Você está na página 1de 2

AUTORIDADE E LIBERDADE

Já vimos que o poder político é natural e necessário, que um dos elementos da soberania é a
força, e que ambos se legitimam pelo consentimento da consciência social e pela realização do bem
público.

-Mas a liberdade é também um elemento natural e necessário na sociedade, porque o homem é um ser
livre e inteligente.

Ateus e deístas, materialistas e espiritualistas, todas as escolas e todos os sistemas, apoiados em


razões diversas, reconhecem que a liberdade é uma condição essencial á vida da personalidade
humana. Se não se pode conceber a sociedade sem autoridade, não se pode concebê-la também sem
liberdade.

Se fosse possível suprimir totalmente a liberdade dos indivíduos, a sociedade se tornaria um


rebanho de servos, de onde desapareceriam em breve os últimos vestígios da Moral, do Direito, da
Ciência, da Arte, da Civilização; uma sociedade onde não houvesse autoridade, soçobraria
rapidamente no crime, na miséria e na morte.

Autoridade e liberdade não são idéias antinômicas, mas condições necessárias e complementares
da vida social e da civilização; onde uma delas falte, estas se tornam impossíveis.

Por serem necessárias ás sociedades e complementares, não podem ser ilimitadas, pois uma
condiciona e completa a outra. As instituições que as regulam com inteligência, os regimes em que elas
se harmonizam, promovem o bem público, realizam a ordem, a felicidade e o progresso sociais.
Para uma sã filosofia política, não há, não pode haver oposição entre liberdade e autoridade, pois
são elas elementos essenciais, condições necessárias da própria vida social, e o homem não pode viver
senão em sociedade. Na prática, porém, os que exercem a autoridade, por mais cultos e bem
intencionados que sejam, podem involuntariamente ofender ou limitar excessivamente a liberdade do
indivíduo, assim como este, voluntariamente ou não, pode opor obstáculos excessivos ao exercício
legítimo da autoridade ou ofender a liberdade dos outros indivíduos pela extensão abusiva da sua
própria.

1
“Pouco importa a noção que se tenha do Estado; que se veja nele a personificação jurídica da
coletividade, como ensina a doutrina metafísica, ou que se veja o produto da diferenciação entre
governantes e governados e uma cooperação de serviços públicos, funcionando sob a direção e controle
dos governantes, como ensina a doutrina realista, pouco importa; é preciso afirmar energicamente e
incansavelmente que a atividade do Estado em todas as suas manifestações é limitada por um Direito
superior a ele, que há coisas que ele não pode fazer e outras que ele deve fazer, e que essa limitação não
se impõe apenas a este ou àquele órgão, mas ao Estado mesmo como pessoa, se se admite essa
concepção, e se impõe a todas as manifestações da atividade estatal, seja qual for o órgão que
intervenha.” ( Duguit —- Droit Const., vol III, pág. 517.)

2
Direitos individuais, liberdades públicas, direitos do homem e do cidadão são expressões
equivalentes, mas comumente se distingue, para facilidade do estudo, o conteúdo dos direitos
individuais em direitos relativos à igualdade civil, à liberdade civil e à liberdade política. São também
denominados obrigações negativas do Estado, porque sua declaração significa que o Estado não deve
fazer nada que os possa lesar. São limitações à autoridade, à atividade dos poderes públicos, dos
governos e das autoridades em geral.

Igualdade civil consiste em resumo na igualdade de todos perante a lei; esta deve ser geral, obrigatória
para todos, não devendo ninguém ficar dispensado de cumpri-la. Todos terão direitos iguais a exercer função
e cargos públicos, desde que possuam a competência e capacidade exigidas em lei. Essa competência e
capacidade será fixada de modo geral, não podendo levar em conta condições de nascimento, de fortuna, de
raça ou de crenças religiosas.

Todos os indivíduos, também, devem ficar igualmente sujeitos aos encargos públicos, ao imposto
e outros deveres, na proporção de seus bens e rendimentos.

A liberdade civil é o direito de todos os homens exercerem e desenvolverem sua atividade física,
intelectual e moral, e compreende a liberdade física, isto é, o direito de ir e vir, de não ser detido
arbitrariamente, mas apenas de acordo com a lei, quando a transgredir; a inviolabilidade do domicílio, o
direito de propriedade, de que não pode ser despojado senão por motivos de utilidade ou necessidade
pública, mediante prévia e justa indenização.
A liberdade civil compreende ainda a liberdade religiosa, isto é, a de praticar qualquer religião, desde que
essa prática não ofenda a Moral; a liberdade de opinião, que é a de expressar verbalmente ou por escrito
suas opiniões, desde que isso não importe em aconselhar ou praticar crimes definidos em lei; a liberdade de
associação, para qualquer fim lícito e justo; o direito de petição, que é o de dirigir ás autoridades quaisquer
reclamações, queixas ou observações.

A liberdade política é o direito do cidadão em tomar parte na organização e exercício do governo,


no de votar e ser votado, preenchidas as exigências da lei. Sua manifestação mais geral é o sufrágio.

apagados:
1
É necessário, portanto, que sejam traçados limites para o exercício da autoridade pelo Estado e para o
gozo da liberdade pelos indivíduos. Traçar esses limites é função precípua do Direito, e como devem
ser claros, e conhecidos por todos, para serem respeitados, as leis os declaram expressamente.
2
Nem sempre foram aceitos os princípios a que o grande jurista se refere; o mundo antigo não
conheceu a liberdade individual, que é uma conquista da civilização moderna; ainda hoje é um
problema delicado de política criar, nas Constituições e nas leis, limites justos á soberania do Estado e
à liberdade do cidadão, encontrar a linha de divisão e ao mesmo tempo de harmonia entre a atividade
necessária de um e de outros. Essa linha, declarada pelo Direito e fixada pela lei, tem de encontrar sua
justificação e fundamento no bem público, na realização das aspirações e das necessidades sociais, que
variam conforme as épocas e os povos. Com exceção de algumas liberdades fundamentais, de alguns
direitos essenciais, como o direito à vida, à propriedade, à expressão do pensamento, à locomoção etc.,
os direitos individuais estão em função das condições peculiares a cada período e a cada povo. Ainda
mesmo aqueles, não são e não podem ser absolutos, mas limitados pelo bem comum, devem ser
exercidos dentro de limites fixados, para que os direitos de todos igualmente se exerçam.

Você também pode gostar