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João I
Fernão Lopes
Fernão Lopes empurrou para a frente, até nós, uma das épocas mais fascinantes do passado português.
Tudo o que ele escreveu era verdade. No tempo dele davam-lhe o nome de cronista e a sua principal missão era escrever a
história dos reinados que tinham ficado para trás. Quem lhes pagavam eram os reis. Eram, portanto, funcionários públicos.
Fernão Lopes teve a ideia de contar as coisas com o máximo de realismo. E, como observador atento da realidade que era,
não lhe escapou o papel decisivo desempenhado pelo povo anónimo no curso da História.
É graças às suas crónicas que sabemos “tudo” acerca da 2ª metade do século XIV português e que consideramos esse período
um dos mais fascinantes da nossa História.
Glossário
Crónicas- (kronos, tempo) sequência, compilação de factos registados segundo a ordem do seu desenrolar. As crónicas
traçavam a história de um reinado, de uma dinastia ou de uma instituição e mesmo a história de um povo, desde os seus
começos, mas sem que o autor tente determinar as causas e apontar os efeitos.
Crónica de D. João I-obra prima de autoria do cronista português Fernão Lopes. Compõem-na 2 partes e abrange,
historicamente, o período do interregno (período entre 2 reinados em que não há rei hereditário) e os acontecimentos que
antecederam os esposais da infanta D. Beatriz com o filho do conde de Cambridge: a aclamação do Mestre de Avis, o
assassínio do conde Andeiro, a trucidação do bispo de Lisboa pela multidão, o cerco da capital e a peste no arraial castelhano
e as batalhas de Aljubarrota e Valverde.
História:
D. Fernando morre, ficando D. Leonor no trono até que haja um sucessor. D. Beatriz começa a ter relações com um
castelhano. Portugal andava sempre na guerra com Castela (Espanha).
D. Leonor arranja para secretário um homem de Castela, conhecido por Conde Andeiro.
O Mestre de Avis ( D. João I) era filho não legitimo, isto é, era filho fora do casamento de D. Pedro e D. Teresa, filho bastardo.
Mestre de Avis queria armar alguma coisa cena para o povo o apoiar ao trono, então começou-se a espalhar um bvoato
dizendo que D. Leonor e o Conde eram amantes, o que fez o povo odiar D. Leonor, chamando-a de prostituta. Então, o
Mestre de Avis finge que o Conde o quer matar, para que isso também se espalhasse pelo povo.
E assim, o Mestre de Avis aparece ao povo mostrando-se como herói, ficando o povo cada vez mais a apoiá-lo.
Fernão Lopes conta esta história para mostrar o quão inteligente foi o Mestre de Avis.
Crónica de D. João I
Capítulo XI
DO ALVOROÇO QUE HOUVE NA ÇIDADE CUIDAMDO QUE MATAVOM O MESTRE E COMO LÁ FOI ÁLVARO PAIS E
MUITAS GENTES COM ELE
homem que obedecia à ordens do Fidalgo com muita pressa
gritava
O pajem do Mestre, que estava à porta, a quando lhe disseram que fosse
pela vila, segundo já estava preparado, começou a ir rijamente a galope, em O Paje obedece às ordens do
cima do cavalo em que estava, dizendo a altas vozes, bradando pela rua: Mestre de Avis, gritando que o
acudam
Matam o Mestre! Matam o Mestre nos paços da rainha! Acudam ao Mestre
que o matam! E assim chegou a casa de Álvaro Pais, que era dali grande
espaço. convocação
o povo capacete
As gentes que isto ouviam saíam à rua a ver que cousa era. E, começando a O povo sai à rua para ver o que se
falar uns com os outros, alvoroçava-se-lhes o coração, e começavam a passa;
tomar armas cada um como melhor e mais depressa podia.
