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Disponibilização: Liz Dan

Tradução: Marcia, Ava, Marina, Cris, Mayo

Revisão Inicial: Marcia, DeaS

Revisão Final: DeaS

Leitura Final: DeaS

Formatação: Fanny
BEARD NECESSITIES
WINSTON BROTHERS #7
PENNY REID
Billy Winston

Claire McClure

Este é um romance de segunda chance, e traz de volta toda a


gangue dos Winstons, atuando de cupido em uma última história de
amor, diversão e conspiração familiar.
Dedicatória
Para todas as pequenas Scarlet em todos os lugares.
PRÓLOGO

CLETUS

“Alguém quer me dizer o que está acontecendo?”


Dou um tapinha na mão do meu irmão mais novo, sobre
as cobertas da cama do hospital, olho o relógio no meu pulso.
Jethro está atrasado.
“Tudo será revelado Roscoe. Tudo será revelado.” Asseguro
com certeza. Pobre garoto, eles o fizeram raspar sua barba. O
mais novo dos sete filhos, sua idade cronológica é 26 anos, mas
parece ter dez anos.
Ele deveria ter me deixado fazer um desenho em sua barba,
isso impressionaria as enfermeiras. Próxima vez. Quando estiver
dormindo.
“É melhor que seja revelado, Cletus.” Essa ameaça vem de
Duane, um dos nossos irmãos gêmeos e número seis da nossa
família. Beau, o outro gêmeo, nasceu primeiro, o que o fez o
número cinco. Duane é o mal-humorado, esse é seu papel.
“Tenho um avião para pegar. O prazo de Jéssica se esgota
amanhã.”
“Estamos todos cientes do tempo da sua progênie, Duane.”
Suavizo minha voz apesar de seu tom conciso. “Quando todos
chegarem aqui, começaremos.”
Compartilho um olhar rápido com Beau, que não ajuda em
nada. Ele parece achar a ansiedade de seu irmão gêmeo,
infinitamente divertida. Beau é a única pessoa que sabe por que
convoquei essa reunião. Eu o informei sobre os detalhes na
semana passada, precisando de um cúmplice. Pode ser um
choque, mas minha família nem sempre reconhece a
superioridade dos meus estratagemas, e você sabe que algo é
um vencedor se for composto pelas palavras “extratos” e
“gemas.”
Além disso, todo mundo gosta de Beau. Era à escolha óbvia
para ser cúmplice.
Dito isto, o nervosismo atual de Duane é por uma boa
razão. Sua parceira em viagens, vida e casamento, Jessica
James Winston, está grávida de quarenta semanas do primeiro
filho. Agora, se fosse um elefante, teria mais cinquenta e cinco
semanas pela frente. Mas ela não é um elefante.
É a filha do xerife local e uma garota doce, embora possa
ser uma verdadeira atrevida de vez em quando. Duane está aqui
conosco por causa de Roscoe que quase morreu algumas
semanas atrás, (Não entre em pânico! Ele está fora de perigo
agora).
Enquanto isso, Jessica vive seus últimos dias de gravidez
na Toscana (Itália) com seus pais, esperando a chegada de
Duane Jr., ou Jessica Jr., ou o que estão planejando chamar
esse bebê.
Falando nisso, “Ei Duane.”
“Sim?”
“Como você vai chamar esse bebê?”
Nossa irmã, número quatro e a única garota em nossa
família, emite um som suave; interpreto que seja do tipo
repreensivo. “Cletus Byron Winston, pare de perguntar a Duane
como vão nomear o bebê. Deixe que tenha seus segredos.”
Levanto uma sobrancelha para o rosto bonito da minha
irmã e ela, por sua vez, levanta uma sobrancelha para mim. Nós
temos idade próxima, Ashley e eu, desde que ela foi a próxima a
nascer depois que agraciei o mundo com minha presença
magnânima. Isso me fez ter a sorte número três da família. É
isso mesmo, o número três tem sorte. É um fato bem
estabelecido no universo. Todo mundo sabe disso.
“Estou aqui!”
Como nadadores sincronizados girando em uníssono,
todos levantamos nossas cabeças e olhamos para a porta,
observando Jethro fazer sua entrada.
“Desculpe o atraso,” diz, com a barba e cabelo castanhos
arrepiados. “Tive que trocar de roupa. Andy estava com diarreia
e...”
Levanto uma mão, impedindo nosso irmão mais velho,
número um, de continuar com sua história de número dois
(onde o “número dois” é cocô).
“Jethro, acho que todos viveremos uma vida completa, sem
saber por que seu filho com diarreia tem alguma influência no
seu atraso.”
Jethro suspira, cruza os braços e me dá o que
provavelmente pensa ser um olhar irritado. Não é. Suspeito que
o rosto do meu irmão mais velho não é realmente capaz de se
enrugar.
“Espere. E o Billy?” Duane pergunta sobre o único irmão
Winston ausente de nossa assembleia. “Onde o Billy está?” O
gêmeo rabugento coça sua barba ruiva bem aparada, olhando
entre mim e Jethro.
Bem, aqui vou eu.
Dou um passo à frente. Todo mundo vira os olhos para
mim. Mesmo sendo o menor dos meus irmãos, apenas oito
centímetros, tenho a maior presença quando assim escolho.
“Fico feliz que perguntou Duane. Jethro.” Faço um gesto
para a porta que meu irmão mais velho acabou de atravessar.
“Você pode calar a boca, por favor? Vou tocar em informações
confidenciais e prefiro que essas revelações terríveis não saiam
desta sala.”
Os olhos azuis de Ashley se estreitam e ela se levanta para
ficar ao lado de Roscoe, enfiando os dedos nos cabelos escuros
das têmporas. “Espere um pouco. Isso será catastrófico? Vai
deixar Roscoe agitado?”
“Não Ash. Não é esse tipo de catástrofe.” Falo, mas então
olho para cima e para direita. “Bem, não acho que seja esse tipo
de catástrofe.”
“Cletus,” Beau diz, bem na hora. Um pequeno sorriso paira
em seus lábios e seus olhos brilham, ou seja, olha para mim com
sua expressão normal. “Quer que eu comece?”
Agora todo mundo divide sua atenção entre Beau e eu, e
tenho um nível de satisfação em suas visões confusas. Sempre
gostei de uma boa reviravolta, tanto na dança quanto na
variedade de enredos.
“Vá em frente, Beau.” Dou um passo para trás, levantando
minha mão no gesto a palavra é sua.
Quando ensaiamos mais cedo, decidimos que seria melhor
Beau interromper e eu ceder a ele. Como mencionei
anteriormente, todo mundo gosta de Beau. Considerando, por
alguma razão, que meus irmãos não aceitam minhas motivações
automaticamente. Obviamente, todos tem problemas de
confiança infundados.
Beau se afasta da parede, seu sorriso fica mais amplo e
ainda mais pensativo. “Cletus e eu pedimos a vocês para vir aqui
por causa de Billy. Sei que falamos isso na semana passada,
pouco antes da chegada dos Payton, mas acho que todos
precisamos nos unir e decidir sobre um plano.”
“Que tipo de plano?” Esta pergunta vem de Roscoe.
“Bem, estamos muito preocupados com ele,” Beau diz,
depois faz uma pausa, espera, dá à nossa família a chance de
perguntar por que estamos preocupados com Billy. Mas, como
eu suspeitava ninguém parece estar confuso sobre as origens de
nossa preocupação.
Ashley leva os dedos à testa. “Não acredito que Billy esteja
fazendo isso. Não acredito que está se colocando nisso. A
primeira vez foi mais do que suficiente, mas duas vezes?”
A isso que Ashley se refere é a doação de medula óssea.
Nosso segundo irmão mais velho se ofereceu para doar sua
medula óssea ao nosso desprezível pai, Darrell Winston. Desde
que descobrimos o plano de Billy, estamos em vários estados e
estágios de choque e consternação. Billy já realizou o
procedimento uma vez e agora está programado para um
segundo turno. Nosso pai morre sem ele.
“Você sabe por que Billy está fazendo isso.” Roscoe levanta
a palma da mão, cutuca a perna de Ashley, atraindo seus olhos
para ele.
Uma pequena risada escapa dela. “Na verdade não. Não
compreendo. Billy não passou o suficiente?”
“Mas se Darrell estiver morto, não pode testemunhar
contra Razor Dennings. E se Darrell não testemunhar contra
Razor Dennings, as únicas acusações que o bastardo enfrentará
são as tentativas de assassinato de Roscoe e Simone.” Diz
Jethro, parecendo quase tão frustrado quanto eu em relação a
toda a situação.
“Entendi.” Duane se afasta da parede. “Odeio, mas entendo
por que Billy está fazendo isso. Razor matou vinte e quatro
pessoas. São 24 famílias que não terão justiça se Darrell morrer
de câncer.”
Ashley faz uma carranca tão feia para Duane e Jethro, que
assustaria os pássaros, se houvesse algum no quarto de hospital
de Roscoe.
Claramente louca como o inferno, ela cruza os braços.
“Quando isso termina, no entanto? Hummm? Quando Billy
deixará de ser o cordeiro sacrificial para esta família? Para esta
cidade? Ele não está bem! Está doente, cansado e, caramba,
desistiu de mais do que qualquer um de nós, muitas vezes. Não
podemos continuar esperando que assuma todos os encargos.”
“Eu concordo,” Roscoe diz calmamente, fechando os olhos.
“Você está agitado, Roscoe?” Sou rápido em perguntar,
examinando-o cuidadosamente. “Isso é demais para você?
Devemos parar?”
“Não. Estou bem.” Ele não abre os olhos. “Estou feliz por
estarmos falando sobre isso, e concordo com Ash. Billy merece
mais.”
“Ele não deveria doar medula óssea para o homem que o
colocou no hospital quando tinha apenas doze anos, que quase
o matou e espancou a nossa mãe,” Ashley resmunga, apontando
o dedo no ar para algum inimigo invisível, impressionante, sua
voz não aumenta acima do apropriado para o hospital, mas
comunica todo o peso de sua ira. “Ele nos manteve a salvo.
Cuidou de nós. Billy merece felicidade. Merece mais do que isso.”
“Bem dito, Ash.” Dou um passo à frente, porque agora é a
minha vez. “Bem dito. E essa é uma excelente sequência para a
verdadeira razão pela qual reunimos vocês. Está na hora de
discutirmos sobre Claire.”
“Isso não é sobre Billy?” Jethro olha para Beau.
“É sobre Billy,” Beau confirma, e acrescenta suavemente:
“Mas é sobre Claire também.”
Jethro parece ficar mais ereto, seus olhos se arregalam. “O
que?”
“Sim. Claire.” Levanto minha voz, querendo sua atenção
total. “E você não vai gostar.”
Jethro, e todos os demais, exceto Roscoe, porque seus
olhos ainda estão fechados, desviam o olhar para mim, depois
para Beau, depois de volta para mim.
“E é aqui que entra a parte da catástrofe, Jet.” Faço uma
pausa, prolongo o momento, sem saber se paro ou saboreio.
Nossos irmãos, Billy e Jethro, não estão nas melhores
relações há mais de duas décadas. Os últimos anos trouxeram
um cessar-fogo frágil, a princípio pelo bem de nossa mãe, e por
Roscoe, os gêmeos, Ashley e eu, mas nunca alcançaram uma
verdadeira paz um com o outro. Não sei se é possível reparar um
relacionamento tão quebrado quanto o deles, ou se continuarão
a coexistir. O tempo finalmente dirá.
Mas voltamos ao agora e à minha pausa dramática, meio
saboreando e meio enrolando. Por um lado, sinto remorso por
ter que dizer a Jethro que a viúva de seu melhor amigo (heroico
e morto) sempre esteve apaixonada por nosso irmão Billy. Por
outro lado, gosto de ser o único a informar a Jethro que a viúva
de seu melhor amigo (idiota e morto) sempre esteve apaixonada
por nosso irmão Billy.
Não me interpretem mal, Ben McClure foi um homem bom,
mas também era tão sem noção quanto um pirata usando dois
tapa-olhos. Não acho que o homem tinha um osso
propositalmente mesquinho no corpo, mas tinha vários ossos
ignorantes, arrogantes e pretensiosos, com certeza.
Sentado no meu belo refúgio de remorso e prazer, continuo.
“O problema é Claire, antes de sabermos que a mãe biológica de
Beau e Duane era Christine, e Claire meia-irmã dos gêmeos,
antes da ilustre carreira de cantora de Claire, antes de Ben
morrer, antes de Ben e ela voltarem à cidade, antes de se
casarem, antes de ela mudar de nome de Scarlet para Claire,
antes de fugir de Green Valley, antes de tudo isso, Claire e Billy
estavam secretamente apaixonados.”
Um choque coletivo percorre o quarto. Até Roscoe ofega,
com os olhos abertos. Ou seja, cada habitante do quarto, exceto
Beau e eu, ofegamos. Ele engasgou na semana passada quando
eu disse a verdade, mas está satisfeito com isso agora.
O choque de Jethro dura pouco, no entanto, e logo se
transforma em irritação. “O que...”
“Agora espere Jethro, espere. Sei que será difícil para você
aceitar que Ben e Claire não eram o modelo de perfeição
matrimonial, desde que os colocou naquele pedestal nos últimos
dez anos, e ela também, mas tenho provas. Se precisar. É
verdade tanto como estou aqui de pé. Billy e Claire eram
apaixonados um pelo outro há dezoito anos, creio eu.”
Sabe como eu disse anteriormente que Jethro nunca
realmente franziu a testa? Bem, sou suficientemente grande
para admitir quando cometo um erro, por mais que raramente
isso ocorra. Jethro está certamente franzindo a testa agora.
“Isso é ridículo, Cletus. Perguntei sobre isso uma vez e ela
disse que não era nada, nada aconteceu. Scarlet, quero dizer,
Claire, estava com Ben. Estava sempre com Ben. Nunca esteve
com Billy.”
“Você está incorreto e, como eu disse, tenho provas. Mas
tenha certeza, a estrela da música country, anteriormente
conhecida como Scarlet, esteve muito com Billy, e eles ainda
estão muito apaixonados um pelo outro.”
As mãos de Jethro levantam até a cintura. “Por que está
fazendo isso? Billy e eu, chegamos a um lugar onde não
brigamos toda vez que estamos na mesma sala. Se o que está
dizendo é verdade, está me dizendo que Claire amava Billy,
queria estar com Billy, enquanto era casada com Ben? Ela não
faria isso, e Ben nunca casaria se ela quisesse outra pessoa. A
felicidade dela era tudo o que importava para ele.”
Abro minha boca, preparado para mostrar o tapete da
verdade sobre Ben McClure, que era um homem muito ignorante
para perceber o que deixava Claire feliz e egoísta para
compreender que sua felicidade não se equiparava
automaticamente à felicidade dela.
Mas antes que possa falar, Beau se adianta, coloca a mão
no ombro de Jethro e dá ao nosso irmão um sorriso gentil. “Os
mortos nunca podem ser vistos como realmente eram, como
pessoas tridimensionais crescentes e pensantes, Jethro. Com
falhas e pontos fortes. Em retrospecto, são santos ou pecadores.
Entendi. Para você, Ben era um santo.”
A garganta de Jethro parece funcionar, e ele se volta para
mim. “Você está errado sobre Claire. Ela amava Ben. Eu estava
lá quando ela descobriu que ele morreu; ficou arrasada.”
Enfio minhas mãos nos bolsos, aceno sombriamente. “Ela
pode ter amado o homem, de certa forma, mas estou certo sobre
Claire. Ela amava Billy antes de Ben, amava Billy quando Ben
morreu, ela ama Billy agora. E deve simplesmente aceitar que
estou certo, porque estou sempre certo. Mas não se trata da
minha porcentagem de verdade.”
Meu irmão mais velho continua balançando a cabeça,
bufando uma risada áspera.
Não temos todo o tempo do mundo para convencer Jethro,
então decido ir direto ao ponto. “Acredite ou não, isso não é sobre
Ben. Ben era um ser humano bom, e sei que ainda sente falta
do seu amigo, mas Billy está vivo e é seu irmão. Billy merece a
felicidade, assim como Claire. Mas esses dois idiotas são muito
teimosos e nobres para escalar a montanha bagunçada de
arrependimentos e segredos que construíram entre si. Então,
como pessoas que amam os dois, cabe a nós, todos nós, fazer a
mágica acontecer.”
Jethro morde o interior de seu lábio, me inspeciona, seu
olhar bravo. Claramente, ainda não acredita em mim.
Sem desviar o olhar de Jet, suspiro e chamo o Senhor
Rabugento, Duane. “Conte-nos sobre a cabana que você e Billy
construíram, naquele trecho alto e plano da floresta.”
Jethro pisca, recuando um pouco.
“Bem, apenas Billy e eu deveríamos saber sobre isso.
Construímos alguns verões antes de mamãe morrer. Acho que
costumava ser um parque de campismo.”
“E, por favor, ilumine a plateia, Duane, o que Billy lhe
contou sobre isso?” Pergunto, o tempo todo assistindo meu
irmão mais velho.
“Billy disse que era um espaço sagrado para ele. Algo sobre,
uh, um lugar que ia quando queria se lembrar de uma época e
uma pessoa que amava e sentia falta.”
Sei que Jethro está familiarizado com esse terreno alto e
plano em particular na floresta. Sei que foi o único a mostrá-lo
a Scarlet, de quatorze anos, como um lugar seguro em que ela
poderia ficar longe de Razor, seu pai, e Christine, sua mãe
negligente e odiosa.
Mas o que Jethro não sabia era que Billy encontrou Scarlet
na floresta atrás de nossa casa naquele mesmo local. Ou melhor,
eles se encontraram.
Meu irmão mais velho não está mais franzindo a testa. Uma
rachadura se forma em seu exterior de granito, a confusão
desliza sobre suas feições. Jet interveio para ajudar Scarlet há
quase vinte anos e, ao fazer isso, foi quem acidentalmente uniu
ela e Billy.
Aproveito o fato de ele estar fora de controle para soltar
outra bomba da verdade. “Você já questionou o momento das
lesões de Billy? Que os Iron Wraiths o colocaram no hospital na
mesma noite em que Scarlet fugiu com Ben? E lhe pareceu
estranho que Razor Dennings deixasse sua filha sair de Green
Valley sem nenhuma retribuição? Mesmo quando voltou noiva
de Ben aos dezoito anos, nem Razor, nem Darrell, nem nenhum
de seus irmãos do clube de motociclistas vieram atrás dela. Por
que acha que isso aconteceu?”
O olhar de Jethro afia seus lábios se separam. “Você está...
Mas espere. Não foi por causa de Ben? Pensei que os Wraiths se
afastaram de Scarlet porque ela estava com Ben, era o que ele
sempre me dizia. Está dizendo que era...”
“Sim,” confirmo, quebrando minha promessa de manter
um segredo sagrado por dezoito anos. Eu o mantive porque Billy
pediu. Chegou a hora. “Billy aceitou o castigo de Scarlet. É por
isso que os Iron Wraiths o espancaram quando tinha dezesseis
anos. Ben não tinha nada a ver com Scarlet a salvo, a não ser
sua tia e tio, dando-lhe um lar. Mas ela poderia ir para a
Califórnia e estar bem. Ela não precisava dele.”
Jethro parece balançar, absorvendo essa informação, seus
olhos voltam no chão.
Enquanto isso, Ashley cobre a boca e Roscoe diz “Vocês
todos me disseram que Billy sofreu um acidente de carro. Nunca
me disseram que os Wraiths lhe deram uma surra.”
“Foi o que nos disseram também” Duane resmunga,
enviando-me sua marca registrada de olhar feio.
“Não me olhe assim, Duane Faulkner. Eles mataram meu
cachorro quando levaram Billy, lembra-se de Lea? Mamãe tomou
a decisão de não contar a você, Ashley, Beau ou Roscoe, e eu
não estava em condições de contradizer. Além disso, mamãe
nunca soube por que os Wraiths espancaram Billy. Só Billy, Ben
e eu sabíamos... mais ninguém.”
“Espera. Ben sabia?” A voz de Jethro falha e dá um passo
à frente, visivelmente angustiado. “Ben sabia que Billy levou o
castigo por Scarlet? Soube o tempo todo?”
Concordo, mas não elaboro, precisamos permanecer no
tópico. “Como o xerife James não conseguiu que Billy falasse ou
lhe dissesse quem eram os culpados, seu escritório não
confirmou nem negou os rumores de que se tratava de um
acidente de carro.” E aqui estamos nós.
“Sinto muito pelo seu cachorro, Cletus. Lea era uma garota
tão doce.” A voz suave de Ashley chama minha atenção. Seus
olhos azuis brilham com lágrimas não derramadas. “E eu sabia
que não foi um acidente de carro, porque onde estava o carro?
Achei que eram os irmãos do clube de motociclistas do nosso
pai, principalmente por causa do quanto Billy os odiava depois.
Ele realmente nunca odiou os Iron Wraiths até voltar do centro
de reabilitação, apenas meio que os tolerava. Mas não sabia que
bateram nele por causa de Claire.”
“Ela sabe?” Jethro pergunta, não parecendo mais irritado,
mas enormemente arrependido.
Resmungo, irritado. O objetivo disso não é fazer Jethro se
sentir culpado novamente. Jethro não teve nada a ver com Billy
chegar ao hospital aos dezesseis anos, mas era um prospecto
dos Iron Wraiths na época, e tenho certeza de que sente
vergonha novamente devido à associação passada.
Reconheço o quanto foi difícil para Jethro mudar sua vida,
dar as costas ao clube de motocicletas e a nosso pai e retornar
à nossa família como filho pródigo. Estar certo e fazer o certo e
permanecer no curso estreito significa nunca conhecer a linha
frágil entre humildade e humilhação, nunca saber o quão difícil
é pedir perdão, nunca entender a dor do perdão retida.
Mas admitir o erro e trabalhar todos os dias da sua vida
para compensar isso exige coragem, persistência e uma rara
força de caráter. Amo Jethro, amo Billy e respeito os dois, Billy
por sempre permanecer no caminho certo, e Jethro por se
desviar, mas se agarrar e lutar para encontrar o caminho de
volta.
“Cletus?” Jethro solicita novamente. “Claire sabe o que
Billy fez por ela?”
“Não. Ela não sabe. Ele não queria que soubesse.”
“Por que não?” Duane troveja. “O que diabos há de errado
com ele? Deveria dizer a ela num primeiro momento, o mais
rápido possível. Ele perdeu a chance de jogar bola na e
faculdade, perdeu a chance de ir para a faculdade, perdeu tudo.”
“Ele não perdeu tudo. Ainda tem todos os dentes, não é?
Não subestime o valor dos dentes. E não importa por que não
disse a ela, embora tenho minhas suspeitas.” Falo, levo minhas
mãos nas tiras do meu macacão e coloco meus polegares em
torno deles. “Ela saberá em breve, porque estou dizendo a ela.
Mas primeiro, precisamos conversar sobre estratégia.”
“Estratégia?” Roscoe pergunta, chamando minha atenção,
e sorrio com o olhar travesso nos olhos do meu irmãozinho.
“Quer nossa ajuda com a estratégia?”
“Parece que sim,” Beau interrompe, “Ele quer nossa ajuda
para colocar seu plano em ação.”
“Entendo.” Ashley levanta o queixo, me inspecionando,
mas parece mais interessada do que cautelosa. Um bom sinal.
“Bem, vamos lá. Qual é o plano?”
“Antes de contar, preciso saber se todos estão juntos.”
Envio a Jethro um olhar aguçado. “Não posso fazer isso, não vai
funcionar, se todo mundo não estiver totalmente comprometido.
Todos têm um papel a desempenhar, outros motivos também.
Será um esforço familiar.”
Jethro encontra meu olhar diretamente, mostrando-me as
palmas das mãos. “Acredite ou não, só quero que eles sejam
felizes. Ambos. São as melhores pessoas que conheço, e se estar
um com o outro significa que serão felizes...” Assisto quando ele
respira fundo, lentamente encolhe os ombros e diz na expiração:
“Conte comigo.”
“Bom. Isso está resolvido.” Duane dá outro passo em
direção ao centro da sala. “Então qual é o plano?” Pergunta,
parecendo curioso ao invés de grosseiro.
Sorrio um pouco, incapaz de me controlar, e digo “Você
conhece o velho ditado Pode levar um cavalo à água, mas não
pode fazê-lo beber? Bom, é verdade. não pode forçá-lo, a menos
que o alimente com sal, ou...” Meu ligeiro sorriso cresce. “A
menos que afogue o cavalo.”
CAPÍTULO 1

CLAIRE

O galo madrugador não é amigo da coruja. No momento


sou ambos.
Bocejo atrás da minha mão, forço meus ouvidos, tentando
descobrir de quem são as vozes murmurando do lado de fora da
minha porta. Pego meu telefone na mesa de cabeceira e olho de
relance para o relógio. Apenas 5h00 da manhã.
Madrugada, de fato.
A adaptação à mudança de horário entre Nashville e
Chianti tem sido lenta, essa à minha segunda semana na Itália.
Embora possa ser a minha terceira. Recentemente perdi a noção
dos dias, enquanto andava de um lado para o outro no meio da
noite, tentando ajudar meu meio-irmão Duane e sua
esposa/minha boa amiga Jessica com seu bebê recém-nascido.
Além disso, sabe, estou na Toscana. Quem precisa dormir
na Toscana? A resposta correta para essa pergunta é
praticamente ninguém. Se alguém tem sorte de estar na
Toscana, nunca deve perder tempo dormindo.
O tempo de uma pessoa na Toscana deve ser gasto em
grande parte em três atividades: beber vinho, comer e apreciar
toda beleza, incluindo a arte, as vistas e os italianos. A menos
que a pessoa em questão seja um bebê recém-nascido.
Obviamente, bebês recém-nascidos não devem beber vinho.
Você também pode se levantar e ajudar a cuidar do bebê
mais fofo do mundo.
Além disso, me dá algum tempo para trabalhar em minha
piada sobre pássaros. Todo mundo já ouviu O madrugador pega
o verme, mas o segundo rato pega o queijo, certo? Bem, senti que
a palavra buraco de minhoca, associada a viagens espaciais e
essas coisas, era uma oportunidade perdida para uma piada
sobre pássaros. Algo como Por que o madrugador acabou em
Alpha Centauri? Porque deu uma volta errada no buraco de
minhoca.
Blá. Precisa trabalhar nisso, Scarlet.
Estico os braços sobre a cabeça enquanto sento não me
preocupo em lembrar que meu nome não é Scarlet nos últimos
dezesseis anos. Para o bem ou para o mal, geralmente ainda me
considero Scarlet, não Claire McClure. Isso é especialmente
verdade quando estou fazendo, pensando ou dizendo algo tolo.
Ainda bem que ninguém pode ouvir meus pensamentos além de
mim; provavelmente pareço uma maluca.
As vozes do lado de fora da minha porta persistem, não
ficam mais altas, mas também não desaparecem. Os pais de
Jess estão aqui, o xerife e Sra. James, mas duvido que um deles
esteja acordado tão cedo. Exceto, na verdade, talvez o xerife?
O pai de Jessica acordou cedo algumas vezes e segurou o
bebê depois das 5h30 da manhã. Reivindicava o pequenino,
assistia o nascer do sol e depois nos preparava o café da manhã,
enquanto segurávamos o bebê Liam no peito. Graças a Deus pelo
xerife e pela Sra. James. São os únicos aqui que tem alguma
experiência com bebês.
Logo, meu amigo de longa data, Jethro Winston e sua
incrível esposa, Sienna Diaz, estão programados para chegar a
uma semana ou mais, talvez mais, em meados de junho. No meu
estado grogue atual, não consigo me lembrar.
Aos trinta e seis anos, Jethro é o irmão mais velho da
família Winston. Ele e Sienna estão casados há alguns anos,
talvez quatro? E tem três meninos adoráveis. Estou ansiosa e
temendo toda a energia juvenil. Por um lado, esses garotos são
divertidos, engraçados e letais, herdando uma quantidade
insana de carisma e boa aparência tanto da mãe quanto do pai.
Por outro lado, não estou dormindo muito e não sei se
tenho energia para ficar com Jet Leg, a enfermeira noturna do
bebê William Beauford Winston (mas eles o chamam de Liam),
terá que correr atrás dos filhos travessos de Jethro o dia todo.
Mas verdade seja dita? Estou ansiosa para descobrir.
Em minha opinião, não tem família demais, especialmente
quando você cresceu sem nenhuma para falar.
“Ele não comeu nada? Nada mesmo?” As perguntas
silenciosas de Duane entram no meu quarto, a preocupação
palpável eleva sua voz.
A preocupação me faz ignorar o roupão de banho na
cadeira ao pé da minha cama, e caminhar rapidamente até a
minha porta. Baby Liam não está comendo? Ele tem febre?
Parecia bem, absolutamente perfeito, quando o deixei à meia-
noite com Jess.
“Que tal antes dele dormir? Não comeu nada?” Duane
pressiona obviamente agitado.
Acabo de colocar minha mão na maçaneta da porta quando
ouço uma voz sussurrada responder “Não, nada,” paro
brevemente porque conheço essa voz em qualquer lugar.
Sienna está aqui? Já?!
Espera, há quanto tempo estou na Itália?
Sei que Jethro e Sienna viriam, mas posso jurar que não
chegariam por mais uma semana. Fecho os olhos, lembro-me de
não ser uma idiota completa ao redor da estrela de cinema.
Não quero me gabar, mas conheço a estrela de cinema,
escritora, comediante e brilhante, vencedora do Oscar, Sienna
Diaz. Nós temos um relacionamento. Twitamos uma para a
outra. Até me sinto confortável em dizer que somos amigas.
Também somos meio que uma família, embora não seja
tecnicamente verdadeiro. Mas essa é uma longa história de
segredos emaranhados e história de caipiras. Melhor não entrar
nisso agora.
Como mãe adotiva de Duane, e mãe biológica de Jethro,
Bethany Winston, costumava dizer “Melhor deixar peidos e o
passado para trás.” Ela podia não ser minha maior fã quando
morreu, mas ainda me lembro dela com carinho.
Mexa-se. Sacudo o nervoso inútil, endireito meus ombros
e abro a porta. Para minha surpresa, o corredor está vazio.
Mas então ouço Duane resmungar: “Ele precisa comer”
Suas palavras, vem de algum lugar ao virar a parede.
Caminho em direção a sua voz, não faço barulho porque
estou descalça. Além disso, estou na ponta dos pés mais do que
caminho. Mas planejo limpar minha garganta e alertá-los sobre
a minha presença, assim posso encontra-los graciosamente. O
trio caminha lentamente pelo corredor, Duane, Sienna e Jethro.
A cabeça vermelha do meu meio-irmão, com os cabelos da cor
exata dos meus, está curvada, os braços cruzados e os ombros
caídos. Com a barba bagunçada e espessa, Duane parece
exausto há algum tempo.
“Sim, mas ele só dorme.” Sienna, linda como sempre, em
um Converse, calça leg preta e um suéter roxo com uma gola
larga caindo em um ombro joga seu longo cabelo castanho
escuro por cima do ombro, e ergue a mão em direção à porta do
outro lado do corredor.
É uma das duas suítes grandes de hóspedes nesse andar,
a outra é a minha. O quarto já estava preparado e aguardava a
chegada de mais familiares. Portanto, não o quarto das crianças
e nem o quarto que Jess, Duane e o bebê Liam dividem desde
que voltaram do hospital para casa.
“Deixe-o dormir primeiro,” Sienna continua, virando-se
como se bloqueasse o caminho, seus olhos castanhos se movem
entre Jethro e Duane quando os três param.
Jethro enfia as mãos nos bolsos traseiros da calça jeans.
“Concordo com Duane. Ele precisa de comida mais do que
precisa dormir. Dormiu o tempo todo no avião. Ashley disse que
não pode fazê-lo comer antes de sair. Ele não está bem, não disse
duas palavras para ninguém.”
Sienna dá um sorriso simpático ao marido. “Jet meu amor,
não podemos julgar o estado mental ou físico de seu irmão com
base em quanto ele fala. Billy não diz duas palavras para você
em um bom dia.”
Paro como se atingida uma parede invisível. Uma explosão
maciça de adrenalina enlouquece-me por dentro.
Billy?!
Ofego, ou engasgo, ou devo ter feito algum tipo de som,
porque todos os três pares de olhos se voltam para mim.
“Claire!” Sienna sussurra alto. “Desculpa. Não tivemos a
intenção de acordar você.”
“Eu...” Não consigo pensar.
Tudo está distorcido. Billy está aqui? Mas... Mas ele não
deveria vir! Foi-me dito que não viria. Estava muito ocupado,
não queria deixar seu irmão mais novo ainda se recuperando no
hospital, não podia tirar uma folga. Disseram-me que não
estaria aqui e agora está, e não sei se estou em êxtase ou
aterrorizada, e Jethro e Sienna estão na minha frente, me
puxando para abraços.
“É tão bom ver você,” Jethro diz. Registro que me segura
pelos braços e me dá um sorriso largo.
“Desculpe novamente se acordamos você.” Sienna joga o
polegar por cima do ombro. “Os meninos já estão lá embaixo na
cama. Estavam dormindo quando chegamos, então vamos
deixá-los descansar até o meio dia. Trouxe Maya, minha irmã,
acho que a conhece? Talvez no casamento? Bem, eu a trouxe
para ajudar a vigiar os meninos. Assim que virem você aqui, vão
querer brincar.”
Ouço as palavras do meu amigo e as compreendo
perifericamente, mas minha mente ficou presa na constatação
de areia movediça de que Billy Winston está aqui.
Agora.
Nesta casa.
Na verdade, provavelmente está atrás da porta para a qual
Sienna acabou de gesticular casualmente. Tão perto.
E não estou preparada.
Nunca estou preparada para Billy Winston.
A última vez que nos vimos foi no Natal, e antes disso foram
quatro anos sem contato. Não consegui parar de pensar nele
desde o Natal e, Quem estou enganando? Desde os catorze anos,
Billy Winston nunca esteve longe da minha cabeça.
As coisas estão diferentes. Sou diferente. Nos últimos seis
meses comecei trabalhar com meus problemas, comigo,
conversando com um psiquiatra sobre o perigo da vergonha, e
como permiti que isso tomasse tantas decisões por mim. Pela
primeira vez em dez anos, pensei em entrar em contato, ligar
para Billy, conversar sobre as coisas.
Não estendi a mão, em parte porque não estava pronta e
em parte porque, depois de deixá-lo parado na neve, não tinha
certeza de que gostaria de ouvir de mim. E mesmo que quisesse
tantos anos de história, sentimentos feridos, palavras furiosas e
segredos estão entre nós. Não sei como desarmar o campo
minado.
Mas agora ele está aqui, e eu também.
“Talvez Claire possa ajudar.” Duane corre para frente e
encontro o olhar do meu irmão.
“Ajudar?” Resmungo.
“Com Billy?” Jethro olha entre mim e Duane, com a testa
enrugada.
“É uma boa ideia,” Sienna diz em torno de um bocejo e
meus olhos disparam para os dela. Se notou minha turbulência
interior, não fez nenhum sinal disso. “Ele pode comer se Claire
perguntar. Ela é difícil de rejeitar.”
“O que? Ajudar? Difícil?” Tento cruzar os braços, mas isso
parece estranho. Então seguro a bainha da minha camisola de
algodão branco nas minhas coxas. “Uh, ajudar com o quê?”
“Billy não come,” Duane diz claramente. “E não parece
bem, verde e pálido. E magro.”
“Ele está magro, certo?” Jethro muda seu peso para frente
e para trás, como se magreza de Billy o deixasse inquieto. “Quero
dizer, muito magro para Billy. E tem olheiras sob os olhos.
Parece quase tão ruim quanto estava naquele centro de
reabilitação, no ensino médio.”
Não sei muito sobre o tempo de Billy na clínica de
reabilitação durante o ensino médio, já estava muito longe de
nossa cidade natal. O pessoal disse que ele quebrou as pernas e
alguns outros ossos em um acidente de carro e ficou no hospital
por meses.
A preocupação com o bem-estar atual de Billy faz minha
mente se concentrar, e corta qualquer ansiedade e palpitações
de estômago que tenho em ficar cara a cara com a minha...
Bem meu. . . É complicado.
“Ele está com febre? Tosse? Você ligou para Ashley?”
Pergunto rápido. Ashley é a única irmã dos Winstons,
enfermeira, doce como torta e afiada como um chicote.
“Não. Sem febre nada como isso.” A expressão de Sienna
fica pensativa. “Ashley estava lá no aeroporto junto com Cletus,
nos vendo sair. Foi quem nos disse para garantir que Billy
comesse algo no avião.”
“Sim.” Jethro estala os dedos, fazendo um som de
frustração cansada, e puxa o telefone do bolso de trás enquanto
se afasta. “Cletus me fez prometer ligar quando chegássemos e
relatar sobre Billy. Esqueci. Deixe-me chamá-lo bem rápido.
Claire posso usar seu quarto?”
Concordo com a cabeça, dirigindo minha pergunta para
Duane e Sienna “Eu... não entendo. Ashley colocou Bil... seu
irmão em um avião quando sabia que estava doente?”
Duane e Sienna trocam um olhar, e Duane suspira e
esfrega o rosto. “Ele precisava sair da cidade.”
Agora estou bem e verdadeiramente perplexa. “Precisava
sair da cidade? Por quê? Ele está bem? Pensei que não estava
vindo, por causa de uh...” Bufo, me sinto estranha falando sobre
Billy. “Por conta do que aconteceu com Roscoe e Simone Payton
e seus deveres em Payton Mills, e ser um congressista, er...
Pessoa e...”
“Claire.” Sienna coloca a mão no meu braço, terminando
minha cascata verbal. “É uma longa história.” Ela segura meu
olhar, um sorriso paciente curvando seus lábios. “Nós
contaremos tudo o que pudermos, uma vez que todos
dormirmos, mas a questão crítica aqui agora é se devemos ou
não deixar Billy dormir ou acordá-lo e tentar fazê-lo comer
alguma coisa.”
Concordo. “Sim. Claro. Desculpa. Você está certa.”
O sorriso dela se alarga e aumenta sua mão cai enquanto
volta a atenção para Duane.
“Bem?” ele solicita. “O que você acha?”
Embora Duane se dirija a Sienna e ela abre a boca para
responder, provavelmente com algo atencioso e inteligente, solto
antes que ela possa falar “Você deveria acordá-lo e forçar comida
nele. E se não comer, não o deixe dormir nem lhe dê paz até que
coma.”
Então mordo meus lábios entre os dentes enquanto olham
perplexos em minha direção. Tento sorrir agradavelmente,
provavelmente falhando. Mas, Deus, se Billy não come, sinto que
essa resposta é óbvia. Alguém precisa se encarregar.
Duane enfia as mãos nos bolsos. “Claire, você não conhece
Billy muito bem, mas ninguém obriga meu irmão a fazer nada
não quer fazer.”
Torço os lábios para o lado, sem dizer nada, porque
conheço Billy Winston. Conheço Billy Winston muito bem. De
certa forma, eu o conheço melhor do que sua família jamais
conhecerá.
E ele conhece você.
Luto contra a natureza incrivelmente verdadeira e
complexa desse pensamento.
“Acorde.” Sienna concorda. “Ele não pode ser forçado. É
por isso que digo para deixar ele dormir. Então, amanhã,
prepararemos sua comida favorita.”
O olhar de Duane passa por Sienna. “Qual é a comida
favorita dele?”
Ela recua. “Você não sabe qual é a comida favorita do seu
irmão?”
Inalo profundamente, em vez de revelar a resposta, mas
faço uma lista mental de ingredientes para pegar na Coop, o
supermercado em Figline, hoje de manhã depois de me vestir.
“É bife?” Sienna tenta, dando de ombros. “Ou talvez peixe?
Ele gosta de peixe?”
Duane também dá de ombros. “Jethro adora comida
apimentada e rosquinhas. O favorito de Cletus é qualquer coisa
de mirtilo e torta de salsicha. Ashley adora tortas doces, todos
os tipos, mas principalmente merengue de limão e noz-pecã. Os
favoritos de Beau são milkshakes de morango e hambúrgueres.
Roscoe adora omeletes, ou qualquer coisa francesa e chique,
mas não tenho ideia da comida favorita de Billy.”
Jethro reaparece no meu lado, telefone pressionado em seu
ouvido. “Certo. Certo. Entendi.” Ele diz, acenando, seus olhos
deslizam para os meus. “Sim. Ela está bem aqui.” Então segura
o telefone, sussurrando “Cletus quer falar com você.”
“Comigo?”
“Sim.” Jethro pega minha mão, coloca o telefone na palma
da minha mão e se vira para encarar sua esposa e irmão. “Cletus
concorda com Sienna. Deixe-o dormir por enquanto. Pode ser
apenas a anestesia.”
Duane solta um bufo descontente e percebo que quer
protestar, mas fica quieto. Eu me viro e volto para o meu quarto,
levando o telefone ao ouvido.
“Olá? Cletus?”
“Scarlet” Ouço o tom seco de Cletus. Seu tom é sempre seco
nos dias de hoje. Não o lembro para me chamar de Claire. Meu
velho amigo parece ter aversão a usar meu nome legal sempre
que somos apenas nós dois. “Sua assistência é necessária.”
“O que há Cletus?” Pergunto, mas a confusão de
pressentimento e antecipação na minha barriga me diz que o já
sei o que está acontecendo. Ele quer que eu ajude com...
“Billy.”
Suspiro profundamente, esfrego minha testa. Apenas seis
pessoas sabem alguma coisa sobre minha história com Billy.
Uma desapareceu dezoito anos atrás, então ela não conta, e dois
deles faleceram, o que deixa Billy e Cletus.
“Não sei se ele quer...”
“Scarlet, eu não pediria se não fosse sério. Estou
familiarizado com o quanto gosta do seu hobby de fingir que Billy
não existe.”
Eu me irrito com isso, respondo com os dentes cerrados
“Não gosto de fingir que seu irmão não existe.”
Primeiro de tudo, é impossível. E segundo, há razões.
Todas razões saudáveis e lógicas? Não. No entanto, hormônios e
sofrimento muitas vezes levam as pessoas a fazerem coisas
loucas, e as razões existem e persistem.
Cletus conhece um pouco da nossa história. Ele sabe o
básico do que aconteceu quando Billy e eu inicialmente nos
apaixonamos quando adolescentes, mas não sabe sobre minhas
escolhas prejudiciais quando tinha dezenove anos. Portanto, não
entende por que acredito a tanto tempo, que Billy Winston e
Claire McClure são muito melhor se não falarem ou interagirem
um com o outro.
“Coisas aconteceram, recentemente e no passado, coisas
que não conhece, e Billy...” Cletus dá um suspiro. Parece tão
triste, irritado, e isso me faz parar. Nunca vi Cletus
exteriormente triste ou irritado.
“O que? O que aconteceu?” Pressiono mais o telefone no
meu ouvido, meu coração acelerando. “É sobre Roscoe?”
O irmão mais novo de Winston e a namorada foram
atacados no mês passado e quase morreram. Há mais na
história, mais segredos envolvendo meu pai malvado, mais
história distorcida de caipiras, mas essa é a essência. Roscoe e
Simone estão bem agora, melhorando a cada dia, mas foi por
pouco.
“Não, não é Roscoe. É o nosso pai. É Darrell.”
Fico mais ereta, um arrepio de alarme corre pela minha
espinha. “O que tem Darrell?”
“Darrell tem câncer. É muito ruim.”
O alarme se torna um alívio vingativo e digo “Bom,” antes
de poder parar a palavra, um sombrio senso de justiça se
apodera de mim.
Meu deslize não importa muito, nenhum dos Winstons
aprecia o pai, nem devem. O homem é terrível. Espancou a mãe
deles, batia neles bastante e mandou Billy para o hospital
quando tinha apenas doze anos. Depois que Bethany Winston,
sua mãe, morreu quase seis anos atrás, a dama mais doce, gentil
e amável do planeta, Darrell tentou sequestrar Ashley no funeral!
Você pode imaginar? O homem é um monstro. Para mim,
o câncer é pouco para o que ele merece.
“Não. Isso não é bom, Scarlet.” Cletus acentua o “t” no final
do meu nome e resmunga algo que não consigo ouvir, e depois
diz “Escute, é tarde aqui e estou cansado. Estamos voando em
uma semana ou duas, depende de algumas coisas, então preciso
que tenha certeza de que Billy coma alguma coisa. Hoje,
amanhã, no dia seguinte, ok? Faça ele se sentir bem.”
“Você quer que eu o quê?” Coloco minha mão no meu
quadril, me erguendo. O que Cletus está pedindo? Fazer ele se
sentir bem? O que isso significa? Não sei como fazer as pessoas
se sentirem bem. Nunca fiz ninguém se sentir bem, exceto com
comida e piadas. Posso fazer comida e piadas, sem problemas.
Mas não acho que o significado de Cletus esteja limitado a
comida e piadas.
“Quero que você, a artista anteriormente conhecida como
Scarlet, alimente, cuide e seja gentil com meu irmão, o homem
por quem se apaixonou por vinte anos, William Shakespeare
Winston, também conhecido como Billy Winston, também
conhecido como congressista Winston.”
Exalo alto, ignoro a dor no meu peito e sussurro: “Não faz
vinte anos.”
“Tudo bem, dezessete, dezoito, dezenove, ou algo assim. A
questão é que ele precisa comer boa comida, e muita, gentileza
e cuidado. Especificamente, de você.”
Não tenho problemas para fazer comida boa para Billy, mas
tenho um problema por ser intimidada por Cletus Winston.
“Cletus não estou dizendo não, mas há muitos bons cozinheiros
nesta vila gigantesca. Jethro está aqui, Sienna, o xerife, Sra.
James, Duane. Há muita gente que pode fazer comida para Billy
além de mim.”
“Não. Tem que ser você.”
“Por quê?”
“Porque você conhece todas as suas favoritas.”
“O que realmente está acontecendo?” Jogo minha mão no
ar. “Isto é ridículo. Sienna, Duane e até Jethro estão
amontoados, planejando como fazê-lo comer. E o que isso tem a
ver com Darrell tendo... tendo...” Uma agitação de preocupação
irritante transforma-se rapidamente em um tornado dos piores
cenários de terror. Eu me encolho, meus olhos ardem como se
levasse um tapa. “Espere, espere um minuto.” Lambo meus
lábios, minha boca subitamente seca, o quarto inclina para o
lado.
Oh Deus. Oh Deus. Oh Deus.
“Espere, está dizendo que Billy tem can...” Rejeito o próprio
pensamento, aumento minha voz. “Cletus Byron Winston, está
me dizendo que Billy também tem câncer?”
“E se tiver? Você faria o que pedi e seria legal com ele
então? Se estiver morrendo, realmente dará a ele a hora do dia?
É isso que vai ser?”
“Pare de ser um valentão e responda a maldita pergunta.”
“Não, mulher. Ele não tem câncer.”
Respiro em um suspiro.
Mas então Cletus, com a voz baixa e inconfundivelmente
zangada, acrescenta “Billy doou sua medula óssea para Darrell.”
O quarto se inclina novamente e minha boca se abre. Não
posso acreditar nos meus ouvidos, e então grito “Ele o quê?!”
“Shh! Não grite, vai acordar o bebê Liam.”
Fecho os olhos brevemente, tento reunir meus
pensamentos, sentimentos e humor, falando devagar e com
cuidado para não levantar a voz. “Está me dizendo que seu irmão
doou medula óssea para Darrell Winston?”
“Billy salvou a vida de Darrell.”
Engasgo com descrença e confusão, meus dedos voltam à
minha testa novamente, desta vez suspeito não conseguir
impedir o meu cérebro de cair da minha cabeça. Que diabos? O
que. Que Inferno.
Por que Billy faria isso? O que o teria possuído? Billy odeia
Darrell. Odeia ele. Por que faria isso? O QUE DIABO ESTÁ
ACONTECENDO?!
“É uma longa história, Claire,” Cletus diz, dando-me a
sensação de que reconhece os barulhos de absurdos saindo da
minha boca pelo que são: completa falta de coerência.
No entanto, o fato de ele finalmente me chamar de Claire
não escapa ao meu conhecimento.
“Cletus.”
“Prometo solenemente, no momento em que Jenn e eu
chegarmos, divulgarei a versão completa dos fatos, do começo
ao fim. Inferno, vou até contar todas as coisas que Billy deveria
ter dito anos atrás, mas não disse porque estava muito ocupado
disputando o título do campeonato mundial de Honorável Mártir
- o que, dado seu mais recente ridículo ato de abnegação,
ganhou em perpetuidade, para todo o sempre, amém. Sei que é
uma decepção, já que você também esperava o título.”
Minha boca se fecha e faço uma careta. “O que isso...”
“Mas agora? Neste minuto? Estou pedindo a você, minha
amiga mais velha e querida, que atravesse o terreno tênue da
Toscana. Aceite sua missão! E vá para onde os italianos vendem
seus produtos alimentares, os vinhos e outras comidas. Preciso
de você, a flautista mágica para preparar as refeições, para fazer
ao meu irmão o maior prato de fettuccine Alfredo já visto em
toda a terra. Coloque o bacon, o frango, o camarão e algumas
verduras, cenouras, brócolis e ervilhas. Coloque amor nisso
também. Alimente-o. Alimente seu corpo e sua alma. Certifique-
se de que coma, tome sol, dê-lhe um abraço ou dois ou cem,
diga-lhe que seus olhos são bonitos. Estou te implorando.”
Apesar do drama de Cletus, eu definitivamente farei todos
os seus pratos favoritos, sem problemas. Mas cozinhar não é
exatamente o que Cletus me pede para fazer.
“Você pode fazer isso?” Ele pressiona. “Fará isso? Aqui, até
digo, por favor. Por favor, Scarlet. Por favor. Por favor.”
Cruzo meu braço livre sobre meu coração dolorido. O que
Cletus quer é uma reconciliação milagrosa entre seu irmão e eu,
impossível por muitas razões. Se alguma coisa acontecer entre
nós, e que é um gigantesco se, vai levar tempo, muito tempo. No
passado, trouxemos o pior um do outro. Nunca faria nada para
liderar isso, não quando ainda estou tão insegura dos meus
próprios sentimentos sobre uma possível reconciliação.
No entanto, Billy está doente. Dado o quão preocupados
Jethro, Sienna e Duane parecem estar, suspeito que é mais do
que apenas recuperar-se fisicamente de uma doação de medula
óssea. Posso ajudar, então ajudarei. Mas não darei abraços ao
homem ou direi que seus olhos são bonitos apenas porque
Cletus exigiu, não importa o quanto desejo estar nos braços de
Billy ou quão verdadeiramente magníficos são seus olhos.
Decido oferecer um compromisso. “Vou aj...”
“Ótimo. Obrigado. Tchau,” Cletus diz.
E então desliga.
CAPÍTULO 2

CLAIRE

“Que cheiro é esse? Pãezinhos de canela?”


