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Galeão da Nazaré
Os barcos tipo galeão foram introduzidos em Portugal, a partir
de Espanha, em 189895, e utilizavam-se na arte da rede de cerco (cer-
co americano)96 – arte que se extinguiu por volta de 1930. Um arma-
dor de fora da Nazaré trouxe, de Vila Real de Santo António, o pri-
meiro galeão. As grandes redes de cerco são então instaladas por
grandes embarcações a remos que os pescadores autóctones, durante
uma trintena de anos, vão manobrar97.
De forma alongada, tratava-se de uma grande e larga embarcação
(comprimento entre 9 e 17 m e largura da ordem dos 4 m), caracteri-
zava-se ainda por possuir quilha e costados reforçados com cintas,
proa ogival e popa arredondada, sendo capaz de suportar até 9 tone-
ladas de arqueação bruta (Fig. 30). Tinha leme por fora, de forma
alongada, e a ponte do convés contava com duas a três escotilhas para
acesso aos compartimentos inferiores, os porões do peixe. A propul-
são era garantida por uma vela bastarda içada em mastro ligeiramente
inclinado para vante; quando não havia vento e também no lançar das
redes, era propulsionada a remos (três a sete por banda), se bem que
ao navegar em círculo (no sentido dos ponteiros do relógio) apenas se
utilizava um remo a estibordo – o remo do castelo, e os restantes a
bombordo98 (Fig. 31 e Fig. 32). Dispunha de uma companha grande
95
José MATIAS, Nazaré – Cronologia dos Factos Mais Importantes (publica-
do em Abril 1, 2014; consultado em 23 de Maio de 2022). https://www.
josematias.pt/eletr/biografia_de_ze_da_palacida2/ Segundo este autor, o pri-
meiro galeão da Nazaré pertenceu a António Raposo.
96
Segundo C. ESCALLIER (op. cit., 1995, 203 e Quadro 9), conhece-se a inscri-
ção de um barco tipo galeão com data de 16 de agosto de 1901, não se podendo,
todavia, afirmar tratar-se da primeira inscrição de um destes barcos, devido à
impossibilidade de consulta de arquivos anteriores a 1893. Naquele mesmo ano,
quatro outros barcos galeão e quatro auxiliares (batel e barco) foram inscritos.
97
C. ESCALLIER, op. cit., 1995, 203.
98
Idem, 114.
51
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
99
J. MATIAS, op. cit., 2014.
100
O grande volume destes barcos obrigava os pescadores a amarrá-los na
enseada durante a estação piscatória, evitando assim o risco de encalhe (C.
ESCALLIER, op. cit., 1995, 203).
52
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
Fig. 32 - Maqueta de
Lancha ou Galeão,
Museu da Marinha,
MM.05375. (Fot. de
José Manuel de
Mascarenhas, 2022)
Fig. 33 - Buque,
segundo A. A.
Baldaque da Silva,
1892, 388.
(Autor: J. Almeida)
53
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
54
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
Fig. 35 - Batel
lagosteiro de S.
Matinho do Porto,
Museu da Marinha,
MM.05421 (Fot. de
José Manuel de
Mascarenhas, 2022).
55
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
106
A. A. Baldaque da SILVA, op. cit., 1892, 384.
107
Pesca. Segunda Circunscripção, Costa Occidental do Sul, Comprehendendo
os Districtos Administrativos de Leiria, Lisboa, Beja, e uma pequena parte do
de Faro, 295 [Arquivo Histórico da Marinha, 254]. As referidas redes de arrastar,
de invento estrangeiro, também eram designadas por trawls e, mesmo aperfeiço-
adas, os seus efeitos eram considerados destruidores.
108
Adolpho LOUREIRO, Os Portos Marítimos de Portugal e Ilhas Adjacentes,
Vol II, Lisboa, Imprensa Nacional,1904, 239, 275.
109
P. I. Rio CARVALHO, Informação de 09 de julho de 1903, Ministério da
Marinha e Ultramar, Collecção de Leis e Disposições Diversas com Relação à
Pesca e Serviço Marítimo dos Portos, Lisboa, Imprensa Nacional, 1907, 524
[Arquivo Histórico da Marinha].
56
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
Fig. 36 - Maqueta do galeão a vapor Novo Oceano (construído em Lisboa, em 1925). Museu da
Marinha, MO-I-90. (Fot. de José Manuel de Mascarenhas, 2022)
Fig. 37 - Pormenor da maqueta do galeão a vapor Novo Oceano, mostrando um guincho destinado
a facilitar as manobras com a rede de pesca. Museu da Marinha, MO-I-90.