Álvaro Pais e o Paje passam a
Álvaro Pais, que estava prestes e armado com uma coifa na cabeça,
mensagem;
segundo uso daquele tempo, cavalgou logo à pressa em cima de um cavalo,
apesar de que anos havia que não cavalgara, e todos os seus aliados com O povo segue-os repetindo o que
ele, brandando a quaisquer que achava: Acudamos ao Mestre, amigos, eles diziam
acudamos ao Mestre, que é filho de el-rei D. Pedro! E assim bradavam ele e
o pajem indo pela rua. Álvaro Pais
o povo ia apoiar D. João (Mestre
ruído de Avis) por ser filho de D. Pedro
tinha um amante
Soaram as vozes do arruído pela cidade, ouvindo todos bradar que
matavam o Mestre. E assim como viúva que rei não tinha, como se lhe este O povo dirige-se ao sítio onde ele
ficara em lugar de marido, se moveram todos com mão armada, correndo à ia ser morto.
pressa para onde diziam que isto se fazia, para lhe darem a vida e livrá-lo de
morte. Álvaro Pais não parava de ir para lá, bradando a todos: Acudamos ao
Mestre, amigos, acudamos ao Mestre, que o matam sem porquê!
escuros
A gente começou a juntar-se a ele, e era tanta que era estranha cousa de ver. Realça a quantidade de pessoas
Não cabiam pelas ruas principais, e atravessavam lugares escusos, desejando que ia apoiar o Mestre de Avis.
cada um ser o primeiro. E, perguntando uns aos outros quem matava o
O povo pergunta quem o vai
Mestre, não faltava quem respondesse que o matava o conde João
matar.
Fernandes, por mandado da rainha. D. Leonor
Alguns bradavam por lenha e que viesse lume para porem fogo aos Paços e
queimarem o traidor e a aleivosa. Outros teimavam pedindo escadas para
subir acima, para verem que era do Mestre. E em tudo isto era ho arroido tão
grande, que se não entendiam uns com os outros nem determinavam cousa
nem viam nada
Crónica de D. João I
nenhuma. E não somente era isto à porta dos paços, mas ainda em redor
deles, por onde quer que coubessem homens e mulheres. Umas vinham com
feixes de lenha, outras traziam carqueja para acender o fogo, cuidamdo
queimar com ela o muro dos paços, dizendo muitos doestos contra a rainha.
de outra maneira insultos querendo D. Leonor
impedir
De cima não faltava quem gritasse que o Mestre estava vivo e o conde João
Fernandes morto. Mas isto ninguém o queria crer, dizendo: Pois se está
vivo, mostrai-no-lo e vê-lo-emos.
Então os do Mestre, vendo tão grande alvoroço como este e que cada vez
se açemdia mais, disseram que fosse sua mercê de se mostrar àquelas
gentes, doutra guisa poderiam quebrar as portas, ou pôr-lhes fogo, e
entrando assim dentro à força não as poderiam depois tolher de fazer o que
quisessem.
Ali se mostrou o Mestre a uma grande janela que dava sobre a rua, onde
estavam Álvaro Pais e a maior força da gente, e disse: Amigos, sossegai, que
eu estou vivo e são, a Deus graças. O Mestre aparece.
E tanta era a perturbação deles, e de tal maneira tinham já em crença que o
Mestre fora morto, que tais havia que porfiavam que não era aquele.
Porem, conhecendo-o todos, claramente ficaram com prazer quando o
ouviram, e diziam uns para os outros: O que mal fez! pois que Então matou
o traidor do Conde, porque não matou logo a aleivosa com ele? Creedes em
O povo diz que o Mestre devia ter
Deus, ainda se há-de vingar dela. Olhai e vides que maldade tão grande,
matado também D. Leonor, pois
mandaram-no chamar onde ia já de seu caminho, pera matarem aqui per sente odio por ela.
traiçom. Ó aleivosa! já nos matou um senhor, e agora nos queria
matar outro; leixae-a, ca ainda há mal d’acabar por estas cousas que faz!
D. Fernando
E indo assim até á entrada do Rossio, e o Conde vinha com todos os seus, e
outros altos funcionários da cidade que o guardavam, assim como
Crónica de D. João I
AffomssEanes Nogueira, e Martim Afonso Valente, e Estevam Vaasquez
Filipe, e Alvoro do Rego, e outro fidalgos; e quando viu o Mestre hir daquela
guisa, foi abraça-lo com prazer e disse: Mantenha-vos Deos, Senhor. Sei
que vos tirastes de gramde cuidado, mas vos mereçiees esta homra melhor
que nos. Amdaae, vamos logo comer . E assim foram para os Paços onde
pousava o Conde.
E estando eles por se sentar á mesa, disseram ao Mestre que os cidade
queriam matar o Bispo, e que ele devia o socorrer; e o Mestre quisera allo
hir.