Olho por cima do ombro, dou um sorriso afetuoso ao meu
irmão. Estava tão perdida no meu próprio nervosismo que as
bolsas sob os olhos de Duane escaparam. Segurando o filho
adormecido na dobra do braço, ele esfrega um olho, luta com um
bocejo e senta em uma cadeira em volta da enorme mesa
retangular no meio da cozinha. A mobília é seriamente
gigantesca, mas todas as mesas desta casa são. Cabem catorze
cadeiras confortavelmente e pode adicionar outras seis em um
piscar de olhos.
“Sim. São pãezinhos de canela. Também fiz pães com a
massa. Esses sairão em breve.”
“Pãezinhos amanteigados, certo? Como mamãe fazia?”
“Isso mesmo. E tem canja de galinha no fogão. Quer um
pão? Com um pouco de manteiga?” Vou para o fogão, depois
para forno e para o balcão, e depois volto para o fogão, uma
corrente de energia frenética a cada passo.
Sinto-me frenética, talvez pareça frenética, mas,
felizmente, não é.
Limpo as mãos no pano de prato do bolso da calça jeans,
volto para onde coloquei os pães. Nenhuma lata de muffins foi
encontrada nesta enorme villa, então cozinhei os pães juntos em
várias formas redondas. Para minha consternação, o pão de
canela no centro de cada assadeira não subiu, emergindo do
forno murcho, achatado e meio cozido.
“Sim, por favor, para pão e manteiga,” diz, bocejando
novamente. “Estou com tanta fome. Não sei por que estou com
tanta fome. Tudo o que faço é trocar fraldas, segurar Liam,
tentar dormir, geralmente sem sucesso, e dizer a Jess como ela
é incrível.”
“A falta de sono pode deixá-lo com fome,” digo
distraidamente e arranco um pão da assadeira para meu irmão,
e levo para ele junto com dois grandes pedaços de manteiga.
“Desculpe por termos acordado você esta manhã.” Ele
aceita o prato, lambendo os lábios. “Janet e o xerife foram
embora há pouco tempo para visitar algumas ruínas ou uma
igreja ou algo assim.” Janet é a Sra. James, a mãe de Jess. “Acho
que todo mundo ainda dorme. Você teve a chance de voltar a
dormir? Ou cozinhou a manhã toda? Que horas são afinal?”
“Acho que são quase uma e meia. Fui à loja, peguei
algumas coisas, não é grande coisa.” Não havia como voltar a
dormir esta manhã, não quando soube que tem um Billy
Winston no final do corredor.
Minhas mãos tremem. Seguro o encosto de uma cadeira
até que parem. “Peguei mais fraldas e as coloquei no berçário,”
acrescento.
“Ah, obrigado por isso.” O bebê em seus braços se mexe,
chamando a atenção de Duane.
Assisto enquanto meu irmão olha para o filho, um sorriso
suave em suas feições. Ele se inclina e beija a pequena bochecha
enquanto faz um som suave e carinhoso. Meu Deus, mesmo se
não fosse meu irmão, é uma visão que derrete qualquer coração.
Mas me pergunto se a imagem é mais preciosa para mim
porque Duane e Liam são meus parentes e porque nenhum de
nós, nem Duane, nem seu irmão gêmeo Beau, nem eu, sabia que
éramos relacionados até poucos anos atrás. Mais preciosa
porque, se o segredo da maternidade de Duane e Beau ficasse
guardado indefinidamente, talvez eu não estivesse aqui para
experimentar esse momento.
Mas Billy sabia disso e nunca disse uma palavra a ninguém.
Esse pensamento atenua parte da expectativa fervendo na
minha barriga. Mesmo agora, todos esses anos depois, ainda não
consigo decidir o que pensar em ver Billy Winston. Ele nunca me
disse que Duane e Beau eram meus irmãos, apesar de ter muitas
oportunidades. Isso me faz pensar no que mais mantem em
segredo.
E isso não é uma pedra no sapato? E aqui eu ainda anseio
por um homem que mentiu para mim, sobre meus irmãos. Por
anos. Anos!
“Por que os bebês cheiram tão bem?” Duane pergunta me
tirando dos meus pensamentos sombrios.
“Hum.” Viro, me afasto do meu irmão e me aproximo da
bandeja que coloquei sobre a mesa. Pego uma tigela grande, vou
para o fogão e coloco duas porções generosas de sopa enquanto
falo. “Tenho certeza de que há uma razão científica,
provavelmente algo sobre hormônios e coisas do gênero.
Honestamente não sei. Mas concordo, os bebês cheiram como o
céu.”
“Para que a bandeja? E todas essas coisas que colocou
nela. Isso é para Jess? Ela está dormindo, finalmente.”
Outra onda de nervoso me faz soltar a concha na panela
com um barulho e reviro os olhos internamente.
Não sou essa pessoa. Não sou uma pessoa nervosa e
ansiosa. Não mais. Crescer, ser cautelosa e vigilante foi um
requisito para a sobrevivência. Mas tudo isso foi há muito tempo,
uma vida diferente, um tempo diferente, uma pessoa diferente.
Sou adulta agora, uma cantora e compositora que trabalha como
profissional. Não sou uma adolescente nervosa, suada e cheia
de ansiedade. Só porque Billy Winston está sob esse teto não
significa que tenho que ficar nervosa por isso.
Determinada a deixar de ficar tão ansiosa, viro para Duane
e me esforço para manter minha voz leve. “Oh isso? Isto é para
o seu irmão.”
“Meu irmão?”
“Uh, o segundo.”
“O segundo?” Duane levanta uma sobrancelha. “Você quer
dizer Billy?”
“Sim. Quando falei com Cletus esta manhã ao telefone, ele
pediu que fizesse com que seu irmão coma uma boa comida.”
Coloco a tigela de volta na bandeja, arrumo o guardanapo e a
colher e, então, desloco o pequeno vaso com duas papoulas
selvagens vermelhas vibrantes de volta e para o lado.
“Cletus pediu a você?”
Por alguma razão, sua pergunta me faz sentir culpada,
como se fui pega em uma mentira, mesmo que disse a verdade.
“Sim, bem, você e Jess têm o suficiente para lidar, e Jet e Sienna
acabaram de chegar, além de terem os meninos para cuidar.
Janet e o xerife querem passear, e isso faz sentido. Mas eu só
estou aqui com uma ajuda extra, se pensar bem, apenas tenho
que cuidar de mim, a maior parte do tempo. E então, faz sentido
que eu seja única a alimentar B-Billy... com comida... e tal...”
O olhar de Duane fica mais aguçado (ou estupefato,
depende de como você enxerga) e se transforma em uma
encarada. Mantenho-me imóvel, exceto pelo torcer dos dedos, sei
que estou me comportando estranhamente, mas nunca fui boa
em lutar contra minha culpa. Mesmo infundada, a culpa sempre
ganha, mas estou trabalhando nisso. Estou trabalhando para
me perdoar.
Então, sabe o que, Sra. Culpa? Desça uma longa montanha-
russa com uma pista inacabada.
“Claire.”
Começo. “Duane.”
“Você está nervosa com alguma coisa?”
Desvio meus olhos. “Não. De modo nenhum.” Minha voz
está tão alta que é quase falsete.
“Porque está agindo como se estivesse nervosa.”
Agora forço minha voz mais profunda e pergunto “Estou?”
e me encolho quando sai um barítono desta vez. Amaldiçoado
seja meu alcance vocal!
O cronômetro dispara e pulo, giro rápido para o forno, abro
a porta e pego os pãezinhos e depois puxo minhas mãos quando
percebo que não uso luvas de forno.
“Pode querer usar algumas luvas de forno,” vem à voz plana
de Duane atrás de mim.
“Sim. Obviamente.” digo, franzindo a testa para o meu
irmão ranzinza.
Amar Duane foi fácil, mas sua rabugice definitivamente
levou algum tempo para me acostumar. Não quero dizer nada
com isso, é exatamente como ele é. Mas sempre que Beau,
Duane e eu estamos juntos, Beau e eu trocamos um bom
número de olhares comiserativos.
Agarro as luvas do forno, retiro os pãezinhos, satisfeita com
a cor de suas partes douradas. Regar com manteiga antes e
durante o processo de cozimento faz a diferença, e tomo nota.
“Cara, isso cheira bem.” Duane diz, mordendo o pão de
canela, engolindo em seco antes de perguntar “Posso comer um
também? E um pouco de canja de galinha?”
Balanço a cabeça, tiro as luvas e pego dois pãezinhos
quentes da bandeja. “Sim. Mas pode se servir sozinho ou esperar
até eu voltar de levar isso ao seu irmão. Não devo demorar.” Se
Deus quiser.
Ele empurra para trás em sua cadeira, curva-se para dar
outro beijo de aconchego a Liam e dá a volta na mesa. “Não tem
problema, eu consigo. Só queria ter certeza de que isso era
permitido.”
“Permitido?” Dou os retoques finais na bandeja de Billy, um
pedaço de manteiga, um guardanapo de linho, uma faca de
manteiga, geleia de amora, olho para Duane. “Por que não seria
permitido?”
Ele revira os olhos. “Cletus.”
Sorrio. Ele não precisa dizer mais nada.
Pego a bandeja e saio conscientemente da cozinha,
recusando-me a pensar nos próximos dez minutos. Não adianta
especular sobre um futuro que não posso ver, mas tenho um
plano.
Pensei tudo ao longo da manhã: subir as escadas com
muito cuidado, minha mente e atenção nas escadas para não
tropeçar; depois colocar a bandeja na mesa do lado de fora da
porta de Billy, então bater na porta, pegar a bandeja de novo e
esperar responder. Quando responder, entrego a bandeja e digo
algo como: Aqui está, Billy ou Coma isso, por favor.
É um bom plano, sólido, normal. Minha mente se comporta
enquanto subo os dois lances de degraus de pedra e, embora
esteja um pouco sem fôlego quando chego ao patamar superior,
tenho certeza de que é devido ao exercício e não ao nervosismo.
Estou bem. Tudo bem. Tudo está bem.
Coloco a bandeja, limpo minhas mãos no pano ainda preso
no bolso, levanto o punho e bato na porta. Meu coração escolhe
esse momento para pular no meu esôfago. Ignoro. Sou adulta e
não tenho mais tempo para corações saltitantes. Corações
saltitantes estão firmemente no meu passado, juntamente com
uma culpa infundada, dando desculpas para as pessoas serem
idiotas, tentando viver minha vida por uma pessoa morta e me
desculpar em série por coisas que não precisavam se
desculpadas como dizer oi. Ou esbarrar em alguém. Ou pedir
um jantar em um restaurante.
Nunca. Mais. Sem desculpas.
Pego a bandeja. Volto para a porta. Espero, me preparo
para o impacto de sua voz. Imagino que dirá algo como, sim? Ou
quem está aí? Mas ele não diz. Não faz barulho. Um minuto
inteiro passa e meus ouvidos não escutam nada além de
silêncio.
Coloco a bandeja novamente no chão, bato novamente,
mas desta vez mais alto e pego a bandeja. Espero.
Sem resposta.
Franzindo a testa, olho para a porta, meu coração pula com
um novo tipo de ansiedade, quando as palavras de Cletus
retornam para mim: Não pediria se não fosse sério.
Abaixo a bandeja pela terceira vez, levanto minha mão para
bater, mas paro. Duane está certo. Não há como forçar Billy a
fazer algo que não queira, sem oferecer a ele algo em troca, algo
que queira.
Pontos sensíveis da minha consciência são acompanhados
por uma onda de calor correndo sobre a minha pele. Respiro com
dificuldade novamente, olho para frente, a porta treme enquanto
trabalho para ignorar as sensações, me deixando quente e fria e
fazendo minhas entranhas congelar e ferver.
Não pediria se não fosse sério.
“Droga” resmungo, levanto o punho e bato na porta. “Billy
Winston, abra esta porta.”
Silêncio.
Então, a cama range. E range novamente. E range pela
terceira vez, seguido por mais silêncio. Todo um maldito oceano
disso.
Obviamente, ele está lá dentro. Obviamente, não comeu.
Obviamente, sabe que sua família está preocupada com ele.
Obviamente, está muito doente para se mover em sua cama.
Não é óbvio? Está doente demais para ficar de pé ou falar.
Olho para a maçaneta, permitindo-me ficar excitada.
Preciso estar excitada se quero abrir a porta.
Você consegue fazer isso. Ele é apenas um homem. Como
qualquer outro homem. Exceto, não o bicho-papão. Não é o bicho-
papão. É como todos os homens comuns e normais. É um homem
comum e normal.
Mesmo enquanto tenho esses pensamentos, sei que não
fazem sentido. Billy Winston não é apenas um homem, e nunca
foi apenas um homem para mim. Quando éramos adolescentes,
era meu inimigo, e depois meu amigo, meu amor e, finalmente,
um traidor. Ele me traiu e me abandonou.
Quando voltei para a nossa cidade aos dezoito anos, casada
secretamente com meu marido, mas comprometida, tanto
quanto qualquer outra pessoa, Billy foi meu sonho, minha
fantasia, meu consolo e conforto e, finalmente, meu inimigo mais
uma vez.
É onde estamos há dez anos. Não sei se é onde estamos
agora. Não quero ficar em dois lados opostos do campo de
batalha, incapaz de resolver nossas diferenças ou coexistir na
órbita um do outro. Mas Deus me ajude mesmo se ainda amo
meu inimigo. O pensamento de Billy ali, sofrendo, incapaz de
ficar de pé ou falar, precisando da minha ajuda, é angustiante.
Da mesma forma, o pensamento dele ali, sem sofrer, mas
me ignorando, depois que cozinhei o dia todo para ele, fazendo
pãezinhos e mais pãezinhos, sopa de galinha e macarrão caseiro
e colhendo malditas papoulas, é irritante.
Agarro a maçaneta e abaixo, meio que esperando que a
porta esteja trancada. A porta se abre, revela dois degraus
íngremes de pedra e a escuridão. Evidentemente, ele fechou as
cortinas opacas, e um momento é necessário para meus olhos
se ajustarem, e meu coração parar de acelerar dentro do meu
peito.
Mas quando consigo enxergar, vejo uma cama king-size no
centro do grande quarto e uma figura deitada em cima dela. Não
embaixo das cobertas, em cima das cobertas. Está de costas
para mim, e um calafrio percorre minha espinha, uma sensação
forte que me faz deixar a bandeja na mesa do lado de fora da
porta e dar dois passos nos degraus íngremes para o quarto, no
piloto automático.
“Billy?”
Ele não se mexe. Meu estômago afunda, a preocupação me
sufoca, e minha respiração fica ainda mais rápida.
Vou até a cama para tocar em seu ombro, mas antes que
minha mão possa fazer contato, sua voz profunda e sombria diz
“Vá embora.”
Eu me encolho, puxo minha mão de volta. “Eu...”
“Por favor. Vá embora” diz, mais calmo desta vez.
Olho para suas costas, seus ombros largos, os cabelos
escuros na parte de trás de sua cabeça. Veste uma camisa de
mangas compridas, preta ou azul escuro, ou verde escuro, eu
não sei dizer, jeans e botas pretas. Nem tirou os sapatos. Pelo
jeito que está deitado, posso ver os braços cruzados sobre o peito
e o rosto pressionado contra o travesseiro. Presa entre minha
confusão, preocupação e irritação, não fico surpresa quando a
preocupação vence.
“Cletus me contou o que aconteceu,” digo suavemente.
“Ele disse,” parece distante, frio, desinteressado. Estou
familiarizada com esta versão de Billy e, por mais que me
entristeça, o desinteresse dele é, de certa forma, mais fácil de
lidar do que o interesse. O interesse de Billy Winston é
basicamente uma arma de choque para o meu bom senso.
“Trouxe comida, sopa de galinha e...” Torço meus dedos,
faço uma careta para sua forma imóvel. Jethro estava certo esta
manhã, Billy parece menor, mais magro. A preocupação floresce,
enche meu peito, minha barriga. “Você precisa comer, manter
sua força.”
“Deixa pra lá.”
Torço meu rosto. Partir imediatamente era o meu plano
antes de o ver. Mas agora, estranhamente, não estou pronta
para sair.
“Tenho tudo em uma bandeja do lado de fora daqui,” digo,
demorando, sem saber por que estou demorando. O instinto me
diz para fazê-lo falar. “Trouxe geleia de amora,” falo
unanimemente. “Mas também tem morango, se preferir. Mas
não uva.”
Silêncio.
Mais silêncio.
Tudo silêncio.
Olho ao redor do quarto e vejo uma cadeira de balanço de
madeira escura. Vou até lá, mantendo um olho nas costas de
Billy, a preocupação agora eclipsa todos os outros bons
instintos.
Incerta do que devo fazer, sair ou ficar, pergunto “Quer
falar sobre isso?”
“Não.”
“Você quer...”
“Não.”
“Posso...”
“Claire,” ele diz, seu tom calmo, sem emoção, e recuo.
Claire.
A única palavra efetivamente expulsa todo o ar dos meus
pulmões. Como Cletus, Billy não é parcial em me chamar de
Claire quando estamos sozinhos. De fato, é a primeira vez que
ele faz isso.
“Eu gostaria de dormir,” continua, com cuidado,
lentamente, como se não me chamou de Claire, como se
fôssemos conhecidos amigáveis, como se fosse educado. “Você
pode sair, por favor?”
Deslizo minha mandíbula para um lado, meus dentes da
frente raspam juntos quando uma faísca adormecida se acende
dentro de mim e digo “Não.”
Então sento minha bunda na cadeira de balanço e começo
a balançar. Ela chia toda vez que avança e clica toda vez que
volta. Chiado, clique, chiado, clique, chiado, clique.
Honestamente, o barulho é irritante como o inferno. Bom.
Billy não responde a princípio, deitado perfeitamente
imóvel por vários segundos enquanto balanço agressivamente
na cadeira, aquela faísca adormecida queima mais forte, quanto
mais olho para suas costas imóveis na penumbra silenciosa,
pontuada com um chiado, clique, chiado, clique, chiado, clique.
Então ele se mexe.
Agarro os braços curvos da cadeira, prendo a respiração
enquanto Billy rola lentamente de costas, como se o movimento
lhe custasse, fosse doloroso, e depois vira apenas a cabeça para
me encarar. Eu me preparo para a força de seu olhar e a
crueldade de seus belos traços, esperando um dos olhares
intensos, com assinatura de Billy Winston, que atordoam e se
espalham ao mesmo tempo.
O que consigo é muito pior.
Ele não está feliz, sem surpresa, então sua irritação mal se
registra.
Também não é uma surpresa, Billy ainda é inegavelmente
e brutalmente bonito. Mandíbula forte e angular, coberta por
uma barba espessa e negra, testa alta, nariz romano, olhos azuis
glaciais. Desde o Natal passado, lembro que tem um pouco de
grisalho nas têmporas e o primeiro vinco de rugas ao redor dos
olhos e na testa. Ambos serviram apenas para fazê-lo parecer
mais distinto e inatingível.
O que faz meu coração se encolher não é seu olhar irritado
ou sua atratividade, mas a palidez de sua pele, a escuridão em
volta de seus olhos e a distinta falta de brilho por trás de seu
olhar.
Assim, fico surpresa. Um pequeno sopro de ar escapa dos
meus pulmões, e paro de balançar enquanto levo outro momento
para estudá-lo. Suas íris tipicamente glaciais estão vazias, sem
vida, sem esperança, derrotadas. Esse homem que nunca foi
mediano está diminuído em todos os sentidos da palavra. Vê-lo
dessa maneira machucado fisicamente, traz uma onda de
inquietação. A sensação não é diferente de ouvir um piano
desafinado ou um garfo raspando um prato de cerâmica. Ele está
realmente doente. E, no entanto, ao inspecioná-lo, tenho certeza
de que a raiz do que o aflige é mais do que física.
Algo no meu rosto deve ter irritado Billy, porque aperta sua
mandíbula com força, seus olhos se estreitando. “Saia.”
Percebendo que estou olhando boquiaberta, e talvez
também encolhida, trabalho para deixar transparecer minhas
expressões, empurro a cadeira para retomar o impulso para
frente e para trás. Chiado, clique, chiado, clique, chiado, clique.
“Não,” digo.
“Não.” Ele repete a palavra, como se provasse ou cuspisse.
“Não.” Balanço minha cabeça rapidamente, meu pulso
acelera por várias razões, mas principalmente porque Cletus não
exagerou, e não sei como transformar meus sentimentos em
ordem. “Mas você pode dormir,” digo, principalmente apenas
para dizer alguma coisa. “Vou ficar sentada nessa cadeira de
balanço.”
O que você está fazendo, Scarlet? O que aconteceu com
você? Não cutuque o ursinho!
Digo aos meus pensamentos que se calem e me deixem em
paz. Talvez não saiba o que estou fazendo ou por que estou
fazendo, mas o instinto assumiu o controle e, às vezes, não há
discussão com o instinto.
“Por quê?” Pergunta impaciente, seu peito sobe e desce
rapidamente. “Por que não vai embora?”
“Porque gosto desta cadeira de balanço.” Levanto meu
queixo. “É confortável.” Chiado, clique, chiado, clique, chiado,
clique.
Seu olhar vaga para onde minha mão agarra o apoio do
braço. “Não há outras cadeiras confortáveis em casa?”
“Não tão confortável quanto esta.” Chiado, clique, chiado,
clique, chiado, clique.
Billy continua me olhando com sua expressão maçante.
“Pode movê-la para o seu quarto.”
“Não. Você está cansado demais. Acabou de dizer isso. Vá
dormir. Estarei aqui.” Chiado, clique, chiado, clique, chiado,
clique.
Sua mandíbula aperta. “Não quero você aqui.”
“Bom saber.” Chiado, clique, chiado, clique, chiado, clique.
Seu peito sobe e desce novamente, mas não há calor atrás
dos olhos, nem gelo. Somente... Nada. Isso me faz querer chorar.
Em vez disso, o instinto me diz para olhar de volta e continuar
balançando.
Chiado, clique, chiado, clique, chiado, clique, chiado, clique,
chiado, clique, chiado, clique, chiado, clique, chiado, clique,
chiado, clique, chiado, clique, chiado, clique, chiado, clique.
“Tudo bem,” ele resmunga, fechando os olhos.
“Bem?” Paro de balançar, mas me inclino para frente,
empoleiro na beira, pronta para... fazer alguma coisa.
“Traga a comida. Eu como.” Sem olhar para mim, Billy
levanta-se para uma posição sentada, um lampejo de dor
distorce seu rosto por apenas alguns segundos, isso faz meu
coração apertar novamente.
Quero ir até ele. Quero ajudá-lo a se sentar. Então quero
envolvê-lo em meus braços e dar-lhe beijos por todo o rosto,
abraçá-lo e dizer-lhe que tudo ficará bem.
Lembro que há muito mais distância do que apenas um
metro e meio entre eu e um abraço de Billy Winston, levanto e
subo os íngremes degraus de pedra. Pego a bandeja de comida,
desço as escadas e vou para a cama grande. Coloco a bandeja
na mesa de cabeceira, pego a tigela e, na minha cabeça, estou
prestes a pegar uma colher de sopa e alimentá-lo, quando Billy
pega a tigela e a tira do meu alcance.
Assustada com sua rudeza e meu estranho instinto de
literalmente alimentá-lo com a colher, volto para o final da cama,
sento e cruzo as mãos no colo enquanto o observo. Billy come
um pouco, três, quatro, cinco colheradas de canja de galinha, os
olhos meio abaixados, e aparentemente olha para nada em
particular. Isso também me parece preocupante.
Mesmo assim, aproveito o raro e silencioso momento,
compartilhando espaço com esse homem com quem sonhei
tantas vezes, estudando seus movimentos, as linhas de seu
rosto.
Anos atrás, odiava sonhar com Billy com alguma
frequência. Acordava me sentindo culpada e envergonhada do
meu subconsciente, considerando os pensamentos não
solicitados, mais uma prova da minha natureza desprezível.
Estava casada com um homem e sonhava com outro. Mesmo
enquanto dormia, fui infiel.
Só. Muita. Culpa.
Mas, em algum momento nos últimos dez anos desde a
morte de Ben, e especialmente nos últimos seis meses desde que
comecei a procurar meu terapeuta, anseio pelos meus sonhos
com Billy. Talvez porque Ben se foi e não estamos mais casados.
Talvez porque os sonhos sempre foram tão bons e nos dávamos
tão bem, cantando, conversando, andando pela floresta, rindo,
deitados juntos, tocando-nos com doçura.
Ou talvez porque cresci velha e sábia o suficiente para
entender a diferença entre pensamentos e ações. Penso em Billy
com frequência. Penso em como seria estar com ele
frequentemente. Mas meus pensamentos não parecem mais
uma armadilha, como uma armadilha inescapável. Não tenho
que agir de acordo com meus desejos e vontades. Eles
simplesmente veem, e tenho o poder de decidir se serão
separados de mim.
“Você pode ir agora,” diz, colocando a tigela de volta na
bandeja e ainda não olhando para mim.
“Hummm.” Levanto e espio. A tigela está vazia, mas o prato
com os pãezinhos não foi tocado.
Pego o primeiro pãozinho, que ainda está quente, divido ao
meio e amasso ambos os lados liberalmente. Depois acrescento
a geleia de amora, devolvo o pãozinho ao prato e coloco na frente
do rosto dele. Billy olha para frente e através do pãozinho que
mantenho em sua linha de visão, o músculo em sua mandíbula
bate.
“Sei que você gosta de geleia de amora,” digo, mexendo no
prato. “E sei que ama esses pãezinhos. Ainda está quente.
Acabei de fazer esta manhã.”
Billy fecha os olhos, o queixo baixa até o peito. Retiro o
prato quando ele leva a mão à testa, enfiando os dedos nos
cabelos.
“Deus Claire. Por favor. Por favor, me deixe em paz.”
Fico tensa, como se um grande e afiado espeto enterrasse
logo abaixo do meu peito. Ele me chamou de Claire. Novamente.
Mas não vou pensar nisso agora. Está doente, necessitado,
e se Billy ainda se importa comigo é irrelevante.
“Coma o pãozinho,” digo, timidamente, tocando na minha
versão de quatorze anos que costumava dar-lhe insolência e
sorrisos em igual medida.
Observo enquanto Billy respira fundo, seus olhos
finalmente se abrem e levantam para os meus, enrijeço. Isto. Isso
é o que esperava antes. Esse olhar. A colisão aquecida,
penetrante e feroz de seu olhar.
Por um segundo, perco a cabeça, deslumbrada, meu
pescoço fica quente. Mas então, quando olhamos um para o
outro, detecto uma fratura na firmeza de sua marca registrada.
Uma nota baixa, como se fosse uma máscara que colocou em
vez de ser realmente ele.
Inclino minha cabeça para o lado, estudo esse rosto que
conheço tão bem. “Ah-ah. Sei o que esse olhar significa.”
“Que olhar?” Pergunta sua voz quase acima de um
sussurro, o tom envia uma onda de arrepios nos braços.
“Está pensando que vai me intimidar daqui, certo?” Cruzo
os braços enquanto seguro o prato. “Acionar o charme do
homem das cavernas? Talvez me faça corar, algo assim?”
“Você tem um rubor muito bonito.” Seu olhar aquecido
viaja até os meus seios. “Sempre me perguntei, você cora em
todos os lugares?”
Coro com isso, mas também sorrio. Ele não está me
chocando ou intimidando, hoje não. “Continue William. Diga
algo para me envergonhar.” Bato meus dedos. “Pode me dizer,
como apostou que tenho gosto de morangos,” digo, certificando-
me de parecer entediada.
Seus olhos voltam para os meus, a lascívia forçada
substituída por aquela apatia desconcertante. Pela primeira vez,
lamento a perda daquele olhar maldito, o desejo de volta, mas
apenas se for realmente ele e não fingimento.
Seguro o prato, balanço novamente. “Coma agora, por
favor.”
Erguendo a mão como se a ação o exaurisse, ele arranca o
pãozinho do prato e come em duas mordidas. Então, ainda
mastigando, desliza lentamente na cama, rola novamente para
o lado e me dá as costas. Volto o prato para a bandeja com
relutância e decido não pressioná-lo a comer o outro pão. Ainda
não. Talvez mais tarde. Junto com aquele fettuccine Alfredo
sugerido Cletus.
Pego a bandeja, subo os degraus e coloco na mesa do lado
de fora da porta. Então volto para o quarto, procuro um cobertor
sobressalente no armário escuro e o cubro com ele. Mas deixo
os sapatos descobertos para poder desatar os cadarços, o que
começo a fazer.
“O que está fazendo?” Billy levanta um pouco a cabeça,
assim que toco sua bota, e posso ouvir o desagrado em sua voz.
“Tirando seus sapatos, vai dormir melhor.”
Termino de desatar os cadarços, tiro a bota direita e depois
à esquerda, coloco as duas logo abaixo da cama. Depois cubro
seus pés com o cobertor, volto para a cadeira de balanço,
novamente, permitindo que o instinto guie meus movimentos, e
me sento. Dessa vez não balanço, aquele chiado faria um peixe-
boi ficar irritado.
Assim que me acomodo, olho para Billy e o encontro me
olhando por cima do ombro.
“Vai dormir?” Pergunto suavemente, igualmente à vontade
e no limite. “Pensei que estava cansado.”
Ele sacode sutilmente a cabeça. “Por que não vai embora?”
Antes que possa pensar melhor nas palavras, digo: “Porque
quero ficar e garantir que nenhum monstro venha enquanto
estiver dormindo.”
Porcaria. Deixei minhas esperanças me ultrapassarem.
Aqui está ele doente, e eu trazendo momentos controversos do
nosso passado, antes de termos uma conversa adequada. Mas
algo através de seu olhar muda numa centelha de interesse, de
lembrança, e meu coração dá uma palpitação em resposta.
“O que vai fazer...” Ele franze a testa. Parece pensativo,
como se lembrasse de algo. Começa novamente: “O que fará com
os monstros, se eles vierem?”
“Você não quer saber.” Cito suas palavras daqueles
momentos controversos roubados, tantos anos atrás. “Bons
sonhos.”
Os olhos de Billy se movem sobre mim, ainda sem brilho e,
de alguma forma, não tão distantes como antes. Eventualmente,
ele se vira completamente, a cabeça cai no travesseiro.
Sinto um alívio e solto a respiração, preciso relaxar as mãos
e meus ombros. Não percebi que estava tão tensa, mas suponho
que faz sentido. Toda vez que estamos sozinhos, brigamos ou
nos beijamos; arrependia-me tanto da briga como do beijo por
tanto tempo. Não quero mais brigar.
Para o bem ou para o mal, seu desinteresse por mim
desarmou minha apreensão e acendeu meus instintos de
proteção. Não consigo me levantar e sair desta sala, mais do que
voar como um pássaro, e é isso.
Alguns momentos se passam e me acomodo na cadeira de
balanço. É confortável o suficiente como as cadeiras, mas nem
perto da cadeira mais confortável da casa.
Assisto os ombros largos de Billy subir e descer em um
ritmo constante, e espero que isso signifique que esteja
dormindo, quase relaxo, quando a voz de Billy áspera e baixa
com o sono diz “Você está me confundindo, Scarlet.”
Mantenho-me perfeitamente imóvel, espero preocupada
que diga mais. Não quero que isso se transforme em um de
nossos argumentos, nossos combates épicos de gritos seguidos
por seu ombro frio. Quero que Billy fique bem, me deixe cuidar
dele, deixe as coisas acontecerem. Só desta vez. Por favor. Apenas
deixe-me fazer isso.
Ele não diz mais nada. Dormiu. Eu o observo dormir,
determinada a manter os monstros afastados.
CAPÍTULO 3

BILLY

O sol se pôs e nasceu desde a visita dela. Agora é de manhã,


ou talvez tarde, não tenho certeza. Não consigo interpretar a luz
que atravessa as bordas das cortinas, é diferente aqui.
Curiosamente, fico de pé e manco até a porta de vidro
deslizante. Subir aquelas escadas ontem me custou. Meu corpo
rígido e protestando, abro as cortinas e estreito os olhos, viro o
rosto para longe da repentina inundação de brilho. Recuo, pisco,
esperando meus olhos doloridos se ajustarem.
O zumbido repetido do meu telefone de algum lugar do
quarto me faz sair da visão ofuscante e procura-lo. Cansado
como estava ontem, levei um tempo para adormecer com ela no
quarto. Quando consegui, não sonhei com nada. E quando
acordei em algum momento no escuro, a irritante cadeira de
balanço estava vazia.
Naquele momento, trabalhei para ignorar a pontada de
decepção sem sentido, e fiz alguns movimentos necessários,
como usar o banheiro, escovar os dentes, carregar o telefone
para verificar se Roscoe ligou, e então saber a hora, mudar em
roupas mais confortáveis. Meu quadril e costas doíam então
peguei algo para aliviar. Voltei para a cama, mas não consegui
dormir.
Agora estou mancando pelo quarto, tento lembrar onde
coloquei meu telefone. Eventualmente, o encontro em cima da
cômoda onde conectei ontem à noite. Franzo a testa para a tela,
meu polegar paira pronto para rejeitar a ligação, me endireito,
surpreso pela identidade do interlocutor. Aceito a ligação, levo o
telefone ao ouvido.
Antes que posso dizer olá, ela diz: “Billy.”
“Dani.”
“Seu telefone vai para o correio de voz há dois dias.”
Olho ao redor do quarto em minha busca por um assento.
“Meu telefone estava desligado. Estava morto. Desculpa.”
“Tudo bem. Liguei para Cletus, ele disse que chegou à Itália
e estava com Jetro, então sabia que estava bem.”
Ignoro a cadeira de balanço, vou até a cama, e sento na
beira dela. “Estava preocupada comigo?”
“Um pouco.”
Fiz a pergunta zombando, então minha reação inicial à sua
admissão, é de surpresa. Daniella, Dani, Payton não está
preocupada. É um trator, e a admiro demais por isso. Desde o
início de nosso compromisso mutuamente benéfico, nunca
procurou expressar preocupação por mim ou preocupação com
meu bem-estar.
“Você está surpreso?” Pergunta, sem parecer ofendida,
mais curiosa. “Não estou tentando incomodá-lo.”
“Sei que não está tentando me incomodar.” Nunca a
acusaria de incomodar. Ela não liga. Nunca. Sempre fui eu quem
a procurei para discutir planejamento e logística, fazer pedidos
para sua participação nessa função ou benefício, e não o
contrário. “Eu deveria ter ligado e dado notícias. Sinto muito.”
“Pare de se desculpar. Nós não fazemos isso um com o
outro. Ei, você comeu alguma coisa?”
Oh. É por isso que está ligando.
“Cletus disse para você me perguntar isso?” Resmungo,
balançando a cabeça. Amo meu irmão, mas ele é definitivamente
um chato.
“Sim, pediu. Queria ter certeza de que está comendo,
porque disse que no dia anterior à sua partida não comeu nada
e, quando chegou, Jethro disse a Cletus...”
“Não posso acreditar neles.”
“Quem?”
“Meus irmãos. Eles criaram uma árvore telefônica para
discutir meus hábitos alimentares.”
“Acho que criaram.” Dani sorri. Ela sorri muito, mas
sempre parece relutante, como se realmente não quisesse
compartilhar essa parte de si mesma com ninguém. Ou talvez
não quisesse compartilhar essa parte dela comigo. “Mas pode
culpá-los? Estão preocupados.”
“Não deveriam,” digo, pensando: Já passei por coisas
piores.
“Isso é uma coisa boba de se dizer. Sua família te ama, é
claro que vão se preocupar.”
“A falta de apetite é um efeito colateral conhecido da
anestesia que usaram para o procedimento. Também aconteceu
da última vez.”
“Então você comeu?”
“Comi.”
“O que você comeu?”
Olho para o nada. “Canja de galinha e, uh, pãezinhos
amanteigados.”
“Oh. Seu favorito.”
“Sim. O meu favorito.” Respondo suavemente.
“Por que soa assim?”
“Como o quê?”
“Está usando sua voz Scarlet.”
Porcaria. “Estou?”
“Está. Ela está aí, não está?”
Esfrego o rosto com minha mão aberta, de repente estou
cansado para conversar. Adormecer foi sempre difícil, mesmo
sem sua presença no quarto. Normalmente, se não estava
exausto a ponto de desmaiar, a noite era quando as lembranças
de Scarlet eram mais nítidas, e por isso que sempre me
certificava de me desgastar durante um dia típico. Algumas
pessoas se exercitam, ou trabalham duro e por longas horas
devido à ambição. Minhas razões eram muito menos louváveis.
“Você ainda está aí?” A voz de Dani no meu ouvido me traz
de volta ao presente. “Billy?”
“Sim, estou aqui,” digo, esforçando-me para banir
pensamentos sobre Scarlet. Novamente.
A vida além deste quarto continuou desde que descobri a
cadeira de balanço vazia. A vida avançou enquanto lutava para
pensar em qualquer outra coisa. Mas fiz isso. Ontem à noite, a
empurrei para as margens da minha mente, preenchendo os
espaços que procurava invadir com listas e tarefas ordenadas.
Se há uma habilidade que pratiquei mais do que qualquer outra
na última década, é me forçar a me concentrar em outros
assuntos além de Scarlet St. Claire.
“Então, ela está aí. Certo?”
“Cletus te contou isso também?” Não tento disfarçar minha
aversão ao assunto.
“Na verdade, sim. Ele fez questão de me dizer que estava ai
com Scarlet.” Parece divertida, como se achasse Cletus hilário.
“Foi muito fofo.”
“Sim, bem, ele sabe que você e eu cancelamos o noivado,
mas não sabe que era falso.”
“Oh acho que Cletus provavelmente sabia que era falso. Na
verdade, tenho certeza de que sabia o tempo todo que era falso.”
“Você acha?” Não sei se concordo com ela, dado o fato de
Cletus ter se preocupado muito com o noivado.
“Seu irmão é uma pessoa baseada em evidências. Nós
nunca saíamos juntos ou passávamos algum tempo juntos,
exceto para éramos vistos em público. Mas isso não importa
agora, porque você cancelou.”
“Ainda está irritada?” Pergunto.
“Não. Claro que não. Desde o início, concordamos em fazer
isso, desde que beneficiasse a nós dois. E não estava irritada
com você quando terminou a situação. Esperava que tivéssemos
mais alguns meses. Tenho algumas coisas em banho-maria,
acordos que preciso ver se seriam mais fáceis se estivesse noiva
do congressista, que em breve será senador, Winston.
“Deveria dizer isso. Podemos continuar por mais alguns
meses, se te ajuda.”
“Não, não acho que seja necessário, já que está atualmente
na Itália com Scarlet.”
Ignoro isso. “Dani. Não é grande coisa.”
“Billy, está tudo bem. Mas obrigado por me deixar ser a
única a tornar isso público. Posso esperar mais uma semana e
depois enviar a declaração oficial.”
“Leve o tempo que precisar.”
Dani faz uma pausa, talvez pensando, talvez sem saber
como proceder, mas acaba perguntando: “Você está ficando em
pé?”
“Não fiz nada além de dormir desde que cheguei.”
“Bom. O médico fez questão de me ligar e me lembrar de
ter certeza de que não se mexeria dessa vez. Você não se cuidou
com a última doação, desta vez realmente precisa repousar esse
quadril. Sem andar. Se acalme.”
“Ok.”
Ela faz uma pausa novamente, talvez pensando em como
abordar um tópico. Contente com o silêncio, olho para frente
sem ver, nem desfruto nem detesto o vazio frio de pensamento e
sentimento dentro de mim.
Já estive nesse limbo entorpecido antes. A primeira vez
tinha doze anos, logo depois que acordei no hospital, depois que
meu pai quase me matou. Na segunda vez, tinha dezesseis anos,
logo depois que acordei no hospital, depois de receber o castigo
de Scarlet, como meu, e os homens de meu pai quase me
matarem.
Dessa vez, a dormência diminuiu logo após descobrir meu
irmão mais novo, Roscoe, naquela lanchonete com uma facada
nas costas. Desde então, passo pela vida, fazendo o que
precisava ser feito. O vazio só se intensificou quando decidi fazer
a primeira doação de medula óssea para Darrell, um ato que
salvaria a vida do homem que quase levou a minha, duas vezes.
Dani suspira, parece impaciente, e diz “Tudo bem, agora de
verdade, Billy. Como está? E não quero dizer seu quadril. Você
a viu?”
Sinto algo dentro de mim, como dor e frustração, pulsando
atrás dos meus olhos. Eu os fecho, bloqueando isso.
“Sim,” digo.
“Bem?” Ela pergunta.
“Foi ela quem me alimentou à força,” digo.
“Sério?” Ela pergunta.
“Hum-hum,” digo.
“Você deve fazer uma greve de fome contínua enquanto
estiver aí.” O tom de Dani está mais seco que o deserto. “Então
talvez ela lhe dê atenção.”
“Não estou fazendo isso.” Testo minha mandíbula,
movendo-a de um lado para o outro. Estou rangendo os dentes
à noite, ou pelo menos o meu dentista me disse quando reclamei
de dores de cabeça.
“Por que não? Seja um pouco paciente, deixe-a ser
enfermeira, veja para onde isso vai.”
“Não.” Abro meus olhos. “Meus dias de tentativa de
manipular Scarlet para me querer acabaram, já faz um bom
tempo.”
“Você quer dizer Claire.”
“Sim.” Mais uma vez, meu olhar perde o foco e encaro o
vazio. “Acho que quero dizer Claire.”
Ouço Dani se mexer, seu assento range. “Sabe, de um
sobrevivente trágico de história de amor para outro, posso
sugerir isso... sabe o que? Esqueça. Vocês nunca selaram um
acordo e parecem tão miseráveis quanto eu. Portanto, não tenho
bons conselhos. Faça o que puder para se proteger o máximo
possível. Tenha expectativas realistas sobre ela e, em seguida,
defina-as ainda mais. É tudo o que pode fazer.”
Sinto meus lábios se curvarem. “Não posso discutir com
isso.”
“Como foi vê-la?” Uma pitada de preocupação incomum
aparece em sua voz. “Ela falou com você dessa vez? Ou fez a
coisa usual de fugir?”
“Ela falou comigo, na verdade.”
“Chocante. Estou chocada. Chocada.”
Finalmente dou permissão à minha mente para me desviar
e pensar na curta visita de Scarlet. Ela me confundiu. Não foi a
comida que me confundiu, ou me obrigar a comer balançando
naquela maldita cadeira. Ambas as ações são muito parecidas
com Scarlet, assim como sua teimosia.
O que me confundiu foi por que ficou depois que comi, por
que tirou minhas botas e me cobriu com um cobertor, por que
disse o que fazer sobre os monstros. Por que fez isso? Odiei que
fez isso. Odiei como a esperança brilhou com a lembrança,
mesmo sabendo que com ela, esperar qualquer coisa seja
loucura. Então, sim, estou confuso. Eu não a entendo.
Você não precisa entender Scarlet. Precisa deixá-la ir.
“Bem? O que ela disse?” Dani empurra novamente me
trazendo de volta ao presente.
“Nada de consequência.” A mentira escapa antes que possa
parar, mas deixo.
Quero ficar e garantir que nenhum monstro venha enquanto
estiver dormindo.
O que fará com os monstros, se vierem?
Você não quer saber. Bons sonhos.
“Se isso não tem importância,” Dani continua
pressionando, como costuma fazer, “Então não deve ter
problemas para me dizer.”
“Bem.” Decido relatar apenas os fatos. “Ela não foi embora
até eu comer.”
“Por que simplesmente não a ignorou?”
“Porque ela se sentou numa cadeira de balanço no meu
quarto, que faz barulhos incrivelmente irritantes sempre que
balança, e não parava de balançar até eu comer sua canja de
galinha.”
Dani solta uma risada. “Está falando sério? Isso é hilário.”
Não digo nada.
“Então o que aconteceu?” Dani pressiona depois que fico
quieto por um tempo.
“Eu comi, então ela ficou e...” Uma risada sombria sai de
mim “Ela me viu dormir.” Não digo a Dani a importância disso,
ou o que Scarlet disse sobre monstros, não é para compartilhar.
Isso é nosso, de Scarlet e eu.
Vagamente, sem ser solicitado, me pergunto se Scarlet
ainda tem pesadelos. O pensamento penetra o suficiente na
minha dormência atual para enviar uma dor aguda através do
centro do meu peito. Fecho os olhos novamente.
Não pense sobre isso. Não pense nela.
Dani fica quieta por um tempo, como se desta vez estivesse
realmente chocada e fala quando finalmente se recupera “Ela
ficou e assistiu você dormir?”
“Sim.”
“Bem então. Não esperava isso. No entanto, não parece
muito feliz com esse desenvolvimento. Quero dizer, pensei que
ficaria feliz. Esta é a mulher pela qual espera basicamente toda
a sua vida.”
Como sempre, é nesse ponto que me arrependo de ter
confiado em Daniella Payton todos aqueles anos atrás, na noite
do casamento de Jethro. Normalmente, não me arrependo
daquela noite, trocamos nossas histórias tristes, bêbados na
biblioteca da casa da minha família, sempre que ela fazia muitas
perguntas ou usava palavras como sofrer.
“Enfim,” digo. Hora de mudar de assunto para sempre.
“Como você está?”
“Ah não. Não terminei. Por que não está mais feliz com
isso? Quando ela veio para o Natal no ano passado, tinha todas
aquelas grandes esperanças e planos, onde mostraria que
cresceu, deixaria que viesse até você.”
“E isso funcionou tão bem,” digo firmemente.
“Seu único erro foi...”
“Amá-la.”
“Nããão.” Não posso ver Dani, mas sei que está balançando
a cabeça. “Seu único erro foi e ainda é estar ressentido com ela.
Ainda está bravo por ela ter escolhido Ben em vez de...”
“Ela escolheu a culpa! Não Ben.” Meus olhos se abrem e
uma onda de fúria moderada enrijece minha voz. “Seu grande
amor é a culpa, não Ben McClure. Ele era apenas o traficante,
aquele que a viciou, com todos os seus 'sacrifícios santos'.
Scarlet é viciada em sua culpa, vergonha e maldita presunção...”
“Ei. Você parece zangado.”
Minha testa cai na minha palma. Droga. Droga! Dani está
certa. Pareço chateado. Estou chateado. Ainda estou muito
zangado com ela.
“Disse a você faz anos, precisa deixar essa merda ir.”
Esfrego meu olho com um punho. “Se pudesse, não acha
que já teria agora?”
“Talvez se transar, relaxe. Ser celibatário toda a sua vida
adulta não é saudável.”
“Nós não estamos falando sobre isso.”
“Ok pense assim, o que é pior? Scarlet ser viciada em sua
culpa ou você, Billy Winston, viciado em sua amargura?”
“Acha que sou viciado em me ressentir dela?”
“Sei que é. Se quisesse Scarlet mais do que sua raiva, já
teria dito a ela o que fez, quando saiu aos catorze anos.”
Esse é um argumento velho e cansado. Tivemos a mesma
conversa várias vezes, geralmente depois de bebermos muito
uísque e ela chorar por Curtis Hickson, também conhecido como
Catfish, capitão e criminoso dos Iron Wraiths. A mulher parece
com a atriz Gabrielle Union e é um gênio financeiro. Ainda não
entendo por que alguém como Daniella Payton, brilhante em
todos os aspectos possíveis, boa, carismática e linda, tem uma
fraqueza por um idiota como ele.
“Não, Dani...”
“Sim! Poderia ter diminuído a distância entre vocês há
muito, muito tempo atrás, apenas dizendo a verdade a Scarlet.
Se ela soubesse que levou o castigo dela, que quase morreu,
perdeu a chance de jogar bola na faculdade, você...”
“Se ela soubesse,” falo com os dentes cerrados, “se sentiria
obrigada a mim, como fez com Ben. Ela não precisa de mais
culpa, mais pessoas fazendo exigências, e não quero que me
escolha por um senso de dever. Isso não tem escolha. Ele a
arruinou. Destruiu o seu espírito.”
Dani fez um som de impaciência e calculo que acaba de
revirar os olhos. “Ela não está arruinada, é fabulosa. Já ouviu o
último álbum dela? Nem gosto de música country e a voz dela
me dá calafrios.”
Ignoro a pergunta e o conteúdo de sua declaração, focando
na questão real. “Prefiro nunca ter Scarlet que ficar com ela
assim. Não quero que pague uma dívida, não quero sua culpa.
Eu só a quero.”
“Então aproveite esta oportunidade! Ela está ai, na Itália,
agora, com você. Deixe de ficar com raiva, pare de odiá-la e
apenas ame a mulher, Billy. Somente. Ame. A. Mulher.”
“Não quero falar sobre isso.” Outra pontada de dor no
centro do meu peito empurra as palavras da minha boca.
“Bem. Vamos falar sobre o transplante de medula óssea.”
“Também não quero falar sobre isso.”
Dani sorri. “Bem. Tanto faz. Há muitas coisas que nunca
quer falar. Então, deixe-me dizer uma coisa. Em nome de toda a
minha família, obrigado. Obrigado por estar lá naquela noite
para ajudar minha irmã. Obrigado por doar a medula óssea.
Está fazendo a coisa certa.”
Impeço-me de desligar na sua cara. Definitivamente, não
quero sua gratidão por doar minha medula a Darrell. Não fiz isso
por ela, ou sua família, ou mesmo minha família. Fiz por
vingança.
Dani continua falando. “Todas as pessoas que Razor
matou, elas e suas famílias vão obter justiça. Ele vai para a
cadeia pelo resto da vida, ou vai receber a pena de morte, uma
ou outra, e isso é por sua causa. Seu pai morreria se não fosse
por você. Sim, Razor seria acusado pela tentativa de assassinato
de seu irmão e minha irmã, uma oficial federal, mas não é isso,
quero dizer, poderia ser libertado em vinte anos.”
“Talvez ele morresse na prisão,” digo calmamente, “Antes
de ser libertado, agora que não pode usar as mãos.”
“Hummm. Talvez. Mas pense em todas as famílias que não
teriam conseguido justiça.”
Dou de ombros, olho pela janela. “Acho que é verdade.”
Passamos os próximos segundos em silêncio, cada um com
nossos próprios pensamentos. Assisto uma vespa bater contra a
porta de vidro do meu quarto, procurando uma entrada. Por
vontade própria, meus olhos se concentram além da vespa, na
paisagem. Se estivesse de bom humor ou com cabeça para
perceber essas coisas, diria que a vista é linda. Colinas verdes,
o caos da floresta remendado intermitentemente com vinhas
arrumadas, villas com telhados vermelhos em pedra cinza e, de
vez em quando, uma torre branca de igreja apontando para um
céu azul sem nuvens.
As montanhas são amarelo e verde, quentes no verão; azul
e marrom, frias no inverno; todas as tonalidades do arco-íris
durante a primavera e o outono. Mas minhas montanhas antigas
nunca foram essa combinação sonhadora de laranja, roxo e
calor. Estou certo. A luz aqui é diferente.
Ouço a cadeira de Dani ranger novamente, me trazendo de
volta para o quarto. Ouço ela expirar e depois inspirar como se
estivesse se preparando para dizer alguma coisa. Claramente,
oscila em indecisões não características. Sinto através do
telefone e os milhares de quilômetros entre nós.
Então, curioso, pergunto “Você tem algo a dizer?”
“Tenho, na verdade.” Mais uma vez, sua cadeira range.
Ouço o farfalhar de papéis, ou algo assim. “Tenho que falar com
você sobre algo além de apenas verifica-lo. Mas não sei como
colocar isso.”
“O que?”
Ela finalmente diz “Recebi a visita do FBI, oh cara, foi
estranho. Apareceram no meu escritório na Wall Street sem
aviso prévio, uma gangue deles de terno preto barato, camisa
branca e distintivo. Disseram FBI tantas vezes. Tantas, como se
eu fosse esquecer nos dez segundos que disseram pela última
vez. Enfim, hum, é sobre você.”
“Sobre mim?”
“Sim. Queriam saber se conversou comigo ou discutimos
os eventos da noite em que Razor tentou matar seu irmão e
Simone.”
“Não falei.”
“Precisamente. Mas queriam saber se falamos, porque
Razor aparentemente alega que depois que o nocauteou você o
atacou.”
“Ataquei.” Ela não pode me ver, então não pode ver o
pequeno toque satisfeito nos meus lábios. “Foi isso que ele
disse?”
“Está dizendo que o nocauteou e depois cortou as mãos
dele com sua própria faca, cortando seus tendões.”
“Se o nocauteei, como pode saber o que fiz depois?” O
manto frio e calmo de desapego se estabelece firmemente ao meu
redor, um casulo de desolação calmante.
“Bem, isso é verdade.” Dani diz, pouco antes de ouvir uma
porta se fechar. “Ninguém mais estava lá, exceto Simone e
Roscoe, e os dois estavam desmaiados. Mas isso também
significa que ninguém mais estava lá para cortar as mãos,
certo?”
“Possivelmente.”
“Possivelmente?”
“Não posso dizer se mais alguém estava lá. Estava ocupado
tentando impedir Simone e Roscoe de morrer.”
“Verdade, verdade.” Sua voz vacila, como se lutasse contra
um calafrio. “De qualquer forma, disse a eles que não sabia de
nada porque simplesmente não sabia de nada. Você não me
disse nada, então como poderia saber alguma coisa?”
“Exato.”
“E eles acharam que isso era estranho, já que estamos
noivos e tudo.”
“Oh?”
“Mas então disse a eles que terminou o noivado e isso
pareceu fazê-los se sentir melhor pela minha falta de
conhecimento.”
Ah.
“E perguntei a eles que diferença fazia se você cortou as
mãos dele, novamente, reiterando que não tinha ideia de um
jeito ou de outro, porque agiu em legítima defesa. Mas os agentes
disseram que isso faz diferença, porque você não estava agindo
em legítima defesa.”
“Será mesmo?”
“Sim. Disseram que, como Razor estava inconsciente, se for
descoberto que você realmente cortou as mãos dele, poderá
enfrentar a prisão por isso.”
“Hummm,” é tudo o que digo. Mas o que quero dizer é que
não ligo. Se esse é o meu castigo, que assim seja. Valeu a pena.
“Eu disse a eles que realmente achava uma merda. Aqui
está você, doando medula óssea para a testemunha número um
deles, e então aqui estão eles, conduzindo uma investigação,
tentando colocá-lo na cadeia. Isso é estupido. Mais uma vez, não
sei de nada, exceto o quão estúpido seria colocá-lo na prisão por
impedir um assassino em massa. Fora isso, não sei de nada.”
Isso traz uma leve risada de mim, uma com humor. “Você
não sabe nada. Isso é uma coisa.”
“Ha-ha. Enfim, também perguntaram quando planeja
voltar ao país. Disseram que quando voltar aos Estados Unidos,
precisam levá-lo e conversar sobre isso. Mas entenderam que se
recupera da sua segunda doação de medula óssea e vão deixa-
lo em paz, até voltar. Isso é o que queria te contar.”
“Obrigado pelo aviso,” digo uniformemente. Tenho que
descobrir o que fazer sobre isso mais tarde. Talvez eu me
entregue, talvez não diga nada, ainda não decidi. Mas não
mentirei. Se não for verdade, não diga.
Faço o meu melhor para viver com isso todos os dias. A
única exceção ao longo da minha vida é Scarlet. A mulher é meu
único segredo, a única pessoa para quem menti, e sempre como
um meio de protegê-la.
“Algo que queira me dizer, Billy? Sobre o que aconteceu
naquela noite?” A voz de Dani cai para um sussurro.
Não hesito. “Não.”
“Então só vou perguntar, você cortou as mãos dele?”
“Tchau, Dani.” Estou cansado de falar; preciso de um
banho; preciso me alongar.
Ela faz um som suave de grunhido de desagrado. “Você é
uma pessoa interessante e complicada, Billy Winston.”
Fico de pé, mantenho a tensão fora da minha voz, dizendo
“Vindo de você, Dani Payton, considerarei isso como o maior
elogio.”
“Sabe, acho que em um universo alternativo, poderia me
apaixonar por você... se não tivesse me apaixonado por Curtis
primeiro.”
Isso puxa um pequeno sorriso de mim. “O mesmo.”
“Você se apaixonou por Curtis?”
Sorrio e ela ri, ainda parece relutante. Gostaria de saber se
já houve um momento em que Daniella Payton riu com
abandono, antes que a vida e o amor acabassem com sua
confiança.
“Por que somos assim?” Ela pergunta, bem na hora. Dani
e eu não conversamos assim com frequência, talvez uma vez por
ano, talvez duas vezes. Mas sempre que fizemos, ela sempre
pergunta: “Por que não podemos simplesmente deixá-los ir?”
“Ainda não tenho uma resposta.” Olho para a porta de vidro
novamente. Uma vespa, talvez até a mesma de antes, bate nela
novamente, tentando encontrar uma maneira de entrar. “Talvez
sejamos estúpidos.”
“Não. Não é isso” diz com desdém, e acrescenta com uma
nota de distração “Talvez sejamos espertos demais.”
“Como assim?”
“Somos atipicamente bem-sucedidos em todas as facetas
de nossas vidas em um grau extremo, exceto essa. Você é o
congressista estadual mais jovem da história do Tennessee e
será um dos senadores federais mais jovens de todos os tempos.”
“Se for eleito.”
“Oh, será eleito. É amado, não apenas no Tennessee, mas
por todos. Meu avô já escreveu em apoio à sua candidatura. A
senadora Parker, da Califórnia, já disse que vai apoiá-lo, ela
seria uma excelente vice-presidente quando chegar a hora. É
inteligente e lindo e muito charmoso quando decide ser. Não tem
esqueletos no armário porque seu armário está vazio. Além
disso, o argumento aceito em todo o caso do Razor Dennings é
que sozinho pegou um assassino em série e é responsável por
salvar o caso do FBI. Você William Winston salvou a vida de seu
irmão e terminou o reinado de terror de June. A imprensa está
apaixonada por você, o Twitter está apaixonado por você, os
memes, Billy! Minha secretária me mostrou a conta do Twitter,
como se chama? Congresso de Barba?”
Continuo rastreando a vespa enquanto Dani fala, agora é
a mesma de antes, arremessando-se contra uma barreira
invisível e impenetrável com a idiotice de um inseto ou de um
homem.
“Onde, acho, tuitam sobre como sua barba basicamente
seduz homens, mulheres e crianças com sua glória? Algo
parecido. Enfim, é épico. Eu ri tanto disso.”
Não vi a conta. Nunca estive no Twitter ou no Facebook. Os
membros da equipe escrevem todos os meus tweets. Não sou fã
da plataforma. Qualquer site que incentive as pessoas a
consumir manchetes enganosas sobre fatos parece
contraproducente para a sobrevivência da espécie humana. É
como se as pessoas se tornaram consumidoras vorazes de
propaganda. Bizarro.
Além disso, Cletus sempre me pede para tuitar coisas ao
vivo, como ir ao supermercado durante a temporada de mirtilos
ou aparar minha barba na barbearia.
“Seu ponto?” Pergunto incapaz de desviar o olhar da vespa
persistente e tola. Toque-toque-toque. Por que não sai? Por que
não desiste?
“Meu ponto de vista, Gruffy McGrufferton, é exatamente
isso, se finalmente decidir concorrer a uma cadeira no senado
no próximo ano, é sua. E talvez esse seja o nosso problema. Se
queremos algo, trabalhamos e trabalhamos e trabalhamos e
empurramos e empurramos e empurramos até que isso
aconteça, e então sempre acontece. Mas com Curtis...”
Ouço quando Dani respira fundo, o som sobrepondo pelo
tap-tap-tap do inseto. Sua melancolia é a melodia da futilidade,
aquela vespa imbecil fornece a percussão; meu silêncio é o
acompanhamento.
“Empurrar não me levou a lugar algum com ela,” afirmo
estoicamente. “Já sei disso.”
“E, no entanto,” ela diz com uma pitada de tristeza, “Não
pode se ajudar, pode? Você ainda empurra.”
CAPÍTULO 4

