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CAPÍTULO 16 REFERÊNCIAS

Registros Médicos, Certificados e


Atestados
Marcelo Vieira de Lima
Lucia Campos Pellanda
Moacir Assein Arús

A qualidade dos registros médicos, sobretudo dos prontuários e


documentos de comunicação entre pontos assistenciais e/ou outros
setores a ns do setor saúde, é fundamental para que os atributos
longitudinalidade e coordenação da atenção estejam fortemente
presentes nos serviços de saúde. Além disso, a qualidade e precisão
dos documentos médicos destinados aos pacientes, como receitas,
certi cados e atestados, é imprescindível para que a comunicação
formal entre médicos e pacientes se desenvolva com uma base clara
e respeitosa.
Complementarmente, os registros médicos extrapolam a
importância médico-cientí ca, ao tangenciar as esferas
administrativas e judiciárias, o que faz desses documentos
relevantes peças comprobatórias. Assim, não se deve considerar tais
documentos como mera formalidade burocrática, sob pena de
prejudicar o atendimento ao paciente e o avanço da ciência, bem
como possíveis implicações administrativo-judiciárias.

ATESTADOS
Os atestados médicos, também conhecidos como certificados médicos, são as
declarações redigidas por autoridade médica, relativas a fatos médicos, cuja
finalidade é afirmar o estado mórbido ou de higidez de um paciente. Do ponto de
vista ético-legal, trata-se do ato de afirmar ou provar em caráter oficial.

É parte integrante do ato médico, e seu fornecimento caracteriza-


se em um direito inquestionável do paciente, não gerando qualquer
majoração de honorários.
Os atestados médicos são notoriamente reconhecidos pela
sociedade, apresentando alto valor moral e legal, pois gozam da
presunção de veracidade, devendo ser acatados por quem de direito,
salvo se houver divergência de entendimento por médico da
instituição ou perito.
Esses documentos têm o poder de:
→ Autorizar o registro civil.
→ Permitir a admissão, o afastamento e o retorno ao trabalho.
→ Gerar licenças médicas.
→ Gerar ou suspender interdição judiciária.
→ Gerar indenizações.
→ Conceder aposentadorias.
→ Autorizar o sepultamento de cadáveres.
→ Contribuir para decisões judiciais e policiais.
Apesar de seu imenso valor, os atestados médicos são
considerados documentos o ciosos, ou seja, podem ser contestados.
Isso se dá porque tal documento emite a opinião de um médico
sobre o estado de saúde de um paciente. Há um caráter subjetivo,
logo questionável. Um exemplo dessa subjetividade é o provável
tempo de consolidação e recuperação funcional de uma fratura
óssea: para um médico, pode ser de 45 dias, enquanto, para outro,
pode ser de 60 dias. A contestação, porém, deve ser realizada pelo
reexame do estado mórbido atestado, de preferência por meio de
junta médica.
O fato de o médico atestar para sua própria família não pode ser
considerado infração ética, pois não existe expresso impedimento a
respeito, salvo nos casos de perícias judiciais ou em situações como
as de doenças graves e de toxicomanias. Porém, nas duas últimas
situações, o fornecimento de atestado não é proibido quando se
tratar do único médico da localidade.1 No entanto, é importante
observar que não é aceitável que o médico ateste para si mesmo.
Há vários tipos de atestado médico, a depender do m a que se
destina:

Atestado de doença
Tem por objetivo declarar a impossibilidade de exercer
determinada função ou atividade no âmbito trabalhista-
previdenciário, na prática de exercícios físicos ou no uso de
transportes coletivos. Serve, ainda, para esclarecer aos órgãos
competentes que o solicitante é portador de uma alteração
funcional, possibilitando o direito a pleitear uma vaga especial em
concursos públicos ou processos seletivos. Do ponto de vista
jurídico, pode, por exemplo, justi car a interdição judicial de uma
pessoa em caso de esta não poder, por motivo de doença, responder
pelos seus atos.

Atestado de saúde
Informa sobre a boa condição psicofísica do solicitante para o
desempenho de determinada função ou atividade no âmbito
trabalhista-previdenciário, na prática de exercícios físicos ou para
ns jurídicos, como para o cancelamento da interdição judicial.