Disse então ao Conde: Não pensais disso, Senhor, se o matarem , que o
matem que não, se ele morrer, não faltará outro Bispo português que vos
sirva melhor que ele. Ao ser dito isto ao Conde, ele cessou à vontade do
Mestre, e o Bispo foi morto desta guisa que sse segue.
Análise:
2. Sensações exaltadas durante a descrição da concentração popular: Audição (“começarom de dizer”, l. 24, “Alli eram
ouvidos braados de desvairadas maneiras.”, l. 25, “era ho arroido atam gramde que sse nom emtemdiam huus com os
outros”, ll. 30-31, “braadavom dizemdo”, ll. 61-62,“dizendo altas vozes”, l. 66) e visão (“A gemte começou de sse jumtar
a elle, e era tanta que era estranha cousa de veer.”, l. 18, “veemdo tam gramde alvoroço”, l. 39).
2.1. Expressividade do sensorialismo: Torna os relatos mais realistas, como que transportando o leitor para o local dos
acontecimentos, fazendo-o “ver” e “ouvir” o que se passou.
3. O povo reveste-se de particular importância ao garantir a defesa do Mestre, influenciando o curso da História de
Portugal.
3.2. Sentimentos dos populares: “alvoraçavomsse nas voomtades” (l. 7); “todos feitos dhuu coraçom com tallemte” (l.
22); “tamta era atorvaçam” (l. 47); “ouverom gram prazer quamdo o virom” (ll. 49-50); “muitos choravom com prazer de
o veer vivo” (l. 59); “com prazer” (l. 66).
3.3. Comparação que realça a ligação do povo ao Mestre, aproximando-o de uma figura familiar merecedora de amor.
4. Personagens individuais: Álvaro Pais, o Mestre de Avis e o pajem.
4.1. Caracterização indireta, pois são as suas palavras e, sobretudo, as suas ações que permitem caracterizá-los.
4.3. Álvaro Pais colabora com o pajem na divulgação do boato da morte do Mestre, preparado previamente
(ll. 8-10). Insiste na divulgação da notícia junto do povo, de modo a “convocar” as massas populares e a criar um clima
favorável à aceitação do Mestre e à sua confirmação como herdeiro legítimo do trono português.
Crónica de D. João I
5. O narrador coloca na voz do povo as acusações de traição, transmitindo-se assim uma imagem muito negativa da figura de
Leonor Teles, chegando a ser acusada pela morte de D. Fernando (ll. 53-54).
6. Fernão Lopes manifesta a sua empatia com as camadas populares e apresenta um retrato pouco abonatório de D. Leonor.
Capítulo CXV
preparada
Maneira
PER QUE GUISA ESTAVA A ÇIDADE CORREGIDA PERA ESSE DEFFEMDER, QUAMDO ELREI DE CASTELLA POS ÇERCO
SOBRELLA próximo que estava dentro da cidade de Lisboa
está a cercá-la
estando
Nenhum discurso deve ser mais proximo deste capitulo que haverdes Fala-nos do Mestre e da cidade que
ouvido, do que termos contado aqui brevemente de que maneira estava a estavam em conflito com o Rei de
Castela.
cidade, jazemdo elRei de Castela sobre ela; e de que modo o mestre de
Avis se protegia do Rei de Castela e ao seu povo que detro eram , por não O Mestre manda cercar a cidade,
receber dano de sus emmiigos; e o esforço e fouteza que contra eles porque eles não podem entrar.
mostravam, em enquanto assim estava cercada.
coragem para não serem atingidos pelos seus
refere-se ao texto inimigos (Rei de Castela)
Os muros todos da cidade não tinham mingua de reparação; e as 77 torres Diz-nos que a cidade estava bem
que tinham em redor de si, foram feitos fortes caramanchoões de protegida, uma vez que as muralhas
madeira, os quais eram bem fornecidos de escudos e lanças e dardos e não precisavam de reparação.
besstas de torno, e doutras maneiras com grande abundância de muitos
setas grandes. armas de arremesso de longo alcance
Os homens estavam armados, bem
Havia mais em estas torres muitos homens com lanças darmas e protegidos à volta das 77 torres da
bacinetes, e doutras armaduras, que reluziam tanto que bem mostrava muralha. A sua armadura era tanta
cada uma das torres que por si era bastante para para se defender. Em que até reluzia (metal).
muitas delas estavam catapultas bem acompanhados de pedras, e
Pelas diversas torres eram colocadas
bandeiras de sam Jorge, e das armas do reino e da cidade, e doutros
bandeiras relativas à cidade de Lisboa.
alguns senhores e capitães que as punham nas torres que lhes eram
A de San Jorge era para proteger a
encomendadas. padroeiro de Lisboa, o seu protetor
cidade e para mostrar a sua pátria.