BILLY

A porta do meu quarto se abre quando estou saindo do


banheiro. Incapaz de ver quem a abriu de onde estou, ou de
grande parte do corredor, paro e seguro a toalha na minha
cintura para garantir que não esteja prestes a cair. Acabei de
tomar banho.
“Quando passei, ouvi você conversando com alguém, então
soube que estava acordado. Se está acordado, pode comer.” O
som da voz de Scarlet me atinge logo abaixo das costelas apenas
alguns segundos antes dela, de perfil, aparecer. Usando um
vestido de verão rosa pálido que termina acima do joelho, unido
aos ombros por meras tiras, ela desce os dois degraus do meu
quarto, carregando outra de suas bandejas cheias de comida.
Seus olhos fixos nos degraus e na bandeja, não no quarto.
Dividido, dou um passo apressado para trás, mas depois paro.
As minhas roupas estão mala, vários metros além de onde
Scarlet está agora.
O que posso fazer? Virar-me e se esconder no banheiro até
que ela saia? Não.
Talvez.
“Não te acordei para jantar ontem à noite, estava dormindo
tão pacificamente, mas precisa comer mais de uma vez por dia.
Então, aqui estou eu, e voltarei com o almoço em algumas
horas.” Ela coloca a bandeja no canto da cama. De costas para
mim, as mãos levantadas para o quadril quando finalmente olha
para cima. Eu me preparo quando se vira, procurando no
quarto. “Onde está escondido, oh meu Deus!”
Bem, ela me viu.
Scarlet me encara, com a mão voando no peito. Olhos
arregalados, seu olhar fica distraído, depois nebuloso, depois
hipnotizado, e nunca sobe mais pra cima do que o meu pescoço,
embora suas bochechas fiquem mais rosadas a cada segundo
que passa. Não me movo além de cerrar os dentes, apenas a
deixo olhar. Tenho certeza de que em algum momento vai
perceber estar boquiaberta com o meu corpo e provavelmente
sairá correndo envergonhada.
Com alguma sorte, seu comportamento impensado pode
mortificá-la o suficiente para enviar outra pessoa com a bandeja
a partir de agora.
Então espero. Como previsto, Scarlet se encolhe
novamente, aparentemente volta a si mesma. Fecha os olhos
com força e depois os cobre com as mãos.
“Eu... Hum, apenas... você... trouxe... você... você tem...”
Bufando severamente, as mãos dela caem do rosto, que agora
está vermelho vivo. Aponta para a bandeja atrás dela, abre os
olhos, fixa-os no teto e grita “COMIDA! OK? Trouxe comida!”
Não digo nada, nem me movo, muito ocupado tentando não
notar como está fofa, perturbada e ofendida pela visão do meu
peito nu. Imagino ter apenas um ou dois segundos para olhar
minha satisfação antes que ela saia do quarto e bata a porta. Ou
talvez saia correndo sem fechar a porta, descendo as escadas e
fugindo para partes desconhecidas nesta gigantesca villa além
do meu alcance sinistro.
Hoje em dia, meu caminhar sinistro é limitado por mancar,
mas isso não faz diferença. Ela ainda não sabe, mas não precisa
correr. Não a persigo mais.
Então, novamente, espero, coço meu queixo, assistindo
Scarlet lutar contra sua humilhação e, sem querer, noto suas
bochechas, orelhas e pescoço queimarem, o quão bonita são
suas pernas nesse vestido, seus pés nus e unhas dos pés
pintadas de vermelho.
Minutos passam... talvez um minuto inteiro, e ela não vai
embora. Enquanto isso, minha pele também está quente.
Memórias de segurá-la sobrepõem à imagem dela agora, em seu
vestido rosa de verão, pés descalços e cabelos soltos, deixam-me
tenso e depois endureço com um resultado decididamente
desajeitado, desconfortável e inútil.
Droga.
Agora? Sério? Estou tendo uma ereção? Que porra de
tortura especial é essa?
“Vai colaborar voluntariamente hoje?” Ela pergunta
olhando para o teto, cortando meus pensamentos particulares,
sua voz alta e tensa, suas mãos no quadril. “Ou preciso lhe dar
a tortura da cadeira de balanço?”
Tortura da cadeira de balanço? Ela não faz ideia.
Agora que estou preso, relutantemente, observo como o
tecido fino realça cada centímetro que deveria estar coberto,
devorando vorazmente as doces curvas de sua forma. Meu peito
se expande e aperta, tudo aperta, com desejo.
Deus. Que. Porra...
Não é a primeira vez, ou a décima vez, ou a centésima vez
que eu me pergunto se faço isso comigo? Depois que ela saiu de
Green Valley pela primeira vez e fiquei preso no hospital, usando
seu nome como uma prece, inconscientemente me machuquei?
Eu me destruí? Scarlet impressa no meu coração mente e corpo,
prejudicou minha capacidade de perceber ou querer alguém
além dela? A alma fica tingida com a cor de seus pensamentos, e
minha alma ainda está escarlate.
Continuo olhando e em silêncio, ela limpa a garganta. É
então que desvio minha atenção dos deleites deliciosamente
rosados que aquecem sua pele macia e pálida. Olho ao redor do
quarto, sacudo, procurando minha mala. Evidentemente,
esqueci nesses três minutos, onde está localizada.
“Deixe lá, por favor. Obrigado.” O pedido é áspero, mas não
há muito que posso fazer sobre o tom da minha voz agora. Sua
mera presença desfaz minha concentração, invade os espaços
confortavelmente entorpecidos que preciso para passar pelos
movimentos, para passar pelo dia.
Segurando a toalha firmemente logo abaixo do umbigo,
ignoro o peso renovado do seu olhar e vou até minha mala, pego
o primeiro conjunto de roupas que encontro e volto ao banheiro.
Uma vez dentro, com a porta fechada, jogo a camiseta, a boxer
e o jeans no balcão e pressiono as palmas contra ele, respiro
fundo, estimulado a limpar a mente, dela. Ou tento.
Mas não posso, não com ela tão perto.
Ergo o queixo, olho para o meu reflexo no espelho, tento
me ver do jeito que ela me vê, alguém que ela não ama, mas
deseja, apesar de seus melhores esforços, intenções e culpa.
Tudo o que vejo é um tolo. Talvez seja o que vê também. Talvez
seja por isso que nunca me quis o suficiente para fazer algo
sobre isso.
Um gosto amargo queima o fundo da minha garganta e
engulo o ressentimento crescente. Mas então as palavras de
Dani voltam para mim: O que é pior? Scarlet sendo viciada em
sua culpa, ou você viciado em sua amargura?
Dani está certa. Por mais que eu ame Scarlet, parte de mim
também a odeia. Odeio ser a fonte de sua culpa, que ela me
considere fraco, algo a ser superado em vez de alguém para
acalentar, como quero acalentá-la. Mesmo agora, suas
bochechas pegando fogo e não sabendo onde fixar os olhos, sua
agitação é fofa, mas a raiz disso não.
Nunca quis ser uma fonte de fraqueza para Scarlet. Queria
ser uma fonte de força.
Inclino para longe do balcão, puxo minhas roupas. Isso não
vai funcionar. Roscoe quase morre, a doação da medula para
Darrell, a constante dor no quadril e nas costas, limitando-me
aonde ir e o que posso fazer na corrida ao senado, a fábrica, as
pessoas contando comigo, tenho o suficiente para lidar... Ela
estar aqui faz tudo pior, caótico. Divide minha atenção: é Scarlet,
e depois tudo e todos os outros. Deixe ir. Deixe-a ir.
Algo para trabalhar.
Certo que ela já foi embora, viro para a porta, ignorando a
aparência desleixada da minha barba. Não estou com paciência
ou mão firme necessária para fazer a barba e aparar. Terá que
esperar. Primeiro, me afogar em e-mails, trabalho, negócios do
governo, redação de propostas, planilhas e estatísticas
trabalhistas. Então, minha família, seus problemas,
preocupações, triunfos, desde que ninguém me pergunte se já
comi alguma coisa.
Saio do banheiro pela segunda vez, percebo tardiamente
que ainda não vi meu xará. Apenas Duane estava acordado
quando cheguei, e ele parecia tão cansado quanto eu. Talvez, se
pudesse, desceria um lance de escada veria se posso...
“Acho que vou ficar.”
Minha cabeça levanta e paro no meio do caminho, confusão
e choque enraizando-me no local.
“Quero garantir que a quantidade adequada de comida
chegue ao seu estômago.” Scarlet, que não saiu, está parada ao
lado da mesa onde coloquei minha bolsa do laptop, agora não
mais à vista. Ela o substituiu por pratos cheios de comida e,
noto um pequeno vaso contendo três papoulas vermelhas. Uma
mão no quadril, aponta para o topo da mesa com a outra, estilo
Vanna White.
“Biscoitos, molho, bacon e ovos. Vamos, sente-se.” Ela faz
um sinal para frente, seu tom doce e melódico. Inclina a cabeça
para o lado, seus longos cabelos ruivos caem sobre a pele nua
do ombro, emoldurando seu rosto requintado. É como algo saído
de um sonho, mas a realidade é um pesadelo.
Não sei o que Cletus disse a ela, mas está claro que
exagerou seriamente. Quando chegar aqui, meu irmão e eu
vamos ter uma conversa.
“Você não precisa ficar,” digo, minha voz baixa. Por favor.
Saia. Agora.
Como se lesse meus pensamentos, ela responde
suavemente “Que tal isso? Quanto mais cedo comer, mais cedo
vou embora.”
Debato minhas opções, eventualmente concordo com um
aceno duro. Comer será a maneira mais rápida de me livrar dela.
Posso comer tudo em menos de cinco minutos, mas discutir com
Scarlet é um presente que dura uma vida. Cruzo para a mesa,
puxo a cadeira para mim e ela dá um passo para trás. Na minha
visão periférica, a vejo reivindicar a cadeira de balanço. Ela a
aproxima, sentando-se à beira, apenas quatro metros de
distância.
“É a receita de biscoitos da sua mãe. Ashley me deu.”
Distraído, balanço a cabeça novamente, meu estômago frio
e azedo, apesar da deliciosa refeição diante de mim. Ainda não
tenho apetite, minha língua tem gosto de serragem, o cheiro da
comida me deixa doente. Mas como cada mordida.
Acabo de colocar o guardanapo no meu colo e pego meu
garfo quando ela diz “Ei, Billy.”
“Sim?”
“Por que o passarinho acabou em Alpha Centauri?”
É como ser esfolado de lado, o golpe sai do nada. Um
choque estridente irradia dor do meu coração para os meus
membros, debilitando-me por um segundo. Fecho os olhos,
fazendo uma careta.
“Você está bem?” Sua voz preocupada está subitamente
mais próxima, sinto a mão dela pressionar minha testa, me
tocar. Ela me tocou. “Você não está com febre. É o seu quadril?
Posso...”
Afasto-me da mesa, em pé, manco e tropeço para longe de
onde ela está.
Sem dúvida, acredito que Scarlet não tem ideia do que faz
comigo. Ela nunca tentou me machucar de propósito, realmente
acredito nisso. Mas no final, isso não importa. Não importou
quando éramos adolescentes e ela foi embora com Ben McClure;
não importou durante nossos curtos e tortuosos meses juntos
ou nos anos seguintes; definitivamente não importa agora.
No final, doe muito, e não aguento mais me machucar,
principalmente com sua marca. E, considerando tudo o que
acontece, não tenho energia para mentir, ou me esconder, ou
fingir que não fui afetado pela presença dela para proteger seus
sentimentos.
Então, luto para acalmar meu pulso acelerado e os
tremores secundários dolorosos que apertam meu coração a
cada batida.
“Billy.”
Levanto uma mão para ela parar, fecho meus olhos
brevemente. Quando os abro, mantenho minha atenção fixa no
chão aos seus pés.
“Claire,” começo, na esperança de que usar seu nome,
coloque mais do que apenas uma distância entre nós, enquanto
escolho minhas palavras com cuidado “Por favor, vá.”
“Você está com dor,” ela acusa e implora. “Sei que os
médicos lhe deram algo pra isso, por que não aceita?”
Estremeço. “Não estou.”
“Não me diga que não dói. Sei o que vi, quase o derrubou
desta vez.”
“Não é meu quadril.”
“Como o inferno, não é. Tome um Tylenol, ou qualquer
coisa! Algo do balcão. Sei que, às vezes, analgésicos podem fazer
as pessoas se sentirem engraçadas e não quer perder o controle.
Entendo.”
Ela se aproxima e então dou um passo para trás. “Você não
entende. Não entende.”
“Então me diga para que possa ajudá-lo.”
“É você,” solto, parte de mim lamenta as palavras assim
que as digo.
Mas não há como recuperar a verdade agora. Tão cansado
quanto estou de ser rejeitado por essa mulher, estou igualmente
cansado de tentar machucá-la com falsa indiferença e
ressentimento fervente. Ela nunca tentou me ferir, mas, para
minha vergonha, o mesmo não pode ser dito de mim. Queria que
ela se importasse comigo e, no meu desespero para isso, fui
hostil e cruel, maldoso.
Mas não quero mais forçá-la a se importar comigo. Ela não
me quer, entendi a mensagem finalmente recebida. Não quero
ser aquela vespa idiota, um homem moderno de La Mancha,
atirando-se sem pensar contra uma barreira invisível e
impenetrável ou perseguindo moinhos de vento. Quero paz
Quietude. Dormência. Silêncio. Quero que ela me deixe em paz.
Acabei.
Esfrego minha testa com as pontas dos dedos, me
comprometo com a verdade. “É você estar aqui. Não é meu
quadril ou minhas costas. É você. Não quero ver você, não quero
falar com você e não quero que me conte nenhuma piada. Vou
comer o que trouxerem, mas estou pedindo para você sair e não
voltar.”
Mantenho-me firme, levanto meu olhar para ela, atento,
esperando que entenda que o objetivo de minhas intenções é a
honestidade. Mas minhas próximas palavras param quando
olho para ela, observando seus olhos vidrados e pele pálida.
“Você está bem?” A pergunta sai de mim, impulsionada
pela preocupação. Na verdade, ela não parece bem.
Sua boca abre e fecha sem som e olha para mim, como se
acabei de lhe dar um tapa.
Então, o queixo dela treme. Droga.
“Scarlet. Estou...” Quero pedir desculpas, mas tudo o que
disse é verdade. Então, em vez disso, digo “Estou tão cansado
da dor. Você não está cansada disso?”
Ela concorda, pressiona os lábios, os olhos se enchem de
lágrimas. Deus, quero ir até ela, abraçá-la, confortá-la, mas isso
levaria a ficar frustrada e ressentida... e se sentindo culpada,
sempre culpada.
“Eu disse a você no Natal passado que nada mudou para
mim,” digo. “Isso era verdade, mas não é agora. Desisto.”
O rosto dela se contorce como se doesse, mas no último
minuto recupera a compostura e levanta o queixo, os olhos de
vitral brilham intensamente. Dani estava certa, Scarlet não está
arruinada e fico feliz em ver seu espírito. Isso me ajuda a focar
nos meus pensamentos.
“Entendo que está fazendo um favor ao meu irmão, me
trazendo comida e outros enfeites. Agradeço. Eu como a comida.
Obrigado. Mas estava certa o tempo todo.”
“Estava certa?” Engasga, como se não soubesse se deve
gritar ou rir. “No que estava certa?”
Dou um segundo para tirar uma imagem mental dela como
está agora. Então endureço minha determinação. “Nós não
somos bons um para o outro,” digo calmamente.
Ela limpa sua expressão completamente, a emoção escorre
dela, deixando apenas uma determinação sombria. “Entendo.”
“Nós nunca fomos,” continuo, tentando me retirar deste
quarto, dessa mulher, dessas palavras finais. É assim que tudo
termina entre nós, tenho certeza disso, me rendo a isso. Estou
tão cansado. “Posso ver isso agora. Eu fui tolo, e cruel, eu acho
pressionando você por algo que nunca vai acontecer.”
Scarlet engole em seco, mas não diz nada, apenas olha
para mim.
“Sinto muito por ignorá-la quando voltou à cidade, retendo
a mim e a minha amizade. Sinto muito por pressionar você a
deixar Ben e sinto muito por ser odioso e rancoroso quando não
fez. Sinto muito por ter aparecido na noite anterior ao seu
casamento, minha mente seduzindo você, nós dois sabemos que
é por isso que eu estava lá, não posso negar, e sinto muito por
todas as brigas desde então, por todas as palavras raivosas.
Sinto muito por tudo isso. Você merece muito mais do que meu
ressentimento.”
Ela abaixa as mãos para as coxas, pressiona ali,
mantendo-as perfeitamente imóveis.
“Como disse anos atrás, trazemos o pior um do outro. Isso
não é sua culpa, é apenas como funcionamos.” As palavras me
sufocam, mesmo que preciso dizer. Estou tão cansado de
perseguir moinhos de vento. “Mas estar perto de você, muito
perto, é difícil para mim. Não sei como parar de querer algo de
você que nunca dará.”
Seus lábios pressionam em uma linha que parece teimosia,
e pisca várias vezes. “Você não acha que é difícil para mim?”
Olho para ela, o ressentimento me ameaça como uma
nuvem tempestuosa me queimando, e quase me impeço de dizer
algo como: Se olhar para mim ainda faz se sentir tão culpada, há
a porta.
Ela não terminou. “Não acha que, se eu pudesse, teria lhe
dado o que quer? Não é você. Nunca foi você.” Ela aponta para o
peito com as duas mãos. “Eu sou o problema, Billy. Fui eu quem
tomou decisões egoístas, guardou segredos, machucou você,
machucou Ben...”
Desvio o olhar, aperto minha mandíbula. Juro por Deus
que estou tão cansado de ouvir sobre a dor de Ben McClure
quando tudo o que ele fez desde o primeiro dia foi tirar vantagem
dela ter catorze anos, sem teto, assustada e sozinha. Para mim,
o que fez com ela fez dele um predador. Pior de tudo, acreditava
em todas as suas besteiras, o que tornou fácil para outras
pessoas acreditarem também.
“Não, espera. Deixe-me terminar, por favor.” Sua voz fica
firme, suplicante, e ela se aproxima, parando a cerca de um
metro de distância. “Deixe-me dizer isso, porque não sei se terei
coragem de dizer isso novamente.”
Olho para todos os lugares, menos para ela. “Não. Não, eu
não ligo. Não quero saber. Estou cansado. Estou tão cansado
disso.”
“Billy.”
“Acabou. Terminei. Não quero mais brigar.” Digo devagar,
com cuidado, sem olhar para ela. Não posso dizer e olhar para
ela. Preciso contar a verdade, mas quero que minhas palavras
sejam mais gentil possível. “Apreciaria se, enquanto eu estiver
limitado em minha mobilidade, alguém trouxer a comida que
você quer que eu coma.”
Eu a sinto se afastar um passo, talvez mais. “Se é isso que
quer,” diz, com a voz distante, como se falasse do outro lado da
sala.
“Sim é.” Engulo em seco, meus olhos apontados para o
chão. “Enquanto estivermos aqui, vou manter distância. E
agradeceria se mantiver a sua.”
CAPÍTULO 5

CLAIRE

É oficial, bebi muito vinho.


Meus olhos têm problemas para fixar as estrelas. A garrafa
está vazia, fui a única a beber, estou com pena de mim. Quando
estou bêbada, sempre sinto pena de mim como uma pessoa
bêbada, idiota, burra, tola.
Além disso, não sou de toda convincente. Sou anti-
convincente. As palavras são como relâmpagos, dicas ou paz, ou
uma pausa, ou qualquer outra coisa difícil de entender, mas
continuamos perseguindo. Ah bem. Se vou beber uma garrafa
de vinho inteira, supondo ser um Chianti, de uma vinícola no
final da rua, não é uma maneira ruim de fazer isso.
“Claire? Você está aqui fora?” A voz de Sienna chama de
algum lugar atrás de mim, provavelmente a varanda de pedra
atrás da casa.
Peguei um cobertor descendo a colina, não muito longe,
apenas uns seis metros, e o espalhei na grama. Assisti ao pôr do
sol sobre as colinas da Toscana, pensando no peito de tirar o
fôlego de Billy Winston, nos olhos raivosos e na tatuagem de
bode no ombro esquerdo, que não imaginava que existisse, e,
aparentemente, bebi uma garrafa inteira de vinho. Só bebo
assim quando estou comemorando ou chafurdando. No entanto,
posso jurar que só foram, dois copos...
“Claire?”
“Aqui,” respondo de volta, sem me virar. Em vez disso,
recosto no cobertor e fecho os olhos. Péssima ideia. Sinto a
rotação da Terra lançando-se através do espaço e estou com
medo de ser jogada do planeta. Tudo gira, incluindo meus olhos.
Abro meus olhos novamente. Melhor.
“Onde? Descendo a colina?” Os passos de Sienna na
varanda logo se tornam passos nas escadas de pedra, e então
mais nenhum som que posso ouvir o que significa que ela
chegou à grama. “Eu vejo você,” diz, sua voz agora num volume
normal. “O que está fazendo aqui no escuro? Sentimos sua falta
no jantar.”
“Desculpe, desculpe...”
“Não peça desculpas. Estas são as suas férias, pode gastá-
las como quiser. Só queria que você soubesse que sentimos sua
falta.” Sienna se mexe na beira do cobertor, talvez tirando os
sapatos, e então na minha visão periférica eu meio que a vejo
deitar ao meu lado. “Puta merda, é lindo aqui. É lindo durante o
dia, é lindo à noite. Basta olhar para essas estrelas.”
“Eu queria poder.” Tento fechar os olhos novamente, mas
gira ainda mais.
Eu a sinto virar o rosto em minha direção. “Por que não
pode?”
Aponto para mim, com os dois polegares. “Bêbada.”
Silêncio por um instante, e então ela sorri.
Eu sorrio.
Nós duas rimos.
“Não, você não está.” Ela gentilmente bate no meu ombro.
“Sim.” Aponto o ar, já que todas as Siennas não ficam
paradas.
Depois de um tempo, ela pergunta: “Você está realmente
bêbada?” E parece voltar o rosto para as estrelas.
“Sim.”
“Você não parece bêbada.”
“Como pareço?”
“Inteira, como sempre parece.”
“Nem tão inteira, nem sempre, nem mesmo próximo.”
Sorrio de novo. Inteira? Estou tão tonta quanto uma daquelas
coisas do jogo Jenga1 no final, quando está prestes a cair se
remover qualquer número de peças.

1
Ela não sorri comigo. “O que está acontecendo, velha
amiga, companheira? Por que está aqui fora, bêbada, sozinha?
Os meninos já estão dormindo, por mais inacreditável que seja.
Jet e eu seríamos, como Cletus diz? vizinhos de bebida, se
soubesse que estava com vontade de beber. Você nunca bebe.”
“Vizinhos de Bebidas,” cito, rindo novamente. “Cletus
sempre foi um esquisito incrível. Mesmo quando éramos
crianças, tinha uma maneira engraçada de colocar as coisas.”
Eu a ouço mudar ao meu lado. “Você conheceu Cletus
quando era criança?”
“Sim.”
“Não sabia disso, sabia? Juro que a gravidez limpa minha
memória toda vez. Pensei que você e Jethro se conheciam por
causa de seu marido, Ben.”
Não sinto a tensão habitual no estômago ou o medo
opressivo sempre que penso na minha infância. Talvez porque
esteja bêbada? “Não. Conheci Jethro antes de Ben. Nossos pais
eram irmãos MC nos Iron Wraiths.” Falar em frases completas
cobra um pedágio, minha boca parece cheia de chiclete usado.
“Está certo.” Ela estala os dedos ou fez um som parecido.
“Eu sabia disso. Mas seu pai é Razor Dennings e é o chefe de
Darrell? Quero dizer, era o chefe dele. Fico esquecendo que
Razor Dennings é seu pai, mesmo que esteja literalmente em
todo o noticiário.”
“Vou aceitar isso como um elogio,” digo, ignorando a onda
de melancolia que empurra a periferia do meu humor, decidindo
que uma piada está em ordem. “Especialmente vendo como está
atualmente, neste momento...” Fecho meus olhos, trabalho para
pegar o rabo do meu pensamento. “Ele está em julgamento! Pelo
que fez com Simone e Roscoe, e todas aquelas outras pessoas.
Ficaria feliz se todos esquecerem que somos parentes.”
Isso não foi uma boa piada. Isso não é uma piada. Apenas
cale sua boca bêbada.
Um momento depois, sinto a mão de Sienna fechar sobre a
minha e apertar. “Sinto muito, Claire.”
“Por quê? Você assassinou alguém?” Ainda não é uma boa
piada.
Ela aperta minha mão com mais força. “Não consigo
imaginar com o que está lidando agora. Cometi o erro de ler um
jornal no voo, e as coisas que a imprensa diz sobre você me
deixou com muita raiva.”
Dou de ombros, puxo minha mão do aperto dela, colocando
atrás da cabeça e envio uma rápida oração de agradecimento
para cima pelas qualidades entorpecentes de uma boa garrafa
de vinho italiano. “Não penso sobre isso. Crescer com Razor
Dennings como pai, pensar nele... e sua maldade... isso não faz
bem.” O mundo se move para frente e para trás, mas então
percebo que sou eu balançando a cabeça. Então paro. “As
pessoas querem acreditar que pensar em algo faz algum bem.
Pshaw! Conversar, reclamar, xingar e gritar não farão diferença.”
“Claire, seu sotaque está mais grosso? Mal consigo
entender você.”
“Desculpa.” Limpo minha garganta, engulo e me esforço
para fazer minha boca se mover normalmente. “Está melhor?”
“Sim. Posso te entender melhor. Estava dizendo algo sobre
falar não ajuda?”
“Correto! Quanto mais você fala, mas se torna infeliz. Como
cavar um buraco. Se imaginando como chegou ao fundo disso.
É estupido. Não quero ser uma pessoa infeliz. Quero ser uma...
uma... uma dessas, sabe uma pessoa satisfeita.”
“Você quer ser contente?”
“Contente é bom. Vou ser uma pessoa boa e contente, e
assim serei.” Eu me agarro nisso por algum motivo, ou tento.
Sienna fez um pequeno som. “Você parece Jethro, quando
cita sua mãe, exceto bêbado.”
Uma imagem de Bethany Winston se materializa em meus
olhos, sorrindo para mim, dizendo que seria a fada da floresta
dela. Mas então essa imagem é obscurecida por outra, seu rosto
marcado com extrema angústia, seus olhos brilhando com
decepção. Engulo a emoção aguda, trabalho para me distanciar
do eco da vergonha.
“Claire? Você está bem?” A voz preocupada de Sienna
dissipa a lembrança desagradável.
“A mãe dele tinha ótimas palavras, com certeza.” Fungo,
trabalho para organizar minha boca em um sorriso. “Puxa,
gostaria de não ter bebido todo esse vinho.”
“Imagino que se meu pai fosse um serial killer, também
ficaria bêbada em uma colina na Toscana.” Eu a ouço se mexer
no cobertor. “Na verdade, acho que ficarei bêbada em uma colina
na Toscana, mesmo que meu pai só mate com piadas de pai.”
Faço uma careta, viro minha cabeça em sua direção
enquanto ela se vira também.
“Dá um tempo.” Todas as Siennas dão de ombros. “É difícil
fazer assassinato ser engraçado.”
“Nós provavelmente deveríamos parar de tentar.”
“Você está certa. É que gostaria de animá-la e não consigo
pensar em nada hilário para dizer quando é a razão pela qual
está triste é tão deprimente.”
“Meu pai não é o motivo de eu estar triste,” digo, porque
vinho + vinho + vinho + vinho = honestidade. “Quero dizer, sei
quem ele é a vida toda. É a pessoa mais assustadora do mundo!
Se nunca mais o visse, ficaria agradecida. Só de pensar nele, é
difícil.”
“Oh. Eu sinto muito. Não precisamos...”
“Não, Não. Se quisermos ter essa conversa, devemos ter
agora.” Bato no chão com a mão, com muita força. Isso vai doer
mais tarde. “Estou bêbada! E isso ajuda muito. A questão é que
não estou surpresa com o que meu pai fez. Não luto por ele.
Estou muito triste, tão triste, pelas famílias. Estava com medo
de Simone e Roscoe quando ouvi o que aconteceu com eles.
Graças a Deus estão fora de perigo agora. Mas Razor Dennings
não tem nada a ver com o meu humor. Se eu deixasse esse
bastardo impactar meu humor, estaria me escondendo metade
do tempo.” O mundo mexe para cima e para baixo, então paro
de balançar. “Talvez o tempo todo.”
“Sério?” Ela pergunta seu tom me dizendo que não acredita
em mim. “Ele não afeta seu humor?”
“Correto.”
“Então por que está aqui fora no escuro?”
“Você mesma disse que é bonito aqui.” Jogo minha mão
para o céu, depois ela volta e me bate na barriga.
“Então por que está bêbada?”
“Esse vinho é bom, e uma surpreendente tatuagem de bode
me pegou de surpresa. Diria que você deve tomar um pouco,
mas já bebi tudo.”
“Tatuagem de bode?” Ela sorri, mas diz “E ainda assim,
você está triste, Claire.”
Meu peito doí, cortando a névoa da embriaguez. Meu peito
não parou de doer, desde que descobri que Billy chegou. Nossa
interação em seu quarto só intensificou a dor, e é por isso que
estou bêbada no momento. Só quero que isso pare.
Depois que ele me disse para manter distância, o que
entendi, aceitei e farei 100%, a dor tornou-se alternadamente
ardida e quente, e depois monótona e dolorosa. Acabou. Esperei
muito tempo. Fui uma idiota por muito tempo e Billy finalmente,
finalmente seguiu em frente.
Bem então. Bom para ele. Ele merece toda a felicidade.
Merecia toda a felicidade anos atrás e sempre mereceu mais do
que eu. Então, brindei com a felicidade dele quatro vezes, e agora
estou tão bêbada quanto Flo McClure, no Natal que disse a todos
nós que era lésbica.
“Acho que estou triste.” Meu queixo treme. Droga. Estou
feliz por Billy, mas isso não significa que estou feliz por mim.
“Por que você está triste?” Ela se vira, deitada de lado para
me encarar. “Fale com Sienna. Conte-me tudo. Talvez possa
ajudar. É sobre as notícias?”
“Não.” Aceno minha mão no ar. “Não ligue para o que me
chamam. 'Filha do diabo'.” Bufo uma risada fraca. “Fui chamada
de coisa pior.”
“Sei como é que, quando todos se reúnem, pode ser
exaustivo.”
“Não são os jornais, não liga.”
“Se alguém pode ajudá-la a não se importar com o que a
mídia está dizendo, sou eu. Sou uma profissional.”
“Sienna. Não é a mídia. É...” Paro meu rosto enrugado,
então o cubro com a mão.
Ela fica quieta por alguns segundos e sinto sua atenção em
mim. “Sei que acha que falar sobre as coisas não vai ajudar, mas
às vezes ajuda. Às vezes, só precisa de uma pessoa em quem
possa confiar para ouvir, com quem possa se abrir e não precisar
se preocupar com os sentimentos, ou se estão te julgando.”
Balanço a cabeça, pressiono meus lábios juntos. Conversar
com alguém assim realmente parece bom. Parece tão legal que
parece um conto de fadas. Fingir. Faz de conta.
“Eu me preocupo com você,” ela continua. “Jethro se
preocupa com você. Ele disse que Ben costumava ser essa
pessoa para você, mas agora ele é...”
“Ben nunca foi essa pessoa para mim,” solto, e depois
respiro fundo, sentindo-me... Bem.
Eh deixe-me esclarecer isso. Por tudo bem, quero dizer, não
é pior.
Sienna fica quieta novamente, mas desta vez o silêncio
parece diferente. “Claire.”
“É a verdade. Ben me amava, cuidava de mim, me
mantinha em segurança. Eu tinha uma dívida com ele, que
nunca poderia pagar. Mas nunca fui honesta com ele sobre como
me sentia, o que queria ou quem era. E quando tentei ser
honesta, apenas o machuquei. Eu o machuquei tanto. Ele não
queria honestidade, queria que o amasse, e eu não podia. Não
pude. Eu não pude.”
Ah, e agora estava chorando.
Droga de lágrimas. Soluço estúpido, bagunçado, sistema
hidráulico. Cara, odeio chorar. Odeio, e se houvesse uma
maneira de modificar cirurgicamente meus dutos lacrimais
ativos quando triste, faria essa cirurgia.
Sinto a hesitação de Sienna, provavelmente devido ao
espanto, antes que estique a mão, me vire em sua direção e me
puxe para seus braços. Enrolada em seu corpo quente, eu choro.
“Oh, Claire. Querida. Você está bem? O que posso fazer?”
Dou de ombros. “Só estou tentando resolver as coisas,
coisas do meu passado, coisas das quais não me orgulho.”
“Você é um anjo.”
Bato nas minhas lágrimas idiotas. “Não. Não sou nenhum
anjo,” digo e então soluço.
Ela ignora o soluço. “É complicado quando as pessoas
morrem, é fácil se sentir culpado por transgressões imaginárias.
Tenho certeza...”
“Eu o traí,” solto, e então me sinto uma idiota, porque
trapacear não foi exatamente o que Billy e eu fizemos.
Sua mão esfregando círculos nas minhas costas para. “Uh,
o que?”
“No meu coração, eu traí,” tento esclarecer.
“Você disse... traiu corações? Gosta do jogo de cartas?”
“Não, não cartas. Quero dizer...” Não sinto mais a
necessidade de chorar, recuo. Estou murmurando minhas
palavras, e ter meu rosto pressionado contra o pescoço dela
provavelmente fica difícil de ouvir. “Aqui está o que aconteceu,
ok? Estava apaixonada por esse homem naquela época,” jogo
meu braço no ar, “e era casada com Ben. Mas é complicado
porque Ben se casou comigo aos quinze anos, dizendo que era...”
“Quinze?!”
“Espere, deixe-me terminar. Ele fez isso para me manter a
salvo de meu pai, ok? E não éramos casados, casados. Seja como
for, é uma longa história. Mas a parte importante, enquanto
estava secretamente casada com Ben, mas todo mundo pensava
que estávamos noivos, esse homem que eu amava, vamos
chamá-lo de B... Barney, e eu nos encontramos em um hotel e
conversamos, beijamos e... apenas aquele tempo, mas não no
hotel, nós nos curtimos.”
“Santo macarrão!”
“Eu sei! E então Barney queria que eu deixasse Ben. Mas
então eu não... estava com medo, meu pai é um filho da puta
assustador e se não tivesse a proteção da família de Ben, bem,
ia ser cruel. E devia a Ben. Devia a ele, devia a ele e ia fazer o
quê? E mais, de certa forma, eu amava Ben? Era estável, dizia
que poderia ficar melhor, apesar dele também fazer o que
quisesse, sem levar em conta meus sentimentos.” Jogo minha
mão no ar novamente. “Apenas me assumiu e se sentiu no
direito o tempo todo. Quão burro certo? Estava confusa, burra e
com dezenove. Dezenove!”
“Uh...”
“E Barney, o homem que encontrei em segredo, ficou muito
bravo e me tratou friamente e tem um bode no ombro. E eu o
culpo? Não estava com raiva dele. Sabia que era a culpada. Eu
era o problema Sempre sou o problema!”
“Claire, tem certeza de que quer falar sobre isso? Isso
parece muito pessoal. Tem certeza de que não quer esperar até
ficar sóbria?”
“Se esperar até ficar sóbria, ficarei muito covarde, não
quero ser um fardo, para dizer qualquer coisa, e agora você sabe,
então, por favor, pergunte-me sobre isso quando estiver sóbria,
para ser forçada a contar uma versão coerente da história.”
“Estou tendo problemas para acompanhar a história.”
Eu mal a ouço. “Além disso, nem cheguei às piores partes
ainda, que é a mãe descobrindo e me pedindo para ficar longe, e
ela estava certa. Estava tão certa. Eu a deixei triste, a
decepcionei. Fiquei longe. E então Billy, espere, quero dizer,
Barney aparece na minha casa na noite anterior ao meu
casamento 'oficial' com Ben e, depois de me dar um beijo, exigiu
que eu saísse com ele, totalmente estilo de homem das cavernas,
o que causou nossa primeira grande explosão... Luta estridente,
que temos basicamente toda vez que nos vemos desde então.
Fim.”
“Uh, eu...”
“Espere, não. Esse não é o fim. Eu me esqueci de dizer, Ben
morreu e me senti tão culpada e envergonhada tipo,
verdadeiramente me odiando, profundo, insalubre, ilógico, com
lavagem cerebral, que evitei Billy por anos.” Aponto para o céu e
não faço ideia do porquê. “Mas então ele ficou noivo e o evitei por
causa disso também. E então acontece que ele não estava
realmente noivo, mas estava, ou meio que estava, mas é falso,
ou não? E ainda queria ficar comigo no Natal, exceto que mentiu
para mim sobre Duane e Beau serem meus irmãos, ele sabia o
tempo todo! e não sei se posso confiar nele. E a única pessoa
com quem dormi em toda a minha vida foi meu marido, com
quem tenho sentimentos muito conflitantes, porque não estava
pronta para fazer sexo, mas me senti obrigada, e isso é uma
bagunça gigante. Agora, este é o fim. O fim.”
As Siennas estão caladas, aparentemente precisando de
alguns segundos para processar essa enxurrada de informações.
Ou talvez minhas palavras foram tão ilegíveis que pensa que
estou tendo uma convulsão. Ou talvez esteja sonhando com tudo
isso e ainda estou em casa em Nashville, dormindo.
Mas então sento e meio que a vejo respirar fundo antes de
dizer “Por favor, me diga que está em terapia.”
“Sim.”
“Graças a Deus.”

