzo que ele ficará furioso e violento comigo por ter transado
com seu irmão e agido normalmente bem embaixo do nariz de todos por
todo esse tempo.
A campainha toca, tirando-me de um completo devaneio, sigo
Agnes até a porta, não tive coragem de deixar a mansão, mas estava me
sentindo deprimida, então pedi que Dona viesse me visitar. Romeo terá que
deixar de ser paranoico e me dar acesso a essa porta quando voltar de
viagem.
Minha madrasta entra usando um vestido claro com um pesado
sobretudo preto por cima, ela está tão boquiaberta quanto eu fiquei quando
cheguei aqui.
— Cadê Dario e Mady? — pergunto por meus irmãos, recebendo
um abraço dela.
— Com as babás. Achei melhor deixá-los para que pudéssemos
conversar sem interrupção.
— Muita gentileza, Dona. — Ela dá um sorriso e se vira,
vislumbrando o espaço.
— É meio fúnebre, mas bem elegante.
— A cara do Romeo — digo, e Dona sorri.
Peço a Agnes que nos traga um chá na sala principal, e guio Dona
até as poltronas próximo às paredes de vidro.
—Vocês estão bem? Parecia tensa no telefone — diz, se sentando e
cruzando os tornozelos modestamente.
— Estamos, ele não é o mal encarnado, como pensei que fosse.
— Isso é maravilhoso, Sienna. — Ela aperta meu joelho. — Seu
pai sente sua falta.
— Duvido. — Não disfarço meu desgosto.
— Já o vi parado em frente ao seu quarto duas vezes.
— Deve estar pensando em transformar em outro cômodo —
deduzo, e Dona faz cara feia.
Seguro na mão dela, de repente ganhando sua atenção.
— Será que você consegue descobrir com papai quando Romeo
volta de viagem. Eu queria fazer um jantar para recebê-lo, mas ele não quis
me contar a data da volta. — Aperto os lábios, mostrando decepção.
— Homens — expressa, revirando os olhos, ela tira o telefone da
bolsa enquanto diz: — Se você for cozinhar, cuide para não usar castanha,
ou avise Piero, ele é alérgico.
— Claro. — Dona coloca o telefone na orelha, possivelmente
ligando para papai e, ao mesmo tempo, puxa uma espécie de pasta grossa
prata com ornamentos dourados dentro da bolsa.
— É o que estou pensando? — Ela assente animada e me estende,
o álbum de foto do meu casamento.
— Querido. — Dona se afasta falando ao telefone, ela conversa
com ele sorrindo, deve o amar muito.
Abro o álbum na hora em que Agnes nos traz as xícaras de chá,
convido-a para olhar o álbum comigo, a empregada aceita timidamente e se
senta na pontinha do sofá ao meu lado.
— Ele volta amanhã à noite, e Carlo mandou um beijo. — Sinto
um grande alívio, só mais essa noite, eu consigo conter Piero.
A manhã passou rapidamente, Dona almoçou conosco e, quando
chegou a hora de ir embora, queria me agarrar no pescoço dela para que
ficasse mais um pouco.

Aproveitei a tarde para dormir o que não consegui durante a noite.


Depois de algumas horas, acordo com um solavanco de porta batendo, e o
meu coração vai para no pé. Ainda está claro, Piero não deve ter voltado à
mansão. Pego um robe de seda, preto, e entro no banho.
Perguntei a Dona a respeito do jantar sem intenção de realizá-lo.
Romeo partiu sem se despedir, embora já tivéssemos alguns momentos
íntimos, ele ainda não me trata como sua esposa. Será que é por que nunca
transamos ou por que minha necessidade patológica de agradar todo mundo
o incomoda? Aff. Se estava cogitando fazê-lo, acabei de perder a vontade.
Deixo o banheiro usando a camisola de seda, com a expectativa de
conseguir fazer algo no andar superior antes que Piero chegue, mas o boçal
já chegou e está sentado muito confortável no recamier aos pés da minha
cama.
Travo os pés e a tensão toma conta do meu elemento, Piero
percebe isso e um sorriso provocativo dança nos lábios dele.
— Não me olhe como se eu fosse o lobo mau, princesa — ele usa
uma voz suave, que eu conheço muito bem, só não compreendo por que
está sendo gentil —, quando você quem é a vilã — adiciona perigosamente
e estende na palma da sua mão o frasco do ‘Boa Noite, Cinderela’.
Travo o maxilar para meu queixo não cair, esse verme maldito do
caralho está mexendo escrupulosamente com minha saúde mental.
Estou fodida.
— Não vai dizer nada? — pergunta, ficando em pé, odeio como
sua postura e altura me fazem sentir pequena.
— Para quê? Não devo explicações a você. — Dou de ombros e
isso parece incomodá-lo. — Vou guardar a encenação paro o Romeo. — Ele
bufa uma risada pelas narinas.
— Você se acha bem espertinha, não é? — comenta, analisando o
frasco à minha frente. — Sabe o que aconteceria se isso parasse nas mãos
do meu irmão?
Dou de ombros novamente, balançando a cabeça em negação, não
tenho ideia do que Romeo faria comigo, ali tem uma dose exata para matar
um homem do tamanho dele, mas eu não a usei, nunca quis matá-lo, eu sou
tão covarde que nem tive coragem de drogá-lo.
— A conversa discreta e nada sutil que você teve com Franco
colocou coisas na cabeça de Romeo, ele acha que estão tramando. E, pelo
que parece, não estava errado.
— Você não sabe do que está falando. — Piero enruga os lábios.
— Eu jamais machucaria Romeo — sussurro e recebo um olhar eviscerado
dele, parece que disse tudo que ele menos queria escutar.
— Ele mal a tocou e já está de quatro como uma cadela — cospe
as palavras com furor. — Quero ver até onde vai esse apreço por ele no
momento em que a proibir de ver e até conversar com suas irmãs em Nova
Iorque ou quando seu pai iniciar uma guerra contra a Famiglia, que, com
certeza, levará à morte de muitos homens. Ainda acha que ele será cordial
com você?
— Se eu cair, você cai comigo. Romeo vai saber que transamos e
que eu ia usar isso apenas para escapar das núpcias — falo rápido demais,
sentindo minhas lágrimas queimarem em meus olhos para serem
derramadas.
— Princesa, tudo indica que você está conspirando com o inimigo.
Suas palavras valerão menos que lama de porco e, como serei eu a entregar
isso ao meu caro irmão, óbvio que você tentará deixá-lo contra mim com
mentiras e mais mentiras absurdas.
Suas palavras me sufocam, fazendo a bile subir a garganta. Deus, o
que eu fiz para merecer isso? Meu coração dói tanto que a sensação é que o
medo está quebrando os ossos do meu peito ao meio, fazendo-me quase
hiperventilar.
Não tem como viver depois disso, papai não terá misericórdia, e
muito menos aceitará uma traidora de volta. Deixará Romeo decidir o meu
castigo... eu prefiro suicídio a parar nas mãos dele.
As lágrimas escorrem na altura do queixo, fazendo-o parecer um
borrão escuro.
— Relaxa, princesa, não precisamos revelar o seu segredinho —
diz, segurando o meu queixo quase que com delicadeza, me esquivo do seu
toque, enojada.
— O que você quer de mim, Piero? — sussurro com minhas cordas
vocais emaranhadas e percebo que tremo sob seu olhar profundo.
— Terminar o que começamos naquele quarto de hotel.
Balanço a cabeça em negação, uma lágrima escapa, mas a limpo
rapidamente, suportando a frustração crescente que me domina. Eu não
posso fazer isso com Romeo... comigo...
— Piero... — seu nome soa uma súplica —, por favor, não me
obrigue a isso — peço com os músculos dos meus ombros se emaranhando
pela pesada tensão.
— Não estou com uma arma apontada para sua cabeça. — Ele
ergue as mãos para o ar. — Faça o que achar melhor, mas, se eu fosse você,
aproveitaria o último dia de princesa e me despediria das meninas, já que
será a última vez que irão conversar.
— Ele é o seu irmão...
— Não apele para isso, não vai funcionar.
Meus dentes quase se partem com a força que aperto minha
mandíbula. Estúpida! Como não vi todo aquele tempo que Piero era um
monstro dissimulado disfarçado de príncipe?
— Então? Agnes não ficará para sempre no mercado. —
Desgraçado, ele ainda teve a petulância de se livrar da empregada, por isso
deixou a porta escancarada, sem medo.
— Eu não quero isso, então nem por um segundo pense que estou
fazendo por vontade própria — profiro com raiva, sentindo o sangue
queimando inflar na minha cabeça.
— Pense nos velhos tempos — Ele enrola uma mecha do meu
cabelo em seu dedo —, quando me implorou para ficar no seu quarto,
lembra? — pergunta, sua voz está tênue.
Seus dedos dedilham pelo meu pescoço até a altura dos ombros,
Piero me olha cheio de luxúria, e me empurra para baixo com tanta força
que meus joelhos cedem e colidem contra o piso escuro, provocando-me
picos de dor.
Ele desce o zíper da calça e me olha com uma sobrancelha
arqueada.
— Se anime, princesa, sinto falta da sua boquinha no meu pau.
Faça-me lembrar dos velhos tempos — incita, liberando seu comprimento
da cueca.
O pânico se acumula em meu estômago, enquanto minhas mãos
sangram pelas unhas enterradas na palma. Isso não pode estar acontecendo.
— Piero... — suplico com lágrimas incessantes escorrendo pela
minha face.
— Quer mais um incentivo, princesa? — pergunta gentilmente,
deslizando a mão para dentro do paletó, ele saca sua arma e minha cabeça
cai para frente, com o peso da indecisão. Será que não é melhor levar um
tiro do que ter que passar por isso? Ou enfrentar a fúria de Romeo e Carlo?
Penso nas meninas e soluço baixinho.
Minhas mãos tremem como papel quando pego no seu
comprimento e o levo até a boca, o gosto do pré-gozo faz a bile me subir à
garganta, travo o maxilar com força, completamente enjoada, e Piero uiva,
sentindo os meus dentes.
Os dedos dele se fecham em torno dos cabelos da minha nuca e,
quando os puxa para trás, provoca dolorosas pontadas no meu couro
cabeludo, fazendo-me gemer pela sensação lancinante.
— Sem dentes. — O aperto de Piero fica ainda mais intenso
quando começa a empurrar o quadril contra minha boca. Ele geme gutural,
e sinto vontade de furar os tímpanos, acredito que esse som ficará para
sempre em minha mente.
— Eu quero mais fundo, princesa, e você mal está arranhando a
superfície. — Piero desliza inteiramente, batendo no fundo da minha
garganta, sufocando-me. Minha impotência me leva à fúria escaldante,
deixam-me com os sentidos distorcidos.
Isso é demais para mim.
Não dá.
Eu prefiro a morte.
Empurro Piero com força, e o bastardo não se afasta um centímetro
do lugar, a minha aflição o deixa ainda mais grosso em minha boca, ele
força meu rosto para cima e o ar me foge dos pulmões como se tivesse sido
sugado a vácuo, pontos pretos balançam em frente à minha visão e de
repente um estouro no andar inferior o faz se afastar.
Sem forças, eu caio para trás e nem vejo Piero deixar o quarto às
pressas. Me encolho no chão, a necessidade de ficar contida em uma bolha
imaginária é maior que urgência que devia sentir em fechar a porta do
quarto.
Levo uma mão ao peito, sentindo o coração bater em um ritmo
desconhecido. Ofego, limpando as lágrimas e a saliva do contorno do meu
queixo, o cheiro dele invade meu olfato e tenho que sair correndo para não
vomitar no chão.
Alivio o meu estômago, mas a tremedeira permanece firme em
meu corpo. Me encaro no espelho enquanto escovo os dentes, e noto
minhas órbitas vermelhas e profundas. Enxergo a vergonha e a derrota em
cada polegada da minha face, viro-me de costas e me escoro contra a pia,
destruída por dentro, meu peito dói apertado, e não tenho certeza se esse
abalo algum dia irá passar.
Deslizo o polegar por meu braço, o impulso que devia resistir é o
bálsamo do qual preciso agora. As lágrimas contornam minhas pálpebras na
hora em que meus dentes moem a pele macia do meu braço.
Um gemido passa por meus lábios, me viro com o peito acelerado
e, pelo reflexo do espelho, encontro o olhar de Maeve na porta.
— O que faz aqui? — pergunto soando ríspida e puxo um papel
higiênico para cobrir o meu braço.
— Sienna... eu... — Me viro para ela, seus lábios estão abertos e
seus olhos em meu braço coberto pelo papel higiênico.
— Maeve — chamo em tom de advertência, e seus olhos
encontram os meus —, o que você quer? — vocifero, e pavor atravessa o
rosto dela.
— Eu vi vocês... — fala hesitante.
O estresse ao extremo nem me faz abalar com suas palavras, estou
mortificada, nada que ela diga poderá me desestabilizar mais do que
aconteceu comigo minutos atrás.
— Não sei o que você viu, mas tudo que disser ao Romeo eu vou
negar. — Deixo o banheiro ligada no automático, com a sensação de
sufocamento outra vez, e sinto a presença dela às minhas costas.
— Ele já fez isso comigo, por isso provoquei o barulho lá embaixo.
— Paraliso no lugar com um aperto no peito, sem saber se devo acreditar
em suas palavras. Viro-me e encontro seus olhos âmbares cobertos por uma
fina camada de lágrima.
— Por que não contou ao Romeo? — pergunto em dúvida.
— É complicado. — Ri amargurada.
— É — adiciono e me sento na cama, percebendo minhas pernas
fracas e trêmulas.
— Noite passada, quando nos pediu que ficássemos na mansão,
percebi sua aflição. Você tem que contar ao Romeo.
— Não, Maeve, não posso. — A decepção é visível na face da
garota. — Obrigada por fazê-lo parar — digo, sentindo minhas vistas se
encherem de lágrimas apenas ao lembrar, amparo minha face com as mãos e
de repente sinto a presença dela ao meu lado, sua mão desliza pela minha
coluna, me reconfortando.
Não sei até que ponto devo confiar nela, mas estou tão fragilizada
que nossa intriga da semana passada parece muito pequena comparada ao
que estou sentindo agora.
— Piero pegou de mim algo que causaria um caos do caralho entre
duas famílias — a garota estreita os olhos —, não posso fazer nada se não
tiver alguma coisa para me proteger de Romeo, será a minha palavra contra
a do irmão, e ele não confia em mim.
— Sua palavra devia bastar, é a filha do poderoso chefão. — Ela
usa uma ênfase forçada, e percebo que é para me fazer sorrir.
— Sou mulher, minhas palavras não valem nada nesse mundo. —
Me deito para trás e encaro o crepúsculo pelo teto de vidro. Maeve se
afasta, deixando-me sozinha com os meus piores pensamentos, Piero.
— Tem uma sala secreta embaixo do pergolado. — Ouço, ergo a
cabeça e ela permanece em frente à porta fechada. — De curiosidade, eu
desci lá uma vez, é uma sala branca, com uma parede repleta de gavetas e a
coisa mais anormal que vi é um ralo bem ao centro e muita corrente dentro
de uma caixa.
O meu estômago dá um nó imaginando o que Romeo fazia lá.
— Enfim, Piero soube que estive lá embaixo e usou isso contra
mim.
— Desgraçado. Agnes sabe?
Ela balança a cabeça negativamente.
— Como o fez parar?
— Nos filmei e depois o ameacei.
— Não entendo, Maeve, você tem liberdade e escolhe ficar nesse
lugar horrível. — Ela se senta ao meu lado e empurra uma pequena mecha
do cabelo para trás da orelha.
— Liberdade, sim, condições, não. Piero é horrível, mas viver lá
fora é pior.
— Não consigo imaginar. — Ela sorri.
— Teve uma inundação com a tempestade que rolou alguns meses.
Romeo pediu que minha mãe limpasse, ele confia nela, e ela em mim, então
me contou que metade das gavetas estão danificadas e logo ele terá que
trocar.
— O que acha que tem lá dentro?
— Arquivos confidenciais com toda a certeza.
Me deito para trás com o peito acelerado, processando toda a
informação que caiu de mão beijada em meu colo. Como confiar nela sem
saber que não vou me foder outra vez?
— Eu fui uma babaca com você, me desculpe — Maeve sussurra,
ela me olha por cima do ombro, com uma expressão tão ferrada quanto a
minha.
— É, você foi — respondo, ela força um sorriso e se deita para trás
ao meu lado em silêncio.
Capítulo 16

— Aceita um chá, senhora? — Agnes pergunta quando me sento à


ilha.
Assinto, dando um longo bocejo, tive outra madrugada miserável,
mesmo que Piero não tenha voltado para casa noite passada, pregar os olhos
foi uma tarefa quase impossível.
Maeve e eu ficamos conversando o resto da tarde, seus olhos
pararam no hematoma em meu braço vezes demais, e ainda assim não me
fez pergunta alguma. Sua mãe nos levou o jantar no quarto, ela disfarçou
bem a surpresa de nos ver juntas e, na hora de adormecer, não tive coragem
de pedir que ficasse comigo, essa é a minha realidade e terei que aprender a
lidar com ela.
Pelo menos até encontrar uma forma de me livrar daquele bastardo,
sem parecer culpada.
Maeve se senta do meu lado com uma bolsa pesada, carregada de
livros.
— E aí, conseguiu dormir? — pergunta baixinho.
— Um pouco — digo e puxo um cookie do prato à nossa frente.
— Romeo volta hoje, estará segura até o fim da noite.
— Você não tem medo dele?
— Do Romeo? — ela pergunta como se eu estivesse me referindo
ao Ursinho Pooh.
Balanço a cabeça e pego a xícara que Agnes solta à minha frente.
— Não — responde, pegando um cookie. — Eu o conheço desde
pequena, achava ele durão e queria me parecer com ele. — Ela ri. — Uma
menina de 15 anos querendo se parecer com um homem que tem a estrutura
corpórea de The Rock.
— Que puta exagero.
— Olha só, a Barbie fala palavrão — ela zomba, fazendo-me
franzir o cenho, — Desculpa, é como os irmãos Ferraro se referiam a você
antes de vir morar aqui.
— É, até que faz sentido. — Maeve comprime os lábios e assente.
— Romeo... ele disse algo interessante de mim?
— Sabe que ele não faz o feitio de elogiar e jogar conversa fora. —
Torço o nariz.
— Estou casada com o Gru — desdenho.
— Ah, ele não é tão mal assim — diz, ficando em pé e puxando a
mochila da ilha. — Até mais tarde, Barbie.
— Até, Mavis. — Ela solta uma gargalhada atrás de mim, pegando
a referência.
É bom e péssimo quase na mesma proporção ter alguém para
conversar que me compreenda. Tomo o resto do meu chá em silêncio e
volto para o meu quarto, trancando a porta. Olho para a extensão e as
lembranças de ontem invadem minha mente como um filme, balanço a
cabeça na tentativa de afastar as memórias, antes que elas devorem a minha
sanidade por completo.
Romeo disse que Piero ficaria alguns dias conosco, já se passaram
quase duas semanas, quero acreditar que está chegando na hora daquele
verme partir.
Ando até a parede de vidro e avisto o pergolado vazio, a ansiedade
para descer lá toma conta do meu corpo. Não tenho certeza do que vou
encontrar, mas se existe alguma coisa que deixa Romeo ou Piero com o
rabo preso, talvez esteja lá.
Espero a tarde chegar, enfio o meu telefone no bolso da calça e
desço depois que Maeve deixa a mansão para faculdade. Ela foi muito
atenciosa ontem à noite, mas ainda tenho minhas dúvidas sobre sua índole.
Peço para Agnes abrir a porta. Ezio me avista, ele fuma um cigarro
escorado contra uma BMW preta, que berra a dinheiro de crime, e anda até
ao meu lado.
— Estou indo relaxar na jacuzzi, seria bom um pouco de
privacidade. — Ele solta o ar lentamente e se afasta, mas sinto seus olhos
em minhas costas o tempo que levo para atravessar o pátio.
Entro no pergolado e tranco as pesadas portas de vidro escuras,
ligo a jacuzzi, mesmo que eu não tenha intenção de usá-la, só o barulho
manterá Ezio afastado do lado de fora.
Percorro os olhos pelo interior, o cômodo é espaçoso com a jacuzzi
de um lado, cercada pelo deque de madeira rústica e, na outra extremidade,
um sofisticado bar, com sofás e poltronas ao redor. Não consigo imaginar
Romeo de boa nesse ambiente, ele não faz o tipo que relaxa. Relembro do
nosso momento aqui e de repente percebo que talvez não seja para os fins
que estou imaginando, torço o nariz.
Caminho até a parede de bebidas, Maeve disse que a sala branca é
atrás dela, descendo uma escada. Meu coração acelera como as asas de um
beija-flor quando seguro na extremidade da madeira e arrasto para o lado
com toda a minha força, revelando uma passagem. Isso até que foi fácil
demais. Meu estômago dói enquanto analiso a escuridão lá de baixo. E se
tiver alguém preso lá? Pensar nisso faz meu couro cabeludo eriçar.
Acendo a lanterna do telefone, clareando uma escada reta. Deus me
proteja. Desço, ignorando qualquer senso de prudência que há em mim, está
escuro pra caramba e tem um cheiro forte de mofo.
Desço o último degrau e, na hora que meus pés tocam no piso, uma
luz branca acende me cegando, levo segundos para me acostumar com a
claridade e, quando percebo que não há janelas ou saídas além da entrada,
começo a me sentir sufocada.
Inspiro e expiro, guardando o telefone no bolso da calça. O
compartimento é um pouco menor que o pergolado e parece uma sala de
arquivamento pela quantidade de gavetas vermelhas anexadas na parede ao
lado de uma mesa de escritório, meio capenga, dado a sua aparência. Me
aproximo das gavetas, percebendo que todas são numeradas e que a
ferrugem está tomando conta de algumas. Olho para os cadeados, e algo me
diz que é impossível abri-los, não acredito que só perdi o meu tempo vindo
aqui.
Me aproximo da mesa de madeira escura e puxo uma gaveta, seria
pedir muito ter chaves? Questiono-me e dou um pulo para longe quando
uma barata sai de lá dentro. Levo a mão ao peito, sentindo o meu coração
quase bater no chão.
Maldição! Se eu não estivesse fazendo coisa errada, não estaria tão
assustada. Faz menos de cinco minutos que desci e a sensação é que ficarei
presa aqui para sempre.
Assim que meu coração acalma, puxo rapidamente uma folha
amarelada solta dentro da gaveta. É uma lista de nomes escrita à mão, a
tinta preta já está desaparecendo, mostrando o quanto é antiga, e cada nome
corresponde a um número do lado.
Totalmente inútil e ultrapassado.
Leio os primeiros: Leonardo Bianchi, Mattia Grego, Irving Jones...
meus olhos correm rapidamente para o fim da lista, não reconhecendo
nenhum nome, até que vejo o do meu cunhado.
Uma emoção estranha serpenteia através de mim, ando até a gaveta
número doze e analiso preocupada e curiosa com o que vou encontrar lá.
Preciso de algo para arrebentar o cadeado, ele está corroído pela ferrugem,
mas parece difícil quebrá-lo.
Com o frenesi tomando conta, olho em volta e encontro a caixa
com correntes que Maeve disse que viu. Ignoro o cheiro pútrido que emana
delas e puxo uma grossa, a enrolando em minha mão.
Deus, isso tem que servir de alguma coisa. Sinto que estou
ultrapassando a loucura de Fiorella e Helena juntas.
Caminho até a gaveta doze e, sem cogitar, desço com força a mão
acorrentada, o cadeado se quebra só depois da sexta tentativa. Se não tiver
nada útil dentro dessa gaveta, quando Romeo descer aqui, vai perceber que
andei fuxicando assim que assistir às câmeras de segurança. E não terei
nada para justificar, além do que estou tentando esconder.
Sinto que minha vida é uma bola de neve e cada dia que passa ela
fica maior. Primeiramente precisava encontrar algo para conter Romeo
quando souber que perdi a virgindade. Agora, mais do que nunca, preciso
encontrar algo, caso Piero resolva foder de vez minha vida, entregando
aquele caralho de ‘Boa Noite, Cinderela’ a ele.
Tudo que eu queria era a porcaria de uma família e a sensação é de
que estou me afastando cada vez mais de conseguir isso. Se Piero morrer,
metade dos meus problemas acaba, a perda da virgindade se tornou pequena
comparada ao que ele tem, caso queira me destruir agora.
Pego o envelope pardo e me escoro contra a mesa enquanto rompo
o lacre dourado. Puxo de dentro algumas fotos, percebendo uma repentina
tremedeira nas mãos quando vejo conteúdo delas.
Santa Mãe de Deus.
Isso é ruim, muito, muito ruim, reflito e o meu peito apertado
concorda comigo.
Solto as fotos uma ao lado da outra em cima da mesa, em todas
elas Franco Fiore está amordaçado e amarrado, com as pernas e os braços
esticados por correntes, sua visão está coberta na maioria das imagens,
exceto nas quais seus olhos estão tão inchados que nem se ele quisesse
conseguiria enxergar.
Meu Deus.
Se a paz existe há mais de uma década, por que a Outfit faria algo
assim com Franco?
Pego uma das fotos, e o pavor afunda em meu estômago como
chumbo. É difícil acreditar que estou casada com um homem que provocou
todas essas atrocidades em outro ser humano.
As costas de Franco são uma visão do inferno. O inferno que
Romeo o apresentou, com toda a certeza. Há tantos cortes, rasos e
profundos, sempre seguindo uma direção, formando asas.
Como Romeo tem estômago para fazer isso em uma pessoa e ainda
conseguir dormir à noite?
Meu círculo íntimo é de monstros e predadores. É impossível ter
um psicológico bom vivendo no meio de tanta tirania e mentira. Piero disse
que Romeo foi o seu criador, e estou começando a acreditar nele.
Ambos são horríveis e cruéis, a diferença é que Romeo ainda não
me apresentou o seu lado sombrio, e temo conhecê-lo em breve.
Com os dedos trêmulos, ligo a câmera do telefone e tiro fotos das
imagens, depois envio para a nuvem, caso as apague sem querer.
Volto para o pergolado, desligo a jacuzzi e me sento em um dos
sofás, respirando ar puro. Eu encontrei meu potinho de ouro, mas a
satisfação que eu pensei que sentiria não veio, saber que Romeo causou
tanta dor não somente em Franco, mas em diversas outras pessoas me faz
começar a pensar que talvez não devesse querer uma família com ele.
Quando vou abrir a imagem de Franco para me torturar mais um
pouco, o telefone toca com uma chama da Fiorella. Meu coração se
espreme do tamanho de uma ervilha, se ela estivesse no meu lugar, ela me
contaria?
Provavelmente não, pensaria que não sou capaz de lidar com a
situação. E sou? Porque estou começando a surtar.
Atendo a chamada.
— Bom saber que está viva. — Sua voz carrega sarcasmo.
— Também sinto sua falta — digo.
— Como estão as coisas?
Péssimas, de mal a pior, me sinto em um filme de terror.
— Bem. E vocês?
— Desde quando virou mentirosa? — pergunta, ríspida. —
Conversei com a Dona, ela disse que Romeo está viajando e, pelo caráter
de merda do seu cunhado, deduzo que ele tenha tentado alguma coisa.
— Uau, devia jogar na Mega Millions.
— Estou preocupada com você, Sienna.
— Eu sei. Me desculpe — digo e meus olhos se enchem de água,
não quero chorar, mas não consigo evitar sempre que penso no que ele fez
comigo. — Eu quero matá-lo — sussurro com minhas cordas vocais em
chamas.
— O que ele fez?
— Nada... — engulo em seco —, nada que eu já não tenha feito
antes.
— Desgraçado. Isso não devia estar acontecendo, Si — responde,
ela suspira alto. — Dê o ‘Boa Noite, Cinderela’ ao Piero — ela sussurra.
Seria uma ótima ideia se aquele verme dos infernos não tivesse me
roubado, mas não direi isso a Ella, só a deixará mais preocupada e acabaria
envolvendo Franco, daí o caos seria iminente.
— É uma ótima ideia — falo, pensando que tem outra coisa que
posso usar para quebrar Piero.
De repente a esperança floresce em mim novamente. Fico sentada
mais um momento no pergolado, imaginando o quanto de castanha ele teria
que ingerir para ter uma anafilaxia.
Volto à mansão com pensamentos positivos, pela primeira vez
desde que cheguei nessa casa. Ando com passos largos até o andar superior
e, quando entro no meu closet para pegar o notebook, vejo as malas de
Romeo no chão.
Oh, Deus, ele já voltou.
Volto para o quarto e meu marido está em pé, diante da entrada,
escorado contra o batente, ocupando quase toda a passagem, com uma
expressão inescrutável, mas seus olhos escuros profundos me encaram
impiedosos. Romeo está apenas com a camisa social branca um pouco
desabotoada e segura um copo de uísque quase vazio, indicando que ele já
chegou há algum tempo.
E lá se vai a minha esperança.
— Romeo. — Seu nome sai num sopro, provocando algum efeito
no homem, que anda em minha direção com passos largos, e solta o copo no
caminho quando chega na minha frente, eu dou um passo atrás, batendo
contra a parede.
Romeo pega em meus pulsos e os prende ao lado da minha cabeça
quase com força. Ele se aproxima e seu corpo parece uma parede de
músculo me prensando, minha respiração sai em um assobio lento.
— Eu sei o que estava fazendo lá embaixo — profere numa voz
desconhecida, e seus olhos repletos de emoções cruas penetram os meus
com tamanha intensidade. — E mesmo que o monstro em mim queira muito
te dar uma lição para deixar de ser enxerida antes que perca a ponta dos
dedos, o desejo de me saciar é ainda maior. — Sua voz é de pura luxúria e
seu comprimento roça meu estômago, deixando-me estritamente enjoada.
— Me solta! — exijo, tentando me livrar dos seus dedos, que me
prendem como algemas sólidas. Romeo me encara e, na sua expressão
fúnebre, capto um brilho de diversão, as lágrimas irritantes se acumulam em
meus olhos, desacreditada que isso esteja acontecendo outra vez.
— Romeo, por favor — peço, com o meu sistema quase desistindo
de mim, mas nada que eu diga parece ter qualquer domínio sobre ele. Baixo
a cabeça quando as lágrimas escorrem.
Uma vez monstro, sempre monstro.
O peito dele, sólido como uma rocha, ampara a minha testa. Sinto
o perfume do seu corpo, o cheiro que me passou conforto e proteção poucos
dias atrás agora me aterroriza. Romeo larga meus pulsos, mas suas mãos
permanecem na parede.
Respiro fundo, ficar presa entre ele e a parede não é uma opção, só
que a sensação é de que qualquer movimento que eu faça provocará uma
reação nele, e não tenho certeza se será boa.
— Tenho sido muito paciente, pêssego, mas suas atitudes me
fazem pensar que está conspirando contra mim desde que chegou nessa
casa.
— Não estou — digo, sentindo as lágrimas escorrerem pelo meu
pescoço.
— Encontrou o que procurava no subsolo? — pergunta com a voz
firme, segurando na curva do meu queixo, me forçando a encará-lo.
— Vi o que fez com Franco Fiore. — Tomo coragem e coloco para
fora antes que me engasgue com as palavras e acabe morrendo com elas. O
aperto de Romeo se torna mais forte, enquanto seus olhos me quebram em
pedaços.
— Quer saber por que nos casamos? — pergunta retoricamente e
de repente se afasta, sinto que um peso saiu de cima de mim.
Romeo fica de costas, removendo sua camisa branca e jogando-a
na cama, com um fragmento de indignação.
— Em abril, Ettore veio visitar Carlo, para garantir que a Outfit
começasse ajudar na captura de Rocco, caso contrário, a aliança seria
desfeita e, consequentemente, os Subchefes saberiam que seu pai
encobertou um agente da DEA nos últimos anos.
— Não compreendo.
— É claro que não — diz e soa como um insulto.
— Se os subs souberem que Carlo escondeu a existência de Rocco
todo esse tempo, questionarão sua lealdade e competência. Seria um prato
cheio para uma sublevação.
— Eles nos matariam?
— Começando por Carlo, mas eu não deixaria nada acontecer com
você, Dona e as crianças, foi essa a promessa que fiz ao seu pai.
— Por que ele não me disse nada?
— Não queria sobrecarregá-la com o fardo dele.
— E mesmo assim o fez.
Romeo me olha como se eu fosse uma peça quebrada que não se
encaixa por aqui. E ele está certo, não quero e não faço questão de me
encaixar nessas teias de mentiras que eles se enfiam, e nós, mulheres, temos
que tirá-las de alguma forma.
— Os fatos são esses, você gostando ou não. Sei que ainda não
aceita esse casamento, mas, se contar ao Franco sobre as fotos, não matará
somente a mim.
— Não quero a sua morte, Romeo — sussurro e nem sei se
acredito no que estou dizendo, ou sentindo, estou tão confusa. — Por que
fez aquilo com Franco? Você nem era mais executor.
— Conflitos. Depois que Rocco supostamente morreu, Riccardo
quis casar Ettore com você. — Não disfarço minha surpresa.
Se tivéssemos nos casado, não teria metade dos problemas que
tenho agora, visto que o Consigliere passou as primeiras semanas do
casamento fugindo da Helena.
— Como deve ter notado, o seu pai não aceitou, ele queria que o
casamento fosse realizado com um herdeiro. E um informante nos contou
que Riccardo estava em dúvidas se devia seguir com a aliança. Carlo pediu
que eu o pegasse porque sabia que não haveria margem de erro, até agora
— adiciona mordaz.
— Não direi nada a ninguém.
Como eu poderia? Sem colocar em risco a vida de Dario, Mady ou
Dona. Eu amo papai apesar de tudo, mas, se acontecer algo com ele, só
colherá o que plantou.
— Já faz meses que Rocco fugiu, acredita que ainda podem
encontrá-lo?
— Fim de papo, Sienna — diz asperamente.

