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Tijucas
2009
LOMBARDO FUCHS DOS SANTOS
Tijucas
2009
LOMBARDO FUCHS DOS SANTOS
Esta Monografia foi julgada adequada para obtenção do título de Bacharel em Direito e
aprovada pelo Curso de Direito do Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus Tijucas.
Bertold Brecht
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte
ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí –
UNIVALI, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca
do mesmo.
The present monograph is about the study of civil responsibility resulting from the medical
mistake, occasionally or by agreement. The main goal is to investigate the civil responsibility
of the health area professionals, particularity the doctors, about the promised expectations, but
not attended, after the execution of medical procedures agreed. The main specific goals are: to
analyze the civil responsibility of the doctors in the Brazilian judicial order environment; to
determinate the damage that can be observed resulting from prejudicial behavior to patient; at
the end, to verify which resulting consequences of each civil responsibility allowed in
national law. The monograph development started from the following questions: a) It is
possible to elect the doctor by the promise of a treatment/benefit that, after your intervention,
could not be checked ?; b) there are differences around the civil responsibility types used in
the Brazilian judicial environment about civil responsibility of the doctors in the situation
showed above ?; It was established the following possibilities: a) the Brazilian judicial
environment grants the possibility of civil responsibilization the doctor who promised to the
patient a result, but, after your intervention, don‟t reach the promised goal; and b) there are
judicial differences between occasionally responsibility and agreed responsibility, disposed in
the Brazilian law, which reflects in the doctors´ civil responsibility. To this research
development used logical induction, and resulting in these following results….
Culpa
Dano
[...] a diminuição ou subtração de um „bem jurídico‟, para abranger não só patrimônio, mas a
honra, a saúde, a vida, suscetíveis de proteção4.
Dano Emergente
[...] é o efetivo prejuízo, a diminuição patrimonial sofrida pela vítima. (...). Representa, pois, a
diferença entre o patrimônio que a vítima tinha antes do ato ilícito e ou passou a ter depois.
Lucro cessante é a frustração da expectativa de lucro. É a perda de um ganho esperado5.
Dano Moral
[...] considera-se dano à pessoa toda ofensa dirigida contra sua integridade física ou
incolumidade moral, a acarretar-lhe conseqüências desfavoráveis como entidade somática e
psíquica6.
1
Denomina-se “categoria” a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia. Cf.
PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito. 8. ed.
Florianópolis: OAB Editora, 2003, p. 31.
2
Denomina-se “Conceito Operacional” a definição ou sentindo estabelecido para uma palavra ou expressão, com
o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias expostas ao longo do trabalho. Cf. PASOLD,
Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito, p. 43.
3
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, p. 21.
4
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, p. 529.
5
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, p. 629.
6
MONTENEGRO, Antonio Lindbergh C. Ressarcimento de danos pessoais e materiais, p. 55.
Dano Material
Lex Aquilia
É na Lei Aquilia que se esboça, afinal, um princípio geral regulador da reparação do dano.
Embora se reconheça que não continha ainda “uma regra de conjunto, nos moldes do direito
moderno”, era, sem nenhuma dúvida, o germe da jurisprudência clássica com relação à injúria
e, “fonte direta da moderna concepção da culpa aquiliana, que tomo da Lei Aquilia o seu
nome característico”.8
Responsabilidade
[...] é aquela que deriva de contrato [...] a culpa surge de forma definida, mais clara, porque
existe uma descrição de obrigação pré-existente no negócio jurídico, que foi descumprido9.
7
MARMITT, Arnaldo. Perdas e danos. Rio de Janeiro: Aide, 1987, p. 14.
8
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil: de acordo com o novo código Civil (Lei n. 10.406. de
10-1-2002). São Paulo: Saraiva 2003, p. 5.
9
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil, p. 25-26.
10
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: responsabilidade civil. v.6. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
2002, p. 11.
Responsabilidade Civil Objetiva
[...] a responsabilidade quando se esteia na idéia de culpa. A prova da culpa do agente passa a
ser pressuposto do dano indenizável.12
11
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 15.
12
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, p. 21.
SUMÁRIO
RESUMO................................................................................................................................... 5
ABSTRACT .............................................................................................................................. 6
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ............................................................................. 7
LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS .............................. 8
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 12
2 RESPONSABILIDADE CIVIL ......................................................................................... 15
2.1 DESLOCAMENTOS HISTÓRICOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL ...................... 16
2.2 RESPONSABILIDADE CIVIL ......................................................................................... 20
2.3 RESPONSABILIDADE CIVIL E PENAL ........................................................................ 24
2.4 RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA E SUBJETIVA ........................................... 26
2.4.1 RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL ............. 29
2.5 RESPONSABILIDADE CIVIL À LUZ DA CONSTITUIÇÃO, DO NOVO CÓDIGO
CIVIL E DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR .................................................... 32
3 DANOS ................................................................................................................................. 42
3.1 CONCEITUAÇÃO E CARACTERÍSTICAS DO DANO ................................................ 42
3.2 DANOS MATERIAIS........................................................................................................ 45
3.3 DANOS PESSOAIS ........................................................................................................... 48
3.4 DANOS MORAIS .............................................................................................................. 50
3.5 DANOS ESTÉTICOS ........................................................................................................ 55
4 RESPONSABILIDADE MÉDICA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR 59
4.1 A RELAÇÃO DO CONSUMO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS ............. 59
4.1.1 O SERVIÇO .................................................................................................................... 60
4.1.2 O CONSUMIDOR .......................................................................................................... 61
4.1.3 O FORNECEDOR ........................................................................................................... 61
4.2 A RESPONSABILIDADE MÉDICA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR 65
4.2.1 A RESPONSABILIDADE PESSOAL DO MÉDICO .................................................... 66
4.2.2 A RESPONSABILIDADE DOS ESTABELECIMENTOS DE SAÚDE ....................... 68
4.2.3 EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE .............................................................. 72
4.3 A PROVA NO ERRO MÉDICO ....................................................................................... 73
4.4 A INDENIZAÇÃO E OS DANOS INDENIZÁVEIS NO ERRO MÉDICO .................... 73
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 77
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 80
1 INTRODUÇÃO
A importância deste tema reside no incremento das relações entre médico e paciente,
com as consequentes responsabilidades decorrentes das contratações de serviços deste
profissional, com suas repercussões no âmbito das expectativas dos pacientes.
13
Nesta Introdução cumpre-se o previsto em PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e
ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 170-181.
13
na base lógica dedutiva14, já que se parte de uma formulação geral do problema, buscando-se
posições científicas que os sustentem ou neguem, para que, ao final, seja apontada a
prevalência, ou não, das hipóteses elencadas.
Com este itinerário, espera-se alcançar o intuito que ensejou a preferência por este
estudo: o aprimoramento das relações médico/paciente, com um aporte de conhecimento mais
amplo ao paciente, parte hipossuficiente nas intervenções médicas contemporâneas.
14
Sobre os “Métodos” e “Técnicas” nas diversas fases da pesquisa científica, vide PASOLD, Cesar Luiz.
Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 99-125.
15
Quanto às “Técnicas” mencionadas, vide PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e
ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 61-71, 31- 41, 45- 58, e 99-125, nesta ordem.
2 RESPONSABILIDADE CIVIL
À frente, fala-se dos danos pessoais, com aporte constitucional conquanto se buscou
conservar o corpo humano de qualquer violência e degradação. Os danos morais são
examinados, constituindo tema de especial relevância e complexa caracterização, eis que
atingem também o patrimônio do ofendido, só tem um patrimônio especial, “imaterial”,
representado pelos bens e valores íntimos mais caros ao ser humano.