***

“Claire?”
Pisco em volta da mesa, me sacudindo, descobrindo vários
pares de olhos em mim. “Desculpa o que?”
“O frango.” Jethro aponta para o lado do meu braço e olho
para baixo, o prato de frango no meu cotovelo.
“O tio Duane quer que você passe o frango, senhorita
Claire” diz o pequeno Benjamin, juntando tudo para mim.
“Oh, sim, desculpe.” Pego o prato e levanto, colocando nas
mãos estendidas de Jethro. “Aqui está.”
Ele franze a testa, sorri, esse é o rosto que Jethro faz
quando está preocupado, e passa o frango pela mesa para
Duane. Minha atenção se volta para Jess e Duane; ambos me
olham suavemente. Duvido que Sienna contou a Jethro, Duane
ou Jess sobre minha sessão de confissão bêbada. No entanto,
claramente, meu humor introspectivo foi notado.
No outro extremo da mesa, os pais de Jess e Maya não
prestam atenção, concentrados em Andrew, o segundo filho de
Sienna e Jet, que está sentado no colo de Maya, e Liam, que
Janet James segura em seus braços.
Sentindo a atenção persistente de alguém, olho para
Sienna. Ela dá seu sorriso caloroso e compassivo para mim, e
então abaixo meus olhos no meu prato, afundando um pouco
mais na minha cadeira.
Bêbada em uma colina na Toscana, derramei minhas
entranhas na minha elarói (ela + herói) ontem à noite. Tenho
certeza de que me lembro dela dizendo algo sobre eu soltar
babaquice sobre lavagem cerebral. Ou talvez eu disse isso?
Graças a Deus não disse a ela que o homem com quem traí, não
é outro senão Billy Winston. Isso faria o jantar, quando ele
finalmente conseguir descer as escadas, muito estranho.
Não falo com ela desde a sessão de confissão. Não é que
estou com vergonha, evitando-a. Mais como se estivesse
incrivelmente ocupada cozinhando e segurando meu sobrinho e
evitando-a.
A maioria das pessoas me considera uma pessoa
especialmente descontraída, e isso é verdade. Tenho problemas
para me levar muito a sério. Quando você acredita que sua
própria opinião é suspeita, não faz muito sentido dedicar muito
tempo ou energia a ela. Como tal, depois de sair do quarto de
Billy ontem de manhã e chorar na adega, disse a mim para
superar isso.
Construí minha casa de culpa, muita culpa cheia de
cupins, ratos e fundações em ruínas, mas é para isso que serve
a terapia. Estou trabalhando no desmantelamento da minha
casa de culpa e isso é tudo o que posso fazer.
Mas ontem, minhas opções eram ficar na adega e chorar
ou assar algo gostoso, como biscoitos. Assar biscoitos
contribuiria para a felicidade e o bem-estar de todos na casa,
enquanto tenho quase certeza de que ninguém quer provar
minhas lágrimas.
Assim, assei. Cozinhei. Bati, marinei e gelei um bolo e,
hoje, desossei três galinhas.
“Este frango está tão bom, Srta. Claire, nem precisa de
ketchup,” diz Benjamin, e levanto meus olhos bem a tempo de
ver seu sorriso. Ele tem o sorriso do pai, isso é certo.
“Que bom que gostou, querido,” digo.
“Você com certeza é uma boa cozinheira, quase tão boa
quanto mamãe,” ele continua, empurrando um pedaço em sua
boca que seria grande demais para mim. Mas ele mastiga como
um campeão, eventualmente engole em seco antes de dizer:
“Pena que não mora conosco.”
Sienna sorri e olho para ela; compartilhamos um olhar
rápido e divertido.
“Tive pensamentos semelhantes antes de seu pai e eu nos
casarmos, pequeno. Entre você e eu, quase me casei com Claire.”
“Sério?” Benjamin parece considerar seriamente isso,
pesar os prós e os contras, seus grandes olhos castanhos se
movem entre nós.
“Sério?” Jethro pergunta, enviando um sorriso cintilante
para sua esposa. “Agora, eu aqui, não tinha ideia de que gostava
de mariscos.”
Alguém no final da mesa engasga com algo, atraindo todos
os olhos. É o xerife James tendo problemas com a água.
Jethro olha para o xerife, explicando, “Claire tem uma
ótima receita de mariscos.”
“Claro,” o homem mais velho murmura.
Sienna ignora a comoção, dizendo ao marido enquanto
pisca para mim “Geralmente não gosto de mariscos, apenas
mariscos de gengibre quentes como os de Claire.”
Apesar do meu humor meditativo e melancólico, sinto
meus lábios puxarem para o lado.
“Vai ter que me dar essa receita” Jess entra na conversa,
escovando a franja loira para o lado, o rosto e o tom tão
arrumados quanto uma linha. “Amo o gosto do gengibre.”
Agora a Sra. James tosse, mas não olho para ela,
compartilho um olhar de olhos arregalados com Duane.
O dele parece dizer: Ela continua fazendo isso comigo na
frente de seus pais.
Então, tento me comunicar: Sabia como ela era antes de se
casar.
Ao que ele diz: Eu sei, mas me sinto mal pelo xerife e pela
Sra. James.
Ao que respondo: Não. Eles ganharam você como filho.
Com esse sentimento, a boca de Duane se curva em um de
seus sorrisos raramente concedidos e aquece meu coração,
aliviando parte da crueza.
Mas nossa troca silenciosa e interrompida por Jethro.
“Puta merda! Vocês estão fazendo isso? Onde leem os
pensamentos um do outro? Pensei que era apenas uma coisa de
gêmeos.”
Meu irmão faz uma careta, zombando de Jethro. “Do que
está falando? Isso não é real. Somos apenas Beau e eu tentando
irritar Cletus. Na verdade, não podemos ler os pensamentos um
do outro.”
Jethro olha de soslaio para Duane, depois para mim,
depois para Duane, como se suspeitasse. “Você só faz isso para
irritar Cletus?”
“Claro.” Duane revira os olhos, esfaqueando um pedaço de
frango com o garfo e depois me olha bem rápido, como se
dissesse: Continue com o truque!
Jethro bate na mesa com a palma da mão. “Aí. Ali. Você
acabou de fazer de novo.”
Sienna sorri atrás do guardanapo enquanto luto contra o
meu próprio sorriso, revirando os lábios entre os dentes.
“O que eu fiz?” Em tom estridente, Duane come sua
terceira porção de frango e encolhe os ombros a seu irmão, como
se estivesse confuso. “Não fiz nada. Você é louco.”
“Tio Billy!”
Uma nova comoção entra em erupção e o meu interior
também. Movimento e exclamações no final da mesa têm todos
os olhos voltados para o outro lado, até os meus. Especialmente
meu. Mal consigo engolir em seco quando me inclino para frente,
procurando por Billy. E quando o vejo, meu coração fica confuso
sobre bater ou fingir de morto.
Ele parece melhor, mais forte. Graças a Deus.
Mas isso significa que agora pode andar. Bem, merda.
Devoro a visão dele, noto que sua barba está uma bagunça.
Isso não diminui sua atratividade, emprestando-lhe um ar de
beleza casual e que também parece estranhamente agourenta.
Usa jeans, uma camiseta branca, e isso é tudo que posso ver
daqui de longe.
Cumprimenta o xerife e a Sra. James primeiro, seus olhos
parecem aquecer quando se estabelecem na criança em seus
braços.
“O que você acha?” A Sra. James pergunta, levantando o
bebê, sorrindo como uma mulher no meio da felicidade da avó.
“Seu homônimo não é bonito?”
“Ele é lindo, parece com a avó,” diz suavemente, colocando
o grande dedo indicador no punho da mão do pequeno Liam.
Meu coração aperta dolorosamente.
A mulher sorri! Como uma adolescente! “Oh, pare,”
repreende, brincando com ele, mas parece satisfeita. “Não
parece. Se parece com seu pai. Olhe para esses cachos
vermelhos.”
“Posso segurá-lo?” Ele dirige essa pergunta para Janet
James primeiro, e depois para Jess, que olha para ele com um
sorriso sonhador.
“Claro!”
“Absolutamente. Vá em frente.”
Ele aceita a criança enquanto Duane se apressa para
supervisionar. Billy encaixa o pequeno humano na dobra do
cotovelo e dá um beijo na testa de Liam. É quando desvio os
olhos, recostando na cadeira, preciso me concentrar em
qualquer insurreição que meus órgãos estejam organizando. Não
aguento a visão disso. Billy Winston, preocupado com um bebê,
faz coisas estranhas em meu interior, envia uma pontada de
saudade de um canto a outro no meu corpo.
Sou oficialmente ridícula.
Sinto o peso do olhar de alguém novamente, arrisco um
olhar para Sienna. Ela não olha para mim. Como Jess e Janet,
seus olhos sorridentes estão em ação no final da mesa, o homem
de tirar o fôlego, segurando o bebê mais fofo do mundo. Desvio
minha atenção para outro lugar, encontro o olhar de Jethro.
Ele está me estudando. Cuidadosamente. Como se
procurasse algo. Talvez encontrou, não faço ideia, porque ao
descobrir sua inspeção, um alarme toca entre meus ouvidos.
Fico de pé. Pego meu prato. “Vou começar a lavar a louça,”
murmuro, e corro para a cozinha.
Para constar, não me importo em ir para a cozinha, amei
essa cozinha, ela definitivamente se tornou meu espaço seguro.
Grande, mas não muito, o estilo se encaixa na estrutura.
Armários de madeira maciça de oliveira, granito cinza de uma
pedreira antiga em algum lugar da Itália, barra da pia de
azulejos pintados à mão em azul, verde e amarelo, uma pia de
porcelana estilo fazenda grande o suficiente para lavar uma
criança. Jess chama de moderno rústico e essa é uma descrição
adequada.
Coloco meu prato no balcão, percebo que mal toquei no
meu jantar, então coloco um pedaço de frango na boca e jogo o
resto da comida no lixo. Puxo todos os pratos sujos da pia,
liberando espaço para pular a máquina de lavar louça e limpar
tudo à mão. Por que não? Tenho tempo e minhas mãos querem
estar ocupadas.
“Claire?”
Fico tensa com o som do meu nome, aliviada por não estar
segurando um prato quebrável.
“Jethro,” digo brilhantemente, mantendo minhas costas
para ele. “Pode deixar isso ali com o resto. Vou limpar tudo.”
“Você lava, vou secar.” Na minha visão periférica, vejo que
colocou o prato ao lado do meu no balcão e paira no meu ombro,
olhando para mim. Não me importo. Isso nos dará a chance de
recuperar o atraso. “Como você está? Como está o trabalho?”
“O trabalho está bem.” Eu o enfrento, dou-lhe um sorriso
de lábios cerrados, preparada para me comportar como se tudo
estivesse bem e elegante, porque está tudo bem. E bonito. “Eles
me reservaram um estúdio em Roma, para poder terminar o
novo álbum para um lançamento no outono. Isso é bom.”
“Estão lançando no outono? Pensei que disse que estavam
atrasando as coisas por causa da má notícia.” Jethro puxa uma
toalha da terceira gaveta, jogando-a por cima do ombro.
“Oh, bem, sabe. Algum grande executivo anulou essa
ideia.” Dou de ombros, abrindo a torneira e pegando seu prato e
ignoro a pontada de emoção não identificada, fazendo meu peito
parecer muito apertado. “Toda notícia é boa notícia, ou algo
assim. Eles já tentam me fazer passar por uma garota má no
país, e acho que meu novo apelido, 'Filha do Diabo', não muda
nada...” A verdade é que odeio o apelido. Odeio isso.
“Sim, por que fizeram isso? Vestir você com todo esse couro
preto e tal?” Ele aceita o prato molhado que entrego, encostando
o quadril no balcão.
“Não sei. Sexo vende, talvez? Quando assinei com a
gravadora, não percebi que era necessário renovar a imagem.
Mas não devo me importar. E isso meio que torna mais fácil,
sabia?”
“O que quer dizer?”
Eu me sinto tranquila aliviada com a direção benigna da
conversa. Isso é confortável, como nos velhos tempos, quando
ensinava música e teatro na escola e Jethro aparecia aos
domingos. Eu preparava o jantar, ele arrumava a casa e depois
eu o ajudava a estudar, primeiro no GED e depois no AA.
“Bem, se posso usar uma fantasia, e fazer uma cena em
cima no palco, esse papel desprezível que definiram para mim,
algo muito diferente do verdadeiro eu, facilita a separação da
minha vida real da via artística. Faz sentido?”
“Acho que sim.”
Entrego a panela grande que acabei de raspar e pego a
frigideira que usei para fazer as flores de abóbora. “De qualquer
forma, deixá-los ditar a parte da marca significa que me deixam
ditar a parte da música. Todas as músicas que escrevi para este
álbum foram compostas de primeira, e isso não é pouca coisa
com essas pessoas.”
“Também ajuda que seja uma compositora incrível, Claire.
Não se esqueça disso.”
Suprimo o instinto de negar ou desviar sua declaração, em
vez de me forçar a dizer: “Obrigada, Jet. Obrigada.” Olhe para
mim, eu amadureci.
“Oh meu!” Jet recua, sua mão chega ao peito em um
movimento que só pode ser descrito como delicado. “Você
acabou de aceitar um elogio? Claire McClure acabou de aceitar
um elogio? Isso acabou de acontecer?”
Faço uma careta para o meu amigo enquanto esfrego a
frigideira de ferro fundido, tomando cuidado para não usar
sabão. “Bem, não se vai me dar uma merda sobre isso, não vou.”
Ele sorri provavelmente da minha expressão exasperada;
expressões exasperadas com outras pessoas eram suas
favoritas.
“Então não vou te dar merda. Mas quero marcar esse dia
no meu calendário como importante. Só foi preciso um grande
contrato de gravação, um álbum de platina e uma viagem chique
à Itália para começar a colocar pra fora.”
Sorrio também, jogando água em seu rosto com as unhas.
“Fecha essa cara idiota.”
Ele pega meu pulso antes que eu possa espirrar mais água
e puxa para baixo, abaixando a voz para dizer: “Claire isso não
é o que uma dama diz.”
Sorrio mais. Isso é algo que Jethro e eu costumávamos rir.
De vez em quando, Ben me dizia que eu não estava me
comportando de maneira feminina. Isso costumava irritar
Jethro, e por isso zombava de Ben, e isso fazia Ben rir, e todos
nós ríamos.
“Já te disse, adoro quando faz isso?”
“O que?” Ele seca minha mão e a solta, sorrindo para mim.
“Adoro como difundia essas situações com humor,
intervinha com Ben quando eu não tinha as palavras certas.
Obrigado por fazer isso, isso significou muito.”
O sorriso de Jethro diminui seu olhar se volta para dentro,
introspectivo. “É estranho que às vezes eu me sentisse como se
Ben e eu éramos espécies diferentes? Eu o amava, Deus sabe
que sim, mas ele fazia coisas que não faziam sentido para mim.”
Jethro parece se afastar de uma lembrança, o lado de sua boca
se curva de bom humor. “Como quando dizia essa merda para
você, como se fosse seu pai ou sargento em vez de seu noivo.
Costumava me irritar, honestamente.”
“Não, não é estranho. Entendo.” Tiro a água, pego a toalha
das mãos de Jethro para secar a minha. “O desapontamento dele
também me pegava de surpresa. Como, uma vez, eu estava
pintando as unhas dos pés na sala de estar e isso o deixou
louco.”
“Exatamente. Lembro-me de uma vez que ele se sentiu mal
porque pedi um hambúrguer com queijo cheddar em vez de
suíço. Mas então, eu me desculpava, como se fosse enorme, e ele
me perdoava na hora, nem ficava bravo. Como se esperasse isso,
pronto para estender a graça.”
Mordo o interior do meu lábio, estudando as linhas de riso
ao redor dos olhos de Jet, sentindo como se fomos abruptamente
pegos em uma maré crescente de melancolia. Mas pelo menos
estamos juntos... Exceto, estamos? Realmente?
Jethro sente a falta de Ben. Ele ainda sente muita falta de
Ben. Considerando que eu não. Não sinto a dor de uma esposa
perder o marido, e o que isso diz sobre mim?
Lutei por tanto tempo para sentir falta dele. Falava sobre
ele melancolicamente com o pessoal, tentando forçar isso,
dizendo todas as coisas certas. Mas, finalmente, me senti uma
traidora por não sentir mais sua falta, culpada por não estar
devastada, o que no final, me devastou.
Atualmente me inspeciono, assim como ele fazia na mesa
da sala de jantar, como se procurasse alguma coisa, Jethro abre
a boca como se um pensamento estivesse na ponta da língua.
Fico parada, encontro seu olhar, não mais em pânico pelo que
ele procura.
Agora que não estou mais perturbada pela aparição
repentina de Billy, meu alarme anterior parece bobo. Este é
Jethro. Conheço Jethro toda minha vida. Passamos por muita
coisa, e nem uma vez, nem uma vez, ele me fez sentir menos,
como um fardo, como uma fonte de decepção ou infelicidade.
Nem uma vez.
Ele era minha família antes que eu soubesse que tinha
alguma família remanescente, visitando-me em Nashville
quando Ben foi implantado e depois, após a morte de Ben,
quando voltei para Green Valley para ficar perto dos McClures,
cuidou de mim e me deixou cuidar dele.
Eventualmente, ele suspira profundamente e diz “Sabe,
tudo bem amar alguém, além de Ben. Certo?”
Na minha linhagem, deve ter um cervo, porque congelo. As
declarações de Jethro são raios, altos e eu fui pega. Que diabos?
Ele me inspeciona por mais um momento, deve ter notado
a mudança em mim, meu alarme, porque então, usa a voz que
reserva para ocasiões em que é necessário, o máximo de cuidado
e consideração e diz “Como sabe, só me tornei um guarda
florestal no parque, porque era o que pensava que Ben queria
fazer, e queria ser a pessoa que ele via em mim. Queria viver de
acordo com sua esperança para mim, depois que ele morreu.”
Dou um pequeno aceno de cabeça.
“Bem acontece que gostei. Gostava de ficar em casa com
minha mãe à noite, aprendendo a tricotar. Gostava de fazer meu
GED, estudar, ganhar meu AA. Gostava de conhecer meus
irmãos, bem, aqueles que queriam me conhecer, usar o uniforme
de um guarda florestal, trabalhar com Drew e as outras
senhoras e colegas, até aquele Griffin. Gostei e fiquei contente
em fazer isso. Por um tempo. Mas faltava algo.”
“O que?” Pergunto sem fôlego, ainda alarmada. Sienna
contou a ele sobre minha sessão de confissão de embriaguez?
“Gostava de ser um guarda florestal, mas não estava feliz.
Não estava feliz vivendo uma vida como um monumento para
outra pessoa, alguém que eu amava, ainda sinto falta, mas que
se foi. Não era justo para mim, mas também não era justo para
Ben também.”
Isso chama minha atenção, rompe o terrível transe. “O
que? Como assim? Não era justo com Ben?”
“Não percebi isso até minha mãe morrer, mas os vivos
mudam, os mortos não. Quem era uma pessoa no momento de
sua morte é quem tendemos a supor que sempre foi e quem
sempre seria se ainda estivesse aqui. Mas isso não é verdade,
é?”
Faço uma careta, tentando freneticamente acompanhar,
mas sem entender bem o que ele quer dizer.
Felizmente, ele deve ter entendido minha confusão, porque
diz “Tome por mim, por exemplo. Se tivesse morrido enquanto
ainda estava com os Wraith, então as pessoas assumiriam que
era quem eu era e quem sempre seria. Mas essa não é a minha
verdade, nem da minha vida. Eu mudei, cresci, trabalhei para
fazer algo de mim, para ganhar a confiança da minha família.”
“Sim, você mudou,” concordo baixinho, o orgulho
afastando a ansiedade. Estou tão orgulhosa dele.
“Agora veja Ben. Era meu melhor amigo, eu o amava muito.
Estraguei tudo, fiz algo monumentalmente estúpido, e ele me
perdoou várias vezes. Oferecia uma mão em vez de julgamento.
Por tanto tempo, fiquei grato por ele, por sua absolvição
categórica de minhas escolhas de merda. Era quem era quando
morreu. Mas você acha que, se tivesse vivido continuaria
perdoando um amigo que era um idiota?”
Uma risada surpresa sai dos meus lábios quando inclino
meu quadril contra o balcão e cruzo os braços. “Você não era um
idiota, Jet. Você era...”
“Um idiota.”
Sorrio de novo.
“Eu era, e sabe disso. E se Ben vivesse, gostaria que tivesse
mudado, chamado minha atenção, parado de me perdoar e
começado a me chamar de idiota. Amar alguém significa querer
o melhor para essa pessoa, não ceder ao egoísmo. Eu amo meus
filhos, e isso significa que não os mimo ou os deixo brincar com
facas, certo? Às vezes, amar significa chamar outra pessoa de
idiota, mesmo que isso exija uma conversa incômoda e
desconfortável, como esta que estamos tendo agora.”
Cubro a metade inferior do meu rosto com a mão para
esconder meu sorriso triste, olho para meu amigo,
impressionada com a forma como circulou essa conversa de
volta para mim, para nós.
“Claire, Scarlet, seja qual for o seu nome, eu te amo. Não
como uma irmã, já tenho uma dessa e é a melhor. E
definitivamente não como uma esposa, também tenho uma e é
a melhor de todas.”
Meu sorriso cresce e largo minha mão.
“Eu te amo como uma melhor amiga,” diz, seus olhos
brilham para mim. “Eu te amo incondicionalmente, mas você
está sendo uma idiota.”
Minha boca se abre e, sem pensar, bato em seu braço com
as costas dos meus dedos. “Ei!”
“Para você!” Ele agarra o local que bati e me afasta, sem
tentar esconder sua risada. “Está sendo uma idiota para você, e
não negue. Seus sorrisos são forçados, há anos. Nem todos eles,
mas a maioria. Coloca as necessidades de todos os outros em
primeiro lugar. Não teve de um único encontro desde que Ben
morreu, nem um único. Não estou dizendo que precisa de um
homem, mas se fechou para todas as possibilidades.”
Olho para ele, tento lê-lo como fiz com Duane na mesa de
jantar.
“O fato é que, Red, você está vivendo a ideia de vida de
outra pessoa.” Jethro olha de volta para mim, inocentemente,
ainda não revelando seus pensamentos, e acrescenta “E
suspeito que sei de quem.”
CAPÍTULO 6

CLAIRE

“Ei, Claire!” Jethro grita, assustando-me muito e envio uma


colher de massa de biscoito no ar.
“Que diabos?” Olho em volta, procurando e não o encontro.
“Jethro?”
Após nossa conversa perturbadora, Jethro e eu
conversamos até a louça estar pronta e, em seguida, ele se
juntou a todos os outros para assistir a um filme na sala da
família enquanto fiquei meu quarto. Escondida. Isso foi ontem.
Atualmente, estou de volta no porão, que também pode ser
considerado o primeiro andar, depende para quem você
pergunta, cozinhando para aliviar o estresse no meio da noite e
ainda não estou pronta para ir para a cama depois de um longo
dia fora do caminho de Billy Winston.
“Você pode ir buscar Duane?” Jethro pergunta de algum
lugar que não posso ver.
Faço uma careta, olho para a esquerda e direita. Limpo as
mãos na toalha do meu bolso, caminho até a sala de jantar,
procuro por Jethro. Ele também não está lá.
“Onde você está?” Pergunto ao meu redor.
“Estou no porão. Você não pode me ver, mas eu posso ver
você. Vai buscar Duane?”
“No porão? É meia-noite.”
“Eu sei que horas são Red. Você me deu um relógio no
último Natal. Vai pegar Duane?”
“Uh. Certo.”
“Obrigado.”
Faço uma careta, estreito os olhos. “Isso é estranho. Como
falar com um fantasma.”
“WoooOOOOOooooOOOO!” Jethro faz sua voz vibrar. “Sou
eu! O fantasma desta vila italiana. Ordeno que remova todas as
bananas das instalações.”
Rindo da antipatia persistente do meu amigo por bananas,
vou para as escadas. “Eu já volto, fantasma.”
Este lugar é enorme, cada andar é como sua própria casa,
exceto que há apenas uma cozinha. Mas a cozinha tem dois
conjuntos de portas francesas, abrindo para a grande varanda
de pedra, ou, acho que chamam de terraço por aqui, com vista
para as colinas da Toscana.
O nível da cozinha, também conhecido como piso inferior
ou porão, tem três quartos, todos abrem para o terraço. Também
tem uma sala de jantar e uma grande sala de família com um
projetor para exibição de filmes. Jethro, Sienna e seus filhos
reivindicaram dois dos três quartos, com Maya a irmã de Sienna,
no terceiro.
No andar principal, onde fica a porta da frente oficial, sete
quartos estão espalhados por duas alas. A ala sul tem uma sala
de estar, uma biblioteca e três quartos. Os pais de Jess, Duane,
Liam e Jess estão na ala sul. Agora, a ala norte também tem
uma sala de estar, mas há uma sala de música em vez de uma
biblioteca e quatro quartos. Atualmente, a ala norte está vazia,
mas Cletus e sua esposa Jenn, Ashley, Drew e sua filha Bethany,
e Beau e sua amiga Shelly devem chegar nos próximos dias.
No último andar, no andar superior, há apenas dois
quartos, o meu e o de Billy, mas são gigantescos. Os maiores
cômodos da casa, cada um com varanda, área de estar, mesa,
cama e banheiro. Tentei me insinuar em um dos quartos da ala
norte, mas Jess me pediu para pegar uma suíte grande no
último andar, explicando que gostaria de compartilhá-la comigo,
usar como um lugar para fazer uma pausa quando ela precisar
de uma.
Pensei que isso era meio bobo. Afinal, eles que alugaram a
casa. A grande suíte deveria ser dela em primeiro lugar.
Resmungando cansada, ela disse que tudo fazia sentido, disse
para “simplesmente seguir em frente e não discutir,” e depois me
pediu para entregar a lanolina para seu mamilo dolorido.
Não sabia disso, mas quando as mulheres amamentam,
seus mamilos podem ficar doloridos e rachados. Usam algum
tipo de subproduto de ovelha chamado lanolina como
hidratante; é seguro para o bebê.
Mas chega de mamilos doloridos.
Na ponta dos pés, no corredor da ala sul, vou primeiro ao
quarto de Liam, abro a porta para ver se Duane está lá. Ele não
está, mas Jessica e Sienna estão, sussurrando animadamente
sobre algo que deve ser intensamente interessante enquanto
Sienna segura Liam no ombro dela, dando um tapinha no
traseiro dele. Verifico seu rosto doce do meu lugar na porta, vejo
que está desmaiado como um marinheiro bêbado, e sorrio.
Esse bebê é o mais fofo, eu juro. O mais bonito.
Afasto meus olhos do meu pequeno amor, olho entre
Sienna e Jess. Ambas parecem inteiramente absorvidas pelo que
fofocam, e então dou um passo para trás, não querendo
interromper e ainda não estou pronta para enfrentar Sienna.
Depois dos últimos dias, ainda me sinto sensível.
“Claire?”
Viro com o som do meu nome e encontro Duane
caminhando em minha direção.
“Ei, Duane,” sussurro, me afasto da porta do quarto do
bebê. “Jethro está chamando por você. Ele está no porão da
cozinha. Sabe onde é isso?”
“Ah tudo bem. Obrigado.” Duane olha entre mim e a porta
do quarto, franzindo a testa. “Algo está errado com Liam?”
“Oh. Não. De maneira alguma. Estava apenas vendo se
você estava aqui. Jess está lá dentro e Sienna balança Liam.
Tudo parece estar bem.”
Uma de suas sobrancelhas vermelhas levanta. “Então por
que parece tão triste?”
“Eu?” Pergunto, sorrindo alegremente.
“Você.” Seu olhar vai para baixo, depois volta, como se
estivesse procurando por um sinal de lesão. “Billy está sendo
legal com você? Quando leva a comida dele?”
“Oh, não estou mais fazendo isso. Jethro está levando.”
Confirmo isso com um aceno enfático.
O olhar do meu irmão se estreita e cruza os braços,
continuando a me inspecionar. “Se não está sendo gentil, você
precisa me avisar. Às vezes, ele pode ser um idiota mal-
humorado, e só concordei com tudo isso porque Cletus disse que
vocês estavam em...”
“Duane!” A porta do quarto é aberta de repente, revelando
uma Jessica frenética e sorridente. “Duane. O que está
fazendo?” Ela olha entre nós.
Meu irmão desvia o olhar para sua esposa. Embora
suavize, só um pouco, a inclinação de sua boca não se mexe.
“Jess, alguém tem que cuidar de Claire em tudo isso. E sabe
como Billy pode ser, taciturno e tal. Além disso, não tenho
certeza se Cletus está certo sobre...”
Jessica coloca as mãos em volta do meu braço e me puxa
para dentro do quarto. “Cale sua boca grande e fofoqueira,
Duane Faulkner,” ela ordena, me solta e depois recua para o
marido e passa os braços em volta do seu pescoço, “ou vou calar
a boca para você.”
O lado de sua boca se ergue e suas mãos chegam a suas
costas no que parece ser um movimento automático. “Vá em
frente, princesa,” ele provoca em voz baixa. “Cale-me.”
Vejo de perfil o sorriso de Jess, os olhos castanhos na boca
do marido. “Faça-me um favor, Claire. Feche esta porta.”
Concordo, fecho rapidamente a porta no momento em que
os lábios do casal se encontram, mas tomo o cuidado de fazer
isso em silêncio; não quero acordar o bebê. Viro e enfrento uma
Sienna sorridente, seus olhos dançam enquanto inspeciona a
porta e depois eu.
“Eles são muito fofos,” diz, batendo no braço da cadeira ao
lado dela. “Venha. Sente-se comigo. Desfrute de abraços de bebê
e minha personalidade brilhante.”
Sorrindo nervosamente, faço como instruído. Mas não sei
o que fazer com minhas mãos, então coloco sob as pernas.
Sienna me observa enquanto me acomodo. Sinto o olhar
dela acompanhar meus movimentos o tempo todo, e assim que
levo minha atenção para ela, diz: “Então, você e Billy, hein?”
Eu me encolho, rapidamente... espanto? Choque?... sento
ereta, minha boca abre estupidamente. “Eu... eu...”
“Billy é o cara? Aquele por quem estava apaixonada?”
“Como... como...”
“Então, me fale sobre isso. Ele também estava apaixonado
por você, certo?”
“Como você descobriu?” Solto, finalmente dizendo à coisa
que meu cérebro precisa que eu diga.
Sienna dá de ombros, um pequeno sorriso nos lábios. “Você
deixou escapar enquanto estava bêbada.”
Antes que perceba o que acontece, digo: “Não foi culpa dele.
Eu menti, ele não sabia que eu era casada.”
Ela faz uma careta, seus lábios achatam. “Vamos. Ele
pensou que estava noiva, certo? Sabia que estava com outra
pessoa. Se é culpa, vocês são igualmente culpados. A menos que
você seja um mente secreta que manipula as pessoas e puxa
suas cordas por trás dos bastidores, não pode se responsabilizar
por tudo. Comece do início.”
“O início?”
“Sim. Quando voltou para Green Valley.”
“Uh, okay.”
Espere. Estou fazendo isso?
Coloco meu cabelo atrás das orelhas, olho para frente,
minha mente agitada. Realmente farei isso? Contarei a Sienna a
história toda?
“Claire,” ela diz e chama minha atenção e junto meu
provável olhar aterrorizado com o seu de compaixão. “Esta é
uma zona livre de julgamento. Acho você fabulosa, mesmo
depois de tudo o que me contou enquanto estava bêbada.
Apenas quero te conhecer melhor. Talvez falar sobre isso ajude.”
“Você contou a Jethro? O que te disse?”
“Não, nem uma palavra. Falei a ele que você e eu
conversamos sobre alguns tópicos profundamente pessoais,
mas não tinha liberdade para compartilhar. Ele pareceu aliviado
por finalmente conversar com alguém. Claire, Jethro se importa
com você. Vamos ajudar. OK?”
Balanço a cabeça, minha preocupação diminui quanto
mais olho em seus olhos gentis, e decido me comprometer. Direi
a ela. Vou contar tudo pra ela.
“Tudo bem, então, hum... acho que começaremos com a
noite da minha festa de noivado, que foi maio de 2007”. Começar
por lá faz mais sentido. Então posso ignorar todo o drama em
torno de Billy que engravidou sua namorada do colegial antes
da minha partida, o que foi mais ou menos por que não tivemos
contato depois que fugi aos catorze anos.
Além disso, isso é assunto de Billy, Samantha Cooper lhe
contou na noite anterior à minha saída da cidade e ele decidiu
se casar com ela e interromper toda a comunicação comigo, e
como ela perdeu o bebê. É amplamente conhecido, nada disso é
segredo meu para compartilhar.
“Maio de 2007, certo.” Sienna concorda uma vez. “O que
aconteceu?”
“Depois que a festa terminou, Ben me levou para a sessão
de música no centro comunitário. A sessão não era algo
importante, era novidade e Ben queria que eu visse.” Engulo em
seco, surpresa com a facilidade de falar isso; agora que comecei,
não consigo me conter. “Chegamos ao centro comunitário, Ben
cumprimentou velhos amigos, me apresentou como sua noiva.
A maioria das pessoas pensou que era uma garota, não a fugitiva
Scarlet St. Claire. Eles nem se lembravam dela.”
“Que estranho.”
“Ben conversou com seus velhos amigos de futebol e eu
estava lá, sem ter nada para contribuir, e então ouvi a voz de
Billy.”
“Ouviu a voz dele? O que? Falando com alguém?”
“Cantando.”
“Cantando? Não sabia que ele cantava.”
“Não sabia?” Meus olhos se movem sobre Sienna. Não
consigo vê-la bem. Iluminado apenas por uma única lâmpada
no canto, o quarto está escuro, decorado com verdes suaves e
azuis tranquilos, dando uma aura de aconchego e intimidade.
“Ele sabe cantar e tem uma voz incrível. Eu o reconheço em
qualquer lugar.”
Ele estava na minha cabeça naquela noite antes mesmo de
ouvir sua voz. Bem, sempre estava em minha mente, mas era
mais do que o habitual. Pensava nele em todos os lugares. “Foi
na festa de noivado que descobri que Samantha Cooper e Billy
Winston nunca se casaram.”
“Desculpei-me com Ben e seus amigos e fui até a sala azul,
que era de onde vinha a voz de Billy, e fiquei na porta,
observando-o cantar.”
“Hã. Essa foi a primeira vez que o viu? Desde que deixou
Green Valley aos catorze anos?”
Balanço a cabeça, vendo o rosto de Billy tão claramente
agora quanto antes, seus olhos brilhantes em seu irmão Cletus,
que tocava banjo ao lado dele. O timbre de Billy rico, profundo e
forte, parecia alcançar as partes minhas enterradas, agarradas
com ganchos.
E ele parecia tão diferente, mas tão parecido, mais velho,
seus traços mais perfeitos e incrivelmente bonito, brutalmente
bonito, sua barba não era mais confusa e irregular, mas escura,
espessa e com formas ordenadas.
“Ele encontrou alguém para aparar a barba,” digo sem
pensar.
“O que?” Sienna se inclina em minha direção e quebra o
feitiço lançado pela memória. “A barba dele o quê?”
“Oh, nada.” Eu me sinto estranhamente à vontade. Talvez
seja o bebê adormecido, talvez a iluminação e o silêncio, talvez a
quietude da meia-noite, mas por algum motivo eu me sinto
completamente relaxada. “De qualquer forma, era a primeira vez
que o via desde que saí da cidade três... ou quatro, acho que três
anos e meio.”
“E ele viu você?”
“Sim.” Meu estômago dá uma palpitação suave. “Ele me
viu.”
“E?”
“Bem, eles terminaram um set e as pessoas estavam
batendo palmas, então olhou para cima e nossos olhos se
encontraram e ele...” naquela noite, minhas palavras ficaram
presas na minha garganta, meu estômago e coração em um
tumulto. Mas agora, lembrar, é como se os eventos aconteceram
com outra pessoa.
“O que? O que ele fez?” Sienna parece estar sentada na
beira do assento. “Conte-me.”
Suspiro e sorrio. “História curta, ele me perseguiu para fora
da sala, puxou para os bastidores atrás da cortina da cafeteria
e me beijou muito.”
“Puta merda!”
“Sim, bem, foi o que pensei. Estava tão atordoada.”
“Então o que aconteceu?”
“Uh, novamente conversamos um pouco e imediatamente
disse a ele que estava lá com Ben, mas menti e disse que
estávamos noivos, como dissemos a todos os outros. Billy não
ficou muito feliz e meio que fugiu. Tentei vê-lo algumas vezes
depois, para que pudéssemos conversar. Éramos muito unidos
antes de eu fugir, mas ele se recusou a me ver.”
“Você não o viu?”
“Não, eu vi.” Um calor sutil se acende no meu peito, aquela
dor persistente. Esfrego o local. “Nós nos encontramos em vários
eventos, uma vez na loja quando saí com a Sra. McClure, uma
vez na Daisy's Nut House quando estava lá com Ben, mas nunca
falava comigo.”
“Tratamento de silêncio, não é?”
Sorrio de novo, mas sei que parece triste. “Eu só... só queria
que falasse comigo, sabe? Senti muita falta dele, por tanto
tempo, e queria falar com ele, mas nem sequer olhou para mim.”
“Ele é um idiota. Nós o odiamos, desagradável.”
“Não.” Sorrio da imitação de Gollum pela Sienna, aliviada
por ter algo para rir. “Ele ficou ferido por eu estar noiva de outra
pessoa. Entendi por que estava chateado.”
“Mas se parou de falar com você, então talvez...” Sienna
bufa infeliz. “Ele é tão teimoso. Vejo isso com Jethro o tempo
todo e me deixa louca. Nunca vi alguém guardar rancor como
Billy Winston.”
Sorrio para a ela. “A história deles é confusa. Billy...”
“Oh eu sei. Jetro errou, Deus como sei. Mas as pessoas
mudam certo? Tentam, trabalham e lutam para fazer as pazes.”
“E Jethro fez,” asseguro a ela. “Ele é uma pessoa diferente
agora, mas sabe o que? Ele também é o mesmo. Jethro sempre
foi doce, mesmo quando fazia más escolhas.”
Sienna sorri e levanta as sobrancelhas. “Não estrague
minha fantasia do meu marido. Apenas entre nós dois, uma
parte de mim ama que é um menino mau reformado.”
“E também é.”
O bebê Liam fez um pequeno som, esticando-se no ombro
de Sienna. Ela olha para ele, desloca para o outro lado, balança
e bate em seu traseiro.
Depois que ele se acomoda novamente, ela sussurra: “Ok,
então, o que aconteceu? Quando finalmente falou com você?”
“Acho que no final de setembro, mais de um ano depois.
Estávamos ao mesmo tempo na sessão de música novamente e
cantamos juntos, na frente do pessoal, Cletus no banjo.”
“Cletus e seu banjo mágico.” Os lábios de Sienna torcem
para o lado.
“Cerca de uma semana depois disso, Billy apareceu no
campus, me surpreendeu do lado de fora do prédio de música.
Pediu para ir com ele tomar um café.” Faço uma careta para a
memória, para o meu processo de pensamento ingênuo e
defeituoso. “Estava tão empolgada que iria a qualquer lugar com
ele. Mas, em vez de me levar para o café, me levou para um
hotel.” Que idiota fui.
“Espere.” Ela para de balançar. “Pensei que disse que não
transaram?”
“Nós não transamos. Fomos para o quarto e conversamos,
e então ele me segurou e depois me levou para casa.”
As sobrancelhas de Sienna se erguem na mesma velocidade
em que fica boquiaberta. “Sério?”
Balanço a cabeça novamente, meus lábios curvados em um
sorriso. “Sim. Estou falando sério. É isso aí. Ele me disse que
sentia minha falta e só queria me conhecer de novo, que tentou
ficar longe, mas não conseguiu. Combinamos de nos encontrar
no mesmo hotel, toda semana.”
Seus lindos olhos castanhos estão arregalados como pires.
“Uau.”
“Eu sei. Constantemente pensava em estar com Billy,
fantasiava sobre isso o tempo todo. E então, como mágica, lá
estava ele.”
“Isso foi enquanto era casada, noiva de Ben?”
“Sim,” respondo, sentindo a sombra fria de vergonha
rastejar no oásis do quarto silencioso. Mentalmente afasto.
Estou tão cansada de sentir vergonha.
“E você o amava.”
“Sim.” Digo, me sentindo calma, o que é tão incomum para
essas memórias. “Quando éramos adolescentes, antes de eu
partir, estava apaixonada por ele, tanto quanto uma criança de
quatorze anos pode estar apaixonada por alguém. Senti sua falta
depois que saí, muito, nunca parei de pensar nele.”
“Mesmo quando você e Ben estavam casados? Antes de
voltar para Green Valley, ainda pensava em Billy?”
“Sim, mas...”
“Espere, posso perguntar isso? O que os impediu de ir até
o fim? Fazer sexo, quero dizer. Se pensava nele o tempo todo,
fantasiava estar com ele, já não era traição? Por que não dar o
passo final?”
“Honestamente? Fui eu. Queria estar com ele, mas não
estava pronta. Minha experiência com sexo foi... bem, digamos
que não foi boa.”
“Caramba. Sinto muito.”
“É o que é. Além disso, relembrando as lições que aprendi
na vida, agora sei que há um universo entre querer e fazer. Não
é o mesmo. Querer algo não significa que está pronto para isso.”
“Quando vocês dois se encontraram, no hotel, ele
empurrou você? Billy pressionou para fazer as coisas.”
“Não. Nunca. Ele não me pressionou. Disse a ele que não
podia fazer isso. Todas aquelas vezes que nos encontramos no
hotel, raramente nos beijávamos nos lábios. Às vezes, eu beijava
sua bochecha ou, quando me abraçava, ele beijava meu pescoço.
Foi tudo o que fizemos. Era, não sei como descrever isso. Era
assim...”
“Inocente?”
Franzo o nariz, ainda sinto que estou relatando a história
de outra pessoa. “Não. Eu ia dizer, responsável.”
Sienna solta uma risada curta e depois outra risada se
seguiu. “Sim, aposto.”
Ela e eu compartilhamos um pequeno sorriso, o que é
estranho. Nunca contei os eventos, nem para mim, sem uma
dose pesada de vergonha. É estranho pensar em mim mais
jovem sem a camada de ódio ligada a isso. Talvez, se fosse um
pouco mais gentil comigo, as coisas pudessem ser diferentes.
“Então o que aconteceu? Por que parou de vê-lo?”
Ugh.
Inspiro profundamente e depois solto. “Billy se retirava
cada vez mais, cada vez que estávamos juntos. Falava menos e
menos. E então, parou de vir. Queria que eu deixasse Ben.”
“E você não faria.”
“Eu fiquei... receosa. Principalmente do meu pai, mas
também de machucar Ben. Ele foi tão gentil comigo. E pensava
que devia muito a ele. Mas então fiz um plano. Decidi contar a
verdade a Ben assim que chegasse a casa. Então, ele chegou em
casa e contei.”
“Você disse a verdade?” Ela para de balançar.
“Sim. Ben me disse para escolher, ele ou Billy. Mas, de
qualquer maneira, disse que nos perdoaria, rezaria por nossas
almas e que sempre teria um lar seguro com ele se voltasse para
ele.”
“Blá,” ela diz. “Não consigo decidir se isso foi gentil ou
incrivelmente condescendente.”
“Liguei para Billy imediatamente. Pedi que me encontrasse
no hotel, mesmo que ele jurou que não iria mais, até eu deixar
Ben.” Uma onda de emoção entope meu nariz e olhos. “Ele
entrou e não olhou para mim. E eu...” minha voz falha.”
“Claire,” Sienna alcança meus dedos como se não quisesse
que eu fosse longe demais, sua mão desliza para baixo e segura
a minha.
“Eu disse que queria falar com ele, sobre algo importante.
E ele me perguntou por que, qual era o objetivo. Perguntei se me
amava, e ele não disse nada. Então perguntei se me odiava.”
“O que ele disse?”
“Ele disse: 'Se te odiar você me culparia?'” Deus, ainda dói,
mas não apenas por causa da resposta fria de Billy.
Bethany Winston, sua mãe, estava lá. Ela o seguiu,
preocupada com o filho, e depois que ele partiu, ela me
confrontou. Nunca contei a ninguém além do meu terapeuta
sobre isso. Mesmo agora, não consigo forçar minha boca a
formar as palavras. Sua decepção ainda machuca como agulhas
e vidro quebrado em mim.
“Oh, querida.” Sienna aperta minha mão com mais força.
“Como eu poderia escolher Billy?” Apelo para Sienna
calmamente. “Minha mãe odiava meu pai e acho que ele também
a odiava. Cresci assim, com amargura. Não havia escolha entre
o ódio de Billy e o amor de Ben. Além disso, tinha meu pai a
considerar. Estar com Ben me mantinha fora de seu alcance. Se
saísse dos McClures, não sabia se ainda estaria segura. E
depois...” Faço uma pausa, sentimentos estranhamente
misturados sobre tudo agora que removi a culpa da narrativa.
“O quê?” Sienna pergunta.
“Então.” Torço meus lábios, enviando-lhe um olhar. “Na
noite anterior ao meu casamento ‘oficial’ com Ben, Billy
apareceu na minha janela. Ben ficou na casa de seus pais
durante a noite e fiquei sozinha.”
“O que aconteceu?”
“Ele tentou me seduzir.”
“Bom.” Ela recua, com os olhos arregalados, mas pisca,
como se precisasse de um momento para processar essa
informação. “Que tal isso, do pilar da honra absoluta, Billy
Winston. Funcionou?”
“Não.” Inclino minha cabeça para frente e para trás, dando-
lhe um olhar de lado, finalmente admitindo: “Na verdade, quase.
Ele fez algumas observações sugestivas, que me deixou
perturbada, e me beijou, e constatamos que meu cérebro parou
de se preocupar com o certo e o errado, e...”
“E?”
“E então se afastou e exigiu em termos inequívocos que
deixasse Ben e fugisse com ele.” Faço uma careta, lutando com
uma dor de cabeça repentina quando lembro de suas ordens de
homens das cavernas, quão bravo estava e quão envergonhada
me senti depois de perceber quão perto estive de quebrar minha
promessa à mãe dele. Mas quando me beijou, quando me tocou,
não conseguia pensar.
Aquela noite foi a nossa primeira grande briga. Ao longo
dos anos, tivemos mais algumas brigas, mais gritos, mais
palavras raivosas, mas essa foi a primeira vez que palavras eram
facas e pareciam com flechas e precisei de todas as armas à
minha disposição para afastá-lo.
“E?” Sienna se arrasta para a beira da cadeira de balanço
e minha atenção volta para ela.
“E nada. Saí do quarto.” Dou de ombros, subitamente
cansada, tão cansada. Não quero mais contar histórias esta
noite. Acabou. “Quando voltei, ele saiu e a próxima vez que
conversamos foi depois que Ben morreu. Fim.”
CAPÍTULO 7

BILLY

“Obrigado por reservar um tempo hoje, congressista.


Agradecemos.”
“Não é um problema.” Faço uma careta para o relógio na
tela do meu laptop, verifico novamente a hora no meu telefone.
Essa diferença de tempo é assassina. Tive mais seis horas de
ligações consecutivas nos Estados Unidos antes de ter a chance
de conferir Roscoe, e é quase hora do jantar na Itália. “Não tenho
muito mais tempo, então há mais alguma coisa?”
“Apenas a preparação da campanha. Karl? Quer informar
o congressista sobre a preparação da campanha?”
“Podemos ter uma ligação em separado,” Karl diz.
“Agendaremos mais tarde.”
“Karl, não. É agora ou nunca,” digo, clico na minha agenda
para amanhã e no dia seguinte e vejo mais do mesmo. Quarta-
feira está bloqueada, o dia inteiro. Não me lembro de fazer isso,
mas há muito o que lembrar e focar.
Karl me encurrala antes de finalmente dizer: “É um tanto
pessoal por natureza.”
“Você está saindo?” Pergunto, abrindo o compromisso o dia
inteiro na quarta-feira para ver quem o adicionou. “Se não está
desistindo, não há nada que precise dizer que a equipe não pode
ouvir.”
Becca Mason, minha chefe de gabinete, interrompe: “O
congressista sabe que não existe vida privada para um político.
Continue.”
“Tudo bem,” Karl diz em um suspiro que parece que não
acredita que realmente está bem. “Então, há um boato de que
você e a neta do juiz Payton não estão mais noivos. Isso é
verdade?”
Respondo imediatamente e sem emoção: “É verdade. Ela
enviará uma declaração nas próximas semanas, mas sim. Nós
terminamos o noivado.”
“Isso é um problema,” ele diz.
Não é um problema; no entanto, pergunto: “E o que vê
como uma solução potencial?”
“Inferno, se sei.” Ele parece desanimado, como alguém que
gosta de ficar chateado.
Tenho que reavaliar a posição de Karl conosco se
finalmente decidir concorrer à cadeira no Senado. Ainda não
decidi. Ele é novo na equipe, enviado pela sede do partido, e tudo
sempre é um problema. Meu contato na festa chamou Karl de
esperto. Mas, na minha equipe, as pessoas que veem apenas
problemas, sem oferecer soluções, são demitidas.
“Billy, o problema é,” ele diz, usando meu primeiro nome
como se me conhecesse, faz uma pausa como se pensasse
bastante no assunto e, em seguida, recomeça: “Os eleitores mais
velhos não confiam em candidatos que não são casados, apenas
como não confiam em candidatos com barba, em candidatos que
sorriem demais ou em candidatos que sorriem muito pouco. Sei
que tudo isso pode parecer bobagem, mas...”
“Parece irrelevante.”
Ele sorri. “Não é irrelevante. Prometo a você, não é. Temos
muitos dados de pesquisa sobre tendências de votação e é a
percepção sobre a substância que influencia o voto, uma e outra
vez. Seu trabalho interessa, eu entendo. Mas meu trabalho é a
percepção, e a percepção elege as pessoas. Farei o meu melhor.
Mas coisas como um homem solteiro, sem família, sem noiva,
antes da corrida começar, é um problema.”
Olho para os detalhes do compromisso de quarta-feira,
incapaz de descobrir quem o adicionou ao meu calendário e me
recosto na cadeira, coçando a barba. “OK. Mason, mais alguma
coisa?”
“É tudo o que temos, congressista.”
“Bem. Até a próxima semana. Tchau.” Desligo no momento
em que Karl diz algo, algum tipo de protesto.
Releio o título do encontro de quarta-feira, dia inteiro,
Bloco para a turnê Buonarroti Simoni, sem ligações.
“Buonarroti Simoni.” Tento ouvir o som, verificando se
reconheço o que ouço e, em seguida, lembro. “Michelangelo?”
Pergunto na minha tela, pego meu celular para digitar uma
mensagem rápida para Becca.
Billy: Quem bloqueou quarta-feira no meu calendário?
E o que é Buonarroti Simoni?
Ela respondeu quase instantaneamente.
Becca: Seu irmão nos pediu para bloquear alguns dias
em sua agenda para passear enquanto está lá. Pensei que
tivesse aprovado
Olho para o texto, me debatendo. Fazer turismo não é algo
que planejava, mas não sou contra. A sessão terminou no verão,
o volume de negócios do estado é mínimo e recebo a maioria das
minhas ligações hoje e amanhã. Normalmente, estaria na fábrica
agora, trabalhando dias inteiros, mas Dolly Payton assumiu o
controle enquanto me ‘recupero.’ Isso foi decidido sem a minha
bênção e, como ela disse, para a minha própria teimosia. Boa.
De qualquer forma, os negócios das usinas estão em excelentes
mãos. E sempre quis ir para Roma...
No entanto, algo sobre a entrada no calendário, que
ninguém achou conveniente me consultar, me parece suspeito.
Envio uma nova mensagem a Becca.
Billy: Qual dos meus irmãos pediu para bloquear minha
agenda?
Becca: O e-mail era de Duane Winston com uma lista de
datas. Posso encaminhar.
Relaxo com essa notícia, aliviado por não ser Cletus. Se
Cletus fizesse o pedido, então eu saberia que algo acontece. Além
disso, Duane não é um ótimo comunicador, especialmente sobre
coisas como essa. Provavelmente imaginou que fazia uma coisa
boa, organizando excursões e outros programas enquanto
estava aqui.
Ainda assim, teve tempo de preparar tudo isso enquanto
cuida de um recém-nascido?
Meu telefone toca novamente; um lembrete do calendário
de que já estou atrasado para minha próxima ligação ilumina a
tela. Afasto os pensamentos sobre Duane, excursões e Roma e
ligo, sentando depois que anuncio que estou na fila e espero o
resto do comitê trabalhista se juntar. A maior parte dessa ligação
é gasta em silêncio. Principalmente, estou lá para garantir que
o lobista do Modesto não tente ocultar nenhuma medida de linha
em nossa conta de compensação justa.
Na metade da conferência de uma hora, Jethro entra com
uma bandeja de comida, coloca na cama ao lado da bandeja
vazia do almoço.
Levanto meu queixo em saudação, silencio a linha para
dizer: “Não precisa fazer isso. Estou ao telefone.” Minha família
ainda envia bandejas toda vez que perco uma refeição. Desde
que consegui descer as escadas na semana passada, achei que
parariam. Não tenho tanta sorte.
Ele dá de ombros, pega uma calça que deixei na cama,
dobra enquanto olha em volta e sussurra: “Sabemos que está
ocupado, mas ainda precisa comer.”
Aceno para o telefone. “Está no mudo, não há necessidade
de sussurrar.”
Jethro coloca minha calça dobrada sobre a cômoda, boceja
e se aproxima. “Quer que eu espere?”
Examino meu irmão mais velho, reprimo o impulso de dizer
algo desdenhoso ou mesquinho. Na minha experiência, a única
tarefa mais difícil do que formar novos hábitos é romper os
antigos.
Estar perto de Jethro não é fácil, ainda não me acostumei
ao cessar-fogo entre nós. Olho para ele, vejo um homem que
escolheu a lealdade para com os outros em detrimento da
própria família. E porque Ben McClure foi mais importante e sua
morte mais significativa para Jethro e mais uma razão para se
arrepender e mudar do que nós? Primeiro a família. Sempre.
Sempre.
Às vezes não. Sempre.
“Não, posso descer quando terminar,” finalmente respondo,
tentando um pequeno sorriso que parece muito forçado. “Parece
cansado. Vá para a cama.”
Concordando, ele examina a parte superior da mesa onde
estou sentado. “Deixe-me tirar essas coisas do caminho.”
Alcanço meu laptop, ele pega meu prato do almoço, meu
guardanapo, meu garfo, o vaso...
“Espere. Deixe isso.” Cubro sua mão, deixando o vaso de
volta no topo da mesa e ganho um olhar esquisito do meu irmão.
“Posso trazer algumas flores frescas, se quiser.” Ele aponta
para o vaso. “Essas estão todas mortas.”
Coloco o pequeno vaso com as três papoulas murchas ao
lado do meu laptop. “Apenas deixe.”
Ele torce o nariz para o vaso, para mim e depois se vira.
“Você é tão estranho às vezes,” ouço ele murmurar e levar a
louça suja de volta para a bandeja do almoço e empilhar tudo.
“A propósito,” diz a caminho da porta, “é o fettuccine Alfredo na
tigela debaixo do prato. Claire colocou uma tampa para mantê-
lo aquecido, disse que não terá um sabor tão bom se não comer
logo. Pensei em passar isso adiante.”
“Claire fez isso?” Levanto e caminho lentamente até a
bandeja. Meu andar sem firmeza quase desaparece se caminhar
devagar.
“Sim. Ela também fez as flores de frango e abóbora na
semana passada, o salmão com alcaparras, o pão achatado, o
melão e a carne, o bife e o parmesão que cheiravam tão bem, o
bolo de carne há dois dias, o cordeiro ontem e todos aqueles
biscoitos na terça-feira passada.”
Meu estômago ronca com a menção dos biscoitos e procuro
na bandeja por eles. Foram à primeira coisa que provei ser boa
desde então... bem, desde antes de Roscoe ser esfaqueado. Foi
como se os biscoitos desbloqueassem meu paladar; tudo ficou
fantástico depois.
“Não há biscoitos hoje?” Levanto a tampa que cobre a
tigela, o vapor e o cheiro de dar água na boca do molho Alfredo
exala imediatamente. Tenho que engolir.
“Deve haver. Não tem biscoitos aí?” Jethro coloca a bandeja
do almoço no chão do lado de fora da porta e caminha de volta,
conferindo meu jantar. “Como eu disse, deve haver. Ela acabou
de fazer alguns novamente duas noites atrás. Ou foi ontem à
noite? Ele coça o pescoço, rindo. “Claire continua assando no
meio da noite. Acordamos com todas essas sobremesas. Esta é
o melhor.”
“Meio da noite?” Faço uma careta, inspecionando-o. “Sei
que também faz a bandeja do café da manhã. Quando ela
dorme?”
Jethro aperta os lábios como se achasse minha pergunta
divertida ou luta contra um sorriso. “Ela disse que tem
problemas com o fuso horário. Talvez ainda não se ajustou à
mudança de horário.”
“Huh,” é tudo o que respondo, porque a suposição de
Jethro parece improvável. Ela está aqui há semanas.
Minha mente monta uma imagem, anota as peças
potencialmente relevantes do quebra-cabeça. Desde a nossa
discussão na semana passada, toda vez que entro em uma sala,
ela sai. Tê-la tão perto e sair sempre que me vê irrita meus
nervos. Não consigo entender por que isso continua me
incomodando tanto, me deixa com uma sensação persistente de
inquietação e irritação. Fui eu que pedi para ela manter
distância e apenas faz o que quero. E Scarlet me evitar é nosso
modus operandi há anos. Alguém pode pensar que já acostumei
a isso.
A questão é que a única vez em que a olhei foi quando veio
ao meu quarto no segundo dia. Quando parou de corar, sua pele
estava muito pálida, seus olhos vidrados. Já me perguntei antes
se ela ainda tem pesadelos. Pergunto-me se os tem agora.
Gostaria de saber se está assando tanto para evitar dormir.
“Ela não deve assar no meio da noite,” murmuro. “Alguém
deve garantir que durma o suficiente.”
“Sério?”
A pergunta de Jet me lembra que ainda está presente. Faço
uma careta e coloco as mãos nos bolsos. “Bem, se está
cozinhando para todos, o que parece estar fazendo, então...”
“Ela não cozinha para todos, Billy. Quero dizer, fez aquele
jantar de frango para todos na semana passada, e os bolos,
tortas e biscoitos são para todos. Mas principalmente...” meu
irmão segura meu olhar, um olhar incomumente intenso nos
seus “... apenas cozinha para você.”

