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CENTRO REGIONAL UNIVERSITÁRIO DE ESPÍRITO SANTO DO

PINHAL – UNIPINHAL –
FACULDADE DE DIREITO DA FUNDAÇÃO PINHALENSE DE
ENSINO

PROBLEMAS NA CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS NA SEARA


ADMINISTRATIVA E A QUESTÃO DA JUDICIALIZAÇÃO

Espírito Santo do Pinhal/SP


– 2021 –
GABRIELLY CABRINI CAMARGO

PROBLEMAS NA CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS NA SEARA


ADMINISTRATIVA E A QUESTÃO DA JUDICIALIZAÇÃO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


ao Curso de Direito do Centro Regional
Universitário de Espírito Santo do Pinhal/SP
como requisito parcial para obtenção do título de
Bacharel em Direito.

Professor Orientador: Júlio César Muniz

Espírito Santo do Pinhal/SP


– 2021 –
Gabrielly Cabrini Camargo

PROBLEMAS NA CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS NA SEARA


ADMINISTRATIVA E A QUESTÃO DA JUDICIALIZAÇÃO

Monografia aprovada em _____/_____/_____ como requisito parcial para


obtenção do título de Bacharel no curso de graduação em Direito no Centro
Universitário de Espírito Santo do Pinhal/SP.

Banca Examinadora:

Orientador: Prof. Júlio César Muniz

__________________________________________________
Professor(a) Membro

__________________________________________________
Professor(a) Membro

__________________________________________________
Professor(a) Membro
DEDICATÓRIA
AGRADECIMENTOS
Epígrafe
RESUMO

O Brasil vive o fenômeno da judicialização das demandas previdenciárias. A


estrutura do INSS, Instituto Nacional de Seguridade Social, órgão gestor da
Previdência Social, permite que benefícios e auxílios sejam pagos após
processo administrativo, algo que vem ocorrendo com menos frequência, haja
vista a busca por soluções mais rápidas, com o ingresso na Justiça ainda em
fases de produção de provas e perícias. Este trabalho demonstrou que tento o
processo administrativo como o processo judicial são meios eficazes a satisfazer
as demandas jurídicas que envolvam o INSS. A judicialização, contudo, é
temerária, pois desvirtua o próprio sentido no INSS como órgão de arrecadação
e pagamento previdenciário. Uma série de fatores têm levado a judicialização
das demandas previdenciárias e é necessário que um debate público seja
iniciado para se buscar uma solução a curto e longo prazo para o problema da
Previdência. No mais, volta-se a ideia que os mecanismos jurídicos existentes
no Brasil para se processar e conceder benefícios sociais é eficiente do ponto
de vista jurídico, pois respeitam a primazia do contribuinte, a Constituição e
demais fontes e princípios do direito. O processo administrativo, divido em fases,
garante o contraditório, a ampla defesa, o devido processo e mesmo o recursos,
aceito ainda meios diversos de prova. O processo judicial, por seu turno,
empresta do Código de Processo Civil o procedimento e rito a serem seguidos,
garantindo também total lisura no processo. O acúmulo das demandas, portanto,
advém de fatores extravagantes ao Direito. A Justiça, assim, deve ser sensível
aos fatores sociais, econômicos, políticos, que determinam a morosidade das
ações previdenciárias, agindo sempre no sentido de garantir um julgamento
célere e satisfatório ao segurado.

Palavras-chave: direito previdenciário. processo administrativo. processo


judicial. judicialização das demandas previdenciárias. INSS.
ABSTRACT

Brazil is experiencing the phenomenon of judicialization of social security claims.


The structure of the INSS, the National Institute of Social Security, which
manages Social Security, allows benefits and aid to be paid after an
administrative proceeding, something that has been occurring less frequently,
given the search for faster solutions, with the entry into court. still in the stages of
production of evidence and expertise. This work demonstrated that both the
administrative process and the judicial process are effective means to satisfy the
legal demands involving the INSS. Judicialization, however, is reckless, as it
distorts the very meaning of the INSS as a social security collection and payment
agency. A series of factors have led to the judicialization of social security claims
and it is necessary that a public debate be initiated to seek a short and long term
solution to the Social Security problem. Furthermore, the idea is that the legal
mechanisms existing in Brazil to process and grant social benefits are efficient
from a legal point of view, as they respect the primacy of the taxpayer, the
Constitution and other sources and principles of law. The administrative process,
divided into phases, guarantees the contradictory, the full defense, the due
process and even the appeals, still accepting different means of proof. The
judicial process, in turn, borrows from the Code of Civil Procedure the procedure
and rite to be followed, also guaranteeing total fairness in the process. The
accumulation of demands, therefore, comes from extravagant factors to the Law.
Justice, therefore, must be sensitive to social, economic and political factors,
which determine the delay of social security actions, always acting to ensure a
quick and satisfactory judgment to the insured.

Keywords: social security law. administrative process. judicial process.


judicialization of social security claims. INSS.
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.............................................................................................. 10

2. A PREVIDÊNCIA SOCIAL............................................................................. 11
2.1. O Custeio do INSS, condições e parâmetros ........................................... 13

3. RESOLULÃO DE CONFLITOS PREVIDENCIÁRIOS................................... 16


3.1. Processo Administrativo Previdenciário ..................................................... 16
3.2. Processo Judicial Previdenciário ................................................................ 19

4. OS NÚMEROS DA JUDICIALIZAÇÃO DA SEGURIDADE SOCIAL............ 21


4.1. Outras causas para o aumento das demandas judiciais.............................. 23
4.1.1. Benefícios por incapacidade temporária e definitiva................................. 24
4.2. As condições de saúde no Brasil e as consequência para o INSS............... 22