Nos primórdios da humanidade, o fator culpa não era cogitado, sendo que o dano
provocava uma reação imediata do ofendido, sem regras ou limitações, dominando a chamada
vingança privada, onde o direito ainda era inexistente.
Nesta fase o mal era reparado através de outro mal. Mas é na Pena de Talião que a
responsabilidade civil tem firmadas suas mais consistentes raízes, na medida em que ali se
constou a fixação de determinado valor como forma de pena a ser prestada pelo ofensor a
vitima. Este mérito foi alçado pela Lei das XII Tábuas.
Bem a esse modo, é lícito dizer que a responsabilidade civil desenvolveu-se conjunta e
paulatinamente à transferência da vindica pessoal – a justiça pelas próprias mãos – para o
monopólio da justiça pelo Estado. Assim, a possibilidade de promover-se uma ação buscando
ressarcimento, escudada na responsabilidade civil, nasceu no instante em que o Estado avocou
para si a repressão dos ilícitos e a tarefa de promover a justiça.
16
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: responsabilidade
civil. v. 3 São Paulo: Saraiva, 2003, p. 10.
17
17
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil: de acordo com o Novo Código Civil (Lei n. 10.406.
de 10-1-2002). São Paulo: Saraiva. 2003, p. 5.
18
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 6.
19
DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 37.
18
O Brasil não ficou alheio às influências napoleônicas, tanto que as premissas francesas
nortearam a criação dos Códigos Civis de 1916 e de 2002, mormente embasadas na culpa
como razão para forçar a reparação do dano. Antes, porém, o Código Criminal de 1830
determinava que o delinquente devesse realizar a satisfação do dano causado à vítima (arts. 21
e 22), e esta satisfação deveria ocorrer da forma mais completa possível.
Enfim, a separação da responsabilidade civil sempre ligada à penal, imposta, pois, pelo
Código Criminal, consolidou a noção de que a satisfação do dano causado pelo ilícito haveria
de estar enquadrada na legislação civil. Aí, portanto, a inescusável influência dos postulados
do Direito Francês para a construção das bases da responsabilidade civil no Direito Brasileiro.
20
VALLER, Wladimir. Responsabilidade Civil e Criminal nos Acidentes Automobilísticos. 4. ed. Tomo I.
Campinas: Julex, 1993, p. 12.
21
DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil, p. 23.
19
correspondentes, respectivamente, aos arts. 186 e 942 do novo diploma, alude à faute como
fundamento do dever de reparar o dano”22.
O ato ilícito, à luz da redação dada pelo art. 186 do novel diploma civil é complexo,
pelo que se faz oportuno trazer a lição de João Casillo, que demonstra com propriedade os
novos contornos da responsabilidade civil firmados no ordenamento jurídico brasileiro,
conforme:
Com arrimo na idéia de que o ato ilícito gera o dever reparatório, disciplinou também
o Código Civil vigente que, igualmente comete ato ilícito aquele que, exercendo um direito,
comete excesso26, assim considerado quando desdobra dos limites impostos pelo fim
econômico ou social daquele direito, ou mesmo, quanto invade perniciosamente e abala a
seara da boa-fé e dos bons costumes. Segundo o enunciado 37, aprovado na Jornada de
Direito Civil da CEJ da CJF, a “responsabilidade civil decorrente do abuso do direito
independe de culpa, e fundamenta-se somente no critério objetivo-finalístico”.
22
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 9.
23
“Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar
prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. A verificação da culpa e a avaliação da responsabilidade
regulam-se pelo disposto neste Código, artigos 1518 a 1532 e 1537 a 1553”.
24
“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar
dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
25
CASILLO, João. Dano à pessoa e sua indenização. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 53.
26
“Art. 186. também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestante os limites
impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.
20
Como já foi abordado anteriormente, na era romana não existia distinção entre
responsabilidade civil e penal, sendo a compensação pecuniária uma pena imposta ao
causador do dano. Somente a partir da Lex Aquilia começou a haver uma leve distinção.
Ainda que a responsabilidade continuasse a ter conotação penal, a indenização pecuniária
tornou-se a forma de punição quando o ato cometido e que causado dano a outrem não era
classificado como crime.
Giorgio Giorgi apud Caio Mario da Silva Pereira conceitua a responsabilidade civil
como “a obrigação de reparar mediante indenização quase sempre pecuniária, o dano que o
21
nosso fato ilícito causou a outrem”27. O que traz a idéia mais aproximada de responsabilidade
civil é a obrigação, o que denota que tudo aquilo que se relaciona à responsabilidade ou outros
vocábulos cognatos, exprimem a idéia de equivalência de contraprestação.
Saliente-se que, o que importa é quando o agente viola uma norma ou obrigação da
qual “se vê exposto às conseqüências desagradáveis decorrentes dessa violação, traduzidas em
medidas que a autoridade encarregada de velar pela observação de preceito lhe imponha,
providências essas que podem ou não estar previstas”28.
Entretanto, mister tratar o fator gerador da responsabilidade civil, qual seja o ilícito, a
fim de estabelecer a origem da obrigação de indenizar o dano praticado pelo agente à sua
27
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 4.
28
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 91.
29
STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial: doutrina e jurisprudência. 2. ed.
São Paulo: Revista dos tribunais, 1995, p. 325.
30
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil: responsabilidade civil e sua interpretação doutrinária e
jurisprudencial. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 93.
22
vitima. Rui Stoco31, reportando-se aos ensinamentos de Carlos Alberto Bittar, cita em nota
que:
A responsabilidade civil constitui, destarte, a obrigação pela qual o agente fica adstrito
a reparar o dano causado a terceiro. Na origem desta figura está a noção de desvio de conduta,
de forma que a teoria da responsabilidade civil foi construída para alcançar as ações
praticadas em contrário ao direito.
Explica o ilustre doutrinador Carlos Alberto Bittar apud Rui Stocco, que “com efeito,
das ações que interessam ao direito, umas são conformes, surgindo, daí, os „atos jurídicos‟, de
um lado, e os „ atos ilícitos‟, de outro, estes produtos apenas de obrigação para os agentes”32.
Quanto aos atos ilícitos, a doutrina tem assente que, são aqueles praticados com desvio
de conduta, em que o agente se afasta do comportamento médio do chamado bonus pater
família (bom pai de família), ou seja, o exemplo de cidadão romano a ser seguido pela
sociedade, devendo por isso submeter-se o lesante à obrigação de satisfazer o dano causado a
outrem.
31
STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial, p. 48-49.
32
STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial, p. 49.
23
Além disso, é pacífico na doutrina que somente são considerados atos ilícitos aqueles
resultantes de ação consciente, devendo juntar-se à antijuridicidade, cumprindo perquirir-se a
vontade do agente. A culpa lato sensu é, nesse caso, o fundamento da responsabilidade.
Desta forma, para que haja ato ilícito, mister se faz a conjugação dos seguintes fatores:
a existência de uma ação; a violação da ordem jurídica; a imputabilidade; a penetração da
esfera de outrem.
Esse comportamento gera, para o autor, a responsabilidade civil, que traz como
consequência, a imputação do resultado à sua consciência, traduzindo-se, na prática, pela
reparação do dano ocasionado, conseguida, normalmente, pela sujeição do patrimônio do
agente, salvo quando possível a execução específica.
33
STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial, p. 49.
24
Nesse sentido, colhe-se a oportuna lição de José de Aguiar Dias apud Carlos Roberto
Gonçalves:
O limiar dessa distinção reside, pois, no reflexo operado pelo ato ilícito do ofensor. Ou
seja, se o dano tem reflexo em bens jurídicos elegidos pelo direito como de interesse público,
importantes a toda a coletividade, há de incidir repressão estatal, e, logo, está-se diante da
responsabilidade penal.