***

Depois de terminar minha ligação com Roscoe, minha


intenção é devolver a bandeja de jantar vazia e ver se consigo
encontrar alguns desses biscoitos. Minha intenção não era
perder meu senso de direção do lado de fora da porta da cozinha
e ouvir com antecipação paralisante enquanto Scarlet canta.
Mas aqui estou eu.
Segurando a bandeja e de frente para a porta aberta, sem
olhar para nada. Sua versão serena de “Blackbird” dos Beatles
vem para mim e tenho dezesseis anos novamente, meu coração
na garganta, preso na armadilha de sua voz celestial. Ela
mantém o volume baixo, provavelmente para não acordar
ninguém. Isso também significa que não a ouviria até quase
chegar à cozinha.
Ela muda de “Blackbird” para “Let it Be,” cantarolando a
introdução antes de recitar as palavras e, em seguida, cantarola
o refrão também. Meus pés se movem, carregando-me para mais
perto da soleira, e espio ao redor do batente da porta.
Os olhos dela estão fechados. Está dançando com
abandono e alegria, pulando, com as mãos no ar, o quadril e a
cabeça balançando como se estivesse em um show, não na
cozinha do porão. Um avental sujo cobre o que parece uma blusa
rosa e shorts. Cabelos compridos e grossos reunidos no topo da
cabeça em um coque descuidado, uma mancha de algo marrom
na bochecha. Talvez chocolate?
Esta. Esta é a Scarlet que amo além do senso e da razão.
Seu espírito irreprimível, engraçado e doce, inteligente e tão
incrivelmente forte. Um desejo urgente invade minha cabeça e
meu coração, um desejo de presas e garras: quero dançar com
ela.
Quando minha mãe estava viva, ela nos fazia dançar com
ela, todos nós meninos, principalmente quando éramos
pequenos. Escapei cedo porque sabia tocar violão. Cletus foi
dispensado quando aprendeu sozinho o banjo. Beau e Duane,
Jethro e Roscoe nunca admitiram, mas adoravam. Duane
provavelmente acima de tudo; dentre todos nós, é o melhor
dançarino, Jethro por um segundo. Nunca quis dançar. Isso me
fazia sentir tolo, ser ensinado, ter que seguir até poder liderar.
Mas, neste momento, mais do que tudo, mais do que
respirar fundo ou ver outro nascer do sol, quero dançar com
Scarlet. Só uma vez. Quero abraçá-la enquanto se move, quero
minhas mãos em seu corpo e seu sorriso radiante no meu rosto
e seus olhos alegres nos meus. Quero que ela me ensine a
dançar.
E então ela me pega.
Grita, pula contra o balcão e o segura, os olhos arregalados
e assustados.
“Oh, Deus.” Ela sorri nervosamente depois de um segundo
prolongado. “Você me assustou muito.”
Abaixo os olhos e aperto minha mandíbula, sentindo o
rastejar do calor quando o constrangimento sobe pelo meu
pescoço até as têmporas. É a primeira vez que coro desde a
adolescência, acho. Ainda bem que tenho barba para esconder
o pior.
“Desculpe por ter assustado você.” Mesmo limpando minha
garganta, as palavras saem ásperas quando entro na cozinha.
Levo a bandeja para a pia, noto como recua diante da
minha abordagem para me dar um amplo espaço e depois recua
ainda mais, como se procurasse a saída mais próxima. Uma
risada sem humor me escapa. O nível de comprometimento de
Scarlet em manter distância é tão absurdo quanto irritante.
Olho por cima do ombro, sem querer encará-la, embora é o
que faço e falo: “Você não precisa sair. Termino em apenas um
minuto.”
Seus lábios em uma linha fina, todos os sinais de seu
abandono alegre anterior se fecham e ela diz: “Tudo bem.” Seus
cílios tremem, seu olhar para o chão como se achasse difícil
olhar para mim.
Volto para pia, abro a torneira e aponto o óbvio: “Você não
precisa sair toda vez que entro em uma sala.”
Com a sensação de seus olhos nas minhas costas, eu a
sinto se aproximar. “Estou apenas tentando obedecer aos seus
desejos.”
Sinto meus lábios se curvarem em um sorriso careta.
“Obedecer.” Não. Scarlet nunca me obedeceu. Nem uma vez.
“Isso mesmo, Alteza Real,” diz docemente, entrando na
minha visão periférica, onde vários ingredientes estão
espalhados no balcão. “Só existo para responder aos seus
comandos, não sabia?”
O que sei é que, embora suas palavras sejam sarcásticas,
elas têm um efeito excitante. E isso também me parece absurdo
e irritante.
Provavelmente por isso que rosno: “Ah, sim? Então pule.”
Ela bate a palma da mão no balcão. Pelo canto do olho, a
vejo virar e me encarar. “Qual a altura?” Pergunta
categoricamente.
Paro, dando-lhe um rápido olhar. Scarlet está me
encarando com toda a intensidade de um inferno. Pisco. Fecho
a torneira, coloco o prato que lavei ao lado e limpo as mãos na
toalha perto da pia. Inclino meu quadril, meu lado bom, contra
o balcão, cruzo os braços e estudo essa mulher linda e com raiva.
O problema com Scarlet é que, por mais que olhe para mim,
eu a acho agradável. Desdém, raiva, tristeza, alegria, timidez,
apreensão, frustração, não faz diferença. Só o olhar dela me faz
querer atraí-la para mais perto.
“Algo em sua mente, Scarlet?” Desde que já olho para ela,
eu me entrego a um momento para estudar a mulher. Sua pele
está muito pálida, não tem cor, principalmente porque é verão
na Itália, e tem leves manchas de cinza sob os olhos. Não está
dormindo o suficiente.
“Você...” Ela levanta o queixo, cruza os braços também,
como se prendesse um escudo no lugar, e começa de novo: “Não
sou um tapete. As pessoas não conseguem apenas esfregar os
pés em mim, não mais. Acabei com isso.”
O que? “Tapete?”
“Você é irritante, é tudo.”
“Ah? Isso é tudo?” Pergunto baixinho.
Isso, sua raiva, é muito mais segura que sua suavidade;
posso estar perto dela sem perder nada, exceto meu humor.
Posso falar com ela sem esperar mais depois. Será uma simples
troca de palavras furiosas e termina, e não tenho que sonhar ou
desejar algo impossível.
“Sim. Quero dizer, você me diz para manter distância,
então faço.” Ela joga as mãos no ar. “Então vem aqui e tenta me
fazer sentir tola por manter distância.”
“Fiz você se sentir tola?”
Ela fala baixo, com sotaque e diz: “Fique longe de mim,
Scarlet. Oh espere. Obviamente, não quis dizer 'sair.'”
Sorrio com a impressão dela sobre mim, apenas um ligeiro
curvar dos lábios. Não sorrio para deixá-la com raiva, juro. É tão
engraçado, e é tão fofa.
Mas, quando suas pálpebras se abaixam e seus olhos
brilham, ela não achou meu sorriso divertido.
“Sabe o que eu acho?” Seu tom goteja com veneno. “Acho
que gosta de brincar com as pessoas, fazê-las dançar ao seu
ritmo e depois mudar. Você está noivo, mas é falso. Sempre me
quer, até que não. Quer falar, mas apenas sobre assuntos que
deseja falar. Sempre estará lá para mim, até que eu não faça
exatamente o que quer e quando quiser, ou até que uma donzela
em perigo apareça e precise do cavalo branco de Billy Winston.
Você se apaixona por qualquer coisa ou por quem não pode ter,
mas assim que...”
O suficiente.
Sem pensar, avanço até ela. Ela recua, seus olhos se
arregalam, mas dá apenas dois passos antes de parecer se
lembrar. Fecha as mãos em punhos e coloca os braços
diretamente ao lado do corpo e inclina o queixo enquanto invado
seu espaço.
“Querida,” sussurro para não gritar, abaixo os meus braços
para poder me aproximar dela, “se pensasse que realmente se
entregaria a mim, se pudesse ter você, realmente e
verdadeiramente você, eu te pegaria. Agora mesmo. Bem aqui.”
Scarlet parece engolir algo grosso, seus olhos disparam
entre os meus e depois para minha boca, seus lábios se abrem.
Deus do céu, quero beijá-la. Tão perto quanto estou, posso
sentir o calor de sua pele, a energia inquieta de seu corpo, e
quero aquela boca mandona dela, quero aqueles lábios
carnudos, eu quero.
“Mas ninguém pode ter você,” continuo, a verdade é um
balde de água gelada no fogo em minhas veias. Minha voz rouca,
fala o que sei que é a verdade. “Porque está apaixonada por se
odiar.”
Ela se encolhe, seus olhos brilham, e sei que a machuquei
quando sussurra desconfiada e instável: “Ah, sim? Bem, você
está apaixonado por me odiar.”
Seu golpe atinge seu alvo, uma facada no coração,
enquanto o arrependimento cobre minha língua com azedo. O
que estou fazendo?
Pare com isso.
Preciso parar de tentar machucá-la como uma maneira de
me importar com ela, que é exatamente como meu pai operava
e é exatamente o que acabo de fazer. A única diferença é que
Darrell fazia isso com facilidade, sem desconforto. Considero que
toda vez que ataco Scarlet, é como cortar um dos meus membros
para poder testemunhar sua angústia.
Não sou essa pessoa. Estou doente e errado, e preciso
parar.
Mas antes que possa absorver completamente o golpe,
antes que possa colocar distância entre nós, desculpar-me por
ser desprezível e deixá-la em paz de uma vez por todas, o rosto
de Scarlet faz uma careta e ela engasga: “Só quero que você pare
de me odiar.”
E então, de algum lugar atrás de mim, a voz do meu irmão
Cletus diz: “Estou interrompendo alguma coisa?”
CAPÍTULO 8

BILLY

“Alguma vez lhe passou pela cabeça, de uma forma ou de


outra que você e Scarlet vão ter que se dar bem?”
Olho paciente para ao meu irmão, ele odeia isso. “Já
passou da uma da manhã, Cletus. Vá para a cama.”
Cletus e sua esposa Jenn, Beau e sua mulher Shelly,
Ashley, seu marido Drew e a filha Bethany chegaram, o avião
pousou há apenas duas horas. Disseram que viriam amanhã,
mas aparentemente, me disseram errado.
Scarlet agarrou a chegada repentina de Cletus, passando
por mim, para um grande abraço em seus braços. Enquanto
isso, ele me olhava por cima do ombro. Pegou o dedo indicador
e o dedo médio de uma mão, apontou para os próprios olhos e
depois para mim, dizendo: “Estou observando você.”
Os momentos seguintes foram uma onda de atividades,
durante as quais Scarlet me escapou oferecendo-se para
mostrar às pessoas onde dormiriam e ajudar com as malas.
Jenn se apressou quando Scarlet saiu e antes que percebesse,
estava de avental e ajudando a terminar a receita que Scarlet
começou para algum tipo de biscoito de chocolate escuro.
Então, com a graça e o charme habilidoso de um
profissional, a mulher de Cletus excepcionalmente baixa, me
acompanha até o meu quarto, sorri pacientemente com seu
sorriso ofuscante e olhos azulados, e me deixa com um copo de
leite e um prato de biscoitos. Mas antes de sair, dá um beijo na
minha testa como se tivesse doze anos de idade.
E então, perplexo com o que precisamente aconteceu, eu
me viro e encontro meu irmão. Cletus. Deitado em cima da
minha cama com as mãos atrás da cabeça. O que nos leva ao
agora.
Sentando, Cletus se arrasta para a beira do meu colchão e
inclina para frente, olha, mas não furiosamente, para mim e
apoia os cotovelos nos joelhos. “Eis como é: Duane e Beau são
seus irmãos através de sua mãe. Jethro é seu melhor amigo,
Sienna e Scarlet são duas caixas de vinho longe da formação do
comum irmã-esposa. Jessica e Scarlet são amigas há sete anos
e Scarlet é uma das poucas pessoas que consegue fazer Shelly
rir. Além disso, de acordo com Shelly, Scarlet naturalmente fala
em frases ímpares, o que quer que isso signifique. O ponto é que
todos estão perto. É apenas uma questão de tempo até Scarlet
ficar amiga da Simone, como fez com Jenn, Ashley e Drew. Você
está seguindo a trilha que estou deixando?”
Caminho para a mesa, coloco o leite e os biscoitos, cruzo
os braços e me viro para encarar meu irmão. “Você está
apontando que Scarlet e eu nos veremos durante várias funções
familiares.”
“Correto.”
“E, portanto,” continuo razoavelmente, “preciso ser legal
com ela.” Já sabia disso, e hoje à noite, depois de ver seu rosto
se enrugar e sentir uma parte da minha alma murchar,
finalmente aceitei isto. Serei legal. Serei bem legal. Serei um
santo.
Mas então Cletus diz: “Não, Billy. Não é ser legal. Legal é
para festas e consultas médicas. Você precisa cortejá-la.”
Pisco uma vez. “Cortejar.”
“Certo. Você precisa corteja-la, espero que literalmente, e
depois fazer dessa mulher sua. Permanentemente. De uma vez
por todas. Coloque um anel nisso. Seduza. Jenn ainda tem as
decorações do nosso casamento, se quiser emprestado.”
Durante esse monólogo esclarecedor, ele se mexe e pega o copo
de leite e um biscoito, mergulha o biscoito no leite, pega um e
morde assim que termina sua lista de ilusões.
“Isso nunca vai acontecer.”
“Por que não? Essas decorações são adoráveis. Você ainda
não conhece seu esquema de cores. Pergunte a Scarlet antes de
decidir.”
Cerro os dentes. “Scarlet e eu nunca vai acontecer, Cletus.”
Ele balança a cabeça com firmeza; “Estou decepcionado
com a sua falta de ambição, Billy. Pensei que estaríamos na
mesma página. Mas agora vejo que vou ter que adotar uma
abordagem amorosa difícil.”
“Cletus…”
“Vou lhe dar uma chance,” diz, depois empurra o resto do
biscoito na boca e fala: “Mais uma chance é tudo que tem. Já
esperei o suficiente por isso e conhece meus sentimentos pela
gratificação atrasada.”
“Perdão?”
“Está superestimado.” Toma um gole de leite e pega outro
biscoito.
“Não, Cletus. Uma chance de quê?”
“Estou lhe dando uma chance. Uma.” Aponta o biscoito
para mim. “Amanhã, irá encontrá-la, pedir desculpas por
qualquer coisa que fez. Diga a ela que sofre de insanidade
temporária, consumido por drogas ilícitas, sequestrado por
alienígenas sondadores imbecis, o que seja. Estou lhe dando
uma chance de corrigir isso e, se não aceitar, não vai gostar do
que acontecerá a seguir.”
“Você está me ameaçando?” Pergunto firmemente. Teria me
divertido se o assunto fosse diferente.
Mas Cletus sabe. Ele conhece minha história com Scarlet.
Sabe o que aconteceu quando ela saiu pela primeira vez e como
lutei quando voltou. Foi quem a mandou embora quando veio
me visitar, procurar por mim, querendo ser minha amiga.
Mas então, ele não sabe. Não sabe que eu a rastreava no
campus da faculdade, na esperança de convencê-la a deixar
Ben. Não sabe como eu a encontrei semana após semana,
pressionando-a para deixar o noivo, que descobri mais tarde já
era seu marido, pressionando-a para mudar seu curso de
educação para música, pressionando-a para criar asas e voar
em vez de viver voluntariamente a vida inteira em uma gaiola
construída por Ben McClure. Cletus não sabe como me
apaixonei por ela novamente, mas cresceu em ressentimento
profundo dela também.
Ele sabe, no entanto, que tentei seduzi-la na noite anterior
ao casamento. Ele me levou para a casa dela e me deixou, e me
encontrou bêbado no telhado da nossa casa na manhã seguinte
com uma tatuagem de uma cabra no meu ombro depois que ela
me disse que preferia dormir com uma cabra do que comigo.
"Está certo, estou ameaçando você. Estou ameaçando com
sua própria felicidade, então não me olhe com esse olhar, ele diz
calmamente, como se eu fosse o louco nesta sala e suas palavras
fossem para acalmar.
“Cletus.” Igualmente calmo externamente, me inclino
contra a mesa, meio sentado, e dou-lhe um sorriso tenso. “Deixe
ir. Quantas vezes precisa aprender a mesma lição? Você não
pode controlar todo mundo. Não pode controlar todas as
situações. Scarlet e eu nunca vamos acontecer. Finalmente
começo a deixar passar, realmente e verdadeiramente, e Deus
sabe que Scarlet me afasta há anos. Vamos seguir em frente.”
Cletus estreita os olhos em mim. Observa-me o tempo todo
e mergulha o segundo biscoito no leite e dá uma mordida,
mastiga e diz: “Vinte e quatro horas. E se não resolver o
problema em vinte e quatro horas, acabou. É como um bong
hippie.”
“Perdão?”
“É como uma criança de doze anos cortando a grama.”
“Você está...”
“É como um camarão que boceja ao amanhecer.”
Sem dizer nada, já que está com vontade de me
interromper, faço uma careta para o meu irmão. Ele faz uma
careta de volta. Abro a boca, com a intenção de perguntar se
terminou.
Ele levanta um dedo. “Tenho mais um. É como um Shaun
White usando uma calcinha fio dental no Yukon. Okay, vá em
frente.”
Apesar de tudo, apesar de quão profundo e completamente
irritado estou, luto com um sorriso. “Você não vai gostar do que
acontecerá se fizer outra declaração.”
“E você não vai gostar do que acontecerá se forçar minha
mão. No entanto, acho que também vai gostar do que acontecerá
se você forçar minha mão. Acho que isso pode causar uma
brecha entre nós por um tempo, mas tudo bem, porque no final
a felicidade de Scarlet é o que importa e a sua felicidade é o que
importa. E com isso, te ofereço uma boa noite.”
Enfia o resto do biscoito na boca e pega o prato com o
restante. Gira nos calcanhares e caminha até a porta. Eu o
observo partir, sabendo que não há como convencê-lo de
travessuras, uma vez que se concentra nisso. Só tenho que fazer
o meu melhor para evitar as armadilhas que cria. Isso é tudo
que posso fazer.
“Espero que trouxe as joelheiras,” diz, olhando por cima do
ombro quando alcança o final da escada. “Não precisará deles
para todo esse sofrimento.”
O jantar da noite seguinte acontece no grande terraço de
pedra atrás da casa. Grandes jardineiras com flores vermelhas,
que as abelhas gostam, estão dispostos ao longo da varanda, e
o jasmim branco cresce em uma treliça contra o exterior de
pedra da vila. Todas as portas da casa estão abertas, pois o calor
do dia cede uma noite suave e uma leve brisa. Entre a comida,
o ar noturno e as flores, cheira perto do céu.
Como todas as mesas deste lugar, na cozinha, na sala de
jantar e aqui no terraço, a enorme peça de mobiliário acomoda
a todos com três cadeiras sobrando.
“Para o irmão de Jess, Roscoe e Simone,” Ashley diz,
erguendo o queixo para os lugares vazios. “Próxima vez.”
“Da próxima vez.” Seguro a tigela de macarrão enquanto
ela se serve, olhando para além de Drew, que está sentado à
minha frente, absorto pelo pôr do sol.
O sol não se pôs além do horizonte, mas quase. Aqueles
que estão de frente para o oeste não está mal, o terraço tem um
toldo retrátil de pano que mantem o sol fora do rosto na maior
parte do tempo. Além disso, temos a vista. Um pomar de oliveiras
desce o vale, campos de cevada, vinhedos, as colinas da Toscana
e um céu crepuscular laranja e rosa.
“O que está olhando?” Drew gira em seu assento para olhar
por cima do ombro, o pôr do sol atrás dele faz uma auréola em
seus longos cabelos loiros. Depois de parar por um momento
para inspecionar a vista, ele se vira para mim, um leve sorriso
atrás de seus olhos cinzentos. “Oh. Aquilo.”
“Quer sentar aqui?” Minha irmã pergunta ao marido, pega
o macarrão e segura para que eu possa me servir. “Vocês do lado
de fora estão de costas para o sol. Não tem visão.”
“Tenho uma visão,” ele diz, dividindo sua atenção entre
Ashley e cortar o bife no prato em pedaços pequenos para a filha
deles, Bethany. Ela insistiu em sentar no próprio lugar e não no
colo do pai.
“Oh, ora!” Entregando o macarrão a Beau do outro lado,
Ashley aponta para o céu atrás de Drew. “Olhe para isso, apenas
olhe para toda essa beleza.”
“Eu já disse.” Ele continua a olhar para ela.
Os lábios de Ashley pressionam em uma linha que é uma
parte exasperação e dez partes felicidade. “Eu amo você,” ela diz,
com a voz toda suave, “mas é doido se acha que sou mais bonita
que essa vista.”
“Então acho que se casou com um homem louco.” Ele dá
de ombros.
Minha irmã e seu marido compartilham um olhar e um
sorriso, calor e doçura passa entre eles. Sinto minha boca se
curvar e estudo meu prato, deixando que tenham seu momento
livre de espectadores. Mas então, meus olhos se levantam antes
que eu possa segurar o impulso e procuro Scarlet como fiz tantas
vezes hoje, e entendo exatamente o que Drew quis dizer.
Esta noite, ela está em um longo vestido de verão da cor de
uvas para vinho, os lábios pintados de vermelho, os cabelos
soltos em volta dos ombros nus. Sorri para Jenn e acena com a
cabeça, e então sorri de novo, e a visão eclipsa a vista e o pôr do
sol e o céu de verão, deixa meu peito apertado, meus membros
inquietos e todo o resto à deriva.
Tentei me desculpar com ela durante o dia. Várias vezes a
procurei. Todos os cômodos que entro, ela continua saindo, não
que eu a culpe. A única exceção é o jantar desta noite. Mas com
os três lugares vazios e do outro lado da mesa, não estamos perto
o suficiente para conversar e muito menos para ter uma
conversa particular.
Estou determinado a pegá-la depois do jantar, mas não vou
para o quarto dela. Não quero que se sinta encurralada. Planejei
me desculpar e propor uma nova trégua: não precisamos
interagir ou conversar um com o outro, mas também não temos
que nos esforçar para evitar um ao outro. Nós podemos apenas...
ficar. Fazer uma tentativa e ver se conseguimos faz funcionar.
“Precisamos discutir amanhã.” Cletus, que se posiciona na
cabeceira da mesa para poder ver todo mundo, levanta a voz por
cima do murmúrio geral da conversa e gira o vinho no copo,
inclinando-o para o lado. Como se inspecionasse sua cor.
“O que acontece amanhã?” Shelly pergunta, para minha
surpresa. Ela não gosta de falar, principalmente em um grupo.
O som de sua voz aparentemente surpreende a todos. A
conversa suaviza e as pessoas parecem se voltar para ela e
Cletus em uníssono.
“Sei que alguns de vocês ainda sofrem com o fuso horário,
mas temos ingressos para o David de Michelangelo logo pela
manhã e precisamos saber quem vai e quem fica.”
Jess levanta a mão. “Duane vai garantir que encontre o seu
caminho. Meus pais e eu vamos ficar com Liam e fazer o jantar
para quando voltar.”
“Maya quer ir, mas Sienna, os meninos e eu vamos ficar.”
Jethro fala por sua família.
“O que? Por quê?” Cletus olha entre Sienna e Jet, pousando
o copo de vinho.
“A última vez que estivemos em Florença, Sienna foi
reconhecida,” Jethro responde, dando de ombros. “Tive que levá-
la através de uma multidão de umas cinquenta pessoas.”
“Ele teve um olho roxo depois e suas costas cobertas de
hematomas,” Sienna brinca, colocando a mão na dele sobre a
mesa.
“Ok, bem, espero que o resto de vocês vá, porque, caso
contrário, perderemos o desconto da excursão em grupo e não
saberemos o que farei.”
“Shelly e eu vamos,” Beau diz, jogando o braço nas costas
da cadeira atrás de Shelly e brincando com sua longa trança
loiro-acastanhada. “E sei que Ash e Drew irão com Beth.”
“Está certo,” Drew confirma. “Estamos ansiosos por isso.”
Minha atenção se volta para a criança de dois anos do outro
lado da mesa. Está bebendo de um copo grande, segurando-o
com as duas mãos e me olha por cima da borda, seu olhar firme
e intenso. Os olhos dela são uma mistura da prata do pai e da
azul da mãe. Suspeito que usará aquele olhar como uma espada
um dia.
Pode-se dizer que Bethany e eu temos um entendimento.
Toda vez que ela me traz um livro, eu leio. Não importa onde
estamos ou o que estou fazendo. Se estou ao telefone, desligo.
Se estou no meio de uma conversa, me desculpo. Se estou
cozinhando, desligo o fogão. Toda. Vez.
Basicamente, ou seu tio favorito.
“Você vem, Claire?” Shelly pergunta, como se fosse um
interrogatório, seu olhar azul escuro penetrante.
Scarlet sorri calorosamente para a mulher, dando de
ombros. “Oh, não sei. Na verdade, tenho trabalho a fazer antes
de ir para Roma em algumas semanas.”
Cletus joga as mãos para cima. “Bem, é isso. O Groupon
não vai me dar um reembolso.”
“Vou pensar sobre isso,” diz, sorrindo do drama de Cletus.
“Sempre quis ver, uh,” seus olhos cintilam nos meus e depois se
afasta, “sempre quis ver aquela estátua.”
“Claire vem. E você, Billy?” Shelly volta seu tom e olhar
interrogativo para mim.
“Ele irá,” Duane interrompe antes que tenho a chance de
responder. “Limpei a agenda dele com a secretária. Ele tem o dia
inteiro livre.”
“Na verdade, não sei.” Coço minha barba, me perguntando
se ficar significa que Claire se sentirá mais confortável. Não
quero ser o motivo pelo qual não vá. “Tenho uma ligação com a
fábrica. Dolly disse que quer passar alguns números comigo.”
Tecnicamente, isso não é mentira. Dolly Payton quer exibir
alguns números comigo, mas a ligação que agendamos é para
as três da manhã do horário italiano.
Cletus aperta os olhos e sacode sutilmente a cabeça,
provavelmente uma ação que espera que eu interprete como um
aviso. Eu o ignoro e tomo um gole do meu copo de vinho.
Recostando-se na cadeira, Cletus junta os dedos e baixa o
olhar para o prato, com uma expressão tensa no rosto. Não
consigo imaginar o que acontece em sua cabeça, que tipo de
punição tem reservada para mim. Pode ser qualquer coisa. Bem,
quase tudo. Duvido que ele vá...
“Ei, Billy.” Ashley bate levemente no meu braço, chamando
minha atenção para ela. Com um sorriso doce, diz: “Eu sei que
isso é completamente aleatório, mas Drew e eu estávamos
conversando sobre aquela nova clínica de reabilitação em Green
Valley no outro dia e sempre me pergunto o que aconteceu com
aquele carro.”
“Carro.”
“Sim. No ensino médio, aquele que bateu em você, e acabou
no hospital por todas aquelas semanas, perdendo sua bolsa de
estudos e tal.”
Olho para minha irmã, confuso sobre o motivo de estar
perguntando isso agora. Quanto mais olho, menos doce o sorriso
dela parece. Os cabelos na parte de trás do meu pescoço
levantam, tensos, como se estivesse sendo observado por um
predador. Ou vários.
Olho ao redor da mesa, encontro apenas o xerife e a Sra.
James, Maya, Scarlet, Jethro e Sienna e seus filhos não olhando
na minha direção. Caso contrário, todos os pares de olhos
assistem nossa troca e cada um tem uma expressão semelhante.
Determinados.
Meu estômago revira.
Eles sabem.
Limpo a garganta, luto para manter meu pulso acelerado
sob controle. “Não posso dizer que me lembro,” consigo
engasgar, volto o olhar para o prato e passo a mão na boca com
o guardanapo, tentando pensar.
Ele disse a eles.
“Foi nessa época que Scarlet deixou a cidade, certo?” Beau
pergunta, e meus olhos se voltam para os dele.
Fico imóvel, encaro meu adorável irmão e seu sorriso afável
e a luz profana de malícia em seus olhos. E então o que se segue
seria cômico se meu coração não batesse tanto no meu peito.
Olho para Jethro. Além de Cletus, ele é a única pessoa na
mesa que sabe que foram os Wraiths, e não um acidente de
carro, que me deixou com tantos ossos quebrados. Se ele
descobrisse, diria a Scarlet à verdade imediatamente, com
certeza. Uma e outra vez, ele mostrou como tinha pouca lealdade
por mim.
Jethro olha para mim. Então Jethro olha para Scarlet, que
franze a testa para o prato dela. Meu olhar se volta para Cletus
e olho, porque meu irmão diligente sorri. Para mim. Seu copo de
vinho levanta em minha direção.
“Então, você vem para Florença amanhã? Ver David?” Beau
pergunta, erguendo as sobrancelhas de maneira significativa.
“Acho que sim,” respondo minhas palavras
cuidadosamente calmas, meus olhos nunca deixam os de
Cletus.
Enquanto isso, ele levanta um pulso e aponta para o relógio
com o dedo indicador, balbuciando, o tempo acabou.
CAPÍTULO 9

CLAIRE

Às 8:00 da manhã, as ruas de Florença cheiram a couro e


pão fresco. Os cafés ainda estão montando, colocando cadeiras,
pequenas mesas circulares e letreiros dobráveis, anunciando
café expresso e gelato, nas ruas estreitas de calçada.
“Por que tem tanto cheiro de couro?” Pergunto a Duane,
que atualmente segura minha mão dobrada na dobra do seu
cotovelo.
Duane lidera o caminho, guiando-nos pelas ruas
secundárias, da estação de trem na Piazza di Santa Maria
Novella até a Galeria Accademia, onde está guardada a enorme
estátua de quatro metros. Todo mundo está atrás de nós,
incluindo Billy. Olho por cima do ombro algumas vezes,
esperançosa e furtiva o suficiente para não ser notada. Ele
aparece na retaguarda, andando com a irmã de Sienna, Maya,
que, odeio notar, olha para ele como se fosse uma casquinha de
sorvete.
Não que eu a culpe.
“Eles chegaram a esses mercados ao ar livre, onde os
vendedores vendem todo tipo de coisa, roupas de mesa de linho
fino, tabuleiros de xadrez em mármore italiano e outros. Mas
agora, parece ser um tipo de coisa mais turística, bugigangas e
outros enfeites, bonecos do papa, calendários de padre sexy.”
“Calendários de padre sexy?” Franzo o cenho e sorrio.
Seus olhos deslizam para os meus e ele sorri. “De qualquer
forma, muitas coisas são feitas em Taiwan e na China, não tanto
na Itália. Faz sentido, economia global. Mas ainda têm o
mercado de couro, onde quase tudo é feito aqui por artesãos
locais. É por isso que cheira a couro.”
Aponta para uma fileira de bancas com revestimentos de
lona nos dois lados de uma rua. “Essa é a Via dell'Ariento. Isso
estará ocupado em cerca de duas horas, cheio de pessoas.”
Em algumas das barracas, homens, mulheres e algumas
crianças se movimentam, pegando mercadorias de caixas de
madeira e puxam a lona para frente para criar uma espécie de
teto de tecido na frente da barraca.
“Além do mercado de alimentos San Lorenzo.”
“Um mercado de alimentos? Inscreva-me.” O sorriso do
meu irmão se torna pequeno. “Gostamos um pouco mais do
mercado de Sant'Ambrogio, do outro lado da cidade, mas é uma
caminhada. No entanto, não sei se Jess gosta mais de
Sant'Ambrogio, porque percorremos o longo caminho,
atravessando a Ponte Vecchio e caminhando pelo outro lado do
rio. Ela diz que é mais calmo desse lado, mais frio no verão.”
Balanço a cabeça, decido pedir a Jess algumas sugestões
sobre lugares que posso ir sozinha dentro da cidade. Nunca
viajei, não tenho certeza se consigo passar um dia sem me
perder, mas que diabos? Estou na Itália. Não há tempo como o
presente para aprender novas habilidades.
Uma vitrine de loja chama minha atenção e depois outra e
outra. Uma loja de antiguidades, uma livraria, uma papelaria
com papéis coloridos e cartões de nota. Tento fazer um mapa
mental de onde fica cada loja, o mercado, as bancas. Sim,
voltarei um dia na próxima semana. Quando voltar, porque
agora estou determinada, eu os verei.
Mas quando chego à Galeria, perdi a conta das lojas para
visitar, me sentindo um pouco sobrecarregada por todos os
pontos de interesse. Muitos para rastrear. O nosso guia de
turismo parece estar nos esperando e avança de um pequeno
espaço quadrado de reunião quando chegamos. Logo estamos
todos com fones de ouvido e um dispositivo para usar em volta
do pescoço para conectá-los. Nosso guia usa um pequeno
microfone que transmite sua voz ao nosso dispositivo. Podemos
ouvi-lo através dos fones de ouvido, se assim o desejar, enquanto
caminhamos pelas várias salas de interesse.
Fones de ouvido em volta do meu pescoço, juntamente com
o aparelho de escuta, espero até Billy e Maya passarem antes de
seguir a multidão de Winstons até a Galeria da Academia. Ele
manca, só um pouco, mas notei. Afasto uma pontada de
preocupação, porque não é meu trabalho me preocupar com
Billy Winston, faço o possível para absorver o esplendor geral do
meu entorno.
O esplendor geral é certamente esplêndido e vazio.
“Onde estão todos?” Toco o braço de Shelly para chamar
sua atenção. “Não acredito que somos os únicos aqui.”
Curiosamente quieto, passamos por várias pinturas
enormes. Quero dizer, são enormes. O tamanho de uma parede
inteira. E então, diante de nós, ergue-se uma estátua gigante de
um homem levantando uma mulher. Após uma inspeção mais
detalhada, percebo que ele não a levanta. Ela luta contra seu
aperto enquanto ele tenta levá-la à submissão.
Embora posso apreciar o artesanato e a arte, é meio
perturbador.
“Sienna puxou algumas cordas,” ela explica. “Este não é o
passeio normal; no final, teremos a chance de ver alguns dos
esboços perdidos de Michelangelo.”
Sinto minha testa enrugar e afasto meu olhar da estátua.
“Isso faz parte do Groupon?”
Shelly aperta os lábios, os olhos sorrindo. “Claire. Não
existe um Groupon para ver David. As turnês costumam esgotar
meses de antecedência, especialmente durante o verão.”
“Oh.” Dou a ela um sorriso tenso de leve embaraço. “Acho
que deveria saber que Cletus apenas era Cletus. Desculpa.”
“Está bem. Você é muito fofa às vezes. Esqueço que nunca
deixou o Tennessee antes. Aquela estátua...” ela ergue o queixo
na direção a nossa frente, onde todos pararam, é de
Giambologna. É um modelo de gesso para The Rape of the
Sabines. A escultura de mármore, esculpida em uma peça
sólida, fica na Piazza della Signoria, sob a Loggia dei Lanzi.
Aproximo-me dela enquanto estudo a escultura
novamente, entrelaçando os braços e me pergunto por que
alguém iria querer uma obra de arte representando um estupro.
Nunca saberia disso pelo comportamento estoicamente
externo de Shelly, mas Shelly é uma pessoa extremamente
afetuosa. Assim que a toco, ela se agarra a mim e é exatamente
isso que preciso no momento. Meu estômago palpita e, pela
primeira vez, não tem nada a ver com Billy Winston.
“O que há de errado?” Ela sussurra, segurando minha mão
com força. “Você está bem”
“É simplesmente bobo.”
“O que?”
“Acho que estou nervosa.” Olho para ela e a encontro me
observando atentamente enquanto nossos passos ecoam no
chão de pedra, afastando-me da estátua. “Nunca viajei assim,
fui a um museu antes, definitivamente nada como isso.”
“Você se apresenta na frente de milhares de pessoas.”
“Mais como centenas. Mil pessoas, no máximo.” Recebi um
convite aberto para o Nashville Music Festival em algumas
semanas e isso terá milhares de pessoas. Dei a eles uma
tentativa de sim, mas depois me convenci de não aceitar várias
vezes. O festival está marcado para a semana em que estaria em
Roma e, embora possa fazer com que funcione com minha
agenda, a ideia de me apresentar diante de tantas pessoas me
faz suar frio. “Até agora, só concordei com eventos menores.
Nunca fiz um dos grandes shows ou festivais em estádios, mas
minha gravadora continua ameaçando me enviar em turnê.”
“Mas você foi para a faculdade, certo? Seu mestrado é em
música? Não foi a nenhum museu então?”
“No fim das contas, minha especialização é educação
musical. Mas não sou de sair. Ia para a aula e depois para casa.
Tia Mary e tio Peter, os tios e tias de Ben, são com quem morava,
eram mais velhos e precisavam de ajuda. Então, quando não
estava na aula, estava em casa com eles.”
“Você gostou de estar lá? Ou gostaria de poder socializar
mais?”
“Ah, gostei. Eram tão legais. Jogávamos cartas à noite ou
eu cantava e tocava piano para eles. E ela me ensinou a
cozinhar.” Sussurro um pouco mais silencioso desde que
acabamos de entrar em uma espécie de corredor e algo sobre ele
parecia extremamente sagrado, como uma igreja, mas com
esteroides de santidade. Em ambos os lados há esculturas de
mármore semiacabadas de homens.
Nosso guia murmura algo para a frente do nosso grupo.
“Devo colocar os fones de ouvido? Ele já está falando?”
“Você está nervosa. Posso dizer.” Os olhos de Shelly se
movem entre os meus e, totalmente sério, ela diz: “Protegerei
você.”
Uma onda de calor e carinho por essa mulher me faz sorrir
largamente. “Obrigada, Shelly. Gosto de você. Mas vou acabar
sendo manequim em apenas um minuto, acho.”
“Deixe-me contar uma história para distraí-la.” De braços
dados, ela nos encaminha para frente, passa por Jenn e Cletus,
além de Drew e Ash e Bethany, além de Billy e Maya, Duane e
Beau. Ela até passa pelo guia e...
“Caramba!” Meus pés tropeçam e minha boca fica aberta
porque lá está ele. David. Bem na nossa frente, como se fosse
real. Quero dizer, merda. Assim, todos o meu nervoso tolo é
esquecido.
“Esse é o David, e é lindo,” ela diz, sua voz definitivamente
não é um sussurro. “Não pode ver o rosto dele muito bem desse
ângulo.” Ela me leva para frente, e para ao lado de seu pé
esquerdo gigante. “Mas está franzindo a testa, parece severo,
focado, um pouco zangado. E, no entanto, a postura dele é tão
relaxada, não acha?”
Concordo com a cabeça, hipnotizada... bem, por toda a
maldita coisa.
Billy me contou uma vez a história da Bíblia quando
éramos adolescentes e a procuro desde então. Tentei imaginar
esse garoto lindo, corajoso, nobre e indiferente ao medo, com
apenas um estilingue e pedras, de frente para o gigante macabro
Golias.
Mas isso? Bonito não é a palavra certa para o que David é,
a descrição parece insignificante, dada a realidade dele. Isto. A
estátua, quero dizer.
Shelly puxa meu braço e me acompanha lentamente pela
barreira para poder ver suas costas. E, meu Deus, ele tem um
traseiro glorioso, glorioso, e um sinal de suspeita me ocorre. Esta
estátua não é uma representação de uma história bíblica, na
verdade não. É uma celebração da forma masculina, de sua
beleza áspera, forma rígida, ângulos severos e linhas graciosas
e, durante grande parte da história, seu objetivo.
“Quando estava na escola, na Universidade de Chicago, nos
contaram uma história sobre Michelangelo, mais uma lenda com
dois finais.” Shelly nos para bem no centro das costas e nós duas
temos um momento para contemplar os detalhes
surpreendentes de seu tronco, pernas e mão direita.
“Uma lenda?” Pergunto, meus olhos fixos no mármore
branco, apenas tangencialmente ciente de que Cletus e Beau se
aproximaram, além de Billy e Maya.
“Quando Michelangelo estava esculpindo a escultura de
David, foi avisado que a peça de mármore escolhida era
defeituosa.”
“Defeituosa?” Billy pergunta, sua voz profunda ecoa no
espaço cavernoso e faz os cabelos na parte de trás do meu
pescoço formigarem. “Como assim?”
“Em 1464, o mármore foi dado a um artista chamado
Agostino para esculpir uma estátua de David, mas ele desistiu,
dizendo que não podia trabalhar com ela. Então, em 1501,
Michelangelo assumiu a tarefa e o mármore. Como pode ver, é
um impressionante mármore branco puro e inestimável, enviado
de uma pedreira em Carrara, uma cidade nos Alpes Apuanos no
norte da Toscana. Uma peça enorme e única de pedra, e mesmo
que todo mundo falhou, Michelangelo queria mesmo assim.”
“Era defeituoso?” Beau pergunta, atraindo os olhos de
Shelly para ele.
“Talvez. De acordo com a história que me foi contada,
Michelangelo deu um nó no peito de David e depois não teve
problemas para esculpir o bloco.”
“Hã. Interessante.” Duane olha para a estátua, apertando
os olhos. “Nunca ouvi isso antes.”
“E aqui é onde as lendas divergem,” ela continua. “Em uma
versão da história, o nó, dizem, era o coração de David.”
“Oh.” Os olhos castanhos escuros de Maya se arregalam,
como se achasse isso angustiante, uma expressão que tenho
certeza está refletida em meus próprios olhos.
“E quando Michelangelo removeu o coração da pedra, foi
fácil manipular e moldar em quem ou o que quisesse.”
“Isso é... triste.” Maya olha para mim, como se confirmasse
que seus sentimentos sobre o assunto são válidos. “O que a
outra lenda diz?”
“A outra lenda afirma que o nó bloqueou o coração de
David. E uma vez removido, a verdadeira forma sob o mármore
foi revelada.”
“Gosto mais dessa história,” Beau diz, sorrindo para Shelly.
“Posso ver o porquê,” Billy murmura, parecendo distraído,
sua atenção fixa na panturrilha e nos pés de David.
“Qual história você prefere?” Pergunto. Shelly sempre teve
uma opinião inesperada sobre as coisas.
“Gosto da dualidade de ambos, para ser honesta.”
“Como assim?” Beau ergue o queixo, o olhar fixo nela, como
se fosse à pessoa mais fascinante e maravilhosa do mundo. Mas,
sempre olha para ela assim.
“Apenas isso, duas pessoas, testemunhando ou
experimentando o mesmo evento, podem ter duas interpretações
completamente diferentes da verdade. Para uma pessoa, o nó
era um coração, e removê-lo devastou a pedra de tal forma que
sucumbiu à visão do artista. Para outro, o nó era uma obstrução
à pedra, impedindo que fosse o que ou quem deveria ser.”
Sinto o peso da atenção de Billy se mover para mim, com
certeza como um toque ou uma palavra dita suavemente.
Engulo. Digo a mim para não olhar. Mas então olho.
Nossos olhares travam fixos, e o impacto corre através do
meu corpo, nas pontas dos dedos das mãos e dos pés. Ele não
sorri ou franzi a testa, apenas olha. Mas isso sempre foi
suficiente para me descontrolar. Só tenho a culpa, mas gosto de
sofrer por Billy Winston.
“A verdade está nos olhos de quem vê?” Pergunta sua voz
profunda. A pergunta direcionada a Shelly, mas seus olhos
nunca deixam os meus.
“Claro que está. A verdade é sempre mais relativa que a
ficção. E a ideia de que duas verdades factuais podem existir ao
mesmo tempo, tão diametralmente opostas uma à outra, é
completamente fascinante. Não acha?”

***

Alinhados, dois a dois, esperamos o elevador nos levar até


o porão. Segundo Shelly, uma sala escondida foi descoberta há
quarenta anos, sob a catedral de Florença, que abriga vários
esboços atribuídos a Michelangelo e seus alunos. Partes das
paredes foram cuidadosamente removidas da sala original há
muito escondida e colocadas neste espaço subterrâneo sob a
Galeria da Academia, mas o elevador para baixo só pode apenas
duas pessoas por vez.
Billy e Maya são os primeiros, Beau e Shelly depois, Cletus
e Jenn e depois Duane e eu na retaguarda. Ash e Drew foram
para a loja de presentes, pois Bethany ficou inquieta,
perguntando várias vezes e em voz alta por que David não vestia
roupas e se estava com frio.
“Duane?” Maya joga os cabelos escuros por cima do ombro
e fala para nós, seu rosto se desculpando. Maya parece muito
com sua irmã, exceto que sua pele é apenas um ou dois tons
mais claro que a tonalidade dourada de Sienna. “Desculpe,
tenho que ir ao banheiro. Pode me mostrar onde fica?”
“Claro.” Duane dá um passo à frente, trazendo-me com ele.
Coloca uma mão nas minhas costas. “Aqui, Claire. Você desce
com Billy. Vou levar Maya.”
“Eu…”
Ding.
“Chegou, é hora de seguir em frente,” Cletus anuncia.
Duane me empurra, e quero dizer, me empurra, para o
elevador e viro, meus olhos arregalados se conectam aos de Billy.
Ele ainda não entrou e parece tão perplexo quanto eu pelo
repentino barulho das pessoas. Mas então, Jennifer dá um
passo à frente e pega o braço dele, guiando-o para o pequeno
elevador.
“Pronto, querido,” diz, aperta o botão da porta fechada e
recosta-se para trás, como se acabou de ajudar uma velhinha a
atravessar a rua. “Vejo vocês daqui a pouco.”
Recuo o mais longe que posso, mas o corpo de Billy ainda
lota meu espaço. Não é até as portas fecharem atrás de nós que
o reconhecimento afia seus olhos, como se acabasse de perceber
o que aconteceu, onde está e com quem está.
“Oh,” ele diz suavemente, afastando-se. “Estou...” Seus
olhos visíveis e incomumente perturbados. “É um elevador
pequeno.”
“É,” sussurro, sem saber onde fixar o meu olhar, meu ritmo
cardíaco acelerando.
Ele preenche cada centímetro da minha visão, e é tão
grande. Nunca senti tanto o tamanho dele antes, não assim, não
onde somos apenas nós dois em um espaço minúsculo e seus
ombros parecem abranger toda a largura, elevando-se sobre
mim. Pouco antes de se tornar esmagador, as portas abrem. Saio
correndo e paro, descobrindo que não fui muito longe.
A sala é exatamente isso, uma sala, talvez seis metros
quadrados. Uma estreita prancha de madeira suspensa por um
cabo, se estende pelo centro e ambos os lados até o chão, de pelo
menos um metro e vinte. Ao longo das paredes, escondidas sob
os arcos e banhada pela luz, há seções nas paredes, desenhos a
carvão sobre gesso branco. E é isso.
Eu me viro. Billy ainda paira perto das portas fechadas do
elevador, as mãos nos bolsos, os olhos cautelosos em mim.
“Isso é muito interessante,” digo, mas principalmente
guincho e gesticulo para o espaço, sentindo que preciso defender
a sala simples por algum motivo.
Mordo o interior do lábio, Billy concorda, sua cautela
mantida.
Limpo a garganta, desço a prancha, minhas mãos cruzadas
atrás das costas, fingindo estar totalmente absorta nos esboços.
A verdade é que eu mal os noto. O que noto? A lenta passagem
do tempo. Um minuto se torna dois, talvez dez, talvez cem.
Continuo olhando sem ver as paredes enquanto ele continua a
pairar no elevador.
Eu me pergunto qual é o plano dele. Talvez queira sair
assim que o próximo elevador chegar? Isso faz sentido.
Certamente explicaria por que não deu mais de um passo para
longe da única rota de fuga.
Bem, isso é bom. Somente. Bom. E talvez, depois que sair,
eu posso relaxar e realmente olhar os esboços, o que deve ser a
qualquer momento. Certamente, Beau e Shelly estão a caminho.
Certamente.
Não tenho ideia de que horas são. Ele continua vagando,
vira-se para as portas, mexe no botão. A pequena sala começa a
parecer tão apertada quanto o elevador e tenho um pouco de
dificuldade para regular minha respiração. Há quanto tempo
estamos aqui em baixo? Dias?!
“Scarlet.”
Fico tensa, meu olhar encontra com o dele. Sua expressão
cautelosa é substituída por uma frustrada, e no segundo
seguinte se move, caminhando em minha direção. Oh Deus. Por
favor. Por favor, seja simpática.
Procuro por algum tópico, qualquer tópico que possa
distraí-lo do que quer que esteja em sua mente, e solto: “Shelly
disse que isso foi feito por Michelangelo e seus alunos.”
Ele para a cerca de um metro de distância, sua boca em
uma linha infeliz, e me preparo para o impacto de palavras
raivosas quando ele diz: “O botão de chamada não parece estar
funcionando,” o que não é o que esperava dele.
Olho para o homem por um instante, depois me inclino
para o lado e analiso as portas. “Não está?”
“Não. E já faz quinze minutos.”
“O que? Já?”
Ele concorda, parece menos irritado e mais... arrependido?
“Sinto muito,” ele diz, seu olhar tipicamente gelado agora
curiosamente moderado, mas ainda reservado. “Acho que essa é
a ideia de Cletus de ajuda.”
CAPÍTULO 10

CLAIRE

“Ajuda?” Repito, confusa.


