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ABSTRACT
In the present study, an analysis of Oscar Mendes’s translation of the
theatre play A Woman with no Importance, by Oscar Wilde is carried
out. Initially, the Victorian context was described, as well as a brief
biography of the author, followed by his main works. Oscar Wilde’s
translators for Brazilian Portuguese were mentioned and special
emphasis was conferred to Oscar Mendes’s works, who is the translator
of the selected comedy. Translation theory and drama translation
concepts were presented and the play was analyzed in terms of its plot
elements, and of the linguistic resources utilized, such as the
maintenance of irony, paradoxes and word play in the author’s social
criticism expression. The results indicate a possibly neutralizing
translation project, with the option for archaisms as well as formal
Anhanguera Educacional Ltda. register. The fact that a comedy translation is devoid of vernacular
Correspondência/Contato language characteristics was highlighted. We argue that the translator’s
Alameda Maria Tereza, 4266
time and context possibly contributed to his translation choices, and, as
Valinhos, São Paulo
CEP 13.278-181 a consequence, they seem adequate. More informal language and lexis
rc.ipade@aesapar.com is recommended in the concepts of Readability and Performability.
Coordenação These concepts normally favor reading and the adaptation of the
Instituto de Pesquisas Aplicadas e literary text to the theatre, particularly in the case of society comedies.
Desenvolvimento Educacional - IPADE
Artigo Original Keywords: Oscar Wilde; translation; Oscar Mendes.
Recebido em: 05/07/2012
Avaliado em: 03/09/2012
Publicação: 30 de setembro de 2012 145
146 Uma mulher sem importância, de Oscar Wilde: uma análise da tradução de Oscar Mendes
1 Salomé, Intentions, The Picture of Dorian Gray, and Lady Windermere’s fan.
2 The ballad of Reading Gaol.
3 A Florentine Tragedy.
4 Decadentismo: fase cultural de final de século XIX, que se opõe ao realismo e naturalismo, e expressa ideais do Estetismo.
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Wilde teve uma vida pessoal conturbada por manter uma relação íntima com o
jovem Lorde Alfred Douglas. Foi julgado, condenado a dois anos de trabalhos forçados e
ao sair da prisão sua família o abandonou. Viveu os três últimos anos de sua vida na
Itália, em situação decadente, com necessidades financeiras, e lá foi abandonado também
por seu amante Lorde Alfred Douglas, “Bosie”. Foi então para a França, onde contraiu
meningite e morreu em 1900, aos 46 anos.
6 Estetismo ou esteticismo foi o movimento iniciado pelos pintores pré-rafaelitas europeus que desejavam resgatar a beleza
na arte e assim, se opor aos valores da industrialização no fim do século XIX. Esse movimento foi também adotado por
escritores, dentre eles Ruskin e Oscar Wilde.
7 The Birthday of the Infanta.
8 The House of Pomegranates.
9 The Model Millionaire.
10 Vera, or The Niilists.
11 Lady Windermere’s Fan.
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Oscar Mendes, tradutor de Wilde no final do século XX, parecia não partilhar das
ideias políticas dos primeiros, e, portanto, suas crenças podem ter influenciado seu
projeto tradutório. Este estudo enfoca suas traduções e não sua produção literária. Oscar
Mendes Guimarães nasceu em Recife em 25 de julho de 1902 e morreu em 04 de
novembro de 1983. Professor formado em direito, jornalista, cronista, membro da
academia mineira de letras, traduziu mais de 200 livros e publicou mais de 18 obras
próprias. O foco deste estudo são as suas traduções dos trabalhos de Oscar Wilde para o
português do Brasil.
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13 Eu os adoro (jantares festivos em Londres). As pessoas inteligentes nunca ouvem e as tolas nunca falam.
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What is left for the translator to do is to engage specifically with the signs of the text: to
wrestle with the linguistic units, the speech rhythms, the pauses and silences, the shifts
of tone or register, the problems of intonation patterns: in short, the linguistic and
paralinguistic aspects of the written text that are decodable and reencodable. (p. 33)14
Lefevere (apud AALTONEN, 2000) defende que, por meio da reescrita, existe a
manipulação dos textos literários com muitos objetivos. Ele afirma que os dois controles
que se referem ao teatro seguem os sistemas sociais. O primeiro tipo de controle é aquele
feito pelos profissionais, ou seja, os críticos, os professores e os tradutores, que
normalmente seguem as restrições dos cânones literários na realização de suas tarefas,
selecionando e rejeitando os textos segundo essas diretrizes. O segundo tipo, afirma
Lefevere (apud AALTONEN, 31), refere-se ao mecenato, que envolve as instituições que
selecionam os textos e, consequentemente, as traduções, em termos de ideologia,
influência econômica e status.
14 O que resta ao tradutor é se engajar especificamente com os signos do texto: lutar com as unidades linguísticas, os ritmos
da fala, as pausas e silêncios, as mudanças de tom ou registro, os problemas de padrões de entonação: ou seja, os aspectos
linguísticos e para-linguísticos do texto que são decodificáveis e recodificáveis. (todas as traduções não referenciadas são
nossas)
15 Levy via a linguagem teatral como uma forma estilizada da linguagem escrita, e enfatizava a “falabilidade” e a fácil
apreensão como critérios na avaliação das traduções do teatro em outra língua: frases curtas e encadeamento de frases,
palavras conhecidas em preferência a outras mais raras, o evitamento de difíceis ligações consonantais e assim por diante.
