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AS SETE ARTES LIBERAIS
José Manoel Machado Farias Neto, MEDB 1
1. INTRODUÇÃO
A maçonaria tem por objetivo tornar feliz a humanidade. Para tanto, utiliza-se de
alegorias para estimular o maçom na sua evolução moral, por meio da subida da escada
em caracol. A Escada é símbolo da busca pela Verdade e do aperfeiçoamento moral,
intelectual e espiritual do homem.
Essa Escada está dividida em três conjuntos de degraus. Os três primeiros degraus
referem-se aos três Grão-Mestres que presidiram a construção do primeiro Templo de
Jerusalém: Salomão, Rei de Israel; Hiram, Rei de Tiro; e Hiram Abiff.
A segunda etapa da subida é composta por um conjunto de cinco degraus. Esses
degraus referem-se aos cinco sentidos que o maçom deve desenvolver para evoluir e se
aperfeiçoar. São eles: ouvir, ver, cheirar (olfato), apalpar (tato) e provar (paladar).
Podemos fazer uma analogia desses degraus com as cinco ordens nobres da Arquitetura:
toscana, jônica, dórica, coríntia e compósita.
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José Manoel Machado Farias Neto é Membro Efetivo do CMDB. Bacharel em Administração pela UPIS,
Especialista em Gestão Empresarial: Estratégia pela FGV e Especialista em Maçonalogia: História e
Filosofia pela UNINTER. Mestre Maçom, membro da Loja Abrigo do Cedro nº 8 e da Loja de Estudos e
Pesquisas Dom Bosco nº 33 da Grande Loja Maçônica do Distrito Federal – GLMDF. E-mail para contato:
josemanoelfarias@hotmail.com.
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Ao analisar essa segunda etapa de degraus, podemos associar os sentidos com as
ordens arquitetônicas e, além disso, caso adicionemos os estudos de Rizzardo da Camino
(2006), teremos o seguinte quadro:
Por fim, ressalta-se que “a Maçonaria tem as suas bases para os seus
ensinamentos simbólicos na Arquitetura material, moral, física, social, intelectual e
espiritual” (DA CAMINO, 2006).
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A terceira etapa da subida é composta por sete degraus, esses degraus são
representados por sete artes liberais, são elas: gramática, retórica, lógica, aritmética,
geometria, música e astronomia.
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Califado em 730 d.c.
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As primeiras leis escritas foram organizadas no período Carolíngio, eram
chamadas “Capitulares” por serem organizadas em capítulos. Essas leis, entre outros
assuntos, estruturou a educação com base na unificação da cultura grega e cristã. Carlos
Magno reuniu em sua corte os maiores intelectuais da época, como o bispo Isidoro de
Sevilha 2 e o monge britânico Alcuíno de Yorque (735 – 804 d.c), e promoveu o que ficou
conhecido como Renascimento Carolíngio.
Alcuíno de Yorque
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Texto retirado da obra de Isidoro de Sevilha ou Isidorus Hispalensis (560 – 636 d.c.): foi arcebispo de
Sevilha, teólogo e enciclopedista. Sua enciclopédia, As Etimologias ou As Origens, serviu como o texto
escolar usado por toda a Idade Média. As Etimologias buscavam não somente as origens das palavras, mas
registrar o conhecimento da Antiguidade clássica.
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De Herrad de Landsberg da obra HortusDeliciarum (século XII). Hortusdeliciarum (em
português, Jardim de Delícias) é uma iluminura medieval compilada por Herrad de
Landsberg na Abadia de Hohenburg, na Alsácia, França. Iniciado em 1167 e concluído em
1185, serviu como um material pedagógico para as noviças do convento.
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3.1 Trivium
As artes do Trivium teriam como objetivo desenvolver a expressão
da linguagem. Segundo Isidoro de Sevilha (EPISCOPI, 1911):
Platão e Aristóteles propuseram a seguinte diferença entre arte e disciplina,
dizendo que a arte reside naquelas coisas que são capazes de serem diferentes
do que são; mas disciplina é seguramente o que aborda aquelas coisas que não
podem ser mudadas. Assim, quando algo é discutido com argumentações
verdadeiras prova-se ser uma disciplina; mas quando se discute algo verossímil
e sujeito à opinião aplica-se o termo arte.
3.1.1 Gramática
A Gramática pode ser considerada a base das ciências liberais, já que para o
registro histórico, o conhecimento da escrita é fundamental. Etimologicamente oriunda
da letra grega Grama (Γ ou γ; em grego: γάμμα, transl.: gámma), é arte de escrever de
forma ordenada e qualificada, de forma a repassar o integral conteúdo do que se deseja
transmitir a quem lê (EPISCOPI, 1911).
As primeiras gramáticas se originaram na Idade do Ferro, na Índia, com Yaska
(VI a.c.). No Ocidente, a gramática surgiu como uma disciplina do helenismo a partir de
século III. a.c. com autores como Rhyanus e Aristarco de Samotrácia. A mais antiga
obra existente, Arte da Gramática (Τέχνη Γραμματική), é atribuída ao gramático
grego Dionísio, o Trácio (100 a.c.), e serviu de base para as gramáticas grega, latina e de
outras línguas europeias até o Renascimento.
3.1.2 Retórica
A retórica é a ciência do falar bem com eloquência em persuadir ao que é justo
e bom. Enquanto na gramática aprendemos a falar corretamente, na retórica descobrimos
de que forma expressar as coisas aprendidas (EPISCOPI, 1911).
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As Sete Artes Liberais da Idade Média Segundo Gravuras de
Cornelis Cort (1565).
3ARISTÓTELES, Retórica. Traduções e Notas de Edson Bini. Editora Edipro, 1ª edição. São Paulo –
SP, 2017.
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3.1.3 Dialética ou Lógica
Segundo Isidoro de Sevilha, “a dialética é a disciplina que visa determinar as
causas das coisas. Em si mesmo é a subdivisão da filosofia que é chamada de lógica, isto
é, a capacidade racional de definir, inquirir e discutir” (EPISCOPI, 1911).