5. CONCLUSÃO................................................................................................ 28

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................. 30
10

1. INTRODUÇÃO

A Previdência Social é talvez um dos órgãos mais importantes da


Administração Pública. Pensões, benefícios, aposentadorias, tudo passa pelo INSS
e a análise da documentação ainda em sede administrativa não está livre de falhas.
É prerrogativa do INSS como órgão gestor da Previdência Social arrecadar e
conceder benefícios no regime comum da previdência, respeitando os ditames
constitucionais e as normas que norteiam sua atuação.
Por uma série de motivos, o INSS não tem conseguido dar uma solução
prática a demanda cada vez maior de ações administrativa dos segurados em busca
de benefícios e auxílios. O acúmulo desses processos, acaba desaguando no
judiciário em dois momentos, em Mandados de Segurança que requerem o regular
prosseguimento do feito ainda em sede administrativa e em processos judiciais que
pretendem reformar decisões do INSS ou mesmo garantir direitos que não foram
devidamente assistidos.
Fato, hoje no Brasil a judicialização das demandas previdenciárias é uma
realidade cada vez mais presente no ordenamento e na Justiça. Os números de ações
sobem a cada ano, desvirtuando o andamento da Justiça Federal e mesmo da Justiça
Comum.
Neste trabalho, fez-se uma remissão do papel da Previdência Social, da
função do INSS, de como funcionam os processos administrativos e judiciais que
envolvem as causas previdenciárias.
Coletou-se também dados estáticos quanto ao processo de judicialização e
suas causas, pontuando que a judicialização não deriva de um problema legal. As leis
nacionais são suficientes para processamento e julgamento das ações previdenciárias
tanto na esfera administrativa, quanto no âmbito da Justiça. Cabe, porém, rediscutir o
próprio modelo de constituição do INSS, apontando, ainda, fatores econômicos,
socias e políticos que sobrecarregam o Judiciário e criam uma sensação de
ineficiência da Administração Pública na figura do INSS.
11

2. A PREVIDÊNCIA SOCIAL

Há uma tendência em se considerar a Previdência Social como uma espécie


de seguro socil “sui genereis” com regime próprio estabelecido por lei. O Regime Geral
da Previdência Social e o Regime Próprio de Previdência de Servidores Públicos. Sua
organização, contudo, é de competência estatal, o que lhe atribui uma condição de
autarquia federal, criada por força de lei:

A virada da década de 1980 para a de 1990 foi marcante em muitos aspectos


para os brasileiros. Desde a elaboração da nova Constituição Federal (1988)
até eleger novo presidente da república que, por sua vez, criaria, por meio do
Decreto n° 99.350, em 27 de junho de 1990, uma gigante autarquia federal
tão importante para a vida de milhares de pessoas em todo o país. Nascia o
Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
O INSS foi criado a partir da fusão do Instituto de Administração Financeira
da Previdência e Assistência Social (IAPAS) com o Instituto Nacional de
Previdência Social (INPS), como autarquia vinculada ao Ministério da
Previdência e Assistência Social (MPAS), atual Secretaria Especial de
Previdência e Trabalho, do Ministério da Economia.
Cabe ao INSS a operacionalização do reconhecimento dos direitos dos
segurados do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) que, segundo a
Constituição Brasileira, tem caráter contributivo e de filiação obrigatória
(BRASIL, 2020, s/p).

Das letras trazidas pelo próprio núcleo de comunicação do Estado, extrai-se


a informação de que a Previdência, dotada de regime próprio, organizada no caráter
contributivo e compulsório, tem por premissa a concessão de benefícios e auxílios
pertinentes aos trabalhadores e segurados (TAVARES, 2020).
É, esta, a dinâmica do INSS, a concessão e revisão de benefícios e auxílios,
tudo edificado em uma estrutura tripla de gestão, contribuições dos trabalhadores,
empregadores e ação do Estado como gestor de recursos.
O art. 201, inc. I a V da Constituição Federal aduzem:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral
de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória,
observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e
atenderá, na forma da lei, a:
I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o
trabalho e idade avançada;
II - proteção à maternidade, especialmente à gestante;
III - proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;
IV - salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de
baixa renda;
12

V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou


companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º. (BRASIL, 2021,
s/p).

O texto constitucional aponta para a obrigatoriedade de filiação, necessidade


de equilíbrio financeiro, com destaque aos benefícios que serão assistidos nos
pedidos ao INSS. A abrangência do Instituto, obrigado uma generalidade do regime,
ou seja, não havendo um regime previamente disponibilizado ao trabalhador, este já
será admitido pelo regime geral da Previdência, sem que haja necessidade de
procedimentos de filiação (SAVARIS, 2019).
A natureza contributiva se perfaz no pagamento compulsório e periódico pelo
segurado ao sistema. A prestação, sempre pecuniária garante assistência diante de
possíveis riscos sociais. A obrigatoriedade no pagamento, por sua vez, se manifesta
nos descontos em folha quando trabalhador empregado e contribuições a serem
efetuadas em caso de autônomos. Em outros termos, no Brasil, todos trabalhadores
estão filiados a algum regime previdenciário, seja ele próprio ou o geral (SANTOS,
2021).
Em continuidade, quando o texto constitucional elenca o fator “equilíbrio
financeiro”, está vislumbrando a necessidade de autossutentabilidade do sistema
previdenciário, ou seja, as contribuições dos segurados devem permitir ao INSS pagar
os beneficiários e financiar seu próprio custeio, trabalhando sempre com resultados
positivos, algo que, como se sabe não ocorre na prática, haja vista o romba da
Previdência orçado no ano de 2020 em mais de R$: 368,2 bilhões de reais (ISTOÉ,
2020).
Outro aspecto importante a ser considerado no estudo do INSS, abarca a
forma de financiamento ou custeio, que hoje é feita via regime simples de repartição,
caracterizado pela contribuição de todos os segurado para um fundo único, o qual
servirá como fonte de recursos para o pagamento também geral de todos os
beneficiários e pensionistas (NÓBREGA, 2013).
Daí surge o liame necessária que caracteriza a solidariedade social ou pacto
intergerações. Os contribuintes de hoje suportam o custeio dos beneficiários mais
antigos, sendo que seus recursos não os beneficiam diretamente em um primeiro
momento. No futuro, a fila do INSS anda e os contribuintes de hoje serão assistidos
pelas contribuições dos ativos, em um ciclo mediato (AGOSTINHO, 2020).
13