(Fot. de José Manuel de Mascarenhas, 2022)
57
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
Fig. 38 - Galeão a vapor Cerco Portugal 5 (1918), em plena atividade pesqueira, Museu de
Portimão, MP-D8-7B. (Fot. de Júlio Bernardo)
110
Portugal – Ministério da Marinha, Estatística das Pescas Marítimas no con-
tinente e ilhas adjacentes no ano de 1914, Comparada com a dos cinco anos
de 1910 a 1914 e coordenada pela Comissão Nacional das Pescarias, Lisboa,
Imprensa Nacional, 1916, 156-157 [Arquivo Histórico da Marinha]. Tudo leva a
crer ser esta embarcação, a referida por C. ESCALLIER (op. cit, 1995, 212) como
tendo sido importada de Vigo, em 1914.
111
Como, por exemplo, o galeão Cerco Portugal 1.º, da firma Júdice Fialho
(Portimão), que iniciou a sua atividade em 1899 (ver nota seguinte).
112
Ana Rita FARIA, A organização contabilística numa empresa da indústria
de Conservas de Peixe entre o final do Século XIX e a primeira metade do
Século XX. O Caso Júdice Fialho, Dissertação de Mestrado em Ciências
Económicas e Empresariais, Faro, Universidade do Algarve, janeiro de 2001.
58
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
Fig. 39 - Planta do galeão a vapor Cerco Portugal 9 (1927), da firma Júdice Fialho
(Portimão), Museu de Portimão, AD1(MP-AD1-16). (Litografia de Humberto Martins)
Fig. 40 - Pormenor do
motor a vapor do
galeão Cerco Portugal
6 (1920), da firma
Júdice Fialho
(Portimão), Museu de
Portimão, MP-AD7-
419. (Fot. de José
Manuel de
Mascarenhas, 2022)
113
Podem-se considerar duas gerações de motores a vapor (antes da expansão
da turbina): motores a vapor da 1.ª geração: motores a vapor simples (um único
cilindro/pistão) e compostos (2 cilindros/pistões); motores a vapor da 2.ª gera-
ção: motores a vapor de expansão tripla (3 cilindros/pistões) e motores a vapor
de expansão quádrupla (4 cilindros/pistões).
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José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
A Traineira
Se bem que o termo traineira, signifique um “barco a vapor para a
pesca do arrasto”115, pode definir-se, mais especificamente, como uma
embarcação vocacionada para a pesca de cerco, através do uso de
trainas (redes de cerco destinadas, sobretudo, à pesca da sardinha)116.
A traina (ou traineira) é uma variedade de cerco americano que, em
comparação com a rede do galeão, apresenta a particularidade de
“franzir pela tralha inferior, no momento de copejar”117. A traineira,
utiliza assim o mesmo tipo de engenho de captura, mas com dimensões
intermédias, entre a rede candil e a rede galeão, explorando fundos já
fora da enseada e havendo permitido retomar a pesca costeira à sardi-
nha, que havia sido abandonada pelos galeões 118.
A traineira foi introduzida em Portugal (Peniche) há cerca de um
século (1913), tendo sido o primeiro exemplar adquirido em Vigo119.
Octávio L. Filgueiras refere, todavia, que a mais antiga traineira a va-
por, de matrícula nacional, de que existe documentação no Museu da
Marinha, em Lisboa, foi a S.S. Germano 3.º, cujos planos datam de
27/02/1912120. Por outro lado, há notícia de que primeira traineira
114
J. MATIAS, op. cit., 2014.
115
A. de MORAIS e SILVA, Novo Dicionário Compacto da Língua Portuguesa,
Mem Martins, Ed. Confluência, 4.ª edição, 1988, 333.
116
PORTO EDITORA – traina no Dicionário Infopédia da Língua Portuguesa
[em linha]. Porto: Porto Editora. [consulta em 2022-05-26 14:07:24]. Disponível
em https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/traina.
117
F. G. PEDROSA, A evolução das artes de pesca em Portugal, Anais do Clube
Militar Naval, vol. CXV, abr.-jun. 1985, 308,309.
118
C. ESCALLIER, op. cit., 1995, 204.
119
MESTRE DO MAR, 2021.
https://mestredomar.com/almanaque-do-oceano/almanaque-traineiras/ [consul-
tado em 26 de maio de 2022]
120
O.L. FILGUEIRAS, Traineiras da Costa Portuguesa, Lisboa, CTT Correios
60
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
61
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
Fig. 41 - Traineira propulsionada com motor a combustão (anos 40?). Postal (sem identificação de
autor e de editor)12.
Fig. 42 - Maqueta de traineira à vela (e a remos), de Peniche, Museu da Marinha, MO-I-25 (Fot. de
José Manuel de Mascarenhas, 2022).