Na oportunidade, cabe uma breve explicação de Alcuíno de Yorque sobre a
diferença entre Retórica e Dialética:
A dialética está para a retórica assim como, na mão, o punho fechado está para
a palma aberta. Aquela conclui os argumentos numa breve oração; esta pelos
campos da eloquência discorre com um verbo. Aquela contrai o discurso; esta
o distende. A dialética é mais aguda no descobrimento da matéria; a retórica é
mais eloquente para falar o que foi descoberto; aquela visa às pessoas
estudiosas; essa frequentemente é dirigida ao povo (Alcuíno de York, 1851).
A Lógica clássica foi enunciada pela primeira vez por Aristóteles, que determinou
as leis para um raciocínio correto mediante silogismos. Pode ser definida como a ciência
que trata dos princípios válidos do raciocínio e da argumentação.
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3.2 Quadrivium
O quadrivium está associado com as ciências que nos ajudam a entender os
mistérios do universo. Pitágoras escreveu o Matentetrade, livro da doutrina do que depois
foi chamado de Quadrivium. Ele é o principal responsável pelos quatro ramos da ciência
que estão voltados para o estudo da matéria por meio do domínio das seguintes
disciplinas: aritmética (a teoria dos números); geometria (a teoria do espaço);
música (a aplicação da teoria do número) e astronomia (a aplicação da teoria do espaço)
(TEIXEIRA, 2016).
3.2.1 Aritmética
A origem do cálculo remonta aos babilônios, egípcios e chineses muito antes do
século IV a.C.. Porém, foi a partir Pitágoras que houve a organização da matemática
enquanto ciência.
A Aritmética oferece um sistema estruturado, com regras, ordem, e opera em
termos de equações. Seu estudo é progressivo e o equilíbrio e igualdade são princípios
aprendidos na aritmética que deve lembrar-nos de agir sobre o nível. Com ela,
descobrimos a beleza das simetrias e das proporções.
As Sete Artes Liberais da Idade Média Segundo Pitágoras de Samos (570 a.C a 495 a.C.)
Gravuras de Cornelis Cort (1565).
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Diversos exemplos de onde encontramos a aplicação da espiral de Fibonacci.
3.2.2 Geometria
A Geometria é a parte da matemática que estuda as questões de forma, tamanho e
posição relativas a objetos e sua aplicação num espaço. As ferramentas de geometria são
o esquadro, o compasso, o nível e o prumo. Estas são as ferramentas básicas de maçons
operativos que hoje usamos na Maçonaria especulativa para ensinar lições de
comportamento correto, retidão de caráter e veracidade.
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arquitetura universal e é por meio da ciência que desenvolvemos a percepção de
profundidade das estruturas e a disposição dos objetos no espaço.
3.2.3 Música
A música é a combinação de sons de instrumentos ou vocalizados de forma
harmoniosa e organizados resultando numa composição. A música é o conhecimento
prático da melodia, que consiste em som e canto (EPISCOPI, 1911). A denominação
“música” derivou das “musas”, porque por meio delas, pensava-se e se buscava inspiração
para desenvolver canções e melodias com a voz.
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As Sete Artes Liberais da Idade Média Segundo
Gravuras de Cornelis Cort (1565).
3.2.4 Astronomia
Astronomia é o estudo dos astros e dos corpos celestes. Essa ciência nos ensina a
admirar e a estudar o universo (EPISCOPI, 1911). O estudo da astronomia remonta às
pesquisas herméticas, zoroástricas, egípcias e gregas. A orientação pelos astros contribuiu
para o progresso da humanidade com sua utilização desde os antigos navegadores com o
uso do Astrolábio até os modernos navegadores espaciais com a utilização de satélites.
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A Astronomia foi também motivo de disputas entre estudiosos e a igreja,
resultando em algumas condenações e mortes na fogueira, num flagrante exemplo de
censura à busca da verdade que se contrapõe aos dogmas católicos.
Na maçonaria, a astronomia pode ser observada no “Céu” da Loja,
simbolicamente, representa por uma Abóbada Celeste. Ao observar essa Abóboda,
encontramos constelações, estrelas, planetas e até alegorias ritualísticas relativas à
movimentação anual e diária do Sol (solstícios e equinócios; meio-dia, meia-noite).
4. CONCLUSÃO
As Artes Liberais, ou Ciências do Companheiro, são o ponto de partida para a
evolução. Do detalhamento de cada uma destas ciências, surgiram as ciências modernas
e o modo que vivemos atualmente.
Para que um maçom possa, com segurança, penetrar o espírito da maçonaria, ele
deve deixar o estudo dos materiais de construção, próprios do Aprendiz Maçom, para
procurar nas ciências, a sua interpretação moral e, principalmente, a espiritual.
Portanto, a constante busca pela verdade leva o homem a se dedicar à felicidade
de seus semelhantes. O estudo das artes liberais e da ciência é um caminho para o
desenvolvimento do ser humano no sentido moral e intelectual e, portanto, a base para o
desenvolvimento do próprio espírito.
Para finalizar, segundo Leonardo di Ser Peiro Da Vinci (1452 – 1519): "Aqueles
que estão apaixonados pela prática, sem a Ciência, são iguais ao piloto que navega sem
leme e bússola e nunca tem certeza, para onde vai. A prática deve estar sempre baseada
em um perfeito conhecimento teórico" (Leonardo da Vinci, The Notebooks of Leoando
da Vinci, Vol II, Cap.XXIX, 2016).
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5. BIBLIOGRAFIA
ALCUÍNO DE YORK. De Dialetica. in: ALCUIN, Opera Omnia, 2 vols. Paris, 1851.
(Migne, Patrologia Latina, C, CI).
CANELLA, Lidice: As viagens dos Vassalos do Rei Salomão ao Rio das Amazonas. João
Pessoa, 2011.
CASACA, Isabela Abes. Carlos Magno e as Artes Liberais. Escola de Artes Liberais,
2016. Disponível em https://escoladeartesliberais.com.br/carlos-magno-e-as-artes-
liberais/; Acesso em 21/11/2021.
DA CAMINO, Rizzardo: Simbolismo do Segundo Grau: Companheiro. São Paulo, Ed.