A língua de Billy dispara para lamber seus lábios. “Cletus
parece pensar que, se você e eu ficarmos presos juntos,
trabalharemos com nossas diferenças.”
Meu estômago revira e minha boca forma um O quando
finalmente entendo. Nós estamos presos. Cletus de alguma
maneira descobriu como nos prender aqui. Ótimo.
“Não tive nada a ver com isso,” Billy diz,
desnecessariamente. Obviamente, não tem nada a ver com isso.
“Eu sei.” Viro e procuro um lugar para me sentar. “Não
acho que você tem,” murmuro. Então, como às vezes posso ser
mesquinha, murmuro: “Não sou eu quem tenta evitar você.”
Billy balança os calcanhares, como se absorvesse minhas
palavras, e fala: “Essa afirmação não tem base na realidade.”
Não encontro nenhuma cadeira ou banco sobre o qual me
sentar e me abaixo na prancha. “Estou apenas dando a você o
espaço que pediu.” Permito que minhas pernas pendurem para
o lado, imaginando se ficarei presa aqui por Deus sabe quanto
tempo, com um homem que despreza a minha visão, posso
muito bem sentar. Estou cansada de ficar de pé e lutar.
“E antes disso?”
“E antes disso, o que?”
“E antes de pedir distância na semana passada? Onde você
estava?”
“E antes disso,” aceno com a mão no ar, “estive em
Nashville por quatro anos e você na capital e noivo. Assim...”
Dou de ombros, porque isso apenas diz tudo.
“Não.” Ele senta também, assume a mesma posição que eu,
a apenas um metro de distância agora. Seus movimentos são
lentos, como se seu quadril dificultasse. “Disse a você no Natal
que não era um compromisso real. Se não estava me evitando,
onde esteve nos últimos seis meses?”
“Você ainda estava noivo. Todos os compromissos são reais
até que terminem,” falo categoricamente. Olho para frente, torço
meus lábios para o lado, não sinto minhas palpitações habituais
do coração e outros órgãos. Apenas me sinto... cansada. Aqui
vamos nós novamente. Estou tão cansada disso.
“Bem, esse noivado acabou. Rompi algumas semanas
atrás.”
Uma centelha de irritação faz meus lábios se curvarem em
um sorriso triste. “Bem, aí vai você. E agora quer que eu
mantenha distância. Engraçado como esse tempo funciona.”
“Sabe o que? Talvez devêssemos esperar em silêncio,”
resmunga. “Vamos esperar aqui em silêncio até Cletus decidir
nos deixar sair.”
“Tudo bem pra mim.” Levanto meus joelhos e abraço
minhas pernas, coloco minha bochecha em cima delas, meu
rosto virado.
Encorajo minha mente a me tirar daqui, reflito sobre como
todos esses argumentos são idiotas. Os mesmos repetidos, e
ainda assim machucam. Billy está certo. Estar perto dele é
difícil. Costumava ser tão fácil, o que apenas dói ainda mais.
Eventualmente, meus pensamentos se afastam, mas não
se afastam muito do homem ao meu lado. Vê-lo enrolado na
cama na semana passada, obviamente com dor e tão
determinado a rejeitar qualquer gentileza que ofereci. Bem, acho
que não o culpo por me afastar, considerando tudo, mas por que
se colocou nessa posição para começar não faz sentido para
mim.
É provavelmente por isso que, antes de poder me conter,
digo: “Na verdade, não. Não está bem comigo. Tenho uma
pergunta.”
“O que é?”
“Por que doou sua medula óssea para Darrell?” Erguendo
a cabeça, olho para ele. Ele tem um joelho esticado, o antebraço
apoiado em cima dele, e retorna minha inspeção.
“Ah. Então é isso que queria dizer quando disse que Cletus
contou o que aconteceu.”
“Sim. Por que fez isso?”
Billy parece hesitar, como se debatesse entre dois
caminhos e não tem certeza de qual caminho seguir. “Quanto
você sabe sobre o que aconteceu em maio? Na lanchonete,
quando Roscoe e Simone foram feridos?”
Observo um vislumbre de vulnerabilidade por trás de seu
olhar com a menção de seu irmãozinho, viro meu corpo para
encará-lo completamente, sentando de pernas cruzadas.
“Apenas o que está nos jornais.”
“Que é?”
“Meu, uh ...” Olho para o teto enquanto recito os fatos como
os conheço. “Razor atacou Roscoe e aquele mal policial entrou
na lanchonete, atingindo Simone. Mas então ela foi capaz de
atirar em Razor antes de desmaiar. Você entrou, encontrou-o a
ponto de matá-la, então bateu nele e cobriu Roscoe e Simone
com gelo enquanto esperava pela ambulância.”
“Esse é um resumo justo. Mas o que os jornais não se
concentraram muito é que Darrell concordou em testemunhar
contra Razor, mas só se alguém doasse medula óssea para ele.”
Minha coluna se endireita. “Ele fez isso?”
“Sim. No começo, seria Roscoe, e eles acham que é por isso
que Razor foi atrás dele. Obviamente, agora Roscoe está doente
demais para fazer qualquer coisa além de se curar. Então eu me
ofereci para...” A boca de Billy se fecha abruptamente, seu olhar
para o chão. Ele balança a cabeça um pouco e suas
sobrancelhas se juntam, dando-me a sensação de que está
pensando sobre assuntos importantes e analisa o que quer
compartilhar.
“Sabe?” Ele finalmente diz, respirando fundo. “A verdade é
que estou fazendo isso por vingança.” Billy sorri levemente, como
se achasse suas próprias motivações bizarras. “Essa é a
resposta. Vingança.”
“O que? Está salvando a vida de Darrell para se vingar?
Como isso funciona? Está salvando-o para irritá-lo?”
“Não. Não me importo com isso.” Ele acena com a
possibilidade. “Ele não vai viver muito mais tempo de qualquer
maneira. Os médicos dizem que estará morto dentro de um ano,
dois no máximo, não importa o quê. Quero prolongar a vida dele
o tempo suficiente para colocar Razor na cadeia.”
“Então... é vingança contra o Razor?”
Ele levanta a cabeça e seus olhar se prendem com os meus.
“E Darrell também. Gosto do fato de que uma das últimas coisas
que fará é trair as pessoas que tanto importaram para ele
durante sua vida. Acho uma satisfação.”
“Posso ver isso.” Estudo a linha sombria de sua boca, o jeito
que sua mandíbula aperta na têmpora e de repente me sinto
comovida ao dizer: “Obrigada.”
Um pouco da intensidade por trás de seu olhar dá lugar a
confusão. “Pelo quê?”
“Por fazer isso, por fazer Darrell testemunhar. Isso me
ajuda a saber que Razor ficará preso pelo resto da vida.”
O olhar de Billy passa por mim, aguçado. “Você ainda tem
pesadelos?”
Paro. Até meu coração parece desacelerar enquanto nos
observamos. É um momento estranho, ter essa conversa com
ele. Ele sabe muito sobre mim, meu passado, minhas
esperanças e medos. Até conhece meus sonhos. E, no entanto,
me odeia. Então, por que estou falando com ele?
“Sempre tive medo,” digo devagar, sem saber se devo
continuar falando ou parar. A história me diz que essa calma
entre nós é uma bomba-relógio; eventualmente um de nós
explodirá.
Contudo... sinto falta disso. Sinto falta de conversar com
ele. Sinto falta de ouvir o que pensa e o que deseja. Sinto falta
da sua voz. Sinto falta da risada, da doçura sutil e do humor
irônico. Sinto falta dele.
No final, novamente, porque sou uma masoquista por Billy
Winston, decido que não há nenhum dano em confirmar algo
que provavelmente já suspeita. “Sempre tive medo de que um
dia voltasse atrás de mim. Que viesse me pegar e levar de volta
para lá. Por isso pedi a Jethro para colocar aqueles quartos de
pânico em minha casa.”
Essa notícia parece deixá-lo inquieto. “Por que voltou para
Green Valley? Por que voltou?”
Observo ele e estudo suas perguntas. “Quer dizer para
viver? Depois que Ben morreu?”
Fico surpresa com a pergunta.
Em todos os meses em que passamos juntos, Billy nunca
perguntou e não queria saber. Naquela época, só queria falar
sobre o futuro, sobre minhas esperanças e sonhos, e suas
esperanças e sonhos, e eventos atuais, e minha escola, e o que
pensava sobre isso e aquilo. É como se fingisse que éramos
apenas duas pessoas normais, sem bagagem, sem preocupações
ou obrigações fora.
Isso não quer dizer que é completamente ignorante de tudo.
Billy conhece pequenos detalhes, como morei com a tia e o tio
de Ben em Nashville há vários anos e por que nunca o procurei
enquanto estava fora, pensei que ele e a namorada do colegial se
casaram. Também conversamos sobre minha música e seu
trabalho na fábrica.
Mas no momento em que lhe contei como Ben dormiu
comigo no meu décimo oitavo aniversário, toda a discussão do
passado parou. Ele não suportou ouvir mais nada. Toda vez que
falava de Ben ou tentava explicar, Billy parava e saía.
“OK. Certo. Por que voltou depois que Ben morreu? Ou
mesmo antes disso? Por que não ficou fora? Segura?” Parece
mais interessado do que zangado, o que, novamente, me
surpreende.
Portanto, respondo a verdade. “Bem, depois que Ben
morreu, senti que precisava estar perto dos McClures. Eles eram
tão bons para mim e perderam o único filho, um filho que
consideravam um milagre. Queria ser uma ajuda em seu tempo
de luto, dar-lhes um foco, alguma esperança.”
A sobrancelha de Billy se junta, seu olhar suaviza, parece
perder parte de sua indiferença anterior.
“Isso foi bom da sua parte.”
“Obrigada,” digo, pois é o que significa e meu estômago
pensa que agora é um bom momento para vibrar. Faço o possível
para ignorar esse desenvolvimento e acrescento: “Antes de Ben
morrer, quando voltamos para a festa de noivado, mas ainda
morava em Nashville para a escola, Ben me disse que era
seguro.”
Os olhos de Billy se movem entre os meus, suas
sobrancelhas se juntam, como se ouviu mal. “Ele disse? Disse
que era seguro?”
“Sim. Disse que, como eu estava sob a proteção de sua
família e éramos casados, os Wraiths me deixariam em paz.”
Em um piscar de olhos, todos os traços de calor e
suavidade na expressão de Billy são substituídos por uma fúria
mal contida. “Ele te contou...” começa, para, sua respiração
agora diferente, mais superficial. De repente, se levanta e anda,
mancando. Anda de volta e não tenho certeza se a careta no
rosto é por causa do quadril ou das minhas palavras. “Ben te
disse que Razor a deixou sozinha por causa dos McClures? Você
estava sob a proteção da família dele?”
Antes de confirmar, repito mentalmente sua pergunta,
garantindo que não perdi nada. “Sim. Quer dizer, se pensar
sobre isso, faz sentido, certo? Todos no leste do Tennessee
conhecem os McClures. Se algo acontecesse comigo, não seria
facilmente varrido para debaixo do tapete, como quando eu era
apenas lixo de MC, morando no complexo.”
Billy aperta os dentes, me encara, dando-me a sensação de
que quer dizer alguma coisa, mas se segura pelo menor pedaço
de fio. “Isso não faz sentido,” finalmente fala, seus olhos brilham
para mim. “Conhece seu pai melhor do que ninguém, sabe do
que ele é capaz. Realmente acha que Razor pensaria duas vezes
em reduzir Ben McClure se o clima o atingisse?”
De pé, limpo minhas costas com as palmas das mãos,
procurando em meu cérebro pelo que posso ter dito que causou
a repentina mudança de humor de Billy. “Que outra explicação
pode haver?”
“Não acredito que confiou nele.” Ele se vira novamente,
empurra os dedos das duas mãos nos cabelos. “Esta é sua vida.”
“Eu sei. Mas por que não? Ele nunca me deu um motivo
para não confiar nele.”
“Oh. Sério?” Billy se vira me dando seu perfil. Sem olhar
para mim, claramente ainda muito chateado, parece estar
fazendo o possível para manter a voz firme. “Ben nunca lhe deu
um motivo para não confiar nele? Que tal entrar no seu quarto
no seu décimo oitavo aniversário e...”
Recuo, um calafrio passa sobre meus ombros. Suas
palavras parecem um tapa. Cruzo os braços sobre minha
barriga, viro e olho para a outra parede, preciso limpar a
garganta antes de dizer: “Sabe, talvez devêssemos ficar quietos
e esperar.”
Ouço seus passos se aproximarem. “Sinto muito. Eu sinto
muito. Sei que não devo trazer isso à tona. Mas, Scarlet, o que
ele fez não foi certo. Nunca perguntou. Apenas pegou o que
queria sem...”
“Por favor, pare.” Eu me aperto mais forte.
Billy exala um suspiro angustiado. “Querida, talvez você
nunca disse não, mas ele nunca perguntou. Por que não o odeia?
Deveria odiá-lo, não a você. Enganou você para se casar com ele
aos quinze anos.” A maneira como Billy diz isso me causa
arrepios na espinha, como se fui arrancada dele, e chorou por
mim, pela criança que fui.
“Já expliquei por que casei com ele aos quinze anos, você
simplesmente não quer...”
“Sim. Na verdade, sim. OK. Isso faz sentido para mim
agora.”
Minha cabeça vira e olho para ele. Impaciente. O QUE? “Faz
sentido.”
“Sim.” Ele concorda, não parece mais zangado, apenas
inquieto. “Quando pensei sobre isso depois, quando me acalmei,
entendi. Casar-se para mudar seu nome, para ser emancipada,
faz todo o sentido. Mas o que nunca fez sentido para mim é que
ficou casada com ele, quando obviamente não estava
apaixonada por ele e te tratava como lixo.” Billy ergue as mãos,
como se tivesse 100% de certeza de que sei o que pensa. “Sei que
odeia quando digo isso, mas é a verdade.”
“Bem, ele...” luto para encontrar as palavras certas. “Tinha
dezenove anos, ok? Devia tudo à família dele.”
Billy aperta a mandíbula e olha para mim silenciosamente.
Resmungo, coço o pedaço quente e espinhoso na parte de
trás do meu pescoço, olho por cima do ombro de Billy para as
portas do elevador. “Tinha dezenove anos e... e Ben foi egoísta.”
Um momento se passa. E depois outro. A palavra egoísta
parece ricochetear nas paredes e entre nós. Agora respiro
engraçado de novo, superficial, mas não porque estou presa em
uma sala com Billy Winston. É porque finalmente falei uma
situação que tem há anos, mas me sentia uma traidora toda vez
que pensava nisso.
“O quê?” O tom de Billy demonstra a tremenda natureza de
sua incredulidade. “O que acabou de dizer?”
“Ben era egoísta,” repito, achando mais fácil dizer a
segunda vez. “E mimado. E arrogante.”
“O quê?” Ele dá um passo para trás, quando minhas
palavras o atingem. “O que você... o quê?”
“Tenho feito uma autorreflexão.” Agito minhas mãos pelo
ar em círculos selvagens, me sinto estranhamente perseguida,
minha voz mais alta do que pretendia. “Estou trabalhando em
algumas coisas, ok? Tento ser uma versão mais saudável de
mim.”
“Você... você... autorreflexão?” Ele parece tão confuso.
“Estou fazendo terapia, se quer saber toda a verdade.”
Percebo que bato os braços como um pássaro e coloco as mãos
no quadril. “E é isso que ia dizer outro dia antes de me dizer para
'manter distância'.” Como me sinto desconfortável e exposta e,
portanto, maliciosa, uso aspas.
Ele recua, pisca para mim como se eu fosse algo novo. Mas
ainda parece estar sem palavras.
“Entendo agora,” acrescento em tom de conversa, “que, na
infância, a minha não foi boa. Minha base para constituir um
relacionamento saudável foi distorcida.”
“Está vendo isso agora?” Billy deixa escapar, parece
engasgar com uma risada atordoada, balança a cabeça e ainda
olha para mim como se eu fosse algo novo, e talvez algo
maravilhoso.
“Não. Quero dizer, sempre soube.” Respondo, minhas
bochechas esquentam de vergonha, e me pego rindo também
desde que o riso dele soa do tipo amigável. “Cale a boca.” Reviro
os olhos. “Quando é seu, é o seu normal. Minha infância foi
minha normalidade. E fiquei muito agradecida a Ben e sua
família por me salvarem disso, e o fizeram. Tenho que dar crédito
onde é devido. Dormir dentro de casa, em uma cama, sem medo.
Saber todos os dias teria comida, roupas limpas, calor, abrigo.
Fizeram isso, me salvaram do meu pai. E Ben não me induziu a
casar com ele aos quinze.”
A testa de Billy franze e abre a boca, provavelmente para
dizer algo desagradável sobre. Bem, então acrescento: “NO
ENTANTO! Não deveria me sentir tão grata a ele quando achei
que não tinha escolha a não ser casar com ele mais tarde, ou
dormir com ele quando quisesse. E foi assim que me senti. Senti
que devia a ele, que a felicidade dele importava mais do que a
minha, que talvez pudesse amá-lo como queria, se apenas
tentasse o suficiente e desse mais. Eu me convenci de que tinha
problemas e era equivocada, e se pudesse amá-lo, estaria inteira.
Foi teimoso e estúpido da minha parte, mas tenho que me
perdoar por isso. E tenho que me perdoar por nunca amá-lo do
jeito que ele queria. Assim...” Endireito-me em toda a minha
altura, olho para todos os lugares, menos para Billy.
“Ai está.”
Depois de um longo momento, durante o qual sinto que
seus olhos continuam me examinando e tento entender as
palavras que acabo de dizer, em vez de esconder meu rosto, ele
pergunta: “Isso é o que me diria na semana passada? Quando
interrompi e lhe disse para manter distância?”
“Sim.” Respondo e dou uma espiada rápida nele enquanto
minha boca se curva em um sorriso parcialmente triste,
parcialmente envergonhado. “Mas entendo. Sim. Nós estamos
nesse carrossel há muito tempo, você e eu. E entendo seu desejo
de sair. De fato, encorajo isso. Deveria ter saído da minha bunda
patética e problemática há muito, muito tempo.” Sorrio.
Ele não diz nada.
Novamente, outro longo momento se passa e, com isso, o
ar da conversa aberta muda, torna-se outra coisa. Algo menos
simples. Algo carregado.
“Scarlet,” diz, meu nome mais respiração do que voz. “O
que está dizendo? Quer que eu siga em frente?”
“Estou dizendo...” Cruzo meus braços e fixo meu olhar no
chão, mas decido falar alto e claro. “Estou dizendo que queria
ver se há uma maneira de poder, se poderíamos nos conhecer
novamente. Depois do Natal, você foi tão amável comigo, e fiquei
tão triste que me cansei de me odiar. Senti-me terrível o tempo
todo. Eu me tornei insensível a isso, é um hábito. Então,
procurei aconselhamento profissional.”
“Terapia.”
“Sim. Terapia. E meu terapeuta está me ajudando a ver que
não havia nada que pudesse fazer sobre o fato de não amar Ben
como ele queria. Era jovem, vulnerável, e não estou desculpando
o que você e eu fizemos, não estou. Encontrar você em segredo
pelas costas dele, nunca deveria fazer isso. Fui eu quem se
casou. Mas não tinha um roteiro e fiz o melhor que podia. E me
culpar pelo resto da vida por algo que fiz, pelas decisões que
tomei quando fugia do meu pai abusivo, pelas decisões tomadas
com medo, bem, não vou mais fazer isso.”
Como antes, minhas palavras parecem ricochetear nas
paredes e entre nós, mas desta vez sinto meu pescoço e minhas
bochechas ficarem vermelhas e quentes. Revelo mais do que
pretendia e agora não me sinto nada segura.
Preciso dizer algo, já que ele não diz nada, e instinto e
autopreservação me fazem recuar. “Mas, se seguiu em frente,
então, meu Deus, continue andando. Você merece tanta
felicidade. Sempre mereceu muito mais do que eu. Ainda estou
tentando descobrir as coisas por mim, ainda estou uma
bagunça, então provavelmente é melhor apenas nos atermos ao
seu plano original de... de...”
Ele se mexe. Olho para cima, tensa com seu olhar severo e
determinado. Não confio em mim para recuar sem dar um passo
errado da prancha, fico quieta e espero que ele venha. Meu
cérebro incapaz de desvendar suas intenções, seus dedos longos
e palmas grossas deslizam contra minhas bochechas, seus
polegares levantam meu queixo e sua boca baixa a poucos
centímetros da minha.
Seus olhos mantem os meus reféns. “Quero dizer isso com
todo o meu coração,” ele diz, as palavras graves e fortes.
E depois me beija.
CAPÍTULO 11

BILLY

Seus olhos se fecham e seu corpo relaxa imediatamente,


pressiona para frente, procura o meu, rendendo-se.
Eu lembro disso. Perseguindo moinhos de vento.
Sempre foi assim com Scarlet, tão fácil. Como se meu toque
apagasse a tensão em seu corpo e ela não conseguisse segurar
tanto o medo quanto eu. A tentação sempre existiu: beijá-la,
deixá-la irracional e depois fazê-la minha. Mas depois ela não
era verdadeiramente minha, não de uma maneira real e
duradoura.
Scarlet agarra minha camisa ao meu lado e puxa, seus lábios
se separam, acolhem, convidam. Luto contra o desejo de devorar
e exigir, sabendo que precisa da minha gentileza, não da minha
ganância. Beijos lentos e profundos pontuados por seus gemidos
suaves e respiração difícil.
Onde ela toca, eu toco. Essa foi minha promessa há muitos
anos e a quebrei apenas uma vez. Por mais que meu corpo grite
e implore para me mover mais rápido, pegar mais, deslizar
minhas mãos pelas curvas dela, soltar suas roupas e tocar sua
pele nua como desejo, não cometerei esse erro novamente.
Definitivamente não agora.
Ela abriu uma janela. Venha inferno ou água alta ou fome ou
o fim dos dias, estou subindo por essa maldita janela. Mas me
moverei devagar. Não darei a ela nenhum motivo para fechá-la,
nunca mais. Juro por Deus que serei um santo.
É por isso que, depois de mais um deslize saboroso da minha
língua e mordida de seu lábio, pressiono minha testa na dela e
dobro meu queixo no peito, tento esfriar minha mente e a
urgência crescente em meu corpo. Minhas mãos não se movem
do rosto dela. Estou tocando nela, ela me toca, me quer, eu a
quero, e isso é o suficiente. Agora.
Ficamos assim, próximos, com as mãos um no outro, por um
tempo. Tenho a sensação de que tem medo de se mexer ou falar,
e sei como se sente. Mas quero que ela saiba que isso é real e,
se Deus quiser, apenas o começo.
Levanto minha cabeça, empurro meus dedos em seus
cabelos, incentivando-a a me olhar. Ela olha. Nebuloso e
confiante, esperançoso, viaja sobre minhas feições.
Inclinado a deixo olhar, pressiono a palma da mão aberta
contra o meu coração e mantenho minha voz baixa enquanto
digo: “Scarlet.”
Ding!
Ela fica tensa. Um segundo depois, o som inconfundível
daquelas portas do elevador se abrindo rasga essa nova e bela
realidade que acabamos de criar, e murmuro um palavrão.
Mas antes que pudesse nos separar completamente, ela
agarra a frente da minha camisa e me puxa para a frente,
roubando mais um beijo no momento em que meu irmão Duane
diz: “Oh, uh. Droga. Nós podemos sair.”
Inclinando, seu lindo olhar fixa no meu, um pouco tonto, um
pouco desesperado, e ela sorri. “Não. Está tudo bem. Nós
estávamos apenas, hum, apenas...”
“Estavam se beijando,” Cletus anuncia, e fecho meus olhos
por alguns segundos, querendo estrangulá-lo. “Isso é o que estão
fazendo. Temos globos oculares e cérebros e ambos funcionam
muito bem.”
Scarlet revira os lábios entre os dentes e cobre o rosto com as
mãos. Incapaz de manter o instinto, eu a seguro em meus
braços, querendo que enfie a cabeça debaixo do meu queixo e
contra o meu peito. Uma satisfação crescente retumba através
de mim quando ela aceita meu abraço, uma sensação de retidão
ardente.
“Vocês podem nos dar outro minuto?" Viro minha cabeça em
perfil.
“Na verdade, não podemos. Eles abriram o museu para
passeios normais.” Duane parece verdadeiramente arrependido.
“E temos ingressos para o Uffizi em seguida. Expiram se não
chegarmos lá a tempo.”
Passo meus dedos pela seda fina de seus cabelos cobre.
“Tudo bem. Vão. Iremos logo depois, assumindo que o botão
funcione desta vez.”
“Entendido. Vamos, Duane.” Ouço o barulho de passos, outro
toque, e aperto meus braços em volta dela, colocando um beijo
no topo de sua cabeça. Então Cletus acrescenta: “Só para
constar, sou o responsável por isso,” logo antes das portas se
fecharem.
Os ombros de Scarlet tremem, está rindo, e o som alivia uma
parte inquieta de mim, ansioso por um sinal de sua felicidade.
Levo alguns segundos para perceber que estou rindo
também.
“Agora ele nunca vai parar.” Suas palavras são abafadas.
“Não. Acho que não vai parar.” Não posso deixar de pensar,
que bom. Nem sempre quis ou apreciei a ajuda do meu irmão,
mas, neste caso, foi boa. Obviamente, precisávamos de toda a
ajuda possível. “Mas vou falar com ele, ver se consigo fazê-lo
relaxar um pouco.”
“Então.” Seus braços vêm ao redor do meu peito e ela inclina
a cabeça para trás, o olhar arregalado, ainda parece
esperançoso, mas com uma pitada pesada de incerteza. “O que
acontece agora?"
“Agora...” Pego um momento para memorizá-la assim, apenas
por precaução, e tenho que me impedir de dizer: Agora,
compromisso irrevogável. Garantias. Legal. Contratos.
Casamento. Hoje. Neste minuto.
Lembrando-me de ser um santo, com paciência e intenções,
engulo as exigências e digo: “Agora fazemos as coisas certas.” E
mesmo que exija sufocar todos os instintos e desejos dentro de
mim, acrescento: “Levamos as coisas devagar.”

***

“Isso é estupido.”
Com considerável relutância, desvio os olhos das costas de
Scarlet e olho para Cletus. “Não force.”
“É claro que vou forçá-lo.” Ele enfia as mãos nos bolsos, o
rosto severo. “Vocês estão se movendo no ritmo de um caracol.”
“Pelo menos estamos nos movendo.”
Ele resmunga. Então grunhe novamente. “Se observar os
eventos de hoje, a única vez em que fez algum progresso foi
quando intervimos e forçamos o problema. Se não insistirmos,
ainda está tentando apenas coexistir com a mulher. "
“Coexistir é um bom primeiro passo.” Olho para frente
novamente, minha atenção se move sobre ela. Andando de
braços dados com Shelly, seu passo leve, Scarlet não parou de
sorrir o dia todo.
Ela sorriu enquanto caminhávamos para o Uffizi. Sorriu
enquanto vagávamos pelo grande museu, apontando coisas que
achava maravilhosas, me perguntando o que pensava. Sorriu
quando, irracional por um momento e dominado pelo brilho de
seu espírito e olhos sorridentes, peguei sua mão e beijei as
costas dela. Também corou.
Então sorriu durante todo o almoço, ajudou Ashley e Drew
com Bethany, entreteve a pequena senhorita enquanto pediam
e usavam o banheiro. Agora estamos voltando para a estação de
trem e ainda sorri. Para mim, é o verdadeiro progresso. Uma
Scarlet feliz e despreocupada é o objetivo final, e farei o que for
necessário para mantê-la feliz.
“Não quero que vocês coexistam. Quero que co-ha-bi-tem.”
Cletus aperta os dedos como se para ilustrar seu significado,
ganhando um olhar rápido de mim. E então, como se seu único
objetivo na vida fosse fazer meu sangue ferver, faz um círculo
com o polegar e o indicador. Paro o outro dedo indicador antes
que ele possa completar o gesto lascivo da mão.
“Cletus. Pare.”
Ele deixa cair as mãos. “Se fosse eu, tentaria carregar o
homem das cavernas novamente. Há um tempo para render e
outro para cobrar, e esse é definitivamente o último. Você
deveria ver como ela olha para você, como se fosse uma das
minhas salsichas.”
“Agradeço seus esforços, Cletus. Mas agora precisa nos
deixar descobrir isso por conta própria.” Não é nada simples.
Talvez avançamos um para o outro, mas ainda existe um
universo inteiro de razões para prosseguir com cautela, entre
elas a investigação do FBI que me espera no Tennessee.
Não acho que tenham o suficiente para me acusar. Se ficar
quieto, não terão nenhum caso, a palavra deles contra o meu
silêncio. E, no entanto, não decidi se ficarei em silêncio ou não,
mesmo que isso signifique desistir da corrida no Senado e tudo
mais. Parte de mim quer confessar.
Mas se Scarlet nos der outra chance... não. Não tomarei minha
decisão como responsabilidade dela.
Cletus dá um breve suspiro. “Não.”
“Não?"
“Não. Nein. Negativo. Nada. Niet. Nee. Voch.”
Faço uma careta, principalmente porque meu quadril doí.
Andei muito hoje.
“Você não pode ser objetivo sobre isso, Billy. Estou lhe
dizendo, jogue essa mulher por cima do seu ombro e tranque-se
em uma daquelas suítes gigantes no andar de cima, ela ficará
emocionada. Por que acha que colocamos vocês naquele andar
juntos? Não acha que eu queria um daqueles quartos grandes e
agradáveis para mim e Jenn?”
“Por que acha que tem uma opinião a dizer sobre isso, não
entendo.”
“Por que acha que não precisa da minha ajuda, não entendo.
Por exemplo...” ele puxa a manga da minha camisa, me fazendo
parar “quando vai dizer a verdade a ela?”
Já paramos, mas a pergunta dele parece entrar em uma
parede. Silenciosamente, nos olhamos, o resto da nossa família
continua no quarteirão, e trabalho para limpar toda a pitada de
medo das minhas feições, substituindo-a por indiferença.
Seus olhos procuram os meus. “Estou falando sobre você
sofrer o castigo dela quando fugiu aos catorze anos e sobre o que
aconteceu com Razor...”
“Eu sei o que quis dizer.” Meu pulso acelera.
Se Scarlet descobrir, essa janela se fechará e serei o único a
fechá-la. Ela pensa que Ben a salvou. Durante anos, construiu
um santuário para ele com tijolos feitos de gratidão, obrigação e
culpa. Mas agora finalmente desistiu e está encontrando seu
próprio caminho. Bom. Ótimo.
Não quero santuários. Só a quero, sem culpa, me querendo.
“Bem?” Ele força, seu olhar procurando. “Quando?”
“Não é da sua conta.”
Seus olhos se estreitam, sua boca uma linha plana. “Não vai
contar a ela, vai? Nunca vai contar a ela.”
Eu me afasto dele, luto para manter o mancar da minha
marcha. “Ela não precisa saber.”
“Billy. Deus sabe que te amo ferozmente. Mas você é tão sábio
quanto burro, e é por isso que precisa da nossa ajuda.”
“Não quero sua ajuda.”
“Bem, que pena. Ela precisa saber quem foi seu verdadeiro
salvador. É como...”
“Escute.” Paro e coloco minha mão em seu peito para detê-lo.
“Apenas me escute. A última coisa que preciso ou quero é que
ela sinta um senso de dever para comigo. Nunca fui seu
salvador, e Ben também não. Fiz o que fiz porque a amava. Eu
a amo. Ela não me deve nada, mas nunca verá dessa maneira,
não é assim que funciona. Tudo para ela é comércio, tudo é uma
dívida a ser paga. Se se sentir endividada, não posso confiar nela
para tomar decisões claras com base no que realmente deseja.
Esta verdade não a libertará. Consegue entender isso?”
Cletus desliza a mandíbula para um lado e olha para mim.
“Tudo o que ouvi foi: Blá, blá, blá, não confio nela. Você disse
mais alguma coisa?”
“Tudo bem,” falo. “Bem. Você disse a Duane, Beau e Ashley.
Preciso saber, para quem mais contou?”
Observando-me com olhos de falcão, Cletus enfia as mãos
nos bolsos, sem dizer nada. Pela primeira vez.
“Cletus. A quem você contou?”
“Bem, pense assim, Billy. Sua bagagem deve ficar muito mais
leve agora que seus encargos estão espalhados por tantas
pessoas.”
A frustração bate como um tambor entre meus ouvidos e me
afasto dele. “Se você ou qualquer outra pessoa disser a ela, isso
não é algo que poderei perdoar.”
Meu irmão fica muito quieto. “Guardando rancores, Billy?
Porque isso funciona muito bem para você.”
“Como o rei reinante do rancor no leste do Tennessee, espero
que entenda.”
“Não, não entendo. E se o julgamento de alguém não pode ser
confiável nisso, é o seu. Você é a pessoa mais honrada e firme
que conheço. Eu te admiro, sempre admirei. Todos nós
admiramos. É destemido, corajoso, altruísta. É o melhor de nós,
exceto…” Ele faz uma pausa, e é um daqueles raros momentos
em que seu olhar está firme, aberto e claro de toda a pretensão.
“Exceto quando se trata de Scarlet. Você se esquece, se perde.”
Ele não entende como é. Não consegue. Não enfaixou os
cortes dela depois que o pai a cortou. Não a ouviu cantar. Não
esteve deitado naquele quarto de hospital. Não foi forçado a
assistir a mulher que amava se casar com outra pessoa, alguém
que a tratava como lixo. E então, ficou de luto pelo bastardo.
E mesmo agora, o pensamento é uma tortura, vê-la com dor,
seu espírito esmagado, odiando-se quando é tudo de bom, gentil
e merecedora. Fui incapaz de fazer qualquer coisa por muito
tempo; não apostava nessa chance de agora.
“Entendo, entendo, sinto o desespero, a sensação de
impotência. E se ela não perdoar você? Acabou de se reconectar,
não quer perder isso. Mas estou lhe dizendo, ela vai perdoar. Vai
te perdoar.”
“Não é sobre isso.” Ele não ouve. Não entende.
“Como concessão do seu excelente progresso hoje, darei a
você o presente do tempo. Beije-a no trem na frente de Deus e
testemunhas, e darei uma semana inteira. Prometo. Mas precisa
contar a verdade antes que ela vá para Nashville ou para Roma.”
“Estou falando sério, Cletus. Não estou de brincadeira.” Falo
entre dentes. “Juro, você sopra uma palavra e nunca vou te
perdoar.”
Algo brilha atrás de seu olhar, algo desagradável, zangado, e
ele abaixa a voz. “Sabe quem você parece, Billy? Parece Darrell.”
O golpe bate e meu estômago aperta, uma lenta descida aos
meus pés, mesmo quando levanto meu queixo e luto para
ignorar seu soco e emitir meu último aviso. “Não fale.”
Cletus me examina como se mexesse no meu cérebro. Uma
pitada de simpatia fratura a severidade de sua carranca e sua
voz implora: “Escute. Já passei por isso. E estou lhe dizendo, se
não confia, não tem nada.” O olhar dele dispara por cima do meu
ombro e depois volta para mim. Aproximando-se, ele diz
rapidamente: “Confie nela. E, ao fazer isso, dê a ela uma chance
de confiar nela.”
“Está tudo bem?” A voz gentil de Jenn interrompe. “Billy, você
está com dor? É o seu quadril? Precisa de ajuda?”
“Estou bem,” digo.
“É o quadril dele. Precisa de ajuda,” Cletus diz.
Cletus e eu falamos ao mesmo tempo e minhas palavras
rendem um sorriso achatado de meu irmão. Viro, preparando-
me para agradecer a Jenn por sua preocupação e garantir que
estou perfeitamente bem quando vejo Scarlet pairar por perto,
uma ruga de preocupação entre as sobrancelhas.
A próxima coisa que vejo é ela dar a volta em Jenn e caminhar
até mim, deslizar o braço em volta das minhas costas e guiar
meu braço em volta dos ombros.
“Aqui, amor. Apoie em mim. Vamos andar juntos.”
Bem.
Meu sangue bombeia espesso por minhas veias com seu
toque inesperado, o peso no peito cai mais baixo e se torna algo
completamente diferente.
“Ok,” concordo automaticamente. Ignoro o sorriso irônico do
meu irmão, concentro-me na visão implausível e inebriante de
Scarlet com meu braço em volta dos ombros dela. Em público.
Na frente da minha família. De propósito. Como se
pertencêssemos um ao outro.
“Vamos pegar seus ingressos. Tome todo o tempo que
precisar.” Jenn sorri para nós dois, as mãos entrelaçadas sob o
pescoço.
“Sim, leve todo o tempo do mundo.” Cletus coloca os dedos
de Jenn em seu cotovelo. “E se precisarem de um tópico de
discussão, ficarei feliz em fornecer vários.” Com mais um olhar
significativo, ele se vira para a estação e seguem em frente.
Nem a ameaça velada de Cletus pode perfurar meu humor
neste momento.
“Vamos?” Scarlet sorri para mim, entrelaçando os dedos em
seu ombro.
Concordo, sem vontade de falar. Agora que ela está ao meu
lado, não quero dizer ou fazer nada que possa fazê-la fugir.
Quero que ela fique. Então não digo nada.

***

Aguardo pela manhã como uma criança aguarda o Natal, a


criança mal-humorada que não consegue dormir por dias e sabe
que seus presentes dormem no corredor envoltos em pijama cor-
de-rosa.
O problema é que, mesmo depois de jogar e virar a noite,
todas as cinco seguidas, não tenho certeza de que mereço
presentes este ano. As palavras de Cletus em Florença pesam
sobre mim. Não consigo decidir se ele está certo ou errado. Além
disso, não consigo decidir se isso importa.
Arrasto-me para fora da cama com o primeiro sinal do
amanhecer, verifico a hora no Tennessee, precisando de algo
para tirar minha cabeça desse limbo. Meu irmão mais novo está
com Daisy e Trevor Payton desde que recebeu alta do hospital;
Eu me pergunto se ele ainda está acordado. Mantemos contato
todos os dias desde que cheguei à Itália, geralmente apenas uma
rápida troca de mensagens.
Sinto falta dele. Estava acostumado a vê-lo todo fim de
semana, tê-lo por perto. Ele é meu amigo e me preocupo com
ele, especialmente agora.
Desbloqueio minha tela, envio uma mensagem rápida
perguntando se está acordado e depois uso o banheiro. Pego
meu reflexo na saída, lembro-me de fazer algo sobre minha
barba negligenciada.
Meu telefone toca quando pego minha mala procurando
roupas limpas e coloco uma pilha ao lado que precisa ser lavada.
Atravesso para onde deixei meu telefone carregando na cômoda,
digitalizo a nova mensagem.
Roscoe: Estou acordado. E antes que diga alguma coisa
sobre estar acordado tão tarde, dormi o dia todo.
Meus lábios se curvam com isso. Quase posso ouvir as
palavras saírem de sua boca, vê-lo revirar os olhos com o que
acha que sou eu reclamando da Europa.
Billy: Não ia dizer nada sobre estar acordado. Queria ver
se tem tempo/energia para conversar.
Aperto enviar e levo o telefone comigo, voltando para minha
mala. Acabo de pegar um short limpo quando meu celular toca
novamente. Olho para a tela, vejo Roscoe ligando.
“Billy. E aí.”
“Roscoe.” O nó no meu estômago diminui e exalo uma boa
dose da preocupação que carrego entre nossas ligações. Ele
parece melhor. Mais forte.
“Como está a Itália?”
Debato como responder. Cinco dias atrás, depois que o trem
chegou de Florença e um jantar rápido em casa, me retirei,
planejando usar o tempo para acompanhar os e-mails. Em vez
disso, não fiz quase nada, olhando sem ver todos os e-mails não
lidos na minha caixa de entrada e debatendo se, ou quando,
contar a verdade a Scarlet.
Os dias desde então são mais do mesmo. Cada hora passada
em sua companhia é ao mesmo tempo divina e frustrante. Ela
fala e eu falo muito pouco, mantendo minhas mãos para mim.
Em vez de arruinar nossa trégua, inadvertidamente, dizendo
algo estúpido ou jogando-a por cima do ombro, como sugeriu
Cletus, estou contente em ouvir sua conversa melódica e apenas
estar perto dela.
Porque, se eu a tocar, tenho certeza de que ela acabará por
cima do meu ombro.
“Billy? Ainda está aí?”
“Uh, sim. Estou aqui.” Jogo o short de volta na mala.
“Como está a Itália?” Pergunta novamente.
“Nada a reclamar.”
“Bebendo minha parte de vinho, espero.”
Olho para trás, procurando um lugar para me sentar. “Oh
não. Como estão as coisas aí? Fez seu último exame?”
“Fiz ontem. Tudo está se recuperando bem e os médicos
dizem que posso começar a me exercitar novamente no próximo
mês.”
“Não exagere.”
“Não se preocupe, pai. Não vou.” Ele sorri enquanto diz isso,
sua voz cheia de carinho, então deixo seu comentário pai passar.
“E como está Simone?” Pergunto, passando os dedos pelos
cabelos. “Como está a recuperação dela?”
“Ela está ótima. Já está liberada para exercícios moderados e
voltará ao trabalho em breve.” Roscoe dá um suspiro. Se tivesse
que nomear, chamaria de melancólico. “Gostaria que ela não
tivesse que ir. Estou me sentindo um pouco mimado agora,
vendo-a todos os dias, tendo-a no final do corredor.”
Sorrio com isso. "Mimado?”
“OK. Mimado e atormentado. Melhor?” Ele sorri e eu também.
Decido não me sentar, vou até a porta de vidro deslizante.
“Sim, isso parece mais preciso. Fico feliz que esteja com os
Payton. Eles impedirão que se esforce demais.”
“Em mais uma maneira,” ele resmunga, e isso também me
faz sorrir. Ele parece muito melhor do que na semana passada,
mais parecido com ele. “E você?” Roscoe pergunta, e ouço uma
porta se fechar do lado dele.
“Como eu disse, nada a reclamar. Quando você vai...”
“Nuh-uh, Billy. Como está? Quero saber. O que tem feito? O
que está em sua cabeça?”
Apoio a mão no batente da porta e espio a paisagem toscana.
“Bem vamos ver. Lido com uma pessoa irritante de
desenvolvimento de campanhas que continua me irritando com
a minha imagem.”
“Sua imagem? O que há de errado com sua imagem?
Parecemos exatamente iguais, exceto que tem esses cabelos
grisalhos.”
“Não, Roscoe.” Ele nunca perde a chance de apontar meus
cabelos grisalhos. Acho que tem orgulhoso deles porque é 50%
da razão pela qual eles existem. “Não como eu pareço. O homem
está perto de um ataque desde que cancelei o noivado com
Daniella, continua me lembrando que os candidatos sem
cônjuges não são eleitos.”
“Bem, fico feliz que você e Dani cancelaram o noivado. E para
constar, os Payton também. Na verdade, acho que ficaram
aliviados quando ela contou a eles.”
Isso me dá uma pausa. “É mesmo?”
“Oh não, não desse jeito,” ele é rápido em acrescentar.
“Adoram você, mas vocês claramente não eram adequados para
o casamento. Não queriam que nenhum de vocês se contentasse
com a conveniência. Enfim, como está seu quadril?”
“Melhor.”
“Incomodou você na semana passada? Depois que foi a
Florença?”
“Sim. Estive descansando de novo, mas preciso sair e fazer
alguma coisa. Não estou acostumado a ficar parado por tanto
tempo.”
“Te entendo. Já conseguiu fazer mais passeios turísticos? Vai
a Roma? Sei que sempre quis ir.”
“Foi por isso que me fez vir nessa viagem? Para que eu
pudesse ir a Roma?”
Ele faz um som de escárnio. “Ninguém te faz fazer nada. Não
fiz você ir, apenas insisti que me deixasse em paz e parasse de
me enlouquecer, querendo matá-lo com todo o seu cuidado. Não
tenho mais oito anos.”
Mordo o interior do meu lábio, combatendo uma estranha
sensação de tristeza. Ele está certo. Não é criança. Mas eu o vi
crescer. Levei-o para o primeiro dia do jardim de infância, fiz
todos os almoços até a quinta série. Ajudei-o em seus projetos
escolares e ensinei-o a dirigir. Era seu líder de escoteiros e
treinador de futebol. É difícil parar de procurar vislumbres do
garoto que precisava de mim no adulto auto-suficiente que se
tornou.
“Estou feliz que esteja aí, Billy,” diz, sua voz me dizendo que
é sincero. “Você precisava ir. Como já venho dizendo há algum
tempo, estamos todos bem. É hora de cuidar de si, cuidar de
seus próprios desejos. Divirta-se.”
“Não tive muita escolha em vir, visto que você foi até Dolly
Payton e pediu que me desse uma licença da usina.”
“Ainda está chateado com isso?” Ele parece sorrir. “Se isso te
incomoda tanto, talvez afogue suas frustrações em um pouco de
vinho italiano e naquela ruiva linda no corredor.”
Minha coluna fica rígida, minha boca se abre enquanto a
compreensão me atinge como um soco na têmpora. “Você...”
“Ouvi dizer que tem uma piscina aí. Quer esticar seu quadril?
Existem alguns exercícios para duas pessoas que são adequados
para um ambiente de gravidade reduzida.”
“Seu merdinha. Também está nisso?”
Roscoe sorri. Ele e eu.
“Não posso acreditar em Cletus.” Afasto-me da janela,
inquieto, zangado e ainda relutantemente divertido.
“Não culpe Cletus. Ele pode ter montado o TNT, mas o resto
de nós está mais do que feliz em revezar-se na iluminação da
partida.”
“O que vocês fizeram? Uma reunião de família sem mim? Têm
um bate-papo em grupo no Google Drive e no Hangouts onde
discutem planos e progresso?”
“Talvez tenhamos, talvez não.” Oh cara. Roscoe parece
encantado. Isso não pode ser bom.
“Inacreditável.” E tão incrivelmente frustrante.
“Deixe-me perguntar uma coisa: estaria aí se eu não
insistisse em você ir?” Quando não digo nada, ele continua: “E
se não combinassem que vocês ficassem presos naquela sala do
porão em Florença, estariam se falando agora?”
Olho para os objetos no meu quarto, mesmo sabendo que ele
está certo, balanço a cabeça. “Você não pode forçar duas pessoas
a se beijar e fazer as pazes, não quando há anos de história e
mágoa entre elas. Nada entre Scar, entre Claire e eu, é simples.”
Ele bufa. “Você a ama?”
Fecho os olhos e esfrego minha testa. Estou com dor de
cabeça.
“Billy. Você a ama?”
“Sim.”
“Ela ama você?”
Um balão formado por incerteza e frustração infla em meus
pulmões, pressiona para fora até minha caixa torácica parecer
muito apertada, meu fluxo de ar obstruído. Ando para longe da
janela. Ando de volta.
O que ela disse na semana passada quando estávamos
presos? Ainda estou tentando descobrir as coisas por mim.
Demorou anos para Scarlet chegar a esse ponto, e passei
cada um desses anos aprendendo a me contentar com menos e
menos: um olhar, uma palavra, compartilhar a mesma cidade e,
finalmente, compartilhar o mesmo estado. Não quero forçá-la,
assustá-la. Não quero lhe dar um motivo para ir embora e não
falar comigo. Também não quero que a intromissão bem-
intencionada da minha família a assuste.
“Billy. Ela...”
“Não sei,” admito, subitamente me sinto como se pudesse
dormir cem anos. “Não sei se ela me ama, Roscoe.” E essa é a
verdade.
CAPÍTULO 12

BILLY

Surpreendentemente, eu durmo. Depois de desligar com meu


irmãozinho, desmaiei e dormi até o meio-dia. Acordei com uma
enorme dor de cabeça de cafeína, mas no geral me sinto melhor.
Rapidamente me troco e escovo os dentes novamente, desço as
escadas, ansioso e com medo da visão de Scarlet em igual
medida.
Não é apenas indecisão que me mantem acordado à noite.
Embora não a toquei a semana toda, ela me toca bastante:
roça contra mim enquanto passa em um espaço apertado; coloca
a mão no meu ombro enquanto está atrás da minha cadeira e se
inclina no meu ouvido para fazer uma pergunta; me alimenta
com o que cozinha, seja biscoitos, sopa ou pão com manteiga
derretida. O pior/melhor é quando ela dá um passo à frente para
enfiar os dedos na minha barba e me provocar sobre o quão
desleixada está.
Ela até se ofereceu para cortá-la. Não é uma boa ideia.
Luto com a fera chamada antecipação, procuro nos espaços
compartilhados no andar principal por ela. Como está vazio,
desço as escadas para o porão e vou direto para a cozinha, seu
lugar favorito.
Ela também não está lá, mas Jethro sim. De pé na grande
mesa, ele parece arrumar a roupa e olha para cima quando
entro.
“Ei,” diz, distraído. “Claire foi te ver mais cedo, disse que
estava dormindo. Está se sentindo bem?”
Concordo, olho pelos corredores e entro na sala de jantar.
“Onde está todo mundo?”
“Saíram.”
“Saíram.”
“Isso.” Jethro pega uma minúscula camiseta com um
dinossauro e a dobra em um pequeno quadrado. “Nadando,
piqueniques e coisas assim.”
“Onde estão nadando?”
“Aqui.”
“Aqui?” Coloco minha mão nos quadris. “Este lugar tem uma
piscina?” Pensei que Roscoe estava brincando.
“Com certeza. É onde a maioria está agora. Por que acha que
fica tão quieto em casa durante o dia? Os meninos ficam na
piscina com Maya desde o amanhecer até o anoitecer,
desmaiando como marinheiros bêbados todas as noites.”
Convencido que Scarlet não está na casa, procuro no balcão
a máquina de café. “Onde fica a piscina?”
“No topo da colina,” diz em tom de conversa, pegando outra
peça de roupa em tamanho miniatura. “E além disso, há um
pedaço de terra que usamos para jogar futebol e um playground
para as crianças. Este lugar é ótimo.”
“Sim. É mesmo. Sobrou café?”
Jethro aponta para um armário atrás de mim. “Está ali, atrás
da portinha de madeira. E não se preocupe. Não foi feito por
Cletus. Jogamos o pote fora depois que ele saiu e escondemos
as coisas boas lá atrás.”
Compartilho um olhar de lamentação com meu irmão, abro o
armário, onde tenho quase certeza de que as canecas são
guardadas. Com certeza, atrás de uma pequena porta de
madeira há um balcão, e no balcão uma cafeteira com meio bule
de café quente.
“Ei, então, a propósito…” Jethro começa.
Sirvo uma xícara e olho para ele. “O que?”
“Queria te perguntar. Como estão as coisas com Dani?”
Jethro tem o mesmo olhar aguçado em seus olhos de uma
semana atrás, quando me disse que Scarlet era quem cozinhava
toda a minha comida. “Nós a vimos algumas semanas atrás; está
bonita.”
Fecho a porta do armário e digo: “Nós terminamos.”
“Eu sinto muito.”
“Não sinta.” Olho para meu irmão por cima da borda da
minha xícara de café e tomo meu primeiro gole. Dado o fato de
que Roscoe, que se recupera de uma facada quase fatal, se
amarrou à conspiração de Cletus, tenho que suspeitar que
Jethro também faz um papel.
“Tudo bem, tenho que confessar uma coisa.” Ele sorri,
colocando as meias de menino que acabou de pegar. “Eu já sabia
que terminaram, Cletus nos disse. Mas você não parece muito
triste com isso.”
“Tenho outras coisas acontecendo, Jet,” digo friamente,
minha irritação com Cletus aumenta novamente. Uma coisa é
contar a Duane, Beau, Ash e Roscoe sobre o meu passado com
Scarlet. Outra coisa é contar a Jethro.
“Sim, eu sei, William.” Jethro imita meu tom e cruza os
braços. “Seu calendário social está bastante ocupado, doar
medula óssea e outros compromissos.”
Olho para ele enquanto olha para mim e, depois de dez
segundos, ele solta: “Sinto muito.”
Pisco, franzindo a testa e desconfio da situação. “Pelo que?”
“O de sempre. Não peço desculpas a você há um tempo, então
suspeito que seja devido.” Meu irmão dá de ombros e sorri, como
se a futilidade de suas constantes desculpas se torne uma piada
interna entre nós.
Eu o estudo, dou uma boa olhada. Talvez finalmente consegui
um bloco sólido de sono porque desta vez o sorriso dele não faz
nada para disfarçar a tristeza que se esconde atrás da superfície.
Mordo o interior do meu lábio e luto comigo.
Hábito e história me dizem que 50% do que Jethro disse é
besteira. E ainda... É mesmo história neste momento? Ou história
antiga?
“Você está perdoado, Jethro,” digo e decido ao mesmo tempo.
Seus olhos se arregalam e ele fica mais reto. “O que? Assim,
desse jeito?”
“Está pedindo desculpas por continuar há dez anos. Mesmo
que não fale sério, sua persistência merece ser recompensada.”
Seu sorriso se achata e seu olhar se estreita em mim. “Bem,
acho que vou me desculpar, caso mude de ideia.”
“Não. Não faça isso.” Aceno com suas palavras. “Falo sério. E
me desculpe se alguma vez fiz se sentir...”
“Como o quê? Como se eu não fosse bem-vindo?”
“Sim.” Balanço a cabeça, uma onda de arrependimento me
alcança, fazendo com que tenha que limpar a garganta. “Sinto
muito. Isso foi errado da minha parte e espero que possa me
perdoar.”
Levanta o queixo, como se considerasse a mim e a meu
pedido e diz de repente: “Você está perdoado.”
Bufo uma risada incrédula. “O que? Assim, desse jeito?”
“Você está de brincadeira?” Descruzando os braços, Jethro
pega outra peça de roupa, sorri de verdade dessa vez. “Estive
esperando minha vida inteira te perdoar por algo, apenas
esperando que fizesse algo errado. Esta pode ser a única vez que
tenho uma chance.”
Sei que ele está brincando, tentando aliviar o clima sombrio,
mas tudo o que sinto é uma sensação de frustração desesperada
com suas palavras. “Esse é seu problema, Jet. Você é muito
parecido com a nossa mãe, perdoa as pessoas com muita
facilidade. Pensa o melhor das pessoas, mesmo quando não
merecem. Passei dez anos rejeitando todas as suas tentativas de
corrigir as coisas. Peço desculpas uma vez, apenas uma vez, e
estou perdoado?” Faço o possível para manter meu volume sob
controle, mas a cada palavra que pronuncia me sinto perdendo
a batalha.
Mas isso me irrita. Uma e outra vez, nossa mãe perdoou
nosso pai. E uma e outra vez, Jethro também.
“O que quer que eu faça, Billy?” Jethro joga a roupa que
estava dobrando, cruza o comprimento da cozinha para ficar na
minha frente. “Faço você andar por brasas? Faço sofrer? Porque
faria isso?”
“Não precisa facilitar tudo para todos o tempo todo!”
“E você não precisa dificultar tudo!”
Minha boca se fecha com isso e dou um passo para trás,
olhando para ele, trabalho para conter essa fúria sem direção.
Não sei por que estava com tanta raiva, mas não estou com raiva
de Jethro, não mais.
Eu o amo. Amo seus dois filhos, sua esposa encantadora e
sua família. Queria que fossemos próximos, nunca parei de
querer isso. E estou cansado desse abismo entre nós, que ajudei
a criar a cada palavra cortante e indiferença.
Enquanto isso, meu irmão suspira, parece mais velho que eu,
pela primeira vez, enquanto esfrega o rosto. “Se sou muito
parecido com nossa mãe, deixe-me dizer o que acho que ela diria
agora.”
Abro os olhos, ele olha para mim e tenho que engolir uma
pedra de tristeza. Jethro e nossa mãe tinham os mesmos olhos.
O mesmo tom. A mesma forma. O mesmo brilho inocente de
paciência incondicional e amorosa.
“Ela diria: “'As pessoas só guardam rancores quando não
conseguem se perdoar'.”
Pisco contra a picada atrás dos meus olhos e nariz, olho para
longe e balanço a cabeça. Quantas vezes minha mãe disse isso
para mim e meus irmãos quando brigamos? Perdi a conta.
“Billy. Você é meu irmão.”
Exalo outra risada. “Sou?”
“Você sempre foi meu irmão,” ele continua indiferente
pacientemente. “Agora, às vezes fui um irmão de merda. E às
vezes, sim, você não me facilitou fazer as pazes. Mas
sinceramente não seria de outra maneira. "
Meu queixo aperta e olho para ele. “Por quê?”
“Porque sabia que no dia em que tivesse seu respeito
novamente, bem, faria por merecer. Eu mereceria.”
Uma onda crescente de tristeza e arrependimento finalmente
acaba com a última raiva. “Eu não deveria ter dificultado, Jet.”
“Não. Não, você definitivamente deveria ter dificultado” ele diz
calmamente, seu olhar sóbrio. “Sua intolerância pelas minhas
besteiras foi um grande motivador.”
Continuo balançando a cabeça. “Eu era muito duro.”
“Talvez, às vezes.” Ele dá de ombros. “Mas sua falta de
vontade de comprometer seus princípios, suas expectativas em
relação a todos nós e seu exemplo, alcançar nosso potencial, ser
melhor, ser bom, deu a todos algo pelo que lutar, de acordo com
o que vivemos. Especialmente eu.”