As coisas entre mim e Romeo não poderiam ter ficado mais


estranhas, assim que terminamos nossa pequena discussão, pois parece que
esse é o nosso único meio de comunicação, ele vestiu as roupas e deixou a
mansão sem me dizer nada. Talvez tenha conseguido o que tanto queria
desde o começo, afastá-lo de vez.
— Hey. — Ergo minha cabeça, vendo Maeve em pé, na porta do
quarto.
— Entre. — Ela caminha em silêncio com uma expressão neutra.
— Achou alguma coisa? — pergunta sem fazer questão de
esconder a curiosidade.
Achei a caixa de Pandora do meu marido.
Maeve foi sincera e a parte de me foder, isso eu fiz por conta
própria, acho que, no fim das contas, posso começar a confiar nela.
— Como sabe que eu fui lá? — A garota me dá um olhar óbvio. —
Não encontrei nadinha — minto descaradamente, — Mas lembrei de uma
coisa que pode aniquilar Piero. — O sorriso dela se ilumina como um farol.
— Preciso que compre um quilo de castanha, vamos preparar um jantar.
Capítulo 17

Entro em um dos clubes da Outfit. Ando reto em um tapete


vermelho, ignorando o som alto das conversas e os olhares que me
acompanham até o bar. Sento-me em uma banqueta, com minha cabeça a
ponto de explodir, e peço ao barman uma garrafa de Jack Daniels.
Passei as duas noites fora pressentindo que Sienna faria alguma
besteira, só espero ter enfiado juízo o suficiente na cabeça dela para não
contar a Fiorella. E eu, supondo que ela me daria tédio, sinto falta do
sossego da minha casa.
Viro o shot de uísque e completo novamente.
Além do Franco, precisei pegar outros soldados da Famiglia e dar
o mesmo tratamento, para que não parecesse um caso isolado. Riccardo
Fiore desconfiaria primeiramente da Outfit, já que estava em dúvidas sobre
o acordo.
Viro outro shot, relembrando em qual estado o deixei, mais morto
que vivo, sua pele começou a feder no terceiro dia e, no quarto, o larguei
em uma vala qualquer nos arredores do Queens.
Franco era jovem, mas não digno de pena, sobreviver lhe gerou
uma boa reputação e, no fim, deu tudo certo.
Viro outro shot e encho de novo.
Sienna me julga com os olhos como se eu fosse o inimigo, isso me
irrita profundamente, e francamente não entendo por que me importo com o
que ela pensa, é só a porra de uma pirralha mimada.
Expiro com força e viro o shot, depois tomo um gole na garrafa.
Sienna me abomina e me considera um monstro, mas só quando lhe
convém, na última semana, quando estava sangrando, quase senti que teria
uma esposa pra valer, mas é literalmente duro quando ela me nega qualquer
tipo de contato físico.
— Dia difícil, Ferraro? — Ouço às minhas costas, olho por cima
do ombro e Coral Barnes, a advogada da Outfit, se senta em um banco ao
meu lado.
Ela curva seus lábios vermelhos provocativos em um riso e joga os
longos cabelos pretos para trás, deixando à vista um pescoço delicado, que
carrega um colar gotas de esmeraldas.
— Pode se dizer que sim — respondo, vendo-a achatar a bituca do
cigarro no cinzeiro à sua frente.
— Soube que se casou com a filha de Carlo — fala, pegando o
meu Jack Daniels e enchendo um shot para si.
— Você não foi ao casamento? — Coral sorri e a pequena pinta
que tem na curva do lábio superior se mexe, eu acho, ou talvez eu já esteja
bêbado demais.
— Não, me desculpe, estava em uma exposição de artes na França.
— Ela vira o shot e pega outro cigarro. — Até que se deu bem, ela tem
quantos anos? Quinze? — pergunta, sarcástica como sempre.
Quando seu pai faleceu há quatro anos, pensei que Carlo fosse
contratar outro advogado, mas Coral se mostrou indispensável e acabou
ocupando o cargo.
— Vinte — esclareço, puxando a garrafa de tequila e tomando um
gole.
— Continua sendo uma ninfeta — comenta, soltando a fumaça de
cigarro para o outro lado.
— Veio até aqui só para me provocar?
— Não, você não vale mais o meu tempo. — Dou-lhe um olhar de
desdém, — Estou aguardando um cliente. E você, Romeo, por que está aqui
sozinho? A sua esposa ainda não tem idade para beber? — Seus lábios se
curvam em um sorriso sexy enquanto solta a fumaça do cigarro.
— Sabe o que é engraçado? Você ainda ter a ponta da língua.
— Não seja cruel — expõe, me dando um peteleco na mão e, em
vez de se afastar, seus dedos permanecem em cima do meu dorso enquanto
seus olhos verdes iguais ao seu colar encontram os meus com malícia.
— Parece tenso, Ferraro. — Sua voz é firme e natural quando me
apalpa por baixo do balcão. Não precisa de muito para o meu pau se agitar
dentro da calça. Sienna fará minhas bolas explodirem se continuar me
negando sexo. Argh, maldita.
Pego a garrafa de uísque e tomo um longo gole, depois seguro no
pulso da Coral e retiro do meu pau, sem compreender por que fiz isso, a
minha esposa me teme e não quer nada comigo.
— Tenho que ir, foi bom te ver, Coral. — Puxo a garrafa de cima
do balcão e deixo o bar.

Chego em casa e já passou da uma da madrugada, deduzo, o


relógio em meu pulso é apenas um borrão. Precisei ligar para Ezio me
buscar, tomei o resto do uísque no carro, apaguei total e, quando acordei,
não conseguia nem colocar a chave na ignição.
Subo para o quarto, e Sienna está deitada, encolhida no meio da
cama, usando uma camisola preta, ela se senta rápido quando me enxerga e
sua expressão é indistinguível, estou bêbado demais para compreender, o
meu palpite é mal-humorada.
— Onde você estava? — Sua voz é exasperada e exigente.
Touché.
— Por que se importa?
— Você está bêbado — diz, incomodada.
— Estou e daí? — Sienna aperta o maxilar com força e se deita,
desligando a luz do abajur.
Jogo meu paletó aos pés da cama e entro no banheiro, sentindo a
vertigem aprofundar-se em mim. Tomo um banho demorado, esperando o
álcool, de alguma forma, escorrer para fora do meu corpo, mas como sei
que as chances disso acontecer são zero, desligo o chuveiro e visto uma
cueca no closet.
Volto para o quarto, e Sienna nem se move na cama, talvez eu
tenha pegado pesado demais, claramente não sei interagir com ela, nossas
conversas sempre acabam, de alguma forma, em discussão.
Pego o meu celular dentro do meu paletó e tem uma mensagem da
advogada.
Lamento se passei dos limites. Simplesmente não resisti ao seu
charme encantador... quando cansar de brincar com a ninfeta, sabe onde
me encontrar. Coral.
Sem dúvidas, a segunda frase é deboche. Fecho a mensagem e
coloco o telefone na cabeceira enquanto me deito ao lado de Sienna.
Arrasto para trás os fios do cabelo dela e inalo o cheiro na curva do seu
pescoço. Maldita, ela consegue ser tão perfeita até quando está com raiva
ou fazendo alguma estupidez, e isso me irrita pra caralho.
Me afasto, desejando apenas adormecer.

Acordo com a garganta seca e, por instinto, procuro Sienna na


cama, mas não a encontro, nem no quarto. Olho as horas no relógio digital e
já está quase chegando às onze da manhã. Puta merda, fazia tempo que não
apagava tão bem. Visto as primeiras roupas que encontro, me lavo e depois
desço com a sensação que tem um tambor dentro da minha cabeça.
Sienna também não está na cozinha, somente Agnes e Piero,
tomando uma xícara de café.
— Onde ela está? — Meu irmão dá de ombros.
— Senhora Ferraro deixou a casa com Ezio já faz algumas horas.
Eles saíram a pé.
Ezio deve ter me informado, mas esqueci de pegar o meu telefone
quando desci.
Me sento ao lado de Piero, recebendo sua atenção.
— O seu apartamento já está pronto? — quero saber, já faz duas
semanas, está na hora dele ir, assim, quem sabe, Sienna se sinta mais à
vontade.
— Quase, pego a chave na véspera de Ação de Graças, estava
pedindo agora mesmo para Agnes começar a arrumar minhas malas.
— Está bem. Sabe que será sempre bem-vindo aqui, não é? —
pergunto.
Piero tem vinte e seis anos, mas sua irresponsabilidade não tem
tamanho, leva inúmeras coisas na brincadeira, exceto quando está na
presença de Carlo, e boa parte disso é minha culpa, devia tê-lo chutado
daqui há muito tempo, para ter mais responsabilidade.
Se algo acontecer comigo, ele não terá somente a Sienna para
tomar conta, como assumirá o meu cargo, caso ainda não tenha um filho
homem.
— Quando foi que se tornou tão dramático? — pergunta,
zombeteiro, e lhe dou um olhar duro.
Me viro quando escuto movimento na escada. Sienna sobe com
passos pesados sem olhar em direção à cozinha, usando uma roupa apertada
de lycra cinza e rosa-claro, seu cabelo está preso em um coque bagunçado,
mas ela não parece se importar.
— Como estão as coisas entre vocês? — Piero pergunta.
— A conheço desde os cinco anos e, de alguma forma, me sinto às
cegas quando o assunto é ela.
— Sienna era acostumada com a autoridade de Carlo, talvez esteja
sendo muito mole.
— Não sou o pai dela, Piero, se eu continuar a tratando feito
criança, ela nunca vai crescer.
— Frouxo — entoa com um risinho quando fico em pé.
Subo para o andar superior, Sienna está tirando os tênis, ela ergue
seu olhar até mim por segundos, mas é o suficiente para perceber que está
infeliz.
— Onde estava? — quero saber, vendo-a tirar os tênis.
— Por que se importa? — pergunta, e sei que é retoricamente, pois
foi a mesma resposta que lhe dei essa madrugada.
Ela passa na minha frente, me ignorando, e entra no closet, levando
o calçado para guardar.
Santa paciência.
Paro na entrada do cômodo, ponderando o que Piero disse lá
embaixo, se ela quer agir feito criança, talvez eu deva tratá-la como uma.
— Eu quero uma resposta — digo impassível em pé, diante da
porta.
— Não pode me pedir o que não me dá. — Outra vez mais uma
resposta minha. Seus olhos azuis profundos como o oceano brilham a
arrogância e de alguma forma bizarra gosto disso, gosto quando ela está tão
puta a ponto de não sentir medo de mim.
— Justo — falo, e sua expressão se mantém fria. — Estava num
bar, noite passada.
— Isso eu notei pelo cheiro de álcool — diz asperamente e remove
o casaco de lycra, atirando dentro de um dos armários, ficando apenas de
top cinza.
— É por isso que está com raiva? — pergunto, sem entender que
bicho a mordeu, quem devia estar puto sou eu, por ter mexido onde não
devia.
— Estou com raiva porque perdi o meu tempo te esperando chegar
e... — Ela para e aperta o maxilar com força, sei que tem medo de me
contar as coisas e, quando hesita, tenho vontade de abrir sua mente para
descobrir o que está escondendo.
— Fale.
— Você não vale o meu sono — entoa, fazendo-me estreitar as
sobrancelhas, mesmo que suas palavras soem verdadeiras, a sensação é que
está mentindo sobre o real motivo.
Sienna tenta passar por mim, mas a impeço quando enxergo um
hematoma roxo-clarinho no seu braço, a seguro de repente, ela tenta se
afastar, mas a puxo para mais perto, fazendo seus olhos se arregalarem.
— O que fez aqui? — pergunto, passando o polegar por cima, está
coberto com maquiagem.
— Bati na quina da ilha — profere, ainda tentando se livrar dos
meus dedos.
— E por que cobriu? — Cerro os olhos, fechando os dedos com
mais firmeza em seu braço, e a porra do controle se esvai, não há um
maldito dia que ela não mente para mim.
— Romeo, o que está fazendo? — pergunta entredentes, tentando
frear os pés no chão enquanto arrasto para o banheiro. — Me solta! —
berra, se agarrando ao batente da parede.
— Você vai limpar esse braço agora, quero ver o que está
escondendo. — Sienna solta a parede e seguro em seu pulso, com sua mão
aberta a centímetros do meu rosto. Dou-lhe um olhar visceral, a última
pessoa que tentou me agredir perdeu a vida.
— Gosto da sua ousadia, pêssego, mas está ultrapassando o limite
da minha paciência — declaro com meu nariz quase colado no dela.
— Vai se foder! — grita, se afastando.
— Isso nem parece um insulto saindo da sua boca — escarneço, a
segundos de perder a cabeça seriamente. Viro-me para a porta do banheiro,
Sienna enterra os dentes em meu antebraço, criando uma dor aguda.
Empurro-a para trás, ela cai sentada em meio a uma profusão de
lágrimas. Desgraçada, praguejo mentalmente, olhando para a mordida em
meu braço, sangrando em alguns pontos.
— Você quer saber o que eu escondo? — pergunta, exasperada,
com seu rosto vermelho e úmido pelas lágrimas que ainda escorrem. Ela
fica em pé e limpa o braço com lenço umedecido, expondo um hematoma
de uma mordida em tons de roxo-escuro e verde-amarelado.
— Você fez isso? — pergunto, conturbado.
Sienna balança a cabeça e, de repente, sinto uma sensação de
aperto no peito, dou um passo na sua direção, mas ela dá três para trás,
balançando a cabeça.
— Por que se machuca, Sienna? — questiono e lembro de quando
a vi em um dos corredores da mansão Santoro, logo depois de Carlo a
informar que nos casaríamos, o seu vestido estava manchado de sangue, no
mesmo braço.
Tento ignorar a dor latente em meu braço enquanto encaro o dela,
sem saber o que pensar, nem imaginar o que a leva a se automutilar. Sienna
se senta no recamier e, entre lágrimas e soluços, ela ampara a face com as
mãos, desolada.
— Me deixe ajudá-la. — Ela solta uma espécie de riso e afasta as
mãos do rosto, seus olhos se prendem no colchão, aposto que para evitar os
meus.
— Quer me ajudar, fique longe de mim.
— Vou agendar um psicólogo pra você — declaro, arrancando uma
risada histérica dela.
— E você espera que eu diga a verdade a ele, Romeo? — pergunta
asperamente. — Que me torturo todas as vezes que minha vida de
principessa sai dos trilhos? Que perdi parte da minha família em um ataque,
onde vi um homem arrancar as entranhas de outro com as próprias mãos, e
dez anos depois fui forçada a me casar com ele... ainda acha que eu não
conheço o inferno?
Ela me encara com os olhos vermelhos e inchados.
— Eu sou o seu inferno. — As palavras saem num sopro.
— Não é apenas você — sussurra, e sei que se refere ao seu pai,
que a obrigou a se casar comigo.
Sienna anda até o banheiro e bate a porta com força, se trancando
lá dentro, enquanto sinto que tomei uma rasteira, ver o que eu provoquei
nela me fustiga de uma forma que nunca vivenciei antes. O meu mundo
sempre foi carregado por caos, e já estou acostumado às reações adversas,
só nunca passou pela minha cabeça que um dia isso, de alguma forma, a
afetaria.
Capítulo 18

Entro em casa com algumas sacolas de compras e passo reto por


Romeo e Piero assistindo ao jogo do New England Patriots, meu marido me
olha brevemente por cima do ombro, depois volta a sua atenção para a TV.
Amanhã à noite, iremos no jantar de Ação de Graças na minha
antiga casa, honestamente não tenho nada a agradecer, mal troco meia dúzia
de palavras com Romeo desde a semana passada.
As coisas estão estranhas, e sei que tenho uma parcela de culpa
nisso, porém, em minha defesa, quando vi aquela maldita mensagem no
telefone do Romeo, enquanto ele tomava banho, tudo que eu enxergava era
ele bêbado comendo outra mulher.
Dormi chorando de raiva, me senti aniquilada, pensando que,
enquanto eu padeço no inferno nas mãos de Piero, ele vai se divertir na rua?
A caminhada que dei na manhã seguinte me tranquilizou um pouco
até eu voltar para casa e Romeo começar agir como se não tivesse
acontecido nada na noite anterior, então as coisas saíram do controle.
Liguei para minha irmã, odiando envolvê-la, mas precisava
conversar com alguém. Quando os problemas são meus, eu simplesmente
perco meus sentidos.
Fiorella disse que devia dar o benefício da dúvida ao Romeo, ela
mencionou que uma vez interpretou uma situação errada e aquilo quase
acabou com o seu casamento, Ella não deu muitos detalhes e, como eu já
estava magoada e confusa, não quis me aprofundar no assunto.
Prefiro acreditar que Romeo não tenha dormido com outra mulher,
por mais que todos os sinais indiquem que sim. Ele disse que não vai
esperar para sempre, e todo dia que passa fico me perguntando se esse dia já
chegou.
Solto as sacolas em cima da cama, comprei um vestido tubinho de
brilhantes, decote profundo, com mangas bufantes na altura do pulso, e
mais alguns acessórios, como bolsa, colar, brincos. Foi bom fazer algo da
minha antiga rotina para variar.
Viro as sacolas em cima da cama e ouço um assobio de admiração
às minhas costas. Olho de soslaio entre os fios do meu cabelo solto e
Romeo está na entrada do quarto.
— Você não me impôs um limite — declaro, agora arrependida de
ter virado mais de duzentos mil dólares em compras na cama.
— Carlo te dava um limite? — pergunta, e sinto sua voz mais
próxima, mas não sou capaz de encará-lo, não depois do que eu fiz a ele.
Quando me autoflagelo, aquilo me adoece por dentro, a vergonha
que sinto, não existe nada que eu possa comparar. E agora que ele sabe,
toda vez que me olha ou tenta falar comigo, tenho a sensação de que é por
pena.
Talvez acredite que ainda haja salvação para a minha sanidade,
mas já aceitei que não existe ninguém normal na sombra da máfia.
— Papai dizia que podia comprar tudo o que eu conseguisse
carregar. — Me viro quando ouço Romeo sorrir, ele se aproxima da cama e
pega uma sapatilha de balé que eu impulsivamente comprei.
— Voltará a dançar? — pergunta, analisando o sapato bege com
fitas de cetim.
Balanço a cabeça em negação.
— Eu devolvo se quiser — respondo, puxando a outra sapatilha de
cima da cama. Eu amava o balé, quando dançava, me sentia livre, era um
momento só para mim, longe de qualquer obrigação da máfia. Até Carlo
dizimar os meus sonhos, e eu perceber que aquilo era uma perda de tempo,
ele estava só me mantendo ocupada para o meu propósito na Outfit.
Romeo solta a sapatilha na cama.
— Não tem que devolver — avisa e se afasta.
— Por que subiu? — pergunto quando ele está alcançando o
batente da porta.
— Vim saber o que havia causado um rombo na minha conta
bancária. — Vislumbro uma espécie de riso por baixo da sua barba
delineada e escura.
Romeo deixa o quarto, e meu peito se espreme, mesmo depois de
saber como ele foi horrível com Franco, entre outras coisas, simplesmente
não consigo odiá-lo. Se ao menos me tratasse mal, também me faria sentir
menos culpada pelas mentiras e pelo fato de que estou prestes a acabar com
a vida do seu irmão. Infelizmente Romeo ama o traste do Piero,
provavelmente sofrerá em silêncio e eu saberei que sua dor é minha culpa.
Desço após guardar as compras no closet e encontro Maeve e sua
mãe na cozinha. A garota comprou um quilo de castanhas como eu havia
pedido, a minha intenção era fazer o jantar de Ação de Graças, mas papai e
Dona convidaram Romeo, e ele aceitou, acreditando que eu adoraria.
— Agnes, pode tirar o resto do dia de folga — aviso, entrando em
seu espaço de trabalho.
Maeve e eu combinamos durante a semana que eu faria o jantar,
para que a culpa não caísse sobre Agnes. Até porque, se ela visse a
castanha, me informaria que o bastardo é alérgico e assim eu não poderia
usar sem parecer suspeito.
— Senhora, ainda nem comecei o jantar.
— Tudo bem, nós pedimos delivery. — Ouço Romeo do outro
lado, pegando uma garrafa de cerveja.
— Nada disso. Eu vou cozinhar — aviso, pegando um avental,
Romeo e a empregada me olham surpresos. — Não é a primeira vez que
faço isso, ok? E se continuar me olhando dessa forma, lavará os pratos do
jantar — declaro, amarrando o avental.
Romeo sorri, ele ergue as mãos para o alto em rendição e deixa a
cozinha levando duas garrafas de cerveja.
— Senhora, se desejar, eu posso ficar e auxiliá-la. — Sorrio, será
que pareço tão fútil a ponto de ninguém acreditar que sou capaz de preparar
um jantar?
Melhor não fazer essa pergunta em voz alta.
— Mãe, aproveita e vá ao salão aparar as pontas do cabelo, eu
ajudo a Barbie. — Dou um olhar de reprovação à garota.
— Tudo bem. Mas, se precisarem de mim, é só enviar mensagem
que volto correndo. — Maeve e eu rimos dela, mas assentimos para que
ficasse despreocupada.
Pego as panelas no armário e solto em cima do fogão, pensei que,
quando esse dia chegasse, meu coração ficaria acelerado e as minhas mãos
trêmulas, mas estou muito confiante, o que é estranho, pois estou tentando
tirar a vida de alguém. Uma pessoa má e insignificante que merece morrer,
pelo menos foi isso que pensei durante todas as noites que olhava a receita
de bolo de carne com recheio de castanhas na internet.
— É impressão minha ou ambos estavam flertando? — Maeve
pergunta, colocando os ingredientes da receita que enviei para ela noite
passada na bancada, ao lado da tábua.
— Não sei do que está falando — digo, indiferente, virando um
pouco de castanhas em uma panela para ferver e usar o seu caldo para o
molho.
— Você, pelo menos, sabe o que está fazendo? — questiona,
olhando para a bancada, tem tantos ingredientes...
— Não — confesso, ela sorri. Jogo um pacote de castanha para ela
e acrescento: —, triture e faça virar pó, Maeve.
Piero passa pela cozinha e, antes de subir para o segundo andar, ele
nos dá um olhar de relance. Maeve acredita que ele desconfia que ela
causou o barulho no andar superior de propósito. Romeo também estranhou
nossa aproximação e, como não estamos conversando muito, Maeve
explicou que se desculpou comigo e decidimos dar uma trégua.
— Será que ele não está desconfiado?
— Ele pode desconfiar, mas não tem como provar — respondo e
de repente me sinto como a Jen Harding, de Disque amiga para matar.

Uma hora e meia depois, a mesa de jantar estava pronta, a cozinha,


uma bagunça, e meia garrafa de Château Lafite, vazia. Maeve inventou uma
desculpa de última hora e deixou a mansão, como havíamos planejado.
Agora somos apenas nós três e o meu coração querendo fugir do
peito. Será que é assim que Romeo se sente quando está perto de tirar a vida
de alguém?
— O jantar está na mesa — declaro na entrada da sala e forço um
sorriso para Romeo perceber que esse jantar é importante para mim. Ele
desliga a TV e se levanta, mas o desgraçado do Piero permanece sentado.
Dou as costas a eles e ouço meu marido mandar o irmão se
levantar.
Olho para a mesa de jantar com satisfação, é o primeiro jantar que
eu faço sem o auxílio de uma cozinheira ou de Dona, ela ficaria orgulhosa.
Os pratos são simples: bolo de carne temperado com castanhas e recheado
com bacon, linguicinha e alguns vegetais. À parte, batatas cozidas com o
caldo das castanhas, assim como o milho, os aspargos e as cenouras, além
do molho de cranberry.
Me sento à mesa à esquerda de Romeo, e Piero, à sua direita, à
minha frente, seus olhos encontram os meus e a náusea bate com força em
meu estômago, e a única coisa que me mantém calma nesse momento é
saber que essa será a última vez que olharei para a cara dele.
— O cheiro está delicioso — Romeo comenta, e não consigo medir
o tamanho do meu sorriso, me sirvo primeiro e percebo os olhos de Piero
em cima de mim, com certeza ele está desconfiado. — Vou buscar um
vinho. — Romeo se levanta e se retira.
— Eu sei que está aprontando alguma coisa, Sienna — ele sibila
com os talheres em punho. — Talvez eu deva lembrá-la do que vai
acontecer se Romeo achar aquela droga.
Suspiro alto e levo um pedaço de carne à boca, ficou delicioso, e a
melhor parte é que nem dá para sentir o gosto da castanha.
— Estou feliz porque nunca mais verei sua cara.
— Eu me mudo hoje — diz, começando a se servir —, mas não
significa que não virei mais aqui.
Piero relaxa no assento quando Romeo se aproxima e começa a
comer em silêncio, preciso conter meu sorriso para não parecer uma
maluca. Romeo desconfiaria, tenho certeza, os últimos dias foram caóticos,
não há o que comemorar.
Meu marido se senta e enche o seu copo, depois o de Piero, que já
está quase terminando com o bolo de carne e as batatas, devo tê-lo irritado,
porém, não poderia sair no meio do jantar sem parecer suspeito.
Romeo começa a se servir, ele está com a expressão suave e
incrivelmente relaxado. Nosso casamento poderia dar certo se fôssemos só
nós. Não teria a pressão de Piero, as mentiras seriam enterradas juntas com
esse porco imundo e eu poderia... sei lá, inventar que não sangrei porque o
meu coletor menstrual arrebentou meu hímen? Nossa, isso parece horrível,
mas pode funcionar.
Sou arrastada de volta à realidade com o barulho de vidro partindo
no chão, encaro Piero e meus olhos se arregalam ao enxergar a
monstruosidade que sua face está se tornando, sua mão está em torno do
pescoço como se estivesse sufocando.
Romeo fica em pé bruscamente e sua cadeira cai para trás, Piero
faz o mesmo e seus olhos encontram os meus, um medo real me atinge em
cheio. De repente, o monstro pula em cima de mim por cima da mesa como
num filme, ele percebeu que não tem mais nada a perder. Caímos para trás e
seu corpo esmaga as minhas pernas presas na cadeira.
— Vou acabar com você, sua piranha imunda, desgraçada. — Suas
palavras saem rouca enquanto seus dedos se fecham em torno da minha
garganta, fazendo minha respiração soar áspera e animalesca.
Romeo arranca Piero bruscamente de cima de mim e o atira longe,
ele se ajoelha ao meu lado, sua expressão é de pavor.
— Você está bem? — Romeo me ergue sem esforço, sinto minhas
pernas moles, então ele me coloca sentada.
Mexo a cabeça em negação, desconcertada.
— Vou ligar pra emergência. Ele deve ter tido uma reação alérgica
a alguma coisa da comida e ficou descontrolado. — Romeo olha para Piero,
tentando ficar em pé e se afasta, praguejando atrás de um telefone.
Morra, filho da puta.
Firmo as pernas que parecem gelatinas e caminho até Piero,
escorado contra a pedra da ilha, se pudesse, o sufocava aqui, no meio da
cozinha. Seus olhos inchados queimam nos meus como no inferno, me
agacho ao seu lado e Piero não faz nenhum movimento, parece que perdeu
todas as forças do corpo.
— Torça pra morrer, pois, se atravessar no meu caminho
novamente, eu não vou fugir. Não tenho mais medo de você, Piero, quer
usar a droga contra mim, use, mas você também tem o rabo preso, talvez,
quando tudo isso acabar, tomarei um chá com a cônsul no Hotel Confort
Snyder — escarneço apenas para lembrá-lo da única pessoa que pode foder
com a vida dele, além de mim.
— Sienna. — Ouço a voz de Romeo de longe.
— Ele está piorando, Romeo — aviso com uma pitada de drama e
olho para meu marido com os olhos cheios de lágrimas não derramadas.
— Eles chegam em cinco minutos e me passaram algumas
instruções.
Romeo deita Piero para trás e ergue as pernas do irmão para
melhorar a circulação, deduzo, pela quantidade de coisas que pesquisei na
internet. Esse verme dos infernos permanece respirando.
— Consegue abrir a porta? — Romeo pergunta.
— Claro, me dê o seu dedo — desdenho, recebendo um olhar
violento dele, que se levanta e atravessa a casa com passos largos.
Oh, Deus, tenho que me mostrar mais afetada e principalmente
culpada, mesmo que me doa na alma ter que fazer isso. Talvez devesse me
preocupar também por não estar sentindo remorso. Só que, quando vejo
Piero, lembro o que ele fez comigo, como foi cruel e horrível e tenho
vontade de arrancar seu pau fora e fazê-lo engolir.
— Você pôs castanha, caju, nozes, alguma coisa desse tipo na
comida? — Romeo questiona ao meu lado, Ezio entrou e está encarando
Piero, assustado.
— Castanhas — sussurro, olhando em seus olhos, e minhas
lágrimas escorrem em abundância. — Sou um desastre, me desculpe.
— Não tinha como você saber — ele diz e faz sinal para Ezio se
aproximar, ambos pegam Piero com cuidado e o levam em direção à sala
principal.
Subo para o quarto com o desespero dominando cada fibra do meu
corpo. Se esse bastardo não morrer, terei que fazê-lo acreditar na minha
ameaça, pois será a única forma de contê-lo.
Me sento aos pés da cama sem saber o que estou sentindo dentro
de mim, está tão confuso, achei que fosse ficar aliviada em fazê-lo sofrer,
mas a única coisa que está me dando é uma dor de cabeça do caralho.
Por que essa aberração não morre?
Romeo entra no quarto, a preocupação estampa sua face e a tensão
corre pelo seu corpo.
— A ambulância está entrando no pátio, eu vou com ele. Você
ficará bem?
Assinto, péssima por fazê-lo ficar mal.
— Não quero que se machuque, Sienna. — Sua voz é firme e
preocupada, pegando em meus pulsos delicadamente.
— Eu não vou, prometo. — Romeo me dá um aceno e se afasta.
Ando até a grande janela de vidro, o pátio reflete do azul ao
vermelho, do âmbar ao branco, as luzes da sirene. Em instantes, vejo os
paramédicos levarem Piero. Romeo olha para cima antes de entrar no
Rover, como se, de alguma forma, soubesse que estaria ali na janela,
olhando-o de volta.
Depois que eles saíram do pátio, ando até a cama solitária,
desejando que essa noite termine para saber o que devo temer na manhã
seguinte.
Capítulo 19