62
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
63
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
130
C. ESCALLIER, op. cit., 1995, 116-118.
131
Portugal – Ministério da Marinha, op. cit., 1916, 156-157 [Arquivo Histórico
da Marinha]. Havendo C. ESCALLIER (op. cit., 1995, 206) referido que data de
1922, o primeiro registo de uma unidade a vapor (vapor traineira N-873-A,
denominada Sisal V), se bem que destinada à pesca com a palangre, os autores
consideram que tal introdução se deu em 1914, em S. Martinho, com base na
referência indicada (AHM). Pensa-se, por outro lado, que as embarcações mo-
torizadas referidas para o período 1926-1930, no QUADRO 4, poderão
corresponder, ou a traineiras (destinadas à arte da traina), como sucedeu em
1930, na Nazaré, ou a batéis motorizados para a pesca no mar alto, como poderá
ter ali acontecido, pelo menos em 1920, 1926 e 1927, já que nestas datas não
existiram aparelhos de arte de traina em funcionamento naquela zona (Portugal
– Ministério da Marinha, Estatística das Pescas Marítimas no continente e
ilhas adjacentes no ano de 1920, Comparada com a dos cinco anos de 1916 a
1920 e coordenada pela Comissão Central das Pescarias, Lisboa, Imprensa
Nacional, 1922, 114-115 [Arquivo Histórico da Marinha]. Idem, no ano de 1930,
comparada com a dos quatro anos de 1926 a 1929. Lisboa, Imprensa Nacional,
1931, 242. [Arquivo Histórico da Marinha]).
132
Idem, 1922, 114, 115, 163 [Arquivo Histórico da Marinha].
133
C. ESCALLIER, op. cit., 1995, 206.
134
C. ESCALLIER, op. cit., 1995, 116-118.
135
Ibidem.
64
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
Barca de Armação
Embarcação de boca aberta, de quilha e coberta, destinada ao
serviço das Armações Valencianas, sistema complexo de captura de
pescado, nomeadamente da sardinha, que exigia pelo menos quatro
embarcações no mar, estrategicamente colocadas. A armação perma-
necia no mar o Verão todo, até setembro. Também teria sido utilizada
na pesca do “cerco americano” (galeão).
Apresentava proa e popa arredondadas, quase idênticas, sendo,
uma e outra, cobertas por uma tilha. O seu comprimento variava, em
geral, entre os 9,5 e os 11 m, sendo a largura do casco da ordem dos
3,5 m. Ao longo do costado, dois verdugos separados entre si, e à
proa e à ré duas malaguetas de cada lado e dois cunhos, um paneiro à
vante e outro à popa. Possuía 4 bancos e navegava a remos (3 de
cada lado, ou, nas barcas de maiores dimensões, 4 de cada lado e um
colocado na popa, próximo do leme136), (Figs. 43 a 49).
Fig. 43 - Batel da armação, à vela, Museu Dr. Joaquim Manso, Nazaré. (Fot. de Álvaro Laborinho)
136
C. ESCALLIER, op. cit., 1995, 105.
65
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
Fig. 45 - Batel de armação, à vela, a ir para a faina. Museu Dr. Joaquim Manso, Nazaré.
(Fot. de Álvaro Laborinho)
Fig. 46 - Batel
"Mimosa", construída
em 1910, e que
pertencia à armação
denominada "Juncal";
faz atualmente parte
do espólio do Museu
Dr. Joaquim Manso,
Nazaré. (Fot. de José
Manuel de
Mascarenhas, 2022)
66
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
Fig. 47 - Batel
"Maria Eulália"
preparando-se
para zarpar.
Postal "170-
NAZARÉ
(Portugal),
Barco". (Sem
identificação
de autor e de
editor)
Fig. 48 - Batel
"Maria Eulália", com
8,6 ton de
arqueação,
construída em 1967
e, atualmente,
parte do espólio do
Museu da Marinha.
(Fot. de José
Manuel de
Mascarenhas,
2022)
137
Parte de uma armação.
138
C. ESCALLIER, op. cit.,1995, 107.
67
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
Fig. 49 - Netas e barcas auxiliares das armações, dos cercos americanos ou de vários tipos de
transporte, varadas em terra. Postal "Praia da Nazareth, 7, Barcos". (Fot. de L. Souza; Pap. e Typ.
de Paulo Guedes)13
68
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
139
Inclinação de 47 graus relativamente ao fundo (C. C. ESCALLIER, op. cit.,1995,
100).
140
O. L. FILGUEIRAS, op. cit., 1981b, 12.
141
Este barco, em virtude do seu perfil, também é vulgarmente conhecido por
“meia-lua”.
142
O. L. FILGUEIRAS, op. cit., 1981b, 13.
143
C. ESCALLIER, op. cit.,1995, 100.
69
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
Fig. 51 - Barco de bico (ou neta, ou barco de arte xávega) que se destinava à pesca local com
rede xávega. A proa alta, em bico, facilitava a entrada na ondulação. Museu Dr. Joaquim Manso,
Nazaré. (Fot. de Álvaro Laborinho)
Fig. 52 - Barco de bico "Perdido", construído em 1949, por Porfírio do Carmo Oliveira. Faz atualmente
parte do espólio do Museu Dr. Joaquim Manso, da Nazaré. (Fot. de Caroline de Mascarenhas, 2018)
144
O. L. FILGUEIRAS, Barcos de Pesca de Portugal, Centro de Estudos de Carto-
grafia Antiga, Coimbra, Junta de Investigações Científicas do Ultramar, 1981a, 363.