De outro giro, quando os efeitos daquele dano não ultrapassam a esfera de um núcleo
mínimo de particulares ofendidos, tem-se a responsabilidade civil, com a qual fica ao alvedrio
da vítima buscar a prestação jurisdicional.
Para Rui Stoco “a responsabilidade penal pressupõe uma turbação social, determinada
pela violação da norma penal, sendo necessário que o pensamento exorbite do plano abstrato
para o material, pelo menos em começo de execução”35.
34
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 18.
35
STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial, p. 47.
25
Com efeito, a responsabilidade penal está para uma infração de norma de direito
público, onde o direito lesado é da sociedade, ao passo que a responsabilidade civil está para a
lesão do direito de particulares, dando azo a que o ofendido pleiteie ou não a reparação.
Transgride também, a lei penal, ele se torna, ao mesmo tempo, obrigado civil
e penalmente. E, assim, terá de responder perante o lesado e a sociedade,
visto que o fato danoso se revestiu de características que justificam o
acionamento do mecanismo recuperatório da responsabilidade penal36.
Não se pode olvidar, contudo, que por vezes a responsabilidade civil e penal
coincidem, proporcionando as respectivas ações, isto é, a ação penal pela sociedade
promovida pelo Estado; e a ação de reparação, promovida pela vítima.
36
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 20.
37
“XLV – Nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação o dano e a decretação do
perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do
valor do patrimônio transferido”.
38
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 18.
26
Enfim, das diferenciações entre responsabilidade civil e penal resulta que a primeira
visa reprimir o dano ao particular objetivando restabelecer o equilíbrio privado que fora
abalado pelo ato ilícito do ofensor; enquanto, por seu turno, a responsabilidade penal tem o
escopo de restabelecer a harmonia social, realizando repressão aqueles ilícitos nocivos aos
valores coletivamente relevantes.
39
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 21.
27
Sob tal prisma, cumpre então considerar que na responsabilidade civil objetiva não há
a necessidade de comprovação ou investigação da ocorrência de culpa, bastando para sua
aplicação a configuração do dano e do nexo causal entre a ação e o resultado obtido.
Diferencialmente do que ocorrerá nos casos em que se configura a responsabilidade civil
subjetiva, pois nesta faz-se relevante a verificação da culpa, para decorrer sua aplicação.
Art.927. [...]
Parágrafo único, Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de
culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente
desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os
direitos de outrem.
40
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 15.
41
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 21.
28
Assim, na seara da responsabilidade civil objetiva a matéria é vista pelo viés do dano
causado, e não pela ação do agente causador. De acordo com Guilherme de Castro:
Vale dizer que, por adotar a responsabilidade civil a teoria do risco, na sua maior
expressão, é substituída a ação ou omissão do agente pela presunção de um constante agir sob
risco, representado pela natureza da atividade desempenhada.
A vertente da teoria do risco que não exige um proveito por parte do causador, por
outro lado, assenta-se na esteira de que quem desenvolve determinada atividade e, em razão
desta, terceiros são expostos a riscos, deve indenizá-los na eventualidade de um dano,
independentemente de ter com culpa ou não neste caso especial.
42
CASTRO, Guilherme de. A Responsabilidade Objetiva no Direito Brasileiro. 2ª. ed. Rio de janeiro.
Forense, 1997, p. 29.
43
LIMA, Alvino. Culpa e Risco. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 198.
29
Fica evidenciado, assim, que as pessoas de direito privado, em alguns casos, igualam-
se, em termos de responsabilidade civil, com os entes públicos, o Estado. São esses casos de
responsabilidade civil objetiva aqueles definidos pelo novo Código Civil, nos arts. 927,
parágrafo único, 932, 936, 937 e 938.
Nota-se que a responsabilidade civil objetiva tem origem num fato lesivo a terceiros,
independentemente de culpa, Nesse sentido, para Caio Mário da Silva Pereira:
O dano, decorrente do ato ilícito, pode ser provocado por uma pessoa a outra em
decorrência de descumprimento de um contrato havido entre as partes, ou, por outro lado,
44
HARADA, Kiyoshi. Responsabilidade Civil do Estado. In: BUCCI, Mário César (Org.). Estudos de
Responsabilidade Civil: doutrina, jurisprudência e prática. São Paulo: Ícone, 2003, p. 543.
45
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil, p. 267.
30
46
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil, p. 25-26.
31
47
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 137.
48
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das Obrigações: responsabilidade civil. v.6. 2. ed. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 11.
49
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 27-28.
32
A Constituição Federal, em seu art. 5°, inciso X estatui que “são invioláveis a
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a
indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Com essa postura, o
legislador constituinte originário impôs a reparabilidade de um dano como direito
fundamental inescusável ao indivíduo. O feito, não se pode negar, traz ínsito o
reconhecimento da responsabilidade civil pela própria Constituição. Não é difícil reconhecer
que o texto constitucional traz aí, em grande parcela, a idéia de responsabilidade civil
subjetiva, carecendo, pois, que se identifique a culpa do ofensor na violação daqueles direitos
fundamentais tutelados no inciso X, do art. 5°, sem exclusão, por óbvio, de tantos outros
similares e de mesma natureza.
Não se conteve aí, entretanto, a Norma Ápice. Foi mais profícua, é verdade, ao cuidar
da responsabilidade civil com relação à Administração Pública. Não por acaso, o art. 37, § 6°,
dispõe que “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de
serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a
terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”. É
a confirmação da teoria da responsabilidade civil do Estado.
De acordo com Caio Mário da Silva Pereira, “se o funcionamento do serviço público,
bom ou mau não importa, causou um dano, este deve ser reparado. Desta sorte, distribuem-se
por toda a coletividade as conseqüências danosas do funcionamento do serviço público. É a
forma única democrática de repartir o ônus e encargos sociais”51.
Aliás, a não ser assim, e admitir a teoria do risco integral para balizar a
responsabilidade civil do Estado, “por essa fórmula radical, a Administração ficaria obrigada
a indenizar qualquer dano suportado por terceiros, ainda que resultante de culpa ou dolo da
vítima”52.
A jurisprudência tem estado atenta a essa dicotomia entre risco administrativo e risco
integral e demonstra que prevalece a primeira, tanto que:
50
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 18. ed. São Paulo: Malheiros 1993, p. 556.
51
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil, p. 7.
52
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, p. 556.
34
A par das sutis disposições constitucionais sobre o instituto em comento, coube, então,
à legislação infraconstitucional conferir o tratamento adequado à responsabilidade civil,
impingindo-lhe os contornos e condições necessárias à sua perfectibilização no mundo dos
fatos.
E como não poderia ser de forma diversa, é o Direito Civil que regula a matéria adrede
à exaustão, cuidando da responsabilidade subjetiva e objetiva e contratual e extracontratual.
Para Rodrigo Xavier Leonardo, “a responsabilidade contratual é fundamentada nos art. 389 a
35
405, enquanto a responsabilidade civil extracontratual é prevista nos arts. 186 a 188, bem
como nos arts. 927 a 954, todos do novo C.C.”53.
Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos,
mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente
estabelecidos, e honorários de advogado.
Art. 391. Pelo inadimplemento das obrigações respondem todos os bens do
devedor.
Art. 392. Nos contratos benéficos, responde por simples culpa do contratante
a quem o contrato aproveite, e por dolo aquele a quem não favoreça. Nos
contratos onerosos, responde cada uma das partes por culpa, salvo as
exceções previstas em lei.