Atestado para a realização de atividade física


Em geral, é necessário um exame dirigido e focado em aspectos
especí cos da saúde para participação em atividades físicas. No
entanto, esse tipo de exame é um dos poucos momentos de contato
de um adulto jovem com o sistema de saúde, e é válida uma
abordagem mais detalhada e abrangente, oportunizando,
principalmente, orientações de promoção de saúde e prevenção de
doenças.
A história pode ser dirigida com o objetivo de identi car
condições que excluam a pessoa da participação em atividades
físicas. É recomendável fazer perguntas a respeito do estado geral de
saúde, história mórbida pregressa, hospitalizações, uso de álcool e
drogas e limitações de função, além de realizar revisão dos sistemas
cardiovascular, pulmonar e musculoesquelético.
O exame físico compreende os seguintes aspectos:
→ Avaliação do sistema cardiovascular: envolve medida da pressão
sanguínea arterial, palpação dos pulsos periféricos, ausculta
cardíaca. Alguns autores recomendam que o paciente corra ou
caminhe por 12 minutos, sendo então examinado, na busca de
alterações hemodinâmicas ou asma induzida pelo exercício.
→ Exame ortopédico: inclui exame de lesões prévias para avaliar
dé cit residual, além de exame do joelho e da articulação
coxofemoral ou de outras articulações de maior risco para o
esporte especí co a ser praticado.
Raramente são necessários exames complementares.
As principais contraindicações ou limitações para participação
em esportes estão descritas no Capítulo Promoção da Atividade
Física.

Atestado de vacina
Pode ser englobado no atestado de saúde. Serve para comprovar
o estado vacinal do paciente, sendo mandatório constar os tipos de
vacinas, as datas de aplicação e as respectivas doses.
Atestado médico administrativo
Tem seus efeitos perante as repartições públicas. São exemplos
licença-maternidade, para doação de sangue, para abono de faltas
ou para consentimento de aposentadoria por invalidez.

Atestado médico judicial


Destina-se para ns judiciais, sendo requisitado ou não pelo
Juízo. Vale ressaltar que qualquer atestado médico pode se tornar
atestado judicial quando este é anexado aos autos judiciais.

Atestado de óbito
O Ministério da Saúde reserva a denominação declaração de óbito
ao documento fornecido pelo médico e atestado de óbito à parte VI
desse documento (FIGURA 16.1). Certidão de óbito é o documento
fornecido pelo Cartório de Registro Civil.
Com ele é realizado o registro de óbito no cartório, sem o qual
não se pode realizar o sepultamento.

O atestado de óbito tem extrema importância, pois permite cessar juridicamente a


vida de uma pessoa. O seu correto preenchimento é imprescindível, visto que tal
documento subsidia decisões administrativas, jurídicas e, em um contexto maior,
estudos médico-sanitários a partir de análises estatísticas. Portanto, o correto
preenchimento deste documento auxilia o planejamento e a avaliação das políticas e
dos programas de saúde no país.

Tendo em vista os aspectos legais envolvidos, são feitas as


seguintes recomendações aos médicos responsáveis pelo
preenchimento de tal documento:2
→ Atestar todos os óbitos, inclusive os fetais, ocorridos em
estabelecimentos de saúde, domicílios ou outros locais.
→ Conscientizar-se da responsabilidade por todas as informações
contidas no atestado de óbito.
→ Assinar o documento somente após o total preenchimento, não
devendo assiná-lo em branco ou deixar declarações previamente
assinadas.
→ Veri car se todos os itens de identi cação estão devida e
corretamente preenchidos.
→ Saber que o documento é impresso em papel especial carbonado,
em três vias e, antes de ser preenchido, o conjunto deverá ser
destacado do bloco.
→ Preencher os campos à máquina ou em letra de forma com
caneta esferográ ca.
→ Evitar, sempre que possível, emendas ou rasuras. Caso isso
ocorra, o conjunto deve ser anulado e encaminhado ao setor de
processamento para controle.
→ Evitar deixar campos em branco, colocando o código
correspondente a Ignorado, ou um traço (–), quando não se
conhecer a informação solicitada ou não se aplicar ao item
correspondente.