145
C. ESCALLIER, op. cit.,1995, 105. Segundo esta autora, a capacidade da
embarcação ia de 2 a 9 homens.
70
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
Fig. 53 - Barco a encalhar. Museu Dr. Joaquim Manso, Nazaré. (Fot. de Álvaro Laborinho)
Fig. 54 - Preparando a pesca com rede xávega. Postal "NAZARETH - Coração de Portugal -
Aprestando para a pesca da sardinha"14. (Fot. NIONE)
71
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
Barco do Candil
Esta embarcação destinava-se à pesca do candil, arte de pesca
marítima, com rede de cerco (rede envolvente), utilizando uma fonte
luminosa, para atrair o peixe para a rede. Praticava-se à noite nas
baías da Nazaré146 e de S. Martinho e destinava-se à captura de pe-
quenos pelágicos (sardinha, carapau, biqueirão e cavala, sobretudo).
De construção idêntica e com características técnicas próximas do barco
de bico, distinguia-se deste, principalmente, por uma roda de proa
mais curta e menos saliente (cortada) (Fig. 55). Dispunha de um paneiro
à proa e à ré e de quatro enxamas (duas de cada lado) corresponden-
tes a igual número de remos. Apresentava, além do banco da ré, dois
bancos com as respetivas anteparas. A sua tonelagem ia de 1,5 a 3,5
ton147; as suas dimensões da ordem dos 5,7 m (comprimento) e 2,2 m
(boca)148, podendo navegar com equipagens reduzidas, indo de dois a
cinco homens149.
Como barco auxiliar, utilizava em geral uma lancha que possuía
na ré uma cruzeta que suportava archotes (fogachos), mais tarde subs-
tituídos por fontes mais eficazes (dispositivos a petróleo, e posterior-
mente a gás) com vista a iluminarem o espaço onde o pescador traba-
lhava, atraindo o peixe à superfície (Fig. 56). O barco do candil come-
çou a marcar presença nos anos vinte, se bem que o seu crescimento
se tenha apenas dado a partir de meados dos anos trinta.
146
A pesca do candil executava-se a partir dos 20 metros de profundidade, na
enseada desde a Pedra do Guilhim, ao longo da praia até à zona do atual Porto de
Abrigo, podendo esporadicamente ter-se realizado fora da enseada, nas zonas a
norte e a sul da Nazaré.
147
C. ESCALLIER, op. cit.,1995, 116.
148
O. L. FILGUEIRAS, Barcos de Pesca de Portugal, Centro de Estudos de
Cartografia Antiga, Coimbra, Junta de Investigações Científicas do Ultramar,
1981a, 363.
149
C. ESCALLIER, op. cit.,1995, 116.
72
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
Fig. 55 - Candil "Vagos", barco construído em 1956 para a pesca do candil, com rede de cerco.
Faz atualmente parte do espólio do Museu Dr. Joaquim Manso, da Nazaré.
(Fot. de José Manuel de Mascarenhas, 2022)
Fig. 56 - Lancha "Ilda", auxiliar do candil "Vagos", construída em 1948. Faz atualmente parte do
espólio do Museu Dr. Joaquim Manso, da Nazaré. (Fot. de José Manuel de Mascarenhas, 2022)
73
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
Lanchas
Estas embarcações, a que já se fez anteriormente referência, como
barcas auxiliares, apresentavam uma forma alongada e o fundo chato,
de proa saliente sem bico e popa de painel, eram propulsionadas por
um ou dois pares de remos, havendo sido tradicionalmente utilizadas
como lanchas-vigias dos grandes arrastões, ou como auxiliares por-
ta-fogachos, como atrás referido150. Podiam ainda ser usadas, local-
mente, para a pesca com aparelhos de anzol ou com redes.
Pesca nos rios Alcoa (Fig. 15), Alfeizerão e Tornada (Fig. 16) e nas
áreas lagunares residuais, resultantes do assoreamento progressivo dos
antigos “mares” interiores da Pederneira e de Alfeizerão (Fig. 17).
Masseira
Este tipo de barco, propulsionado em geral por uma vara, era
usado na pesca à tarrafa, no Alcoa e nas lagoas residuais adjacentes a
este rio. Integra-se, na opinião de Octávio Lixa Filgueiras, nas “canoas
de tábuas” de tipo mesopotâmico, nele se observando uma identidade
estrutural dos seus extremos (iguais) com a popa do barco nazareno
(neta e candil) e da xavasca de S. Martinho151.