Madras, 2006.
EPISCOPI, Isidori Hispalensis: Etymologiarum sive originum - libri XX. Copyright 1911
by Oxford University Press American Branch.
ISMAIL, Kennyo. A letra “G” na Maçonaria. No esquadro, 2011. Disponível em:
https://www.noesquadro.com.br/simbologia/letra-g-na-maconaria/. Acesso em
22/11/2021.
JOSEPH, Sister Miriam: The Trivium: The Liberal Arts of Logic, Grammar, and Rhetoric.
Paul Dry Books Inc, 2002.
LEONARDO DA VINCI. The Notebooks of Leoando da Vinci, Vol II, Cap.XXIX. Dover
Publications, Inc. Mineola, New York, 2016.
RIVAS, R. Alcuíno de York: Obras morales. Introdução, tradução e notas. Espanha:
EUNSA, 2004.
TEIXEIRA, Thiago Brum. A Origem das Artes Liberais. Escola de Artes Liberais, 2016.
Disponível em: https://escoladeartesliberais.com.br/a-origem-das-artes-liberais/; Acesso
em: 21/11/2021.
TEIXEIRA, Thiago Brum. Carlos Magno e os Pilares da Civilização Ocidental. Escola de
Artes Liberais, 2016. Disponível em: http://escoladeartesliberais.com.br/carlos-magno-e-
os-pilares-da-civilizacao-ocidental/; Acesso em: 21/11/2021.
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Associações da Janela de Overton, com Espiral do Silêncio, Pós Verdade e
Liberdade de Expressão, no Contexto Maçônico. 1
Objetivo
Este trabalho tem por objetivo brevemente analisar os novos conceitos em uso pela
sociedade (Janela de Overton, Espiral do Silêncio, Pós Verdade e Liberdade de
Expressão), os quais estão em curso nas redes e mídia social, tendo em vista a conduta
dos obreiros, preconizada e disponível na Constituição e Regulamento Geral da
Maçonaria. Dessa forma, espera-se melhorar discussão e a harmonia nas Lojas e também
garantir a busca da Verdade, sem vieses ideológicos de qualquer natureza.
Introdução
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1 Adaptação do artigo, apresentado por Claudio Bellaver em 12/11/2020, em sessão da Loja Elos da Fraternidade 84,
GLSC. Concordia – SC
Como livres pensadores iniciáticos que somos, podemos aderir e aceitar aquilo que
uma maioria talvez o faça, sob o risco de nos tornarmos manipulados ou, rejeitar com
base em filosofias da ética e da lógica, sustentáculos da Arte Real. Assim sendo, é preciso
encontrar as relações dos novos padrões incluídas no título desse artigo, pois esses
interagem entre si na formação da opinião pública, fortemente influenciada pela
engenharia social, tão bem abordada no Dilema das Redes, da série Netflix (2021).
Joseph Paul Overton foi vice-presidente sênior do Mackinac Center for Public Policy. Ele possuía um
diploma de bacharel em engenharia elétrica pela Universidade Tecnológica de Michigan e um diploma de
Juris Doctor na Thomas M. Cooley Law School. Em meados dos anos 90, Joseph P. Overton, então membro
do Mackinac Center for Public Policy, elaborou um modelo de como os políticos reagem a diferentes
possibilidades de pauta legislativa. Essa teoria se preocupava em modelar como entes vulneráveis à
retaliação eleitoral de seus representados seriam obrigados, de certa forma, a obedecer determinadas
expectativas contextuais de atuação dentro de delimitados espectros de atuação legislativa. Como Overton
era ao mesmo tempo engenheiro elétrico de formação e possuía o título de juris doctor e sendo advogado
registrado na Michigan State Bar, talvez tenha contribuído para uma visão mais pragmática e mecânica da
ação estatal, exatamente um dos apelos da teoria que leva seu nome (Leite, 2018).
Resumidamente, ele estabeleceu que as opiniões sobre todos os assuntos podem ser
enquadradas num espectro alocado em um intervalo que vai desde o absolutamente
contrário até o absolutamente favorável, explicado por vários autores (França,2016;
Teodorico, 2018; Leite, 2021).
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judiciário. Como não existem boas estatísticas e não há interesse claro da busca da
verdade filosófica insofismável sobre aborto, a maioria da sociedade fica à mercê e
modelada, principalmente pela mídia tele-radio-jornalística.
Há boa literatura, artigos, vídeos que explicam com clareza como ocorre o
deslocamento da janela sobre questionamentos relevantes que existem na sociedade. Mas,
via de regra é necessário tempo para acomodação da opinião pública e publicidade para
aumentar o peso do grupo pró ou contra. Na janela de Overton, fica claro demonstrar que
o objetivo é manipular lentamente a opinião pública, sem que as pessoas percebam o
movimento.
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Aqui entra o segundo conceito, que ajuda entender a Janela de Overton. É a Espiral
do Silêncio, cuja teoria foi publicada em 1974 pela cientista política Elisabeth Noelle-
Neumann (1974).
Elisabeth Noelle-Neumann (19/12/1916 - 25/03/2010) foi uma cientista política alemã, professora de
Pesquisa em Comunicação na Universidade de Mainz e diretor do centro de resgate de opinião pública
Institut fur Demoskopie. Allensbach. Sua contribuição mais famosa é o modelo da espiral do silêncio,
detalhado no artigo The Spiral of Silence. A Theory of Public Opinion. O modelo é uma explicação de
como a opinião pública percebida pode influenciar as opiniões ou ações individuais.
Ela refere em seu trabalho que em uma sociedade quando um pequeno grupo de
indivíduos têm uma opinião contrária ou conflitante em relação a um grande grupo de
indivíduos, eles tendem a calar-se e omitir suas convicções por medo de serem bulidos,
excluídos ou, isolados. Então, não há problema no silenciar em determinadas posições,
até porque ninguém é obrigado a aceitar uma opinião espúria e desprovida de virtude. O
calar-se é útil em diversos casos, no entanto há um perigo nessa atitude dentro da espiral,
pois provoca depois de algum tempo a desconexão com a verdade e pode ser grande
demais a diferença no resto do ambiente de diversidade, tendo já sido promovida a
distorção. Se isso acontecer, sua opinião agora, não vale mais nada. Entretanto, só porque
você não vê uma determinada situação ou opinião, não significa que ela não exista.