Como preencher a causa da morte


As estatísticas de mortalidade segundo causas de morte são
produzidas atribuindo-se ao óbito uma só causa, a chamada causa
básica. A causa básica, por recomendação internacional, deve ser
informada na última linha da parte I, ao passo que as causas
consequenciais, caso existam, devem ser informadas nas linhas
anteriores.
É de suma importância que, na última linha, o médico informe
de maneira correta a causa básica, para que se tenham dados
con áveis e comparáveis sobre mortalidade segundo a causa básica
ou primária, de modo a subsidiar estudos do per l epidemiológico
da população.
Na parte II, registra-se qualquer outra condição mórbida
signi cativa que tenha contribuído para a morte do paciente, sem
estar, no entanto, diretamente relacionada com a doença ou situação
patológica que causou a morte, não sendo, portanto, registrada na
parte I.
A FIGURA 16.2 mostra três exemplos de preenchimento correto
da causa básica.
Cabe ressaltar que, nos casos de óbitos fetais, não se deve anotar
o termo “natimorto”, mas sim a causa ou causas do óbito fetal.
A codi cação da parte I e II com o código da Classi cação
internacional de doenças (CID-10) é realizada por técnicos da Equipe
de Informação da Coordenação Geral de Vigilância em Saúde da
Secretaria Municipal de Saúde. Assim, as áreas sombreadas à direita
de cada alínea não devem ser preenchidas pelo médico.
Nos casos de mortes violentas (homicídio, suicídio ou acidente),
não naturais ou suspeitas, a lei determina que a declaração seja
fornecida obrigatoriamente por peritos médico-legais, após a
necropsia, salvo nas localidades onde existir apenas um médico, que
será então responsável pelo fornecimento da declaração.

FIGURA 16.1 → Campo do atestado de óbito relativo à causa da morte.


FIGURA 16.2 → Exemplos de preenchimento correto do atestado de óbito.
Os atestados de óbito de pessoas falecidas de morte natural sem
assistência médica deverão ser fornecidos por médicos do serviço de
veri cação de óbitos, nas cidades onde houver tal serviço, por
médicos do serviço público de saúde mais próximo do local onde
ocorreu o evento ou, na falta destes, por qualquer outro médico da
localidade. Em quaisquer dos casos, deverá constar no atestado que
a morte ocorreu sem assistência médica.1
Nos casos de morte fetal ou natimorto, os médicos que prestaram
assistência à mãe devem fornecer a declaração de óbito do feto,
quando a gestação tiver duração igual ou superior a 20 semanas ou
o feto tiver peso corporal igual ou superior a 500 g e/ou estatura
igual ou superior a 25 cm.1
Ao óbito feminino em idade fértil (10 a 49 anos) correspondem
campos especí cos na declaração de óbito que visam obter
informações para elaboração de programas de proteção à saúde da
mulher e à diminuição da mortalidade materna.

Modelo de atestado médico


A FIGURA 16.3 ilustra um atestado de doença, por ser o mais
comum na prática médica. Serve ainda como modelo para atestados
junto ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
FIGURA 16.3 → Um atestado de doença.