É Ação de Graças.
Já amanheceu, e Romeo ainda não voltou para casa e não tenho
nenhuma notícia a respeito de Piero. Dizem que notícia ruim chega rápido,
mas não tenho certeza se isso se enquadra nessa situação.
— Precisa se acalmar. — Maeve segura em meu pulso, me
impedindo de arrancar uma unha com os dentes.
— E se ele ainda estiver vivo? — pergunto, sentada em um dos
sofás na sala principal, com o meu peito apertado.
— Damos outro jeito. — Sorrio, mas acho que é o reflexo do
desespero.
— Se ele contar ao Romeo, é o meu fim, duvido que ele me dará
espaço para esclarecer — sussurro e, quando Maeve vai argumentar, a porta
se abre, fazendo-a se calar.
Levanto-me num pulo, vendo apenas Romeo entrar na casa, sua
expressão não é das melhores, mas, devido ao seu espírito natural, eu não
tenho ideia do que esperar.
— Maeve, nos dê licença. — São as primeiras palavras que passam
pela boca dele, deixando-me sem saber no que pensar, a garota me dá um
olhar preocupado, mas se retira em silêncio, enquanto meu marido entra
mais na sala.
— Romeo — balbucio numa lástima, ele solta o ar lentamente e se
atira no sofá ao meu lado. Sua cabeça se escora entre os vãos das almofadas
enquanto seus olhos escuros e cansados encontram os meus.
— Ele vai ficar bem — profere, olhando dentro dos meus olhos.
Solto o ar lentamente, com um sorriso de alívio enquanto levo uma
mão ao peito.
— Isso é maravilhoso — comento, vendo qualquer esperança que
eu tinha de me livrar de Piero escorrer pelo ralo. — Onde ele está?
— No hospital, sua saturação está baixa, ele ficará em observação
por mais vinte e quatro horas.
Desgraçado, filho da puta, eu devia tê-lo sufocado com um pano
de prato.
— Conseguiu conversar com ele?
Romeo assente.
— Ele quer se desculpar pelo que fez, ele disse que não entende o
que aconteceu. — Mexo a cabeça em negação, sem conseguir conter a ação,
não quero chegar perto de Piero, tudo que sai da boca dele é enganação.
— Está com medo, confesso que também fiquei quando ele pulou
em cima de você. Parecia uma cena saída de um filme — expressa
baixinho, olhando para o nada como se estivesse lembrando.
— Ele não precisa se desculpar, afinal, foi eu quem quase o matou
— comento, parecendo suave e descontraída.
— Você daria uma péssima assassina. — Rimos.
— De fato, eu não nasci para o crime.
— Eu preciso descansar um pouco. — Ele se levanta, parece que
passou a noite em claro.
— Devia ter voltado para casa — falo.
— Ele teve um choque anafilático, podia ter morrido, e eu queria
estar lá caso acontecesse.
— Você o ama mesmo — sussurro.
— Ele é família, é o mínimo — diz e me dá as costas.
Romeo sobe, e eu me escoro para trás no sofá, buscando uma
forma de engolir o fracasso, nunca mais teremos outra chance, Piero ficará
sempre alerta a partir de agora. Merda!
Prendo o último brinco de diamantes na minha orelha e me afasto
para olhar o meu vestido. Ele é curto sem ser vulgar, o oposto do decote,
que é longo e aberto demais, não sei o que me fez sentir tão confiante na
loja. Pego um casaco de pelo branco e minha bolsa de mão e desço,
recebendo um olhar de admiração da Maeve.
— Ele já voltou? — pergunto, me aproximando da cozinha.
— Ainda não. — Faço beiço e me sento à ilha, em frente a uma
garrafa de vinho enfeitada com um top vermelho à sua volta.
Romeo passou a maior parte do dia adormecido, mas, quando
acordou, a primeira coisa que fez foi me dar acesso à porta de entrada, em
seguida, pediu para alguns dos seguranças levar as malas de Piero para o
apartamento novo, e depois se trancou no escritório. Podia ver que estava
tenso e com os pensamentos distantes, por isso resolvi dar espaço para ele.
Depois de um tempo, ele deixou a sala e tomou um banho, ele
disse que teria que passar no escritório Carrington Entreprise, a empresa de
telecomunicação/ fachada da Outfit, no centro da cidade, antes de irmos
para o jantar de Ação de Graças, e agora, cá estou eu entediada, esperando-
o.
— Por que não vai até lá? Fica a dez minutos.
A última vez que estive naquele edifício, minha mãe ainda estava
viva, e Carlo trabalhava fora de casa, isso parece que foi em outra vida.
— Eu vou — digo, me levantando da mesa e puxando a bolsa e a
garrafa de vinho.
— Aproveite o Ação de Graças, Mavis, e, se eu fosse você, sumiria
dessa casa por um tempo. Piero pode ter se mudado, porém, duvido que ele
saia das nossas vidas por vontade própria.
— Talvez devesse, mas daí você ficaria sozinha — comenta, me
acompanhado até a porta. — Agora somos amigas de crimes, não tem volta
— fala, me fazendo rir.
— Obrigada por ficar do meu lado, é difícil viver nessa casa. —
Maeve concorda com um aceno e abre a porta para mim.
— Boa festa, Barbie. — Viro para repreendê-la, mas a porta já está
fechada.
Avisto Ezio fumando encostado na BMW preta e encurto o espaço
até ele, que ajeita sua postura rapidamente.
— Me leve ao edifício Carrington, vamos encontrar Romeo lá.
— Sim, senhora — fala, abrindo a porta do carro e pegando o
telefone, provavelmente para avisar Romeo.
Me aconchego no banco de trás e escoro a cabeça contra a janela,
por algum motivo, ansiosa, hoje será a primeira vez que sairemos em
público como um casal, não sei o que esperar.
Depois de alguns minutos, Ezio estaciona em frente a um elegante
prédio e abre a porta do carro para mim, sua expressão, como sempre, não
se altera em nada, queria entender como Fiorella conseguiu ficar tão
próxima do seu segurança depois de um ano de puro ódio durante a vigília
na mansão Santoro.
O segurança me conduz em silêncio em direção ao elevador e,
embora seja feriado, tem certa movimentação no primeiro andar. Subimos
rápido para o último andar e só quando as portas se abrem percebo que
trouxe a garrafa de vinho, em vez da minha bolsa de mão.
Descemos em uma espaçosa recepção em tons de cinza-claro e
pedras de mármore preto na maioria das paredes, exceto nas grandes
janelas, o andar inteiro está completamente vazio. O segurança se detém
para que eu ande em sua frente, mas não tenho ideia de onde fica a sala de
Romeo.
— Última sala, após a recepção, senhora — avisa, averiguando em
volta. — Estarei aqui caso precise de algo.
Lhe dou um aceno e caminho, analisando a garrafa. Meu primeiro
Ação de Graças casada com Romeo, taí uma coisa que nunca passou pela
minha cabeça. Mesmo que Piero ainda esteja vivo, preciso acreditar que as
coisas vão melhorar agora que seremos apenas eu e ele na mansão. Reflito,
olhando em frente e enxergando dois elevadores no fim do corredor.
Será que seria desrespeitoso abrir a garrafa que daremos ao papai e
a Dona, para comemorar esse momento? Me parece muito propício. Romeo
está tenso desde a noite passada, o álcool o faria relaxar e isso quebraria o
gelo em nossa relação, quero recomeçar de onde paramos. Em nossa última
briga, o fiz se sentir culpado, sendo que há outros motivos que me levaram
ao inferno.
Chego na última sala, a parede é de vidro, mas a persiana clara e
fechada esconde o seu interior, o que é ilógico, já que a porta também é de
vidro.
Enxergo uma plaquinha de metal com o nome de Romeo Ferraro
incrustado, preso no topo da porta, paro em frente a ela com o meu sorriso
mais adorável.
Olho através da porta e me torno uma pedra incapaz de sair do
lugar enquanto vejo Romeo foder com uma mulher na mesa. A camisa dele
está aberta, exibindo seus músculos contraídos pelo tesão, e sua amante,
com os peitos e o rosto colados na madeira escura de mogno, enquanto ele a
segura com firmeza pela nuca e seus longos cabelos pretos escorregam pela
lateral da mesa. O quadril de Romeo investe com ritmo, força e fúria dentro
dela, lhe arrancando gritos de prazer.
Meu corpo começa a tremer, a bile me sobe à garganta e, quando
levo a mão à boca, a garrafa escorrega dos meus dedos, causando um
estampido, os gemidos dos quais nunca vou esquecer param e de repente
aqueles olhos escuros e sombrios encontram os meus na porta, provocando
o inferno no meu interior.
— Senhora. — Ezio me encara distante e preocupado, dou um
passo para trás, sentindo-me nocauteada, desejando desaparecer, mas, como
isso é improvável, me afasto da sala sem olhar para dentro dela e, ainda
assim, capto movimentos no interior.
Me viro e minhas pernas se tornam gelatinas, não é possível que
isso esteja acontecendo, prefiro morrer a ter que encarar aquele filho da
puta, miserável. Corro em direção aos elevadores no fim do corredor e,
quando aperto o botão para descer, Romeo sai da sala, abotoando sua
camisa. As portas se fecham e posso sentir meu coração querer abandonar o
peito. Olho para mim no espelho e odeio tudo que vejo, devia tê-lo
enfrentado em vez de fugir, eu nem tenho para onde ir, mas só a ideia de
ficar perto dele e olhar para ele faz a raiva pinicar meu couro cabeludo.
As portas se abrem, ando para a rua escura e deserta, contendo
poucos carros, não sei para onde ir, então entro em um restaurante ao lado
do prédio, avisto o banheiro sem dificuldade e caminho até lá, percebendo
alguns olhares em mim.
Entro em uma das cabines e me sento na tampa da privada com as
pernas bambas. Se passaram três semanas, e o desgraçado não conseguiu
ficar a porra de um mês sem transar. Fungo baixinho e pisco, tentando reter
as malditas lágrimas.
Sem dinheiro, telefone ou para onde ir. Sem dúvidas, cheguei ao
fundo do poço e prefiro dormir nesse banheiro a ter que voltar para casa e
olhar para a cara dele. Romeo, a esta hora, deve estar colocando seus
soldados atrás de mim. Será que avisará o meu pai? Carlo, com certeza,
exigirá saber por que fugi, o que me faz pensar que ele não contará até ter
certeza de que não consegue me achar por conta própria.
A porta abre, fazendo meu coração quase quebrar minhas costelas
com a intensidade que bate. Ergo as pernas do chão com receio que seja
alguém da máfia, mas então ouço a voz de duas jovens conversando.
Deixo a cabine, chamando atenção delas, as meninas se vestem
estilo a Maeve, só que com um olhar menos arrogante, ou deve ser pela
minha expressão lastimável.
— Poderiam me emprestar o celular? — As duas me analisam,
depois se entreolham, e a loira com os cabelos rosados na ponta me estende
o dela.
— Obrigada — sussurro, vendo o vermelho dos meus olhos no
grande espelho.
Disco o único número que me vem à cabeça, até porque não
lembro de nenhum outro de cor. Levo segundos para alguém da mansão
atender o telefone residencial.
— Alô — minha madrasta, por milagre de Deus, atende.
— Dona, é a Sienna.
— Você e Romeo já estão chegando? — pergunta, parece animada,
expondo que não sabe de nada, olho as meninas pelo espelho, me
observando, e entro em uma das cabines, constrangida.
— Ele me traiu, Dona, estou no banheiro de um restaurante e não
tenho para onde ir — digo com meus olhos se enchendo de lágrimas
novamente —, será que posso entrar pelos fundos e passar a noite aí?
— Ah, Deus, que merda, querida! — pragueja. — Assim que você
colocar os pés aqui, os seguranças vão avisar ao seu pai.
— Eu não quero voltar para aquela casa, Dona.
— Eu sei, vem, eu vou aguardá-la em frente à casa. — Encerro a
chamada e ouço a porta do banheiro se abrir.
— Hey, aqui é o banheiro feminino, seu pervertido — uma delas
diz severamente, fazendo minhas pernas tremerem.
— Viram uma garota loira, bem arrumada, com um casaco de pelo
branco? — Ouço Ezio, e meu coração bate tão alto que a minha impressão é
de que ele vai me entregar.
— Não vimos ninguém — uma delas diz asperamente. — E, se não
sair agora, vamos gritar. — A porta fecha com força e preciso me sentar
para não ir ao chão. De repente, as duas param na minha frente, e estendo o
telefone para a dona, depois seco as lágrimas, sentindo minhas vistas
arderem.
— Aquele palhaço é seu namorado? — a morena pergunta.
— Marido — minto, pois é mais fácil do que ter que explicar a
minha realidade. — Brigamos, e ele quer me levar para casa.
— Argh! Que cuzão — a loira resmunga.
— Só entramos pra usar o banheiro, se quiser carona até algum
lugar, pode ir conosco — a morena pontua e se afasta, ela fede a cigarro e
chiclete de morango.
O carro estaciona dentro do pátio antes de alcançar a entrada
mansão Santoro e me despeço das meninas. No restaurante, aguardamos um
pouco até ter certeza de que Ezio não estaria do lado de fora, me esperando,
e depois entrei no carro de duas completas estranhas. A loira se chama
Sidney e a morena, Quinn, ambas me convidaram para ir a uma festa na
fraternidade Pi Kappa Alpha.
Deus, como eu queria ser mais corajosa, ir apenas para dar o troco
na mesma moeda. Pensar nele faz meus olhos se encherem de água, não
quero acreditar no que vi, aquela cena, os sons, a expressão no rosto dele
quando me viu... esmagam a minha alma.
Romeo quebrou qualquer coisa que poderíamos ter algum dia.
Odeio-o com tanta intensidade que meu peito dói como se, de fato, tivesse
sido apunhalado.
Dona me encontra, passa os braços em minha volta e me leva em
direção à casa sem perguntas, ela usa um vestido preto e um penteado
simples, fazendo me recordar da porra da Ação de Graças, francamente não
tenho nada a agradecer.
Avisto muitos carros ao longo do pátio e o Rover entre eles faz-me
frear os pés no chão.
— Você contou a ele? — pergunto aos prantos, dando um passo
atrás.
— É claro que não, Romeo chegou há uns cinco minutos e está no
escritório com seu pai, não vai demorar até eles souberem que está aqui.
— Eu não devia ter vindo.
— E passaria a noite no relento? — Dona responde e me leva em
direção à lateral da casa.
— Estou estragando a sua festa, me desculpe. — Ela me olha
pesarosa, mexendo a cabeça em negação.
— Não se preocupe com isso, meu bem.
Entramos na casa pela lateral e atravessamos os cômodos em
direção ao meu antigo quarto, Dona abre a porta, me deixando entrar e está
tudo do jeito que havia deixado.
— Ele não mudou nada.
— Eu te disse. — Ela sorri. — Vou buscar uma roupa confortável
para você. — Dona se retira, fechando a porta.
Caminho até a cama e me esparramo nela, o meu cheiro ainda está
em cada canto desse cômodo, aqui passei os últimos dias me preparando
para o inferno que seria viver com o Romeo. Rio, como fui burra, me deixei
envolver. Mesmo me controlando perto dele, senti que tínhamos algo, nada
profundo, mas estávamos indo aos poucos, obviamente isso era só coisa da
minha cabeça.
Meus olhos se enchem de água novamente e me sinto a porra de
uma cachoeira, chuto meus sapatos longe, irritada, desejando quebrar
alguma coisa, deixar tudo em pedaços como Romeo fez comigo.
Limpo o que consigo das lágrimas em meu rosto quando a porta do
quarto se abre, um banho viria a calhar agora, mas não é Dona que
atravessa a porta.
— Por favor, não me obrigue a ir embora. — Papai suspira e anda
até mim usando um terno preto.
— Você é do meu sangue, princesa, mas pertence ao Romeo agora,
e ele quer levá-la.
— A única forma de ele me tirar desse quarto é me arrastando —
digo com minha garganta dolorida. — Ele me traiu! — exclamo, sentindo
minhas unhas ferindo minhas palmas. — Eu quero que Romeo queime no
inferno, onde é o lugar dele — praguejo o seu nome como se fosse uma
maldição.
— Ele ficou preocupado quando fugiu. — Rio alto e profundo.
— Engraçado, não vi essa preocupação enquanto ele enfiava o pau
em outra mulher.
— Sienna — papai adverte e, diante de mim, vejo um homem
dividido entre ser um bom pai ou um bom Chefe e, pela quantidade de
merda que está acontecendo com a Outfit, ter a filha surtada em sua casa é o
menor dos seus problemas.
Carlo não se importa comigo, tudo gira em prol da organização, eu
sou apenas uma peça inútil desse tabuleiro, se fosse homem, teria mais
serventia para ele.
— Você prometeu que me aceitaria de volta se algo ruim
acontecesse. — Ofego com minha voz embargada.
Papai coloca a mão na minha perna agitada.
— Fisicamente, filha. Não posso impedi-lo de levá-la. — Minhas
lágrimas rolam, — Mas vou puni-lo, eu prometo — ele me assegura.
— Eu não quero que você o machuque — sussurro, encontrando os
olhos do meu pai. — Eu quero machucá-lo. — Os lábios dele se curvam
satisfeito.
Pela quantidade de ferimentos que Romeo tem, parece ser
intolerante à dor física, mas deve haver algo que fere o seu coração, eu só
preciso descobrir o que.
— Você cresceu. — Ele fica em pé, e Dona entra com algumas
peças de roupas.
— Ela não irá ficar, Dona. — A mulher lhe dá um olhar de
reprimenda. — Vamos dar espaço a eles — diz, e vejo a sombra de Romeo
na entrada do quarto. Desgraçado, estava escutando a nossa conversa todo
esse tempo!
— Não — imponho firme, mesmo que minhas cordas vocais doam
pela aflição. — Não quero espaço com esse homem, não quero ouvir ou vê-
lo — digo, olhando para o meu pai. — O senhor quer que eu saia, peça a
um dos seguranças para me levar.
Romeo assente, e eu odeio isso. Odeio até que esta decisão
pertença a ele, odeio como ele consegue me fazer sentir tão pequena com
gestos tão insignificantes. Não consigo olhar nos olhos dele, sinto-me
humilhada e constrangida pela cena que presenciei, odeio todos esses
sentimentos que ele está me fazendo sentir.
Capítulo 20

Desço do carro e ando com passos rápidos para dentro de casa, tive
pouco tempo para pensar no que fazer com nossa relação, mas cheguei à
conclusão de que o melhor para mim é que ele vá dormir em outro quarto.
Romeo pode me ter de volta em sua casa, mas não terá em sua
vida.
Entro no quarto, depois me tranco no banheiro e me escoro contra
a porta, arrancando o vestido que havia comprado pra esse maldito feriado.
Escorrego até o chão, ficando sob os calcanhares, enxergo meu reflexo no
grande espelho à minha frente, a vermelhidão e o inchaço dos meus olhos
certamente podem ser enxergados do espaço sideral.
— Sienna. — Romeo dá dois toques suaves na porta.
Me levanto com as pernas tremendo, ligo o chuveiro e me tranco
no box, abafando qualquer justificativa que ele queira dizer. Escorrego para
baixo da água quentinha, sentindo-a limpar as minhas lágrimas.
Traço o polegar pelo braço o hematoma já está sumindo, mas ainda
permanece dolorido, posso parecer masoquista, mas gosto da forma como
dói e, principalmente, de como purga as impurezas dos meus pensamentos
quebrados. Meu coração encolhe e meu eu interior suplica para aliviar a
ansiedade que se alimenta do meu elemento. Não aguento mais ter que fazer
isso, devia ter pegado aquele ‘Boa Noite, Cinderela’ e ingerido após a
cerimônia.
Eu queria que Romeo fosse leal a mim, mas como pedir lealdade se
quando tudo que eu faço é mentir para ele?
— Sienna, saia, vamos conversar. — A voz de Romeo abre um
buraco incandescente no meio do meu peito, e a tentativa de descartar
qualquer pensamentos autodestrutivos vai embora quando aumenta o desejo
de fazer essa sensação pavorosa sair de mim.
Enterro os dentes em minha pele, a dor atravessa meu corpo,
fazendo meu coração bater na cabeça, silenciando todos os meus
pensamentos. Me ajoelho no chão do box e permaneço ali até não ter mais
lágrimas para derramar.
Desligo o chuveiro e me enrolo em uma toalha sem alternativa, não
posso ficar presa nesse banheiro para sempre. Abro a porta, e Romeo está
sentado aos pés da cama, é difícil ignorá-lo, sua presença domina cada
canto do quarto. Entro no closet e deslizo pelo meu corpo as peças íntimas
rapidamente, antes que ele resolva entrar aqui, penso, e o desgraçado já está
ocupando a passagem da porta.
— Não pode me ignorar para sempre, Sienna.
Isso é o que veremos.
Puxo a camisola mais simples que encontro e a coloco de costas
para ele, ajustando a minha expressão de indiferença, Romeo sufocará com
meu silêncio, já que isso é tudo que eu posso lhe dar, e não há nada que ele
diga que consertará o que ele fez conosco. Me viro para meu indigno
marido, sentindo meu braço latejar, me concentro apenas nos picos de dor
no instante em que passo pelo pequeno espaço entre ele a parede.
— Você me pediu que ficasse longe — explica às minhas costas.
Pedi na hora da raiva, quando dizemos coisas que não devemos,
mas isso é só um detalhe técnico, você me traiu, Romeo, e não vai me
culpar por comer outra mulher!
Encontro minha bolsa de mão em cima da cama e pego o meu
telefone de dentro.
— Você me odeia, me abomina e, em muitas vezes, não fez
questão de esconder isso. Não sei o que esperava de mim.
Odeio com todas as minhas forças, agora mais que nunca.
Coloco meus sapatos confortáveis de ficar em casa, ignorando
Romeo às minhas costas, ele parece uma mosca zanzando em volta de mim,
o que está me deixando irritada.
— Eu não queria magoá-la, pêssego — ele profere baixo e seu tom
é vacilante.
Você me traiu, cacete, por que permanece à minha volta? Por que
está tentando mostrar que se importa? Quando claramente não está nem aí.
A cachoeira ameaça entrar em ação, mas cerro o maxilar a ponto
de partir, não vou dar esse gostinho a ele.
Puxo um travesseiro, melhor eu sair desse quarto antes que perca a
minha paciência. Ficarei em algum de hóspedes e amanhã peço a Agnes
para remover as tralhas dele daqui.
— Está sendo imatura. Isso nem é a porra de um casamento de
verdade, você sempre me afasta, o que queria que eu pensasse? — entoa, e
sinto sua frustração.
Você comeu outra mulher, caralho, nada que diga ou faça irá me
persuadir a argumentar com você!
Viro-me para deixar o quarto com o travesseiro e o telefone na
mão, Romeo me pega pelo braço machucado sem muita força, mas o
suficiente para me fazer gemer com a dor aguda. Seus olhos se estreitam de
forma avaliadora e correm pelo meu braço, o empurro com força, sem
efeito algum enquanto retira a seda que esconde minha lesão.
— Você fez de novo — ele emite pesaroso, e suas palavras
queimam como lava em meu estômago.
— Não me toque e não sinta pena de mim! — esbravejo com
ferocidade e me vejo sair do meu elemento.
— Eu sinto muito.
— Será que sente mesmo? — sibilo com cólera.
Puxo meu braço, e Romeo não me solta.
— Você me dá nojo!
Tenho nojo dele, nojo do toque dele, duvido que tenha tomado um
banho desde a última hora que estava comendo aquela mulher. Fecho
minhas mãos com força e minhas ações irrefletidas tomam conta da minha
mente enevoada. Meu punho acerta o rosto de Romeo, e sua cabeça é
empurrada para a esquerda, em um estalo alto.
Romeo me olha consternado. E o que me deixa ainda mais puta é
que ele nem tentou me impedir. Dou um murro no seu peito e depois outro e
mais outro, até seus dedos me soltarem, e continuo esmurrando-o, mesmo
que já tenha perdido minhas forças, mesmo que não cause nenhum impacto
nele.
Tremo de raiva, tantas decisões erradas que me levaram cada vez
mais para o fundo do poço. Não sei como deixei as coisas chegarem nesse
ponto, então, Piero surge em minha mente.
Me afasto de Romeo, minha cabeça está uma confusão do caralho,
estou com tanto ódio dele que nada mais importa, eu só quero fazê-lo sofrer
como fez comigo.
— Ouça... — Ele se aproxima.
— Eu transei com o seu irmão. — Escuto as palavras passarem
pela minha boca de forma libertadoras.
Romeo para no caminho, estreitando as sobrancelhas,
incompreensível.
— É por esse motivo que não pude me entregar a você.
— Está mentindo — afirma, e a tensão cresce em sua face. — Não
envolva o meu irmão, Sienna — diz em tom de aviso.
— Sabe uma coisa que nunca entendi? Por que se importa tanto
com Piero quando tudo que ele deseja é te apunhalar pelas costas?
— Piero jamais te tocaria — ele brada entredentes, e me pergunto:
será que eu agiria assim caso Fiorella fosse a acusada?
— Mas tocou, antes e depois do casamento, dentro dessa casa,
nesse quarto... — Minhas palavras soam como o veneno de uma cobra.
A expressão de Romeo é tão perversa que me choca até os ossos.
Ele me empurra para trás na cama, montando em meu quadril e engulo o
desconforto subindo pelo meu peito enquanto tento me mexer debaixo dele.
Seus dedos se fecham em torno da minha garganta sem esforço, e Romeo se
aproxima, tocando a sua testa na minha, me dominando.
— Está me dizendo que me traiu com meu irmão nessa casa, em
nosso quarto? — sibila e seus dedos apertam minha pele com precisão.
— Piero abusou de mim quando eu disse que não queria trair você.
— A expressão de Romeo se mortifica e ele se afasta como se tivesse sido
queimado, plenamente desorientado.
Me sento e atravesso a cama, pegando distância dele.
— Quando? — pergunta.
— Durante a sua viagem.
— Por isso queria ir comigo — afirma, e minhas lágrimas rolam
quando eu assinto.
Romeo me dá as costas e consigo enxergar a tensão se expandir
nos músculos das suas costas, a raiva intensa e desenfreada o domina, e ele
extravasa destruindo o quarto inteiro.
— Devia ter me contado — ruge e sua ira me atravessa.
— Eu não podia falar — digo e um soluço me escapa com força.
— Ele estava me ameaçando.
— Com o que, Sienna? — pergunta com a voz alterada e atravessa
o quarto parando à minha frente.
Engulo todo o meu pavor, assumindo o autocontrole, ou pelo
menos tentando.
— Piero me deu uma droga para colocar em seu drink nas núpcias.
Se tomasse a metade, você desmaiaria; tudo, morreria, eu não tive coragem
de usá-lo. Então, depois que ele nos viu na jacuzzi pelas câmeras do
pergolado, ele ficou muito irritado. Pegou a droga de volta e disse... — a
cena me vem à mente e me sinto enjoada — que, se eu não o chupasse, diria
a você que eu estava conspirando com a Famiglia, pois estava desconfiado
da conversa que tive com Franco enquanto dançávamos.
— Vou matá-lo — declara com os dentes cerrados e se levanta
bruscamente.
Não tento conter Romeo quando ele pega das poltronas o coldre
com suas armas e sai, vestindo-o, então ele para no batente da porta e se
vira para mim de repente.
— Tentou matá-lo com as castanhas — menciona como se tivesse
tido uma epifania.
Aceno levemente, e Romeo me deixa no quarto. Deito-me para
trás, consumida por esse dia e com a sensação de que comecei outro
incêndio, do qual Piero não vai conseguir se safar.
Uma espécie de riso se forma nos meus lábios e, tirando a dor da
traição, não sinto mais peso algum em meus ombros e, pela primeira vez
desde que entrei nessa casa, eu posso ser eu mesma.
Capítulo 21