Muitos estão neutros, alheios ou desinteressados nessa percepção, o que facilita o
deslocamento da opinião pública.
Pesquisa de opinião nos EUA feita por Pew Research Center (2021), mostra que 72%
dos americanos tem acesso a pelo menos uma plataforma de mídia social. Isso aumenta
a responsabilidade de boa informação nas mídias sociais, havendo ao mesmo tempo uma
forte chamada para a espiral do silêncio na mídia social. As pessoas tendem a fugir do
conflito nas suas redes sociais e por isso, conversam sobre os assuntos que tendem a
conseguir maior concordância das demais pessoas da rede social e não sobre aqueles
assuntos onde a discordância e o conflito podem aparecer (que são, portanto, silenciados,
gerando uma inexistência da discordância). Um estudo que testou o caso Snowden,
apontou que: (a) as pessoas pareciam estar menos dispostas a discutir esse tema polêmico
na mídia social do que off-line; (b) ao contrário do esperado a mídia social não foi
apontada como uma plataforma para compartilhar opiniões de forma alternativa; (c) as
pessoas tendiam a discutir os temas apenas se achavam que a audiência concordava com
elas e, (d) usuários de mídia social também tendem a compartilhar menos as suas
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opiniões, exceto em casos onde pensavam que a sua audiência nesses sites concordava
consigo (Hampton et al, 2014 e Recuero, 2014).
Por outro lado, não deveria haver temor em defender a verdade na prática dos bons
costumes, quando existem ferramentas filosóficas, entre as quais a ética e a lógica que
permitem definir diferenças entre o certo e o errado e a construir os necessários
silogismos, que são as conexões de premissas, que por logica e ética conduzem ao bem.
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não se sustenta na ética das ações e produz um ruído na Liberdade de Expressão, que é
o quarto conceito basilar da comunicação.
A lei não admite censura, apenas responsabilização, isso porque a censura requer
análise prévia dos conteúdos divulgados, com o intuito de barrar aqueles que não forem
aprovados por quem está no poder, decidindo a que tipo de informação a população terá
acesso. Já a responsabilização, ainda que punitiva, consiste em ações posteriores à
divulgação de um pensamento que viole direitos alheios. Um estado democrático não se
ocupa em restringir informações e ideias, mas deve responsabilizar o cidadão que não
respeite o direito dos demais (FIA,2021).
Também a Lei de Segurança Nacional vem sendo usada para criminalizar delitos
contra as instituições e o Estado e que vão além do conceito da liberdade de expressão,
garantido pela Constituição do Brasil.
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informações, pois há pouca informação do necessário e independente controle externo
dessas agencias.
Conclusões
Artigos consultados
Bellaver, C. 2020. Podemos ser deístas, sem conflitar com religiões? Loja de Pesquisas
Dom Bosco Nº 33, Vol 2(1):30-35.
24
FIA - Fundação Instituto de Administração. 2021. Liberdade de expressão: lei, evolução,
importância e limites. https://fia.com.br/blog/liberdade-de-expressao/ Consultado em
01/11/2021.
França, B. 2016. Janela de Overton: como manipular a opinião pública. Tecla SAP #1.
https://papodehomem.com.br/janela-de-overton-como-manipular-a-opiniao-publica/
Consultado em 01/11/2021.
Hampton, K. et al. 2014. Social Media and the ‘Spiral of Silence’. Summary of Findings.
https://www.pewresearch.org/internet/2014/08/26/social-media-and-the-spiral-of-
silence/ Consultado em 01/11/2021.
Hottois, J. 1985. The Spiral of Silence: Public Opinion—Our Social Skin. By Elisabeth
Noelle-Neumann. (Chicago: University of Chicago Press, 1984. Pp. 184.). American
Political Science Review, 79(3), 919-920. doi:10.2307/1956947.
25
Recuero, R. 2014. A espiral do silêncio na mídia social.
http://www.raquelrecuero.com/arquivos/2014/08/a-espiral-do-silencio-na-midia-
social.html Consultado em 01/11/2021.
http://www.raquelrecuero.com/arquivos/2016/07/nodexl-para-estudos-de-midia-social-
vantagens-e-desvantagens.html Consultado em 01/11/2021.
United Grand Lodge of England (UGL). Freemason Information. Masonic Education and
Analysis. Anderson’s Constitutions of 1723. https://freemasoninformation.com/masonic-
education/books/andersons-constitutions-of-1723/ Artigo consultado em 31/10/2021.
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CORDEL DO APRENDIZ
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A pedra bruta que temos que lapidar.
Com muita dificuldade todos os dias tiramos uma pequena lasca.
Para sermos exemplos de uma pedra polida.
Nesse mundo, que mesmo com muitos problemas ainda é a nossa casa.
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Fazemos tudo bem disfarçados e com boa sorte enganamos ate a morte
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MAÇONARIA: DEMOCRACIA, CONHECIMENTO, JUSTIÇA E
VERDADE
José Maria de Abreu 4, MCDB 22033001
1. INTRODUÇÃO
Desde a adolescência tenho sido um ardente leitor. Apreciava obras relacionadas
à ficção científica e até hoje encontro nelas grande deleite. Romances futuristas me
fascinam e Isaac Asimov é um dos meus autores preferidos: “Fundação”, “Eu, robô”, “O
fim da eternidade” e “O colapso do universo” são obras que muito me instruíram sobre
conceitos científicos e que mais tarde me fizeram acatar e respeitar concepções saídas da
objetividade e aferibilidade. As noções de ciência que abstraí destas obras me
convenceram de que a única certeza que o homem deve ter é a permanência da dúvida
acerca daquilo que se afirma. Certezas absolutas devem ser apanágio apenas de dogmas,
não da ciência. A eficácia da ciência reside nas respostas que ela é capaz de dar aos
dilemas da vida, porém sua beleza encontra-se nas indagações permanentes que ela
mesma faz acerca do objeto sobre o qual se debruça. Seus opostos, o sectarismo e a
intransigência, têm outro nome: fundamentalismo.