Portanto, tal sistema pode ser visto como uma das causas da própria
judicialização das ações previdenciárias, visto que a pirâmide etária no Brasil vem se
modificando com o passar das décadas e hoje há um número menor de pessoas no
mercado de trabalho contribuindo efetivamente do que em outras épocas da história
recente do país. Em contrapartida, com o aumento da expectativa de vida da
população, mais pessoas têm acesso aos benefícios do INSS, em uma conta que
parece não ter solução prática ou viável no curto prazo.

2.1. O Custeio do INSS, condições e parâmetros

Por força de mandamento constitucional, os regimes da previdência pública


possuem natureza solidária e contributiva, o que exige a participação de todos no
custeio do INSS (MORAES, 2005).
A Previdência é, neste sentido, custeada pelo conjunto das contribuições
sociais dos trabalhadores ou segurados, dos empregados com carteira de trabalho e
emprego assinada e ainda por recursos da União, que contribui na mesma proporção
das contribuições pessoais. Tal distribuição tripartida garante uma maior solidez ao
processo, não sendo, contudo, suficiente para se estabelecer padrões não deficitários
(LAZARRI, et. al. 2021).
O INSS, órgão gestor da Previdência fica responsável pela arrecadação das
contribuições e pagamentos dos benefícios. Sua natureza autárquica, como visto
acima, garante ao segurando a possibilidade e de uma série de ações na Justiça
quando os processos administrativos dentro do próprio INSS não garantem o repasse
de valores ou benefícios devidos. Notadamente, como se verá na análise dos números
da judicialização das demandas previdenciárias, o Mandado de Segurança tem sido
peça fundamental nesta simbiose entre INSS e Judiciário, o que acarreta um
judicialização da judicialização, por força do pedido muitas vezes versar quanto a
inércia do INSS na via administrativa. Ou seja, ingressa-se administrativamente, com
posterior pleito judicial via Mandado de Segurança requisitando o regular
prosseguimento da demanda administrativa, que pode vir a ser revista novamente no
Judiciário, acarretando atrasos em pagamento e a sobrecarga da Justiça (SAVARIS,
2020).
Com a Emenda Constitucional 20/98, que acrescentou ao art. 167 da
Constituição o inc. XI, estabeleceu-se a vedação “da utilização dos recursos
14

provenientes das contribuições sociais de que trata o art. 195, I a, e II, para realização
de despesas distintas do pagamento de benefícios do regime geral de previdência
social de que trata o art. 201”. Desta forma, o financiamento de obras públicas ou
desvirtuamento dos valores previdenciários está vetado, sendo que as contribuições
só podem ser utilizadas para o pagamento de benefícios e custeio do INSS (GODOY,
2019).
Outro ponto referente ao custeio da Previdência e destino dos recursos são
as alterações que a lei traz de tempos em tempos. Ao longo dos anos, muitas foram
as alterações na forma da contribuição o que vem ocasionando uma diferença
perceptíveis no valor calculado no benefício inicial e aquele a ser percebido no risco
social vindouro (VAZ, 2020).
A Lei de Custeio da Seguridade Social, por seu turno, estabelece a forma das
contribuições; os segurados, empregados com carteira assinada, domésticos e
trabalhadores avulso devem contribuir com uma alíquota percentual que incide sobre
o salário-de-contribuição mensal. O valor é progressivo e segue as alterações na
remuneração do trabalhador (ALVES, 2020).
Outras espécies de trabalhadores têm bases de cálculos diferenciadas, que
incidem em diferentes alíquotas a dependente das faixas salariais. Esta diferença
busca equacionar a arrecadação na busca de isonomia (princípio da capacidade
contributiva); aqueles que melhor são remunerados, contribuem com valores
pecuniários mais elevados (NÓBREGA, 2013).
Há ainda os contribuintes autônomos ou individuais e o facultativo, que
contribuirão com 20% dos seus vencimentos. Nestes casos, não havendo uma fonte
pagadora, cabe ao próprio segurado fazer os recolhimentos. Este é o caso, por
exemplo, do advogado autônomo. Muitos ambientes “on-line” das Seccionais da
Ordem dos Advogados do Brasil já disponibilizam ao causídico uma tabela prévia a
ser preenchida com os valores percebidos onde será gerada a contribuição devida, a
qual, via guia de arrecadação pode ser adimplida (GODOY, 2019).
Por último, o contribuinte especial, contribuirá com 2% da receita bruta de sua
produção rural, definhando assim a universalidade dos contribuintes (SANTOS, 2021).
A Previdência, por sua organização em regime geral, tem por finalidade o
custeio do regime básico de proteção social. A Previdência Privada, tal como predito
pelo art. 202 da Constituição, é quem garante uma proteção complementar. Surge dá
a noção de pisto e teto nos benefícios concedidos; há um limite mínimo que abarca a
15

maioria dos beneficiários, e um teto estabelecendo um valor limite de pagamento


(TAVERES, 2009).
Assim, todo contribuinte vinculado ao Regime Geral de Previdência Social,
ainda que não trabalhadora, irá contribuir para o sistema até um limite previdenciário
e, havendo o risco social, o benefício em contraprestação não ultrapassará estes
valores (SAVARIS, 2020).
Importante então ter-se em mente esta ideia de solidariedade contributiva. Os
contribuintes de hoje se servirão dos recursos futuros e os beneficiários de hoje
contam com o pagamento dos trabalhadores, segurados e Estado.
Como se verá no capítulo atinente aos números da judicialização das
demandas previdenciárias, esta é uma conta cada vez maior e que necessita de um
grande debate público que venha a traçar metas de custo e longo prazo que possam
oxigenar o INSS.
16