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O escritor da peça Uma Mulher Sem Importância, Wilde, foi um autor crítico e
contestador de sua sociedade, chamando a atenção para práticas e papéis sociais
ultraconservadores naturalizados e internalizados. A primeira parte da nossa análise
contempla os papéis masculinos, iniciando com Lorde Illingworth, um personagem
irônico, machista e individualista. Mantém ele sua imagem por meio do enredo e de suas
falas. Ilude uma donzela pobre e deixa-a; tem com ela um filho bastardo de quem deseja
ser provedor, mas não deseja reconhecê-lo; também não oferece casamento à senhora
Arbuthnot a fim de reparar os danos, o que seria aceitável na época. Selecionamos o
trecho abaixo, de uma fala do personagem Lord Illingworth, para ilustrar a manutenção
da imagem da personagem por meio de suas falas:
It is perfectly monstrous the way people go about, now-a-days, saying things against
one behind one’s back that are absolutely and entirely true (WILDE, (1893), 2004, p. 375)
É uma coisa verdadeiramente monstruosa o comportamento das pessoas em nossos dias,
dizendo coisas, às nossas costas, que são completa e absolutamente verdadeiras.
(MENDES, 1961, p.663)
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You should never try to understand them. Women are pictures. Men are problems. If
you want to know what a woman really means – which, by the way, is always a
dangerous thing to do – look at her, don’t listen to her. (WILDE, (1893), 2004, p. 398).
Não deveria tentar nunca compreendê-las. As mulheres são quadros. Os homens são
problemas. Se você faz questão de saber o que realmente pensa uma mulher – o que, a
propósito, é sempre uma coisa perigosa – olhe-a, mas não a escute. (MENDES, 1961,
p.689)
O primeiro trecho fala sobre o fato de as mulheres serem muito inteligentes para
um romance. A crítica de Wilde se prende ao fato de a sociedade atribuir à mulher um
papel meramente decorativo e passivo. Mendes reproduz quase literalmente a passagem.
No segundo caso, a frase “A woman who would tell one that would tell one anything”
foi traduzida “Uma mulher capaz de dizer isso é capaz de tudo”. Na tradução, houve
uma troca de ênfase entre o falar e o fazer de uma mulher.
De acordo com Schmidt (2000), os papéis dos gêneros têm sido objeto de
discussão histórica desde os tempos coloniais. Mas apenas recentemente, após a revolução
feminista dos anos 60 e 70, esse debate assumiu uma forma teórica e pragmática. A
história mostra que sempre houve uma repressão das mulheres, que sempre foram
desligadas dos assuntos públicos e relegadas ao lado doméstico e, assim, privadas dos
eventos. O excerto abaixo trata do papel mais ativo da mulher fora do ambiente
doméstico.
Sr. Kelvil, um Membro do Parlamento no enredo, tem forte visão política sobre a
virtude. Escreve um ensaio sobre a pureza, pleno de preocupação com padrões morais.
Defende a participação da mulher na política, como parte do curso dos eventos, e aprecia
as posições das mulheres em favor da moralidade.
Women are always on the side of morality, public and private. (WILDE, (1893), 2004,
p.8)
As mulheres estão sempre ao lado da moral, tanto pública como privada. (MENDES,
1961, p. 663)
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I have never regarded woman as a toy. Woman is the intellectual helpmate of man in
public as in private life. Without her we should forget true ideals. (WILDE, (1893), 2004).
Ora, eu nunca considerei a mulher como um brinquedo. A mulher é a adequada
companheira intelectual do homem, tanto na vida pública como na vida privada. Sem
ela, esqueceríamos nossos verdadeiros ideais. (MENDES, 1961, p. 667)
O comentário a ser feito aqui concerne à palavra “party”, utilizada no inglês para
significar uma festa ou um grupo de pessoas. Nesse exemplo, a tradução “reunião” parece
se aplicar às pessoas, mencionadas primeiramente de forma negativa e, depois, de forma
positiva, pela personagem.
O segmento parece conferir um tom neutro à alusão de conotação sexual. Por isso
talvez comportasse registro e escolhas lexicais mais informais. Isto imporia à passagem o
tom do vernáculo, se fosse o caso de uma retradução para os dias de hoje. Mendes
escreveu para sua época e contexto, portanto, o seu tom e suas escolhas provavelmente se
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adaptaram ao seu tempo e à finalidade de edição da peça para a leitura e não para a
encenação.
Men always want to be a woman’s first love. That is their clumsy vanity. We women
have a more subtle instinct about things. What we like is to be a man’s last romance.
(WILDE, (1893), 2004, p.385)
Os homens querem sempre ser o primeiro amor de uma mulher. Nisto resumem toda a
sua grosseira vaidade. Nós, mulheres, possuímos um instinto muito mais sutil das
coisas. O que nos agrada é ser o derradeiro romance de um homem. (MENDES, 1961,
p.674)
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O eu lírico, nessa passagem, manifesta sua crítica severa à sociedade inglesa, sua
superficialidade e seu tratamento das outras classes sociais. A personagem Ester exprime
sua força no texto original; na tradução de Mendes, o tom acusativo e solene confere à
obra uma atmosfera de julgamento das ações dos ingleses.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesta breve análise, é possível observar que grande parte da tradução dos trechos aqui
selecionados manteve o tom de ironia e crítica do texto original. A ironia, o jogo de
palavras e os paradoxos foram traduzidos, de forma a conferir à tradução a mesma
intensidade crítica de Wilde.
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156 Uma mulher sem importância, de Oscar Wilde: uma análise da tradução de Oscar Mendes
tradução de uma coletânea das obras de Wilde. Outra reflexão é possível em relação ao
posicionamento do tradutor frente à estética e às ideias políticas do autor.
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