Informações importantes que devem constar nos


atestados
O médico deve atentar a todos os detalhes ao elaborar um
atestado médico, pois, como já citado, todo atestado médico é, em
potencial, um documento judicial. O desleixo ou descuido no
preenchimento deste e de outros documentos médicos pode
comprometer seriamente a carreira pro ssional do médico emissor.3
Registro dos dados de maneira legível: a perfeita compreensão do
conteúdo do atestado médico é item de suma importância, inclusive
salientado na Resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) no
1.851/2008, porém alguns médicos não cumprem tal determinação,
estando, dessa forma, expostos a sanções éticas.
Identi cação do médico emissor do atestado: inclui o nome e
sobrenome do médico, o endereço completo onde se deu o
atendimento, o número de inscrição no Conselho Regional de
Medicina (CRM) e suas especializações, caso as possua. A utilização
de carimbo do médico em receita é opcional, pois não há
obrigatoriedade legal ou ética. O que se exige é a assinatura com
identi cação clara do pro ssional e seu respectivo CRM.
Alguns médicos têm adotado a impressão eletrônica de sua
assinatura no atestado. Esse procedimento deve ser evitado, pois,
além de não ser reconhecida como assinatura, facilita muito a
fraude. Deve-se também evitar o uso de caneta preta, a m de
di cultar possíveis falsi cações.
Motivo do atestado: deve-se discriminar o motivo do atestado – para
ns trabalhistas, para ns de prática desportiva, para ns de
concurso público, entre outros. O termo “para os devidos ns” é um
erro muito frequente nos atestados médicos, e em mãos erradas
pode comprometer a carreira do médico. É importante ser especí co
na discriminação do motivo do atestado.
Pedido do paciente ou pedido do Juízo: tal informação declara
expressamente que o documento emitido foi uma solicitação do
paciente ou do Juízo, e não de terceiros. Como o atestado médico é
utilizado para diversos ns, com essa informação e com a assinatura
do paciente no documento, ca o médico resguardado de sanções
éticas ou mesmo cíveis no que tange à revelação de diagnóstico ou
de outras informações.
Identi cação do paciente: inclui o nome completo do paciente, sem
abreviações, e o número do registro de sua carteira de identidade. O
médico deve sempre realizar a identi cação do paciente com um
documento o cial com foto. Em caso de menor ou interdito, a prova
de identidade deverá ser exigida de seu responsável legal.
Não são poucas as vezes em que, para gerar um álibi, um
criminoso solicita a um cúmplice que faça uma consulta médica em
seu lugar. Desta feita, o documento médico comprova que naquela
determinada hora e local o criminoso não se encontrava no local do
crime.
“Foi por mim examinado na data de hoje”: essa informação indica que
o exame foi realizado pelo médico que assina o atestado na data
comunicada.
“Tendo sido recomendados”: ca expresso, pelo médico autor do
atestado, a recomendação que se segue, sendo de responsabilidade
única e exclusiva do paciente o cumprimento ou não de tal
recomendação.
Tempo de afastamento: deve ser informado em numeral e por
extenso. Tal cautela serve para evitar a adulteração do tempo de
afastamento. É aconselhável também anotar no prontuário a
informação relativa a esse tempo, pois serve como prova e
parâmetro do tempo em que o paciente se encontra em repouso. Se
o número de dias for inferior a 10, recomenda-se colocar o número
0 antes do número de dias. Por exemplo, 05 (cinco) dias.
Outro erro comum, encontrado nos atestados médicos, é a
sugestão de afastamento por tempo indeterminado. Se o médico não
conseguir determinar o tempo de recuperação do paciente, deverá
estimar um intervalo periódico para reavaliar o caso em questão,
como 03 meses, 06 meses. Se a doença gerou uma sequela, é
incurável ou terminal, deverá o médico descrever essa informação
de forma ética, ou seja, com a anuência expressa do paciente. Por
exemplo, apresenta doença com sequela de nitiva.
O médico deve, ainda, evitar sugerir aposentadoria se não for
perito judicial ou previdenciário, pois se trata de atribuição
exclusiva desses pro ssionais.
Informação do código da CID-10: os médicos somente podem fornecer
atestados com o diagnóstico codi cado ou não quando por justa
causa, exercício de dever legal, solicitação do próprio paciente ou de
seu representante legal.
Quando a solicitação for feita pelo paciente ou seu representante
legal, este deve expressar a sua anuência com sua assinatura no
rodapé do atestado, acompanhado da expressão “autorizo a
informação do código da CID-10”.
Datação do documento: informa a data da elaboração do documento.
Não são raros erros de datação, como a datação futura (semelhante
ao cheque pré-datado) ou mesmo a ausência de data, o que anula
totalmente o valor do documento médico.
Outros dados médicos: o atestado médico pode ainda conter:
→ Os resultados dos exames complementares.
→ A conduta terapêutica.
→ O prognóstico.
→ As consequências para a saúde do paciente.