3. RESOLUÇÃO DE CONFLITOS PREVIDENCIÁRIOS

Como demonstrado acima, o INSS, órgão responsável por gerir e administrar


a Previdência Social, fica responsável pela arrecadação dos recursos e custeio de
benefícios. Contudo, há a necessidade de provocação da autarquia para se ter acesso
a valores e isto se dá em um primeiro momento ainda na esfera administrativa do
órgão.
Contudo, uma vez não havendo satisfação no pagamento de benefícios
porventura devidos, há a possibilidade de exame ou reexame no Judiciário, havendo,
assim, duas alternativas ao segurado que pretenda ingressar com pedidos contra o
INSS.

3.1. Processo Administrativo Previdenciário

É de responsabilidade do Instituto Nacional de Seguridade Social a análise


dos benefícios de caráter previdenciário. Tal análise de dá com vistas nas questões
atinentes a cada contribuinte ou possível beneficiário, sempre tendo como parâmetro
os princípios da publicidade, devido processo legal, segurança jurídica, ampla defesa
e contraditório. Ao contribuinte que ingressa administrativamente no INSS é
oportunizado a produção de provas, a juntada de certidões e exames, a consulta a
saldos e outros documentos que possam melhor instruir a ação administrativa
(LAZZARI, et. al. 2021).
Um dos pilares destes procedimentos é a concessão do melhor benefício a
que faz jus o segurado, sendo vetada a recusa imotivada de requerimentos feitos com
documentação incompleta. Tal medida funciona como avalista em situações onde o
segurado, ainda não assistido por patrono jurídico vai até o INSS atrás de informações
e, muitas vezes, de forma mitigada, vai completando seu processo administrativo com
documentos solicitados pelo órgão, o que lhe garante sempre uma segurança jurídica
em sua causa de pedir (GODOY, 2019).
Há essencial destaque, neste sentido, a IN 45/2010, norma disciplinadora da
administração das informações dos segurados, que mantém o reconhecimento e faz
a revisão dos direitos dos beneficiários com base nos dados cruzados da Previdência
17

e daqueles apresentados pelo contribuinte, estabelecendo as diretrizes do processo


administrativo previdenciário (ALVES, 2020).
O manual de processo administrativo previdenciário elaborado pela AGU,
Advocacia Geral da União, espelha as fases do Procedimento Previdenciário:

1) Fase Inicial: o processo é iniciado e os objetivos da instauração do


processo administrativo são definidos; 2) Fase Instrutória: são produzidas as
provas necessárias à tomada de decisão pelo servidor do INSS; 3) Fase
Decisória: o servidor analisa o requerimento e a prova produzida para decidir
se o postulante possui ou não direito ao pedido formulado; 4) Fase Recursal:
o administrado, caso não concorde com a decisão administrativa, pode
postular sua reanálise por meio do recurso administrativo (AGU, 2012, p. 11).

Não há um rito necessariamente a ser seguindo. Cada fase pode conter


características de uma fase anterior ou sucessiva, como a produção de novas provas
na fase recursal (AGOSTINHO, 2020).
O processo administrativo, porém, sempre será iniciado no protocolo realizado
nos canais do INSS de atendimento ao segurado, seja por meio de requerimento
previamente preenchido, ou por ofício encaminhado ao órgão por patrono legalmente
constituído (SANTOS, 2021).
O art. 565 da IN 45/2010, entende como legítimos para formular o
requerimento de benefícios ou auxílios o segura, seus dependentes ou beneficiários,
além de procurador legalmente constituído e que possam registro nos órgãos de
classe competentes, além do represente legal, tutor, curado ou administrador
provisório em casos de incapaz (GODOY, 2019).
Já a Lei nº 8.213/91, também entende como legítimos para ingresso
administrativo a empresa, sindicato ou entidade de aposentados devidamente
legalizada, de acordo com o art. 117:

Art. 117. Empresas, sindicatos e entidades fechadas de previdência


complementar poderão, mediante celebração de acordo de cooperação
técnica com o INSS, encarregar-se, relativamente a seus empregados,
associados ou beneficiários, de requerer benefícios previdenciários por meio
eletrônico, preparando-os e instruindo-os nos termos do acordo (BRASIL,
2021, s/p.).

Numa segunda fase do processo administrativo, há a instrução, onde o


contribuinte trará aos autos as provas de que dispõe para concessão ou revisão de
benefício. É necessário, neste momento, o preenchimento de algumas exigências
18

para produção de um material que possa ser, de fato, analisado. O preenchimento


correto dos requisitos dispostos nos formulários do INSS são os primeiros passos
nesta etapa. Levar tudo ao órgão de maneira organizada facilita a análise e permite
uma melhor conferência das informações (GODOY, 2019).
Quanto as provas, a esfera administrativa do INSS permite a juntada de
qualquer meio probatório, como testemunhal, pericial, certidões, atestados,
documentos públicos, registros, etc. (NÓBREGA, 20213).
Após prévia análise, o servidor profere sua decisão, sempre fundamentada,
que deverá conter um breve relato dos pedidos e da instrução. É obrigatório também
que se ateste a motivação do deferimento ou indeferimento, bem como o cálculo dos
valores correspondentes que porventura serão pagos (OSIPE, 2013).
Por último, a fase de recurso permite uma reavaliação dos pedidos. O art. 126
da Lei nº 8.213/91 diz a este respeito:

Art. 126. Compete ao Conselho de Recursos da Previdência Social julgar,


entre outras demandas, na forma do regulamento:
I - recursos das decisões do INSS nos processos de interesse dos
beneficiários;
II - contestações e recursos relativos à atribuição, pelo Ministério da
Economia, do Fator Acidentário de Prevenção aos estabelecimentos das
empresas;
III - recursos das decisões do INSS relacionados à comprovação de atividade
rural de segurado especial de que tratam os arts. 38-A e 38-B, ou demais
informações relacionadas ao CNIS de que trata o art. 29-A desta Lei;
IV - recursos de processos relacionados à compensação financeira de que
trata a Lei nº 9.796, de 5 de maio de 1999, e à supervisão e à fiscalização
dos regimes próprios de previdência social de que trata a Lei nº 9.717, de 27
de novembro de 1998 (BRASIL, 2021, s/p.).

Através de recurso ordinário, o segurado terá 30 dias, com início do prazo a


contar do efetivo recebimento da intimação da decisão, para apresentar protestos a
decisão. Em contrapartida, o INSS terá também 30 dias apresentar suas
contrarrazões (SAVARIS, 2020).
Ainda quanto a fase recursal, quando recair sobre o processo recursos
intempestivos, esses não gerarão efeito, mas o INSS mencionará em suas
contrarrazões a intempestividade. Isto se dá, pois importante lembrar, o INSS é, a
priori um órgão de arrecadação e pagamento, não agindo como julgador (ALVEZ,
2020).
Assim, a processo administrativo, quando em um prazo aceitável, dentro dos
limites constitucionais, respeitando os preceitos processuais e agindo como órgão de
19

verificação, funciona muito bem para o seu fim, sendo que na ausência dos
pressupostos legais de concessão de benefícios, ou havendo mora exacerbada no
procedimento, o Judiciário será acionado para dirimir o litigio.

3.2. Processo Judicial Previdenciário

O art. 109, I da Constituição de 1988 estabelece ser de competência da


Justiça Federal o processamento e julgamento das causas em que a União, suas
autarquias ou empresas públicas forem interessadas (MORAES, 2005).
Assim, por mandamento constitucional, os litígios envolvendo o INSS serão
distribuídos e julgados em primeira instância nas Varas da Justiça Federal. Por seu
turno, os recursos, quando pertinentes, serão enviados aos Tribunais Regionais
Federais, cabendo, ainda, interposição de recurso especial ou extraordinário no STJ
ou no STF, respectivamente (AGOSTINHO, 2020).
Porém, a própria Constituição, no art. 109, §3º (e o STF via súmula 689),
permitem que, não havendo na comarca do segurado nenhuma Vara da Justiça
Federal, o feito poderá ser distribuído na Justiça Comum. Contudo, recursos sempre
deverão ser remetidos ao respectivo TRF (art. 109, 4§ CF).
Um ponto sempre presente nos processos previdenciários será a presença do
INSS como litigante, bem como a presunção de hipossuficiência do segurado, que
está ajuizando ação no sentido mesmo de conseguir receber valores pecuniários
indispensáveis a sua subsistência (GODOY, 2019).
Outros aspectos também norteiam as ações judiciais previdenciárias, como o
princípio da interpretação da norma previdenciária mais favorável ao segurado.
Sempre bom relembrar a figura do INSS como ente que recolhe e paga, não um órgão
de fiscalização (TAVARES, 2009).
Voltando a hipossuficiência, o caráter alimentar do benefício demanda ações
rápidas e o Novo Código de Processo Civil de 2015 atende as necessidades das
causas previdenciárias, garantindo a tutela de direitos (SAVARIS, 2019).
Por outro lado, como se verá no capítulo posterior, o volume de processos
judiciais previdenciários não deriva de uma legislação omissa ou defasada, mas das
conjecturas sociais, históricas e estruturais do Brasil e do próprio INSS (AGOSTINHO,
2020).
Neste sentido:
20

[...] No direito processual previdenciário, a lide possui um potencial muito


maior de não ser um jogo de cartas marcadas, e sim um terreno propício para
o desenvolvimento do processo colaborativo. Uma alteração procedimental
por exemplo, que vise oportunizar à parte a produção de uma nova prova,
ainda que não seja o momento processual mais adequado de acordo com o
procedimento comum ordinário, poderá ser mais facilmente aceita pela
Procuradoria do INSS, uma vez que seu objetivo não é a vitória processual,
mas sim a justa solução da lide, que será alcançada de forma mais efetiva,
caso a referida prova seja produzida a contento. (OSIPE, 2013, p. 85)

Assim, cabe ao magistrado compreender a realidade de cada causa,


enfrentando os argumentos trazidos pelas partes no melhor entendimento possível
para a rápida solução da lide.
Ademais, o estímulo ao processo administrativo, deve existir, o que facilita a
entrega de benefícios de maneira mais ágil.
21