Eu já cometi mais assassinatos que posso lembrar. Homens e


mulheres de diferentes idades, por diferentes motivos. Matar e mutilar
nunca foi um problema, era apenas mais um trabalho como qualquer outro.
Só que tirar a vida do meu irmão, por mais que ele mereça ter cada membro
do seu corpo arrancado por uma serra elétrica, é algo que nunca passou pela
porra da minha cabeça.
Agora me dou conta de como Piero é insensato e burro pra caralho.
Tantas garotas para ele foder nas boates da Outfit, e ele escolheu logo a
minha mulher.
Pensar em ambos juntos e em como tudo ocorreu bem debaixo do
nariz de todos, principalmente do meu e eu não enxergar, me faz sentir um
velho medíocre. Todos os sinais que Sienna me dava, tentando se manter
afastada de Piero, e tudo que eu acreditava era que ela estava sendo apenas
presunçosa. Nossa, se ela tivesse me contado antes, podíamos ter resolvido
isso de outra forma! Queria saber o que ela supôs que eu faria só por ter
perdido a virgindade antes do casamento, a honra dela não se alteraria em
nada para mim, o difícil de engolir é saber que ela escolheu fazer isso com
Piero.
Santo inferno, quero arrancar as entranhas dele com as minhas
mãos.
Desço em frente ao seu novo apartamento, fica em Gold Coast, um
bairro nobre de Chicago. Conversei com Piero hoje à tarde, depois que
Sienna me pegou com a calça arriada.
Que porra de situação! Queria poder arrancar da minha cabeça a
expressão em seu rosto: choque, nojo, decepção. Ela nunca vai me perdoar,
mesmo que minhas razões sejam válidas. Sienna me rejeitava toda vez que
eu tentava algo, disse que eu sou o seu inferno e me pediu para me afastar,
quase na mesma frase. Estava exausto e precisava enfiar o meu pau em
qualquer boceta. Eu não me envolvi com mais nenhuma mulher desde que
foi anunciado o nosso noivado, que ocorreu há quase três meses. É tempo
pra caralho.
Deus, se eu soubesse o que ela estava passando, transar seria o
menor dos meus problemas. Meu casamento durou menos que a luta entre
Jorge Masvidal e Ben Askren, quem sabe matar Piero me renda pontos.
Quero rir disso, mas, na verdade, sinto algo que não tenho há muito
tempo, tristeza. Ele é a minha família, e todas as decisões que tomei desde
que fugimos de Apúlia foi para protegê-lo de um pai bêbado, estuprador e
agressivo, e Piero se transformou nele.
Giro a maçaneta, e está destrancada, atravesso a porta com
cuidado, olhando o interior escuro. Piero me falou mais cedo que recebeu
alta do hospital, aparentemente ele esteve aqui, a casa permanece arrumada,
exceto pelas malas ainda no chão.
Entro mais no espaço da sala e escuto um revólver destravar atrás
do meu ouvido esquerdo. O cano frio pressiona próximo à minha nuca, me
provocando uma sensação desagradável não por ter uma arma apontada
para mim, mas por ser imbecil do meu irmãozinho.
— É assim que recebe um irmão? — pergunto, me afastando do
cano, mas Piero a pressiona com mais força na minha cabeça.
— Não fode. Acha que sou idiota? — grunhe em meu ouvido.
— Não, mas está agindo feito um, qual é a porra do problema,
Piero? —pergunto.
— O que está fazendo aqui, Romeo? A essa hora da noite? Carlo
disse que você foi buscar Sienna, não devia estar lambendo sua esposa e
pedindo perdão?
— O quanto de drogas eles te deram no hospital? — desconverso,
não reconhecendo mais meu irmão e, se ele souber que vim até aqui para
matá-lo, não hesitará em puxar o gatilho.
— Estou lúcido pra caralho. — Ele afrouxa o aperto do cano. —
Agora me diga o que está fazendo aqui?
— O que você acha? — questiono retoricamente. — A Barbie
ficou surtada depois que me viu comer a puta da Coral. Tem drama demais
naquela casa. — Piero sorri, isso o anima, desgraçado.
— Ela chorou?
— Feito um bebê, o que me fez ficar ainda mais duro, acredite. —
O estupido ri e se afasta.
— Foi mal, depois do jantar, fiquei com o pé atrás.
— Não achou que eu viria até aqui para matá-lo, não é? —
pergunto, vendo-o guardar a arma.
— Não, irmão.
Sorrio.
— Então achou errado, seu boçal.
A expressão no rosto de Piero é impagável, sua mão volta para
dentro do paletó, puxando a arma, seguro em seu punho e torço para o lado,
a arma dispara, clareando o cômodo e repercutindo vibrações em meu
corpo, aplico mais força em seu membro e, na mesma hora em que agarro o
seu pescoço com a mão direita, a pistola vai ao chão.
— Você não devia ter tocado nela nem nos teus sonhos mais
fantasiosos — profiro, empurrando-o pela garganta, ele grunhe algo
indistinguível e cai para trás em cima das malas, comigo sobre seu corpo.
Sinto sua corrente sanguínea em meus dedos, cada batimento do
seu desespero me traz ondas desagradáveis e repulsivas, acredito que
Sienna tenha sentido o mesmo quando ele estava a machucando.
Nunca fui misericordioso, já aceitei que não existe salvação para
minha alma, e matar o meu irmão sem lhe dar o benefício da dúvida é o que
me deixa mais perto do inferno.
Piero tenta me empurrar com as pernas enquanto desfere golpes em
minhas costelas, golpes que se tornam cada vez mais fracos. Seus olhos se
fecham com força e lágrimas escorrem por suas têmporas, fazendo meu
fodido coração queimar no peito, meus dedos vacilam e odeio essa
sensação. Hesitação.
Suas pernas paralisam, indicando que está no fim, Piero abre os
olhos tão vermelhos quanto seu rosto e de repente uma dor pungente
atravessa o meu abdômen, uma lâmina me rasgando mais vezes que consigo
contar. Alivio o aperto em seu pescoço, descendo uma mão pelo meu torso
e sentindo uma queimação do caralho se expandir pelo meu corpo.
A mão que empunha a faca sobe em direção ao meu rosto, me
esquivo do golpe totalmente impreciso e vergonhoso, provocando uma onda
de dor em meus cortes.
Seguro em seu punho e o bato no chão até a faca cair da sua mão, e
outra corrente lancinante me domina na hora em que ele aprofunda os dedos
nas lesões da faca. Meu corpo se contrai, Piero encolhe o joelho entre nós e
me empurra com um gemido animalesco, cambaleio para o lado, caindo no
chão, ofegando. Ele se arrasta para longe de mim, enquanto cubro os meus
cortes, sentindo o sangue escorrer entre os meus dedos.
— Você está velho e acabado — diz com uma voz rouca e
ofegante, tentando ficar em pé e de repente escutamos a sirene da polícia.
Que caralho.
— Devia ter metido uma bala no meio da sua cabeça, mas daria
muita bagunça. — Tento me mover, mas dói como o inferno.
— Quem sabe na próxima.
Piero me olha de relance na escuridão e desaparece em segundos,
desgraçado, minha cabeça cai para trás, sem forças para me levantar. Escuto
passos na escada do lado de fora, em seguida, dois policiais entram com as
armas em mãos.
— Cavalheiros — saúdo.
Carlo não vai gostar nadinha disso.
Uma lanterna clareia o meu rosto desnecessariamente.
— Senhor Ferraro.
Hum, talvez seja o meu dia de sorte, sorrio e a dor se espalha.
— Policial Castilho e Forsing, há quanto tempo — respondo, e a
central da polícia chama um deles no rádio, pedindo confirmação do
disparo.
Maldito bairro residencial.
— Foi o escapamento de uma moto — Forsing declara, olhando
para a minha mão amparando o sangue.
— Não poderá ir para o hospital — me avisa em seguida.
Reforço a minha cara feia, que porra ele pensa que eu sou? Uma
criança?
— O que houve aqui, Ferraro? — Castilho pergunta, olhando em
volta.
— Discussão entre irmãos — respondo, puxando o meu telefone
do bolso. — Não vou me esquecer dessa gentileza — asseguro.
Ambos já estão na folha de pagamento há alguns anos, eu não
gosto de policiais, mas eles são úteis infelizmente. Espero eles saírem e ligo
para o Ezio, mando-o deixar os seguranças da casa em alerta, vir me buscar
e trazer mais dois seguranças consigo. Preciso de alguém de guarda caso o
infeliz do meu irmão resolva dar as caras para pegar suas coisas.
Escoro a cabeça para trás sem forças, o desgraçado não hesitou em
pôr a porra de uma arma na minha cabeça, e eu, idiota, hesitei em tirar sua
vida, porque é minha família.
Capítulo 22

— Que confusão do caralho — Maeve profere, tomando o shot de


um dos uísques mais caros do Romeo.
Acho que escutei essa frase dela mais de umas dez vezes na última
hora. Estamos jogadas na sala principal, já que Romeo destruiu o nosso
quarto, e parcialmente bêbadas, nem precisei contar como foi minha Ação
de Desgraças, ela estava escondida em um dos quartos durante a briga
inteira.
— O que fará em relação ao Romeo depois que ele eliminar Piero?
— questiona, acredito que ela esperou até que eu estivesse bêbada para me
fazer essa pergunta.
Relaxo minha cabeça na almofada e me viro para ela, encarando
seus olhos sem saber o que responder.
— Queria que ele se matasse depois. — A garota me lança um
olhar incrédulo. — Ah, para, não o defenda para mim — repreendo,
fazendo-a erguer as mãos para o alto.
— Estou do seu lado, Barbie. — Reviro os olhos — Só que — ela
hesita e sei que vou odiar o que dirá —, ele vai matar o próprio irmão por
você, quer declaração de amor maior que essa?
— Amor? — Rio com escárnio. — Romeo quer matar Piero
porque está com o ego ferido. Bruto do jeito que ele é, acho incapaz de
amar alguém que não seja igual a ele.
— Talvez o tempo ajude — diz modesta, e não disfarço minha
expressão de irritação.
Só uma máquina do tempo para ajudá-lo.
Escoro minha cabeça nas almofadas do sofá e fecho os olhos,
exausta, sentindo tudo girar, está tão tarde, mas sei que, se eu subir para
aquele quarto, ficarei me torturando com cada detalhe desse dia sórdido.
Maeve encosta a cabeça na minha, e me sinto relaxar quase que na
mesma hora. A única parte boa de tudo isso é que tenho alguém para dividir
a minha desgraça.

Acordo de repente sendo sacudida fortemente pelos braços, fico


desorientada por um momento, com a mente e os olhos enevoados.
— Sienna! — Maeve grunhe.
Encaro a garota com os olhos arregalados e, quando ela se retira da
minha frente, tenho que piscar os olhos para ter certeza de que não estou
delirando pelo excesso de álcool quando vejo a sala rodeada de homens de
terno.
Ezio se aproxima fedendo a cobre e coberto por sangue, suas mãos
estão vermelhas, como se ele tivesse afundado seus dedos em um balde de
tinta, o encaro horrorizada, me sentindo presa em um pesadelo dentro de
outro pesadelo.
— Preciso de toalhas.
Balanço a cabeça, ainda sem entender que porra está acontecendo.
Me levanto e o segurança se afasta, revelando Romeo estático, deitado em
um dos sofás, meus lábios se separam com força, com o pânico ocupando
cada célula do meu corpo. Sua camisa social branca está integralmente
vermelha, e Romeo pálido, indicando que perdeu mais sangue do que
deveria. Dois soldados começam a arrancar suas roupas, Romeo nem se
move, embora ainda não esteja totalmente apagado.
Encontro o seu olhar distante e apático e sinto uma pontada
esporádica penetrar meu coração.
— Ele precisa de um hospital, e não de toalhas. — Me ouço dizer,
parece que, depois de uma eternidade, dou um passo em direção ao Romeo
e Ezio me puxa pelo braço.
— Pegue as toalhas, senhora, o médico está a caminho —
assegura, parece desgostoso, puxo meu braço dos seus dedos
ensanguentados, percebendo que estou apenas de camisola.
Maeve entra na sala com várias toalhas brancas e entrega-as para
Ezio, agradeço-a, pois não teria ideia de onde as encontrar.
Os homens se retiram da sala, deixando apenas meu segurança que,
nesse momento, pressiona uma toalha no abdômen de Romeo.
— Converse com ele, tente deixá-lo acordado — Ezio diz, pegando
o telefone do bolso, vejo Maeve me olhar de esguelha.
Eu queria que Romeo morresse, mas não necessariamente na
minha frente, e agora me sinto péssima por ter desejado aquilo, vê-lo
sangrar como um porco não está me fazendo sentir menos raiva dele, está
me fazendo sentir culpada pra cacete.
Maeve percebe minha indecisão e dá um passo à frente, mas a
seguro pelo braço. Romeo e eu continuaremos casados, independente da sua
galinhagem, terei de aprender a lidar com ele sangrando ou não.
Me aproximo e me ajoelho no tapete, ficando perto da sua cabeça.
Ele não se mexe, mas seus olhos encontram os meus, noto que está se
esforçando para mantê-los abertos.
— Vai morrer? — pergunto, e seus lábios se curvam em um
sorriso.
— Desculpe, pêssego, mas você não terá tanta sorte — expressa
com a voz baixa e arrastada de quem está perdendo as forças.
— Cadê a porra do médico? — pergunto a Ezio, que ainda mexe
no telefone.
— Estava em Springfield, com a família — responde, sem me
olhar nos olhos.
— Dói? — pergunto, e Romeo me dá outro sorriso. Aparentemente
a perda de sangue o deixa sorridente.
— Pra caralho — ele geme quando Ezio tira a toalha carmesim, e
sangue flui com facilidade pelos buracos do seu ferimento, cobrindo sua
tatuagem e escorrendo para o sofá, Ezio troca por outra toalha rapidamente,
pressionando sua lesão.
— O ferimento foi feito com o que? — Maeve pergunta às minhas
costas.
— Faca — Ezio a responde e depois direciona seus olhos em mim.
— Pressione aqui, eu vou encontrar o médico.
Ele se afasta, e eu me estico por cima do Romeo para segurar a
toalha, me sentando na borda do sofá. E sua mão ensanguentada cobre a
minha mão delicadamente enquanto seus olhos buscam pelos meus.
— Pêssego — murmura, e noto que faz com esforço, os dedos dele
sobem e se fecham em torno do meu pulso. — Não espero que me perdoe
por...
— Pare! — exclamo, o silenciando. — Não me faça pensar nisso
agora, é difícil vê-lo ferido e saber o que te levou a ficar assim, mas não
estou pronta para falar da sua infidelidade.
Fecho os olhos, tentando deter as lágrimas no canal lacrimal, é
fácil visualizá-lo fodendo aquela mulher como se tivesse ocorrido há
minutos, acho que nunca vou conseguir esquecer.
Ezio volta acompanhado do médico, eu presumo, um homem
jovem, de cabelos loiros e olhos castanhos, que me analisa por um
momento, enquanto o segurança solta uma mala grande em cima da mesa
de centro.
O médico a abre, esteriliza as mãos e depois coloca luvas de látex
rapidamente.
— É a esposa?
Assinto, vendo-o se aproximar.
— Erga a toalha. — Faço, e a expressão do médico não é das
melhores, ele faz sinal para baixar. — Pode se afastar agora, eu vou cuidar
dele — me assegura com um sorriso gentil, e sei que faz para me acalmar.
O que ele não sabe é que mais nada me afeta hoje.
Depois que o médico chegou, subi para o quarto, me lavei e troquei
minha camisola por um moletom. Não tive coragem de descer, de vê-lo
naquele estado. Eu o odeio intensamente pelo que fez conosco, só que,
depois de vê-lo sangrar como um animal, não consigo desejar o seu mal.
Sinto vergonha de mim mesma por ser tão influenciável.
— O médico já foi embora — Maeve avisa na porta. — Romeo
está medicado e tem mais pontos que um bordado de pano de prato. —
Torço o nariz.
— Acho melhor ele dormir lá embaixo, assim não tem que fazer
força para subir as escadas.
— Ezio disse a mesma coisa, mas queria saber o que você quer
fazer.
— Eu vou levar um travesseiro e uma coberta — aviso, saindo da
cama.
— O médico também pediu que a esposa desse um banho de leito
nele, para tirar o restante do sangue e manter a ferida limpa.
Olho para Maeve com a sobrancelha arqueada.
— Peça ao Ezio — aviso, puxando o travesseiro de Romeo da
cama.
— Seria como limpar a sujeira esfregando mais sujeira —
menciona e parece um pouco animada com o banho.
— Você quer lavá-lo? — pergunto, vendo-a franzir os lábios como
se eu tivesse pedido para ela dar banho em um leproso. — Cinquenta mil —
sibilo, ela gargalha, fazendo-me sorrir.
— Romeo está apagado, nem vai perceber sua presença — explica.
— E por que eu devia ajudá-lo? — questiono. — Se ele tivesse me
pegado com um homem, eu estaria sem os membros agora — menciono,
parando em frente do que parece uma cena de crime.
— Porque você é boa. — Rio.
— Burra para não dizer algo pior.
— Ezio disse que foram seis facadas. — Meu estômago embrulha,
isso deve ter doído horrores.
Maeve desliza a mão por trás do meu braço, chamando minha
atenção.
— Se quiser, eu arrumo uma água quente e um pano. — Assinto.
A garota me deixa só. Encaro Romeo apenas de cueca preta e
meias brancas atirado no sofá na mesma posição que antes, seu corpo largo
e robusto permanece coberto por sangue, exceto onde fica a lesão.
Ergo sua cabeça e deslizo o travesseiro com cuidado, Romeo abre
os olhos vermelhos como o sangue seco em seu corpo. Ele ainda está muito
pálido, com os lábios esbranquiçados.
— Está com fome? Deve estar se sentindo fraco.
Ah, Deus, eu vou para o céu.
— Estou me sentindo a pior escória da terra.
Maeve volta com uma bacia de inox da cozinha e me entrega,
depois coloca uma pequena toalha branca em meu ombro e se retira, nos
deixando a sós.
Solta a bacia em cima da mesinha, é melhor eu começar logo, antes
que a água esfrie, reflito, molhando o pano.
— Não precisa fazer isso — Romeo sussurra com as mãos inertes,
ao lado do corpo.
— Não se preocupe, não é por você. — É por mim, não
conseguiria dormir, não depois de vê-lo nesse estado, parece que seu corpo
está do avesso.
Começo a limpar o seu ombro esquerdo, onde não tem tanto
sangue, e vou descendo, revelando pequenas e grandes tatuagens, uma
mistura infinita de desenhos, que não consigo decifrar.
Molho o pano, deixando a água vermelha, o deslizo por suas
costelas, o corpo dele tremelica levemente, encontro seu olhar me
contemplando e pergunto:
— O que aconteceu com você?
Romeo vira a face para o outro lado e vejo a umidade em sua
têmpora.
— Estava sufocando Piero e... hesitei por um segundo. — O pomo
de Adão dele oscila e os músculos do seu peito ficam endurecidos pela
tensão. — Ele aproveitou minha fraqueza e me esfaqueou.
— Acho que também não conseguiria matar Ella — balbucio.
— Fiorella não é uma desgraçada fodida que merece morrer. —
Romeo inspira, mas não relaxa. — Piero voltará, sem passaporte e dinheiro,
não conseguirá ir muito longe.
Romeo se vira para mim, com os olhos úmidos e vermelhos.
— Prometo que vou encontrá-lo e acabar com ele.
Assinto.
Removo o máximo de sangue que consigo do seu torso e em volta
do curativo que o médico pôs e depois o cubro até a cintura, com um
edredom que Maeve me deixou as minhas costas.
Romeo segura em minha mão quando vou me afastar.
— Eu sinto muito, pêssego.
— Quero acreditar nisso — digo, livrando minha mão dos seus
dedos. — Vou pedir a Agnes para tirar suas coisas da suíte — aviso e lhe
dou as costas.
Preciso urgentemente ficar sozinha, aconteceu tanta merda em um
espaço tão curto de tempo que meu cérebro parou de processar as coisas
depois que Romeo chegou ensanguentado.
Subo para o quarto e a solidão abraça o meu coração, entre outros
sentimentos. Deito-me, me permitindo sofrer agora, pois amanhã quero
esquecer tudo isso.
Capítulo 23

DEZEMBRO

Paro em frente à parede de vidro do meu quarto e, enquanto bebo


um chocolate-quente, observo vários seguranças ao longo do pátio e alguns
homens da Prescott Construtora trabalhando no meu jardim. O que eles
estão construindo é uma ótima pergunta. Romeo não me contou, e eu não
fiz questão de perguntar, me sinto em um jogo do silêncio, onde só eu estou
me esforçando para ganhar.
Já passaram três semanas desde o infeliz Ação de Graças. Romeo
está quase cem por cento recuperado, ao contrário do nosso casamento.
Moramos na mesma casa e compartilhamos a sala de jantar todos os dias,
mas não trocamos quase nenhuma palavra, não por falta de tentativa dele.
E, depois que me proibiu de sair de casa até capturar Piero, confesso que
isso não me deixou nem um pouco animada.
Estamos a duas semanas do Natal, eu amo essa época do ano, gosto
de enfeitar a casa e de comprar presentes. Mas tenho o medo real de que
seja mais um feriado fodido, não tenho psicológico para mais desgraças.
Ouço uma suave batida na porta, olho por cima do ombro e Romeo
está escorado no batente. Sinto algo se agitar no meu interior, ele nunca
vem até aqui, pelo menos, limites, ele sabe respeitar.
Me viro para Romeo, encontrando o seu olhar, percebo que estou
me recuperando. Não dói tanto como antes, ainda que eu não consiga
esquecer.
— O que foi? — pergunto, vendo-o olhar em volta.
— Sinto falta daqui — profere com as mãos no bolso e desvia o
olhar para a claraboia.
Também sinto, Romeo ocupava muito espaço da cama e, de
alguma forma, era tão perfeito, nossos corpos se encaixavam como quebra-
cabeça, mas prefiro morrer a admitir isso.
— Sinto falta de sair dessa casa, infelizmente não dá para ter tudo
que quer — respondo e beberico meu chocolate-quente.
— Tenho algo para você. — Romeo tira as mãos do bolso, sem me
dar espaço para imaginação, revelando um frasco de comprimido laranja.
Ele encurta o espaço entre nós e me estende.
Que merda é essa? E a primeira coisa que surge em meus
pensamentos. Leio o nome e nem consigo pronunciá-lo.
— É para ajudá-la a conter a necessidade da autoflagelação.
— Sabe o que me ajudaria a conter? — pergunto retoricamente,
vendo seu maxilar ficar rígido.
Não ser usada pelo meu pai, abusada pelo meu cunhado e traída
pelo meu marido, a história da minha vida em uma frase.
— Tome você, talvez ajude na sua psicopatia — emito
naturalmente e atiro o frasco de volta a ele.
Romeo o solta com força a mais na estante ao seu lado e segura o
meu olhar com firmeza.
— Está magoada e com raiva, ok, mas o remédio não é um acordo.
Tome uma pílula, uma vez ao dia, leia a bula e, se der alguma reação
adversa, me avise.
Minhas narinas inflam pela irritação contida e sua ordem de merda.
Romeo suaviza a sua expressão severa e dá um passo em minha direção,
dou-lhe as costas na mesma hora e me afasto dele, olhando para a janela
novamente.
— Só quero o seu bem, Sienna.
— Então encontre Piero para que eu possa sair dessa casa —
respondo e ouço um suspirar e passos a seguir.
Romeo tem passado muito tempo fora de casa atrás de Piero, sei
disso porque toda vez que ele chega muito tarde, ou não vem para o jantar,
ele justifica sutilmente, deixando claro que não estava comendo outra
mulher. E, consequentemente, o meu cérebro perverso me leva direto para
sua traição.
Desço com minha xícara de chocolate-quente vazia, e a campainha
toca. Peço a Deus que não seja papai ou Dona, no dia seguinte à Ação de
Desgraças, o casal Santoro nos fez uma visita. Romeo precisou contar o que
aconteceu, incluindo as minhas escapadinhas com Piero, bem debaixo do
nariz de todos.
Dona chorou, papai surtou, foi um verdadeiro show de horror, e
agora tenho recebido mais visitas seguidas da minha madrasta quando tudo
que eu mais quero é ficar sozinha.
Agnes se apressa para abrir a porta, enquanto solto a louça na pia.
De longe, avisto minha prima Lilia, tirando um cardigan preto e longo,
ficando apenas de vestido branco. Não a vejo desde o casamento, e só há
um motivo para sua visita, conselhos de uma mulher traída para outra.
Deus, nunca pensei que passaria por isso.
Eu vou matar a Dona.
— Lilia — saúdo, andando até ela com um sorriso receptivo.
Dou um beijo e um abraço nela e a levo para a sala de estar.
— Sua casa é fabulosa — diz, sentando-se em uma poltrona,
agradeço-a e me sento ao seu lado, fazendo um sinal para Agnes trazer um
chá para nós.
— Dona pediu que viesse aqui? — pergunto sem rodeios, o único
lado bom de morar com Romeo é que não preciso mais fingir alegria o
tempo todo.
— Na verdade, foi seu pai.
— Como? — pergunto, sem disfarçar meu choque, a fazendo
sorrir.
— Acredite, disse a ele que não queria me meter, mas Antônio
falou que eu não podia recusar um pedido de Carlo. — Ela faz cara feia. —
Enfim, você não precisa me contar nada.
— Isso tudo é uma droga — digo, lamentando. — Como você e
Antônio estão? — Lilia relaxa, colocando seu cabelo loiro para trás da
orelha.
Na última vez que paramos para conversar, Lilia e seu marido
estavam como eu e Romeo, dormindo em quartos separados.
Posteriormente, comecei a me encontrar com Piero e acabamos nos
afastando um pouco.
— Estamos bem e não estou dizendo para convencê-la a se acertar
com Romeo, mas para tirar proveito da situação — diz, curvando os lábios
num sorriso. — As amantes são como fadas madrinhas, eu as chamo de
fadamante, peça o que quiser, e ele te concederá — explica, rindo.
Faço cara de nojo.
— Lealdade seria bom. — Ela ri, enrugando o nariz. — O que
você conseguiu que já não tenha, Lilia?
— Entrar para universidade, faço o curso à distância — explica.
— E, enquanto você se distrai nas aulas, ele come outra. — Lilia
suspira.
— A confiança foi a parte mais difícil de restaurar, Si, mas não é
impossível.
— E, no fim, você está tentando me convencer — comento,
pegando uma xícara de chá que Agnes deixou na mesa de centro.
— Estou te dando os fatos, o que você vai fazer, é problema do
Romeo — responde com um sorriso
— E está cursando o quê? — mudo de assunto, prometi a mim
mesma não ficar remoendo a história da traição.
— Finanças — expõe, animada, e sei que teremos assunto para o
resto do dia.

A tarde foi mais agradável do que eu esperava, Lilia não entrou


mais no assunto da traição, consegui focar em outras coisas e, por um
segundo, me imaginei nas aulas de balé novamente, eu era mais feliz
quando dançava. Percebo que as coisas desandaram quando deixei de
frequentá-las para me encontrar com Piero, o pior erro da minha vida.
Subo para o quarto, cogitando pedir a autorização de Romeo, mas,
para isso, teria que engolir o meu ego gravemente ferido e, mesmo que a
fadamante me ajude, sinto repulsa em apenas pensar nisso, Romeo não
permitiria até encontrar Piero.
— Sienna — Romeo me chama quando passo em frente ao seu
escritório. Dou um passo atrás, refletindo que hoje ele está falante demais
para a personalidade dele, indiferente.
— Pois não? — pergunto no batente.
— Vou levá-la para jantar.
Não consigo esconder minha confusão e, também, não faço
questão.
— O quê? — pergunto, questionando-me se ele sofreu de perda de
memória.
— Você quer sair de casa, estou disposto a levá-la, e podemos
olhar as luzes natalinas. — Um riso involuntário me escapa.
— Você — exprimo com ênfase — quer ver as luzes de Natal?
— Vai comigo, ou verá as luzes natalinas só no próximo Natal.
— Se está tentando ser gentil, devia engolir essa arrogância —
digo, dando as costas para ele.
Por mais legal que seria fazer algo diferente para variar e ver as
luzes natalinas, como faço todos os anos com a Dona, estaremos apenas eu
e Romeo e sua acessibilidade me cheira a armação.
Ele nunca foi claro sobre o que esperava do nosso casamento, foi
direto a somente uma coisa, que não ia me esperar para sempre, mas nunca
disse claramente que me queria como esposa, e tenho a sensação de que
isso vai acontecer e não estou pronta para dizer que sim. Para esquecer o
que ele fez e seguir em frente como Lilia fez com Antônio.
Entro no quarto e Romeo também.
— Estou tentando, Sienna — admite, e vejo seu maxilar tenso.
— Eu não pedi que fizesse isso.
— Pegue o casaco.
— Vai me obrigar a sair? — pergunto, perplexa.
— Vou — declara, enfiando as mãos nos bolsos. — No fundo,
você quer, então, vou ignorar o seu mau humor e te esperar no carro.
— Já que é clarividente, adivinha para onde estou te mandando
nesse exato momento.
Ele enruga os lábios.
— As opções são infinitas — diz com deboche e me dá as costas.
— Pro caralho — grito quando ele deixa o quarto.
Merda!
Pego o primeiro sobretudo que encontro no closet e desço de calça
jeans e tênis, com zero vontade de sair com ele.
Deixo a casa vagarosamente, sentindo o frio aprofundar-se em meu
corpo, entro no Rover e bato a porta do carro com força desnecessária,
Romeo trava o maxilar, e lhe dou um sorriso.
— Aonde você quer ir? — pergunta, dando a ré.
— Para a casa. — Ele reforça sua cara feia e lhe dou um olhar
despretensioso.
— Vamos ao restaurante onde tivemos nosso primeiro encontro.
— Aquilo não foi um encontro, estava tentando me livrar de você
— digo secamente, cruzando os braços — e seu irmão estava me
intimidando no banheiro, por isso chorei, e não porque sou jovem, ingênua
e inexperiente — relembro-o.
Romeo aperta os dedos no volante, acredito que, se ele fizer mais
força, é capaz de arrancá-lo.
— Podia ter me contado, Sienna.
— Nossa, isso nem passou pela minha cabeça! — escarneço e viro
o olhar para a rua, sentindo o meu coração acelerar.
O caminho até o restaurante é silencioso, e tudo que menos sinto
nesse momento é fome, estou irritada pra cacete, não quero brigar e piorar
as coisas entre nós, mas ainda é difícil para mim, pois fingir que está tudo
bem, nesse caso, não é opção.
Romeo estaciona em frente a outro restaurante, D'ile de France,
pelo menos ele tem bom senso, penso, e deixo o carro assim que ele abre a
minha porta, olho à nossa volta e, além de Ezio, tem mais dois seguranças
da casa.
Entramos no restaurante e um jovem recepcionista anda em nossa
direção com uma expressão jovial, com certeza novato.
— Boa noite, senhor e senhorita. — Sorrio quando Romeo dá o seu
sutil olhar de desdém para o garoto. — Aguardem só um momento, minha
colega acompanhará o senhor e sua filha até a mesa. — O garoto sorri para
mim, e lhe dou uma piscada sutil.
— Já esteve neste restaurante, pai? — dou ênfase, vendo a uma
veia se destacar no pescoço do meu promíscuo marido.
— Não, e me lembre de nunca mais voltar — sibila, uma jovem
mulher aparece à nossa frente, ela nos conduz pelo requintado restaurante
com um toque francês.
Nos sentamos em uma mesa para dois, longe das janelas de vidro,
Romeo puxa a minha cadeira, como sempre, um maldito cavaleiro. O
garçom se aproxima com o cardápio, e me pego lendo uma imensa lista de
comida, pensando que esse jantar está sendo mais estranho que o primeiro.
Realizamos nosso pedido e, assim que ficamos a sós, o clima pesa como
uma nuvem negra em cima da mesa.
Aqueles olhos escuros e inquisidores me encaram e, ao contrário
de Romeo, um robô sem emoção, eu odeio esse tipo de circunstâncias, ele
sabe disso e parece que fez de propósito. Minha perna se torna inquieta
enquanto olho para as pessoas além dele.
— Quer passar o Natal com sua família? — pergunta, chamando
minha atenção.
— Prefiro cozinhar a ter que suportar tantos olhares pesarosos em
uma única noite.
— Sienna. — Sua expressão suaviza, como o seu tom de voz.
— Não vamos falar sobre isso — imponho, não em um lugar
cercado por pessoas civilizadas, onde não posso surtar e te bater, reflito.
Aposto que agora ele se arrependeu de ter me trazido jantar, é mais
fácil ignorá-lo em casa, estamos a sós, e Agnes faz questão de sumir das
nossas vistas quando estamos no mesmo cômodo.
Jantamos sem trocar uma palavra, tomei duas taças de vinho, o que
me deixa com a imaginação solta e as pernas levemente bambas, penso ao
andar atrás de Romeo em direção ao caixa na saída.
Esse foi o jantar mais rápido da face da terra, veremos se ele ainda
deseja ver as luzes de Natal.
— Romeo Ferraro — uma voz feminina e animada o saúda.
— Há quanto tempo, Amélia — responde, me puxando para o seu
lado e revelando a cônsul que me viu com Piero no lobby do hotel.
Oh, céus, vê-la na presença de Romeo certamente faria meu
coração saltar pela boca, se fosse em outra hora.
— Está é a...
— Sienna, se bem me lembro — ela se antecede com um sorriso
—, Piero nos apresentou há alguns meses, jamais esqueceria de um rostinho
tão angelical.
— É um prazer vê-la novamente, senhora Sharma.
Sinto os olhos dele em mim, o ignoro e nos despedimos dessa
mulher tão gentil. Romeo pede para Ezio fazer o pagamento e segue na
minha frente para o carro. Nada que mais discórdia para apimentar a nossa
relação.
Deslizo para o banco e Romeo faz o mesmo, dessa vez, batendo a
própria porta. Reparo no seu temperamento um tanto alterado e permaneço
em silêncio.
— Quem mais sabe? — pergunta, sem tirar os olhos da estrada,
com os dedos agarrados ao volante. — Seu segurança? Dona? Fiorella?
— Não me pergunte coisas que não quer saber.
— Como escapava bem debaixo das vistas de todos?
— Isso não importa mais, Romeo — declaro, voltando com minha
perna inquieta e sentindo meu coração ficar apertado.
— Gostava dele — afirma — Sempre gostou, desde novinha, então
por que não pediu ao Carlo para se casar com ele?
— Eu tentei, Piero não quis — respondo, e Romeo engole seco,
ficando rígido.
— Continuou com ele depois do noivado? — Sua voz exprime
irritação.
— Pare de me atormentar com o seu irmão! — exclamo com as
mãos em punhos. — Você não tem esse direito — entoo, sentindo as
lágrimas escaparem dos meus olhos e o meu sangue borbulhar na cabeça.
Romeo fica em um silêncio profundo e ensurdecedor. Fico tensa no
banco do carro, mas, em vez de alimentar essa discussão na minha mente,
olho pela janela centenas de luzes e enfeites de Natal ao longo da estrada.
— Quer descer? — pergunta com a voz calma quando para em um
semáforo.
— Não, só me leve para casa, por favor — peço, sem tirar os olhos
da janela.
Dentro de instantes, ele estava estacionando dentro dos portões.
Tento descer, mas as portas estão travadas ainda, viro-me para ele, e Romeo
está recostado, olhando para o volante.
— Eu fui invasivo e desnecessário — assegura, encontrando o meu
olhar. — É fustigante ter poder e dinheiro para reparar coisas quando tudo
que desejo, o dinheiro não pode consertar.
Suas palavras soam sinceras, quero confiar no Romeo, mas ainda
não consigo.
— Quem sabe o tempo conserte — expresso, olhando para os meus
dedos na maçaneta, Romeo a destrava, e desço, buscando por ar.
Ando para dentro de casa sem esperar por ele, antes que eu faça
algo do qual me arrependa.
Capítulo 24

