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rotina light

?
Novo livro mostra
que fazemos mais
de 200 escolhas
alimentares por dia,
muitas delas sem nos
dar conta. Pequenas
mudanças de hábitos podem
nos ajudar a tomar as decisões
certas – e, assim, emagrecer
e manter a forma

Por que
comemos tanto
texto: Mariana Weber
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S em pensar, freqüentemente comemos mais (e pior) do que gos-


taríamos. Também sem perceber, ganhamos quilos extras só
notados quando a calça não fecha e o ponteiro da balança já dis-
parou. Dependendo do ambiente e da companhia, somos capa-
zes de nos entupir de pipoca velha ou de tomar um vinho barato e ainda
elogiar sinceramente. Você acha que não cai nessa? Pois cai. “A maioria
das pessoas acredita que é o comandante de suas escolhas alimentares.
se come com o objetivo de limpar o prato, e
não necessariamente para saciar a fome.
Em outra ocasião, em um restaurante-labo-
ratório da Universidade de Illinois, Wansink
e outros cientistas serviram uma taça de
vinho baratinho como cortesia aos clientes-
cobaias de um jantar. A alguns, eles disseram
Quero que elas vejam que não são”, diz o americano Brian Wansink, tratar-se de uma garrafa da Califórnia (estado
autor do livro “Por Que Comemos Tanto?” (Editora Campus), lançado americano conhecido pela produção vinícola
recentemente no Brasil (leia entrevista a seguir). “Mas também quero que de qualidade). A outros, informaram que ela
percebam que pequenas mudanças em suas cozinhas e rotinas farão toda era da Dakota do Norte (estado sem tradição
a diferença sem exigir nenhum sacrifício de verdade.” Em outras pala- na área). Resultado: quem recebeu a bebida
vras, criar o ambiente ideal para fazer as escolhas certas é mais eficiente “californiana” bebeu mais, comeu mais,
para emagrecer e manter a forma do que aderir a um regime. ficou mais tempo à mesa e gostou mais da
Segundo Wansink, que é professor de marketing e ciência da nutrição mesmíssima refeição do que quem ganhou
da Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, tomamos mais de 200 o copo da “Dakota do Norte” – ou seja, o
decisões alimentares diariamente – são inevitáveis, portanto, algumas vinho “chique” predispôs os convivas a achar
pisadas na bola. Para mostrar a complexidade dessas escolhas, ele conduz tudo uma beleza. Em um terceiro estudo,
experiências em um laboratório equipado com espelhos unidirecionais e esse em um cinema, os espectadores de uma
câmeras escondidas, além de sensores posicionados sob as mesas. No sessão da 1 hora da tarde receberam, ao
meio dessa parafernália são promovidos jantares, almoços, festas e lan- comprar o ingresso, um refrigerante e um
ches – sempre devidamente observados por um time de cientistas que balde grátis de pipoca murcha, preparada
analisa como a iluminação, a posição das mesas, os tipos de prato, os cinco dias antes. Havia pacotes de dois
nomes das receitas e outros fatores influenciam a quantidade, a qualida- tamanhos: quem ganhou o maior comeu em
de e a velocidade das refeições. Certa vez, os pesquisadores esconderam média 173 calorias a mais de pipocas do que
um sistema de tubos para injetar mais sopa nas tigelas durante as refei- os presenteados com o menor.
ções, sem que ninguém percebesse. No experimento, observaram que, Pesquisas como as de Wansink têm muda-
quanto mais alimento era acrescentado aos pratos, mais colheradas da- do a forma como os especialistas enxergam
vam os desavisados comensais. Assim, a equipe conseguiu mostrar que o problema do sobrepeso. “Ele está produ-
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rotina light Para fazer as