4. OS NÚMEROS DA JUDICIALIZAÇÃO DA SEGURIDADE SOCIAL

O Conselho Nacional de Justiça, através do Justiça em números, anuário do


órgão responsável por trazem a público um panorama da Justiça no Brasil, no início
de 2019, apontou que no ano anterior, mais de 28,1 milhões de ações foram iniciadas
no Brasil. Por estes números, para cada grupo de cada 100 mil habitantes, equivalente
a uma cidade de porte médio para os padrões brasileiros, novos 11.796
procedimentos judiciais se iniciaram.
Os números falam por si. A judicialização das demandas, mesmo com
mecanismos de conciliação e arbitramento, leis e entendimentos contrários a
condenações e que aplicam princípios de bagatela; vias administrativas para
resolução dos conflitos, reforma das leis do trabalho, tudo isto não é suficiente para
um abrandamento dos números. Fato, o Judiciário vem sendo sobrecarregado e as
demandas se avolumam.
Desta realidade, não escapam as demandas ligadas ao INSS. No período
entre 2015 a 2018, houve um aumento no número de processos judiciais contra a
Previdência Social superior a 50%, chegando-se à casa de mais de 1,7 milhão de
processos (TCU, 2018).
Há uma expectativa de que, hoje, mais de 8 mil novas ações sejam
distribuídas diariamente na Justiça em causas de natureza previdenciária. É um
volume imenso da população insatisfeita com os critérios administrativos impostos
pelo INSS e que procuram o Judiciário na tentativa de reverter uma decisão que negou
a concessão de algum benefício ou evitou uma revisão de benefício já existente.
Ainda segundo dados do CNJ, as demandas previdenciárias somam hoje
mais de 8 milhões de processos, algo em torno de 10% de todos os processos judiciais
ativos no Brasil. Estes processos são longos e em sua maioria tramitam em
localidades com intensa concentração urbana, o que acaba sufocando ainda mais as
varas judiciais (MINISTÉRIO DA ECONOMIA, 2020).
Existe mesmo um acúmulo de ações e recursos a nível Previdenciário,
podendo mesmo se considerar a existência de um congestionamento de processos
na Justiça Federal, onde 40% das ações em curso nos cinco Tribunais Regionais
Federais são ligadas a demandas previdenciárias onde é litigante o INSS (BRASIL,
2020).
22

Esta situação, infelizmente, não depende apenas de uma melhor orientação


ao segurando, uma maior agilidade na concessão ou revisão administrativa de
benefícios ou mesmo uma atuação mais efetiva do Judiciário. Fatores alienígenas ao
processo, seja ele administrativo ou judicial também entram na conta.
Existem mais de 2 milhões de pedidos de perícias e exames via
administrativos parados no INSS a mais de 45 dias. Tal número é resultado de uma
série de fatores, desde a Reforma Previdenciária de 2019, que culminou em uma
enorme procurar de certidões, requerimentos, contagens de tempo de contribuição
pelos segurados, até os problemas advindo da Pandemia de Covid-19, que
literalmente parou o Brasil e o mundo por um substancial período, sendo que a
normalidade dos atendimentos ainda não foi reestabelecida (TCU, 2018).
Neste sentido, observa-se um problema maior. A judicialização da
judicialização. Ante a inercia do INSS em analisar os pedidos na fase administrava,
não resta ao segurado opção senão o ingresso no Judiciário via Mandado de
Segurança em virtude da omissão do agente público, requerendo uma resposta
administrativa a sua demanda, tese já reconhecida como necessária pelo STF dendê
o precedente vinculante RE 631.240 de 2016. Isto gerou um aumento na demanda de
mandados de segurança na Justiça Federal superior a 300%, sendo que o objeto da
ação é somente receber a resposta administrativa de um pedido; resposta que,
portanto, poderá vir a ser debatida novamente no Judiciário.
Ademais, ainda com base nas informações do CNJ (2020), a
concessão/revisão de benefícios via administrativo está a quem do desejado. A cada
dez processos deste gênero, oito acabam extrapolando as esferas do INSS para
demandar na Justiça. Tal movimento demonstra como o INSS se vê. A crise da
Previdência Social, o rombo cada vez maior nos cofres públicos, o envelhecimento da
população, a procura por auxílios doença, tudo é fator que contribui para análises
administrativas estéreis que tentam postergar o inevitável para aliviar a pressão
monetária da Previdência.
É certo que este tema político, entretanto, não cabe numa análise didática
jurídica impressa em um trabalho acadêmico de Direito. A hermenêutica jurídica busca
interpretar o cotidiano do Direito, permeado no Brasil pelo positivismo jurídico e o
consequente império da lei, fonte primeira do próprio Direito, de modo que a
manifestação de outros agentes, como questões sociais, estruturais, etc. servem
23

somente como complemento vertical do horizonte, não sendo nunca um norte na


discussão.
Contudo, é sim inegável que anos de descaso com a Previdência Social e
modelos falidos de gestão, terminaram por contribuir com o agravante da
“judicialização” das demandas ante o INSS. E, em futuro próximo, será necessário um
grande debate público para conduzir a uma nova transição normativa e novos
parâmetros que possam oxigenar as contas e contribuir com o aceleramento das
ações ainda em nível administrativo.
Tudo isto é preocupante. Recente auditoria do Tribunal de Contas da União
aponta que a judicialização já é o caminho preferido pelos segurados, que não mais
se importam em cumprir os ritos da esfera administrativa. Em seu levantamento, o
TCU aponta que em 2017 mais de R$: 90 bilhões foram pagos pelo INSS em ações
judiciais, montante que abarca tanto benefícios previdenciários, quanto assistenciais.
Tais valores representam um acréscimo de 15% das despesas totais do Instituto
naquele ano (TCU, 2018).
Assim, esta primeira análise dos números do INSS já demonstra claramente
que a judicialização das demandas previdenciárias é uma realidade latente. Uma
análise ainda tendo como referência os números do CNJ, revela ainda que mais da
metade das ações previdenciárias são julgadas procedentes ainda no primeiro grau,
indicando aos operadores do Direito da área previdenciária, especialmente os
advogados, ser a judicialização um bom negócio. Auxílios-doença, aposentadoria por
idade, benefícios assistenciais (LOAS), aposentadoria por invalidez, aposentadoria
por tempo de contribuição, pensão por morte, demandas que pertinentes no âmbito
administrativo, mas que terminam no Judiciário. Tal multiplicidade de ações culmina
nos atrasos e, como apresentado em números, esses valores bilionários atraem
profissionais.