DUAS SEMANAS DEPOIS

— Quero que pare de procurar o seu irmão — Carlo muda de


assunto, de repente, fazendo-me quase cuspir o uísque no chão. — Coloque
Ezra atrás dele.
— Não deve estar falando sério — profiro, colocando o copo na
mesa de centro do seu escritório.
— Você teve um mês para achá-lo, e todos sabemos que Piero não
era dotado de inteligência, ele conhece as suas táticas, Romeo. Coloque
Ezra ou começarei a pensar que não quer encontrá-lo.
Piero me deu seis facadas, meu desejo é estripá-lo com a mesma
faca. É irônico isso vindo de Carlo. O Chefe que permitiu a deserção do
próprio herdeiro, colocando em perigo a organização e a família. Sorte a
nossa que Rocco se foi para sempre, saiu do país e só Deus sabe onde está a
esta hora.
— Eu quero arrancar a cabeça dele mais que qualquer coisa na
minha vida. Vou fazê-lo pagar por todo mal que provocou em sua filha, tem
a minha palavra.
A relação entre mim e Carlo virou uma merda depois que trai a
Sienna. A frieza dele não chega nem perto do comportamento dela comigo,
uma parte de mim gosta da sua determinação em me manter afastado, a
outra parte, meio que quer obrigá-la a me aceitar como seu marido.
A pior foda da minha vida está me rendendo uma dor de cabeça do
caralho.
Fico em pé, e Carlo faz o mesmo.
— Virão para a ceia de Natal? — indaga quando estou chegando à
porta.
— Sienna não quer sair.
— E como culpá-la, não é?
Argh. Ele nunca vai me deixar esquecer, quinze anos de serviços e
serei sempre lembrado como o traidor. Se eu tivesse feito como muitos
outros homens, a pegado na força, talvez fosse um homem digno sob seu
olhar agora.
Eu prometi que não a machucaria, embora, na hora da raiva, essa
promessa se torne nebulosa em minha mente, eu ainda não a quebrei, pelo
menos fisicamente.

Estaciono em frente à casa, desço do carro e faço a volta nele,


abrindo a porta do passageiro. Eu não tinha a menor ideia do que comprar
para Sienna de Natal, não sei nem se devia dar algo a ela, provavelmente
ela tocará fogo.
Apanho do carro um buquê de quinhentas rosas-vermelhas,
torcendo que ela não me bata com ele. Passo por Ezio e seus lábios se
curvam num risinho.
— Acho melhor manter essa maldita boca fechada — exprimo com
um sorriso, arrancando o dele da sua cara.
Nunca dei flores a ninguém, nem mesmo levei em funerais, mas
sempre via o olhar de Francesca deslumbrada e emocionada quando Carlo
lhe dava flores. Depois que ela faleceu, as emoções dele se tornaram duras,
ele parecia enferrujado para o amor, mas Dona rompeu qualquer barreira
que o homem fodidamente enlutado tinha erguido.
Entendo que a família seja importante para Carlo, mesmo que
tenha que abrir mão das meninas, ele nunca deixou de se preocupar com
elas. Principalmente com Fiorella, vivendo tão longe e sendo a caçula.
Eu cresci em um lar conturbado de merda, era preferível passar
fome a morar sob o mesmo teto que meus pais. Posso ser todo fodido, fazer
coisas erradas, mas Sienna não precisa conviver com esse lado.
Ela é pura luz, não merece a minha escuridão.
Atravesso a porta de entrada, sentindo-me na casa do Papai Noel.
Em quarenta anos, nunca tive a porra de uma árvore de Natal, a agora há
uma brilhante e cheia de bolas douradas e vermelhas ao lado da lareira na
sala.
Sienna está deitada de bunda para cima em um dos sofás, ela usa
uma meia grossa vermelha até o joelho e um vestido curto de lã branco, que
cobre apenas seu traseiro, deixando o espaço das coxas de fora.
Me aproximo dela, chamando sua atenção, Sienna olha para o
buquê encantada, seus lábios se abrem brevemente, mas ela os fecha com
força, escondendo o início de um sorriso, o que ela não consegue disfarçar é
o brilho de deslumbramento nos olhos.
Cacete, devia ter comprado as flores antes.
— Isso aí é para substituir a árvore de Natal? — pergunta
retoricamente, com uma expressão pretenciosa.
— Você gostou? — Ela dá de ombros, indiferente.
— São rosas, até os mortos gostam. Eu só não sei se teremos um
vaso que suporte... — Ela examina as flores.
— Quinhentas — digo.
— Uau — exprime, mas sem muita animação. — Não comprei
nada para você.
— Tudo bem, não costumo receber presentes — explico e me viro
para procurar Agnes, visto que Sienna não se levantou do sofá.
Bom, pelo menos, ela não me bateu com o buquê.
Maeve me encara com as rosas e enruga os lábios.
— Fez mais alguma merda ou ainda está compensando a anterior?
— pergunta, mastigando a ponta de um lápis, sem modos algum.
— Tem sorte que é mulher — respondo secamente, soltando esse
puta buquê na ilha. — Ela viu o estúdio?
— Não que eu saiba — diz, voltando-se para o seu livro aberto.
— Pensei que estivesse de férias — comento, pegando uma garrafa
de cerveja.
— Estou, isso é para uma empresa que estou tentando conseguir
estágio.
— Talvez eu possa ajudar.
— Não se preocupe, já tem problemas demais para cuidar. — Ela
sorri.
Agnes entra na cozinha com vários panos de prato e fica
boquiaberta ao ver as flores.
— Se me permite dizer, são muito lindas, senhor. — Maeve revira
os olhos, ela acha Agnes formal demais.
— Pode encontrar um vaso que caiba quinhentas rosas, Agnes? —
Sienna questiona atrás de mim, me viro para ela e sua indiferença a minha
presença consegue ser quase tão fria quanto à minha naturalmente.
— Ih, senhora, não tenho certeza, mas acho que podemos pôr em
um balde por enquanto — exprime e se retira em seguida.
Sienna sobe para o segundo andar, possivelmente para o quarto, ela
passa muito tempo lá quando estou em casa, o que faz me sentir um lixo de
homem. Estou ficando sem ideias de como me redimir. E se não tiver mais
conserto?
Não posso obrigá-la a me aceitar... Na verdade, até posso, mas não
faria isso com ela.
— Hey. — Maeve estala os dedos, chamando minha atenção.
— Ela vai me odiar para sempre — comento.
— Dezessete anos se passaram para eu descobrir que uma boceta
derruba você. — A cerveja quase volta pelas minhas narinas.
— Pelo amor de Deus, não use esse vocabulário comigo. — Maeve
ri, fechando o livro.
— Devia fazer um pedido de desculpas simples, sem grandes
presentes, ou ideias mirabolantes, tudo isso não a comove. Sienna sabe que
tem dinheiro para comprar o que almeja, ela precisa de desculpas sinceras,
saber que você está disposto a perdê-la se isso a deixa feliz.
— Mas não estou disposto a perdê-la.
— Então se fode sozinho — Maeve profere, levando minha garrafa
de cerveja à boca.
Pirralha desgraçada, talvez esteja certa.
Vejo Sienna terminar a quarta taça de vinho sentada ao meu lado
na mesa de jantar, ela está relaxada e seus olhos com brilho a mais.
— Devia estar misturando álcool com as pílulas? — Ela ergue seu
olhar encontrando o meu e solta um pequeno riso, acredito que esteja
começando a ficar alegrinha.
— Devia ter me lembrado antes da quarta taça — diz, pegando no
bico da garrafa de vinho, mas a seguro no lugar antes que a tire da mesa. —
Se não tive um piripaque até agora, acho que não tenho mais — declara,
tentando puxar a garrafa.
— Já bebeu demais — aviso, afastando os seus dedos.
— Credo, você parece meu pai! — exclama, levantando-se da
mesa e se segurando no encosto da cadeira.
— Está sentindo girar? — questiono retoricamente. — É seu corpo
informando que já deu — censuro.
— Essa conversa também já deu. — Ela anda em direção às
escadas até que sem titubear, o que me faz pensar que encherá a cara com
meus uísques no quarto.
Que caralho.
Encho minha taça de vinho até a extremidade, refletindo se não é
melhor tirar as bebidas e as armas que estão espalhadas em esconderijos
individuais lá em cima, a combinação perfeita para o caos, odiaria levar um
tiro de graça.
Termino de beber e subo para o andar superior. A porta está
encostada, empurro-a levemente, olhando o interior, as luzes já estão
apagadas, mas a claraboia clareia suavemente em cima da cama.
Sienna está deitada de costas para a porta, com o torso nu e a
coberta tapando acima da linha da sua cintura, com certeza apagada,
também depois de quatro taças de vinho, não dá pra esperar outra coisa.
Dou as costas, puxando a porta, mas paraliso quando escuto um lamurio.
Será que está chorando?
Outro gemido chega até mim, alto e claro, me dando a certeza de
que não é choro, Sienna está se acariciando. Cacete!
Apenas se afaste, seu prepotente desgraçado, se ela já te odeia,
deixará tudo pior.
Reflito, mas não consigo me mover e tirar a imagem dela da minha
cabeça. Porra, até parece que tenho quinze anos novamente, o sangue do
meu corpo desce pro meu pau em um tempo irreal.
Sienna se deita de barriga para cima e, sob a luz da claraboia,
vislumbro os seus seios cremosos e os mamilos intumescidos. Sua mão
permanece entre as pernas, mas os gemidos diminuíram e, de repente, ela se
senta, parecendo frustrada.
Ela joga a cabeça para trás, e sua frustração me percorre, ofego,
refletindo que não devia ter vindo, Sienna direciona seus olhos para porta e
fica em pé subitamente.
Nunca me senti em uma saia justa como agora e nem se eu
quisesse, conseguiria atravessar o corredor para onde fui realocado. A porta
abre bruscamente e Sienna rompe diante dela, nua e vibrando de raiva,
aqueles olhos azuis me despedaçam com força.
— Sienna...
— Entre. — Sua voz é comedida.
E a indecisão cai sobre meus ombros, ela está nua e parcialmente
bêbada, claro que não está pensando direito. Sienna me odeia, a não ser que
queira que eu entre para me matar. Faz mais sentido.
— Agora. — Havia esquecido que ela bêbeda se torna desaforada.
É estranho seguir ordens de alguém que não seja o Carlo, mas
obedeço, pior que está, não tem como ficar, e até que gosto desse outro lado
dela, parece uma caixinha de surpresa.
Entro no quarto e a porta se fecha atrás de mim, me viro e, em toda
a minha degradante vida, dessa vez, eu não sei como agir. Ela está parada
em minha frente, completamente nua, com os cabelos revoltados de uma
forma sexy e totalmente segura de si.
Meus lábios se separam, embora eu não tenha formado nenhuma
frase.
— Não vamos conversar — impõe, dando passos pequenos até
mim e suas delicadas mãos começam abrir os botões da minha camisa.
— Não acho que seja uma boa ideia, está com álcool demais na
cabeça — digo, sem conseguir conter meu olhar duro.
Esse momento se tornou a minha maior tentação assim que a despi
na noite de núpcias e não quero que seja o seu maior arrependimento na
manhã seguinte.
— Estou sóbria o suficiente para não se sentir culpado em tirar
vantagem. — Suas palmas pressionam contra o meu abdômen, me
direcionando para a cama.
Sienna sobe os dedos para o meu pescoço, enquanto um dilema se
forma em minha mente. Isso só pode ser um teste, me pergunto o quão
irritada ela ficaria se eu disser que não, eu não desejo mais magoá-la, mas
eu duvido que ela entenda isso.
Meus dedos se fecham em torno da sua pele macia e, no instante
que me sento na extremidade da cama, a puxo pela cintura entre as minhas
pernas e respiro o cheiro malditamente perfeito entre os seus seios,
deixando minha mente nublada. Ela dedilha até a minha nuca, enroscando
os dedos nos meus cabelos, e a perna esquerda desliza sobre a minha,
montando em meu colo.
— Minha escolha.
Seu consentimento destrói todas as barreiras que me mantêm sob
controle.
Passo o braço no contorno da sua cintura e a trago para mais perto,
agarrando a nádega esquerda. Sienna envolve meu rosto com as mãos e
junta nossos lábios, despertando minha luxúria como uma droga,
intensificando meu desejo de consumi-la.
Ela inclina-se para cima de mim, empinando seu traseiro enquanto
me deita em um amontoado de coberta. Deslizo uma mão entre nossos
corpos, alcançando sua boceta ainda molhada, dando-me conta do quanto
ela está excitada. Escorrego centímetros dos meus dedos para cima,
atingindo seu clitóris, e seu corpo se agita violentamente, mantenho a mão
firme, e seu quadril balança contra os meus dedos, que abrem as dobras
dela, alcançando cada vez mais a sua abertura.
Uma súplica rouca passa por seus lábios, fazendo os meus
músculos mais tenros se endurecerem desesperadamente por qualquer toque
dela. Agarro seu traseiro e enterro dois dedos na sua boceta, ela grita, e suas
unhas cravam em meu peito.
Começo a fodê-la enquanto meu polegar acaricia seu clitóris, e
meu pau se contorce em antecipação para estar dentro dela. Sienna balança
os quadris para frente e para trás, contra minhas investidas, e solta um grito
quando sua boceta se aperta, gozando em meus dedos.
Sienna encontra os meus olhos e se afasta, jogando os cabelos para
o lado, removendo a minha calça. Sem dúvida, ela é a personificação da
luxúria, é a coisa mais linda e valiosa que tenho.
Suas pequenas mãos seguram em meu pau, enquanto seus olhos
azuis acinzentados que transmitem poder e excitação possuem os meus.
Sienna fica sob os joelhos, se abrindo para mim. Os lábios dela encontram
os meus à medida que meu pau se encaixa na sua entrada.
Não lembro de estar tão tenso, nem na minha primeira vez. Não
quero machucá-la, embora não seja mais virgem, sinto a pequena boceta
dela estrangular o meu pau. O que é bom pra caralho, me faz querer deitá-la
na cama e empalá-la com toda a minha força.
— Não vou quebrar — avisa como se lesse meus pensamentos.
Deslizo até o fundo dela, apertando a sua bunda e vendo o seu
corpo ficar rígido. Sienna me empurra para trás e rebola contra mim,
conforme meus olhos escuros acariciam sua pele de porcelana na tênue
claridade do quarto. Ela se apoia com as mãos abertas em meu abdômen, e
suas unhas se enterram em minha pele à medida que ela geme e se esfrega,
me fodendo, expondo perfeitamente que sabe o que está fazendo. Não quero
ser hipócrita, porém, isso fere agressivamente o meu ego.
Suas pernas envolvem minha cintura com força e sua cabeça cai
para trás com seu corpo subindo e descendo, fazendo cada movimento mais
intenso que o anterior.
Ergo-me, pegando em seus seios, que balançam no ritmo da sua
cavalgada. Seguro-o com uma mão e abocanho seu mamilo intumescido,
sugando, sua boceta se contrai e espasmos dominam o seu corpo.
Sienna geme, jogando o corpo para trás, a amparo pelas costas e
devoro o seu seio, deixando seu mamilo cada vez mais inchado entre os
meus lábios, lambo a sua pele até alcançar o outro mamilo, o puxo com os
dentes, ela grita e pulsa em volta de mim.
— Goza pra mim, pêssego. Quero que você goze, cavalgando o
meu pau.
As unhas de Sienna cravam com mais força em meus ombros, seus
lábios se abrem com um gemido lascivo, agarro sua bunda e aperto,
metendo mais duro dentro dela, presenciando o arrebatamento do seu
orgasmo.
Giro Sienna na cama, ficando por cima dela, alavanco o seu
quadril, tendo a melhor visão do mundo, meu pau enterrado nela. Saio até a
entrada da sua fenda apertada, quente e melada, sentindo cada partícula do
meu corpo se estender e queimar pela excitação, encontro o seu olhar
brilhante na escuridão do quarto e, em vez de rompê-la como o demônio no
meu interior exige, debrucei-me sobre ela para reivindicá-la de forma
tradicional.
Suas pernas enlaçam minha cintura, e Sienna empurra os quadris
para que eu escorregasse os centímetros restantes dentro dela. Contemplo a
beleza do seu rosto lindo, os lábios levemente inchados e rosados, assim
como as maçãs do seu rosto.
Engato nossos olhares e invisto dentro dela em estocadas lentas e
profundas, escutando o som dos nossos corpos se unindo lentamente em um
vaivém. Sienna arqueia debaixo de mim, seguro em suas mãos em cima da
cabeça e fico preso na perfeição de cada lamurio e ondulação que
percorrem seu corpo. Lambo o seio dela, dando pequenos chupões,
tornando a respiração dela rápida e profunda.
— Mais rápido e mais forte — exige quando prendo seu mamilo
entre os dentes e o puxo.
Aplico mais força, tendo certeza de que ela ficará toda roxa na
manhã seguinte, bombeio rápido e mais forte, atingindo o seu ponto mais
fundo, sua boceta me aperta, levando à nossa libertação, e me derramo
dentro dela, com força.
Sienna permanece agarrada ao meu tronco, sua respiração está
pesada, e seu peito está tão colado ao meu que ouço seu coração bater em
um ritmo frenético. Planto um beijo em seu ombro e percorro os dedos nas
suas costas, sentindo uma pequena camada de suor.
O quão sentimentalista seria se dissesse que ficaria para sempre
assim com ela?
Sienna afasta seu rosto do meu, e sua expressão é inescrutável.
Seus dedos delicadamente tocam em meu peito, nos separando, ela desliza
para o lado, tirando-me de dentro dela, e se levanta sem dizer nada. Ela
veste um robe de cetim preto no caminho para o banheiro e se vira para
mim, diante do batente, com uma mecha do cabelo cobrindo seu rosto.
— Feche a porta quando sair — profere naturalmente, quebrando
qualquer expectativa que criei, e se tranca lá dentro.
Caio para trás na pilha de cobertas, sem saber no que pensar.
Ela me usou para sexo.
A minha esposa me usou para trepar e depois me mandou dar o
fora. Quero rir, mas, em vez disso, arrumo minhas roupas de volta ao lugar,
pego o que sobrou da minha dignidade, as armas e as bebidas e deixo o
quarto sem entender o que estou sentindo. Era mais fácil quando eu não
sentia porra alguma.
Capítulo 25

É Natal.
Escolho uma roupa em meu closet, com a sensação de um
atropelamento. Um lembrete doloroso da noite anterior. Minha vagina dói,
como se eu tivesse abrigado um punho, pergunto-me se isso é normal, e
meu seios estão com grandes chupões pretos.
Oh, Deus, como algo tão bom consegue me fazer sentir um lixo
agora?
Antidepressivo e álcool, uma combinação perfeita para me fazer
enxergar o lobo mau em pele de cordeiro. Taí a saída perfeita para o nosso
casamento dar certo, escarneço mentalmente, pois jamais conseguiria
suportar tanta dor de cabeça como esta que estou sentindo agora.
Coloco rapidamente uma meia-calça, saia xadrez preto e branco,
que sobe acima do umbigo e, por último, um cropped de lã batida vermelho,
pego um lenço da mesma cor e prendo meus cabelos em um rabo de cavalo
baixo.
Meu primeiro Natal longe da minha família e longe dos olhares
furtivos de pena deles, estou ansiosa para que esse ano termine, pois, de
alguma forma bem estúpida, meu cérebro acha que conseguira deixar toda a
merda que aconteceu para trás.
Desço, recebendo mensagens da Fiorella, muitas fotos fofas de
Stefano. E, na semana passada, Helena me enviou sua última ultrassom, ela
está esperando uma menina que se chamará Aurora Reviello.
Fiorella mandou também as fotos da roupinha do batizado de Stef,
será no fim de janeiro. Ela me deu a honra de ser a madrinha, mesmo
sabendo que as chances de eu conseguir ir são quase zero.
Será que o padre aceita por videoconferência?
Pensei em usar a fadamante, rio, os remédios devem estar fazendo
efeito mesmo, se fossem algumas semanas atrás, estaria chorando. Usá-la
para conseguir ir ao batizado. Parece errado tirar proveito dessa situação, só
que preciso tirar algo de bom dessa merda para não enlouquecer.
Chego no andar inferior e, como acordei tarde, o cheirinho de
comida natalina está a todo vapor.
— Bom dia! — saúdo, colocando o meu telefone no balcão e me
sentando ao lado de Maeve.
Ela me dá um risinho nada sutil.
— O quê? — pergunto, sem muita vontade.
— A véspera de Natal foi milagrosa? — Ela arqueia a sobrancelha.
— Você não tem casa, não? — pergunto secamente, puxando um
marshmallow do pratinho à minha frente.
— Hey — reclama queixosa e sussurra — Agnes está namorando.
E prefiro ouvir vocês transando do que a minha mãe. — Torço o nariz.
— Prefiro que não ouça — repreendo.
— Fizeram as pazes? — Ela está com aquele sorrisinho de volta.
— Não, precisava aliviar a minha tensão, e não estava conseguindo
sozinha. — Maeve ri.
— Ele está se esforçando — ela diz com estima, eu sei que ela tem
sentimentos parentais por Romeo, e vê-lo sofrer também a deixa mal. —
Você viu o tamanho daquele buquê de rosas? — indaga retoricamente.
— Metade já deve estar morta, assim como o coração dele. — Ela
faz cara feia, e eu rio.
— Esse casamento inteiro começou de forma errada, e não estou
pronta para acelerar as coisas e voltar para algo que vai me machucar ainda
mais.
— E ontem não foi um erro?
Os momentos de ontem percorrem a minha mente e sinto o sangue
salpicar as minhas bochechas, a minha imaginação não tem freio.
— Não vou apressar as coisas, Maeve, só para fazê-lo se sentir
melhor.
— Eu sei, e te entendo.
Romeo entra na cozinha, e Maeve se retira, nos deixando a sós.
— Já tomou café?
Balanço a cabeça negativamente, levando outro marshmallow à
boca, sem conseguir olhá-lo, não compreendo o motivo, não sentia
vergonha de Piero, mas, com Romeo, meu marido, tenho a sensação de que
minhas bochechas estão cozinhando.
— Vem, eu quero te mostrar uma coisa.
Romeo me dá as costas e anda sem me esperar em direção à saída.
Pulo da banqueta e o sigo, com borboletas brincando em meu estômago.
Será que é outro presente, me desculpe, eu comi outra mulher?
Deixamos a casa, e Romeo se destaca à minha frente, vestindo um
terno preto. O pátio está coberto por uma grossa camada de neve, assim
como as altas árvores que cercam a nossa casa.
Romeo está me levando em direção à nova construção, que é um
parâmetro da casa, teto embutido, e paredes de vidro claras, exibindo um
pouco do interior.
— O que é isso? — pergunto, vendo-o parar diante de uma porta e
a abri para dentro. Ele abre espaço para eu entrar, expondo um pomposo
estúdio de ballet, é lindo demais, seria perfeito, se não fosse resultado de
uma traição. Enxergo o seu reflexo atrás de mim por uma parede de
espelhos, do outro lado do estúdio, e me viro para encontrar o seu olhar.
— Isso tudo é culpa? — pergunto, sem conseguir conter a tristeza.
O corpo de Romeo enrijece, transformando-se em um bloco sólido
de músculos.
— Não sei o que fazer — ele admite. — Nunca pedi perdão ou me
importei o suficiente para tentar me redimir, só que, com você, é diferente,
eu me importo, e quero que saiba disso.
— Tinha medo de você e, depois que passei a conviver ao seu lado,
percebi que não me machucaria... — Meus olhos se enchem de água, me
viro, não quero encará-lo dessa forma.
— Eu não tinha ideia de que se importava, Sienna. — Engulo em
seco com a sensação de mãos esmagando o meu coração. — Você pediu que
eu me afastasse, e assim o fiz.
Me viro para ele, sentindo meu couro cabeludo pinicar.
— Atendeu o meu pedido bem rápido, foi como soltar a coleira de
um cachorro — escarneço, amargurada. — Ponha-se no meu lugar, se visse
outro homem me fodendo em cima de uma mesa, o que faria? — A
escuridão consome seu olhar e se estende, pairando ao seu redor. — Será
que eu seria digna de perdão? Ou você me despedaçaria, como fez com
Franco?
— Não a machucaria — entoa sem expressão ou entonação. —
Você é minha esposa — entoa com aspecto de posse controlada — e estou
disposto a me afastar para sempre, se assim desejar, mas, primeiro, terá que
tentar. — Meus lábios se separam por uma fração de segundos e a
preocupação cintila em sua face.
Ele pode fazer isso. Se afastar e me ver apenas quando lhe convir,
precisamente em jantares e festas dentro e fora da máfia, para exibir que
nossa relação permanece em êxito.
As palavras ficam entaladas no fundo da minha garganta, eu não
sei o que dizer, ou no que ponderar. Romeo está disposto a renunciar a mim,
caso isso seja o meu desejo no fim. Dando-me a certeza de que estarei livre,
caso faça outra estupidez.
A incerteza cai como uma pedra de mármore no meu estômago, e o
meu coração bate forte na cabeça, silenciando a voz interior. A chance de
tentar um casamento de verdade e de ter uma família que tanto sonhei me
fará refutar os meus princípios morais.
— Aceita?
— Caso escolha nos afastar, a casa e a Agnes ficariam para mim,
certo? — Romeo sorri e, de alguma forma muito perturbadora, isso derruba
toda a minha tensão.
— O que você quiser, pêssego — responde, seguro de si.
— Aceito. — Seus olhos escuros se iluminam, e Romeo não
contém seu sorriso. — Mas tenho uma objeção, sem mais mentiras.
— Sem mentiras.
— Podemos subir agora, estou faminta.
Ele assente e me conduz para o lado de fora do estúdio, quando
chegamos em frente à casa, os portões se abrem e um carro acelera para
dentro do pátio em alta velocidade.
— Entre. — A voz dele não me dá espaço para questionamento,
obedeço, andando em direção à entrada, o carro estaciona e um cara de
sobretudo desce dele, Romeo encurta espaço até ele e começam a conversar.
Atravesso a porta sem ter ideia do que está acontecendo, e ando até
a janela. O convidado inesperado está com uma blusa branca manchada de
sangue no colarinho, mas ele parece bem fisicamente.
Romeo começa a ditar ordens e alguns seguranças do pátio andam
em direção ao estacionamento, dentro de segundos, três motos atravessam
os portões tão rápido quanto à entrada do carro.
Que porra está acontecendo?
Será que encontraram o bastardo do meu cunhado?
Romeo entra na casa, tirando o seu casaco, ele passa reto por mim
em direção ao segundo andar, e o sigo com passos largos.
— O que houve? — pergunto, vendo pegar o coldre em uma
poltrona qualquer no seu novo aposento. Ele veste como se estivesse indo
para guerra. Romeo pega duas facas e prende uma na panturrilha e outra, no
antebraço com presteza.
— Piero matou um dos homens que estava de guarda na casa. Ele
deve estar ficando sem dinheiro, estúpido. Eu vou encontrar aquele filho da
puta e extirpá-lo até sua alma sair do corpo — entoa com suas veias do
pescoço se destacando e não há o menor tremor em sua voz que traía sua
frieza.
— Tome cuidado, ainda sinto o cheiro do seu sangue no carpete da
sala.
— Não se preocupe, as chances de eu hesitar dessa vez são as
mesmas que a minha entrada no céu.
Nenhuma.
Romeo planta um beijo no topo da minha cabeça e me larga em seu
quarto, com o coração do tamanho de uma ervilha. Ando até o meu
aposento e, pela grande janela de vidro, o vejo entrar no Rover e
desaparecer pelos grandes portões.
Engulo a frustração que domina cada poro do meu elemento e me
deito, esperando-o retornar.
O colchão chacoalha do meu lado, acordo e vislumbro, através das
pálpebras pesadas, Romeo abrindo os botões da camisa. Deslizo uma mão
por suas costas, sentindo os sulcos das suas cicatrizes, chamando a sua
atenção.
Ele me olha por cima do ombro e vejo uma escuridão profunda
dominar suas feições. Estreito os olhos quando reparo em um rastro de
sangue seco escorrendo da sua sobrancelha e orelha.
— Era uma emboscada — declara, exausto, e se deita para trás, a
luz da claraboia ilumina seu torso embebido por sangue, do queixo à
cintura, a camisa de Romeo está rúbea e grudada contra a sua pele.
— Esse sangue é dele? — Romeo solta uma lufada e balança a
cabeça em negação.
— Ele me levou pra morte, estou tão cego de raiva que não
enxerguei. — Os músculos do seu maxilar se contorcem sob a pele, e seu
olhar conflagra a fúria distorcida.
— O que você fez, Romeo? — Ele direciona seus olhos fúnebres
para o meu rosto.
— O que eu fazia de melhor. — Seus lábios se torcem em um riso,
e começo a ficar preocupada. — Mas agora estou velho e lento.
— Isso é uma crise de meia-idade? Porque estou vendo você
coberto de sangue, mas nenhum buraco em seu corpo.
— Só você para me fazer rir, pêssego — ele diz isso sem nenhum
sorriso no rosto. A mente de Romeo, nitidamente, está num lugar distante e
umbroso.
Deito-me ao seu lado, encarando o mesmo pedaço do céu. O forte
cheiro de ferrugem em seu corpo me deixa levemente enjoada, e nem é pelo
fato de ser o sangue de algum estranho.
Perceber como isso não me assusta e me afeta como antigamente
me faz refletir que amadureci para o submundo, ou alguma coisa de grande
importância se quebrou dentro de mim.
— Piero me levou até West Garfield Park. — Seu pomo de Adão
oscila.
Em outras palavras, o gueto de Chicago, nunca pus meus pés lá,
mas aquela cidade dá bastante trabalho para os jornalistas e a polícia, o
crime violento de WGP é agraciado com a extensa atividade de gangues na
área.
— Ele sabe que não consegue me matar, pelo menos, não sem um
elemento surpresa. Eu o segui até um armazém abandonado e, quando
cheguei lá, havia seis caras da gangue Latin Kings para me matar, menos o
boçal do meu irmão.
— Você é o subchefe de Chicago, eles não deveriam saber disso?
Romeo se vira, encontrando o meu olhar.
— Eu te disse, quanto mais velho, mais inimigos. Quando comecei
a trabalhar para o seu pai, ele pediu que limpasse uma área que a gangue
hispânica estava comandando. Piero, provavelmente, os persuadiu em troca
de vingança e dinheiro — explica, desalento.
— O que vai acontecer? — Romeo morde o lábio.
— Carlo está puto pelas mortes no armazém, ele ordenou que eu
parasse de procurar Piero e colocará seus homens atrás do meu irmão.
— Vai obedecer?
— Não posso, te prometi que o encontraria.
— Talvez papai esteja certo, você não está enxergando com
clareza. É o seu irmão, isso é duro para você.
Romeo se afasta e se levanta, saindo do quarto silenciosamente.
Acredito que ele tenha ido tomar um banho ou encher a cara em algum
canto da casa.
É agora que eu o sigo, ou dou espaço, não tenho certeza do que
fazer. Ele parece acabado, mesmo tentando encobrir isso com uma máscara
impenetrável. Decidir matar o seu irmão está o matando. Romeo sempre
mostrou afeto por aquele filho da puta desprezível.
Dou um suspiro e ando até o seu quarto, as roupas de Romeo
seguem uma trilha no chão em direção ao banheiro. A porta está aberta e
Romeo, dentro de uma banheira que parece um pouco pequena para o
tamanho dele, sua cabeça está caída para trás e seus olhos, fechados. Ele
não os abre, mesmo que tenha notado a minha presença.
Sua tristeza me afeta de uma forma que não consigo explicar. Me
sento na beira da banheira e jogo alguns sais na água rosada pelo sangue
dos nossos inimigos.
Pego uma esponja na prateleira ao lado e começo a lavar seus
ombros. Romeo abre os olhos, encontrando os meus.
— Isso devia estar acontecendo só daqui a alguns anos. — Rio da
fracassada tentativa dele de fazer uma piada.
— Não se acostume — repreendo, apertando a esponja em cima da
sua cabeça, seus olhos se fecham e água escorre vermelha pela sua face.
Romeo abre os olhos e encontram os meus, e uma emoção diferente
percorre por eles.
Desde pequenininha, vejo Romeo a serviço da máfia. Ele sempre
foi circunspecto com sua vida privada, acredito que nem papai conhecia sua
casa. O que eu sei a seu respeito é que ele criou o estrupício do irmão,
amparou Agnes e Maeve de continuarem com uma vida ferrada em um
trailer... e, nesse tempo todo, quem cuidou dele?
De repente, Romeo me puxa para dentro da banheira, de robe e
tudo. Faço cara de nojo devido à cor da água, tirando um sorriso preguiçoso
dele.
— Isso é nojento pra cacete — advirto, dando um nó nos meus
cabelos para o alto.
— Nada que um banho de água corrente não resolva.
Romeo abre as pernas, eu caio entre elas e ele me puxa para cima
de si, colando minhas costas em seu peito e envolvendo meu corpo com
seus braços. A barba macia dele roça no meu pescoço, e Romeo planta um
beijo atrás da minha orelha, provocando-me um arrepio.
Relaxo, marinando em sangue humano. Nossa, isso parece tão
errado, mas, se Romeo precisa disso para ficar melhor, estou disposta a
tentar, já que até agora nada do que aconteceu em nosso casamento foi
normal.
Capítulo 26
JANEIRO