Aspectos legais
O CFM de niu, no Código de Ética Médica, vários fatores
importantes a serem observados quando da elaboração de atestados
médicos.
É vedado ao médico:
Art. 80. Expedir documento médico sem ter praticado ato pro ssional que o justi que,
que seja tendencioso ou que não corresponda à verdade.
Art. 81. Atestar como forma de obter vantagens.
Art. 82. Usar formulários de instituições públicas para prescrever ou atestar fatos
veri cados na clínica privada.
Art. 83. Atestar óbito quando não o tenha veri cado pessoalmente, ou quando não tenha
prestado assistência ao paciente, salvo, no último caso, se o zer como plantonista, médico
substituto ou em caso de necropsia e veri cação médico-legal.
Art. 84. Deixar de atestar óbito de paciente ao qual vinha prestando assistência, exceto
quando houver indícios de morte violenta.
Art. 86. Deixar de fornecer laudo médico ao paciente ou a seu representante legal quando
aquele for encaminhado ou transferido para continuação do tratamento ou em caso de
solicitação de alta.
Art. 91. Deixar de atestar atos executados no exercício pro ssional, quando solicitado
pelo paciente ou por seu representante legal.
Infelizmente, são frequentes as denúncias envolvendo esse tipo
de documento médico, em que processos ético-pro ssionais têm sido
gerados por indícios de atestados inidôneos ou mesmo falsos.

PRONTUÁRIO MÉDICO
Segundo o dicionário Porto, prontuário advém do latim
promptuariu, que signi ca despensa, armazém. Signi ca lugar onde se
colocam as coisas que são precisas a qualquer momento. Assim, o
prontuário médico pode ser de nido como um local onde
informações médicas sobre um paciente estão à disposição, para
serem observadas e utilizadas a qualquer momento.
Com os avanços tecnológicos, surgem os registros médicos
informatizados, tornando o uso dos dados do prontuário mais
amplo, abrindo espaço para ferramentas clínicas como geradores de
lembretes e facilitando a interação de diversos pro ssionais dentro
das redes de atenção que participam no cuidado de determinado
paciente (ver Capítulo Prontuário Eletrônico e Sistemas de
Informação em Saúde para Atenção Primária à Saúde).
O prontuário é universalmente utilizado e aceito no meio
médico, porém, muitas vezes, é usado de maneira inadequada. Erros
no preenchimento desse documento podem ter repercussões
gravíssimas para o paciente, para o médico e para a própria
medicina.
Um exemplo é o preenchimento ilegível da prescrição
medicamentosa, podendo ter consequências fatais, por levar à
administração de medicamentos ou doses erradas ao paciente.
A forma taquigrá ca de alguns prontuários, onde detalhes
importantes são omitidos, pode expor o médico a processos judiciais
e consequente desgaste moral e psicológico. De semelhante maneira,
em função da ilegibilidade, desorganização e omissão de dados
importantes, as pesquisas médicas realizadas pela avaliação do
prontuário são bastante prejudicadas. Esses tristes fatos nos levam a
crer que, de maneira geral, boa parte dos médicos desconhece a
importância ética, legal e cientí ca do prontuário médico.

De nição
Segundo a resolução do CFM no 1.638/2002, o prontuário
médico é um documento único constituído de um conjunto de
informações, sinais e imagens registradas, geradas a partir de fatos,
acontecimentos e situações sobre a saúde do paciente e a assistência
a ele prestada, de caráter legal, sigiloso e cientí co, que possibilita a
comunicação entre membros da equipe multipro ssional e a
continuidade da assistência prestada ao indivíduo.
Essa resolução informa ainda em seu Art. 2o que a
responsabilidade pelo prontuário médico cabe:
→ Ao médico assistente e aos demais pro ssionais que
compartilham do atendimento.
→ À hierarquia médica da instituição, nas suas respectivas áreas
de atuação, que tem como dever zelar pela qualidade da
prática médica ali desenvolvida.
→ À hierarquia médica constituída pelas che as de equipe,
che as da Clínica, do setor até o diretor da Divisão Médica
e/ou diretor técnico.
Como todo documento médico, este deve ser preenchido de
forma legível, com a clara identi cação dos envolvidos no cuidado
do paciente.