Senão, veja-se:
Não há, entretanto, pela ótica do Código Civil vigente, ato ilícito capaz de impor um
dever indenizatório, quando forem os atos “praticados em legítima defesa ou no exercício
regular de um direito reconhecido” (art. 188, I) ou quando “a deterioração ou destruição da
coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente” (art. 188, II).
Mas a regulação civilista traçada nos arts. 186 a 187 é insuficiente para modelar a
responsabilidade civil no ordenamento jurídico contemporâneo. Por isso, o codex
complementos substanciais no art. 927 e ss., conquanto introduz também os Postulados da
responsabilidade objetiva.
53
LEONARDO, Rodrigo Xavier. Responsabilidade Civil contratual e extracontratual: reflexões metodológicas
em face do novo Código Civil brasileiro. Revista de Direito Privado, n. 19. São Paulo, Revista dos Tribunais.
Jul/set. 2004, p. 261.
36
Nas raias da responsabilidade objetiva, por sua vez, o tom é capitaneado pelo
parágrafo único do art. 327 do Código Civil, assim: “haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade
normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os
direitos de outrem”.
Eis a responsabilidade objetiva, antes afeta aos atos estatais, agora incrustada no
Direito Civil, passando a reger determinadas situações entre particulares. A razão dessa nova
postura do legislador reside na adoção da teoria do risco criado, diante da complexidade das
relações sociais e jurídicas hodiernamente experimentadas pelas pessoas e, também, no
reconhecimento de que somente a teoria da culpa, por inúmeras vezes, cria situações em que
se tem presente e visível o dano, demonstrado o nexo de causalidade com a ação ou omissão
do agente, mas o insucesso na prova da culpa, faz parecer o direito à reparação.
54
LEONARDO, Rodrigo Xavier. Responsabilidade Civil contratual e extracontratual, p. 265.
55
BERALDO, Leonardo de Faria. A responsabilidade civil no parágrafo único do art.927 do Código Civil e
alguns apontamentos do Direito comparado. Revista de Direito Privado, n.20. São Paulo, Revista dos
Tribunais, out./dez.2004, p. 218.
37
a) os pais com relação aos filhos menores sob sua guarda ou companhia (inciso I);
Também responde de forma objetiva o dono do animal que causar danos a terceiros,
desde que inocorrente a culpa da vítima (art. 963). Igualmente está abarcado pela
responsabilidade objetiva “o dono de edifício em construção responde pelos danos que
resultarem de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta”
(art. 937) e “Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano proveniente das
coisas que delem caírem ou forem lançadas em lugar indevido”.
São apenas algumas das situações previstas no próprio Código Civil vigente que
reclamam a responsabilidade civil objetiva, mas que não excluem as demais outras previsões,
no mesmo sentido, existentes na legislação extravagante.
Por fim, cumpre aduzir que a responsabilidade civil no ordenamento jurídico brasileiro
recebe um acréscimo especial da legislação consumerista, diploma legal do micro sistema
jurídico das relações de consumo que impôs como regra geral, ao contrário do Código Civil
tenha revogado o Código de Defesa do Consumidor, pois, como explica Leonardo de Faria
Beraldo, “quando o dispositivo [do Código Civil] menciona que haverá obrigação de reparar o
38
dano, nos casos especificados em lei, nos parece evidente que o legislador quis deixar claro
que as leis especiais continuam em vigor, tais como o Código de Defesa do Consumidor”.
Veja-se que, sem adentrar no texto da legislação consumerista no CDC, o art. 931 do
Código Civil já prevê que “ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários
individuais e as empresas respondem independentemente de culpa pelos danos causados pelos
produtos postos em circulação”. Nesse sentido, de acordo com o entendimento cristalizado, o
enunciado n°. 42 da Jornada de Direito Civil - CEJ da CJF (11 a 15/02/2002) “o art. 931
amplia o conceito de fato do produto existente no art. 12 do Código de Defesa do
Consumidor, imputando responsabilidade civil à empresa e aos empresários individuais
vinculando á circulação dos produtos”. Supletivamente Enunciado n°. 190 da mesma jornada
de Direito Civil informa que “a regra do art. 931 do novo CC não afasta as normas acerca da
responsabilidade pelo fato do produto prevista no art. 12 do CDC, continuam mais favoráveis
ao consumidor lesado”.
56
LUNARDI, Fabrício Castagna. A Responsabilidade Civil do Fornecedor por Vícios dos Produtos no
Código de Defesa do Consumidor. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1045,12 maio 2006. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8267>. Acesso em: 15 mai. 2009.
57
LUNARDI, Fabrício Castagna. A responsabilidade civil do fornecedor por vícios dos produtos no Código
de Defesa do Consumidor. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1045,12 maio 2006. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8267>. Acesso em: 15 mai. 2009
40
De toda sorte, se por um lado a regra geral eleita pelo Código de Defesa do
Consumidor é ser a responsabilidade civil objetiva, por outro carrega a exceção da
responsabilidade civil subjetiva abrigando os profissionais liberais.
A razão para esta exceção é que, via de regra, o profissional liberal não presta um
serviço de resultado, mas tão-só de meio, por isso não abarcado pelas disposições do art. 3°, §
2°, tampouco na regra do art. 20, ambos do CDC. A contratação do profissional liberal, diga-
se uma vez mais, envolve a atividade de meio, e não um resultado certo e determinado. Para
os profissionais liberais, portanto, vige a forma de responsabilidade civil subjetiva, do que
decorre a necessidade de demonstrar a culpa no desenvolvimento da atividade profissional
para haver uma reparação.
3 DANOS
No Direito moderno o conceito de dano continua vário. Para uns, o dano não
reside na lesão material do bem, como na destruição de um objeto ou a morte
de um homem, mas na diminuição patrimonial que dela deriva alguém
(Differenztheorie). Outros assinalam que o dano significa a lesão de qualquer
interesse jurídico, donde proclama autorizada doutrina alemã que dano e
interesse são a mesma coisa (Schden und Interesse sind idenish)58.
Portanto, irrompe o sistema jurídico com um ilícito que dá azo ao reclame de uma
compatível indenização.
58
MONTENEGRO, Antonio Lindbergh C. Ressarcimento de Danos Pessoais e Materiais. 6. ed. Rio de
Janeiro: Lúmen Júris, 1999, p. 6.
59
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil, p. 934.
60
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 529.
43
Forçoso reconhecer, ademais, que pela própria dicção do Código Civil, não mais se
cogita que um dano atina unicamente a desfalque patrimonial material, pois nítido que o dano,
ainda que unicamente moral, será igualmente considerado um ilícito passível de reparação.
A expressão indenizar que se move atrelada aos danos, revela na verdade a intenção de
deixar-se livre do dano, tornar ao statu quo ante. Vale dizer: devolver a situação indene, sem
dano, sem prejuízo.
Nessa seara é que floresce a noção da extensão do dano, na medida em que o escopo
último é recompor os fatos da vida a uma situação como se não houvera o dano. Todavia, em
muitas oportunidades esse feito não mais se galga, pelas próprias limitações materiais da
recomposição dos prejuízos ou pela natureza do bem jurídico, do interesse ou do direito
ferido.
61
OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional. São
Paulo: LTr, 2005, p. 109.
44
É exigível, portanto, que seja o dano certo, atual e subsistente. De acordo com Carlos
Roberto Gonçalves, “nem todo dano é ressarcível, mas somente o que preencher os requisitos
de certeza e atualidade”62.