— Sério, não entendo com isso não dói os teus pés — Maeve
profere, sentada no chão do estúdio, vendo-me fazer o demi plié, segurando
a barra.
— Na verdade dói — sorrio, encontrando o seu olhar pelo espelho
—, mas é só até me acostumar novamente.
— Você não me chamou aqui para ficar te vendo dançar, não é? —
Reviro os olhos e me viro para ela.
— Quero ir ao batizado do meu sobrinho, em Nova Iorque, mas
duvido que Romeo me deixe ir sozinha.
Já estamos em janeiro, eu não aguento mais a prisão dessa casa,
não tenho mais nada pra fazer, mesmo com o estúdio de ballet, estou
enlouquecendo. Romeo me levou à mansão dos Santoro algumas vezes,
porque, além daqui, lá é o único lugar seguro que o bastardo do Piero não
colocaria os pés. Dei a ideia para me usar de isca, com certeza aquela besta
do Piero tentaria me sequestrar e me matar em algum beco sem saída.
Grrr. Óbvio que Romeo disse que não.
— Quer que eu seja sua acompanhante? — pergunta, ficando em
pé e se encarando no espelho, ela está pomposa do jeito dela para ir a uma
festa hoje à noite, na qual nunca colocaria os meus provavelmente. — Eu
topo, nunca fui, e acho lindo aquele estado — diz, fazendo-me dar pulos de
alegria.
— Vou falar com ele hoje à noite. — aviso sem conter o meu
sorriso.
As chances de ele aceitar são voláteis, mas acredito que, se eu
pedir com jeitinho, ele ceda. O nosso relacionamento tem ficado cada vez
mais sólido. Romeo e eu estamos conseguindo passar por cima de tudo e
seguir em frente, a única coisa que nos perturba é o silêncio de Piero.
Aquele calhorda deve estar tramando agora, já faz duas semanas
desde sua última tramoia, e Romeo decidiu deixar nas mãos de papai, o que
nos dá mais tempo para ficar juntos. Às noites ao seu lado são longas,
quentes e orgásticas, e ele tem se aberto aos poucos, o que é maravilhoso.

Volto para a casa animada, entro no banho, aguardando Romeo


chegar, com a sensação de que estou prestes a pedir algo para o meu pai. Só
que, com Romeo, eu tenho uma artilharia pesada para usar, e eu vou pôr em
prática tudinho agora, penso ao ouvir um barulho no quarto.
Desligo o chuveiro e visto um robe branco, dando um pequeno
laço na cintura. Entro no quarto, ele não está aqui, apenas o seu terno, o
colete e toda aquela parafernália metálica que ele carrega consigo.
Ando até o seu escritório, Romeo está atrás da mesa, seu olhar
alcança o meu e o sorriso do meu marido se torna largo e satisfatório.
Romeo solta o telefone do lado e bate em seu colo, fazendo me sorrir.
Caminho até ele, me sentindo uma estrelinha saltitante. Suas mãos
se fecham em torno do meu quadril, fazendo-me montar em seu colo.
— Como foi o seu dia? — pergunta, como faz todos os dias.
Dou de ombros sutilmente.
— Como ontem e o dia anterior... — Romeo pressiona os lábios.
— Isso é uma droga, pêssego, me fale se tiver algo que eu possa
fazer para melhorar isso — pede, atencioso.
— Na verdade, tem uma coisa — digo com uma expressão dócil e
me sento na mesa do seu escritório, com as pernas sutilmente abertas e os
pés contra o seu peito.
Os olhos de Romeo fixam entre minhas pernas por um longo
tempo.
— Estou vendo que isso vai sair caro. — Sorrio, e ele sobe o olhar
até mim.
— Quero ir ao batizado do Stef. — Romeo fecha as minhas pernas,
assim como a sua expressão, e não preciso ouvi-lo para saber sua resposta.
— Posso levar a Maeve comigo — sugiro, fazendo o robe deslizar pelos
meus ombros, seus olhos percorrem meu torso por tempo demais
— Não quero você longe até pegarmos Piero.
— Vem comigo — digo, apertando o seu pau acordado com o meu
pé, Romeo fica com o maxilar tenso.
— Não — fala secamente e de repente vejo o meu pai outra vez em
minha frente, puxo meu robe de volta ao lugar, envergonhada. — Sienna —
chama quando desço da mesa, mas não tenta me segurar.
Romeo não vai mudar de ideia, e eu não preciso de mais
explicações, só sei que Piero, mesmo longe, continua fodendo com minha
vida, deixo o seu escritório sem olhar para trás.
Volto para o quarto e paro em frente às janelas de vidro, os
seguranças lá embaixo parecem pequenos pontinhos pretos perdidos na
neve, será que eles sentem o mesmo que eu? Numa prisão.
Não preciso me virar para saber que Romeo está às minhas costas,
inalo uma respiração, sentindo o seu cheiro, masculino e primitivo. Suas
mãos encostam na parede de vidro comigo entre elas.
— Não pode ficar com raiva por eu querer protegê-la. — Ele
empurra meu cabelo para o lado, beija o meu ombro e depois o meu
pescoço e sua barba me causa cócegas.
— Piero não me seguiria até Manhattan, você tem o dinheiro dele
sob controle, se ele tivesse como ir embora, já teria saído de Chicago, não?
— Tenho o do exterior, e não sabemos onde Piero está agora. —
Livre, leve e solto, filho de uma égua.
Eu devia ter pedido isso antes de fazer as pazes. Cacete. Agora, a
última coisa que desejo é usar a puta da fadamante, trazer à tona algo que
pode nos quebrar novamente só para conseguir algo que desejo, parece
imaturo demais.
— Não quer me deixar ir, porque está com medo de que eu revele o
que fez com Franco — deduzo.
— Isso você podia ter feito por telefone, e não fez — fala com seus
músculos se tornando rígidos em minhas costas.
— É, mas como eu tenho a necessidade patológica de agradar a
todos, talvez eu falasse sem querer.
— Está me chantageando, pêssego? — pergunta, me virando para
ele.
Não disfarço o meu sorriso, a princípio, eu estava apenas citando o
receio que, aparentemente, ele está sentindo para não me deixar ir, mas, por
outro lado, parece muito uma chantagem.
— Se eu disser que é, você me deixa ir?
— Não, a sua segurança é mais importante para mim.
Desgraçado.
— Mesmo? Mais que a Outfit? — indago, analisando a sua face,
olhos escuros e atenciosos e lábios tentadoramente curvados em um largo
sorriso provocante que poucas pessoas já viram, encoberto por uma barba
baixa e encaixada.
— Mais do que qualquer coisa que eu já tive na vida — declara,
franco, e seus olhos pretos parecem se enterrar na minha alma.
Corto contato visual e dou as cotas a Romeo.
— Odeio quando usa palavras bonitas para me persuadir —
resmungo.
— Posso usar outras coisas. — Romeo se aproxima de mim, mais
duro que uma rocha, ele desliza meu robe para baixo e sua mão cobre o
meu seio, deixando meu mamilo entre os dedos, ele o esmaga e envia um
formigamento direto para minha boceta.
Lá embaixo, vejo os seguranças virarem de costas para casa.
— Abre as pernas, pêssego — orienta, com os lábios colados em
meu ouvido e uma voz aveludada que me desorienta. Meu corpo obedece ao
seu comando, se abrindo para ele.
Romeo desliza os dedos entre minha bunda, alcançando minha
fenda molhada, ele estremece atrás de mim, enterrando seu dedo médio
lentamente.
— Você não me decepciona, pêssego. — Meu canal espreme,
sugando o seu dedo. Romeo aperta meu seio, removendo o dedo e subindo
em direção à minha bunda, espalhando a minha excitação, deixando-me
ainda mais molhada, olho por cima do ombro, insatisfeita, quando ele se
afasta.
— Coloque as mãos no vidro — pede, puxando meu quadril para
trás, ele desce dando beijos e dentadas na minha coluna, olho por cima do
ombro inteiramente arrepiada, o enxergo ficar sob os joelhos, abocanhando
minha nádega esquerda, arrancando-me um grito e provocando outro
formigamento.
Romeo agarra as bochechas da minha bunda e as separa, sua língua
quente e macia desliza entre minhas dobras e brinca na minha entrada,
dando-me a sensação do latejar vazio. Gemo em frustração, querendo mais
e empino a bunda para que sua língua consiga ir mais fundo. Então recebo
uma palmada ardente, se era para me acalmar, me deixou ainda mais
excitada.
Giro uma perna por cima da sua cabeça com leveza ficando de
frente para ele, e encaixo a panturrilha na curva do seus ombros.
— Gosta dessa flexibilidade.
Romeo me empurra para trás, na parede de vidro, e sua língua
atinge meu nervo inchado, tirando-me um grito. Nossos olhos se fixam
quando arqueio o quadril para frente, esfregando-me em seu rosto, num
ritmo que começa levantar espasmo na minha perna.
Tento acelerar os movimentos, mas Romeo segura meu quadril
com tanta força que chega doer, e os golpes da sua língua se tornam lentos e
macios.
— Romeo... — me queixo com sua tortura —, me deixe gozar —
gemo, percebendo minhas pernas se tornarem bambas.
— Você ainda não está pronta para me receber, pêssego. — Arfo
quando dois dedos batem duro na minha fenda faminta. — Quero sua
boceta pingando para mim. — Estremeço com a luxúria e poder das suas
palavras.
Romeo me chupa e tortura meu clitóris sensível com a sua língua
afiada, a perna que está no chão vacila pelo prazer, cedendo ao peso do
corpo, mas ele me firma no lugar, apertando mais os lábios na minha
intimidade. Uma onda de excitação atravessa o meu corpo, espalhando-se
pelo meu ventre, libertando o meu desejo ardente.
O meu coração bate na cabeça e preciso me escorar contra a parede
para não desabar em cima dele. Romeo fica em pé e abaixa sua calça junto
da cueca, seu pau se levanta inabalável, contra seu estômago, exibindo o
tamanho do seu tesão.
Seus olhos famintos me encaram, e os dedos se fecham em torno
das minhas coxas, me puxando para cima. Romeo desliza a língua para
dentro da minha boca e me coloca sentada na ponta de uma estante.
Seu pênis sobe, batendo em meu sexo, quente e pesado, cercado
por veias grossas. Pego em minha mão e, com o polegar, aliso sua glande
úmida pelo pré-gozo. Acaricio o seu pau, fazendo Romeo enrijecer e se
tornar mais duro, sua expressão é selvagem e perversa.
Romeo afasta minhas pernas, quando direciono o seu pau na minha
entrada, vislumbramos juntos seu corpo entrar centímetro a centímetro
dentro de mim, fazendo-me sentir cheia e alargada, ainda fico chocada com
como consigo suportá-lo por inteiro.
Romeo agarra meus quadris e começa um vaivém, sem tirar os
olhos dos nossos sexos.
— É tão quente e macia, é perfeita para mim. — Seus olhos
encontram os meus e vejo o seu arrebatamento. — É minha. — Romeo
entra duro e profundo.
A mão dele traceja para minhas costas, e seus lábios abocanham
meu mamilo com força, gemo. Engato os dedos nos cabelos da nuca dele e
mordo o lábio, sentindo seus dentes em minha aréola. Sou incapaz de
mandá-lo parar.
Acho que é a melhor dor que ele já me fez sentir.
Romeo me puxa do armário e me coloca contra a parede de vidro.
— Isso é quase um pornô para os seguranças — comento,
assoprando uma mecha de cabelo colada à minha face.
Romeo ri, ainda me penetrando, suas mãos amparam minhas coxas
com força.
— Nenhum é louco o suficiente para ficar te olhando nua —
profere, levando o meu quadril centímetros mais pra frente e atingindo um
ponto que me fez gemer e a minha perna inteira tremer.
— Oh, Deus... — reviro os olhos —, é tão bom.
Ouço-o sorrir.
— Você gosta assim, pêssego? — Romeo arremete contra mim
fundo, com os movimentos rápidos e bestiais.
— Sim... — choramingo, e os dedos dos meus pés se enroscam
diante de tanto prazer.
Me agarro em seus ombros fortes e cavalgo no seu pau, sentindo
uma mistura de sensações percorrer pelo meu corpo, tocando todas as
minhas terminações nervosas. Gozo, gritando tão alto, conforme os
espasmos dominam o meu elemento.
— Amo o som que você faz quando goza, como você se torce e
grita.
Abro os olhos, encontrando os seus. Sua voz pinga de luxúria, com
a necessidade de gozar.
— Amo quando me faz gozar. — Romeo ruge diante das minhas
palavras, ele saiu totalmente, me penetrou com força e, na terceira estocada,
me encheu com um jato quente do seu sêmen.
Minha cabeça cai em seu ombro, exausta, Romeo se senta na cama,
comigo em seu colo, e se deita para trás. Seus dedos acariciam minhas
costas lentamente, e a sensação de paz que me traz é formidável.
Escorrego para cama, sentindo-o sair de dentro de mim e muito
molhada. Deito-me em seu ombro e viro o rosto de Romeo em minha
direção, segurando-o pelo queixo.
— Como começou a trabalhar para o meu pai? —pergunto.
— Luta clandestina. — Estreito os olhos, curiosa. — O dinheiro
era fácil e as lutas também — profere com desdém, fazendo-me torcer os
lábios.
— Deixe-me adivinhar, você impressionou Carlo, e ele o convidou
para entrar na organização.
Romeo sorri.
— Queria que tivesse sido assim fácil, pêssego. Eu o impressionei,
sim, mas tive que expandir minha área de conhecimento para passar em
algumas missões.
— Está falando em matar?
— Eu já havia matado antes de entrar para Outfit, mas tive que
aprender uma porção de coisas.
— Quem você matou? — pergunto, e as carícias em minhas costas
param. Seu maxilar se flexiona e a expressão dele se torna fria, desprovida
de qualquer clemência.
— Meus pais. — Sua resposta cai como pedra em meu âmago e me
pego desejando não ter feito essa pergunta. — Eles eram maus e mereciam
morrer. — Meu coração encolhe com toda sua honestidade.
— Eu lamento.
— Tudo bem, já faz muito tempo — entoa e seus olhos se perdem
no teto, cativos em seus pensamentos.
A necessidade de querer saber o que houve no seu passado se torna
pequena comparada à urgência de fazê-lo esquecer o que eu acabei de
lembrá-lo. Dedilho os dedos pelo seu peitoral tatuado e durinho, com a
mente parecendo que pifou, não consigo pensar em mais nada. Cacete!
— Me deixaria fazer uma tatuagem? — pergunto e não tenho ideia
do porquê fiz isso.
— Você é a minha tela branca, e só eu vou marcá-la.
Sua resposta me deixa leve como uma pluma, me estico para beijá-
lo, e Romeo se curva por cima do meu corpo, sinto sua ereção em minha
coxa e sei como manter seus pensamentos longes por um tempo.
Capítulo 27

Chego no andar inferior, e Romeo, para minha surpresa, ainda está


em casa, tomando café da manhã na ilha, dou um beijo em seu cangote e me
sento ao seu lado, recebendo um sorriso dele.
— Você devia sorrir mais, fica encantador — digo, fazendo sua
expressão quebrar, reviro os olhos.
Pareceria menos uma fera, penso.
— Estou indo para a casa do seu pai, quer vir?
— Pode ser, eu vou pegar o meu casaco — aviso.
— Coma primeiro — entoa, me empurrando um prato com
panquecas em minha direção.
Agnes solta uma xícara de chá na minha frente na hora em que
Romeo se afasta para atender uma ligação.
— Maeve ainda não chegou? — pergunto a Agnes, preciso contar a
ela que nossa viagem a Nova Iorque foi para o espaço. Pensar nisso me
deixa injuriada, sinto falta das meninas.
— Não chegou e o telefone chama até cair na caixa de mensagem
— explica, parece preocupada.
— Ela foi a uma festa ontem — deve estar doidona na cama de um
estranho —, deve estar descansando na casa de uma amiga — respondo,
beberico o meu chá e envio uma mensagem para a maluca da Maeve.
Mensagem Maeve: Sua mãe está preocupada, seria bom se desse
um sinal de vida.
Termino de comer e subo para o meu quarto, Romeo está no
escritório, ainda ao telefone. Depois da nossa conversa de ontem, me senti
tão carregada, acho que nunca terei coragem de voltar naquele assunto, a
não ser que ele queira me contar, o que acho pouco provável, a maneira que
ele reagiu, me faz pensar que tudo que ele menos deseja é relembrar aquilo.
Entro no closet e pego um sobretudo branco, de pelúcia, me visto
rapidamente antes que Romeo resolva ir sem mim e, quando guardo o
telefone no bolso, ele começa tocar com a uma chamada de Maeve.
— Seria bom se você ligasse para Agnes — digo ao atender.
— No momento, Maeve está impossibilitada de fazer qualquer
ligação. — O som da voz de Piero quase me faz derrubar o telefone no
chão, me escoro na parede com meu coração batendo loucamente,
ameaçando saltar pela minha boca.
— O que fez com ela? — Ouço um risinho dele que me deixa em
estado enervante.
Pobre Maeve, o efeito colateral de toda essa maldita merda.
— Nada, princesa, até parece que eu sou um monstro — responde
suavemente e despreocupado, como só um narcisista conseguiria.
— O que você quer, Piero? — Vou direto ao ponto, com minha voz
soando estridente, ele não me ligaria só para se vangloriar, não é?
— Ainda bem que perguntou, espero que tenha papel e caneta, pois
vou precisar que traga algumas coisas para mim. — Um nó se forma em
minha garganta apertado.
— E como eu faria isso? Por sua culpa, essa casa está até o talo de
segurança.
— Isso é problema seu e da sua amiguinha, e acho bom você
manter a calma, porque não vou hesitar em matá-la se fizer qualquer
estupidez.
Viro-me de frente para a parede e amparo minha testa nela,
sentindo-me suar frio.
— Sienna — a voz de Romeo soa no quarto.
— Me liga em cinco minutos. — Desligo, enfiando o telefone no
bolso, respiro profundamente, com a sensação de sufocamento, e deixo o
closet, vendo Romeo no batente da porta.
— Está tudo bem? — Dou um sorriso a ele e assinto, mas creio que
não é o suficiente para mascarar o meu pavor e a minha palidez extrema
repentinamente. — Estava falando com quem no telefone?
— Fiorella — balbucio. — Ela ficou chateada por eu não poder ir
ao batizado.
Romeo suspira, com pesar.
— Eu lamento, pêssego. — Romeo passa os braços ao meu redor e
beija o topo da minha cabeça, cheiro o seu perfume, mas estou tão tensa que
nem mesmo o seu calor acolhedor e seus braços me fazem relaxar. —
Quando pegarmos Piero, prometo levá-la para ver as meninas.
— Está bem — digo, me afastando dele. — Eu mudei de ideia, vou
fazer companhia para Agnes, a Maeve ainda não chegou e ela está
preocupada. — Romeo analisa minha expressão por um momento e
concorda.
Ele planta um beijo em meus lábios e me deixa no quarto com o
coração na mão. Me sento, pois minhas pernas tremem, o meu estômago
embrulha com força, fazendo a panqueca subir à garganta.
Puta merda!
Ir até lá é suicídio, não ir é o mesmo que deixar Maeve para morte.
Meu telefone toca, e o meu temor aumenta em cem por cento.
— Pegou papel e caneta princesa?
— Não vou anotar nada até eu falar com a Maeve — profiro com
meu tom de voz sob controle, embora eu esteja completamente fora dele.
— Claro, por que não? — pergunta retoricamente, e um estalo alto
ressoa do outro lado na mesma hora, seguido por um grito de Maeve, que
despedaça meu coração. — Dá oi para sua amiguinha — ele diz, e logo
ouço uma respiração pesada ao telefone.
— Não faça nada do que ele está mandando — Maeve sussurra
com a voz rouca embargada de raiva e aflição.
— Farei o que ele quiser, e você voltará para — respondo, e nem
mesmo eu acredito em minhas palavras.
— Sua idiota — resmunga, e sinto meus olhos se enxerem de
lágrimas.
— Está viva. Agora vamos ao que interessa, porque estou ficando
sem tempo e paciência. Abra o cofre no escritório de Romeo, fica dentro do
armário atrás da cadeira, e pegue todos os meus documentos e passaportes
que tiver lá, depois que fizer isso, vá até o seu closet, tem uma parede falsa
atrás do espelho, é só empurrá-la para o lado.
— O que tem lá?
— Depois você verá. Tem dez minutos, princesa, lembre-se de
pegar uma mala grande. — Piero desliga e, em seguida, recebo uma
mensagem com duas senhas.
Oh, Deus, como farei isso sozinha? Me livrar de Ezio e de Agnes e
sair dessa casa sem fazer um alarde.
Dez minutos, Sienna! — meu cérebro berra.
Ok. Depois eu me preocupo com isso, firmo minhas pernas e ando
até o escritório do Romeo no automático. Abro a porta do armário e digito a
primeira senha, quando a porta destrava, eu amaldiçoo por Piero estar
conseguindo fazer o que quer mais uma vez.
Isso nunca vai acabar?
Quais as chances de sairmos vivas? Assim que eu chegar aonde
quer que diabos ele esteja, pode dar um tiro nela e outro em mim, e esse
seria o fim para nós duas.
Pense, Sienna!
Abro o cofre e tem vários passaportes, pego todos que estão em
nome de Piero e os documentos endereçados àquele filho da puta
desprezível. No fundo do cofre, tem alguns rolos de dinheiro e algumas
armas.
Meus dedos pairam sob a grande, preta. Ter uma arma não seria
ruim, penso, pegando-a e pesando em minha mão, a merda é que eu não
tenho ideia de como manuseá-la. Enfio a arma no bolso do casaco, e os
passaportes dentro do envelope com os documentos, e deixo o escritório em
direção ao closet.
Quando entro no quarto, Agnes está estendendo a minha cama.
— Senhora, achei que estivesse no estúdio — expõe, afofando meu
travesseiro.
— Tudo bem, eu já ia descer falar com você — digo com um
sorriso formidável. — Ooo... — Agnes me aguarda paciente inventar uma
mentira — o meu coletor menstrual estragou, poderia ir a uma farmácia
para mim? — Sorrio.
— Claro, senhora, volto o mais rápido possível — avisa, deixando
o meu quarto, espero Agnes sair e tranco a porta. Caminho até o closet e
empurro o amplo espelho para o lado, revelando uma porta de ferro.
Será que tem outra coisa que eu não conheço nessa casa?
Digito a senha em uma plaquinha de metal e a porta se abre como
as portas de um elevador, as luzes de dentro já estão acessas, revelando o
que parece ser a porra de um cofre da Casa da Moeda.
Entro e caminho entre o que aparenta ser duas camas de casal no
formato de cédulas de cem dólares. Meu queixo cai ao ver tanto dinheiro
em um lugar só, mas meu choque dura pouco quando recordo-me do que
preciso fazer.
Pego uma mala de rodinhas no closet e jogo dentro dela o máximo
de dinheiro que consigo, depois a arrasto até o meio do quarto, sem saber o
que fazer. Lá no fundo, eu sei que é uma péssima ideia, eu não tenho força
nem para levantar essa mala, quem dirá me defender de Piero.
Ando sem muita vontade até a janela e enxergo Ezio, seus olhos
encontram os meus depois de um momento. Aceno para ele, o segurança
parece ficar sem jeito, tenho vontade de revirar os olhos.
Meu celular toca e meu peito se aperta quando vejo o nome de
Maeve.
— Já fez o que eu mandei? — pergunta, parecendo agitado.
— Sim.
— Ótimo. Vou enviar a localização, você tem uma hora, Sienna.
— Preciso de mais tempo, ainda não sei como sair da casa. —
Minha voz soa suplicante e eu odeio isso.
— Já disse, não é problema meu — vocifera.
— Me deixe falar com ela, Piero.
— Pare de ser burra... — Maeve diz depois de um momento e a
voz dela me enche de esperança, apesar do insulto. — Já tem sua prova de
vida, princesa. Uma hora. — O embuste desliga.
Fecho as mãos em punho para conter a leve tremedeira que começa
a dominar o meu corpo. É simplesmente impossível sair dessa casa, a não
ser que eu atropele todos os seguranças pelo caminho.
Se eu conseguir me livrar de Ezio, o resto é moleza, ele só não
precisa ver quem está atrás do volante.
Troco meus saltos por um par de tênis e desço, arrastando a mala
para o andar inferior. Como quase não tenho saído de casa, a BMW está
criando pó na garagem, só que o caralho da chave está com Ezio.
Adentro a garagem pela entrada dos empregados e solto a mala ao
lado do carro, me escoro nele por um momento e vejo um pequeno ninho de
passarinho no canto, mas nenhuma ave.
De repente, tenho uma epifania bem estúpida.
Caminho apressada até a porta, antes que Agnes volte da farmácia,
e abro-a, chamando atenção de Ezio. Não disfarço o meu pavor quando
aceno para ele.
— O que foi, senhora? — Ele se aproxima, mostrando
preocupação.
— Tem uma aranha no meu quarto. — As feições do homem
endurecem, e me amaldiçoo por ter acenado para ele na janela.
— Ela é muito grande? — Faço cara feia, contendo minha vontade
de revirar os olhos.
— O suficiente para eu vir te chamar — aviso secamente, o que ele
pensa que eu sou?
Dou as costas para o segurança, mostrando minha irritação, o que
não precisa de muito, e sinto o homem às minhas costas, subo para o
segundo andar e, quando chego no meu quarto, deixo Ezio entrar na minha
frente.
Puxo a arma do bolso e aponto para suas costas.
— Onde você a viu, senhora? — pergunta, se virando para mim, e
o choque em seu rosto é palpável, seguido de indignação.
— Me desculpe, Ezio, mas preciso que me dê as chaves do carro.
— Claro e depois, por favor, me dê um tiro. — Cerro os olhos, não
gostando do seu tom de voz. — Você, pelo menos, sabe usar isso? —
pergunta, e lhe dou um dos meus melhores sorrisos.
— Quem sabe. — Dou de ombros. — Você quer me testar? —
pergunto, deslizando o dedo no gatilho sensível, sentindo meu coração bater
na cabeça.
— Por que está fazendo isso, Sienna?
Se eu disser que vou me encontrar com Piero, é preferível que Ezio
queira tomar um tiro por mim do que por Romeo, que certamente o matará
depois por me deixar sair.
— Quando for da sua conta, eu te informo — aviso, estendendo a
mão para ele. — Me dê a chave, ou essa conversa que estamos tendo agora
será o menor dos seus problemas quando Romeo chegar.
— Ele não vai acreditar em você.
— Depois do que Piero fez comigo, sob os seus cuidados, ele vai
acreditar em qualquer merda que eu disser! — exclamo, e dizer isso me
machuca profundamente, pois é verdade.
Ezio me estende a chave com a mão aberta e um olhar
questionador.
— Jogue na cama e o telefone também — peço, devido aos seus
dedos ágeis, ele me desarmaria num instante.
Ezio atira a chave com irritação e depois o celular. Empurro para
longe qualquer tipo de frustração que ameaça passar por meu corpo e
aponto para o closet.
— Entre. — O homem, que tem quase o tamanho da passagem da
porta, caminha na minha frente, o sigo à distância, sentindo o tempo passar
rápido demais para os passos lentos de Ezio.
Ele entra no armário, e eu o tranco, sabendo que uma porta de
madeira não irá segurá-lo por muito tempo. Pego as chaves e o telefone em
cima da cama e depois tranco o quarto.
Desço a escada de dois em dois degraus e, quando chego na
garagem, ouço um estouro no andar superior. Abro a porta do carro com
meu coração quase quebrando minhas costelas com a intensidade que bate,
jogo a mala para dentro, depois deslizo no assento, aguardando a porta da
garagem abrir.
Deus me ajude, oro, visto que a última vez que dirigi foi na minha
prova da autoescola.
Capítulo 28

