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Multiculturalidade: a Visão de
Sense8 e Slavoj Zizek.
Porto
2023
Resumo
A Multiculturalidade baseia-se no debate pelo respeito da coexistência de
outras culturas, através da compreensão dos seus valores e normas. Para tal, é
necessário garantir a igualdade de direito global, de forma que seja colocada de
parte a discriminação seletiva e se preservem as características particulares de cada
cultura.
Abstract
The term Multiculturalism is based on the debate about respecting the
coexistence of other cultures by understanding their values and norms. To this end,
it’s necessary to guarantee global equality, so that selective discrimination is set
aside, and the particular characteristics of each culture are preserved.
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Índice
Introdução................................................................................................................................3
Conclusão...............................................................................................................................13
Bibliografia.............................................................................................................................14
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Introdução
Como tal, este trabalho tem como principal objetivo realizar uma
contextualização sociocultural do termo multiculturalidade, de forma a entender
quais os principais fatores que permitem a existência e exploração deste, mas
também quais as principais ameaças e limitações apresentadas.
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1. Multiculturalidade: Contextualização Sociopolítica
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Em termos concretos, trata-se de conferir centralidade aos denominados
“direitos dos grupos étnicos”, garantindo representação política e social destes em
diversos níveis de decisão institucional. Adicionalmente, desenvolvem-se com
frequência, em alguns países, “políticas de quotas” que distribuem lugares no
mercado de trabalho, nas instituições políticas e nas organizações sociais em função
da pertença étnica (Taylor, 1994).
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2. A visão de Slavoj Zizek
Este incentiva uma certa dose de intolerância como uma necessidade caso o
objetivo seja elaborar uma critica, a sua definição de despolitização da economia
parte de uma reflexão sobre a sua participação plena através da atitude ideológica
atualmente hegemónica – o liberalismo multicultural e complacente (Laureano,
2016).
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É através de uma discussão sobre o universal e o particular, que Zizek defende
que é natural à corrente política conceber um tipo de atalho entre o universal e o
particular: um individual universal é uma contradição onde o individual surge como
substituto do universal. O multiculturalismo é a melhor conformação da ideologia do
capitalismo planetário, uma postura que cuida toda a cultura local à vontade do
colono que interage com uma multidão colonizada (Laureano, 2016).
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3. Sense8 e o Pensamento de Zizek
As personagens são Lito (México), Sun (Coreia do Sul), Will (Estados Unidos da
América), RJ (Reino Unido), Kala (India), Wolfgang (Alemanha), Nomi (Estados Unidos
da América) e Capheus (Quénia) e o grupo é caraterizado como pertencentes à
“próxima” evolução da espécie humana denominada de homo sensorium. Estes
distinguem-se ao terem as suas mentes unidas – uma consequência da ligação
psíquica. Conseguem também “habitar” o corpo uns dos outros e partilhar as suas
aptidões de forma intercambiável como se os seus cérebros fossem parte de uma
rede. O enredo da série desenvolve-se na descoberta e tentativa de comunicação
entre estes, enquanto são perseguidos pelo Whispers, uma personagem que usa o
mesmo poder, a única diferença é a sua necessidade de os olhar nos olhos para
conseguir ligar-se ao seu elo psíquico.
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exclusão da politização. Para o filosofo, despolitizar a economia é necessário como
base do plano inquestionável da sociedade, da cultura e da política e como forma de
dar visibilidade às questões socioeconómicas apenas será possível numa análise
reconstrutiva sem qualquer ligação aos fatores políticos. Sendo que o conflito radical
encontra a rejeição da política quanto à esfera da cultura e da subjetividade. A
sublimação do radicalismo político na relação da sociedade com a cultura é que deixa
intocada a “base marxista” da luta sociocultural quanto à dinâmica económica do
capitalismo global sendo “a forma como a economia funciona aceite como uma
simples visão do estado objetivo das coisas” (Zizek, 2001).
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estas não se podem identificar plenamente nas vivências e experiência de indivíduos
não brancos e as ramificações ou implicações de tal realidade (Borrás Diás, 2019;
Martins, 2019).
Uns dos termos mais associados com Sense8 é a palavra “conexão”, esta está
enquadrada na realidade tecnologicamente abundante do século XXI. A conexão,
como conceito, é fortemente imbuída de noções de vida e realidades virtuais,
chegando a um ponto, nos dias de hoje, onde fortemente – embora não
exclusivamente – denota aplicação direta na conetividade digital. No entanto, Sense8
emprega o retrato de relações sexuais íntimas para contar um conto de outro tipo de
conexão, a humana. Este conceito ligado ao emocional e “real”, traz uma versão de
conetividade constituída a partir de uma resposta à incerteza que vem com a vida na
sociedade pós-moderna, uma sociedade onde tudo é instável e maleável (Maia &
Galego, 2021).
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essas problematizações. Percebendo e adaptando esses debates sociológicos no seu
enredo, a série sugere que os relacionamentos eróticos podem ser considerados
gatilhos e plataformas para a aquisição de segurança (Maia & Galego, 2021).
Esta forma de conexão é um dos fatores que leva Sense8 a destacar-se como
criação fictícia, uma vez que Wachowski leva a idealização ao próximo nível, no seu
universo, onde o casal não é limite. Diversas vezes é sublinhado no decorrer da
história que os personagens são capazes de experienciar o amor na sua forma mais
pura. A este fator adiciona-se o facto de a sua evolução como homo sensorium levar
à formação de vínculo com mais sete indivíduos, os quais compartilham um laço
inquebrável de afeto. Tal acaba por se tornar, de certo modo, uma nova noção
idealizada do ethos do envolvimento erótico. Noutra perspetiva, a do caos da
globalização, o modo de vida sempre mutante e nunca estável, leva aos personagens
da série a terem um ponto de referência emotivo imutável e irrefutável (Borrás Diás,
2019).