A ciência é antagonista do fundamentalismo; o fundamentalismo é inimigo da
ciência. Essa perniciosa corrente multifacetária encontrou na esfera digital poderoso
fermento que, crescendo, somente traz o engodo e a mistificação. O fundamentalismo
oprime, mata e dissemina o ódio contra a inteligência lógica. Tem sido a matéria-prima
da pós-verdade, mãe das “fake news”. Num mundo regido por subjetivismos nos quais a
expressão “eu acho que...” vem dominando as redes sociais, é indispensável a reação
imediata do método científico para reunir argumentos que superem meras convicções.
“Youtubers” (em que pese sua relevância para o mundo digital) não podem ser apanágio
que suplante a ciência. Crenças e opiniões são ferramentas importantes para que as
pessoas percebam a realidade que as cerca, no entanto não podem se sobrepor a
argumentos objetivos e demonstráveis. O mexerico do bate-boca não pode ser mais
4
Graduado em História e Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais; Mestre em Direito
e Instituições Políticas pela Universidade FUMEC (MG); Membro regular da ARLS Cinquentenário de
Brasília nº 37, jurisdicionada à GLMDF.
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essencial que o argumento válido da ciência, isto é, a veracidade das premissas enquanto
garantia da veracidade da conclusão.
Ora, os maçons são homens livres e de bons costumes. Quando de sua Iniciação
são introduzidos nos “sãos princípios da razão e da moral”, que força os irmãos a um
“amadurecimento reflexivo e humano diante do mundo profano” 5, pois terão à sua frente
uma incessante luta contra “a tirania, a ignorância, os preconceitos e os erros”. A razão
maçônica nos ensina combater o obscurantismo, nos presenteando com um mecanismo
cognitivo-racional para a adequada investigação da verdade.
O pensamento maçônico tem-me ensinado muito sobre o que Nietzsche 6
referenciou sobre a inércia daqueles que estando na praça ignoravam o presente que
Zaratustra lhes trazia, isto é, a superação do homem: “eu vos ensino o super-homem. O
homem é algo que deve ser superado. Que fizeste para superá-lo?”. Todo maçom, ao
verdadeiramente absorver a simbologia e a filosofia do Templo, é convidado a ter uma
percepção mais ampla e refinada do mundo, sendo capaz de enxergar mais longe do que
os outros homens. Isso não o fará superior aos demais, porém contribuirá para tornar-se
uma versão melhor de si mesmo, uma vez que a verdadeira nobreza consiste em sermos
maiores do que éramos ontem.
Procuro neste ensaio, de forma preliminar, traçar algumas linhas relacionadas à
investigação da verdade como contraponto ao turbilhão de opiniões destituídas de
fundamentação consistente, que vêm jorrando de forma incessante nas redes sociais,
principalmente as de natureza política, e que tem trazido nefastas consequências à nossa
jovem e frágil democracia.
Faço aqui, no entanto, uma advertência: o ato de refletir nos leva ao ato de afirmar
algo que acreditamos ser verdadeiro. Por conseguinte, quando expressamos um juízo de
valor sobre um determinado tema ele sempre se revelará inacabado, de resto imperfeito.
Schopenhauer 7 dizia que “o mundo é minha representação”, querendo o filósofo exprimir
que nossa percepção das coisas resulta da sensibilidade, do espaço e do entendimento que
temos acerca delas, como consequência do nosso “próprio campo de visão como os
limites do mundo”. Sendo representação do mundo ela não é perfeita, mas pode contribuir
5
ISMAIL, K. O Líder Maçom: como a Maçonaria tem formado Líderes nos últimos séculos e colaborado
para a Felicidade da Humanidade. Londrina: A Trolha, 2014.
6
NIETZSCHE, F. Assim falou Zaratustra. Porto Alegre: L&PM Editores. Livro eletrônico. Posição 165.
7
SCHOPENHAUER, Arthur. O Mundo como Vontade e como Representação. São Paulo: Editora UNESP.
2005. p. 43.
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para que uma vez compartilhada, possa o destinatário igualmente refletir sobre sua
verdade.
2. DESENVOLVIMENTO
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ARENDT, H. Entre o passado e o futuro. São Paulo: Perspectiva, 2009.
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expectativa). Portanto, não há como agir a não ser no momento presente; e agir, no
contexto maçônico, é atuar com conhecimento, justiça e verdade.
Mas agir exige antes de tudo conhecer; conhecer as coisas e conhecer-se. Eis o
grande desafio que nos é posto. Faço tal afirmação porque nem sempre a verdade dos
fatos nos é apresentada de forma tão cristalina. Ao contrário, temos enfrentado atualmente
uma profusão de inverdades tão absurda, a uma quantidade de informações,
desinformações e contrainformações tão grande que promove junto àquele que realmente
busca conhecer a verdade uma paralisia tal que o deixa inseguro sobre os passos que
deveria dar para as grandes questões da vida. Agir sem conhecer é temerário. Enquanto
sujeitos da formação tanto do conhecimento maçônico quanto da cognição sobre o mundo
profano, devemos fazer antes a seguinte indagação: como conhecer?
Platão 9, numa de suas obras, nos apresenta três condições (ainda hoje bastante
utilizadas) necessárias ao conhecimento: o conhecimento como sensação (alguém ter por
crença alguma coisa); o conhecimento como opinião verdadeira (alguém acreditar ser
verdadeira essa crença); o conhecimento como opinião verdadeira acrescida de um logos
ou justificação (alguém apresentar razões objetivas para acreditar em alguma coisa). Tem-
se, portanto, três requisitos indispensáveis ao conhecimento: crença, verdade e
justificação. A contemporaneidade os denomina de conhecimento como crença
verdadeira justificada.
Tomo aqui, de forma resumida, as lições que Almeida e Murcho 10 nos dão sobre
o conhecimento a partir do pensamento platônico.