Aspectos legais
O prontuário médico é um instrumento extremamente valioso
para o paciente, seu médico e demais pro ssionais de saúde. Como
todo e qualquer documento médico-legal, o seu correto e completo
preenchimento, como já citado, permite ao médico sua eventual
defesa judicial perante a autoridade competente, em caso de
processos ético-legais.
Este aspecto ético-legal do prontuário levou o CFM a enfatizar,
em seu novo Código de Ética Médica, cuidados relativos a tal
documento:
É vedado ao médico:
Art. 85. Permitir o manuseio e o conhecimento dos prontuários por pessoas não obrigadas
ao sigilo pro ssional quando sob sua responsabilidade.
Art. 86. Deixar de fornecer laudo médico ao paciente ou a seu representante legal quando
aquele for encaminhado ou transferido para continuação do tratamento ou em caso de
solicitação de alta.
Art. 87. Deixar de elaborar prontuário legível para cada paciente.
§ 1° O prontuário deve conter os dados clínicos necessários para a boa condução do caso,
sendo preenchido, em cada avaliação, em ordem cronológica com data, hora, assinatura e
número de registro do médico no Conselho Regional de Medicina.
§ 2° O prontuário estará sob a guarda do médico ou da instituição que assiste o paciente.
Art. 88. Negar, ao paciente, acesso a seu prontuário, deixar de lhe fornecer cópia quando
solicitada, bem como deixar de lhe dar explicações necessárias à sua compreensão, salvo
quando ocasionarem riscos ao próprio paciente ou a terceiros.
Art. 89. Liberar cópias do prontuário sob sua guarda, salvo quando autorizado, por
escrito, pelo paciente, para atender ordem judicial ou para a sua própria defesa.
§ 1° Quando requisitado judicialmente o prontuário será disponibilizado ao perito médico
nomeado pelo juiz.
§ 2° Quando o prontuário for apresentado em sua própria defesa, o médico deverá
solicitar que seja observado o sigilo pro ssional.
Art. 90. Deixar de fornecer cópia do prontuário médico de seu paciente quando de sua
requisição pelos Conselhos Regionais de Medicina.