151
O. L. FILGUEIRAS, Os barcos da Nazaré no panorama da nossa Arqueolo-
gia Naval. Lisboa, Centro de Estudos da Marinha, 1981b ,17. Este investigador
apresenta, nesta obra, duas fotografias da masseira. Na sua opinião existem
analogias estruturais entre este barco e o “shartoush” do Eufrates.
74
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
Fig. 57 - Barca chata do Alcoa. Maqueta do Museu da Marinha, MM.05404. (Fot. de José Manuel
de Mascarenhas, 2022)
153
O. L. FILGUEIRAS, Barcos de Pesca de Portugal, Centro de Estudos de
Cartografia Antiga, Coimbra, Junta de Investigações Científicas do Ultramar,
1981a, 363.
75
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
Fig. 58 - Barca chata do Alcoa, como se pode observar no Centro de Interpretação do Museu do
Peixe Seco, da Nazaré. (Fot. de José Manuel de Mascarenhas, 2022)
Fig. 59 - Barcas chatas do Alcoa, durante uma pescaria às enguias. Museu Dr. Joaquim Manso,
Nazaré. (Fot. de Álvaro Laborinho)
76
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
154
O. L. FILGUEIRAS, Os barcos da Nazaré no panorama da nossa Arqueolo-
gia Naval, Lisboa, Centro de Estudos da Marinha, 1981b, 24, fig. 31, fig. 32.
155
O. L. FILGUEIRAS, op. cit., 1981a, 363.
156
Frei Manoel de FIGUEIREDO cit. por M.V. NATIVIDADE, op. cit., 1960, 122.
157
Fonte: Confraria da Misericórdia da Pederneira, cit. por Christine
ESCALLIER, op. cit., 1995, Tableau 6A, 69.
158
A.A. Baldaque da SILVA, op. cit., 1892, 125.
159
Idem, 126.
77
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
160
Nas Estatísticas citadas na nota anterior não constam, nos mapas da Nazaré,
dados relativos às águas salobras. Por outro lado, os dados referentes a S.
Martinho, entre 1920 e 1930, passaram a estar contabilizados juntamente com
os da Lagoa de Óbidos, o que inviabilizou a extensão deste quadro a anos
posteriores.
161
José Manuel de MASCARENHAS, “Os campos dos coutos de Alcobaça:
ordenamento hidráulico e valorização do território”, in A. V. MADURO, & R.
RASQUILHO. (coords.), Um Mosteiro entre os Rios. O território alcobacense,
Alcobaça, Hora de Ler, 2021, 483-539. Ver sobretudo p. 486, 487 e Fig. 17.
78
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
162
Fernando Gomes PEDROSA, “A evolução das artes de pesca em Portugal”, in
Anais do Clube Militar Naval, vol. CXV, abr.-jun. 1985, 287-319.
163
F. G. PEDROSA, op. cit., 1985, 313.
164
J. de Almeida SALAZAR, Memorias manuscriptas da Real Casa da Nazareth,
tomo 2.º, pag. 536, cit. por M.V. NATIVIDADE, op. cit., 1960, 122.
79
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
165
Frei Manoel de FIGUEIREDO, Mapa do Estado Da Marinha de Pesca na
Praia da Nazaré em 1780, cit. por M.V. NATIVIDADE, op. cit., 1960, 122.
166
Rede envolvente-arrastante de alar para a praia com aparelho de um saco e
asas, mas em que, o saco é extremamente pequeno em relação às mangas laterais
(Diana SILVA, Comunidade Piscatória de Vila Chã (Vila do Conde), Porto,
Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2014,90). Estas redes eram usa-
das em águas interiores não oceânicas, segundo Rogélia MARTINS e Miguel
CARNEIRO, Artes de pesca artesanais em Portugal, Lisboa, Instituto Portugu-
ês do Mar e da Atmosfera (IPMA), 2021, 115.
https://www.ipma.pt/pt/media/noticias/documentos/2021/Artes_
Pesca_artesanais.pdf [consultado em 01/06/2022].
167
Frei. Manoel de FIGUEIREDO, cit. por M.V. NATIVIDADE, op. cit., 1960, 122-123.
168
Portugal – Ministério da Marinha, Estatística das Pescas Marítimas no Conti-
nente do Reino e Ilhas Adjacentes no ano de 1900, comparada com a de 1896,
1897, 1898 e 1899, Coordenada pela Commissão Central das Pescarias, Lis-
boa, Imprensa Nacional, 1902, Mappa 15, 38 [Arquivo Histórico da Marinha].
169
Mapa do Pessoal e Aparelhos de Pesca Empregados na Praia da Nazaré, de
Adolpho Loureiro, cit. por M.V. NATIVIDADE, op. cit., 1960, 123.
170
A. A. Baldaque da SILVA, op. cit., 1892, 125.
80
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
171
Mapa do Pessoal e Aparelhos de Pesca Empregados na Praia da Nazaré,
de Adolpho Loureiro, cit. por M.V. NATIVIDADE, op. cit., 1960, 123.