***

Jethro me fez sentar na mesa da cozinha e comer alguma


coisa. E então, nós dois carregando um monte de toalhas,
subimos a colina em direção ao som de crianças e adultos
espirrando água e absorvendo o sol do verão.
Enquanto atravessamos o portão que cerca a piscina,
examino a multidão procurando Scarlet e paro abruptamente
quando a encontro. Sentada na beira da piscina, vestida com
uma camisa de natação de manga comprida, calcinha de biquíni
e nada mais, sou recompensado e punido por esperar tanto
tempo para procurá-la.
“Ok, todo mundo fora da piscina. Hora de se limpar para o
jantar. Isso significa você, Ben! Abaixe o macarrão de piscina e
pare de espirrar no seu irmão.” Jethro pega minha carga de
toalhas e segue em frente, distribuindo toalhas para Ash, Drew
e Bethany, Beau e Shelly, Duane e Jess, embora Jess não
precise de uma, está na sombra com Liam e Sienna, Maya, Ben
e Andy. De acordo com Jetro, Cletus e Jenn, assim como o xerife
e Janet, estavam fora, passeando.
Quando meu irmão chega a Scarlet, ele dá de ombros.
“Desculpe, Red. Fiquei sem toalhas. Mas, ei, se importa de
ajudar Billy a empilhar todos esses brinquedos de piscina? Não
devemos deixá-los na água.”
“Sem problemas,” ela diz, parecendo sem fôlego enquanto seu
olhar procura e depois encontra o meu.
Ela sorri do seu lado da piscina, me dando um pequeno
aceno.
Aceno do meu lado da piscina, dando-lhe um pequeno
sorriso.
Minha família se afasta lentamente enquanto Scarlet e eu, de
acordo com nossas ordens, pegamos a área do pátio. A certa
altura, ela pula na piscina para pegar algumas bengalas no
fundo e não posso desviar meus olhos da visão dela deslizar pela
água, seus cabelos ruivos correndo atrás dela como uma sereia.
Engulo minha luxúria quando ressurge, atravessando a
extremidade rasa até que chega ao canto com os degraus.
Enquanto as escala, olho para as gotas de água rolando pela
pele nua de suas costas e pernas até que vira na cintura, e tenho
a presença de espírito para desviar os olhos.
Que. Droga.
“Está quente,” ela diz.
Concordo, precisando de um banho frio. Procuro
freneticamente por algo que possa pegar e organizar e passo
meus dedos pelos cabelos.
“Você deveria nadar da próxima vez” continua a voz dela. “É
bom.”
Manter meu cérebro focado na tarefa em questão é uma luta,
portanto a fala não é atualmente uma opção. Então, novamente,
concordo.
“Tirou uma boa soneca? Quando acordou?” A voz dela está
mais próxima.
Dou de ombros, curvando para recuperar o macarrão da
piscina com o qual Ben batia em seu irmãozinho e o adiciono à
pilha, levanto e giro, e fico cara a cara com Scarlet.
Endureço, dou um passo para trás. Não esperava que
estivesse tão perto.
“Cuidado,” ela diz, as mãos fechadas em punhos e apoiadas
na cintura. “Se você der outro passo para trás, cairá na piscina.”
Olho para trás, vendo que está certa, e viro com a intenção
de mostrar minha gratidão.
Mas antes que possa agradecer, ela exige: “Por que está tão
quieto o tempo todo?”
Assustado, olho para ela e seus olhos brilhantes. “Eu...”
“Você mal fala comigo desde quarta-feira passada.”
Cuspindo e lutando contra uma onda de pânico, faço uma
pergunta estúpida: “O que quer que eu diga?” E depois luto
contra uma contração.
“Não sei.” Ela joga as mãos para cima, enviando gotas de água
pelo ar como uma fada com poeira de duende. “Você pode
começar se explicando.”
“Me explicar?”
“Sim. Você pode não gostar, mas não teremos futuro se não
falarmos sobre o passado.”
Procuro meu cérebro monumentalmente confuso. O que mais
há para discutir em nosso passado? Ben era um idiota egoísta,
fim. Já não resolvemos tudo?
Então pergunto: “Me explicar sobre o quê?”
“Que tal por que manteve em segredo o fato de Duane e Beau
eram meus meio-irmãos.” O queixo de Scarlet se projeta. “Por
que fez isso? Não acha que eu tinha o direito de saber?”
Ah. Meu sorriso é de desculpas. “Acho que tinha o direito de
saber, mas jurei que nunca contaria a ninguém. Minha mãe
estava preocupada com o que você...” Levanto minha atenção
para o horizonte, parando de chamar aquele monstro de pai. Não
quero vincular a identidade dela à dele, ela merece mais.
Reorganizo meus pensamentos e escolho minhas palavras com
mais cuidado e tento novamente: “Minha mãe tinha medo do que
Razor faria, se descobrisse que Beau e Duane eram de Christine.
Estava preocupada, estava aterrorizada, que ele os faria
desaparecer. Nunca disse a você por respeito a ela e por sua
segurança contínua.”
A boca de Scarlet se curva em uma linha triste. Enquanto
processa minhas palavras, parte de sua irritação parece
diminuir, mas parece ser substituída por uma pitada de
melancolia.
“Entendo manter um segredo por respeitar Bethany. Tenho
certeza de que sabe, mas muitas pessoas não sabem a verdade
até agora. Duane, Beau e eu não tornamos nosso
relacionamento amplamente conhecido. Nenhum de nós quer
envergonhar sua mãe ou desrespeitar a memória dela.”
“Sim. Estou ciente de que decidiram manter isso privado.”
“E protegê-los do Razor também faz sentido. Tive
preocupações semelhantes. Então, acho que entendo por que
não me contou.” Embora aceitou meu argumento, ainda não
parece muito feliz com isso. “Mas isso ainda não explica por que
você fica tão quieto o tempo todo.”
“Talvez apenas sinto falta de ouvir você falar.”
Percebo imediatamente que essa afirmação foi a coisa errada
a dizer, porque a irritação de Scarlet volta a brilhar. “Esse é um
raciocínio terrível. Acha que quero falar tudo? Acha que não
quero saber sobre você? O que está acontecendo dentro dessa
sua cabeça anormalmente linda? Diga algo. Qualquer coisa. Fale
sobre o tempo.”
Meus lábios puxam para o lado. “O clima.”
“Honestamente, Billy, só quero que converse. Fiz algo de
errado? Está com raiva de mim?”
“Não. De modo algum.”
“Então...” Fazendo gestos selvagens, ela bufa e grita:
“Participe!"
Olho por cima da cabeça dela no horizonte novamente,
esperando encontrar algumas respostas lá, tentando descobrir
um caminho a seguir. Ela está certa. Não estou falando. Não
quero estragar um único momento com ela, fazer ela correr e
perdê-la novamente. Então fico em silêncio.
“Ok, tudo bem.” Suas palavras estão cortadas, como se
acabou de decidir alguma coisa. Sinto seu avanço em mim,
levanto as mãos pouco antes de fazer contato com meu peito.
“Então, que tal isso...”
Em um segundo, estou de pé na beira da piscina e, no
próximo, sou empurrado para trás, em queda livre. A última
coisa que vejo antes de ficar submerso é seu sorriso
determinado, porém satisfeito.
Não está frio, mas é uma surpresa. No entanto, rapidamente
encontro meu rumo e volto para cima. Saio na superfície, limpo
meus olhos a tempo de pegar os movimentos dela sobre meu
peito imerso com uma quantidade razoável de apreciação.
“Você se sente melhor agora?” Pergunto, mostrando minha
satisfação também. Pernas tonificadas na parte de baixo do
biquíni, o quadril largo, o recuo da cintura, as curvas deliciosas
dos seios naquela camisa fina de natação. Posso olhar o dia
inteiro, exceto agora que meu senso de justiça exige que ela
acabe na piscina comigo.
“Um pouco.” Ela cruza os braços e não faz nenhum esforço
para disfarçar sua admiração pelo meu corpo. “Você deve tirar
sua camisa. Está molhada.”
Minha mandíbula aperta e ignoro o último comentário dela
enquanto subo as escadas, torço minha camiseta no estômago.
Seus olhos na pele exposta.
“Quer me empurrar na piscina de novo? Isso ajudaria?” Tiro
meus sapatos. Não posso persegui-la em sapatos molhados.
“Pode ajudar.” Ela dá de ombros, seus olhos brilhando como
safiras. “Está oferecendo?”
Vou direto para ela.
Ela deve ler minhas intenções porque seu sorriso vacila.
“Espere um minuto.” Ela levanta a mão, como se fosse me parar.
“Espere, o que está fazendo?”
“Venha aqui.”
“Por quê?” Ela recua.
“Você me empurra, eu te empurro. É assim que as coisas
funcionam conosco, certo?”
“Ah não. Não, estou bem.” Ela vira e se afasta, olhando por
cima do ombro enquanto avanço. “Você pode, uh, apenas me dar
esse de graça.”
Corro atrás dela, sem fazer nenhuma tentativa de olhar para
qualquer lugar além de suas costas. “Lá vai você, mudando as
regras no meio do jogo.” Quero apertar, morder.
“Isso é um jogo?” Ela corre agora, como uma maldita gazela.
“É agora.”
“Sério?” Ela pergunta, então grita, me evita e se vira
exatamente quando eu a agarro. “Bem, se é um jogo,” ela grita
enquanto corre, “então devemos equilibrar um pouco as
probabilidades. Não é justo. As probabilidades favorecem você.”
“Elas me favorecem?” Meu quadril não gosta da corrida,
então diminuo a velocidade novamente. Cara, esqueci o quão
rápida ela é. “Como elas me favorecem?”
“Bem, para começar...”
“Ei, vocês dois! Não pode correr pela piscina!” Sienna grita de
algum lugar, parando nós dois.
Olhamos em volta, procurando por ela, mas não encontramos
ninguém. Olho para Scarlet, percebo que ainda está distraída,
procurando a esposa de Jethro. Não há tempo como o presente
para aproveitar. Chego mais perto. Quando Scarlet nota, é tarde
demais. Eu a encurralei.
Assustada, ela olha para a esquerda e depois para a direita,
procurando uma fuga. A menos que planeje subir a superfície
rochosa em suas costas, o único caminho para a liberdade é
através de mim, e não posso evitar meu sorriso perverso quando
seus olhos se arregalam quando assimila.
Então, eles se estreitaram. “Viu? Não é justo.”
Sinto meu sorriso aumentar, meus medos anteriores
esquecidos no momento. “Só porque estou ganhando, não
significa que não seja justo.”
Ela cruza os braços. “Mas você ia ganhar, não importa o quê.
É maior e mais forte. Pode facilmente me pegar, me levar para a
piscina e me jogar.”
“E você é menor e mais rápida,” digo razoavelmente,
aproximando-me, meus braços abertos para pegá-la, apenas no
caso de decidir fugir. “Se queria fugir, já poderia ter fugido.”
Ela me dá um olhar sufocante, ergue o queixo. “Está
sugerindo que eu gostaria de ser jogada na piscina?”
“Talvez sim, talvez não.” Dou de ombros, gostando muito
dessa expressão em seu rosto, como se eu fosse travesso e ela
me desaprovasse completamente. Eu me pergunto se é assim
com seus alunos que se comportam mal quando ensina teatro
na escola. Bom Deus, de repente sinto pena de todos os
adolescentes hormonais da classe dela.
“Você sempre pode…” Começo, perto o suficiente agora para
deixar meus olhos vagarem, até o pescoço, o zíper na frente de
sua blusa de banho. “Oferecer outra coisa,” termino, dizendo a
mim que estou brincando.
É só uma piada.
No entanto, e talvez não seja minha parte perceber que seus
mamilos enrugam de repente e empurram contra o tecido fino
de sua blusa de banho. Meu olhar vai para o rosto dela e não
encontra nada de sua desaprovação anterior. Foi substituída por
uma expressão quente e nebulosa.
E isso definitivamente causa uma reação em mim.
Os lábios de Scarlet se separam, seus olhos se movem entre
os meus, procurando, sua respiração fica mais curta quanto
mais perto eu chego, e qualquer ilusão que tenho sobre minha
declaração ser apenas uma piada diminuem em nada.
“Scarlet,” digo por nenhuma outra razão, além de querer dizer
o nome dela, seu nome verdadeiro. Quero ouvir isso enquanto
ela olha para mim dessa maneira, lembrar que ela ainda existe,
mesmo que em algum momento no futuro ela exista em algum
lugar além do meu alcance.
Ela balança para frente quando seus cílios tremem, suas
mãos sobem para agarrar um punhado da minha camisa
molhada, sua atenção focada na minha boca. “O que...” diz
bruscamente, engole em seco e lambe os lábios. “O que tem em
mente?”
“Não sei,” sussurro, ficando em cima ela. Deus, estou tão
duro, e não me importo se ela me sentir. Não. Isso não é verdade.
Quero que sinta isso. Na minha súbita loucura, quero que ela
saiba.
Ela estremece, com a respiração presa, mesmo quando
pressiona seu corpo mais contra o meu, como se esperasse que
eu me mexesse. Desse jeito, sem escapar, mas como se isso fosse
o que ela queria o tempo todo. Erguendo-se na ponta dos pés,
seu corpo desliza para cima, apenas duas camadas molhadas de
roupas separam nossa pele.
Eu gemo.
O que estou fazendo? Vai devagar.
Minhas mãos encontram sua cintura enquanto as dela sobem
para meus ombros.
Você precisa ir devagar. Afaste-se.
“Billy,” ela sussurra, mas soa mais como um gemido.
“Eu... deveria me trocar,” digo inexpressivamente, falando
principalmente comigo. “Estou todo molhado.”
“Então estamos quites,” ela diz, colocando um beijo suave no
meu pescoço, sua mão captura a minha e traz primeiro para o
peito e depois para o estômago.
Percebo seu destino final para meus dedos, imagino o que
aconteceria a seguir. Fecho os olhos com força, enrijeço meu
braço. Ela não sabia, não sabe, quão feroz e selvagem é o meu
desejo por ela. E por mais que quero desesperadamente tocar
seu corpo, fazê-la gemer e implorar, não farei isso contra as
rochas ao lado da piscina.
Ou na grama.
Ou na piscina.
Não na nossa primeira vez.
Ela merece pétalas de rosa e champanhe, velas e música,
lençóis de seda e sedução, romance e paixão. Não só paixão.
Resolvido, encontro o fio necessário de autocontrole no
último minuto e tiro a mão dela do meu pulso, me afastando. E
então dou mais dois passos para trás, só por segurança.
“Scarlet...”
“O quê?” Ela retruca, dando um suspiro aguado que faz meus
olhos se abrirem. Olha para mim, as bochechas vermelhas, os
braços cruzados, os ombros levantados, impotentes. “O que,
Billy? O que? O que posso fazer?”
“Não é você.”
“Eu sei.” Sua voz falha. Limpa a garganta e firma o queixo
antes de continuar. “É você. E sua falta de interesse em me
tocar.”
“Não.” Agora dou um passo à frente, mas ela levanta as mãos
e vira o rosto para um lado andando ao meu redor.
“Esqueça. Ok? Você precisa de tempo. Tudo bem.” Eu a ouço
fungar enquanto se afasta rapidamente, começando a correr
quando chega ao portão. “Levei tempo, agora precisa de tempo.
Levei anos para pensar, você teve uma semana. Está bem. Não
tenha pressa.”
Ugh. Observá-la partir parece que milhares de tachinhas
pressionadas no meu peito. Mas meu cérebro lento e encharcado
de luxúria não consegue descobrir o que dizer, como explicar
antes que ela desapareça.
Trabalhei tanto para não dizer nada, que acabo dando nada
a ela.
CAPÍTULO 13

BILLY

Logo de manhã, depois de mais uma noite sem dormir, visto


roupas de ginástica e desço as escadas. Alguns dias atrás, Duane
mencionou de passagem que a propriedade tem uma pequena
academia e uma sala de musculação na entrada de cascalho e do
outro lado da área de estacionamento da rotatória. Nada como
me esgotar. Então, talvez, depois do banho, eu encontre Scarlet
e...
E…
Bem, farei algo.
Depois do que aconteceu ontem na piscina, ela foi educada
pelo resto do dia. Não fria. Nem quente. Apenas educada.
Acontece que a única coisa pior do que seus constantes toques
é quando ela os retêm.
Não a culpo. Ficou claro que está frustrada, e não apenas por
causa do que chamou de minha falta de interesse em tocá-la.
Ela quer que eu fale com ela. Preciso falar com ela. Gostaria.
Hoje, a encontrarei e falarei com ela.
Com isso decidido, determino ainda que focarei no peito e
braços na sala de musculação. Olhe para mim, decidindo as
coisas. Finalmente.
Para minha surpresa, Jethro e Beau já estão de pé e
malhando. Isso simplifica bastante as coisas. Revezamos um ao
outro e, quando terminamos, o sol está muito mais alto em um
céu parcialmente nublado, o dia totalmente comprometido.
“Quer nadar?” Beau limpa a testa com uma toalha. “Claro
que está quente hoje. Precisa pegar emprestado um calção de
banho, Billy?” Beau sai da longa entrada, claramente planejando
atravessar o pomar de oliveiras em vez de seguir o caminho mais
longo de cascalho até a casa principal. “Tenho um extra.”
“Talvez mais tarde.”
“Ei.” Jet bate no meu ombro levemente com as costas da mão.
“Se este pomar é muito parecido com floresta para você, deve
ficar por perto. Caso contrário, pode se perder.”
Beau sorri.
“Cale a boca,” resmungo, não sorrindo exatamente. Minha
família, especialmente Jethro, nunca me deixou viver com o fato
de que sempre me perdia na floresta.
“Ei, quem é?” Beau aponta para um campo de cevada além
do pomar e depois de parar, apertar os olhos e apurar os
ouvidos, percebo que Scarlet é pelo menos uma das pessoas. As
outros três parecem ser Jess, Shelly e Ashley.
“Devemos ir e dizer um oi,” Jethro sugere alegremente.
Meu irmão mais velho, de olho em mim, precisamente sorri,
como se soubesse um segredo sobre mim. Meu cenho aperta de
imediato. Aqui vamos nós.
“Ei, senhoritas!" Beau grita, já caminhando em direção a elas.
“Vocês querem ir... Espere, isso é comida?”
Com um brilho nos olhos, Jethro segue Beau, deixando-me
na retaguarda com minhas suspeitas. Logo estamos no
encontro, que obviamente é um piquenique matinal. Bethany
aparece, colhe papoulas vermelhas entre a cevada verde e
entrega à mãe.
É uma foto agradável e eu tiraria uma, exceto que o olhar de
Scarlet trancado no meu assim que passamos as árvores, não
me deixa fazer muito mais do que olhar para ela e ficar de pé.
Ela usa aquele vestido rosa de verão, aquele com cordões nos
ombros segurando-o. Seu cabelo em uma trança solta e seus
lábios vermelhos como morangos, provavelmente porque tem
morangos no prato.
O que quero fazer é jogá-la por cima do ombro, levá-la de volta
para casa, passar a manhã, tarde, noite, manhã seguinte, tarde
e noite explorando cada centímetro de seu corpo magnífico e
aprendendo todas as maneiras que gosta de ser tocada. Mas se
eu fizer, ela derrama os morangos.
“Bem. Olá. De onde vocês vêm?” Ashley se inclina para trás,
olhando para nós.
“Há uma academia com uma sala de musculação no final da
rua,” Beau responde distraidamente, circulando o cobertor para
se ajoelhar ao lado de Shelly. “O que tem aí? São bolinhos? Posso
pegar um pouco?”
“Sim, é claro,” ela diz, dá um pequeno sorriso e quebra o
bolinho ao meio. Noto que oferece a ele o pedaço maior. “Aqui.”
Ele sorri para ela, mas depois se inclina para frente e a beija
na boca, dando uma lambida no canto dos lábios. “Você tinha
alguma coisa ali. Não se preocupe, limpei para você” diz,
mentindo.
“Está com fome?” Scarlet pergunta suavemente, sua
pergunta para mim, levantando o prato de morangos.
Engulo em seco enquanto contemplo a oferta. Mas então,
olho para minha família, todos, menos Shelly e Beau, nos
observam.
Balanço a cabeça. “Não. Obrigado.”
Ashley dá um suspiro exagerado. O olhar em seus olhos
parece comunicar frustração, mas seu tom é leve quando diz:
“Estávamos conversando sobre os planos para a viagem a
Veneza que está por vir. Você vem, Billy?”
Enfio as mãos nos bolsos do short e dou de ombros. “Acredito
que vou. Duane limpou meu calendário com Becca.” E duvido
que tenha uma escolha.
“Bem, Claire diz que está pensando em ficar aqui,” Jessica
diz, e olho para a esposa de Duane. Seu bonito olhar marrom se
estreita, pode-se até chamar de recado. Faço o meu melhor para
ler as instruções femininas lá, mas claramente falta alguma
coisa porque, depois de um tempo, ela também suspira. “Acha
que Claire deve ir?”
“Você deve perguntar a Claire,” digo, a resposta óbvia. “Se ela
quiser ir, então deve. Se não, depende dela.”
“Mas você vai?” Esta pergunta vem de Jethro, e olho para ele.
Tenho a sensação de que tenta ajudar. Com o que, não tenho
ideia.
“Sim...?” Digo devagar, olhando entre ele e Ashley,
procurando algum sinal do que querem que eu faça. Ambos me
olham atentamente, como se esperassem que eu termine um
pensamento crítico. Perdido e forçado a adivinhar, eu me dirijo
a Scarlet. “E você deve ir. Não há razão para não ir. Duane e
Beau são seus irmãos. Esta é sua família também.”
Ela concorda, um sorriso educado no rosto e os olhos caem
no prato. “Sim. Com certeza. Sempre quis conhecer Veneza.”
Balanço a cabeça também, olhando para Ashley para
confirmar que fiz o que queria. Em vez disso, seus lábios estão
pressionados em uma linha plana e sua cabeça se move para
frente e para trás com um pequeno gesto de cabeça. É a
expressão que ela usa com os gêmeos depois que fizeram algo
monumentalmente idiota.
“Uh, Billy.” Beau se levanta, seu tom fácil, mas seu olhar
preocupado. “Venha comigo por um segundo, quero mostrar
uma coisa aqui. Jet, você também.”
Dando um sorriso tenso para as damas, apesar de Jess,
Ashley e Shelly olharem para mim como se eu fosse uma
decepção extrema, até a pequena Bethany olha carrancuda na
minha direção, eu me viro e sigo Beau, voltando para o pomar e
quase para a casa, local de onde vimos o piquenique
originalmente.
Assim que chego aos meus irmãos, Jethro me olha,
visivelmente consternado. “É o melhor que pode fazer? Lembrar
a ela que é parente de Duane e Beau?”
Beau faz uma careta de consternação. “Cletus estava certo.
Você precisa da nossa ajuda.”
Recuo, dividindo minha atenção entre eles. “Como é?”
“Tem que nos ajudar.” Jethro baixa a voz para um sussurro.
“Ajudar? Ajudar com o que?”
“Você está sem prática, Billy. Quando foi a última vez que foi
a um encontro? Quando foi a última vez que paquerou uma
mulher? É muito rude. Nem toda conversa é uma audiência no
Senado. Claire tem um coração mole, precisa de ternura.” Beau
me dá um sorriso simpático.
Um som incrédulo me escapa. “Está falando sério? Quer me
dar conselhos sobre Claire?”
“Não. Queremos lhe dar conselhos sobre mulheres” Beau diz,
compartilhando um olhar com Jethro.
“Sou ótimo com mulheres.” Era fantástico com as mulheres.
Beau coloca as mãos no quadril. “Então por que continua
batendo e queimando com Claire?”
“Esse é o plano,” Jethro interrompe antes que eu possa
contestar novamente. “Vamos levar todas de volta para casa, por
algum motivo. Elas sabem o que acontece, então vão concordar.”
“Elas sabem o que acontece?” Quase engasgo.
“Certo.” Beau ignora minha pergunta. “Então, você fica com
Claire, se oferece para ajudá-la a carregar as coisas de volta
quando estiver pronta, mas sente-se para ficar claro que gostaria
de ficar. Terá total privacidade, manteremos todos em casa.
Elogie o que ela veste ou diga que gosta. Diga algo como 'eu gosto
deste vestido em você'. Simples assim.”
Jethro olha por cima do meu ombro para as mulheres ao
longe e depois se aproxima. “Então pergunte o que fará hoje, o
que fará amanhã, quais são seus planos para esta semana, o
que achou dos museus de Florença. Faça ela falar. E se vê uma
oportunidade para um duplo sentido? Pegue.”
“Exatamente,” Beau sussurra. “O objetivo é fazê-la rir, então
deve estar brincando quando diz isso. Quanto mais brega,
melhor. Ela entende a intenção e ri. Entendeu?”
Apesar de tudo, escuto e absorvo o conselho de meus irmãos.
Quero dizer, eles são definitivamente os especialistas. Por mais
insano que seja, em algum momento nos últimos dois minutos
e sem perceber expressamente que o faço, passo de incrédulo a
irritado e interessado.
Não esperando que eu responda, Jethro coloca a mão no meu
ombro, mas olha para Beau. “Desculpe se essa próxima parte é
estranha para você, Beau.”
“Não. Está tudo bem.” O ruivo acena com a preocupação de
Jethro. “Ela é minha irmã e sua felicidade é importante, não
preciso contemplar os detalhes.”
“O quê?” Olho entre eles, novamente certo de que falta
alguma coisa.
Olho para Jethro que continua: “Aqui está o acordo, e isso é
verdade para a maioria das mulheres, noventa e nove por cento
do tempo. Se ela tocar em você, como sua mão, seu braço ou sua
perna...”
“Especialmente a perna.” Beau concorda com firmeza. “Se ela
tocar em qualquer lugar acima do joelho e deixar a mão lá, é
como o convite universal 'abaixo da garupa'.”
“De qualquer forma, se tocar em você, isso significa que quer
que a toque, quanto mais cedo melhor.” Jethro explica com um
ar acadêmico. “Faça o que ela faz. Se o toque dela é leve e
paquerador, faça isso. Se o toque é mais proposital, bem... então
lá vai você. Prossiga conforme as instruções. Mas, o importante
é que, se ela abrir a porta e você não entrar, isso a deixa sentindo
que não é tão apaixonado por ela quanto ela é por você. Nesse
caso, é necessária comunicação verbal, estabelecimento de
limites e gentileza, mas firmeza e honestidade é preciso.”
“Certo. Eu sei disso.” Agora concordo, minha mente trabalha,
lembrando-me de todos os tempos e de todas as mulheres que
envolveram os dedos em volta do meu bíceps e apertaram,
tocaram minha perna debaixo de uma mesa ou arrastaram a
mão pelo peito. Uma vez, eu sabia o que isso significava e tomo
nota. Ao longo dos anos, ainda sei o que significava, mas fiquei
indiferente.
“OK? Temos um plano?” Jethro dá mais um tapinha no meu
ombro e depois solta a mão, fazendo como se fosse caminhar
para o piquenique.
“Espere.” Eu o paro, a realidade do que acaba de acontecer
finalmente alcança a surpresa.
Jethro volta-se para mim, seus olhos questionando. “O que?
O que há de errado?”
Eu o inspeciono e pergunto antes de pensar melhor no
impulso: “Por que está fazendo isso?”
As sobrancelhas dele se erguem, como se minha pergunta o
confundiu.
Arrisco um olhar para Beau e vejo meu irmão mais novo
entender o que perguntei. Beau sempre foi bom em ler pessoas,
captar tendências e nuances.
Volto meu olhar para Jethro e pergunto novamente: “Por que
está fazendo isso? Por que está tentando me ajudar?”
O entendimento deixa de lado a confusão nos olhos do meu
irmão mais velho. “Não há ninguém no mundo que mereça mais
a felicidade do que vocês dois. Eu amo você, Billy, mesmo que
possa ser um idiota de verdade às vezes.” Segurando meu olhar,
o lado de sua boca se eleva mais alto. “Vamos, boneco. Vamos
pegar a garota.”

***
Ao retornar ao piquenique, Beau anuncia: “Acho que gostaria
de nadar. Quem quer vir?”
E então, quase em uníssono e como se nadar fosse um
codinome para a aquisição de superpotências, todos, exceto
Scarlet, se levantam e saem prontamente, deixando para trás
basicamente tudo.
Enquanto isso, eu permaneço imóvel na beira do cobertor,
fazendo o possível para não parecer notável enquanto Scarlet
olha para minha família que parte, ainda mastigando o restante
do morango que mordeu quando Beau, Jethro e eu fizemos
nossa segunda abordagem.
Ela olha para o cobertor por alguns segundos e depois levanta
o olhar para o meu, um lado da boca se curva para cima. “Acho
que eles realmente querem nadar.”
Estudo-a de perto, tento analisar se está satisfeita ou
desconfortável e pergunto: “Você quer nadar? Vou ajudá-la a
levar tudo de volta.”
Ela inclina a cabeça, agora me estudando. “Quer ir nadar?”
“Não,” respondo imediatamente.
“Que bom,” diz calmamente, e seu pequeno sorriso se torna
um sorriso. Mas seus olhos ficam mais turvos quanto mais ela
olha para mim, como se estivesse perdida em seus pensamentos.
Enquanto isso, olho para ela, observando como suas pernas
dobram e se curvam, a barra do vestido repousa no meio da coxa
e seus pés estão novamente nus.
Meus pensamentos voltam antes que eu possa contê-los e
imagino minhas mãos em sua pele, deslizando a barra mais
acima do quadril enquanto ela se reclina e beijo até o interior de
sua coxa, puxando de lado esse pedaço de tecido entre suas
pernas para dar um beijo de língua nela...
“Morangos,” ela diz, arrancando-me da minha imaginação
rebelde.
“Perdão?” Minha atenção se volta para o exterior.
“Se está com fome, tenho algo para comer.”
“O que seria isso?” Resmungo, me perguntando se falo meus
desejos em voz alta.
Ela levanta o prato novamente. “Estava muito ambiciosa
quando me servi e não há como terminar tudo isso. Tem certeza
de que não quer?”
Engulo a saliva que corre para a minha boca durante minha
fantasia pecaminosa e desvio o olhar dela, um caos ao qual não
estou mais acostumado dificultando a concentração. O que devo
fazer? O que Jethro disse?
Sente-se, uma voz me lembra. Balanço a cabeça,
concordando, e depois me ajeito para sentar. Não aí! Próximo à
ela.
“Isso mesmo,” murmuro e esfrego minha testa. Percorro os
itens de piquenique abandonados, sento no círculo vago de
cobertor adjacente ao dela.
Ela se inclina para um lado enquanto eu me sento, para me
dar espaço, mas não se afasta, virando para mim, seu braço roça
o meu enquanto coloca o prato no colo e pega um morango. Mal
me acomodei, minhas pernas esticam na minha frente e cruzam
no tornozelo, quando ela levanta a fruta na frente do meu queixo,
os olhos na minha boca.
“Aqui. Estão quentes do sol.” Ela sorri suavemente, olhos
brilhantes refletindo o azul do céu, sardas douradas temperando
a pele pálida, a luz do sol brilhando em seus cabelos cor de
cobre. Linda.
Observo ela observar minha boca, abro meus lábios e ela me
dá o pedaço de fruta, seus lábios também se separam, sua
língua espreita enquanto coloco a fruta com os dentes,
segurando-a no lugar, mas sem morder. Ela parece hipnotizada,
atordoada, seu olhar inconfundivelmente quente, intencional,
como se eu comer um morango fosse a coisa mais fascinante do
mundo inteiro.
Pressiono minha língua contra a fruta e mordo. Ela pisca.
Lambo meus lábios com o excesso de suco enquanto seus dedos
se afastam, depositando lentamente o restante frondoso em seu
prato, seu olhar ainda fixo na minha boca e sua mão como uma
pena até pousar na minha perna. Logo acima do joelho.
O peso da palma da mão quente é impossível de ignorar. Nada
nesse toque parece leve. Espero que Jethro e Beau estejam
certos. Espero que ela me tocar assim significa que ela quer que
eu a toque porque minhas mãos já estão se movendo. Nosso
ambiente, por mais bonito que seja, desaparece e só a vejo. Sua
respiração muda e a nebulosidade em seus olhos fica inquieta,
levantando para a minha quando minhas pontas dos dedos se
conectam com sua coxa nua, menos de um centímetro abaixo
da linha rosa rendada.
Talvez seja loucura, mas eu me rendo.
Vou levantar o vestido dela, como imaginei momentos atrás.
A necessidade de agir queima dentro de mim, as chamas
espalham pelos pequenos e ansiosos sopros de ar a cada
ascensão e queda de seu peito.
Eu mal falei com ela desde que estou trancado naquele
quarto. Mas, naquele momento, não consigo ver além do
desespero nela, inquestionavelmente espelhado em mim de fazer
alguma coisa. Qualquer coisa. Fechar o abismo entre nós com
ações da mesma maneira que o fechamos na semana passada
com palavras.
No entanto, por mais frenético que me sinta, deitá-la de volta
e tocar sua pele macia, lamber, provar e sugar sua doce carne,
e realizar todos esses desejos, preciso que ela diga. Nunca,
nunca poderia assumir isso.
“Scarlet, você quer...”
“Sim,” ela diz, parecendo e sentindo como se estivesse com
dor. “Pelo amor de Deus, sim. Sim. Sim. Sim.”
Como se não pudesse esperar mais um segundo, ela agarra
a frente da minha camisa, me puxa para frente e me beija.
CAPÍTULO 14

CLAIRE

Ele me beija de volta. Sem hesitação. Assim, como se


estivesse pronto, como se soubesse que isso iria acontecer.
Como se planejasse. Minhas costas atingem o cobertor, meus
dedos atrapalhados em seus cabelos e sua boca quente consome
a minha quando ele passa por mim, sua língua varre por dentro,
demolindo, tomando.
Esses não são os beijos doces do nosso passado. Este é um
monstro, um animal alimentado por anos de necessidade,
frustração e desespero cru. Agora minhas mãos estão sob a
camisa dele, tocando as rugas duras de seu estômago, a pele
macia de seus ombros e os pelos grossos de seu peito.
Algo quebra.
Quero dizer, dentro de mim algo quebra. Apenas quebra.
Como um copo cheio de água atingindo o chão de ladrilhos a
toda velocidade. Não estou pensando. Não há como pensar. Não
há pensamento. Apenas sua boca gananciosa no meu pescoço,
seus dedos rasgando os laços do meu vestido, suas mãos no meu
corpo, subindo pela minha saia, me segurando pela calcinha. E
então ele move minha calcinha e seus dedos estão dentro.
Ouço minha respiração parar e sinto meu quadril avançar.
Eu me sinto frenética. Tão frenética. Ele me separa, a
almofada macia de seu dedo médio circula, e eu choramingo. Ele
me faz sentir tanto, ele sempre faz, sentimentos que são
necessários e perigosos em igual medida. Não parece seguro o
que estamos fazendo. As sensações, o calor e a falta da mente
são o oposto do seguro. Estou em perigo. Estou perdida. E eu
não me importo. Não me importo.
“Scarlet. Me toque. Você é perfeita.”
Ele não precisa me falar. Minhas mãos já se movem,
minhas pontas dos dedos e unhas raspam contra seu torso
glorioso no caminho para dentro de seu short. E então meus
dedos estão ao seu redor e se parece como o céu, o pecado e a
rocha sólida, e juro que quase gozo. No fundo da minha barriga,
meu corpo aperta, aperta, me implora para agradar, oh, por
favor, acabar com este sofrimento. Eu sofro. Doe.
Acaricio o comprimento grosso e quente dele e ele para,
depois treme, seu grande corpo estremece. “Espera, espera. Não
tenho camisinha.”
“Não ligo.” Eu não ligo.
Na verdade, parte de mim se importa, a parte irracional,
histérica e maluca. A parte que quer emitir um convite para
impregnação. Por favor. Me engravide. Vamos fazer uns bebês!
AGORA!
Eu o quero, preciso dele dentro de mim, minhas mãos nele
e sua boca no meu peito mais do que quero ou preciso de
qualquer coisa. Mais do que quero estar segura, ou bem. Não
consigo pensar nessas coisas. Elas não importam. Só isso
importa.
Mas Billy se move para o lado, pressiona sua ereção no meu
quadril para que eu não possa tocá-lo como queria.
“Por favor, Billy. Por favor.”
“Shhh.” Seus lábios estão no meu pescoço, debaixo da
minha orelha, movendo-se para baixo enquanto seus dedos
brincam com meu corpo e eu o arranho, tento alcançar o que
retêm. Mas então ele pressiona sua pélvis para frente e a
sensação brutal e dura dele me deixa selvagem.
Empurro seu peito e ele recua, seus olhos arregalados,
alertas. “Eu... você está bem?”
Rosno e empurro e empurro e empurro até que ele está
deitado de costas. Monto em seu colo e balanço, girando,
esfregando, três camadas de roupas entre nós e, no entanto,
meu corpo não parece se importar.
“Scarlet, Scarlet... poooooorra.” O palavrão rasga dele, a
coroa de sua cabeça pressiona contra o cobertor, seus olhos
reviram, seus dedos cavam minhas coxas sob minha saia
enquanto persegue o atrito, usando seu calor rígido.
“Oh Deus,” gemo, o primeiro dos estilhaços me lança, meus
movimentos ficam cobiçosos e sem graça.
Nossos olhos se encontram.
O dele selvagem, atordoado, lindo fogo azul, e suas mãos
grandes e ásperas agarram as alças do meu vestido e sutiã e as
puxam para baixo. Ouço o som de tecido rasgando quando rasga
a frente do meu vestido. Não me importo. Olhos nos meus seios
nus, Billy avança, seus braços vêm ao redor do meu corpo me
segurando presa. Sua boca festeja, morde e enfia a língua, seus
dedos beliscam, seguram e sentem.
Seu quadril empurra para cima, usando-me para buscar
seu próprio prazer. A visão de sua grosseria e apreensão, sendo
o instrumento dessa completa perda de controle deste homem
estoico, me fez chorar, o desejo de parar e ficar tensa e me curvar
diante de um poderoso porque estou gozando. Mas forço meu
corpo para continuar me mover, perseguindo o atrito e o calor,
puxando-o, balanço e empurro, enquanto ele fica tenso, e se
curva e estremece, se rende.
E eu gozo. Tão. Forte.
E então desço. Mal consigo recuperar o fôlego, não consigo
me segurar. Mas isso não importa. Billy está aqui, me
segurando, movendo para o cobertor ao lado dele. Seus lábios
ainda beijando, mas docemente. Suavemente. Um braço sob
meus ombros, me coloca na parede de seu corpo, ele continua
sua exploração. A palma da mão calejada segura e massageia
meu peito, e depois desliza para baixo, por cima da saia do
vestido e na cintura da minha calcinha.
Meu coração bate forte entre os ouvidos, eu o observo.
Assisto enquanto seus longos dedos bronzeados desaparecem
na minha calcinha, acariciando os cachos antes de senti-lo me
separar, retomando de onde parou antes. Com minha roupa de
baixo, parece um segredo emocionante, sua mão se mover sob o
tecido onde não posso ver. Meu quadril mexe
incontrolavelmente, inclinando-se para cima, querendo a
invasão que esconde.
“Billy,” engasgo, a palavra mais ar do que som. Eu me sinto
perdida, tão perdida, com fome, morrendo de fome. Não sei o que
acontece, como ainda posso me sentir assim depois de chegar
ao clímax. Toda a minha experiência em alcançar a satisfação
foi individual e nunca senti vontade de perseguir um orgasmo
com outro.
A boca dele arrasta mordidas ao longo do meu ombro até a
clavícula, os cabelos grossos de sua barba deliciosa ao longo da
minha pele. Lambe e saboreia, um som retumba de seu peito,
um deleite primitivo enquanto seu dedo médio e indicador brinca
com minha entrada e ele aninha o pico duro no centro do meu
peito.
E então seu corpo se move, o braço em volta dos meus
ombros me deixa. Sua boca está no meu umbigo e seus dedos
puxam minha calcinha pelas pernas, e quero mesmo que essa
seja a primeira vez para mim e meu coração dispara.
Quero que ele suba entre minhas pernas e beije a parte
interna da minha coxa enquanto eu me contorço e ofego. Quero
que me espalhe com os polegares e respire em mim, segure meus
olhos enquanto lambe os lábios. Quero que cubra meu centro
dolorido com sua língua e boca quente e me observe enquanto
eu me desenrolo completamente até que não consiga mais. Não
posso mais observá-lo enquanto me observa. Ver-me refletida, a
profunda e insaciável fome em seu olhar é um espelho meu.
É demais. Demais. Pressiono a base das minhas mãos nos
meus olhos fechados e me ouço choramingar contra a trilha
sonora de Billy devorando meu corpo com língua e dentes e
lábios, finalmente, finalmente me invade com os dedos.
“Oh Deus, oh Deus, Oh Deus,” canto, certa de que estou
dividida em dois com a enormidade e necessidade desse prazer.
Mais uma vez gozo, mas desta vez não consigo controlar o
instinto de arquear e curvar, tensa. Minhas pernas tentam se
fechar em torno de sua cabeça, enquanto sons insondáveis e
necessários absurdos passam por meus lábios. Ele pressiona a
palma da mão no meu estômago, talvez para me segurar ainda,
talvez para me impedir de lhe dar um olho roxo com o joelho.
Desta vez, a crise recua mais devagar, um mar agitado
subjugado ao longo do tempo por ondas suaves. Quando minhas
pernas relaxam, ele levanta a cabeça, beija o interior da minha
coxa, rouba uma mordida rápida da carne macia antes de subir
sobre mim e me reunir em seu corpo.
Eu me encolho nele, em seu calor, minhas mãos empurram
sob sua camisa e procuram por sua pele. Ele permite, me ajuda
levantando um cotovelo para poder remover a roupa ofensiva.
Reclinada mais uma vez em seus braços, minha bochecha
contra a parede do peito, respiro profundamente, luto contra a
súbita vontade de chorar enquanto exalo.
Quanto eu quis isso? E por quanto tempo? Essa
proximidade, intimidade com ele. Sinto como se estivesse em um
lindo sonho, e o terror de potencialmente acordar se arrasta
lentamente.
“Você é muito mais forte do que parece,” ele diz,
surpreendendo-me por ser o primeiro a quebrar o silêncio com
sua voz estridente.
Tenho um momento para pensar nas palavras dele, como
se meu centro de idiomas ainda não ligasse novamente. Quando
finalmente compreendo, levanto minha cabeça e olho para ele.
“Sou?”
“É.” Um sorriso suave, que não reconheço imediatamente,
ilumina seus olhos e dá a seus lábios a menor curva.
“Como assim?”
“Pensei que fosse quebrar meu queixo com suas coxas.”
Sua boca se contorce e de repente me lembro de onde vi
esse sorriso mal, esse brilho afetuoso por trás de seu olhar.
Assim que Billy Winston era quando estava feliz. Meu coração
dá um puxão, depois treme enquanto devoro essa visão dele,
gananciosa por isso, querendo esconder isso para mais tarde,
quando eu puder saborear a visão e a memória.
Mas então, suas sobrancelhas se unem, o sorriso diminui.
“Você está…”
“Estou ótima,” digo, meus olhos e nariz ardendo, e não
consigo me lembrar de ter falado palavras mais verdadeiras.
Ele me examina e posso ver que não sabe se estou dizendo
a verdade, então subo em cima dele, agarro seu rosto e beijo
seus magníficos lábios repetidamente, separando várias vezes
apenas o tempo suficiente para dizer coisas como, “Estou tão
bem” e “Nunca estive melhor,” e então o beijo novamente.
Billy me segura na cintura quando salpico seu rosto com
beijos, mas então suas mãos descem para o meu traseiro,
apertam e ele geme. Colocando-me no cobertor, ele se ergue
sobre o cotovelo, deitado no meio do corpo e continua a
massagear minhas costas.
“Tenho tantas coisas para lhe contar sobre o seu corpo,”
ele sussurra sombriamente contra o meu ouvido, me fazendo
tremer.
“Vai me contar sobre meu próprio corpo?” Tento forçar um
pouco de desprezo em minha voz, mas isso provavelmente é
desfeito pela maneira como minhas mãos se movem sobre seu
corpo, deliciando-me com cada centímetro quadrado de sua
perfeição física.
“Sim.” Ele beija meu pescoço, sua palma desliza para o meu
peito. “Seu corpo está em minha mente há muito, muito tempo.
Quero lhe contar tudo.”
Sua barba e suas palavras fazem cócegas e reflexivamente
inclino meu queixo no peito, rindo levemente.
“Isso faz cócegas,” ele diz, como se catalogasse informações
de grande importância.
“Sim. Isso faz cócegas.” digo, abruptamente dando uma boa
olhada em mim e no meu vestido arruinado e no meu peito nu
e...
Caramba! Só Deus sabe onde está minha calcinha. Esse
pensamento corta a névoa da luxúria extraordinária e sorrio
novamente.
Mas desta vez com alegria e admiração.

***

Nenhum de nós consegue encontrar minha calcinha.