4.1. Outras causas para o aumento das demandas judiciais

O acúmulo de demandas na esfera administrativa e a consequente


judicialização das ações previdenciárias, realidade já demonstrada acima, advém,
como também dito, de uma série de fatores de ordem econômica, social, política e da
própria estrutura do INSS (VAZ, 2021).
24

No mais, naquilo que concerne a aplicação do Direito na busca por garantias


contidas na lei, alguns benefícios se destacam como elementos de entrave. As
demandas por incapacidade temporária e definitiva e a própria saúde da população
brasileira.

4.1.1. Benefícios por incapacidade temporária e definitiva

Pesquisa recente promovida pelo Instituto de Pesquisa e Ensino no ano de


2020, pesquisa encomendada pelo CNJ apontou que litígios onde se buscam direitos
ante a seguridade social representam hoje, mais da metade das ações distribuídas e
em curso no Brasil (MINISTÉRIO DA ECONOMIA, 2020).
O estudo aponta que a intensidade e perfil das demandas está intimamente
relacionada as condições sociais e econômicas das localidades e das pessoas que
ingressam contra o INSS. O subemprego, as incertezas trazidas pela pandemia da
Covid-19 e a diminuição do quadro técnico do INSS também em virtude da pandemia,
aceleraram a procura por processos judiciais (VAZ, 2021).
Pelos dados colhidos, mais de 10% das ações administrativas são finalizadas
no Judiciário. Por amostragem, o estudo apontou algumas características como
principais para concessões e indeferimentos a nível administrativo: a) ao menos 11%
de todos os processos administrativos concedidos pelo INSS são fruto de decisões
judiciais, sendo que este percentual é ainda maior em regiões mais desenvolvidas
como o Sul e Sudeste; b) benefícios que necessitam de perícia, na maioria das vezes,
só se concretiza no Judiciário, indicando uma judicialização forçada; c) o número de
desempregado a procura de algum tipo de benefício ou auxílio aumentou
consideravelmente no último ano, agravando o problema das filas ocasionado pelo
interrupção dos serviços no início da pandemia; d) tem-se observado um aumento
contínuo no prazo para concessão ou reavaliação dos benefícios já durante a última
década. Os requerimentos administrativos se avolumam e já há uma tendência pela
judicialização manifestadas nos números e no crescente, ano após ano, número de
ações distribuídas (TCU, 2018).
O CNJ (2020) aponta quatro principais problemas que podem ser
solucionados para que o processo de judicialização seja mitigado: a) melhorar o
acesso do segurado a instância administrativa e otimizar o atendimento; b)
necessidade de se criar um entendimento jurisprudencial dentro do próprio INSS para
25

que demandas sejam concedidas ainda na esfera administrativa com amparo do corpo
jurídico do órgão; c) reformulação dos possíveis recursos administrativos e
reaproveitamento de pedidos na mesma demanda, sem a necessidade de novo
ingresso administrativo ou ingresso no judiciário; d) melhor reaproveitamento das
provas e requerimentos administrativos e exposição dos mesmos, quando necessário,
no Judiciário.
Este último ponto é essencial. Não raro, todo o procedimento administrativo
não é aproveitado pelo Judiciário, acarretando mais morosidade e uma dupla análise
que poderia ser facilmente encerrada.
Para o jurista Paulo Afonso Brum Vaz, algumas alternativas merecem ser
discutidas:

As principais propostas me parecem ser: o reforço na qualidade de análise


do material probatório e verificação de informações sobre o segurado; a
uniformização dos critérios de análise probatória e pericial; o
compartilhamento de sistemas do INSS e do Judiciário; o acesso pelo
Judiciário às análises e aos documentos do processo administrativo; e a
ampliação dos esforços do Judiciário para a consolidação da sua
jurisprudência (VAZ, 2021, s/p.).

Sempre necessário destacar o quadro mundial de pandemia da Covid-19


como fator essencial a judicialização. A relação do indivíduo com o Estado se baseia
na lei. A Constituição é o norte e as garantias constitucionais se espalham no
ordenamento através de leis especiais e códigos. Quando da inércia do Estado, tal
omissão gera um direito ao particular, que será sanado via Mandado de Segurança.
A Lei 12.016/2009 estabelece:

Art. 1º Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido


e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que,
ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer
violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de
que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça (BRASIL, 2021).

A ação ou omissão do agente público, portanto é o fator relevante no processo


iniciado via Mandado de Segurança, e, no caso do INSS a omissão na análise dos
dados trazidos na esfera administrativa pelo segurado gera o direito líquido e certo a
análise, que deve ser rápida, pois o perigo da demora representa em si violação de
direitos. Tanto mais, a “fumaça do bom direito” sempre será demonstrada na própria
inércia do INSS, que determina o ingresso judicial.
26