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de desconexão do mundo digital, mais especificamente, não se trata mais de desejar
ou de precisar experimentar conexão no mundo digital, uma conexão fora do
ciberespaço é proposta como uma resposta à futilidade de sujeitos pós-modernos
ontologicamente inseguros. Embora durante a série a conexão entre os indivíduos
seja descrita usando termos como um computador (ou seja, um “cérebro com
rede”), os protagonistas não precisam de um computador para experimentar a sua
conexão. Num mundo globalizado, essa desconsideração do ciberespaço e do espaço
real torna-se essencial, ou seja, a resposta mais eloquente para as realidades
digitalizadas e desencaixadas que nos envolvem, fora só que é considerado
“conservador” e gera insegurança perpétua – é a perspetiva de uma conexão que,
intuitiva e instantaneamente une os indivíduos (Borrás Diás, 2019; Rohmann, 2020).
O globalmente diverso – em termos de etnia e geografia – são as origens dos
sentidos e do cenário mais apropriado e simbólico, na medida que destaca a
diminuição dos obstáculos espaciais. A sexualidade em Sense8 pode ser lida de uma
forma alternativa, primariamente através das relações sexuais dos protagonistas que
constituem um ato de transgressão e desobediência e, por último, através do que diz
respeito às próprias representações e às mensagens que elas transmitem sobre o
sexo, o género e o sexismo (Maia & Galego, 2021; Rohmann, 2020).
A posição de Zizek quanto à luta pela diferença cultural, é a hegemonização
través da criação de consensos partilhados se o objetivo for a luta pelo
multiculturalismo e o progressismo idealizado. Em vez de se estabelecer elementos
em comum partilhados, deve priorizar-se a luta contra a política. A sociedade não
deve viver a tolerar as suas diferenças, como um pacto, mas sim a lutar em conjunto,
um pacto de luta que atravessa as civilizações e a sua identidade a partir do interior
contra um núcleo opressivo. Emancipando-se no fundo não com a cultura global
partilhada pelas vantagens políticas, mas sim pelos reprimidos, os explorados que se
conectam para um objetivo comum através do lado negativo das vivencias humanas.
O universal neste caso, não se baseia no sentimento profundo resultante da
existência de diferenças, mas onde se partilham os mesmos valores básicos. Baseia-
se sim na experiência da negatividade e do desfavorecimento de uma identidade
particular que se conecta (Zizek, 2001).
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Conclusão
Em conclusão, Sense8 pode ser entendido como uma construção artística que
procura utilizar a plataforma consumista dominante ao apresentar a diversidade e a
conexão não como individualismo, mas como um apelo unificador de pura
intimidade. Ao mesmo tempo, é igualmente possível que o espetáculo tenha
inadvertidamente caído na tentativa de defender a liberdade do erotismo,
apresentando representações comemorativas da sexualidade que, ao contrário,
resultam na mercantilização da experiência sexual.
A história contada por Sense8 implica o atual debate moral e político sobre a
multiculturalidade, defendendo novas possibilidades, as próprias criadoras
introduzem várias influências visuais para afirmar a importância das construções
artísticas como ferramentas através das quais o público pode perceber, compreender
e ampliar as suas ideias em torno da partilha multicultural e a sexualidade.
Assim, Sense8, implica e explica, encoraja até, esse mesmo processo: onde
através dos vários discursos, narrativas e metáfora, mesmo que contraditórias, o
espetador é motivado a ser um recipiente ativo, podendo identificar-se, aceitar ou
rejeitar momentos da crónica, mas entende a necessidade de ser necessário uma
união para lutar. Isto é, pode-se dizer que tudo nesta série é sobre sexo, menos o
próprio sexo; o sexo nesta obra é sobre conexão, celebração, diversidade, liberdade,
uma estrutura surrealista, distópica ou de ação abundante é articulada apenas para
tornar o cenário para a metáfora principal florescer: os sujeitos humanos têm a
capacidade de se conectar independentemente de qualquer limite.
A (in)sensibilidade deste imaginário pós-humano para as modalidades raciais,
de classe e de género pode ser criticada, contudo, o que permanece contante é o
pensamento desejoso de um remédio para a fragmentação do espácio-temporal
literal, metafórica e da insegurança existencial da pós-modernidade.
Em conclusão, tanto Sense8 como as reflexões de Zizek alertam para uma
discussão ainda não de todo ultrapassada entre o universal e o particular, entre
aquilo que deve constituir o patrimônio de toda a sociedade, seja ele referente à
história, à cultura ou aos bens materiais, e aquilo que constitui a história e a cultura
dos grupos pertencentes a uma dada sociedade.
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Bibliografia
Borrás Diás, S., (2019) Sense8’s Wolfgang Bogdanow: The Epitome of the Process of
Deconstruction, tese para obtenção do grau em Estudo Ingleses apresentada à
Universidade das Ilhas Baleares;
Maia, L. & Galego, L. (2021) Lito And Hernando: A Semiotic And Speech Analysis
About Sexuality In Sense8 Christmas Special Episode in Revistafsa;
Rohmann, R., (2020) Transnational Identity in Online Discourse – Netflix’s Sense8 and
accompanying Twitter communication, tese para a obtenção de grau de Mestre
apresentada à Universidade de Waterloo e a Universidade Mannheim;
Zizek, S., (2001) Multiculturalism, or, the Cultural Logic of Multinational Capitalism in
New Left Review;
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