Deixo a garagem e os seguranças abrem caminho olhando para


mim e, mesmo sabendo que eles não podem me ver, me sinto em um filme
de terror. Acelero, chegando nos portões, que se abrem para trás quase
lentamente, sufoco um grito e, quando olho pelo retrovisor, Ezio já está na
entrada da casa, gesticulando para os seguranças, parecendo um maluco.
Arranco com força e me apavoro com a potência do carro, dirijo o
mais rápido e longe possível da mansão, sei que não demorará muito para
outros veículos estarem atrás de mim.
Não sei o que Romeo pensará quando souber que eu simplesmente
fugi, nem quero pensar nisso agora, preciso me preocupar com o que fazer
quando encontrar Piero.
Abro a localização que Piero me passou, ele está a menos de
quarenta minutos de distância. O meu telefone toca com uma chamada de
Romeo, desligo, sentindo a pressão dominar o meu sistema.
A essa altura, ele deve estar rastreando o carro e possivelmente o
meu telefone, preciso ser mais rápida que ele, mas como?
Bato com a cabeça contra a escora do banco, impedindo que as
emoções me controlem.
O telefone de Ezio toca no banco ao meu lado, é Romeo
novamente, meus dedos trêmulos atendem a chamada. Só Deus sabe o que
vai acontecer depois que eu me encontrar com Piero.
— Oi — digo e me sinto em uma despedida.
— Eu sei que não está fugindo, pelo menos eu quero acreditar
nisso — Romeo profere, e sua voz soa tão aflita quanto a minha.
— Piero está com a Maeve — respondo.
— Pelo amor de Deus, pare esse carro agora. Ele vai matá-la, vai
fazer isso com as duas.
É provável.
— Não posso, não conseguiria viver com o peso da morte dela,
talvez eu morra, talvez não. — Rio com amargor, e as lágrimas escorrem.
— Mas sei que tomei a decisão certa e sei que ela também faria.
— Não é a hora de bancar a heroína, pêssego, pare o carro, e eu me
entrego a ele no lugar das duas.
— Não, eu comecei toda essa merda e vou acabar com ela. —
Desligo o telefone e estaciono na beira de uma rua deserta, quase me
afogando com as minhas lágrimas. Espero o meu pânico diminuir e procuro
pelo endereço que Piero me passou no Google. Estou a menos de quinze
quilômetros. É uma fábrica de metal abandonada, com duas entradas, norte
e oeste. Piero me aguarda na entrada norte e, por essa razão, começo a
dirigir até a oeste.
Acelero, entrando em uma estrada de chão, distante de qualquer
civilização, um lugar perfeito para uma criatura como ele se esconder. Os
momentos que tive com ele percorrem a minha mente, eu estava
completamente cega de amor, é difícil compreender como não percebi o
quão dissimulado, maluco e psicótico Piero é.
Diminuo a velocidade, entrando na rua da fábrica, não é nada
menos que uma grande construção enferrujada em um amplo pátio com o
gramado alto, e um pavilhão destruído ao lado. Estaciono a uma distância
razoável, aproveito que ainda estou dentro do tempo do carro e apresso os
passos, passando por cima da cerca de metal caída no chão, com placas
grudadas, com o escrito: Afaste-se perigo. Corrosivo 8.
Meu telefone toca e inconscientemente meu coração dispara,
encerro a chamada às pressas quando vejo que é Romeo e coloco o telefone
no modo silencioso, não preciso demais distração, eu mal consigo escutar
direito com o meu coração batendo tão alto.
Ando com passos rápidos até uma pilha de concreto do pavilhão e
me abaixo, olhando por cima dela, e só há escombros, ele deve estar na
fábrica.
Me escoro contra o concreto, esperando a coragem voltar para o
corpo. Nunca fui provida de bravura, nasci sabendo que sempre haveria
alguém para me proteger, e cá estou eu, sem seguranças e nenhum
conhecimento, pronta para enfrentar o inimigo.
Atravesso os escombros, agachada, andando em direção à fábrica,
que fica de frente para o pátio norte. O vento bagunça os meus cabelos,
enquanto assopro minhas mãos, sentindo-as congelar pelo frio pungente de
janeiro.
Entro na fábrica e ando entre as grandes máquinas, o cheiro de
água parada, ferrugem entre outras coisas que não sei discernir está me
deixando puramente enjoada. Esse lugar está há tanto tempo abandonado
que tem plantas nascendo em volta do maquinário.
Meu telefone vibra, é Romeo outra vez, encerro a chamada,
sentindo o coração pesar no peito. Guardo o aparelho no bolso quando estou
me aproximando de uma escadaria ampla para descer ao primeiro andar,
que está coberto por um toldo preto, atrapalhando a minha visão.
Me abaixo no chão e o meu coração me sobe à garganta quando
enxergo Maeve, amarrada e sentada no chão frio, contra um armário velho,
ela está com a cabeça entre as pernas, aparentemente tentando se manter
quente.
Olho ao seu redor, à procura de Piero. Não consigo vê-lo, o maldito
toldo cobre metade da área inferior. Ele pode estar em qualquer lugar. Olho
para trás bruscamente, com aquela sensação de que alguém está
espionando, mas é apenas o medo e o meu cérebro criativo criando peças.
Respiro fundo sentindo a bile subir à garganta, um calafrio e, ao
mesmo tempo, um calor extremo percorre o meu corpo. Péssima hora para
uma crise de ansiedade, Sienna.
O meu telefone vibra, mas, dessa vez, é Piero, o que faz o meu
mal-estar piorar em todos os porcentos. Corro o mais rápido que consigo da
escada e me escondo atrás de uma das máquinas, com a respiração
ofegante.
Levo uma mão ao peito, como se, de fato, fosse o suficiente para
calar o meu coração e atendo o telefone.
— Onde você está, cacete?! — ruge, e sou capaz de escutá-lo de
onde estou escondida.
— Estou chegando — falo o mais calma que a minha voz permite.
— Não fode comigo, Sienna, você não vai querer entrar nessa
briga.
— Entrar, Piero? Eu já estou no meio dela — imponho, sentindo as
lágrimas emergirem.
Por um momento, um silêncio profundo se estende do outro lado.
— Não devia ter contato a ele, colocou o meu irmão contra mim —
lamenta.
— Você me machucou, Piero, ia continuar me ferindo se eu não
fizesse nada.
— Você me desejava, se entregou a mim. Eu acreditei que me
amava, mas me desprezou assim que enfiou a aliança no dedo. Era só isso
que você queria, a porra de um casamento, de uma família. Tudo que eu não
podia te dar, e nem Romeo vai, porque somos iguais. Carregamos uma
mancha disforme e enraizada em nossa alma, e nada que você faça mudará.
Engulo um soluço, incapaz de respondê-lo.
— Estou vendo você chegar — Piero diz, e uma sirene berra dentro
de mim, me deixando em alerta. — Estou indo até você, princesa. — Seu
tom de voz é contido, mostrando-me o tamanho da sua bipolaridade.
Ele desliga.
Oh, Deus, como ele está vendo? O carro está do outro lado da
fábrica.
Corro de volta às escadas e me abaixo para ver a movimentação do
andar inferior, Maeve está em alerta dessa vez, reúno minhas forças e desço
as escadas, sentindo um medo real espalhar-se pelo meu corpo.
Estou na metade dos degraus e enxergo apenas a silhueta de Piero a
alguns metros de distância, Maeve ainda não percebeu minha presença,
apresso os passos, antes que aquele verme olhe para trás, chego nela e cubro
sua boca bruscamente, deixando-a agitada.
Grandes olhos vermelhos e inchados se enchem de água quando
ela me enxerga. Empurro sua franja para o lado, exibindo um hematoma
feio em sua testa.
— Você veio. — Ela chora e toca em meu rosto com os pulsos
amarrados.
— Temos que sair daqui, consegue caminhar? — pergunto e
começo a desamarrar os tornozelos dela.
Maeve responde, mas sua voz é abafada por um disparo do lado de
fora, o pavor atravessa o meu corpo, tremo como uma vara verde, sem
conseguir tirar o resto da fita.
— Quem está lá?
— Não tenho ideia.
— Precisa ir! — ela vocifera quando outros disparos são feitos.
— Não. — Arrasto Maeve pelas axilas, com todas as minhas
forças, sentindo os músculos dos meus braços começarem a queimar. Os
disparos cessam. E sou forçada a parar também, sem forças. Escoro Maeve
contra uma barra de ferro e volto a remover a fita dos seus tornozelos.
— Princesaa... eu sei que está aí... você acabou de matar o seu
segurança — profere, batendo em algo de metal, fazendo-me ter um
sobressalto, ele está perto o suficiente para não me deixar pensar em mais
nada.
— Eu já volto — sussurro, e Maeve me segura pelo braço, aflita.
— Vou levá-lo para longe, tente tirar o resto da fita — sibilo, puxando a
arma do bolso.
Ela assente.
— Apareça, vamos acabar logo com isso — entoa mais perto.
Busco por ar e corro na direção à escada, para o andar superior,
olho por cima dos ombros e vislumbro o Piero perto de onde Maeve está
escondida.
— Hey, palhaço — grito, chamando sua atenção, e não espero para
ver a reação dele, disparo com uma lebre, sumindo no andar inferior, com a
adrenalina cegando qualquer instinto de preservação. Corro até uma
máquina grande e me agacho atrás dela, tremo tanto que quase mordo a
minha língua.
— Quer brincar de esconde-esconde, princesa? — pergunta alto,
expondo a sua distância. Fico de quatro no chão imundo e engatinho até a
máquina do lado.
— As coisas não precisam terminar mal para você, fuja comigo,
vamos deixar tudo para trás. — Sufoco um riso.
Isso só pode ser blefe, ou um episódio psicótico, não é possível.
— O que me diz? — Arranco o casaco e o jogo longe, sem saber
como despistá-lo. — Se não responder, vou atrás da pobre Maeve, ainda
amarrada no andar de baixo — provoca.
— Prefiro ir para o inferno a me envolver com você — grito,
entregando a minha localização.
Levanto-me e corro com o resquício de força que há em meu
corpo. Olho por cima do ombro e de repente minhas pernas amolecem,
tropeço em uma pilha de ferro, caindo por cima deles, e a arma escapa dos
meus dedos, deslizando para longe.
Gemo pela dor que penetra meu elemento, tento me levantar, mas
sou virada de barriga para cima bruscamente.
— Achei você — Piero profere com um risinho quase todo coberto
por uma grossa barba preta, ele monta em meu quadril, soltando seu peso,
fazendo-me gritar, moendo minhas costas contra os metais no chão.
Empurro para cima pelos ombros em vão, Piero não se move meio
centímetro, apenas me machuco ainda mais.
— É uma pena que tenha escolhido o lado errado, princesa. —
Seus dedos deslizam pela minha barriga, erguendo a minha blusa, engulo o
pavor e seguro em seus pulsos quando alcançam os meus seios.
— Piero, por favor — apelo, sentindo-me afundar em lágrimas,
implorando para que ele tenha qualquer senso de humanidade.
— Eu sinto muito que tenha que acabar assim.
Mexo a cabeça em negação e tremo na hora em que seus dedos
ágeis se fecham em torno do meu pescoço, lentamente, enquanto seus olhos
umbrosos se satisfazem com toda a sua crueldade.
— Prove um pouquinho do que ele me fez sentir. — Piero aperta
os dentes duro e ofegante.
Os dedos dele se tornam implacáveis, roubando o meu ar. Me
debato sob ele, esmurrando seu peito, seus braços, onde quer que meus
dedos alcancem, desesperada, sentindo minha essência abandonar-me aos
poucos.
Me nego a morrer, sabendo que a última coisa que virei será a face
do diabo.
— Está quase lá, princ... — Piero se engasga quando uma barra de
metal atravessa seu crânio, saindo pela boca, o terror extremo que sinto, não
há emoções no mundo capaz de retratá-lo.
O peso desaparece de cima do meu corpo e fico leve novamente,
mas ainda imobilizada, como se meu sistema estivesse religando.
— Sienna. — Romeo me ergue do chão, olho para seu rosto
angustiado e recebo um sorriso triste dele.
— Acabou — diz, beijando a minha testa.
Ameaço olhar para Piero, mas Romeo não permite, ele me mantém
em seus braços, mexendo a cabeça em negação.
Cansada para lutar contra qualquer coisa e sentindo as pálpebras
pesadas tremerem, apenas escoro-me contra o seu peito e o deixo tomar
conta de mim.
Desperto, deitada em minha cama, levo as mãos ao pescoço,
sobressaltada, sentindo os dedos de Piero em mim. Romeo aparece ao meu
lado em questão de segundos, seus olhos estão suaves como nunca e muito
preocupados.
— Está segura, está em casa — afirma, me sentando do meu lado e
me puxando para seus braços.
— Onde está Maeve? — pergunto, alarmada, estava plenamente
desorientada e não me lembrei dela.
— Está bem, Agnes está cuidando dela em um dos quartos de
hóspedes. — Sorrio um pouco mais aliviada.
— E o Ezio? — As feições do meu marido endurecem, fazendo
meus olhos encherem de água. — Eu quis salvar Maeve e acabei o
matando. — Fungo, mal o enxergando pela quantidade de lágrimas que
passam por meus olhos.
— Piero é o único culpado — ele pontua com seriedade e, embora
uma parte de mim acredite nisso, eu nunca vou me perdoar por isso.
Romeo suspira e segura em meu rosto, limpando as minhas
lágrimas delicadamente.
— Vê-la naquela posição me fez sentir o medo que eu nunca havia
sentido até hoje — declara, olhando nos fundos dos meus olhos como se
estivesse recordando de algo. — Queria que ele estivesse vivo só pra lhe
dar uma morte merecida. — profere e fúria distorcida brilha em seus olhos.
— Acabou — sussurro, nem acreditando que esse inferno chegou
ao fim.
— Acabou, pêssego — Romeo reforça e me puxa para o seu colo.
Escoro a cabeça em seu pescoço, consumida pelo dia de hoje, e
não consigo evitar chorar, colocando para fora todos os sentimentos
arraigados em meu âmago.
Romeo faz pequenas carícias atrás da minha orelha e não me vejo
em um lugar mais seguro do que em seus braços.
Capítulo 29
UMA SEMANA DEPOIS

Sento-me no capô do carro e acendo um cigarro, uma coisa que


não faço há muitos anos, enquanto aguardo dois dos meus homens abrir
uma cova, profunda, na extensa mata de desova da Outfit.
Jamais supus que um dia enterraria meu irmão aqui, ao lado dos
inimigos.
O meu sangue borbulha nas veias toda vez que me vem à mente
Piero em cima dela. Suas mãos em volta do seu pescoço macio e delicado e
no quanto de sofrimento ele lhe causou, porque fui frouxo, e não o matei de
primeira.
Piero merecia bem mais que um pedaço de metal enterrado na
cabeça. Filho da puta egocêntrico. Eu fiz tudo ao meu alcance para dar a ele
uma vida decente como a que tínhamos, mas o mau já estava radicado nele,
só eu não havia percebido. Vou enterrar Piero no passado, custe o que
custar, como fiz com os doentes dos nossos pais.
Desço do carro em frente à mansão e enxergo as luzes do estúdio
acesas. Avisto Tito, o novo segurança da Sienna, ele é o irmão mais novo do
Ezio. O homem me dá um aceno de cabeça, respeitosamente.
Ainda é estranho não ter mais a presença do segurança aqui, Ezio
trabalhava para mim desde os dezoito anos. Era um Homem de Honra.
Sienna ainda se sente responsabilizada pela sua morte, e não tem nada que
eu diga que posso amenizar essa culpa, só o tempo vai aplacar.
Desço até o estúdio e, através do vidro, vislumbro minha mulher
em um collant preto e os cabelos soltos que voam a cada movimento
delicado que o seu corpo faz. Ela tem passado bastante tempo aqui,
explicou que, quando dança, consegue esquecer até mesmo de quem ela é, e
isso ajuda a fugir da realidade quando não estou em casa.
Espero que um dia ela volte a dançar por prazer, e não como uma
válvula de escape. De todo o terror vivido, pelo menos, a autoflagelação
está sob controle com o remédio.
Atravesso a porta, e a música Experience, de Ludvico Einaudi, toca
baixinho no fundo. Sienna encerra os passos quando me enxerga, e o seu
sorriso se ilumina como um farol, é estranho como uma coisa tão pequena e
simples me enche de prazer.
Ela vem correndo e pula no meu colo, se agarrando em meus
ombros, meus olhos ficam na altura do seu pescoço, que permanece com o
hematoma das garras do Piero marcadas nela.
Desgraçado.
— Voltou a fumar? — pergunta de repente, e fico surpreso por se
lembrar, já parei há uns sete anos.
— Não, é temporário, me desestressa.
— Eu sei de outra coisa que pode te desestressar. — Dou-lhe um
risinho e seus dedos dedilham até o meu pescoço, — Dançar, seu pervertido
— diz-me, arrancando uma risada.

Sienna caminho à minha frente em direção à cozinha. Empurro


para baixo o mal-estar que sinto ao entrar em casa, tenho muitas lembranças
boas com ele, com o irmão que eu amava, não aquele monstro que ele se
transformou ao longo dos anos.
Sienna me olha em frente à ilha e me sinto uma pedra pesada,
incapaz de sair do lugar. Ela me estende a mão a metros de distância e o seu
sorriso é pequeno e preocupado.
Ando até ela, tirando o meu paletó, pego Sienna pela cintura e a
coloco sentada em cima da ilha, ela abraça meu pescoço quando me enfio
entre suas pernas.
— O que acha de fazermos uma viagem? — Seu sorriso se alarga.
— Parece perfeito. — Ela alisa minha barba, — Eu irei com você
para onde quer que vá. — E planta um beijo molhado em meus lábios.
— Hum, pornô de graça na cozinha. — Maeve se levanta do outro
lado da ilha, nos surpreendendo, sua franja está presa para o lado com um
grampo, deixando à mostra uma trilha de ponto em sua testa.
— Vou pôr um sininho em você — aviso, tirando uma risada dela.
A consternação toma conta do meu peito novamente. Maeve foi
mais uma vítima de Piero, mas não me contou antes, pois achou que eu não
acreditaria. Quantas mais ele aterrorizou bem embaixo do meu nariz?
Olho para Sienna e a jogo por cima do meu ombro, ela dá um grito
e um pulo quando aperto o seu traseiro.
— Podem continuar, eu só vim pegar um biscoito — a garota grita
quando alcanço a escada.
Subo com Sienna para o nosso quarto e a coloco em cima da cama.
— Eu sei que já passou o batizado, mas podemos ir a Nova Iorque
— digo quando ela fica de joelhos, abrindo os botões da minha camisa.
— Isso me faria muito feliz — profere e desliza suas mãozinhas
por meus ombros rígidos enquanto os seus lindos olhos azuis sorriem para
mim. — Vem — diz, me puxando pelas pontas da gravata cinza —, me
deixe aliviar a sua tensão. — Caio de quatro em cima dela.
Seus olhos inocentes fazem um passeio rápido em meu corpo e, de
repente, sua mão apalpa o meu pau por cima da calça, olho para o rosto dela
e vislumbro um sorriso doce.
Desço mais, apoiando meus cotovelos no colchão, e reivindico
seus lábios lentamente. A minha mente pode estar padecendo no inferno,
mas, quando estou com ela, dentro dela, me sinto um drogado no paraíso.
Nossas roupas desaparecem à medida que desço, beijando o seu
corpo. Sienna arrepia e arfa debaixo de mim quando sente meus dentes na
curva da sua cintura.
Minha língua brinca no seu pequeno umbigo, e suas unhas cravam
em meus ombros, puxando-me para cima. Cheiro os seus seios e sugo o seu
mamilo, um lamurio passa por seus lábios, enquanto suas pernas apertam o
meu corpo, excitada.
Sienna enlaça a perna em meu quadril e segura no meu pau, que
repousa em cima do seu sexo. Ela afunda a cabeça dele na sua boceta
molhada e sobe, masturbando seu clitóris com ele em um ritmo lento e
forte.
Me afasto e abro suas pernas, segurando-a pelas coxas. Me torno
mais duro a cada fricção e a oscilação do seu corpo perfeito.
— Eu poderia gozar só de vê-la me usar para se tocar. — Ela me
aperta com força, estrangulando o meu pau, gemo pelo tesão e a
necessidade de me enterrar nas suas dobras molhadas.
Sienna agarra o lençol com a mão livre, arqueia o quadril e seus
lábios se transformam em um grande “o”, alcançando o clímax. Ela abre
aqueles grandes olhos azuis e desliza o meu pau na sua fenda encharcada e
esfomeada. Afundo nela com força, arrancando um grito e sentindo-me uma
bomba prestes a explodir.
Imerso na calmaria do seu corpo, me deleito, em seu cheiro, e sua
respiração saindo rápida e quente em meu pescoço, sem pressa para acabar.
Capítulo 30

FEVEREIRO

— Eu queria que viesse comigo. — Faço beiço enquanto prendo o


brinco na orelha e vejo Romeo, no reflexo do espelho, apenas de cueca
boxer.
— Ficarão mais à vontade sem a minha presença, pêssego —
declara suavemente e se levanta, o sigo com os olhos e o enxergo apanhar
uma garrafa de cerveja no frigobar. Ele se vira para mim, abrindo-a com os
dentes, franzo o nariz, fazendo-o sorrir.
— Está linda — diz enquanto fecho um sobretudo azul royal em
frente ao peito.
Dou de ombros, insatisfeita.
— Eu sei — respondo, o fazendo sorrir, me aproximo dele e afago
sua barba bem-feita com as mãos. — Vou sentir sua falta — digo, me
sentindo emotiva de repente.
— E eu estarei bem aqui neste quarto de hotel, esperando por você.
— Eu acho bom. — Planto um beijo em seu pescoço, que é onde
eu alcanço, e deixo o quarto acompanhada de Tito.
Chegamos em Nova Iorque não passava das dez horas da manhã,
fizemos um passeio pelo Central Park e depois fomos ao The Met, um dos
maiores acervos de artes do mundo. Um pouco de normalidade era o que
precisávamos.
Já faz duas semanas desde a morte dele. Eu evito pensar em Piero
o máximo que consigo, mas a sensação é de que ele saiu das nossas vidas,
mas não das nossas mentes. Romeo pode tentar disfarçar o quanto quiser,
mas sinto o seu luto e a sua fúria contida, na mesma proporção.
Infelizmente, a paz que desejamos só o tempo poderá nos dar, ou
se eu não estiver enganada, teremos algo para comemorar dentro de pouco
tempo. Estou atrasada há duas semanas, contudo, devido ao terror que
experimentei, pode ser apenas estresse.
Como não quero dar uma notícia ilusória ao Romeo e depois tirá-la
por um equívoco bobo, farei um teste quando retornarmos a Chicago, pedi
que Maeve comprasse ontem à noite, mas não tive coragem de fazer.
Não me permiti fantasiar com a ideia de estar grávida, apesar de
ser parte do que eu mais almejava. Seria frustrante olhar para a barra
negativa e saber que estou deprimida o suficiente para bagunçar todo o meu
organismo.
Atravesso as portas giratórias para sair do hotel, e Maeve está
escorada contra uma pilastra, fumando um cigarro. Ela veio conosco e nos
deu um perdido assim que descemos do jato, com uma mochila e um mapa
de Manhattan.
Me aproximo, chamando sua atenção, ela joga a bituca no chão e
amassa com um coturno.
— Está indo ver sua irmã? — pergunta, pegando um chiclete no
bolso.
Aceno, confirmando.
— Vem comigo, elas iam gostar de conhecer você. — Maeve
franze os lábios.
— Pelo pouco que descreveu a sua irmã, ela parece ser meio
presunçosa. — Sorrio, sem entender como ela chegou nessas conclusões.
— Você me lembra ela, um pouco. — Maeve faz cara feia. — E, se
bem me lembro, Mavis, você também não gostava de mim quando me
conheceu.
— Porque parecia uma Barbie pedante.
— Vamos, ou nunca mais te trago nas minhas viagens românticas.
— Românticas? Eu vi o seu itinerário, museus não são românticos,
Barbie. — Ela desaprova, fazendo-me rir.
— Talvez não para pessoas sem cérebro como você. Vamos logo
— digo, entrando em um luxuoso carro alugado com Tito ao volante.
— E se elas não gostarem de mim? — pergunta, deslizando para o
meu lado.
— Daí, azar o delas — respondo e relaxo no assento quando o
carro começa a andar.
Gosto da Maeve, ela é uma pessoa fácil de lidar, é sincera e não
tem medo de correr riscos. Depois do sequestro, achei que fosse entrar em
parafuso como eu, mas ela levantou a poeira e não permitiu que Piero
tomasse sua paz.