• Crença: forma-se a partir de um estado mental ou convicção que alguém tem sobre
alguma coisa. Por exemplo, se acredito que o meu time será campeão brasileiro este
ano, estou expressando meu convencimento de que ele será campeão. Uma vez
convencido, abro um campo para o conhecimento, pois não há conhecimento sem
crença, apesar de haver crença sem conhecimento.
• Verdade: Estar convencido de algo não é o bastante, pois no exemplo acima nada
me garante que de fato meu time será campeão este ano. Poderia estar enganado.
Enganar-se é pensar que se sabe algo sem saber realmente. Por isso, para haver
9
PLATÃO. Teeteto (O Conhecimento). Livro eletrônico. Domínio Público, digitalizado pelo Grupo
Acrópolis (Filosofia): <http://br.egroups.com/group/acropolis>
10
ALMEIDA, A.; MURCHO D. Janelas para a Filosofia. 1ª ed. Lisboa: Gradiva, 2014. P.167-176.
33
conhecimento, é preciso que nossas crenças sejam verdadeiras. “Conhecimento falso
não é sequer conhecimento, tal como o ouro falso não é ouro” 11.
• Justificação: Uma crença só será justificada quando colhermos argumentos sólidos
para tê-la como verdadeira. Se acredito que meu time será campeão porque me vali
de estatísticas dos últimos anos quanto à sua performance; se entre as recentes
contratações de jogadores figuram estrelas do futebol; se existem recursos
financeiros para investimento em tecnologias desportivas, então tenho uma crença
justificada, mesmo que ela venha a se revelar falsa no futuro (meu time não foi
campeão). No entanto, se acredito que meu time será campeão só porque sonhei que
ele seria, esta não será uma crença justificada mesmo que ela se revele verdadeira no
futuro (sonhar com meu time campeão não é uma boa razão para justificar minha
crença).
Se a crença é um estado psicológico do sujeito e a verdade depende do que acontece
no mundo exterior, a justificação é condição que vai determinar de maneira apropriada
como alcançamos o conhecimento. Mais tarde, na Modernidade, a reflexão platônica
acerca do conhecimento aliou-se à dúvida cartesiana 12 , fundada no empirismo e no
racionalismo. Assim sendo, vê-se que estabelecer uma relação adequada entre a verdade
e justificação em nossas crenças é uma das tarefas mais difíceis para a busca do
conhecimento. Por isso a “ignorância, a mentira, o fanatismo e a superstição que são os
flagelos causadores de todos os males que afligem a humanidade” ainda persistem. Por
essa razão deve o maçom lutar contra esse estigma. Mas para lutar e vencer, deve
conhecer.
Quando conhecemos nos aproximamos mais da verdade. Segundo a definição
aristotélica, a verdade consiste na conformidade entre a ideia o objeto. A verdade é algo
que não está nas coisas, mas no sujeito que a enuncia. Aristóteles 13 dizia que a verdade
consiste em julgar que as coisas são o que são na realidade: “Dizer que é, o que é, e dizer
que não é o que não é, eis a verdade” A partir dessa definição conclui-se que a verdade é
uma relação de assentimento entre o espírito que julga (sujeito) e o que é de fato (as
coisas). Ora, não podemos ter o espírito da verdade se não temos a luz do conhecimento.
11
_____. Op. Cit. pag. 172.
12
DESCARTES, René. O Discurso do Método. Livro eletrônico. Domínio Público, digitalizado pelo
Grupo Acrópolis (Filosofia): <http://br.egroups.com/group/acropolis>
13
ARISTÓTELES. Metafísica. São Paulo: Edições Loyola.2002.
34
2.2. Verdade e “Fake News”
É deveras impressionante como a mentira vem sendo sistematizada e
potencializada nas redes sociais. Nos últimos tempos temos observado como a
manipulação das informações tem sido a tônica em nosso país e no mundo, e como tem
se revelado catastrófica e ruinosa para as relações sociais e políticas.
No entanto, a questão não é nova, só mudou de tom e gravidade. Ao longo da história,
política e embuste sempre mantiveram um relacionamento íntimo. Aqui poderíamos
indagar se a verdade poderia realmente encontrar na política um espaço mínimo para agir.
Na verdade (sem nenhum trocadilho), a mentira na política sempre foi tema recorrente
entre os grandes pensadores da humanidade. Já que a Filosofia, por meio da episteme 14,
tem por finalidade a busca da verdade, conclui-se que ela tenha se ocupado desse tema
amplamente.
Assim, Platão 15 abrigava em seu pensamento a necessidade da verdade para a boa
condução da pólis, mas admitia a “nobre mentira” como excepcionalidade para a
manutenção de sua unidade. Maquiavel 16 buscava legitimá-la como fator imperioso para
manter a manutenção do Estado; já contrário, Kant 17 argumentava, com fundamento em
seu imperativo categórico, que a verdade é um dever de todos, não podendo ser obrigação
apenas de alguns: o dever de não mentir pelo dever, nascido da lei moral. Para o filósofo
de Königsberg, contrapondo-se a Benjamin Constant, a verdade não é propriedade de
quem quer que seja, não fazendo distinção entre pessoas. Daí a mentira ser um grave
delito, não podendo jamais ser justificada. Depois deles vieram Kierkegaard, Hegel, Marx
e Nietzsche, dentre tantos outros que, se citados, tornaria longa a lista.
Ainda que trágica, a atual conjuntura é riquíssima para a análise do fenômeno pela
ciência e filosofia políticas. Arendt 18 afirma que a verdade de fato é mais vulnerável do
que a verdade racional. Verdades assentadas em afirmações científicas se mantém, uma
vez que sua racionalidade transcende os limites da política. Basta lembrarmos o que a
ciência tem dito sobre os efeitos da pandemia, infelizmente hostilizada pelo negacionismo
nas redes sociais. Como o vírus não tem intencionalidade e nem é político, a verdade
racional teima em contestar o negacionismo. A racionalidade está para além dos limites
14
Conhecimento científico, por oposição à opinião sem fundamento ou sem reflexão.