Não escapam à regra da atualidade os lucros cessantes, ainda que os efeitos sejam
sentidos no futuro, é forçoso ver que o dano que importe em interrupção de lucros irá refletir
de forma a impedir ou reduzir o rotineiro e razoável incremento patrimonial da vítima.
Nessa raia, não basta que, para a caracterização dos lucros cessantes, exista uma mera
possibilidade; é imperioso que, também nestes casos, exista uma consistência de certeza.
Assim ensina Rui Stoco: “o critério acertado está em condicionar o lucro cessante a uma
probabilidade objetiva resultante do desenvolvimento normal dos acontecimentos às
circunstâncias peculiares ao caso concreto”64.
O dano, para ser indenizável, carece ainda de ser subsistente, isto é, somente
permanece o dever indenizatório, e assim se coaduna e se justifica, enquanto o dano não tenha
sido ressarcido, reparado, compensado ou indenizado.
62
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 530.
63
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 530.
64
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil, p. 935.
45
Reproduz-se, no mais das vezes, pelas perdas e danos que a vítima experimentou, e,
também, por aquela expectativa de ganhos e acertos que foi frustrada.
Por isso, o dano material, de acordo com Antonio Lindbergh C. Montenegro, “implica
a obrigação de responder o ofensor pelo dano emergente e pelo lucro cessante”65.
O cerne jurídico-legal da reparabilidade dos danos materiais é firmado pelo art. 402 do
Código Civil vigente: “Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos
devidos ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente
deixou de lucrar”. Com efeito, inútil é falar-se em danos materiais se não se considerar ai os
danos emergentes e os lucros cessantes, espécies do gênero maior “perdas e danos”.
Tratando-se de bens corpóreos, aí considerados os bens móveis (art. 82 usque 84, CC)
e bens imóveis (art. 80 e 81, CC), a diretriz primeira dos danos materiais encontra abrigo no
art. 952 do Código Civil vigente, que possui a seguinte redação: “Havendo usurpação ou
esbulho do alheio, alem da restituição da coisa, a indenização consistirá em pagar o valor das
suas deteriorações e o devido a título de lucros cessantes; faltando a coisa, dever-se-á
reembolsar o seu equivalente ao prejudicado”.
65
MONTENEGRO, Antonio Lindbergh C. Ressarcimento de Danos Pessoais e Materiais, p. 153.
66
MARMITT, Arnaldo. Perdas e Danos. Rio de Janeiro: Aide, 1987, p. 14.
46
O dano material que atine a bens corpóreos se expressa tanto pelo uso que faz
depreciar o conteúdo econômico da coisa, como também pela distribuição ou inutilização,
conferindo ao legítimo proprietário a pretensão de haver do lesante o valor comercial da coisa
além dos danos suportados pela privação do bem ou pela falta do gozo da coisa durante todo o
lapso que dela ficou afastado.
Para os casos de perda ou destruição do bem, o Código Civil possui regra específica
no parágrafo único do art. 952, sendo válido transcrevê-la: “Para se restituir o equivalente,
quando não exista a própria coisa, estimar-se –á ela pelo seu preço ordinário e pelo de afeição,
contanto que este não se avantaje aquele”.
67
MONTENEGRO, Antonio Lindbergh C. Ressarcimento de Danos Pessoais e Materiais, p. 154.
68
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 629.
47
O Supremo Tribunal Federal, aliás, por meio da súmula 562, consolidou o seguinte
entendimento: [...] “na indenização de danos materiais decorrentes de ato ilícito cabe a
atualização de seu valor, utilizando-se, para esse fim, dentre outros critérios, dos índices de
correção monetária”.
Tratando-se da coisa que danificada, possa ser reparada e entregue à vítima, não só seu
conserto é suficiente para ressarcir por completo o dano experimentado. É preciso levar em
conta a depreciação (desvalorização) sofrida. A depreciação da coisa, e que deve ser levada
em conta no cômputo do dano indenizável, é todo atributo negativo que torna desmerecido o
bem para fins de uso próprio ou para disposição mediante contraprestação econômica da
coisa, seja para locação ou alienação.
Essa afirmação ganha vulto quando se cuida de relações comerciais, onde a marca de
produtos e o renome de que goza determinada empresa denotam o pernicioso contra-valor que
a depreciação da imagem lhe acarreta. A jurisprudência tem estado atenta a essas questões
peculiares, como se vê nos seguintes julgados:
69
MONTENEGRO, Antonio Lindbergh C. Ressarcimento de Danos Pessoais e Materiais, p. 159.
70
MARMITT, Arnaldo. Perdas e Danos, p. 78.
48
afastar toda e qualquer violência à expressão física da pessoa humana protegida pela
Constituição, expressada, então, pelo corpo.
A exceção é tão-somente a legal, trazida pelo art. 13 do Código Civil: “Salvo por
exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição
permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes” excetua, ainda o Código
Civil, que o corpo humano pode ser disposto para fins de transplantes de órgãos, todavia
jamais a título oneroso, obedecidos os regramentos da Lei n. 9.434/97.
Outra exceção é consignada pelo art. 14 do mesmo diploma: “É válida, com objetivo
cientifico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte para
depois da morte”.
Por tudo então que se disse, é inelutável concluir que a pessoa humana, por sua
representação corpórea, é abrangida por uma tutela ressarci tória que, segundo Antonio
Lindbergh C. Montenegro, “compreende a vida, a integridade corporal (bens físicos), a honra
e a liberdade (bens morais)”71.
71
MONTENEGRO, Antonio Lindbergh C. Ressarcimento de Danos Pessoais e Materiais, p. 55.
50
Trata-se pois, dos danos pessoais, uma espécie sui generis que congrega danos
materiais, aqueles que violam o corpo e mutilam a integridade física, e danos morais, aqueles
que atentam aos valores que fazem o que a pessoa é.
Atualmente não há mais espaço para a negação da existência de danos morais e, daí, o
conseqüente nascimento de uma legítima pretensão de indenização. É válido dizer que a
pessoa pode ser lesada tanto naquilo que possui quanto naquilo que é. Assim, a lesão naquilo
que a pessoa tem, afeta o seu patrimônio material, enquanto que o dano ao que a pessoa é, diz
respeito ao seu patrimônio imaterial – ou extra patrimonial como preferem alguns – intimo,
moral, personalístico.
Com efeito, apesar de o dano moral puramente considerado não afetar os bens físicos
(materiais) da vítima, não deixa de ser um dano igualmente ao patrimônio da pessoa. Assim
explica Rosa Maria Borriello de Andrade Nery:
72
MONTENEGRO, Antonio Lindbergh C. Ressarcimento de Danos Pessoais e Materiais, p. 55.
51
De acordo com Rui Stoco, “significa, portanto, que o dano que se deve vislumbrar é
aquele que atinge a pessoa, nos seus bens mais importantes, integrantes do seu patrimônio
subjetivo”75.
Uma certeza, porém, que se pode ter em relação a danos morais é que seu conceito é
dúctil, flexível, influenciável e suscetível, estando em constante mutação conjuntamente às
mais sensíveis mudanças da sociedade.
Nesse aspecto, Sebastião Geraldo de Oliveira, citando André Gustavo Andrade, faz
ver que “o dano moral é um conceito em construção e com o desenvolvimento social e a
conseqüente evolução dos direitos da personalidade tende a ser ampliado para alcançar
situações hoje ainda não consideradas”76.
73
NERY, Rosa Maria Barreto Borriello de Andrade Nery. Dano moral e patrimonial: fixação do valor
indenizatório. Revista de Direito Privado, n. 21. São Paulo: Revista dos Tribunais, jan/mar.2005, p. 15.