172
A. A. Baldaque da SILVA, op. cit., 1892, 126.
173
Fernando Rui REBORDÃO, Classificação de Artes e Métodos de Pesca,
Lisboa, Publicações Avulsas do IPIMAR, 4, 2000, 28.
81
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
174
A. A. Baldaque da SILVA, op. cit., 1892, 214.
175
Idem, 225.
176
Idem, 232.
82
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
Fig. 61 - Encoadura de
uma armação de sardinha
redonda, segundo A. A.
Baldaque da Silva, 1892,
232v. (Autores: J.
Almeida e D. Netto)
83
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
178
Adelina Gomes DOMINGUES, “As artes de pesca em Sesimbra”, in Musa, 3,
2010, 229-236, 233.
179
Ibidem.
180
A. A. Baldaque da SILVA, op. cit., 1892, 235.
181
José MATIAS, Nazaré – Cronologia dos Factos Mais Importantes (Publica-
do em abril, 1, 2014; consultado em 23 de Maio de 2022).
https://www.josematias.pt/eletr/biografia_de_ze_da_palacida2/
84
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
Fig. 62 - Armações de sardinha à valenciana – “Uma armação de pesca d’este genero compõe- se
das seguintes partes principaes: Q- copo, bd- bucho, k- rabo e hh- boca” ( SILVA, 1892, 225).
85
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
183
F. R. REBORDÃO, op. cit., 2000, 36.
184
Diana I. R. SILVA, Comunidade Piscatória de Vila Chã (Vila do Conde),
Porto, Faculdade de Letras da UP, 2014, 91.
185
F. G. PEDROSA, op. cit., 1985, 308.
186
A. A. Baldaque da SILVA, op. cit., 1892, 235.
187
Ibidem.
188
F. G. PEDROSA, op. cit., 1985, 308.
189
Ibidem.
86
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
Fig. 63 - Maqueta de galeão a vapor e de cerco americano. Museu Marítimo "Almirante Ramalho
Ortigão", MMARO.00027, Faro. (Fot. de José Manuel de Mascarenhas, 2022)
190
F. R. REBORDÃO, op. cit., 2000, 37.
191
J. BARBOSA, op. cit., 1993.
87
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
192
Ibidem.
193
J. MATIAS, op. cit., 2014. Segundo este autor, era um barco pesado, com 15
a 20 metros, companha grande (cerca de 20 homens), com 5 a 6 barcas associa-
das.
194
C. ESCALLIER, op. cit., 1995, Tableau 19, 221.
195
C. ESCALLIER, op. cit., 1995, 204.
196
Na maior parte dos casos, havia três embarcações envolvidas nesta arte: a
traineira, a enviada e o bote.
88
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
197
MESTRE DO MAR, 2021. https://mestredomar.com/almanaque-do-oceano/
almanaque-traineiras/ (consultado em 26 de maio de 2022).
198
C. ESCALLIER, op. cit., 1995, Tableau 19, 221.
199
F.G. PEDROSA, op. cit., 1985, 296,297.
200
Segundo consta nos livros de notariado de Aveiro, em 1751, 1764 e 1765
existiriam já diversas companhas a pescar na costa, como refere Maria João
MARQUES, Arte Xávega em Portugal, Uma arte secular em decadência, Or-
ganização, caracterização e declínio, Porto, Faculdade de Letras da UP, 2011.
201
Idem, 302.
89
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
202
Ibidem.
203
Idem, 303.
204
A. A. Baldaque da SILVA, op. cit., 1892, 245.
205
Rogélia MARTINS e Miguel CARNEIRO, Artes de pesca artesanais em Por-
tugal, Lisboa, Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), 2021, 116.
h t t p s : / / w w w. i p m a . p t / p t / m e d i a / n o t i c i a s / d o c u m e n t o s / 2 0 2 1 /
Artes_Pesca_artesanais.pdf [consulta 01/06/2022].
206
F. R. REBORDÃO, op. cit., 2000, 36.
207
A. A. Baldaque da SILVA, op. cit., 1892, 246.
90
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
Fig. 64 - Arte de xávega, segundo A. A. Baldaque da Silva, 1892, 244v. (Autores: J. Almeida e D. Netto)
208
Maria João MARQUES, Arte Xávega em Portugal, Uma arte secular em
decadência, Organização, caracterização e declínio, Porto, Faculdade de Le-
tras da UP, 2011.
209
J. MATIAS, op. cit., 2014.
210
Classificação a partir dos códigos de matrícula.
211
C. ESCALLIER, op. cit., 1995, Tableau 19, 221.
91
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
Fig. 65 - Rede da arte de xávega: saco e parte das asas. Museu Marítimo "Almirante Ramalho
Ortigão", MMARO.00023, Faro. (Fot. de José Manuel de Mascarenhas, 2022).