4.2. As condições de saúde no Brasil e as consequências para o INSS

Não se pode negar que há uma mudança social em curso no Brasil. Não se
está mais diante de um país essencialmente agrário e o êxodo para as cidades, em
verdade, já se manifesta em sentido oposto, com um grande número de pessoas
procurando cidades menores distantes dos grandes centros urbanos exauridos e
caros.
Se por um lado é inegável que o padrão de consumo dos brasileiros
aumentos, isto não se reflete em qualidade de vida. O trabalhador médio continua em
rotinas exaltantes de trabalho, recebendo valores pecuniários baixos, absorvidos no
cotidiano dos transportes, alimentação, moradia. A própria subsistência das famílias
está cada vez mais condicionada ao trabalho de todos os membros do núcleo familiar
e da existência de pessoas seguradas dentro de uma residência (TCU, 2018).
Soma-se a isto dados da OMS, Organização Mundial da Saúde, que lista o
Brasil como um país ainda instável no tratamento de várias doenças. O investimento
em saúde pública também vem sofrendo com a crise econômica que se alastra desde
meados da década de 2010/2020 e a falência dos hospitais públicos e um reflexo
visível do desmantelamento do próprio Sistema Único de Saúde (VAZ, 2021).
Aqui, vale destacar que a legislação trabalhista no Brasil arrecada
contribuições que possibilitem ao trabalhador uma compensação em determinadas
situações. Tais contribuições, compulsórios, não conseguem suprir o rombo
previdenciário e o envelhecimento da população ajuda nesta bolha. Há menos
pessoas contribuindo e mais pessoas requerendo benefícios.
As condições do trabalho também se modificaram ao longo dos anos. Se
antes condições insalubres e perigosas representam riscos mais concretos, a própria
evolução das rotinas criou uma série de novas doenças.
Hipertensão, estresse, doenças físicas e mentais associadas a pressão cada
vez maior por resultados em um mercado saturado e com poucas oportunidades.
Novos arranjos na relação de emprego como o teletrabalho trouxeram o trabalho para
dentro do foro íntimo das pessoas, reduzindo a liberdade, gerando uma sensação de
constante ligação entre o colaborador e as corporações (VAZ, 2021).
Os limites de horas, o deslocamento por vários quilômetros até o emprego,
tudo contribui o esgotamento das pessoas e posterior demandas no INSS.
27

A qualidade de vida, portanto, está também diretamente relacionada ao


aumento das ações que buscam concessões de benefícios e auxílios.
E falando em auxílio, não se poder retirar da lista o Auxílio Emergencial, que
se utilizou da estrutura da Previdência Social para analisar milhões de pedidos
advindo de uma enorme massa de pessoas afetada pela Covid-19, trabalhadores
autônomos impossibilitados de trabalhar, famílias que subsistem apenas com este
estímulo governamental e que se utilizaram dos servidores da Receita para cadastro
e atualização de dados (VAZ, 2021).
Certo que há um hiato entre a necessidade dos segurados e a capacidade de
processamento dos pedidos a nível administrativo e todos as vertentes analisadas
convergem na judicialização dos processos.
28

5. CONCLUSÃO

Como foi apresentado, a Previdência Social, gerida pelo INSS, é a autarquia


federal responsável pela arrecadação das contribuições previdenciárias e o
pagamento dos benefícios e auxílios destinados a determinados grupos de pessoas.
O caráter compulsório de filiação ao regime geral da previdência garante a
todos os trabalhadores acesso aos benefícios do INSS em um sistema de
solidariedade entre partes. Os trabalhadores e segurados de hoje, juntamente com os
recursos advindo do Estado, garantem o pagamento dos benefícios distribuídos
atualmente e o andar da fila garante que as novas gerações banquem os futuros
beneficiados.
A lei estabelece o INSS como órgão de arrecadação e pagamento. Não é um
órgão de controle, mas também por lei, é necessário que o beneficiário provoque o
INSS via processo administrativo para fazer valer seu direito a determinado auxílio ou
benefício. Neste sentido, o INSS apura as informações e emite parecer decisório
quanto a concessão ou não daquilo que foi pedido.
O processo administrativo, que funciona sempre respeitando os princípios do
Direito, da Constituição e da legislação pertinente, dá ao segurado todos os meios
para provar sua condição. Há ainda fase recursal própria e um rito a ser seguindo,
sendo que as fases do procedimento não são tão herméticas como um procedimento
judicial.
A inércia do INSS na fase administrativa, será enfrentada em âmbito Judicial
via Mandado de Segurança, o que acaba por deslocar grandes esforços do judiciário
para resolução de demandas ainda na esfera administrativa, sendo que, a depender
do resultado naquela seara, novamente o judiciário será provocado. Quanto a isto, o
trabalho demonstrou o crescente número de mandados de segurança impetrados nos
TRF tendo o INSS como litigante, o que contribui com a letargia da Justiça.
Observou-se também que hoje há uma tendência na judicialização das causas
previdenciárias. A Pandemia de Covid-19 só acelerou este processo, visto seus
efeitos em bloquear o acesso de vários segurados a perícias e documentos.
Mas esta tendência faz parte de um movimento maior. A Previdência
apresenta reiterados rombos e a concessão de benefícios têm deixado de se pautas
29

nos instrumentos contidos na lei e que autorizam pagamentos. Existe um evidente


movimento de protelação em pagamentos, o que mantém o rombo ainda sob controle.
A inversão da pirâmide etária nacional, o desemprego, a saúde do brasileiro,
tudo pressiona a Previdência. No campo jurídico, tanto o processo administrativo
quanto as ações liminares em Mandado de Segurança, quanto o processamento das
ações judiciais, demonstram eficiência legal. São instrumentos jurídicos capazes de
dirimir os conflitos e trazer Justiça às demandas. Por outro lado, nem sempre está
Justiça alcança o beneficiário original, pois o volume de demandas vem crescendo e
a Serventia necessita de novos colaboradores.
Um debate nacional acerca dos rumos da Previdência deve ser proposto para
reformular as bases de arrecadação e pagamento. O modelo em si parece não ser o
ideal.
A nação passou por mudanças estruturais nos últimos 50 anos. O Brasil não
é mais um país agrário, muito menos industrial. O terceiro setor abocanha grande fatia
da mão-de-obra adulta e o trabalho informal cresce a cada mês.
Perceber essa realidade é essencial para que haja um equilíbrio nas demandas
previdenciárias e um sossego ao Judiciário.
A judicialização não é um caminho, mas hoje parece ser um caminho sem
volta.
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6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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