Com o advento do prontuário eletrônico, a resolução do CFM no


1.821/2007 de niu que é de no mínimo 20 anos o prazo, a partir do
último registro, para a preservação dos prontuários dos pacientes
em suporte de papel, que não foram arquivados eletronicamente em
meio óptico, micro lmado ou digitalizado.
Documentos que compõem o prontuário médico
A seguir, são detalhados os documentos que fazem parte do
prontuário médico ambulatorial, com ênfase em particularidades da
atenção primária à saúde (APS).4
Instituições hospitalares e grande parte dos serviços
ambulatoriais utilizam um prontuário médico para cada paciente.
Em APS, dada a importância da orientação familiar no processo de
cuidado, sugere-se que sejam utilizados prontuários familiares. Para
esse m, é considerada uma família o conjunto de moradores de
determinado domicílio, não importando se os laços que os unem são
relacionais ou biológicos.
O prontuário familiar é composto por documentos relativos ao
grupo familiar e documentos relativos a cada um dos indivíduos que
compõem esse grupo.
Os documentos comuns ao grupo familiar podem ser:
Capa ou envelope do prontuário: deve conter nome da instituição, o
título “Prontuário Médico”, o nome e número de registro da família,
assim como seu endereço.
Formulários com dados de identi cação da família: neles devem
constar os dados de identi cação do conjunto de indivíduos que
residem naquele domicílio. Os dados mínimos que devem fazer
parte de tal formulário são nome de cada um dos indivíduos,
número de registro civil e cartão SUS, se disponível, data de
nascimento, sexo, estado civil. Deve-se frisar que é imprescindível a
apresentação de documento o cial de identi cação com foto para
abertura do prontuário e/ou inclusão de mais um indivíduo.
Página do genograma: após o formulário com dados de
identi cação, é possível incluir uma folha em branco onde se pode
montar o genograma da família, pelo menos em seu aspecto
estrutural (ver Capítulo Abordagem Familiar).
Formulário sobre o domicílio: este pode conter, entre outros dados,
informações sobre tipo de domicílio, número de cômodos, destino
do lixo, tipo de esgoto, abastecimento de energia e água, presença
de animais domésticos e/ou de produção, condições ambientais e
valoração do grau de bem-estar familiar.
Os documentos relativos a cada indivíduo podem ser:
Formulários com dados de identi cação: neles devem constar os
dados de identi cação do paciente, como número de registro, nome,
local e data de nascimento (ou idade aproximada), sexo, estado
civil, nome dos pais, nome do cônjuge, pro ssão, pessoa
responsável, endereço, telefones, procedência.
Lista de problemas ou Formulário de diagnósticos: esse tipo de
documento é utilizado para se ter uma revisão rápida do histórico
do paciente. Nele constam a lista com os problemas de saúde, as
doenças diagnosticadas ou as hipóteses diagnósticas apresentadas
pelo paciente ao longo dos atendimentos realizados na instituição,
assim como as principais questões sociais que podem determinar
impacto na saúde do indivíduo ou seu grupo familiar. Cada
problema deve ser datado em relação ao seu início e, se aplicável,
ao seu nal. Pode, ainda, conter dados sobre alergias
medicamentosas. É interessante que junto deste formulário haja um
espaço destinado especi camente às medicações de uso prolongado,
assim como ao calendário vacinal apropriado a cada faixa etária.
Fluxograma de exames: nesse uxograma, em geral no formato de
quadro ou tabela, são registrados em ordem cronológica os
resultados dos principais exames diagnósticos, onde cada coluna
representa uma data e cada linha, um tipo de exame. Trata-se de um
recurso muito útil para acompanhar pacientes com doenças crônicas
ao longo do tempo.
Informações sobre anamnese e exame físico: este formulário deve
conter em seu cabeçalho minimamente o nome completo do
paciente, seu registro no serviço de saúde e, como complemento,
liação e data de nascimento. Para cada atendimento é
imprescindível que se registre a data e hora do atendimento.
A forma como se registra cada atendimento é muito variável.
Entretanto, serviços de saúde com grande experiência em APS
costumam utilizar como método de registro o SOAP, isto é, as
questões Subjetivas, as queixas/problemas, que o paciente traz à
consulta; o registro Objetivo dos achados do exame físico do médico
e os principais resultados de provas diagnósticas; a Avaliação do
médico frente ao conjunto de informações anteriores, isto é, suas
hipóteses diagnósticas e/ou os diagnósticos de nidos; e o Plano de
atuação, ressaltando as ações de responsabilidade do médico e as
que carem a cargo do paciente.
O formato mais extenso de anamnese-padrão, composto por
queixa principal, história da doença atual, história médica
pregressa, etc., pode ser utilizado em uma primeira consulta do
paciente junto ao serviço de saúde ou em outras oportunidades
quando o médico julgar necessário, mas, devido às características
dos atendimentos em APS, em grande número e comumente de
curta duração, o método SOAP é mais indicado. É importante que,
ao nal de cada atendimento, o médico assine e carimbe, com o
número de seu registro no CRM, o prontuário do paciente. Para
detalhes sobre registro de informações da família (genogramas,
ecomapas), ver Capítulo Abordagem Familiar.

O que não deve ser feito no prontuário


De forma a evitar transtornos médico-legais, a seguir são
descritos alguns cuidados que devem ser observados na elaboração
de um prontuário médico.
Não se deve:
→ Escrever a lápis.
→ Usar líquido corretor.
→ Deixar folhas em branco.
→ Fazer anotações que não se referem ao paciente.

Referências

1. França GV de. Medicina legal. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara


Koogan; 2011.
2. Brasil. Ministério da Saúde. Manual de instruções para o
preenchimento da declaração de óbito [Internet]. Brasília: MS;
2001 [capturado em 06 dez. 2011]. Disponível em:
http://www.unirio.br/hugg/arquivos/declaracao_obitos%20.pd
f.
3. Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM no 1.851/2008
[Internet]. Brasília: CFM; 2008 [capturado em 06 dez. 2011].
Disponível em:
http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2008/1851_
2008.htm.
4. Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal. Prontuário
médico do paciente: guia para uso prático [Internet]. Brasília:
CRM DF; 2006 [capturado em 06 dez. 2011]. Disponível em:
http://www.crmdf.org.br/sistemas/biblioteca/ les/7.pdf.

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