74
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 548.
75
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil, p. 1666.
76
OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional. São
Paulo: LTr, 2005, p. 116.
52
Por essa razão, Sergio Cavalieri Filho, aduz que só enseja a configuração de danos
morais “a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira
intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e
desequilíbrio em seu bem-estar”77.
Simples dissabores, irritações ou inquietações exageradas não dão azo a dano moral,
mesmo porque cada pessoa sente as punções do dia-a-dia de uma forma distinta, com maior
ou menor intensidade e importância.
77
CAVALHIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p.
78.
53
Uma vez mais, fica ao critério ponderado do juiz da causa interpretar se os calçados e
agruras suportadas pelo ofendido invadiram sua esfera íntima e lhe causaram danos morais
ou, se, de outro modo, ficaram apenas na órbita dos singelos aborrecimentos do cotidiano.
Também os danos morais possuem requisitos, que têm sido chancelados pela mais
atenta jurisprudência, não fugindo das regras gerais inerentes a todos os danos, fixadas pelos
arts. 186 e 927 do Código Civil. Convém, ver, a esse respeito, o seguinte aresto:
Faz-se imperioso dizer, porém, que os danos morais são os que atingem direitos
relacionados à personalidade da vítima. São esses direitos, dos mais importantes e que
formam o espectro da dignidade da pessoa humana, que Carlos Roberto Gonçalves afirma
serem “inalienáveis, que se encontram fora do comércio, e que merecem a proteção legal”78.
A Carta Magna os abriga mais expressamente em seu art. 5°, X, em que: “são
invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito
a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. O Código Civil
vigente, por sua vez, no art. 11: “Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos de
personalidade são intransmissíveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”.
78
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 550.
54
O rol de direitos de personalidade que podem ser irrompidos por danos morais não é
exaustivo nas expressões utilizadas pela Constituição Federal e pelo Código Civil atual (art.
11) Nesse passo, Gustavo Tepedino preleciona:
A violação dos direitos de personalidade pelo dano moral opera como uma invasão
inopinada, irrefreável e irresistível, que faz fenecer as forças internas da vítima, lhe pondo a
sucumbir e subordinar-se a todo o mal que aquela agressão traga consigo. Por isso o caráter
odioso, repulsivo e repreensível de todo dano moral, porque ao ocorrer reduz a própria
condição humana da vítima ao lhe privar da compleição de seus mais caros direitos de
personalidade.
O dano moral decorre, no mais das vezes, de um evento repentino, muitas vezes
constituindo-se e extinguindo-se a um só tempo, todavia impregnando seus efeitos na esfera
psíquica da vítima e postergando-os ao incerto.
79
TEPEDINO, Gustavo. Cidadania e direitos de personalidade. Revista Jurídica, n. 305, a. 51. Porto Alegre:
Síntese, 2003, p. 27.
55
Também é preciso fazer a diferenciação providencial entre o dano moral puro e dano
moral reflexo. Nesse sentido, ensina Araken de Assis:
A noção, aqui, equivale muito àquela do dano direto e indireto nos prejuízos materiais.
De acordo com Pontes de Miranda apud Carlos Roberto Gonçalves, “se há repercussão de
ordem patrimonial, ainda que mediante repercussão, o dano deixa de ser extra patrimonial”81.
O reconhecimento dos danos estéticos como uma nova categoria de danos é feito
recente e ainda provoca acirradas discussões quanto a sua natureza jurídica, mormente se é
tão-somente um desdobramento de danos materiais ou de danos morais.
Com efeito, ao que parece, o dano estético congrega características presentes nos
danos materiais e morais, sem, entretanto, pertencer a qualquer deles. Danos estéticos são
danos diferenciados e, como tal, merecem tratamento igualmente particular pelo direito.
80
ASSIS, Araken de. Indenização do Dano Moral. Revista Jurídica, n. 236. Porto Alegre Síntese, jun. 1997, p.
5.
81
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p. 548.
56
Wilson Melo da Silva afirma que o dando estético é “qualquer modificação duradoura
ou permanente na aparência externa de uma pessoa, modificação esta que acarreta um
„enfeamento‟ e lhe causa humilhações e desgostos, dano origem, portanto a uma dor moral”83.
Igualmente Rui Stoco, para quem: “o dano à estética pessoal é espécie do gênero dano
85
moral” .
Ainda que o conceito de beleza seja bastante relativo, diferente de época para época,
de cultura para cultura, ao falar-se em dano estético fica evidente que se trata de dano à beleza
física da pessoa.
82
OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional, p.
173.
83
SILVA, Wilson de Melo. O dano estético. Revista Forense. n. 19. São Paulo: Forense, abr/jun, 1961, p. 25.
84
OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional, p.
127.
85
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil, p. 1356.
86
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 16. ed. v. 7. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 73.
57
Amparado da doutrina de Teresa Ancona, Rui Stoco traz preciosos elementos para a
identificação do dano estético, sendo oportuno colacionar:
Aqui não se trata apenas das horripilantes feridas, dos impressionantes olhos
vazados, da falta de uma orelha, da amputação de um membro, das cicatrizes
monstruosas ou mesmo do aleijão propriamente dito. Para a responsabilidade
civil basta a pessoa ter sofrido uma “transformação”, não tendo mais aquela
aparência que tinha, ou seja, um desequilíbrio entre o passado e o presente,
uma modificação para pior.
O Segundo elemento, acrescenta, é a permanência ou, no mínimo, o efeito
danoso prolongado, alertando: “Pensamos que o dano estético passageiro
não é dano moral e sim dano material, facilmente indenizável e facilmente
superável”.
E conclui: “Para que exista dano estético é necessário que a lesão que
enfeiou determinada pessoa seja duradoura, caso contrário não se poderá
falar em dano estético propriamente dito (dano moral), mas em atentado
reparável à integridade física ou lesão física ou lesão estética passageira que
se resolve em perdas e danos habituais”87.
Uma diferença crucial que se ousa dizer entre danos morais e estéticos reside na
subtaneidade e prolongamento do evento danoso, daquele acontecimento que gera os efeitos
de dor moral, agonia, supressão da paz de espírito, angústia e um cem-número de tormentos.
O dano moral decorre de um evento único, súbito e concentrado num exíguo instante;
o que dali advém são suas conseqüências perturbadoras da mente e do estado psicológico da
pessoa, que vão, sabidamente, ao longo do tempo, esmaecendo.
O dano estético, por seu turno, ainda que provoque as mesmas sensações e inquietudes
que o dano moral puro, contém a particularidade de impedir o desaparecimento destes efeitos,
pois enquanto persistirem as lesões, estará avivando no íntimo da pessoa aquelas
87
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil, p. 1356.
58
perturbações, agindo como se reativasse e provocasse a cada instante o dano físico sofrido
pela vítima.
O dano estético torna a vítima uma diferença. A faz exótica e digna de olhares
desconfiados e da curiosidade alheia. Nada mais violador do íntimo do ser humano do que
ver-se a si próprio com demérito e menoscabo como, ao mesmo tempo, ser expiada
constantemente face à coletividade, servindo ao deleite e ao sentimento de pena dos olhos
alheios.
Por essas razões todas, os danos estéticos encetam nova modalidade de danos.
Congregam, é verdade, nuanças dos danos materiais quando se está diante de lesão que
provoque redução da capacidade laborativa ou total incapacidade. Ou, ainda, quando em
decorrência da lesão, ainda que não comprometa o funcionamento de qualquer órgão, membro
ou movimento, impeça a continuidade do trabalho desenvolvido em razão da esbelteza do
corpo, a exemplo de artistas e modelos.