escolhas certas
zindo evidências experimentais de que fato- nação, apresentação dos pratos e nomes
res externos disparam o gatilho dos excessos No restaurante bacanas – em um experimento, constatou-se
na alimentação”, diz a nutricionista ameri- lPeça ao garçom para que uma receita anunciada como “filé de
cana Marion Nestle, professora da retirar os pães da mesa: peixe italiano suculento” vendia mais do que
Universidade de Nova York e autora do livro eles são irresistíveis. um simples “filé de peixe”. Conveniência
“What to Eat” (“O que comer”, editora l Rache um prato e leve a também é crucial – secretárias presenteadas
North Point Press), ainda não lançado no outra metade para casa. com bombons comiam muito mais quando
Brasil. Segundo o psicobiólogo Sebastião de l Se estiver em grupo, eles ficavam em um pote sobre suas mesas
Sousa Almeida, professor do Laboratório de comece por último e do que quando as guloseimas eram coloca-
Nutrição e Comportamento da Univer- imite o ritmo de quem das a alguns passos de distância. E os choco-
sidade de São Paulo, em Ribeirão Preto, come mais devagar. lates eram devorados mais rapidamente
durante muito tempo se olhava apenas o ainda se dispostos em bomboneiras transpa-
paciente e não era incomum culpá-lo por Nas compras rentes, que os deixavam bem à vista.
falta de força de vontade. “Hoje sabemos lPrefira embalagens Para comer menos bobagens, podemos
que fatores ambientais, como uma televisão pequenas ou leve pacotes afastá-las e escondê-las, mas, segundo
ligada durante o jantar, também influen- grandes e, em casa, Wansink, não é uma boa saída abrir mão
ciam bastante a alimentação.” distribua o conteúdo em totalmente dos alimentos que apreciamos.
Baseado nas conclusões de seus estudos, potes menores. “Dietas de privação exigem uma mudança
Wansink propõe mudanças na rotina ali- l Cuidado com a “aura” de estilo de vida drástica demais”, diz. No
mentar. O caso das pipocas, por exemplo, de saúde de alguns lugar de passar fome ou banir da mesa tudo
ensina que é melhor passar longe das por- alimentos. Por parecerem que é gostoso mas engorda, o professor
ções gigantes – quanto maiores elas são, inofensivos, eles levam a sugere cortes sutis de calorias. “Se tirar
mais se come, mesmo que o conteúdo não exagerar na quantidade. três pequenas porções de 100 calorias de
seja lá essas coisas. O tamanho dos recipien- sua alimentação habitual, é possível perder
tes também conta: tendemos a colocar uma Em casa 14 quilos ao longo de um ano”, afirma
quantidade maior de alimento em pratos e l Use pratos de tamanho Wansink. Quem tiver paciência nem preci-
copos grandes (veja outras dicas práticas no médio.A comida parece sa ir tão longe. Pelas contas dele, uma lata
quadro “Para fazer as escolhas certas”). Na “menor”nos grandes. de refrigerante por dia pode ser a diferença
lista de fatores que influenciam a alimenta- l Troque os copos baixos entre engordar ou emagrecer até 5 quilos
ção, entram ainda aromas sedutores, ilumi- e largos pelos altos e em um ano.
finos, que dão impressão
de ser maiores.
l Se for comer diante da
TV, leve uma porção, e
não o pacote inteiro.
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“Dieta boa é a que você não sabe que faz”


Em entrevista a Criativa, Como lidar com isso e comer me livrar de pratos grandes e copos
Brian Wansink, professor somente o necessário? baixos e largos. Ainda tenho vasilhas
de marketing e ciência da A chave é rearranjar o ambiente. Se com guloseimas no escritório para
nutrição da Universidade você se serve mais ao usar pratos todo mundo que pára por lá, mas as
Cornell, fala dos resultados grandes, livre-se deles. Se um pote encho com balas de que não gosto.
de suas pesquisas e diz como sobre sua mesa a leva a comer o
usar o ato de comer sem pensar dobro de balas (e pode acreditar O senhor diz que o sobrepeso pode
que leva), afaste-o 2 metros. ser contagioso. Como assim?
em favor da boa forma
Os hábitos que levam uma pessoa a
Quais são os principais fatores que Qual é o pior hábito para quem quer ganhar peso podem ter efeito
nos levam a comer? controlar o peso? contagioso no resto dos moradores
A maioria de nós não come demais Dieta de privação. A maior parte da casa. Deixar a comida exposta,
porque está com fome, e sim de nós não tem disciplina para beliscar diante da TV, servir
por causa de parentes e amigos, mantê-la por mais do que um porções grandes, tudo isso
pacotes e pratos, nomes período curto. Mudanças graduais influencia o peso da família toda.
e números, rótulos e indicações de menos 200 a 300 calorias na
de “light”, cores e velas, formatos alimentação diária podem fazer Comida rotulada como “light” pode
e cheiros, distrações e distâncias. uma diferença de 9 a 14 quilos ao nos fazer comer mais?
A pessoa média toma mais de 200 longo de um ano. Este é o melhor Sim. Subestimamos

Produção: Claudia Alcione Pereira


decisões alimentares diariamente jeito de perder peso: devagar e sem tremendamente o número de
– café da manhã ou não? Torrada pensar. A melhor dieta é aquela que calorias contidas nelas e tendemos
ou rosca? Parte dela ou inteira? você não sabe que está fazendo. a comer demais. Com petiscos,

Fotos: Iara Venanzi


Na cozinha ou no carro? Não descobrimos que as pessoas
podemos explicar a maioria Você mudou seus hábitos por causa freqüentemente comem 20% mais
dessas escolhas. Elas estão no de suas pesquisas? calorias quando pensam que eles
limite de ser inconscientes. Fiz uma série de mudanças, como têm baixo teor de gordura.

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