Crónica de D. João I
E hordenou o o Mestre ao ponto da cidade, que fosse repartida a guarda
dos muros pelos fidalgos e cidadãos honrados; aos quais deram certas
quadrilhas e besteiros e homees darmas pera ajuda de cada um guardar
bem a sua. partes da muralha soldados armados com bestas tocar As pessoas foram repartidas para
Em cada quadrilha havia 1 sino para rrepicar quando tal coisa vissem; e guardar cada parte da muralha.
como cada um ouvia o sino da sua quadrilha, logo todos corriam Em cada quadrilha havia um sino para
rapidamente para ela; por quantas vezes , os que tinham em encargo das tocar quando houvesse algo de
torres, vinham descansar à cidade, e e deixavam-nas encomendadas as suspeito
homes a quem muito confiavam; outras vezes não ficavam com elas e só
ficamavam de vigilantes; mas como davam o sinal de alarme enxiam-se
logo os muros de muita gente de lá de fora. gritos
E não sendo suficiente tudo isto, o Mestre que tinham um especial o Mestre já não dormia faz tempo,
cuidado da guarda e da governação da cidade, damdo seu corpo a porque estava de guarda na cidade.
mui breve sono, inspecionava por muitas vezes de noite os muros e
O Mestre de Avis quando estava tudo
torres com tochas acesas perto de si, b em acompanhado de muitos
preparado para o cerco da cidade,
que levava sempre consigo. Não havia ninguém que desobedecesse participava na defesa, não dormindo
dos que haviam de vellar, nem tal que esquecesse coisa que lhe fosse muito, não tendo uma atitude passiva.
responsável; estavam todos prontos a fazero que lhe mandavam, de
forma que todo o bom regimento que o Mestre ordenava, nom Ele dava as ordens e os outros
obedeciam.
mimguãva avomdamça de trigosos executores. dormia pouco;
todas as ordens que o Mestre sono muito breve
paus com chama
dava, não diminuíam
Análise
Neste texto vamos ver a maneira como o mestre de Avis e os portugueses se defendem da cerca;
Tempo verbal: Pretérito imperfeito do indicativo- a ação está a decorrer, estamos a acompanhar a sua preparação dando-
nos a sensação que estamos lá dentro a assistir;
P. Perfeito- ação acabada;
P. Mais que Perfeito- (pouco usado);
P. Imperfeito- ação inacabada, “construía”
todo em ella, assi em celeiros subterrâneos come per outra maneira, Eles já sabiam que era pouco, porque haveriam de
certificar?
e acharomm que era tam pouco que bem avia mester sobrello
comsselho? Subjetividade- Interrogação de Fernão Lopes;
Comsselho- haveria necessidade se seguir o
Na çidade nom avia trigo pera vender, e se o havia, era muito pouco conselho do mestre?
e tão caro, que as pobres gemtes nom podiam chegar a elle; ca valia Antiga unidade de medida de capacidade para secos e líquidos
ho alqueire quatro livras; e o alqueire do milho quareemta soldos; e a Antiga moeda portuguesa
canada do vinho três e quatro livras; e padeciam mui apertadamente Antiga medida de capacidade equivalente a 2litros
ca dia avia hi, que, aimda que dessem por um pão uma dobra, que o Sofriam muito
nom achariam a vemder; e começarom de comer pão de bagaço A cada dia que passava
Não havia o produto
dazeitona, e dos queyjos das mallvas e rraizes dervas, e doutras
planta
desacostumadas cousas, pouco amigas da natureza; e tais hi avia,
Em melaço
que sse mantinha em alfélloa. No logar hu costumavom vemder o
Fazer buracos
trigo, andavom homens e moços esgaravatamdo a terra; e sse
Rapazes jovens
achavom alguns graãos de trigo, metiãnos na boca sem teemdo outro
mantimento; e outros se fartavo dervas, e beviam tamta água, que Referencia ao pão e ao vinho;
achavom mortos homens e cachopos jazer imchados nas praças e em
Havia dinheiro, mas não haviam produtos,
outros logares. então mantinham-se da natureza, e uns
Das carnes, isso mesmo, avia em ella gramde mimgua; e sse alguns morriam porque comiam ervas venenosas.
