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Liderar ou chefiar: eis a questão

A discussão que ronda ultimamente a liderança parece ser sem fim.

Por Danilo España

A discussão que ronda ultimamente a liderança parece sem fim. Novos perfis
de líderes apareceram no front nas últimas décadas impactando a forma de
enxergarmos aquele que está no degrau acima. Líderes mais carismáticos,
envolventes, “chegados” ou visionários recheiam o mercado trazendo novos
ares e novas perspectivas. Mas, afinal, por que o “jeitão” da liderança impacta
tanto nosso dia a dia? Que tipo de gestor você quer ser hoje ou, em quem você
vai se inspirar para liderar no futuro?

Parafraseando o filósofo Mario Sergio Cortella: “O que é liderar? É ser capaz de


inspirar. Inspirar pessoas, ideias, projetos, situações. O líder é aquele que infla
vitalidade. Eu não estou usando a palavra ‘inspirar’ à toa. A noção de inspirar é
dar vitalidade. É animar. O líder é capaz de animar, palavra que vem do latim
anima e que significa alma… de anima vem ‘animal’, ‘animação’, ‘animado’.
A tarefa fundamental que desenvolve a liderança é ser capaz de inspirar as
pessoas. Muita gente não é capaz de inspirar, só é capaz de expirar. Tirar
animação, tirar vitalidade. Se alguém só expira, talvez não consiga ser líder, só
consiga ser chefe. Mas chefe está ancorado em uma hierarquia.” (do livro: Qual
é a tua obra? Inquietações propositivas sobre gestão, liderança e ética.)

O parágrafo acima já explica muita coisa, principalmente algumas das razões


pelas quais as empresas comandadas por líderes inspiradores geram bons
resultados para seus colaboradores e, por tabela, em seus negócios. Sempre
dizemos em nossos textos que ninguém motiva ninguém, mas somos capazes de
inspirar e gestores imbuídos dessa energia acabam sendo admirados e
seguidos.

Um dia desses, num evento de Excelência nos Negócios que mediei na Harvard
Business Review Brasil, escutei inúmeras vezes de grandes líderes que a gestão
de pessoas é pilar fundamental para a excelência da liderança. Um líder tem
de buscar compreender o que de fato motiva e inspira seus colaboradores. A
nova métrica diz que a motivação não é mais algo pasteurizado. Jaime Szulc,
presidente para América Latina da Goodyear disse: “A liderança tem de ser
humanista, é preciso ativar pessoas para que façam seu melhor. No fundo,
todos querem contribuir para o mundo que vivem”. E completa afirmando ser
um líder que acredita em motivar pessoas, “mas como pessoas são únicas para
cada uma delas o impulso será diferente”.

No mesmo evento, o professor Soumitra Dutta, reitor da Escola de Gestão da


Universidade de Cornell (Estados Unidos), fez algumas observações
interessantes: “Temos de pensar realmente fora da caixa. A excelência dos
negócios se baseia em dois pilares: inovação e gestão de pessoas”. Em relação
à gestão, ele disse: “Quanto mais tentarmos mudar o comportamento das
pessoas, menos motivadas elas estarão. Muitas vezes, líderes impõem seu jeito e
suas intenções no outro. Pessoas são diferentes e temos de perguntar o que as
motiva, entender o que é importante para cada uma delas”, afirmou.

“As empresas que buscam pela alta performance têm de saber cuidar da
felicidade de seus colaboradores e entender o que os faz acordar todos os dias
e seguir para o trabalho. A busca por um contexto e um ambiente em que
pessoas possam se desenvolver sentindo-se úteis e reconhecidas é um dos
grandes desafios dos dias de hoje. A verdade é que todos nós queremos nos
sentir competentes no que fazemos”, complementou o professor Soumitra.

Acho que é exatamente isso que torna o estudo mais complexo e, ao mesmo
tempo, mais interessante. Pessoas se motivam por fatores absolutamente
diversos e a compreensão desses fatores é o que está alterando as bases e
ferramentas de motivação. Pessoas querem mais do que remuneração. As
pessoas saíram da caixa. Não somos mais os laranjas mecânicas da Revolução
Industrial. O padrão comportamental passou por grandes mudanças, dando
espaço para que cada um pudesse assumir sua anima; cada qual vibrando
com impulsos diferentes.

A banda Titãs, no final dos anos 1980, foi visionária no que proclamou – de forma
simples, no sucesso “Comida”:

“A gente não quer só dinheiro

A gente quer dinheiro e felicidade

A gente não quer só dinheiro a gente quer inteiro e não pela metade…

Você tem sede de que? Você tem fome de que?…

Afinal, a gente tem fome de que? Tem sede de que?”

A música “Comida” ilustra bem o novo cenário lotado de pessoas que não
querem mais apenas o dinheiro. Querem se sentir inteiras, buscar seu propósito
e muitos anseiam deixar um legado. Querem existir além do café da manhã e
do jantar, preencher o vácuo e fazer valer a existência.

Para esses, o verdadeiro líder vai muito além da “chefia”, aquela figura de chefe
dos seriados antigos e desenhos animados. Aquele que ainda não mudou e
olhou para os olhos de seus colaboradores não vai assegurar por muito tempo
seu lugar ao sol. Os verdadeiros líderes inspiram, são personas que de algum
modo queremos seguir, continuar seus feitos e os acompanhar.

Fonte: Revista Exame. Disponível em: https://exame.abril.com.br

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