15
PLATÃO. A República. 9ª. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1993. p. 154
16
MAQUIAVEL. O Príncipe. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001. p. 113.
17
KANT, I. Sobre um Suposto Direito de Mentir por Amor à Humanidade. In: Textos Seletos. 2ª edição.
Petrópolis: Ed. Vozes. 1985. p. 120.
18
ARENDT, H. Entre o passado e o Futuro. 8ª edição. São Paulo: Ed. Perspectiva. 2016. p. 168-191
35
da política. Ao contrário, a verdade dos fatos, que se encontra dentro do âmbito político,
sempre corre o risco de desaparecer. Negar os fatos, fazendo uso de mentiras, extingue a
verdade. Mas é o risco que devemos correr e o preço que devemos pagar se quisermos
viver numa Democracia.
Faço essa afirmação porque é próprio das pessoas, ao se relacionarem
politicamente com outras, opinarem sobre um determinado fato. Portanto fatos e opiniões
não são, a priori, inconciliáveis, uma vez que a liberdade de opinião e expressão deve
garantir que eles venham à tona e sejam devidamente interpretados. Não é possível a
existência de fatos sem a sua interpretação. Só não é admissível, como Arendt afirma, que
se transponha o limite da interpretação e se altere o próprio conteúdo do fato, distorcendo
a verdade.
As discussões políticas que hoje são travadas em redes sociais demonstram
claramente não só a superficialidade e a distorção a que os fatos estão submetidos, mas
também a visão fundamentalista que lhes caracterizam. Em geral são discussões que não
avançam para além de preferências partidárias ou o apreço cego por um determinado
candidato ou governo. Ora, um debate minimamente saudável e produtivo deve
transcender meras paixões, alcançando uma visão mais elevada das estruturas e processos
governamentais com a abordagem objetiva entre teoria e prática. Visto dessa forma, tem-
se a ciência a serviço da política. Nossa jovem Democracia certamente deseja e merece
colóquios mais elevados, ao menos por aqueles que se autoafirmam intelectuais. O debate
franco, respeitoso e libertador deveria ser o marco referencial de avanço para qualquer
ação política, não importando a ideologia a qual o indivíduo se apegue. O confronto
inteligente entre os interlocutores, por meio do qual o emissor enuncia uma ideia e o
receptor complementa, contrapõe, aprofunda, exemplifica, ouve e se faz ouvir com bons
argumentos é a essência do princípio democrático. Vencerá o melhor argumento. Um
diálogo inteligente e sedutor, um jogo riquíssimo caracterizado pela elegância intelectual
entre os dialogadores, um encontro entre a inteligência, a entrega e a criatividade que só
faz crescer aqueles que se entregam a essa contenda prenhe de significação e de saberes.
Num mundo inflacionado pela pós-verdade que alimenta a mentira, estamos nos
afastando cada vez mais do debate sério e fecundo que devia nortear nossa
política. Decuplicou-se a dificuldade pela busca da verdade. Devemos, pois, ficar sempre
atentos aos fatos que nos são expostos cotidianamente, principalmente nas redes sociais,
uma vez que Verdade e transparência devem ser o mote da ação política. Porém nossa
36
Democracia, ainda jovem, não conseguiu se desvencilhar do patrimonialismo 19 e do
estamento burocrático 20 , agora potencializados pela pós-verdade, que insistem em
penumbrar a realidade, confundindo todos nós, deixando-nos míopes no trato com as
grandes questões.
Hoje, mais do que nunca, tem-se revelado cristalina a afirmação de ASIMOV21
proferida nos idos de 1980: “A tensão do Anti-intelectualismo vem sendo um fio que se
desenrola através da vida política e cultural fomentado pela falsa ideia de que democracia
quer dizer que a minha ignorância é tão válida quanto seu o conhecimento”.
Democracia e transparência são irmãs xifópagas que não podem ser separadas,
porque possuem um só coração pulsante. A premissa democrática se funda na ideia de
que a transparência deve isentar a política dos segredos e da ocultação da verdade. No
mundo contemporâneo a humanidade finalmente alcançou a possibilidade de superar,
pela Democracia, o embuste e o sigilo que até então, ao longo da história, eram utilizados
como ferramentas legítimas para o exercício do poder político. Num país que se afirma
republicano e democrático, o domínio comum (atributo da res publica – coisa pública) se
define justamente pelo princípio de que na esfera pública a informação correta deve estar
acessível a todos, numa abrangência tal que possibilite um debate com ampla exposição
e visibilidade... sem “fake News”.
3. CONCLUSÃO
"O drama da internet é que ela promoveu o idiota
da aldeia a portador da verdade..."
(Umberto Eco)
19
Conceito criado pelo sociólogo Max Weber relacionado à característica de um Estado que não conhece
limites entre o público e o privado. Esse Estado, de caráter privatista e particularista, se sustenta
politicamente em si mesmo na medida em que o tecido social é frágil e distante de seus objetivos. In:
WEBER, M. Economia e sociedade: Fundamentos de Sociologia Compreensiva. Brasília: UnB, v. 2, 1999.
20
De inspiração weberiana, o termo “estamento burocrático” foi criado pelo sociólogo e jurista Raymundo
Faoro para designar um grupo social que exerce o poder político exclusivamente em razão de seus interesses
particulares, sobrepondo o privado sobre o público, na busca de poder, prestígio e riqueza. Para Faoro, o
“estamento burocrático” constitui uma herança histórico-política do Estado Português quatrocentista. In:
FAORO, R. O Donos do Poder: a Formação do Patronato Político Brasileiro. 4ª ed. Porto Alegre: Ed.
Globo, v. 1,1977.
21
ASIMOV, I. Um culto à ignorância. In: Revista Newsweek. 1980.
37
postura reflexiva mais crítica ante à pós-modernidade que nos é imposta. A irreflexão, a
incapacidade de pensar, de interrogar a realidade tem sido a tônica nas redes sociais,
sustentadas por algoritmos e a opinião irresponsável de grande parte dos influenciadores
digitais.