212
M. J. MARQUES, op. cit., 2011.
92
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
93
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
214
Iria GONÇALVES, À mesa nas terras de Alcobaça em finais da Idade Média,
DGPC/Mosteiro de Alcobaça, 2017, 258; Iria GONÇALVES e Manuela Santos
SILVA, “São Martinho do Porto e a Lagoa de Alfeizerão na Idade Média”, in A
Baía de S. Martinho do Porto. Aspectos Geográficos e Históricos”, Lisboa
2005, 59.
215
http://digitarq.dgarq.gov.pt/details?id=1459083 (lv. 39 de Sentenças, fl.548).
216
Frei Fortunato de S. BOAVENTURA, 1827, 35; António Valério MADURO, “O
Inquérito Agrícola da Academia Real de Ciências de 1787. O caso da comarca de
Alcobaça”, in Mosteiros Cistercienses. História, Arte, Espiritualidade e Patri-
mónio, Tomo III, 2013, 340.
217
William BECKFORD, Alcobaça e Batalha. Recordações de uma Viagem,
Lisboa, Vega, 1997, 36.
94
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
218
A.N.T.T., Livro das Despesas do Convento de Alcobaça, n.º 7 (1756-1759),
mç. 6, cx.133.
219
António Valério MADURO, Requinte e Paladar. A Gastronomia Monástica
Alcobacense, Porto, CEDTUR/ISMAI, 2019, 37-38.
220
Heinrich LINK, Notas de uma viagem através da França e Espanha, Lisboa,
Biblioteca Nacional, 2005, 119.
95
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
com peixe seco representava cerca de 12% dos gastos com a alimenta-
ção e que, como se pode constatar, os gastos com o peixe seco eram
praticamente equivalentes aos do peixe fresco (vide Quadros 9 e 10).
A supressão da área lagunar remete para a Nazaré o novo porto
de pesca, o que implica maiores riscos, uma transformação das em-
barcações e adaptação das artes. Independentemente destas
especificidades abordadas nos capítulos anteriores, a safra do mar
assentava essencialmente nas seguintes capturas:
“(…) no porto da Nazaré as que aparecem mais são de sardinha,
carapau, pescada, goraz, safio, raia, cação e ruivo, na proporção de ½
de sardinha, ¼ de carapau, e ¼ de outras espécies (…). Em S. Martinho
safio, moreia e lagosta” 221. Por seu turno, Baldaque da Silva refere que
na Nazaré, para além da hegemonia da sardinha, se pesca muitos peixes
de apreço, como “a pescada, pargo, linguado”. Já em S. Martinho, as
capturas incidem, para além da lagosta, nas fanecas e safios à linha e
com boscas e linguados, solhas e enguias com zorra de arrastar222. Ou-
tra fonte refere que, em S. Martinho, para além da pesca dos crustáceos
efetuada com cachoças desde a costa até duas milhas de mar, exerce-se
a pesca à cana de espécies como o sargo, a tainha, o sarrão e o robalo,
e no período de baixa-mar captura-se moluscos, como a lapa, o mexi-
lhão, o caranguejo, o búzio e o polvo com bicheiro e na concha empre-
gam tresmalhos para a pesca da corvina e cação e netas para o linguado,
solha, tainha, robalo, boga, raia, camarão e savelha.223
Sobre o inventário geral do pescado capturado nas águas da
Nazaré refira-se a: “pescada, cherne, corvina, robalo, dourada, pargo,
pargo-morro, bica, badejo, abrótea, ricardo, juliana, cantaril, gorás,
cachucho, cardial, chaputa, sargo, besugo, besugo-trombudo, charroco
ou peixe-galo, ruama, peixão, boga, faneca, chicharro, carapau, bar-
ba-ruiva ou pichelim, sardinha, biqueirão, lavadinha, ruivo, cabrinha,
221
A. S. MACEDO, Estatística do Districto Administrativo de Leiria, Leiria,
1855, 115.
222
A. B. da SILVA, Estado Actual das Pescas em Portugal, Lisboa, Imprensa
Nacional, 1892, 125.
223
Pesca e Serviço Marítimo dos Portos nos anos de 1896 a 1905, Lisboa,
Imprensa Nacional, 1907, p.657.
96
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
224
“Nazaré”, in Grande Enciclopédia Portuguesa Brasileira, vol.18, sd, 510.
Augusto Soares Barbosa de Pinho LEAL, Portugal Antigo e Moderno, vol.VI,
225
97
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
5. Os sistemas tradicionais
de conservação do pescado
Para conservar o peixe e assim dilatar o seu período de consumo
recorre-se à “seca, salga, salmoira e escabeche”, no entanto, os pro-
dutos da salga lideravam os consumos226. Os frutos do mar mais re-
quisitados para estas artes eram a sardinha, o cação, a raia, o carapau,
a cavala, o polvo, entre outras espécies, que integravam na dieta ali-
mentar os comeres próprios das classes populares, mas também a
pescada, peixe que se destacava na ementa dos religiosos a fim de
satisfazer os extensos e exigentes períodos de abstinência e que tam-
bém era sujeita à conservação pela seca (vide Quadro 10).