Depois de um momento, atravessamos os portões da mansão Fiore,


meu peito se agita, tomado de ansiedade. Desço do carro e puxo Maeve
para fora, ela olha em volta, tão chocada quanto eu fiquei na primeira vez
que estive aqui.
— Cacete, quantos seguranças! — sibila, olhando em volta.
— O chefe da Cosa Nostra mora aqui, ele seria estúpido se não
tomasse cuidado. — Maeve sorri, nervosa.
— Esse negócio de máfia é muito estranho — sussurra enquanto
nos encaminhamos para a entrada.
— Ignore, como eu e o resto das mulheres — comento, sentindo o
braço dela engatar no meu, de repente, sinto um leve puxão quando estamos
entrando de baixo da área coberta.
— Aquele é o marido da sua irmã? — sussurra, avistando Lazzaro
contra um poste da área, fumando um cigarro. Como sempre, parece que é a
única coisa que ele sabe fazer.
— Acalma a periquita — digo, sem evitar um sorriso —, ele é
segurança pessoal da minha irmã — esclareço.
— Seu cunhado deve ser superestimado para não se preocupar com
essa muralha do lado de fora. — Maeve encara Lazzaro com a sutileza de
uma bazuca.
— Ele é — sibilo. — Agora se controle. — Ela me dá um risinho.
Fiorella surge na entrada da porta com as mãos na cintura, usando
um vestido lã batida, vermelho-escuro, destacando o seu cabelo loiro, preso
em um coque frouxo, e ela fez a desfiada franja novamente.
— Vim saber o porquê da demora para entrar — diz com um
sorriso na cara. Helena surge atrás dela com uma formosa barriguinha de
uns seis meses.
— Estava mostrando a elegância da sua casa a Maeve. — Fiorella
dá um risinho de quem não acredita.
— Humm, tá — diz, direcionando seus olhos analíticos para
Maeve.
— É um prazer, Fiorella — Maeve fala com aquele mesmo olhar
de indiferença que eu queria arrancar da cara dela quando a conheci.
— É bom conhecê-la, Maeve — Helena está com um sorriso no
rosto, — Podemos entrar? Está frio aqui — fala, abraçando a barriga.
— Vamos — Fiorella avisa.
Helena entra, depois Maeve e, quando é a minha vez, Ella coloca o
braço à minha frente, impedindo a minha passagem. Seus olhos azuis
acinzentados me encaram friamente e, de repente, ela me abraça com força.
— Deus, Sienna, como fiquei preocupada com você. — Abraço-a
de volta, relaxando em seus braços. — Não ter notícias é a pior parte.
— Eu estou bem — afirmo. — Estamos bem — adiciono,
pensando em Romeo.
Ela se afasta e me puxa para dentro da casa, tiro o meu casaco e
Fiorella o toma de mim. Na última vez que estive aqui, queria ajuda para
me livrar de Romeo, agora não me vejo mais sem ele.
— Estamos a sós? — pergunto, não vendo ninguém, nem os
empregados.
— Franco vem mais tarde. — Ah, que bom, menos chances de
Maeve aflorar sua depravação inconscientemente.
Caminhamos para a sala de estar, está mais organizada, parecendo
um ambiente para adultos. Avisto Stefano sentado em um tapete felpudo
branco, rodeado por almofadas, devorando um mordedor.
— Meu Deus, ele está enorme! — expresso, emocionada. —
Quantos dentes ele já tem? — pergunto, surpresa, me ajoelhando nas
almofadas e pegando ele.
— Os dois de baixo — responde quando me sento no sofá ao lado
dela e coloco ele em meu colo. — Eu te enviei fotos deles — acrescenta.
— Muitas fotos — balbucio, — Na última vez que estive aqui, ele
não segurava nem a cabeça no lugar. — Helena, sentada do outro lado,
dividindo um sofá com a Maeve, sorri. — Como está a gravidez, Hell? —
pergunto, e seus dedos acariciam a barriga com um sorriso caloroso.
— Maravilhosa — diz, apertando os lábios.
Helena pode estar achando dolorosa e terrível, mas, depois do que
passou, acredito que ela não reclamaria.
— Mais três meses, Hell — Fiorella fala e aperta as bochechas de
Stef, o bebê tenta passar para o colo dela, mas eu não permito e viro-o de
frente para mim.
— Ele é a cara do Franco. Só que fofo — pontua, vendo as
sobrancelhas do meu sobrinho formarem uma expressão de bravo
naturalmente.
— Eu sei, estou ferrada — ela profere, nos fazendo rir, depois
coloca delicadamente uma mecha do meu cabelo para trás da minha orelha.
— Como estão as coisas na sua casa?
Meu telefone vibra em meu casaco, e Fiorella o entrega para mim.
— É Romeo? Ele já sente a sua falta? — pergunta e vejo seu
desdém explícito em sua voz.
Depois que ele me traiu, Ella disse que eu devia dar um tiro nele,
ou nas bolas dele, era o mínimo por me fazer sofrer.
— Não, é só um remédio que estou tomando — esclareço, soltando
o telefone no sofá quando Stef tenta pegá-lo. — Nós estamos bem.
— E pensar que Hell quase se casou com Piero.
— Sério? — Maeve pergunta, olhando para Helena, aposto que
pensando: ela teria padecido o inferno nas mãos daquele cretino.
As duas começam a conversar, me viro para Fiorella, brincando
com o bebê.
— Como estão as coisas por aqui? — pergunto, olhando para seu
rosto jovial, Ella parece realizada e feliz.
— Estamos bem. E pensando em ter outro bebê. — Meus lábios se
separam surpresa, fazendo-a sorrir.
— Tipo agora?
— Não, quando Stef tiver maiorzinho, queremos que ele tenha
alguém que possa confiar, como eu tenho você e a Helena. Crescer nesse
mundo é difícil... — Ela fica pensativa, seguro em sua mão.
— O que aconteceu?
— Queria que estivesse perto de nós, depois de tudo que aconteceu
com você, eu não consigo confiar em Romeo. Quais as chances de o irmão
mais pancada da cabeça ser o mocinho?
— Romeo não machucaria Sienna — Maeve profere do outro lado.
— Você não o conhece direito. — As sobrancelhas de Fiorella se estreitam
de forma soberba.
— Maeve está certa. Eu confio nele — declaro, antes que minha
irmã diga alguma malvadeza.
A expressão de Fiorella relaxa, e Maeve fica em pé, enfiando as
mãos nos bolsos do casaco.
— Eu vou fumar um cigarro com aquele grandão lá fora — avisa
sem suavizar sem asco por Fiorella e deixa a sala sem olhar para trás.
— Uau, de onde você tirou esse pitbull? — Ella pergunta
retoricamente, ela sabe que Maeve é filha da Agnes.
— Está sendo maldosa, Fiorella — repreendo. — E eu só não vou
atrás dela, porque eu realmente acho que ela foi flertar com o seu
segurança. — Rio.
Helena se senta do meu lado e apalpo sua barriga, é tão perfeita e
durinha.
— Pobre menininha. Com um pai mafioso, não terá mais sorte que
nós. — Hell ri e concorda.
Me viro para Ella, que mexe no celular, passando por várias fotos
de Stefano com pressa.
— Quero te mostrar as fotos do batizado pessoalmente, para ter
certeza de que vai olhar — expressa de forma incisiva. — As fotos da
agência ainda não foram reveladas, mas eu te envio uma em uma moldura,
se quiser — oferece com pesar.
— Eu adoraria, Ella.
— Não estou encontrando — diz, com estranheza.
— Deve ser porque esse telefone não é seu — Helena escarnece,
deslizo a mão pelo sofá em busca do meu, sentindo o coração cair no
estômago ao lembrar que não deletei as fotos de Franco.
— Fiorella — exprimo e, na hora em que tento puxar o telefone da
mão dela, ela o afasta e se levanta do sofá, com a expressão uma confusão.
— Como você tem isso? — pergunta, soando ríspida e estridente.
Fiorella vira o telefone para mim, apontando uma das fotos de Franco.
Encaro seus olhos azuis enervantes, sem conseguir formar as
palavras para explicar. Entrego o bebê a Helena, que está tão confusa
quanto Ella.
— Fiorella, é mais complicado do que parece — expresso, segura,
enquanto dou um passo na direção dela.
— Não é! — ela silva. — Foi o doente do seu marido que fez isso,
não foi?
Me dói no âmago fazer isso, mas lhe dou um aceno positivo.
— Romeo só seguiu ordens do nosso pai. — Fiorella ri com
escárnio e isso faz o meu sangue ferver.
— Não pode contar ao Franco.
— Você não pode me pedir isso, o que o nosso pai e Romeo
fizeram é imperdoável. — Consigo sentir sua ira me penetrar.
— Você não vai contar — determino.
— Se coloque no meu lugar. Ele é o meu marido, a minha família,
ele merece pôr um ponto-final nessa história, saber quem lhe causou tanta
dor.
— Isso é o que eu tenho feito desde que você era pequena. Me
colocado no seu lugar, para que pudesse ser a irmã destrambelhada,
desajuizada, só que não dá mais pra mim assumir todas as broncas sozinha,
estou sobrecarregada.
Sua expressão de mágoa me machuca, abrindo uma das pequenas
cicatrizes do meu coração, mas vou aprender a viver com isso.
— Você está tão presa nesse mundinho que esqueceu que ainda
tem uma família do outro lado: Dona, Dario, Maddy, eu. As nossas vidas
também serão afetadas, provavelmente mais que a sua. — Ela ri,
amargurada. — Se contar ao Franco, entraremos em guerra, nossos maridos
irão tentar matar um ao outro e, provavelmente, nunca mais nos veremos. É
isso que você quer?
Espero que um choque de realidade tome conta da sua mente
enevoada.
— Não posso mentir para ele — balbucia, petrificada e com
lágrimas nos olhos.
Puxo meu casaco, sentindo que enfiei meus pés pelas mãos
novamente. Essa sensação de gangorra em minha vida está acabando
comigo, preciso voltar ao hotel e deixar Nova Iorque o quanto antes.
— Devolva o meu telefone — peço e estendo minha mão para ela.
— Você está tão diferente — sussurra, paralisada.
Balanço a cabeça em negação.
— Não, mentalmente eu sempre fui assim, só que, com Romeo, eu
não tenho que disfarçar.
— Meninas. — Hell para entre nós duas com Stefano no colo. —
Precisam se acalmar.
— Por que não me contou? — ela questiona.
— Eu queria, mas a segurança da minha família vem em primeiro
lugar.
— Acha realmente que eu não me preocupo com você, Dona e as
crianças? Jamais permitiria que Franco as machucassem.
— Você não tem esse poder, Fiorella. E, se não enxerga isso, eu
não tenho mais nada para fazer aqui. — Visto o meu sobretudo e puxo o
telefone da sua mão.
Carlo precisa tirar Dona e as crianças de Chicago antes que a
merda toda exploda em nossa cara, pois, além de lidar com os soldados da
Famiglia, os da Outfit cairão matando quando descobrirem a existência de
Rocco.
Será o inferno na terra.
Dou um beijo e um cheiro no cangote de Stefano, depois um
abraço em Helena, e percebo que estamos as duas com lágrimas nos olhos.
— Sentirei a sua falta — falo, alisando sua barriga. — Cuida bem
da Aurora.
— Isso não pode acabar assim — Helena profere com a voz
embargada de aflição.
Me viro para Fiorella e, ao mesmo tempo em que desejo dar um
chacoalhão nela, a compreendo. Ela pertence à Famiglia agora, ao Franco, e
ela faria qualquer coisa por ele, assim como eu faria pelos meus.
Abraço minha irmã apertado, ela enterra sua cabeça em meu
pescoço, e ouço um soluço escapar dos seus lábios.
— Eu não quero criar uma guerra, nem que nossos filhos cresçam
inimigos, ou que herdem nossas desavenças.
— Eu sei. Eu também não, Ella. — Ella se afasta, limpando as
lágrimas.
— Papai merece morrer — pragueja com fúria.
Assinto, limpando as minhas lágrimas também.
— Eu vou guardar o segredo da Outfit, você vai deletar essas fotos
e vamos enterrar isso o mais fundo que conseguirmos — Fiorella expõe,
baixinho, para mim e Helena.
E nós duas assentimos juntas.
— É a coisa certa — Helena fala, me entregando Stefano
novamente. — Vamos nos sentar, essa discussão me deixou com cólica —
se queixa, se aconchegando em uma poltrona.
Me sento em outro sofá com Fiorella ao meu lado, a tensão ainda
percorre a sala, o que me deixa péssima, não queria ter vindo até aqui tirar a
paz da Fiorella. Espero que ela consiga lidar com isso.
— Acho que estou grávida — revelo, e aquela bolha pesada é
estourada. Minha intenção era contar para Romeo primeiro, mas precisamos
de uma boa notícia nesse momento.
— Quanto tempo está atrasada? — minha irmã pergunta,
emocionada, olhando para minha barriga.
— Duas semanas. — Torço o nariz, fazendo-a sorrir. — Farei o
teste hoje à noite.
— Somos as meninas mais férteis da família Santoro — Helena
exprime.
Maeve volta para a sala sem esconder o sorriso do rosto.
— O que você aprontou? — pergunto.
— Nada — diz, se sentando ao meu lado, — Mas eu peguei o
número dele.
— Do Lazzaro? — Fiorella questiona, surpresa. — Um ano, e eu
não consigo arrancar nada desse homem...
— E o que deseja arrancar do segurança, Fiore?
Franco, como sempre, entra em suas aparições surpresas. Maeve
encara o homem por cima do encosto do sofá e desliza quase para trás de
mim, com certeza querendo cobrir sua expressão libidinosa.
Fiorella enruga os lábios e ergue os ombros.
— Só o acho trombudo demais. — Ela abre um sorriso.
Franco analisa seu rosto por um momento e depois junta as
sobrancelhas sutilmente.
— O que houve? — pergunta baixinho, com certeza, devido ao
nariz vermelho de Fiorella e às pálpebras levemente inchadas.
— Sienna acha que está grávida — anuncia, e sorrio quando os
olhos dele encontram os meus, me sondando.
— Legal — diz com a expressão de uma tela branca, maneio a
cabeça em concordância.
Franco afaga o ombro de Fiorella e depois desaparece em um
corredor.
— Você vai ficar bem? — pergunto, escorando a minha cabeça em
seu ombro.
— Nós vamos. — Ella aperta a minha mão.
Entro em meu quarto de hotel um pouco exausta da visita a
Fiorella, foi dramático, mas até que deu para descontrair um pouco.
Contudo, o que mais preciso agora é estar de volta no conforto e na
segurança da minha casa.
Romeo desliga a TV assim que me aproximo dele e me deito no
seu lado. Ele me puxa para perto de si, analisando-me como Franco fez com
Ella.
— Está tudo bem, pêssego?
— Melhor agora. — Enterro minha cabeça em seu pescoço e
relaxo em seus braços, recebendo pequenas carícias atrás da cabeça.
Capítulo 31

Nada como voltar para casa.


Subo com as malas de mãos para o nosso quarto, enquanto Sienna
vem atrás carregando seus sapatos. Alguma coisa aconteceu durante a sua
visita a sua irmã, Sienna voltou para o quarto de hotel com os pensamentos
distantes.
Coloco as malas no closet, em seguida, começo a remover as
minhas roupas e, quando volto para o quarto, ela já está deitada na cama,
apenas de lingerie preta, com o vestido cobrindo a cabeça.
Subo em cima das pernas dela sem soltar o peso e, mesmo com o
tecido em sua face, consigo enxergar o vestígio de um sorriso.
— O que ocupa seus pensamentos? — pergunto, alisando a sua
barriga chapada.
Minha esposa remove o vestido, franzindo os olhos para a
claridade do quarto.
— Franco. — Minha expressão se fragmenta, e o seu olhar fica
tenso, Sienna se senta, arrastando as pernas para longe de mim. — Eu não
quero mentir para você, mas também não quero que fique com raiva de
mim.
— Contou a Fiorella sobre o Franco — deduzo, pois não vejo outra
explicação para seus pensamentos estarem naquele homem.
— Não contei, ela viu as fotos no meu telefone.
— Você tirou fotos? — Meu tom de voz sobe inconscientemente, e
seus olhos se exprimem a culpa. — Eu vou dar um jeito nisso — aviso,
descendo da cama e procurando o meu telefone.
— Fiorella não vai contar a ele.
— Você não tem como afirmar isso, pêssego. Ela é a esposa dele,
se fosse o contrário, você me esconderia?
— Esconderia. — Travo a mandíbula para não dizer besteira. —
Eu confio nela, é a minha irmã. — Aperto os meus lábios, eu não cometo
mais esse erro.
Sienna desce da cama e caminha até mim, no meio do quarto.
— Não faça nada — diz, segurando em meus pulsos, chamando a
minha atenção. — Confie em mim — ela pede e soa quase como uma
súplica.
Respiro fundo e me sento na borda da cama, Sienna entra no meio
das minhas pernas e seus olhos alcançam os meus quando seus polegares
deslizam por minhas sobrancelhas delicadamente.
— Eu confio em você, pêssego, mas vou ficar em alerta — aviso.
Ela assente.
— Me desculpe — entoa, deslizando as mãos pelos meus ombros.
— Saímos para relaxar e voltamos para casa com caos a mais.
— Tudo bem, você me contou, isso é importante. — Ela dá um
pequeno sorrisinho e me beija nos lábios brevemente.
— Eu preciso ir ao banheiro — expõe, se afastando.
Ando até a parede de vidro e sirvo um Bourbon, que repousa na
mesinha de centro. A casa está vazia e silenciosa, apenas com os
seguranças. Agnes entrou de férias, e Maeve ficou em Nova Iorque, para
uma entrevista de emprego. Ela pediu para não contar a Sienna ainda, até
ter certeza se vai conseguir a vaga.
Dou um longo gole, sentindo o líquido queimar, e me viro quando
uma porta se abre.
Sienna deixa o banheiro e um sorriso floresce no canto da sua boca
quando me enxerga. Amo o sorriso dela, os olhos brilhantes e o corpo, tudo
nela me deixa maluco, despertando um lado que nem eu mesmo conhecia.
Ela é perfeita pra caralho. Minha linda esposa caminha em minha
direção, trazendo algo em suas mãos.
— Está com carinha de quem aprontou — falo, soltando a bebida
na mesinha para pegá-la.
— Estou grávida. — Suas palavras soam doces e me rendem um
misto de emoções difíceis de discernir, porém, medo é uma delas, medo do
que quer que provenha de mim não seja puro. — É uma boa notícia, não é?
— Sua voz sua incerta.
Suavizo a minha expressão e curvo os lábios em um sorriso
verdadeiro para ela.
— É claro que sim, pêssego. Tudo o que vier de você me faz feliz.
Ela abre um sorriso que quebra qualquer pensamento negativo que
meu cérebro ferrado possa ter. Puxo Sienna para os meus braços, colando
seu peito ao meu, sentindo-me o filho da puta mais sortudo da terra.
Ela ergue os olhos até os meus, coberto por uma fina camada de
lágrimas.
— Prometo nunca mais decepcioná-la, serei o melhor pai e marido
que você já sonhou na vida — entoo, reivindicando seus lábios.
Epílogo

DEZEMBRO
10 MESES DEPOIS

Ajeito na prateleira da sala principal um retrato do nascimento do


bebê ao lado de um enfeite natalino. Já passaram seis semanas, e ele nem se
assemelha ao mesmo da foto. Olho para Luccare, ele dobrou de tamanho, os
cabelinhos sedosos e pretos como os de Romeo, e os olhos claros
acinzentados. Ele é de uma beleza tão pura que não me canso de olhá-lo, e
nem Romeo, que, às vezes, vira a noite em claro, embalando o pequeno
para eu dormir.
Cogitei contratar uma babá, mas ter uma família e ser mãe é tudo
que sempre desejei, não vou me abdicar das coisas difíceis. Depois do
início catastrófico que Romeo e eu tivemos, acordar 75428 vezes durante a
madrugada é moleza.
Aquela nuvem negra que pairava sob a nossa casa foi embora aos
poucos, conforme minha barriga crescia e ficava mais evidente que
estávamos seguindo na direção certa. Romeo e eu teremos marcas que nem
o tempo poderá apagar, mas, ao lado dele e de Luccare, parece que se torna
mais fácil.
— Ele dormiu? — Romeo pergunta às minhas costas com uma
mão na minha cintura e a outra ele desliza sobre a cabecinha de Lucca,
olhando-o com admiração.
— Feito um bebê — respondo com um sorriso e o solto em um
pequeno berço vime, no meio da sala.
— Já estou ficando sem assunto com aquele cara. — Rio, afagando
o rosto do meu marido com as mãos, encontrando seus olhos escuros e
profundos.
— Seja gentil, eles voltam para Nova Iorque em poucas horas. —
Romeo faz cara feia.
Voltamos para a cozinha, onde Agnes está terminando o jantar de
Natal, conversando com Maeve e Lazzaro, tão tenso e sem graça quanto
Romeo. Fiquei feliz e triste na mesma proporção quando ela disse que se
mudaria para Nova Iorque.
Maeve está realizada com o emprego e visivelmente feliz
namorando e morando com o ex-segurança de Ella. Lazzaro, por exibir uma
ótima conduta, apesar das fugas das meninas, sorrio sempre que lembro, foi
promovido a capitão do Queens em Nova Iorque.
Os meses passaram tão rápido durante a minha gravidez, e Romeo
achou melhor permanecer em território amigável até o Luccare nascer.
Estou ansiosa para conhecer Aurora e ver Fiorella com sua nova gestação,
ela disse que se sente como uma pata grávida da Serena.
Romeo se senta em uma poltrona, e eu me aconchego em seu colo,
cruzando as pernas. Maeve e Lazzaro giram na banqueta em nossa direção.
— Já passou o Natal alguma vez em Chicago, Lazzaro? — Os
olhos do capitão encontram os de Romeo brevemente, antes de me
responder.
— Uma vez, na sua antiga casa.
— Ah, claro. Você era o segurança da Fiorella — respondo, ele era
tão silencioso que era fácil esquecer às vezes.
— Pobrezinho — Maeve profere, passando a mão na nuca dele,
Lazzaro não sorri, mas suas feições se suavizam para a garota. Até parece
um requisito para os homens da máfia italiana, fingir que não tem um
coração.
— Não seja maldosa, ela está comportada agora. — O capitão dá
um risinho que discorda.
Agnes aparece na frente deles, chamando atenção. Me viro para
Romeo e passo o braço por cima dos seus ombros, me aconchegando em
seu peito largo. Ele enfia o nariz na curva do meu pescoço e sua barba
grossa me causa cócegas.
Posso descrever esse Natal como o melhor de todos. Sem grandes
sorrisos de menina perfeita, sem conversa fiada só para agradar. Com ele,
não me sinto uma marionete, posso ser o que eu quiser.

Assim que o jantar foi servido, Luccare despertou, como eu


imaginava. Mamãe entrou no banho, se sentou para fazer uma refeição, se
deitou para descansar, ele acorda, parece que o menino tem um sexto
sentido.
Romeo ficou com ele em seus braços para que eu pudesse comer,
depois passou para Maeve, e assim foi nosso jantar: leve, descontraído e
simples.
Dou um profundo cheiro no cangote dele e coloco Luccare
adormecido em seu berço, com a chupeta quase caindo da sua pequena
boquinha. Dou um longo suspiro antes de deixar o quarto, é gostoso e
satisfatório admirá-lo.
Entro em meu quarto e Romeo está saindo do closet apenas de
cueca boxer preta, dou uma olhada nada sutil em seu corpo seminu, quanto
mais velho, mais gostoso.
Tiro o meu vestido preto no closet, ficando apenas com uma
lingerie safada de Natal. O pequeno tecido que cobre minhas partes íntimas
é de renda transparente, com a extremidade branca de pelúcia.
Quando estou saindo do closet, pego uma touca de papai Noel e
encaixo na cabeça. Evito me olhar no espelho, mesmo que a nossa relação
esteja meio morna, devido ao parto recente, quero acendê-la novamente,
mas vulgaridade nunca foi o meu feitio. Meu marido está sentado na beira
da cama, apoiado para trás, nas palmas das mãos. Seu sorriso se alarga
quando me vê, mostrando todos os seus dentes.
— Mamma mia — sibila, e seu sorriso é ocupado por uma
expressão depravada.
— Você gostou? — pergunto com uma sobrancelha arqueada,
caminhando em passos lentos até ele.
— Por Deus, pêssego, eu nem gosto do Natal, e já se tornou o meu
feriado preferido. — Sorrio parando entre suas pernas, as mãos de Romeo
exploram meu corpo, descendo para minha bunda.
Meus olhos encontram os dele na hora em que seguro em seu rosto
e planto um beijo em seus lábios, depois em sua bochecha e seu pescoço,
fazendo-o se inclinar para trás. Desço, deixando uma trilha de beijo em seu
corpo pecaminoso e percebo Romeo ficar tenso, travado.
— Pêssego. — Ele segura a minha face. Quando fico de joelhos no
chão, encontro o seu olhar, tenso.
Eu ainda não dei prazer a ele com a minha boca. Ainda não me
sentia à vontade, e Romeo nunca me cobrou, depois minha barriga cresceu
tanto que qualquer coisa me enjoava, não queria vomitar em cima dele.
— Apenas relaxe, mio amore — sussurro, segurando em seus
pulsos e tirando do meu rosto gentilmente.
Romeo ergue os quadris quando seguro nas laterais da sua cueca e
arrasto para baixo, libertando seu pau deliciosamente grande, cabeça larga e
arroxeada, coberto por veias grossas. Romeo se inclina para trás, ficando
sobre as palmas da mão novamente, e acaricio o seu comprimento pesado, o
levando em direção a minha boca.
Romeo geme quando meus lábios se fecham em torno do seu
comprimento e chupo a sua região mais sensível, provando o gosto do seu
pré-gozo.
Deslizo seu membro duro como uma pedra, até o sentir em minha
garganta, e uso minha língua para fricção. Os quadris do meu marido se
movem em minha direção, conforme o masturbo com uma mão ao mesmo
tempo em que o chupo.
— Ahh, caralho... pêssego. — Romeo dá um grunhido profundo
que percorre pelo meu peito e um tremor violento corre o corpo dele,
levando espasmos ao seu quadril, fazendo-o ir mais fundo na minha
garganta.
Ergo o olhar até ele, e a impressão é que eu acordei uma fera
bestial e faminta, e o meu desejo é de que ele me devore inteira.
A mão dele corre até meus cabelos e se enroscam neles próximo a
minha nuca, deixando-me inteiramente arrepiada. Lhe dou meu
consentimento com um olhar, e Romeo começa a ditar um ritmo, sedento de
tesão pela maneira que seu pau pulsa em minha boca.
Sinto o seu pau cada vez mais duro e pesado, e meus lábios
melados escorregam com facilidade em seu comprimento.
— Sienna — profere com obscuridade e luxúria, e seus dedos
freiam minimamente as estocadas. — Se não quer engolir, se afaste. —
Deixo seu pau bater mais fundo em minha garganta, e Romeo explode,
inundando a minha boca. Ordenho até a última gota e me afasto, limpando
os lábios com classe.
Romeo me puxa e gruda nossos lábios com fervor, me deitando da
cama.
— Porra, pêssego — sibila com uma voz embargada de luxúria
sombria e lasciva —, essa boca fica ainda mais gostosa com o meu gosto
nela.
Romeo chupa a minha língua e o meu queixo, e me marca com os
seus dentes o meu pescoço, até alcançar os meus mamilos intumescidos. Ele
puxa a renda para baixo, e sua língua o lambe e depois o abocanha, sugando
sem muita força, mas o suficiente para me deixar molhada.
Ele puxa a minha calcinha, despedaçando-a e jogando longe. Tiro a
minha touca e encaixo na cabeça dele, levando aqueles grandes olhos
escuros e luminosos me olharem.
— Dê o seu melhor, papà.
Meu marido desliza profundamente na minha entrada, fazendo-me
arfar e arquear as costas na mesma hora. Ele passa uma mão por baixo da
minha coluna, me mantendo no lugar. Afago o seu rosto e mordo meu lábio
inferior com suas estocadas lentas e profundas que me bagunçam desde o
princípio, fazendo com que gemidos e murmúrios escapem dos meus lábios.
— Amo o quanto fica prontinha para me receber, sem nem mesmo
tocá-la, amo como seu corpo parece fundir-se ao meu — sussurra com a voz
rouca de excitação, me preenchendo dolorosamente devagar, fazendo com
que seus movimentos friccionem meu clitóris latejante por atenção. — Eu
amo você inteira, pêssego.
Gemo alto quando ele bate fundo, levando espasmos até o meu
âmago.
— Eu amo você todinho, Romeo.

FIM
LIVROS DA SÉRIE:

Votos por Dever


Votos de Mentira
Votos Quebrados
....
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PRIMEIRO LIVRO DA SÉRIE
ROMANCE MÁFIA + CASAMENTO FORÇADO + MAFIOSO IMPLACÁVEL.

Nascida no berço da máfia de Chicago, Fiorella Santoro descobre tarde demais que seu destino já
havia sido decidido antes mesmo de completar dezoito anos.

Para garantir a paz entre Outfit e a máfia nova-iorquina, Ella, é usada como uma moeda de troca,
sendo forçada a se casar com o herdeiro da Cosa Nostra: Franco Fiore.

Franco não tem honra, coração e nem moral, dominado como o Corvo, pois reflete a encarnação do
mal, pretende possuí-la e reivindicar toda sua inocência.

Franco só não presumia que a sua futura esposa fosse tão sombria e perigosa quanto ele, Fiorella não
estava disposta a ceder, quebrar ou se esconder.

Uma união fatal que tem tudo para terminar em sangue, se torna uma paixão ardente, perigosa e
instável, colocando em perigo não só o acordo entre as máfias, mas tudo que está a volta deles.
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SEGUNDO LIVRO DA SÉRIE

Helena Hathaway foi adotada por Carlo Santoro, o Chefe da Outfit, devido a sua amizade com a filha
do mafioso. Ela cresceu sob as regras da máfia, jurou lealdade e submissão. Porém, para ajudar sua
amiga, cometeu um ato de traição, colocando em risco o acordo entre as máfias. Helena se vê no
início de um pesadelo, desesperada e sem alternativas, ela foge para salvar sua vida.
Ettore Reviello, imponente e corrompido, é a voz da razão na máfia nova-iorquina. O
Consigliere, carregado por um passado obscuro, nunca desejou se casar. Logo que descobriu que seu
destino já estava determinado, havia somente uma coisa que ele poderia fazer: encontrar uma mulher
disposta a se casar sem a esperança de um futuro.

Duas almas quebradas se unem. A sedução ardente e a luxúria que já existiu uma vez, revive
entre os dois, e, desejo, ódio e superação é a batalha que Ettore terá que lutar se quiser resistir ao
casamento com Helena.

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GRAVIDEZ INESPERADA - BILIONÁRIO MULHERENGO.

Delphine Dubois aos 27 anos, chegou no auge da sua profissão; Diretora Financeira do Hotel Bel Air
Country Club. Para sua vida ficar perfeita, só falta uma coisa. Um bebê.
Devido a um relacionamento complicado no passado, Delphine não consegue confiar em outro
homem, por isso decide fazer inseminação artificial. Duas semanas antes da consulta, por influência
da sua melhor amiga, ela faz sexo casual com um homem que conheceu no lobby do hotel.
Delphine só não contava que no dia da inseminação já estaria grávida do homem quente e com
sotaque espanhol, com quem ela rolou a noite inteira. Christopher Wesker, um mulherengo
indomável e pior de tudo, herdeiro do Hotel Bel Air.
Christopher fará de tudo para ganhar a confiança dela, porém a sua reputação ao longo dos anos o
coloca em maus lençóis.

O que resta saber é; será que Delphine cederá aos encantos do espanhol, pelo bem do bebê?

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Dante Armstrong abandona Nova York e se muda para Seattle em busca de um recomeço.
Com o passado manchado de relacionamentos fracassados, Dante ergue uma armadura emocional e
decide dizer não ao amor, até sua irmã contratar uma doce e tímida empregada.
Hannah Reese, depois de muito custo foi escalada para trabalhar na cobertura de um ricaço, porém
não imaginava que encontraria um homem gentil, solitário e quebrado.
A atração entre os dois é irrefreável, Dante sabe que não resistira, mas com as feridas do passado
ainda aberta, ele propõe a jovem um relacionamento sem compromisso.

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Michael O'Connor, um advogado bem sucedido que esbanja beleza e status, está à

procura de uma babá para sua filha.

Viúvo há mais de quatro anos, Michael ainda sofre com os fantasmas do passado, mas tudo muda

quando contrata Lindara, uma doce jovem que o abala feito um raio com toda a sua simplicidade.

Lindara Fincher, aos 7 anos de idade, tinha uma vida espetacular, morava em Upper East Side e era

a melhor dançarina de ballet de sua turma. Porém, ela vê sua vida de cabeça para baixo, quando em

uma noite ela e seus pais sofreram um grave acidente de carro a deixando órfã.

Ambos atormentados pelo passado encontram algo em comum, mas para que esse amor floresça

terão que lidar com Sabrina, funcionária e ex-namorada do Michael, que une forças com o arqui-

inimigo de longa data do advogado.


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Lindara aceitou o pedido de casamento, mesmo guardando um segredo que pode destruir seu
relacionamento com o advogado Michael O’Connor. Na tentativa de consertar o seu erro, ela acaba
sofrendo um terrível acidente perdendo parcialmente a memória.
Michael não poupa esforços para ajudá-la a lembrar dele. Porém, no processo, eventos preocupantes
trazem grandes consequências para vida dos dois.
Lindara se encontra em um impasse: ficar ao lado do seu noivo, mesmo não o amando, ou tentar
recomeçar a vida, longe de tudo o que ela já amou.

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Depois de muitos altos e baixos Lindara foi transformada em uma mulher indecorosa pela
mídia, fazendo-a se afastar de todos que mais ama. Ela tenta seguir em frente sem olhar para trás,
mas o passado novamente volta atormentá-la.
Dante antigo rival do Michael se aproveita da situação e faz de tudo ao seu alcance para conquistar o
coração da jovem, que a muito custo acaba cedendo aos seus encantos.
O advogado se torna a válvula de escape da Linda, sempre presente e atencioso. Eles só não
imaginavam que em um piscar de olhos o universo deturparia a relação dos dois, e mais uma vez
Lindara se veria entre o passado e o futuro.
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Um cara novo na cidade.
Um aplicativo estúpido.
Uma aposta que trará estragos irreparáveis.

GRAVIDEZ POR ACIDENTE

Abigail Waterford não poderia estar no melhor momento da sua vida, cursando o 2° ano na
Universidade de Yale e sendo namorada do capitão do time de futebol. Porém, nem tudo são flores, a
garota esconde um segredo que acredita ser a sua ruína. Ninguém conhece o seu passado e na internet
é como se ela não existisse. E isso está prestes a mudar.
Dexter Prescott, ex-capitão do time retorna a cidade para terminar o último ano do curso. Seu maior
objetivo é recuperar sua posição no futebol. Contudo, seus planos mudam quando seu caminho cruza
com Abby.
Dex fica fascinado e intrigado com a ruiva, e quando percebe que ninguém sabe nada a respeito do
passado dela fica propenso a descobrir.
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Um bad boy de caráter duvidoso se rende a uma nerd disposta a colocá-lo na linha.

Dakota King, uma aluna exemplar na Universidade de Nova York, tem sua vida transformada em um
caos no instante em que Savannah, sua irmã gêmea, lhe apresenta Heyden Hayes e Erin Yoshida, o
cara, por quem ela sentia uma tremenda queda.
Estudante de literatura inglesa, a tímida garota sonhava em viver o seu próprio romance e aproveitou
a oportunidade quando foi assaltada em seu trabalho e o assaltante lhe propôs um acordo em troca do
seu silêncio. Dakota pensou que seria fácil enganar a polícia, já que o seu pai estava encarregado do
caso, mas jamais pensou que se apaixonaria pelo assaltante.
LEIA AQUI: amzn.to/3xoEHzn

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