criavom porcos, mantiinhasse em eles; e pequena posta de porco,
Também
vallia çimquo e seis livras que era huua dobra castellãa; e a galinha faltava
quarenta soldos; e a dúzia dos ovos, doze soldos; e se almogávares
tragiam alguus bois, vallia cada huu sateemta livras, que eram
quatorze dobras cruzadas, vallemdo emtom a dobra çimquo e sei
livras; e a cabeça e as tripas, hua dobra; assi que os pobres per
Crónica de D. João I
mimgua de dinheiro, nom comiam carne e padeciam mal; e
começarom de comer as carnes das bestas, e nom somente os
pobres e mimguados, mas grades pessoas da çidade, lazeramdo nõ
sabiam que fazer; e os geestos mudados com fame, bem mostravom
seus emcubertos padecimentos. Amdavom os moços de três e de
quatro anos, pedimdo pam pella çidade por amor de Deos, como lhes
emsinavam suas madres; e muitos nom tinham outra cousa que lhe
dar senom lagrimas que com eles choravom que era triste cousa de
veer; e se lhes davom tamanho pam come hua noz, aviamno por
gramdebem. Desfalleçia o leite aaquellas que tinham criamças a seus
peitos per mimgua de mantimento; e veemdo lazerar seus filhos a
que acorrer nom podiam, choravom ameude sobrelles a morte amte
que os a morte privasse da vida; muitos esguardavom as prezes
alheas com chorosos olhos, por comprir o que a piedade mamda, e
nom teemdo de que lhes acorrer, cahiam em dobrada tristeza.
Toda a çidade era dada a nojo, chea de mezquinhas querellas; sem
nenhuu prazer que hi ouvesse: uns com gram mingua do que Tinham dó
acontecer
padeciam; outros avemdo doo dos atribulados; e isto nom sem
Contudo
rrazom, ca sse he triste e mesquinho o coraçom cuidadoso nas cousas
tristeza
comtrairas que lhe aviinr podem veede que fariam aqueles que as
comthinuadamente tam presentes tinham? Pero com todo esto, frequentemente
quando rerpicavom, nenhum nom mostrava que era faminto, mas prova de subjetividade por parte do autor,
forte e rrijo comtra seus inimigos. Esforçavomsse uns por comsollar pergunta-se a si mesmo
os outros, por dar rremedio a seu gramde nojo, mas nom prestava
está
comforto de palavras, nem podia tall door seer amanssada com
Discutir de outras coisas
nenhumas doçes razões; e assim como é natural coisa a maão hir
falta
ameude omde see a door, assi uns homens falamdo com outros, nom
A fome era tanta que eles falavam sempre disso;
podiam em all departir, senom, em na mimgua que cada um padecia.
Oo quamtas vezes emcomendavom nas missas e pregações que Quando estas discussões apareciam não se
rrogassem a Deos devotamente por o estado da çidade; e de joelhos demonstravam famintos mas fortes para
beijando a terra, braadavom a Deos que lhes acorresse, e suas prezes defender
socorresse
nõ eram compridas! Uns choravom antre si, mal dizemdo seus dias, Ouvidas, satisfeitas
queixamdosse por que tamto viviam, como se dissessem com o Preferiam morrer do que viver nestas condições
Propheta: Hora vehesse a morte amte do tempo, e a terra cobrisse
nossas façes, pera non veermos tamtos malles! Assi que rrogavom a
Sofrimentos tão cruéis
morte que os levasse, dizemdo que melhor lhe fora morrer, que lhe
serem cada dia rrenovados desvairados padecimentos. Outros se queixavam
querellavom a seus amigos, dizemdo que forom desavemtuiradas Eram gente desgraçada
gemte, que sse amte nom derom a elRei de Castella, que cada dia Antes se tivessem entregado
padecer novas mizquiidades, firmamdosse de todo nas peores cousas sofrimentos
que fortuna em esto podia obrar. Preferiam ter sido entregues ao Rei de
Castela do que estarem neste sofrimento
Sabia porem isto o Meestre e os de seu Comsselho, e eramlhe
Mestre de Avis
doorosas douvir taaes novas; e veemdo estes malles a que acorrer
O povo queixava-se então preferia fechar os
nom podiam ajudar, çarravom suas orlhas do rrumor do poboo.