Em outro passo, possuem as nítidas repercussões dos danos morais puros (dor moral,
aflição, angústia) com a agravante de impedir o esquecimento do evento danoso enquanto
persistir a aparência prejudicada pelo aleijão ou deformidade.
59
Relação de consumo pode ser entendida como uma relação jurídica marcada pela
qualidade das partes, tendo dos pólos com interesses diametralmente opostos, de um lado o
consumidor e de outro o fornecedor, definições adiante trabalhadas e, objeto desse interesse. 79
Não se pode olvidar que a relação de consumo abrange todos os atos concernentes à
consecução do vínculo a ser estabelecido entre consumidor e fornecedor, envolvendo também
a oferta e a publicidade.
79
GRINOVER, Ada Pellegrini [et al]. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Comentado pelos autores
do anteprojeto. 7. Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p. 42.
60
4.1.1 O SERVIÇO
80
CAVALIERI FILHO, Sérgio. A responsabilidade médico-hospitalar à luz do código do consumidor.
Disponível em: http://www.forense.com.br/Atualidade/Artigos_DCOM/346dou11.htm. Acesso em: 22 jun.
2009.
81
GRINOVER, Ada Pellegrini [et al]. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Comentado pelos autores
do anteprojeto, p. 173.
82
NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva,
2000. p. 90.
61
4.1.2 O CONSUMIDOR
De acordo com a definição estabelecida pelo Código do Consumidor, em seu artigo 2º:
“Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como
destinatário final.” 76 O conceito do artigo 2º é estendido à coletividade de pessoas que mesmo
não sendo determináveis, tenham participado da relação de consumo (artigo 2º, parágrafo
único, CDC); às vítimas do evento danoso oriundo da relação de consumo, ainda que não
identificáveis, a despeito de terem ou não sido consumidoras diretas, (artigo 17, CDC); e à
todas as pessoas expostas às práticas comerciais (artigo 29, CDC), equiparando-as ao
consumidor.
Consumidor, portanto, seria todo aquele que adquire diretamente produtos e serviços,
que sofre as conseqüências nefastas advindas da relação de consumo ou que esteja exposto à
práxis comercial envolvendo produtos ou serviços, na condição de usuário final.
4.1.3 O FORNECEDOR
83
NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, p. 77.
84
GRINOVER, Ada Pellegrini [et al]. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Comentado pelos autores
do anteprojeto, p. 26-27.
78
NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, p. 90.
62
79
GRINOVER, Ada Pellegrini [et al]. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Comentado pelos autores
do anteprojeto, p. 39.
63
[...] a) habitualidade – aquele modo de vida adotado pelo profissional, que faz
de sua profissão algo inerente à sua maneira de viver; b) regulamentação –
mais do que um simples regulamento, exige-se a normatização da atividade;
c) habilitação – deve-se entender que o exercício profissional pressupõe uma
habilitação prévia; d) presunção de onerosidade – a presença da remuneração
na relação contratual ou de consumo é de fundamental importância para
definir o caráter oneroso do exercício profissional; e) autonomia técnica –
mesmo assumindo obrigação de prestação de serviços, ou até de natureza
laboral, o profissional só deve ter subordinação de ordem jurídica, nunca de
emprego ou trabalho; f) vinculação a alguma corporação ou sindicato –
determinadas profissões exigem filiação obrigatória à entidade de classe ou
sindicato, outras deixam ao livre arbítrio do profissional. Mas todos devem
estar sujeitos a normas éticas, codificadas, também de caráter disciplinar,
através das quais possam ser responsabilizados, por violação dos princípios
que norteiam sua atividade.81
80
GRINOVER, Ada Pellegrini [et al]. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Comentado pelos autores
do anteprojeto, p. 176.
81
VASCONCELOS, Fernando Antônio. Responsabilidade Profissional Liberal nas Relações de Consumo.
Curitiba: Juruá, 2002. p. 30.
64
sua saúde. É o acidente de consumo. Assim, o fornecedor é responsável pelo simples fato de
colocar o produto no mercado, assumindo os riscos dessa conduta.
82
GRINOVER, Ada Pellegrini [et al]. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Comentado pelos autores
do anteprojeto, p. 176.
83
ALMEIDA, João Batista. A Proteção Jurídica do Consumidor. 3. Ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 80-93.
65
colocá-la em risco, o texto legal indica valer a exceção, ou seja, sem a prévia
demonstração de culpa, não cabe responsabilização. Nas demais situações está
aberta a possibilidade de utilização de outros critérios para a apuração da
responsabilidade dos profissionais liberais, pois diante da inexistência do
comando legal, a responsabilidade não encontra empecilhos (sob esse aspecto
técnico) para que seja informada por critério diverso, fugindo do sistema
tradicional proporcionado pelo § 4º do art. do CDC.84
Para o consagrado jurista Rui Stoco85, além da culpa, o dano causado pelo abuso de
direito, preconizado no artigo 187 do mesmo diploma legal, também se submete ao
regramento da responsabilidade subjetiva.
84
PRUX, Oscar Ivan. Um novo enfoque quanto à responsabilidade civil do profissional liberal. Revista de
Direito do Consumidor, São Paulo, n. 19, jul/set. 1996. p. 212-215.
85
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil, p. 128.
66
O exercício da medicina como se pode perceber, encontra-se no rol das atividades que
se prestam à incidência do Código de Defesa do Consumidor, no entanto, face ao parágrafo 4º
do artigo 14, se infere que, se o médico no desempenho de seu mister vier a causar dano a
outrem por erro, que seja caracterizado como erro médico, terá sua responsabilidade apurada
mediante verificação de culpa, e será obrigado a reparar o dano causado se presentes os
pressupostos da responsabilidade subjetiva (ação ou omissão, dano, nexo casual e culpa),
disciplinada no Código Civil.
Faz-se necessário reprisar que, via de regra, a relação jurídica médico-paciente é tida
como contratual. Contudo, o médico, na maioria das vezes, não assume uma obrigação de
resultados e sim de meios, comprometendo-se apenas a empregar todos os conhecimentos e
técnicas disponíveis, na tentativa de minorar o sofrimento do paciente objetivando, se
possível, alcançar a cura, porém, sem jamais assegurar o resultado, a própria cura. Nesse caso,
apesar da obrigação assumida ser contratual, ao paciente/consumidor cabe o encargo de
provar a culpa do facultativo. Nas situações em que a doutrina tende a classificar a atividade
médica como sendo obrigação de resultados, com culpa presumida, cabe ao médico o ônus
probatório da ausência de sua responsabilidade.
86
NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, p. 123.
67
Duas visões, nem tão novas sobre o erro médico, mas pouco difundidas no Brasil, são
noticiadas pela doutrina pátria. A primeira, de raízes francesas, é conhecida como perte d’une
chance (a perda de uma chance), presumindo que a intervenção do médico retirou do paciente
a possibilidade de cura:
87
SHAEFER, Fernanda. Responsabilidade Civil do Médico e Erro de Diagnóstico, p. 76.
68
88
KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico, p. 61.
89
FRANÇA, Genival Veloso de. Direito Médico, p. 109-110.
69
apesar de não contarem com previsão expressa no diploma legal protetivo, são acolhidas pela
doutrina como condições liberatórias da responsabilidade do fornecedor.
Algumas considerações, entretanto, devem ser feitas pois, três situações podem se
configurar na relação entre os estabelecimentos de saúde e o paciente que utiliza seus
serviços: a prestação de serviços envolve serviços tipicamente hospitalares; o médico que
presta serviços não apresenta vínculo com o hospital; e, por último, o médico é empregado ou
membro do corpo clínico.