Segundo Iria Gonçalves, desde o século XIII, os salgados de
Alfeizerão abasteciam o porto de pesca da Pederneira, estimando-se
em oito a nove moios a quantidade de sal necessária para a preserva-
ção do pescado227. Adianta ainda a autora que para conservar um
milheiro de sardinha utilizava-se pelo menos um alqueire de sal228. Num
período cronológico bem mais próximo, nomeadamente no mês de
abril de 1749 regista-se uma despesa de 20.800 réis em oito moios de
sal e sua condução da caravela para a cabana da Pederneira229.
Constantino Lacerda Lobo dedica à arte da conserva de peixe em
Portugal uma memória descritiva em que explana o carácter rudimen-
226
Vicente Almeida D’EÇA, “As Pescas em Portugal. As salinas”, in Exposição
Nacional do Rio de Janeiro em 1908. Secção portuguesa. Notas sobre Portu-
gal, Lisboa, 1908, 280.
227
I. GONÇALVES, O Património do Mosteiro de Alcobaça nos Séculos XIV e
XV, Lisboa 1989, 275.
228
I. GONÇALVES, À mesa nas terras de Alcobaça em finais da Idade Média,
DGPC/Mosteiro de Alcobaça, 2017, 271.
229
A.N.T.T., Livro de Despesas do Convento de Alcobaça, n.º 5 (1747-1750), mç
5, cx.132.
98
Barcos e artes de pesca nas costas da Nazaré e de S. Martinho, entre o século XVIII e 1930
tar dos métodos utilizados. Refere o autor que a salgação se faz quer
em tinas (pios) alternando o peixe, nomeadamente a sardinha, com
camadas de sal, ou que apenas o peixe é amontoado e salgado. A
pescada podia também ser colocada em pilhas salgada ou beneficiar
de uma salmoira230.
A importância do sal para a conservação do pescado leva à ne-
cessidade de explorar novas salinas na abertura do século XX. É o
caso da firma “Lopes & Companhia” que se constitui a 6 de abril de
1903, com sede na Pederneira e o capital social de 600.000 réis231.
Esta sociedade vai estabelecer as salinas na Aljufreira (Alfeizerão).
Mas a sociedade, embora concebida para durar 30 anos, acabou por
ter uma vida curta, sendo extinta a 23 de maio de 1911232.
A seca constituía outro importante recurso para a conservação. O
peixe era previamente amanhado, escalado e colocado em salmoira.
O tempo de preparação da moira variava, nomeadamente, entre 10 a
15 minutos para o peixe seco e 5 a 10 para o carapau enjoado. De
seguida, o peixe era levado para a seca sendo depositado no areal
sobre uma cama de junco. Para o peixe seco estimava-se 2 a 3 dias de
benefício solar, enquanto para o carapau enjoado (mais verde) basta-
vam 3 a 4 horas.”233
O peixe fumado, não seria tão expressivo, mas Iria Gonçalves
refere o caso particular das «sardinhas arencadas” de Alfeizerão»234.
Sabemos que a abadia de Alcobaça também adquiria arenques para
230
Constantino Lacerda LOBO, Memória sobre a preparação do peixe salga-
do, e seco das nossas pescarias, in Memória Económica da Academia Real das
Ciências de Lisboa (1789-1815), Tomo IV, Banco de Portugal, 198-201.
231
A.D.L., C.N.N., 1.º of., lv.143 ou 25, fls.4-7, 6 de abril de 1903. Da sociedade
faziam parte Rodrigo Lopes Gomes, proprietário das Quinta de S. Gião e Pesca-
rias que cedia o terreno e os Padres João Lopes Gomes, de Leiria, e António
Maciel Rodrigues Lima, de Forjães-Esposende, que exercia funções de pároco e
coadjutor da Pederneira. A administração da sociedade competia ao Padre Lima
e ao Padre Gomes a caixa da sociedade.
232
A.D.L., C.N.N., 1.º of., lv.207, fls.7-9, 23 maio de 1911.
233
Ana HILÁRIO; Carlos FIDALGO, Seca do Peixe: Uma Arte, Câmara Munici-
pal da Nazaré, 73.
234
I. GONÇALVES, À Mesa nas terras de Alcobaça em finais da Idade Média,
2017, 276.
99
José Manuel de Mascarenhas | António Valério Maduro
Figs. 66 e 67 - Estindarte de peixe no areal. O peixe era preservado pela salga e seca.
(Fot. de Álvaro Laborinho)
235
A. V. MADURO, Requinte e Paladar, 2019, 39.
100