ouvidos porque não podia ajudar
Como nom querees que maldissessem sa vida e desejassem morrer subjetividade
Estavam entre a vida e a morte. Falavam
alguns homens e mulheres, que tanta diferença há douvir estas Os filhos morriam de fome
mal da sua vida (lamentavam-se)
cousas, aaqueles que as emtom passarom, como há da vida aa desejando a morte. A distância da vida e da
morte? Os padres e madres viiam estalar de fame os filhos que muito morte era curta.
Crónica de D. João I
amavom, rrompiã as faces e peitos sobrelles, nom teemdo com que
lhe acorrer, senom plamto e espargimento de lagrimas; e sobre todo
isto, medo gramde da cruell vimgamça que emtemdiam que elRei de
Castella deles avia de tomar; assi que eles padeciam duas grandes
guerras, uma dos inimigos que os cercados tinham, e outra dos
mantimentos que lhes mimguavom, de guisa que eram postos em
cuidado de sse defemder da morte per duas guisas.
Pera que he dizer mais de taaes falleçimentos? Foi tamanho o gasto
Acrescentar mais sofre
das cousas que mester aviam que sohou um dia pella cidade que o este sofrimento?
Mestre mamdava deitar fora todollos que nom tevessem pam que Tanta a falta das cousas
que tinham necessidade
comer , e que somente os quer o tevessem ficassem em ella; mas
quem poderia ouvir sem gemidos e sem choro tal hordenamça de cidade Ouviu-se
As pessoas sofriam e choravom
mandado aaquelles que o nom tinham? Porem sabemdo que nom Um pouco
era assi, foilhe já mandado aaquelles que o nom tinham? Porem fome
sabemdo que nom era assi, foilhe já quamto de comforto. Omde
Por causa
sabee que esta fame e falleçimento que as gemtes assi padeciam,
nom era por seer o çerco perlomgado, ca nom avia tamto tempo que Se acolheram na cidade
Lixboa era cercada; mas era per aazo das muitas gemtes que sse a
ella colherom de todo o termo; e isso mesmo da frota do Porto A cidade
Aconteceu o mesmo no Porto
quamdo veo, e os mantimentos serem muito poucos.
Vejais
Hora esguardaae como sse fossees presente, uma tall çidade assi certeza
descomfortada e sem nenhuma çerta feuza de seu livramento, como libertação 2ª pessoa do plural
veviriam em desvairados cuidados, quem sofria omdas de taees viveriam
afflições? Oo geeraçom que depois veo, poboo bem avetuirado, que Tais cuidados Dirige-se às futuras gerações.
Tantas aflições
nom soube parte de tantos malles, nem foi quihoeiro de taaes “Deus protegeu-os, pois ele
testemunha
padeçimentos! Os quaaes a Deos por Sua merçee prougue de çedo agradou resolveu o assunto antes que
eles nascessem” - deus
abreviar doutra guisa, como açerca ouvirees. maneira
Em breve mandou a peste negra,
mandando os contaminados
para lá de forma a assustar os
castelhanos (os castelhanos
eram medricas) -
Enaltecimentos do português,
os portugueses são
corajosos/fortes
Análise
Falamos de uma situação que Lisboa passou- a falta dos mantimentos devido ao cerco de Lisboa pelos castelhanos.
Os castelhanos aproveitaram a acolher as pessoas que eram deitadas fora, depois concluíram que era pelo desgosto que
conseguiriam ganhar. Eles preferiam ficar prisioneiros dos castelhanos do que voltar para a cidade, porque lá iriam morrer à
fome.
Descreve como estava a população de Lisboa, esfomeada porque a cidade estava cercada pelos Castelhanos.
Isto é o reatrto fiel de como está a população.
Crónica- objetivo: registar os acontecimentos mais importantes da época de forma objetiva.
O cronista não consegue ser totalmente objetivo, pois Fernão Lopes também dá a sua opinião e fala do que ele sentia acerca
daquilo tudo. Pois ele é português e conta acontecimentos dos portugueses, ele é subjetivo. (Ex na linha 39 que acaba com
2?” logo é a prova de subjetividade pois o autor pergunta-se a si mesmo).