[...] não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se
em conta as circunstâncias relevantes, como o modo de seu fornecimento e de
sua prestação, o resultado e o risco que razoavelmente dele se esperam e a
época em que foi fornecido, não se considerando defeituoso pelo simples fato
de adoção de novas técnicas (art. 14, § § 1º e 2º).90
A segunda situação diz respeito aos casos em que o médico atua como profissional
independente, sem vínculo com o estabelecimento de saúde, faculdade exercida com
supedâneo no artigo 25 do Código de Ética Médica que concede ao médico direito de:
“Internar e assistir seus pacientes em hospitais privados com ou sem caráter filantrópico,
ainda que não faça parte do seu corpo clínico, respeitadas as normas técnicas da instituição.”91
Novamente aqui, majoritariamente, entende-se que o hospital, se judicialmente acionado,
responderá objetivamente de acordo com o Código do Consumidor e que a responsabilidade
do médico será apurada mediante verificação de culpa.
90
ALMEIDA, João Batista. A Proteção Jurídica do Consumidor, p. 91.
91
CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA. Conselho Federal de Medicina. Disponível em:
http://www.cfm.org.br/codetic.htm. Acesso em: 28 abr. 2009.
70
Uma corrente doutrinária, minoritária, assim se manifesta: mesmo que o médico seja
empregado do nosocômio, há que se verificar se este agiu ou não com culpa, para só então, se
determinar a responsabilidade do hospital. Seja o médico empregado ou não, a
responsabilidade médica será sempre regida pelo § 4º do artigo 14 do código consumeirista. O
atuar do médico estabelecerá a responsabilidade do hospital.
92
STOCO, Rui. Responsabilidade civil dos hospitais, sanatórios, clínicas, casas de saúde e similares em face do
código de defesa do consumidor. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 84, n.712, fev. 1995, p. 72.
71
93
CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA. Conselho Federal de Medicina. Disponível em:
http://www.cfm.org.br/codetic.htm. Acesso em: 28 abr. 2009.
72
Em síntese, diante do dano supostamente causado por erro médico, em primeiro lugar
há que se verificar a conduta do médico, se isenta de culpa, nem ele nem o hospital
respondem. Se culposa, o hospital, sendo ele o demandado, terá o dever de indenizar com
base na culpa presumida do patrão, tendo direito de, regressivamente, reaver do médico o
montante que houver despendido da indenização. Se a ação for proposta somente em face do
médico este responde pela indenização se comprovada culpa.
94
KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico, p. 193.
73
A prova que o consumidor terá que produzir quando a ele competir o ônus probandi,
será no sentido de demonstrar a conduta (omissiva ou comissiva) culposa do médico em uma
de suas modalidades, dolo, negligência, imprudência ou imperícia; o dano perpetrado; o nexo
causal entre a conduta e o dano; incluindo-se também, as hipóteses em que o médico violar as
disposições contidas do Código de Defesa do Consumidor relacionadas à proteção contratual,
às práticas abusivas, à publicidade e oferta, conforme já evidenciado.
Os meios de prova em que poderão ser úteis na elucidação dos fatos envolvidos em
uma demanda por erro médico incluem: o prontuário médico, os atestados médicos, os termos
de consentimento, o contrato devidamente formalizado, os termos de responsabilidade, a
prova pericial, a prova testemunhal, além de outras. Ressalte-se que os meios de prova
mencionados podem ser utilizados por qualquer um dos envolvidos no litígio, seja autor ou
réu.
Erro médico indenizável é o que resulta de uma ação ou omissão culposa do médico
no exercício de sua profissão, refletindo-se um dano para o paciente. O dano pode ser
74
O regramento da indenização está estabelecido nos artigos 944 e 954 do Código Civil,
lembrando que a reparação do dano encontra parâmetros na sua extensão e, com a inovação
trazida pela Lei Civil vigente, na gravidade da culpa, levada em consideração quando o juiz
95
AGUIAR JR., Rui Rosado de. Responsabilidade Civil do Médico, p. 49.
96
BITTAR, Carlos Alberto. Reparação Civil por Danos Morais. 2. Ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais,
1998.
97
DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. 6 ed. Rio de janeiro: Forense, 1979. v. 2. p. 431-432.
75
O erro médico pode ocasionar uma série de danos ao paciente, tais como: a morte, o
comprometimento de sua integridade física, a produção de lesões, o agravamento da
enfermidade que o acomete, a inabilitação para o trabalho, dentre outros. Na avaliação do
dano e sua conseqüente quantificação, alguns parâmetros devem ser observados98:
d) Se a lesão resultou dano moral ou dano estético, a quantificação será definida pelo
prudente arbítrio do juiz.
98
KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico, p. 112-133..
99
GOMES, Júlio Cézar Meireles; FRANÇA, Genival Veloso de. Erro Médico: um enfoque suas origens e
conseqüências, p. 165-166.
76
segunda, esboçada por Rui Stoco100 entende que o dano estético é absorvido pelo dano moral
e como tal, deverá ser indenizado.
Deve-se ter em mente que além da indenização prevista nos dispositivos da Lei Civil,
o médico responsabilizado pelo cometimento do dano resultante de um erro seu, responderá
aos seus órgãos de classe, nos termos de seu diploma ético, poderá sofrer as sanções previstas
pelo Código de Defesa do Consumidor além de responder, conforme o caso, na esfera penal.
100
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil, p. 128.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O inconformismo faz parte da natureza humana. Não há aquele que ao se sentir lesado
não busque, de alguma forma, a reparação ou a compensação do prejuízo sofrido. Longe vão
os tempos em que a vingança privada era a forma de se fazer justiça. Sob a tutela do Estado,
os indivíduos passaram a contar com instrumentos jurídicos que lhes possibilitam buscar a
satisfação do interesse violado. Nessa esteira, o Código de Defesa do Consumidor, operou
verdadeira revolução no campo jurídico, reconhecendo a vulnerabilidade do consumidor, ao
mesmo tempo em que lhe propiciou meios que facilitem a defesa de seus interesses.
dever de indenizar emergirá quando no serviço prestado puder ser comprovada a negligência,
a imprudência ou a imperícia. Por ser obrigação de meio e não de fim, cabe ao paciente o
ônus da prova, todavia, com a possibilidade de inversão do encargo probatório, sempre que
presentes a hipossuficiência do consumidor ou a verossimilhança da alegação, analisadas pelo
juiz, no caso concreto.
Invertido o ônus da prova, nos parece que o mais correto é considerar a existência de
culpa presumida. Ao produzir a prova liberatória de sua responsabilidade, quando esta lhe
couber, o médico deverá comprovar a inexistência de culpa dos atos por ele praticados, não
ficando vinculado apenas às hipóteses liberatórias previstas pela legislação consumeirista,
caso contrário, se torna difícil compreender a intenção do legislador ao excepcionar a
responsabilidade dos profissionais liberais.
Com isso, não se quer negar a existência de erros médicos, nem retirar daquele que se
sentir lesado o direito de buscar a tutela jurisprudencial, mas, sobretudo, se quer alertar para a
necessidade de prudência ao imputar ao médico uma conduta culposa, sob pena de se
inviabilizar o exercício da medicina.
Nos parece que uma série de dissabores poderia ser evitada se o relacionamento
médico-paciente fosse, primordialmente, pautado no respeito mútuo, se houvesse o resgate da
pessoalidade na prestação do serviço, sobretudo, se o médico além de desempenhar seu ofício
com profissionalismo e diligência, cumprisse o dever de informar ao paciente todas as
vicissitudes que envolvem o serviço prestado.
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