Ora, o bem supremo que todos desejamos é a felicidade, e o único caminho que
pode nos levar à felicidade geral é nosso compromisso com uma política transparente,
que possa flertar continuamente com a verdade e a justiça, pois não se concebe verdade
sem justiça nem justiça sem verdade. Desde Aristóteles 22 a ideia de justiça e verdade tem
sido objeto de permanentes debates. Em sua ética das virtudes a verdade e a justiça se
revelam como resultantes de reiteradas práticas virtuosas, que é o meio termo entre dois
extremos que constituem vícios nas condutas humanas: o excesso e a falta. É desse meio
termo e somente dele que a justiça e a verdade podem florescer e, por conseguinte,
possibilitar uma política que viabilize a felicidade geral. Notem os leitores que os
ensinamentos maçônicos estão em perfeita consonância com o pensamento aristotélico,
quando aqueles nos exortam a elevarmos templos à virtude e cavarmos masmorras aos
vícios.
Finalizo afirmando que buscar a felicidade geral significa a conjunção entre o
conhecimento, a verdade e a justiça que todos, no mundo maçônico ou profano, devemos
nos instrumentalizar para alcançar o bem comum, materializado na Democracia. Todos
nós, maçons ou não, devemos convergir nossas potencialidades para chegarmos a uma
verdadeira intensidade de força comunitária, de modo a promovermos a felicidade geral,
sem “fake news”.
4. BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA, Aires; MURCHO Desidério. Janelas para a Filosofia. 1ª ed. Lisboa: Gradiva,
2014.
ARENDT, Hannah. Entre o passado e o Futuro. 8ª edição. São Paulo: Ed. Perspectiva.
2016.
22
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Edipro. 4ª Ed. 2014.
38
ASIMOV, Isaac. Um culto à ignorância. In: Revista Newsweek. 1980.
ISMAIL, Kennyo. O Líder Maçom: Como a Maçonaria tem Formado Líderes nos
Últimos Séculos e colaborado para a Felicidade da Humanidade. Londrina: A Trolha,
2014.
KANT, Immanuel. Sobre um Suposto Direito de Mentir por Amor à Humanidade. In:
Textos Seletos. 2ª edição. Petrópolis: Ed. Vozes. 1985.
NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra. Porto Alegre: L&PM Editores. Livro
eletrônico. 2015.
39
O DILEMA LGBTQIA+ NA MAÇONARIA BRASILEIRA
40
1. Introdução
2. Desenvolvimento
41
“A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem
como fundamentos: II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana” (CF, 1988). E
ainda, em seu Art. 3º:
Você pode ter lido sobre os recentes acontecimentos em alguns estados dos
EUA, incluindo Geórgia e Tennessee, onde Grandes Lojas Maçônicas
adotaram novas regras ou tem imposto regras existentes que disciplinam os
maçons por sua orientação sexual. Tais regras e ações não coincidem com os
princípios da Maçonaria praticados pela Grande Loja da Califórnia e não são
apoiadas pelo que entendemos como o grande objetivo da nossa fraternidade.
(…) Maçonaria instrui seus membros para defender e respeitar as leis do
seu governo e não para minar essas leis (…). Com mais de 50.000 membros
em todo o estado, as lojas sob a Grande Loja da Califórnia estão abertas a
homens de bom caráter e fé, independentemente da sua raça, cor, crenças
religiosas, opiniões políticas, situação econômica, orientação sexual,
capacidade física, cidadania ou nacionalidade (..). (grifo nosso) (ISMAIL,
2018)
42
A Grande Loja de Utah, em nome de seu Grão-Mestre R. Wesley Ing também
emitiu um pronunciamento:
43
essencialmente iniciática, filosófica, filantrópica, progressista e evolucionista, cujos fins
supremos são: Liberdade, Igualdade e Fraternidade” (grifo nosso). O maçom deve estar
sempre atualizado quanto às demandas sociais de sua realidade, fazendo-se cumprir os
deveres para o bem estar comum e os direitos humanos.
Após todo esse cenário, em 2018 a Grande Loja Unida da Inglaterra – GLUI,
considerada como a origem e guardiã de toda a regularidade maçônica, publicou em seu
site oficial sua nova Política de Mudança de Gênero, ela estabelece a abordagem da
UGLE para as questões levantadas para a Maçonaria pela reatribuição de gênero,
destinando-se ajudar a orientação das Lojas em suas tomadas de decisões. O Escopo do
documento diz ainda, que o referido “não impõe regras vinculativas e, embora forneça
algumas orientações gerais sobre a lei de discriminação, não constitui aconselhamento
jurídico.” Por fim, conclui afirmando que
esta Política não tenta abordar todas as questões relacionadas ao gênero que
podem surgir à medida que a reatribuição de gênero e a transição de gênero se
tornam mais prevalentes em uma sociedade em mudança e, quando o fazem,
precisarão ser abordadas de acordo com os princípios maçônicos de legalidade,
bondade e tolerância. (UGLE, 2018, online)
44
membro a renunciar à Loja ou discriminar um membro com base em qualquer
um desses motivos. Uma Loja não deve, em nenhum momento, exigir que um
membro prove que é legalmente um homem. (UGLE, 2018, online)
3. Considerações Finais
O RGF não demonstra proibição para tal admissão, entretanto, este movimento
não acontece naturalmente. Seria um problema do alcance da maçonaria para esta
comunidade, ou uma aversão dos membros maçons para com esse grupo?
45
Se há aversão dos membros da maçonaria para com a admissão de membros da
comunidade LGBTQIA+, então, compreende-se que o maçom deseja que sua vontade
seja maior que os fundamentos da fraternidade, ferindo seus princípios básicos e
essenciais. Os processos de investigações foram elaborados para manter a idoneidade do
mesmo perante sua admissão. Porém, por serem realizados por pessoas, sofrem
influências que predeterminam o destino do candidato nesta jornada.
Com base no exposto, pode-se concluir que, foram encontradas lacunas que
permitem a abertura de um diálogo para a compreensão deste fenômeno, permitindo,
como postula a Maçonaria, o progresso. Somente assim, poderemos “desbastar a pedra
bruta” em nossa jornada na fraternidade.
4. Referências Bibliográficas
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