Este fato é um pouco embaraçoso no começo. Tento agarrar
meu vestido nos seios e cobrir minhas costas enquanto também
seguro a saia no lugar.
Estou despreparada. Mentalmente despreparada para ser
um gatinho sexual confiante após a administração de Billy
Winston, induzida por orgasmo duplo. Além disso, há a questão
não tão pequena de minhas cicatrizes, nas costas e nos lados,
das omoplatas para baixo, e essas não são nada sexy.
Mas então Billy me entrega sua camiseta para vestir sobre
meu vestido rasgado, se oferece para remover sua cueca
também.
“Você não pode estar falando sério.” Agora agarro a camisa
dele no meu peito, efetivamente escondendo minha frente.
“Sempre falo sério.” Seus polegares engancham em seus
shorts, presumivelmente preparados para puxá-los para baixo
junto com sua cueca.
Meus pensamentos se dispersam porque sua voz mais o
olhar em seus olhos me dizem que fala sério. “E? Nós
simplesmente vamos ficar nus? Em um campo de cevada? Na
Toscana?”
Ele dá de ombros, olha para mim como se eu fosse fofa e
boba e ele quer me devorar, movendo a cintura de sua bermuda
duas polegadas para baixo, expondo mais aquela coisa deliciosa
em V entre seu quadril e uma mecha de cabelo escura logo acima
da sua...
“Espere!” Ofego. E então enterro meu rosto na camisa dele.
“Tarde demais,” ele diz.
E sinto uma pulsação de calor, como um BOOM, balançar
meu corpo, tudo enrolado e depois relaxa e enrola novamente.
“Você... você está nu?!"
Dê uma espiada, Scarlet. O que pode doer? Depois do que
acabaram de fazer, não seja idiota.
Nós estamos no meio da paixão! Isso é totalmente diferente.
E o que aconteceu ontem na piscina? Você basicamente
enfiou a mão dele na sua calcinha e agora está com vergonha?
Ele estava todo molhado. Billy Winston molhado é uma
dose letal de afrodisíaco em esteroides e metanfetamina. Além
disso, isso também foi embaraçoso depois.
Ele já te viu nua.
Engulo em seco, percebendo de uma só vez que ele me viu
nua. Ou, basicamente nua. E já viu a maioria das cicatrizes uma
vez.
“Sim. Estou nu,” ele confirma calmamente e acrescenta:
“Por enquanto.”
“O que isso significa?!” Gemo, a indecisão uma escala
musical de escalada entre meus ouvidos.
“Bem...” ouço um movimento e quase espio. Quase. “Isso
significa que, quando estava no topo, gozei principalmente na
barriga, mas também um pouco na cueca. Agora elas estão frias
e pegajosas, mas meu shorts parece estar bem.”
Ofego novamente, outro BOOM, mas então me sinto ainda
mais como uma idiota. Se pensar um momento sobre as coisas,
perceberei que foi o que aconteceu. Enquanto estava ocupada
pegando minhas alegrias durante a louca sessão de cavalgada e
trituração, ele também chegou ao clímax. O que também explica
por que meu vestido está úmido na frente.
Eu me sinto egoísta. Deveria me oferecer para ir atrás dele
também. Eu deveria ter...
“OK. Pode olhar agora.”
Espero mais alguns segundos, principalmente para me
controlar, deixo a camisa cair um pouco e olho para ele.
Esperava que estivesse na minha frente, fazendo algo sexy e
confiante. Billy é sexy e confiante, porque sempre foi sexy e
confiante, mas nem sua confiança nem sua sensualidade
apontam em minha direção. Ele nem olha para mim.
Andando pelo local do piquenique, ele reúne os pratos
descartados às pressas deixados por sua família, empilhando-
os, dobra cobertores, guarda comida, como se não acabamos de
nos atacar momentos atrás. Como se a vida mudou.
Tento descobrir como me sentir sobre seu comportamento
imperturbado e concentrado, se concentrando nas tarefas.
Enquanto isso, sou um plissado confuso de penas de cavalo
(Sim, sei que cavalos não têm penas. Esse é o ponto).
Seu olhar pisca para mim enquanto continua a trabalhar.
“Há algo de errado com a camisa?”
“Não,” digo fracamente, fazendo uma cara que
provavelmente parece com o meu nariz coçando.
Ele se senta nos calcanhares, ainda sem camisa, glorioso,
sexy, confiante e hipnotizante, e me estuda. “O que há de
errado?”
“É só...” levanto minha mão em direção a ele... “você está
agindo como se tudo estivesse normal, como se esse tipo de coisa
acontecesse todos os dias, e sinto que tudo não está normal.”
“Não está normal.”
Como posso descrever isso para ele? Como explicar como
me sinto abalada? A enormidade da minha felicidade e medo,
feliz porque finalmente demos o primeiro passo nessa linha, com
medo porque tenho medo de que algo aconteça e nunca mais
faremos novamente, ou que ele não queira fazer isso novamente,
ou não gostou de fazer isso comigo. O que, sim, dada a nossa
história compartilhada, pode parecer uma preocupação
infundada. Mas está aí.
Se alguém souber como parar de se preocupar com coisas
idiotas, ligue para mim.
Ele se levanta e caminha lentamente para mim, apreensão
nos olhos. “Você... se arrepende do que aconteceu?”
“NÃO!” Balanço a cabeça freneticamente, acrescentando
rapidamente: “Só de que isso não aconteceu mais cedo. Mas,
Billy, tudo está diferente agora. Novo. Mudado. Preciso que fale
comigo sobre o que está acontecendo em sua cabeça e coração.
Eu te amo.” Solto esta última parte, estremecendo um pouco
assim que as palavras saem da minha boca.
Na minha confissão, as feições de Billy suavizam, seu
sorriso pequeno, mas quente, satisfeito.
Não terminei. Já que disse isso, posso muito bem dizer
tudo. “Eu te amo,” repito, minha voz rouca e crua. “Quero que
fiquemos juntos, mas não quero te apressar. Sei que quer levar
as coisas devagar, e respeito isso. Você tem muitas
responsabilidades para tantas pessoas. Acho que quero saber o
que acontece depois da Itália. Isso parece um sonho, não a vida
real. Quero que estejamos juntos na vida real e quero saber
como é isso. Para você. Se também quiser.”
O persistente sorriso feliz em seus lábios e atrás de seus
olhos alivia um pouco da minha ansiedade. Tanto que me vejo
sorrindo também. Ele parece considerar a mim e minhas
palavras, debatendo-as silenciosamente, absorvendo todos os
seus possíveis significados. Isso é algo sobre ele que descobri
sempre que passamos um tempo significativo na companhia um
do outro. Quando ele demora a falar, é porque está sendo
atencioso com minhas palavras e as dele.
Tomando uma das minhas mãos, ele leva ao peito, ainda
sem camisa, sobre o coração, e a pressiona ali. “Não se engane,
o que aconteceu entre nós foi importante para mim. Minha vida
e meu coração foram transformados para sempre. Você é a
arquiteta e artista do meu paraíso pessoal. Agora, quando fecho
meus olhos, não preciso imaginar como é o céu. Saberei.”
Oh.
Se fosse do tipo que desmaia, teria desmaiado. De fato,
quer saber? Ainda posso.
“Mas Scarlet,” ele diz meu nome com reverência,
gentilmente, como se fosse uma oração que repete com
frequência: “Não precisava ver, tocar ou provar o paraíso para
saber o quão profundo e irrevogavelmente estou apaixonado por
você. Isso não mudou. Isso é tão constante quanto minha alma,
que sempre foi e sempre será sua.”
“Meu Deus,” suspiro mais do que disse a palavra, me
sentindo tonta, perdida no labirinto de suas palavras perfeitas.
Ele se aproxima e cuidadosamente coloca fios de cabelo
solto atrás da minha orelha como se fossem feitos de ouro, seus
olhos observam o lento progresso de seus dedos. “Quero estar
com você, agora e na vida real. E nossa vida real é nossa para
definir, de mais ninguém.” Seu tom é suave, mas contém uma
nota de desafio.
Como se desafiasse alguém a nos dizer como viver nossa
vida juntos.
Como se me desafiasse a discordar.
CAPÍTULO 15

CLAIRE

Billy carrega a cesta pesada. Eu carrego o cobertor. Ele me


disse para deixar todo o resto porque quer segurar minha mão
no caminho de volta.
Quero dizer, como posso argumentar com isso?
A diversão começa assim que entramos pela porta do
terraço que dá para a cozinha. Todo mundo está lá, e quero dizer
todo mundo. Todos os seus irmãos, seus cônjuges, o xerife, a sra.
James e até o pequeno Liam. A sala fica em silêncio assim que
entramos. Só posso imaginar como estamos: um Billy de peito
nu, eu de camisa, nós de mãos dadas, meu cabelo uma bagunça,
meus lábios inchados, ele ostenta pelo menos dois chupões. Pelo
menos coloquei minhas sandálias de volta nos pés.
Torço meus lábios, levanto meu queixo, faço o possível para
não sucumbir a ameaçadora mortificação enquanto olho para
Cletus. Seus olhos brilham, o demônio.
Preciso agradecer a ele mais tarde.
“Nem uma palavra,” Billy ordena, colocando a cesta no
chão e, em seguida, pega o cobertor de mim e coloca em cima.
Com isso, ele rapidamente me puxa da cozinha, passa
pelos olhos e lábios apertados com força de sua família no
corredor dos fundos. Assim que meu pé bate no terceiro degrau,
ouço a cozinha irromper em conversas, barulhos felizes,
conversas que me fazem cobrir o rosto e sorrir.
“Eles são loucos. Completamente loucos.” Ele sorri
levemente, me enviando um olhar de desculpas.
“É engraçado.” Limpo meus olhos. “E na verdade meio fofo.
Eles realmente amam você.”
“Realmente amam me irritar.”
“Você está irritado?”
“Não,” ele confessa, lutando contra um sorriso. “Mas não
diga isso a eles.”
Fizemos um plano voltando para a casa. Nós dois nos
limparíamos em seus próprios espaços, e depois partiríamos
para o resto do dia. Poderíamos pegar um trem para Florença,
pegar emprestado um dos carros alugados e dirigir até a cidade
de Siena ou Lucca, ou talvez ir comer pizza em Pisa. Quero tirar
uma daquelas fotos engraçadas onde parece que ele segura a
torre inclinada. Sorri com a sugestão, sem dizer nada, mas o
olhar em seus olhos me disse tudo o que preciso saber.
Ou seja, ele acha que sou tão ridícula quanto fofa.
Parte de mim prefere ficar suja de novo enquanto nos
lavamos juntos. Mas outra parte de mim, a parte que é tímida
sobre minhas cicatrizes e envergonhada por ver-me nua sente
alívio. Não quero que veja minhas cicatrizes novamente, ainda
não. Não quero falar sobre elas ainda. Quero deixar o passado
para trás por um tempo e ficar de olho no futuro.
Agora que me contou o que está em sua mente e coração,
pude ver suas ações na semana passada através desta nova
lente. Por exemplo, sua falta de toque parece mais restrição, não
desinteresse. Mas ainda não entendo o silêncio persistente dele.
Billy Winston é apenas uma pessoa notavelmente quieta
agora? E se sim, como me sinto sobre isso? Sinto falta da voz
dele, da partilha de pensamentos. Ele tinha uma mente tão
bonita, uma maneira inteligente de pensar sobre questões e
abordar problemas. Espero que não esconda isso de mim.
Ansiosa por vê-lo, tomo banho e me visto em tempo
recorde, tipo, dez minutos e então, em minha rápida caminhada
até o quarto dele, meu estômago ronca. Com fome e quase certa
de que ele também não comeu, pressiono meu ouvido na sua
porta. Ouço o som fraco de seu chuveiro ainda correndo e decido
ir até a cozinha e nos preparar uma tábua de charcutaria.
Charcutaria é uma daquelas palavras que nunca tentei
dizer em voz alta na frente das pessoas. Sei o que é, como é,
como fazer, mas sempre acabo esquecendo uma das sílabas
entre meu cérebro e minha boca.
“Char-cu-ta-ria,” sussurro várias vezes enquanto desço as
escadas, mas depois franzo a testa ao ouvir o som. “Char-cu-ta-
ria?” Tento.
Droga. Viu? Melhor chamar isso de aperitivo ou lanche.
Não me ocorre até que já estou no porão que os irmãos de
Billy e suas famílias ainda estão circulando, parabenizando a si
mesmos. Sentindo-me um pouco estranha ao ver todo mundo
depois do espetáculo de nossa entrada, vou na ponta dos pés em
direção à cozinha, minha coragem aumenta quando ouço
apenas um leve murmúrio de vozes. Ver duas ou três pessoas
não será tão ruim.
Espio pelo batente da porta. Cletus e Duane estão parados
nas proximidades, com Duane de frente para mim, uma severa
carranca estraga sua expressão.
“Vou garantir que sim,” Cletus é promissor, com um tom
razoável, mas firme, como se tentasse convencer Duane de
algum tipo de coisa. “Sei que está cansado, sono privado. Os
bebês são uma forma de tortura não coberta pela convenção de
Genebra. Apenas acalme-se. Ele provavelmente já disse a ela.
Viu como pareciam felizes?”
Sinto um sorriso pateta assumir minhas feições e estou
prestes a entrar na cozinha quando a voz brava de Duane diz:
“E se não disse a ela e Claire ainda não sabe?”
Meu corpo inteiro para e escuto antes se entender o fato de
que estou escutando.
“Então, como eu disse, vou me certificar, antes que ela vá
para o festival de música ou para Roma que Billy vai dizer a
verdade.”
Duane parece ficar mais agitado. “Sabe que eu amo Billy,
sabe que amo. Quero vê-lo feliz, assim como todos. Mas Scarlet
não tem ninguém. Se ele ainda não contou a ela...”
“Duane. Não é nada de ruim, ele não fez nada para
machucá-la. Tudo o que fez foi para protegê-la. Ele a salvou.”
“Mentir para alguém por décadas é doloroso. Acredite, falo
por experiência própria. Entendo por que mamãe, por que
Bethany, nunca contou a mim e a Beau e a verdade sobre
Christine ser nossa mãe biológica, mas isso não significa que
ainda não dói.”
Cletus se põe de pé, quando as palavras de Duane o afetam,
e sua voz suaviza. “Talvez eu não tenha a capacidade de saber
exatamente o que está sentindo, mas minha empatia funciona
muito bem. Confie em mim, Billy dirá a ela sobre o que fez
quando ela foi embora. Você tem minha palavra.”
“Toda a verdade.” Duane corta a mão no ar. “Tudo, desde
como eles mataram seu cachorro em troca daquela garota Carla
até como quase mataram Billy em troca por Claire.”
Recuo, minhas duas mãos voam para a minha boca para
sufocar um suspiro.
Mas Duane ainda fala e meus ouvidos gananciosos
continuam ouvindo, presos pelo meu próprio choque. “Como ele
se entregou voluntariamente e o espancaram tanto que perdeu
a chance de bolsas de estudos na faculdade. Como ficou no
hospital por meses e na reabilitação por meses depois. Tudo
isso.”
Recuo e me pressiono contra a parede, preciso do apoio
sólido enquanto abafo algo que tenta explodir do meu peito.
“Até essa tatuagem, por que ele a tem, o que encobre.”
“Contar a ela sobre o espancamento é suficiente, Duane.
Não há necessidade de traumatizar Claire com detalhes gráficos
e horríveis.”
“É importante que ela saiba e entenda o que fez por ela, a
extensão disso. Isso o mudou. Nunca mais foi o mesmo depois.”
Alguém resmunga, talvez Cletus, e ele diz: “Você e eu
estamos de acordo sobre os fundamentos.”
E então ele diz outra coisa, mas meu cérebro não consegue
compreender porque corre, procurando freneticamente o que sei
ser verdade. Ou o que penso que sabia ser verdade e o que pode
ser verdade e quem disse o quê, quando e...
Eles o espancaram?
Fecho os olhos enquanto imagino, detalhes sangrentos e
tudo, minhas costas deslizam pela parede enquanto meu corpo
treme com uma onda repentina de náusea e angústia. Minhas
pernas não aguentam meu peso e o peso dessa nova realidade.
Eu me curvo para frente e enterro meu rosto nas mãos e o
passado se levanta como uma onda, submergindo-me, me
sufoca e lava tudo o que penso ser verdade.
***

Depois que subo as escadas correndo e choro como se fosse


meu trabalho, deito na cama e me permito imaginar. Eu me
permito pensar no corpo quebrado de Billy. Se não o fizer, se
continuar afastando, ficarei louca.
Depois de fazer isso e aceitar o que fez por mim, quão jovem
era, quão corajoso e nobre, e o que perdeu, choro mais um
pouco. Lamento por ele, por aquele garoto que conhecia e
amava, e depois lamento pelo homem que se tornou e por todos
os encargos que ainda carrega.
Cenas do meu passado se materializam a seguir. Catalogo
todas as decisões que tomei que foram totalmente erradas,
equivocadas e baseadas em mentiras. Também lamento por
mim.
Lamento a menina de quinze anos, que pensava que o
garoto que amava não a amava de volta.
Lamento a menina de dezoito anos, que se sentia tão
obrigada a alguém que o deixava tocá-la quando e como ele
quisesse.
Lamento por aquela garota de dezenove anos, casando com
um garoto que se convenceu e a todos de que a amava enquanto
ela se convencia de que trabalharia todos os dias para ser digna
de seu amor. Talvez Ben não soubesse o que Billy fez por mim,
talvez soubesse. De qualquer maneira, mentiu para mim.
Independentemente disso, a verdade é que ele não sabia amar.
Só sabia possuir.
E então, eu a enterro. Todas as versões dela. Toda sua
miséria, covardia patética e decisões baseadas em medo e
informações falsas. Acabo com isso. Eu não a ressuscitarei.
Mas colocá-la para descansar não significa que não tenho
curiosidade, a necessidade de saber o porquê, de entender. As
perguntas, tantas perguntas, permanecem, sendo mais
importante e urgente: por que Billy não me disse a verdade?
Eu não era santa. Erros foram cometidos. Tentei o meu
melhor com o conhecimento disponível para mim e, mesmo
agora, acredito que Billy também tentou o seu melhor. Tem que
haver uma explicação. Tem que haver uma razão.
Quando penso em todos os nossos encontros, em todos os
momentos em que afastei Billy, implícita ou explicitamente, há
uma justificativa a cada vez. O que eu devia a Ben. Segurança.
Minha promessa a Bethany. Meus sentimentos de inutilidade.
Acreditava, no fundo que Billy merecia mais. Certo ou errado,
bom ou ruim, sempre havia uma razão.
No meu coração, tenho certeza de que Billy justificava a
mentira toda vez que decidiu ativamente ocultar a verdade. Ele
tinha suas razões, e não quero acreditar que nenhuma dessas
razões seja má. No entanto, Duane está certo, doí. Doí tanto.
E é aí que estou, magoada, confusa, questionando, quando
ouço uma batida suave na minha porta.
Lambo meus lábios secos, passo a mão nos olhos. Estão
secos, mas preciso limpar a garganta antes de dizer: “Entre.”
A porta se abre e sei que é ele. Não preciso olhar para cima.
Eu sinto.
“Ei,” ele diz. Um segundo depois, a porta se fecha e
caminha em minha direção. Posso vê-lo na minha visão
periférica.
Preparo, e odeio o que preciso fazer, levo um tempo sentada
na cama, dando-lhe um pequeno sorriso, mas retenho meus
olhos. “Ei.”
“Estive esperando por você. Dormiu?” Ele senta ao lado das
minhas pernas, coloca a mão no meu joelho, o polegar desenha
um círculo sobre a rótula. Então para. “Esteve chorando?”
Concordo, cruzando os braços. “Billy, preciso lhe contar
uma coisa.” Debato a melhor maneira de fazer isso, como
perguntar a ele sem confrontá-lo. Não estou com raiva. Talvez
devia estar, mas não estou. Estou machucada e cansada de me
sentir torcida.
“O que? O que há de errado?”
“É sobre algo que aconteceu há muito tempo.” Algum
instinto me faz cobrir sua mão com a minha. “E não planejava
lhe contar. Mas algo aconteceu hoje, e percebi que é melhor ser
honesta e potencialmente ferir a pessoa que mais gosto do que
protegê-la com segredos e mentiras.”
Ele fica muito quieto e não diz nada por tanto tempo que
olho para ele. Ele parece igualmente cauteloso e preocupado.
“O que é?”
Enrolo meus dedos nos dele, seguro sua mão mais
apertada. “Naquela noite que foi ao hotel, aquela última, quando
liguei para você, sua mãe ouviu nossa conversa. Ela deve ter
ouvido você no telefone falando comigo.”
“Minha mãe?” Seus olhos se estreitam, visivelmente
confusos, como se entreguei uma peça de um quebra-cabeça,
sem fornecer primeiro o quadro geral.
“Ela estava preocupada com você, então te seguiu até o
hotel. E depois que saiu, veio até a porta e me confrontou.”
Mantendo o olhar dele, coço minha testa, observo sua reação.
“Ela estava preocupada com o que fazíamos. Ela me pediu, em
sua maneira doce e gentil, para deixar você ir.”
Sua carranca é de confusão, não de raiva. “Minha mãe
pediu?”
“Sim,” confirmo calmamente. “E prometi a ela que ficaria
longe de você depois disso.”
Os olhos de Billy caem em nossas mãos, mas tenho a
sensação de que não as vê, ou a mim. Seu olhar se volta para
dentro. “Por que ela faria isso?”
“Não fique com raiva dela.” Aperto seus dedos. “Ela não
queria que se comprometesse por mim ou por ninguém. Não
queria esse tipo de mancha na sua alma. Não queria que vivesse
com a culpa de ser um traidor, ou talvez pior, justificasse isso
como algo aceitável, pegando o que queria apenas porque queria.
Disse que era como Darrell se comportava. Que ele podia
justificar cada uma de suas decisões prejudiciais, e tentou criar
você melhor do que isso. Concordei com ela, então prometi.”
Ele olha para mim enquanto falo e é estranho, o eco de seu
antigo eu logo abaixo da superfície. Ele parece tão jovem, quase
ingênuo. E parece magoado, como se essa informação sobre sua
mãe o machucasse. Claramente, o fato de Bethany pensar essas
coisas sobre ele é perturbador.
Sabia que seria, e é por isso que nunca quis contar a ele.
Não queria que pensasse mal de sua mãe. Não queria que a
memória dela estivesse corrompida. Ela não está aqui para se
defender, para explicar sua perspectiva. Não parece justo.
Mas talvez algumas situações não sejam justas e nunca
serão justas. Não importa quanto planejemos, pensemos e
tentemos compensar, a injustiça persiste.
Continuo: “Sei que seu pai a traiu muito, então acho que
atingiu perto de casa. Para ela. Não queria isso para você e...”
“Por que não me contou?” A pergunta confusa fortemente
temperada com acusação, e ele se levanta, puxando a mão dele.
Volto a dobrar meus braços, tentando ao máximo não
julgá-lo por sua explosão, apesar da hipocrisia. “A próxima vez
que te vi foi na noite anterior ao meu casamento com Ben, depois
de já ter prometido a Bethany que ficaria longe. Contar a você
então seria contraproducente para a minha promessa. Quando
Ben morreu, isso não parecia relevante. Estar com você,
compartilhar uma vida com você parecia uma impossibilidade.
Estava me afogando em tanto ódio e...”
“E as palavras dela reforçaram isso,” ele corta com raiva.
“Deveria ter me contado. Não admira que me odiasse, não
admira que não suportava olhar para mim. Ela fez você se sentir
como se estivesse errada.”
“Eu estava errada.”
“Não.”
“Não. Eu estava. Esgueirar-me por aí estava errado, Billy.
Devia ser honesta. Não fui. Fui uma covarde e paguei o preço.
Sua mãe decepcionada comigo, perder a confiança dela, isso
fazia parte do preço. Ações têm consequências, não podemos nos
esconder delas. Sempre que ela e eu estávamos juntas no mesmo
lugar depois disso, podia ver como olhava para mim, como se
fosse uma estranha em quem não confiava, que queria
corromper o filho.”
Ele enfia os dedos nos cabelos, girando e resmunga. “Não!
Você não estava sozinha. Eu estava lá com você. Ela nunca
deveria ter colocado isso em seus ombros. Fui eu quem te
procurou, te levei a aquele hotel. Se um de nós corrompeu o
outro, fui eu. Queria corromper você, Deus, como queria. E ela
nunca deveria ter se aproximado de você, deveria ter vindo até
mim.”
“Ei, ei. Entendo.” Levanto, desejando poder alcançá-lo e
terminar esta conversa com abraços e beijos reconfortantes, mas
sabendo que ainda há muito a dizer. “Colocando-me no lugar
dela, eu entendo. Não a culpo; não estava brava com Bethany.
Tudo o que fez foi me dizer a verdade. Pode ser doloroso ouvir,
mas isso não torna o que disse menos verdadeiro. E se fosse
sincera, se todos fossemos sinceros desde o início, e corajosos o
suficiente para sermos honestos um com o outro sobre tudo,
toda essa mágoa poderia ser evitada.”
Mais uma vez, ele fica muito quieto e absorve minhas
palavras. Mas desta vez a quietude é diferente, a energia dele
está diferente. É como ver um animal perceber lentamente que
foi encurralado.
Ele vira. E olha para mim, meio em pânico, meio com raiva.
“Você sabe.”
Encontro seu olhar diretamente, fazendo o melhor para
manter a dor longe do meu e sussurro: “Sim. Eu sei.”
“Como?” Agora ele sussurra, pânico supera a raiva. Pelo
momento.
Ignoro sua pergunta em favor da minha. “Em algum
momento, houve alguma chance de me dizer a verdade sobre
aceitar meu castigo? Sobre salvar minha vida?”
Seu queixo levanta um pouco, e vejo quando reconstrói a
parede entre nós. Assisto com meus próprios olhos enquanto
meu estômago afunda. Tijolo por tijolo. Até que ele está em sua
fortaleza e me deixa do lado de fora.
“Quem te contou?” Sua voz fica fria, distante, e arrepia a
espinha.
“Ninguém. Ninguém me disse” falo baixinho, gentilmente,
mas sem tentar esconder meu cansaço. Estou tão cansada. Até
os ossos.
“Você não quer me dizer.”
“Não. Estou dizendo a verdade. Ouvi dois de seus irmãos
conversar, ouvi o meu nome e de repente estava ouvindo antes
que soubesse o que acontecia, como se estivesse presa, não
pudesse me mover. Foi assim que descobri.”
“Quem foi?”
Minha boca se curva em um sorriso triste. “Não vou te
dizer, porque isso não importa. O que importa é, por que não me
contou?”
Ele não diz nada. E porque se barricou tão completamente,
não tenho ideia do que pensa.
“Tudo bem.” Olho para trás, ignoro a dor aguda no meu
peito. “Você não responderá a essa pergunta, mas aqui estão
algumas outras. Por que tem essa tatuagem? O que cobre?”
Silêncio.
“Ok, que tal essa. Ben sabia o que fez por mim?”
Também não esperava que ele respondesse, então quando
imediatamente diz: “Sim,” eu me encolho.
Eu me viro, segurando meu estômago. Mesmo que Ben não
soubesse o que Billy fez para garantir minha segurança, Ben
ainda mentiu para mim. Mas agora? Agora não há maneira de
contornar isso. Ben assumiu o crédito pelo sofrimento de Billy.
Eu me sinto enjoada. Suspeitava e esperava que Ben não
soubesse, mas ouvi-lo confirmar parece um soco no estômago.
Cegamente avanço, encontro a cama. Sento nela. “Não
acredito que ele mentiu para mim.”
“Ele sabia o tempo todo.” A voz de Billy em algum lugar
atrás de mim é monótona, sem emoção. “Até me visitou quando
estava no hospital. Quando o questionei sobre onde você estava,
agiu como se estivesse inacessível, mas segura. E então, mais de
um ano depois daquela noite na sessão de música, mais de um
ano após a noite da sua festa de noivado, ele me procurou para
falar sobre isso.”
“Para falar sobre isso?” Eu me viro para olhar Billy por cima
do ombro. “O que ele disse?”
“Não queria que lhe dissesse e estava de acordo. Pensou
que eu ia dizer.” Uma ligeira rachadura se manifesta atrás de
seu exterior de granito quando olha para mim. “Mas não tinha
ideia até que me disse em Florença que ele mentiu para você
como fez. Não tinha ideia de que lhe contou que a família dele
era a razão pela qual Razor deixou você em paz.”
Incrédula, pergunto: “O que achou que Ben diria? Quando
perguntei a ele? Teve que me convencer de que era seguro voltar
para Green Valley. E como nenhum de vocês me contaria a
verdade, é claro que mentiu.”
“Você está defendendo ele?”
“Não. Não estou. Só estou perguntando o que esperava. Se
você se recusou a me dizer a verdade, por que está surpreso por
ele ter mentido?”
“Ben queria o melhor para si, então tomou decisões por
você, por isso mentiu.”
Eu me viro completamente, encarando-o, a raiva
finalmente desperta dentro de mim. “Então qual é a sua
desculpa? Vocês, vocês dois, tiraram minha capacidade de
tomar decisões. Você tirou das minhas mãos. Não tinha todas as
informações, Billy.”
O queixo de Billy fica tenso, seus olhos se fecham
novamente enquanto ele grunhe: “Então acho que Ben e eu
temos mais em comum do que gostaria de admitir.”
Mais uma vez, suas palavras carecem de emoção e, por trás
de seu olhar, um tipo frio de certeza, uma resignação se instala.
Odeio quando olha para mim desse jeito, como se pensasse
que sabe tudo que acontece na minha cabeça e apenas assume
que qualquer ação que o machuque mais será o curso de ação
que eu tomar. Ainda mais, odeio que, até recentemente suas
suposições estivessem na maior parte certas.
Porque nunca soube, porque ele nunca me contou. Fiz o
melhor que pude com as informações que tinha.
“Quer saber? Eu me rendo.” Levanto. Levanto minhas
mãos, mostrando-lhe as palmas das mãos. “Costumava dizer
que você e eu trazíamos o pior um do outro. Nós trazemos.
Porque você quer que eu cumpra suas expectativas. Quer
acreditar no pior de mim. Quer me vê tropeçar e cair e, em vez
de oferecer uma mão, fica à margem e se parabeniza por ter
ganho o jogo.”
No meio do meu pequeno discurso, Billy começa a balançar
a cabeça, os olhos vidrados. E quando termino, ele se vira e vai
embora, cruzando a porta.
Percebo sua intenção de sair e corro atrás dele, passo por
ele e bloqueio seu caminho, exigindo: “Onde você vai?”
Ele não olha para mim. “Essa conversa é inútil,
terminamos.”
“Não. Não terminamos. Vamos ter essa conversa. Estamos
no meio dessa conversa. Está acontecendo quer goste ou não.
Não é de admirar que me odiasse tanto. Não é à toa que se
ressentiu tanto comigo.”
Seu olhar, agora irritado, corta para o meu: “Eu me ressenti
porque estava apaixonada por mim e não era honesta consigo
mesma. Eu me ressenti porque escolheu a culpa em vez de nós,
várias e várias vezes. Ben não era a terceira pessoa em nosso
relacionamento, Scarlet. Sua culpa era. Nós não vamos fazer
isso. Não quero sua culpa.”
Billy se vira e caminha para longe, novamente passa os
dedos pelos cabelos.
Eu o sigo, sem tentar moderar o volume da minha voz. “Por
que não me contou? Por que não me disse a verdade?”
“Você está brincando, certo?” Ele me dá apenas seu perfil,
sua boca bonita se curva em um sorriso amargo. “Vi como se
retorcia por Ben, como mentiu para ele sobre o que queria e o
que sentia, sobre como mentiu para você. Como, sempre que há
algum desequilíbrio, sente que precisa trabalhar para a outra
pessoa.” Finalmente, ele me encara. “Você não é minha
funcionária, Scarlet. Não quero que trabalhe para mim. Então
não. Não quero o tipo de relacionamento que tinha com Ben. Não
quero isso para nós. Queria que me escolhesse livre e claro, livre
de dívidas, livre de obrigações. Sem. Dívida.”
“Há uma dívida! Você desistiu de tudo por mim e, então,
quando podia me dizer a verdade...”
“Não. Não desisti de tudo por você. Não desisti da minha
família. Não desisti do futuro deles. Não desisti da minha mãe.
Não desisti do meu emprego na Payton Mills. Construí uma vida
mesmo esperando, sempre esperando, que eventualmente me
escolhesse. Que me quisesse. Não porque me devia. É assim que
funciona, Scarlet. O amor não é sobre desistir. É sobre nunca
desistir.”
CAPÍTULO 16

CLAIRE

“E depois o que aconteceu?”


“E depois!” Jogo minhas mãos para o alto, ando de um lado
para o outro na frente de Sienna. “Ele saiu. Acabou de sair. E
bateu a porta ao sair!”
Estamos atualmente no seu quarto. Ela me encontrou na
cozinha agredindo a massa de pão (ou seja, amassando-a) e
gentilmente me convenceu a deixá-la de lado, convenceu-me a
vir ao seu quarto e conversar. E assim eu fiz. Contei tudo a ela.
TUDO. Mesmo como perdi minha calcinha no campo de cevada.
Ela me disse que Lucy Honeychurch2 ficaria orgulhosa, o
que quer que isso signifique.
“O que você fez? Depois que ele bateu a porta?” Sienna está
sentada no braço do sofá, com os braços cruzados, os olhos
arregalados enquanto segue meus movimentos frenéticos.

2
Personagem do Filme A Room with a View (br: Uma Janela para o Amor). No início do Século XX, a jovem
inglesa Lucy viaja pela primeira vez para Florença, na Itália. Lá chegando, ela encontra o excêntrico George
Emerson, por quem acaba se apaixonando. Ao retornar a Inglaterra, terá de fazer uma grande escolha em sua
vida: casar-se com seu antigo noivo ou seguir seu coração e procurar o recém conhecido George.
“Depois de alguns segundos, fui atrás dele, pensei que foi
para o quarto, mas não estava lá. Então desci as escadas e
procurei nessa enorme monstruosidade de casa por ele.”
“Então, ele diz que o amor nunca desiste, e sai?” Ela parece
tão confusa quanto eu.
“Sim. Exatamente. Ele me deixa louca e não faz sentido!”
Enceno estrangulá-lo.
“E não conseguiu encontrá-lo?”
“Não. Não, não consegui.” Uma respiração dolorida deixa
meus pulmões e paro meu ritmo frenético. “Não posso. Não
consigo encontrá-lo.”
Minha amiga fica quieta por um momento e depois desliza
do braço do sofá para uma das almofadas. “Conhecendo Billy,
posso acreditar em todas essas coisas. Isso soa como ele. Quero
dizer, ser estupidamente nobre e toma decisões incrivelmente
idiotas com base em avaliações em preto e branco que exigem
nuances e sutilezas. Não entendo por que não contou a verdade
originalmente.”
“No começo, tenho certeza de que ele não sabia onde eu
estava ou como me alcançar. Dado o que agora sei sobre Ben,
estou convencida de que não queria que Billy me encontrasse.”
“Assim... Ben era um idiota?”
Balanço minha cabeça, sinto-me impotente para responder
a essa pergunta. “Não sei. Talvez. Sim. Às vezes. Mas, e não
estou defendendo ele, mas não somos todos idiotas às vezes?
Não era um vilão, mas definitivamente não era um santo.”
“Discordo, mas isso é algo que definitivamente deve
discutir com seu terapeuta. De volta a Billy, por que não contou
a verdade quando você voltou para Green Valley?”
“Ele disse que não me contou porque não queria que eu me
sentisse em dívida com ele.” Reviro os olhos. “Mas o que ainda
não parece entender é que sou louca de amor por ele e estava à
procura de uma razão, qualquer razão em tudo para jogar
minhas promessas fora da janela e saltar em seus ossos!”
“Caramba.”
“Eu sei! Quero dizer, quando disse a Bethany Winston que
ficaria longe do filho dela, não tinha ideia...”
“O quê? Espere o quê? Bethany pediu para ficar longe de
Billy? Quando foi isso?”
“Argh. Apenas esqueça que disse isso. É história antiga. A
questão é Billy e essa situação impossível. Quero estar com esse
homem e ele não confia em mim para ficar com ele sem sentir
que há uma dívida a ser paga. E assim, sinto que nunca vai
confiar em mim sobre o quanto eu o quero, a menos que faça
algo para limpar o balanço patrimonial entre nós e deixá-lo em
dívida comigo.”
“Não faça isso. Então será uma vida inteira mantendo a
pontuação e eu, por exemplo, odeio matemática.”
“E ainda estou brava com ele. Não pediu desculpas! É como
se fosse incapaz de ver isso da minha perspectiva.”
“Você deve seduzi-lo.”
Faço uma careta, certa de que a ouvi mal. “O quê?”
“Seduza-o. Então, no meio das preliminares, explique para
ele. Os homens são muito mais receptivos a admitir que estão
errados quando estão prestes a transar.”
“Sienna.” Coloco uma mão no meu quadril. “Parece que sei
alguma coisa sobre seduzir um homem?”
“Honestamente?” Seus olhos se movem para baixo e depois
para o meu corpo. “Parece que pode escrever um livro sobre o
assunto. Além disso, o que há para seduzir homens? Apenas
fique nua e deite na cama. Todo o sangue sai do cérebro e eles
não conseguem pensar. Ciência.”
Apesar da tristeza da situação, sorrio.
Ou talvez, por causa da desolação da situação, sorrio.
Arrasto meus pés, vou até o sofá e sento ao seu lado. “Não
sei o que fazer. É como se estou sempre batendo minha cabeça
contra paredes de tijolo, querendo coisas que são impossíveis.”
“O que é impossível? O que é que você quer?”
“Billy entender minha perspectiva e se desculpar,
sinceramente. E então quero garantias de que parou de esconder
a verdade. Primeiro, manteve o fato de que Duane e Beau são
meus irmãos em segredo, agora isso. Se houver algum segredo
residual, quero conhecê-lo.”
“Não quer que ele rasteje?” Sienna empurra meu braço
levemente com as pontas dos dedos. “Implore por perdão?”
Dou a ela um olhar lateral. “Billy não implora.”
“Mas seria legal, certo? Se fizer?” Agora ela me dá uma
cotovelada. “Imagine-o, de joelhos, uma rosa em sua boca,
vestindo um daqueles ternos sensuais e bem feitos dele, quem é
o alfaiate, aliás? com as mãos entrelaçadas. Pegue-me de volta,
Claire! PEGUE-ME DE VOLTA!”
Sorrio da imagem que pintou e sua imitação dramática, é
tão absurda. “Honestamente? Não. Não preciso que implore.
Preciso dele comigo. Preciso que fique e converse sobre tudo,
para que possamos construir uma ponte para o outro lado
juntos. Sinto que todos esses segredos entre nós construíram
pontes para lugar nenhum. E depois...”
“E depois?”
Não posso evitar o meu sorriso triste enquanto olho para
ela. “Seria terrível se dissesse muito sexo?”
Agora Sienna sorri, com a cabeça jogada para trás
enquanto bate na perna com a palma da mão. Seu riso é
excepcionalmente amigável, então é claro que também sorrio,
mesmo que minhas bochechas esquentaram com a admissão.
Não estou brincando.
Quando ela para, seus olhos se voltam e avaliam enquanto
se movem sobre o meu rosto. “Nada disso parece impossível.”
Olho para ela. “É, quando nem consigo fazê-lo falar
comigo.”
“Não se preocupe com isso.” Ela dá um tapinha na minha
perna e depois se levanta. “Deixe comigo.”
Observo ela atravessar a sala, pegar seu telefone, destravar
e depois digitar furiosamente.
“Deixar o quê para você?” Meu estômago torce com
desconforto. Uma coisa é ser o destinatário involuntário das
travessuras e piadas da família Winston. Outra coisa é estar em
conflito com eles.
Confirmando meus medos, Sienna sorri e pisca, levanta o
telefone no ouvido. “Ou, mais precisamente, deixe conosco.”

***

Billy está com Ashley.


Sienna ligou para Jethro e Jethro ligou para Duane e
Duane ligou para Cletus e Cletus enviou uma mensagem em
grupo.

Cletus: Sei que você odeia mensagens de texto em


grupo da mesma forma que eu, mas alguém pode gritar de
volta se Billy estiver com você?
A irmã deles envia uma mensagem quase imediatamente.
Ashley: Ele está comigo, me ajudando a carregar
mantimentos no morro. Por quê?
Cletus: Pare-o. Vou levar Claire até aí e ajudo você a
carregar as sacolas pelo resto do caminho.
Ashley: Com certeza. De repente me sinto fraca.

Cletus me encontra na porta da frente e vamos juntos


descer a colina. Ele não faz perguntas. De fato, com uma
expressão sombria, os braços balançam com propósito, os olhos
fixos e não diz nada.
Billy e Ashley aparecem quase imediatamente assim que
saímos da entrada de cascalho e cortamos a íngreme trilha
natural que fica ao lado de um pequeno riacho. Uma quantidade
grande de arbustos de lavanda se alinha no outro lado da trilha,
onde pequenas borboletas brancas flertam com as flores roxas.
Do outro lado do riacho, há uma cerca de madeira rústica e,
além dela, há uma vinha, fileiras ordenadas de videiras verde-
esmeralda, cobertas no final com roseiras em plena floração.
Ashley está sentada em uma grande pedra perto da trilha,
os cotovelos sobre os joelhos, sorrateiramente olha para o morro
de vez em quando. Billy está agachado na sua frente, de costas
para nós, com a cabeça inclinada como se estivesse procurando
tensão ou ferimento.
Sinto uma pontada de culpa, mas apenas uma pontada. Se
não tivesse saído, então não o enganaria agora. Talvez essa seja
uma lógica absurda, mas é a única lógica que tenho.
Estamos a uns quinze metros de distância quando Billy
olha distraidamente por cima do ombro, dá uma olhada dupla e
depois se levanta lentamente. A transformação de seus traços,
num minuto surpreso, no próximo zangado, no próximo
distante, completa quando nos encara e coloca lentamente as
mãos nos bolsos.
“O grande irmão está orgulhoso,” Cletus murmura
baixinho.
“Ah. Olhe para mim.” Ashley se levanta da rocha onde está
sentada, vira para pegar várias sacolas de pano. “Estou me
sentindo bastante recuperada de repente.”
Billy olha para sua irmã e depois olha para Cletus. “Deixe-
me adivinhar, precisa que eu volte à loja para alguma coisa?”
“Sim.” Cletus fecha a distância para o irmão e pega as
compras perto dos pés de Billy, enquanto Ashley não perde
tempo em passar por todos nós em linha reta, subindo a colina
com a destreza de um alpinista profissional.
“O que você precisa?” Billy pergunta categoricamente.
“Não sei. Queijo parmesão, talvez. Parece que usamos tudo
aqui. Você volta para a loja com Billy?” Cletus dirige esta
pergunta para mim, mas seus olhos estão no irmão. “Ele não
consegue sair de um saco de papel, porque os sacos de papel são
feitos de madeira e isso está muito perto de ser como uma
árvore.”
“Sim. Claro. Volto com ele, sem problemas.” Apesar do
nervoso no estômago, pressiono meus lábios para não sorrir com
as palhaçadas de Cletus.
Cletus dá a Billy mais um olhar melancólico e depois se
vira e segue atrás de Ashley. Observo-os partir até
desaparecerem além do topo da colina. E então olho para o local
onde desapareceram por mais alguns segundos, reúno meus
pensamentos. Então olho para Billy.
Ele não está olhando para mim. Suas mãos ainda estão nos
bolsos e os olhos estão na vinha do outro lado do riacho. A linha
severa de sua mandíbula e o pulsar em sua têmpora me dizem
que está descontente com meu sequestro surpresa.
“Sabe...” Dou pequenos passos ao longo da trilha até
ficarmos lado a lado, eu de frente para ele e a lavanda, ele de
frente para o riacho, a cerca e o vinhedo. “Sabe por que eles
plantam a roseira na borda de cada linha?”
Ele não diz nada, apenas fica olhando. E ele me chama de
teimosa.
“É porque a roseira e a videira são suscetíveis aos mesmos
tipos de doenças. A roseira é a versão italiana do canário na
mina de carvão, por assim dizer.”
Seu olhar desvia para o riacho, mas ainda não diz nada.
Quer silêncio? Tudo bem. Mas não vou sair até conversar sobre
isso.
Fecho os olhos, ouço a água passar correndo e um pássaro
chamar outro pássaro no céu, inalo o perfume inebriante de
lavanda, grama verde, sujeira e sol.
“Então é isso que parece,” falo, principalmente para mim.
Ele persiste em silêncio, acho que não vai responder.
Então, quando abro meus olhos e descubro que seu olhar está
fixo no meu rosto, apenas olhando, fico surpresa.
“Como é?” Ele pergunta, finalmente falando.
“O tratamento silencioso.” Meus lábios se curvam e estudo
o azul de seus olhos. Decido chamá-lo de geleira da Toscana a
partir de agora. “Esqueci como era quando decide que não vale
a pena conversar. Espere um minuto, antes de me encarar com
esses lindos olhos julgadores, percebo que passamos por um
período épico onde eu dava o tratamento silencioso. Então,
talvez deva aceitar isso agora como minha dívida, e talvez a
mudança seja um jogo justo. Talvez deva ser fácil para mim. Mas
isso não é fácil. É difícil.”
Fico animada com o fato de que, embora esteja firmemente
acampado em sua fortaleza blindada, não desvia o olhar.
Testo minha sorte. “Por favor. Conte-me. Por que tem essa
tatuagem? O que está cobrindo?”
Seus cílios tremem, como se joguei poeira em seus olhos, e
sua garganta funciona. “Não quero te contar.”
“Por que não?”
“Porque está cobrindo o nome do seu pai.”
Meu estômago aperta, o mundo se inclina e sussurro, “O
quê?”
Fechando os olhos, ele diz, “Quando me levaram, Razor
cortou seu nome no meu ombro primeiro. Então conectou as
linhas para que parecessem marcas aleatórias. Mas eu sabia.
Então cobri com uma tatuagem.”
Levanto meus dedos para cobrir minha boca, olho para ele
horrorizada, porque sei exatamente como é. “Não posso... sinto
muito. Sinto muito.” Não quero imaginar isso, mas como não
fazer? A imagem me assombrará pelo resto da minha vida e pela
sensação de desamparo.
Ele abre os olhos, a desolação em seu olhar rapidamente
eclipsada pela frustração. “Não me olhe assim.” Sua voz é como
granito, fria e severa.
“Assim como?” Sussurro.
“Não sou Ben.”
Pisco, confusa. “Que bobagem está falando?”
“Nunca te disse, porque não queria que olhasse para mim
como o olhava, com partes iguais de adoração e ressentimento.
Não sou um herói. Sou homem e estava apaixonado por você, e
queria que me visse, me quisesse.”
Dou um passo mais perto, incentivada pela honestidade e
gentileza cruas de seu tom. “Acha que eu não te queria?”
“Ah, eu sabia que sim, isso nunca esteve em dúvida.” Ele
parece tão triste. “Mas nunca me viu com clareza suficiente para
fazer algo a respeito.”
“E de quem é a culpa?”
Seu pomo de Adão mexe, como que engolindo minha
afirmação ou sua reação a ela.
Ele esfrega a testa. “Fiz o que fiz. E acabou, acabou e a vida
mudou.”
“Então está dizendo que mudou completamente de ser
espancado quase até a morte? Está dizendo que não fez isso por
mim?”
Billy concorda com firmeza, volta sua atenção para a vinha.
“Isso mesmo, fiz por mim mesmo.”
“Você disse que amar significa nunca desistir.” Estudo seu
perfil, espantada com a serenidade da nossa conversa até agora,
tão aberta, honesta e calma. “Bem, mentir para alguém também
não é como o amor funciona. É assim que o medo funciona.
Mentir para mim significa que não confia em mim.”
Seus olhos se voltam para os meus, há dor por trás deles,
mas não raiva. “Você não sabe.”
“O quê? O que não sei?” Piso na sua frente. Cedo ao desejo
de colocar minhas mãos nele, agarro seus antebraços. “Fale
comigo. Por favor, apenas fale comigo.”
“Bem. Não conseguia lidar com o pensamento de algo
acontecer com você, seu pai colocar as mãos em você
novamente. Ia fazer o que fosse preciso.” Ele vira os pulsos,
desliza as mãos pelos meus braços até meus ombros. Segura
meu olhar, olha profundamente nos meus olhos, como se a
próxima parte fosse extremamente importante. “Mas isso não é
seu, não é de sua responsabilidade. Tomei a decisão por mim,
não por você. Fiz isso por mim mesmo.”
“Essa é uma lógica maluca, Billy. Você fez isso por mim e
passou dezoito anos me odiando, magoado comigo porque eu
não fazia ideia.”
Ele balança a cabeça, parece decepcionado com a minha
interpretação. “Não. Não foi isso que aconteceu.”
“Mesmo que seja um pouco verdade, mesmo que apenas
um pouco do seu ressentimento provocou sua punição, foi
exatamente o que aconteceu.”
“Isso não muda nada. Fiz o que fiz. Não fiz isso por você, fiz
por mim mesmo. E não me arrependo. É o que eu queria. Você
não entende isso?”
É assim que ele racionaliza suas decisões para si, como
racionaliza esconder a verdade de mim. Pelo menos agora tenho
minha resposta. Billy nunca me disse a verdade porque estava
com medo. Não confiava em meu amor sem obrigação, e não
confia em mim agora.
Coloco as palmas das mãos contra seu peito, agarro um
punhado frouxo de sua camisa. “É isso que entendo: você se
esconde de mim, grandes e enormes partes, porque não confia
em mim para aceitá-las e amá-lo. Quando estávamos nos
escondendo por aí, nos encontrando no hotel, nunca quis
discutir o passado. Nunca quis falar sobre algo que veio antes,
o que aconteceu enquanto eu estava fora. Pensei que era porque
não queria ouvir sobre Ben. Mas agora vejo que não queria que
eu soubesse de você.”
Billy continua a me olhar por trás de sua fortaleza, o queixo
apertado, o silêncio em sua espada. Tudo bem. Talvez me ouça,
talvez não, mas ainda tenho coisas que precisam ser ditas.
“Acha que sou uma leitora de mentes?” Pergunto baixinho,
inspeciono seu rosto bonito. “Bem, não consigo ler sua mente.
Não sei o que quer ou o que está em seu coração se não me
disser. Estou cansada dos segredos, estou cansada das
mentiras, especialmente mentiras para o meu suposto
benefício.”
Sua mandíbula aperta e penso detectar uma rachadura na
fortaleza, uma leve queda de pedra. Mas talvez seja apenas meu
desejo.
“Escute-me. Ouça. Sabe o quão difícil foi parar de me
culpar e me odiar por ser desleal com Ben porque pensei que me
salvou? Tem alguma ideia? E agora acontece que ele mentiu
para mim.”
Deixo isso afundar. Deixo-o marinar.
E então continuo, “Já lhe ocorreu que guardar esse segredo
era prejudicial? Já parou de pensar em si e no que queria de
mim por tempo suficiente para perceber que me trancou no
limbo? E tinha a chave o tempo todo.”
Enquanto falo, Billy pisca e se encolhe, como se minhas
palavras o cortassem. Seu olhar perde o foco.
Mas não terminei. “Finja por um momento que não estava
apaixonado por mim, não queria nada de mim, exceto a minha
felicidade. Finja que éramos apenas amigos. Você me diria a
verdade então? Se a minha felicidade fosse tudo o que
importava, o que teria feito?”
A percepção afia atrás de seus olhos, seus lábios se
separam, dá a sensação de que isso, o que acabei de dizer, nunca
ocorreu a ele.
“Então, você está certo.” Aperto meus dedos em torno do
tecido de sua camisa. “Não te devo nada. Essa dívida foi paga
dez vezes.”
Para seu crédito, a ponte levadiça baixa com um estrondo
e revela uma repentina angústia e remorso. Grande, enorme
remorso. Tanto remorso. Sai de seus olhos e da respiração
irregular que vem de seus lábios separados.
“Scarlet,” ele sussurra, o som do meu nome forjado em auto
recriminação torturada. “Sinto muito.”
“Obrigada por se desculpar.” Dou um passo para trás,
minhas mãos caem da sua camisa. “Mas para onde vamos
daqui? Não sei, realmente não sei. Mas deixe-me ser cem por
cento clara: ainda te amo e ainda quero estar com você.”
Ele estremece novamente, tropeça um passo à frente, seus
dedos em meus ombros flexionam, e reconheço os sinais
reveladores de vergonha e culpa, que me fazem sentir culpada.
Mentalmente, empurro a culpa para longe, raspo e jogo no lixo.
É isso mesmo, não há mais culpa para mim.
“Não me interprete mal, estou louca como o inferno,”
continuo em tom suave, porque só quero gentileza entre nós a
partir de agora. “É onde nós estamos. Estou com raiva de você e
ainda te amo. E não é por causa de algum senso estúpido de
obrigação ou de qualquer tolice. Terminei com isso. Ainda quero
você na minha vida. E, no entanto, tenho que me perguntar,
sobre o que mais está mentindo para mim?” Procuro em seus
olhos da geleira da Toscana a verdade. “Que outros segredos está
guardando?”
CAPÍTULO 17

BILLY

“Acho sua falta de progresso decepcionante.”


Olho para o meu irmão. Cletus que se materializa perto do
meu ombro sem perceber sua abordagem. Dadas as questões
importantes em minha cabeça, não estou surpreso que ele foi
capaz de se esgueirar.
A maioria dos meus irmãos e seus parceiros estão se
movendo, socializam e limpam o chão da sala de música, de
modo que haja espaço suficiente para dançar. Scarlet está
prestes a cantar, e Drew senta-se ao seu lado e afina um violão.
Pairo dentro da única saída, sem saber se fico ou vou. O que
resume os últimos dias.
“Por que não faz algo produtivo em vez de ficar aqui,
meditando?” Cletus resmunga e cruza os braços.
Antes que possa responder à pergunta de Cletus, Jenn diz,
“Existe uma linha tênue entre dar espaço a uma pessoa e manter
distância, Cletus. Tenho certeza de que Billy está fazendo o que
acha certo.”
Agora olho para Jenn. Também não a ouvi se aproximar.
“Você está bem, Billy?” Ela sorri para mim, seus olhos de
um tom surpreendente de roxo em seu rosto recentemente
bronzeado.
Debato como responder à sua pergunta, pois não há como
dizer que estou bem para Jennifer. A mulher é muito
observadora e nos tornamos muito próximos nos últimos anos
para delicadezas.
Estou bem? Bem, como sempre, quero mais. Quero que
Scarlet me perdoe; quero me perdoar por minhas escolhas de
merda e egoístas; quero que confie em mim; quero abraçá-la e
beijá-la, fazer amor com ela, conversar, ouvi-la cantar, fazer com
que me ensine a dançar.
Mas primeiro, preciso contar a Scarlet sobre Razor, o que
fiz com ele, e não tenho nenhuma justificativa boa para evitar
esse assunto, além de escolhas mais egoístas e de merda. Fico
frustrado que o nosso passado sempre tem mais importância do
que o nosso futuro, mas esse não é um bom motivo. Da mesma
forma, lembrar-me disso, o momento, a violência, é difícil, e não
tenho certeza do que fazer com a investigação do FBI, e não
quero discutir isso, mas esse também não é um bom motivo.
Fui criado por um homem violento. Já fui vítima de
violência extrema muitas vezes. Cometi atos de violência contra
os outros. Não me arrependi daqueles atos. Cada vez fiz o que
precisava ser feito, e ainda não gosto particularmente do
pensamento de expô-la a esse lado meu, quem me tornei.
Mas direi a ela. Preciso. A única questão é quando.
“Ah, ele está bem,” Cletus responde por mim antes que
possa organizar meus pensamentos. “Apenas dândi3. Quero
dizer, por que não estaria? Ele está aqui, e Scarlet está ali, e nem
o laço se dividirá, ou o que quer que seja esse ditado.”
“Nenhum dos dois deve. O ditado é: Nenhum dos dois deve,”
Jennifer diz, coloca a mão no meu ombro e me dá um tapinha
gentil. “Quando Claire vai para Roma?”
“Logo depois de Veneza,” Cletus resmunga. “Embora ela
mencionou algo sobre talvez voltar a Nashville para o festival de
música primeiro. De qualquer forma, estamos ficando sem
tempo.”
Trabalho para respirar além da dor no meu peito, educo
minha expressão. Uma nova distância aparece no horizonte.
Distância literal. Se não fizer algo logo para consertar as coisas
e estabelecer um caminho claro a seguir, apesar de todo o desejo
do mundo, ela será areia escorregando pelos meus dedos.
Novamente.
“O que eu gostaria de saber é o que diabos aconteceu?”
Cletus emite um som grunhido. “Tudo estava progredindo
conforme o planejado, antes do previsto, devo acrescentar, e
sabe como eu gosto de eficiência, e depois nada. Três dias vocês
sendo educados. Onde está o DPA?
“DPA?” Pergunto.

3
Just dandy: Quando algo está bem. Não pode melhorar.
“Demonstrações Públicas de Afeto. Depois de dezoito anos
de energias reprimidas, pensei que estaríamos encontrando
vocês em armários e atrás de portas. Agora, não estou sugerindo
que faça um show. De fato, por favor não. No entanto, do jeito
que as coisas estavam, Ashley sugeriu que talvez precisássemos
bater panelas antes de entrar em uma sala.”
Como sempre, a tentativa de Cletus de sutileza carece de
sutileza. Ele não precisa me dizer o quanto errei ou o que perdi.
Só o pensamento dela partir, não vê-la por dias ou mais depois
de tê-la tão perto por semanas me faz querer destruir algo. Perdi
o nosso bloco de desbaste4 em casa. Agora é um ótimo momento
para cortar um pouco de madeira.
“Sei que está dando um tempo para Claire, e entendo que
quer ser respeitoso, mas já pensou em fazer um grande gesto?”
Jenn pergunta. “Quando Cletus me pediu desculpas por ser um
tolo, trouxe vinte e dois presentes de aniversário, um para cada
um dos meus aniversários. Não estou dizendo que precisa
comprar algo para ela, de jeito nenhum. É sobre a consideração,
isso que fez a diferença.”
Inclino minha cabeça para frente e para trás em um leve
movimento. Considerei grandes gestos. Passei os últimos três
dias arruinando meu cérebro, tentando determinar o que
poderia dizer ou fazer para expressar a enormidade do meu
arrependimento.

4
Pedaço de tronco de árvore utilizado para apoiar a lenha ao cortá-la.
Exceto que suspeito que Scarlet não quer que me
arrependa mais do que quero que ela se sinta em dívida.
“O que precisa fazer é deixá-la sozinha novamente.” Cletus
coloca um cotovelo no meu ombro, embora eu seja três
centímetros mais alto que ele. “Quando estiver sozinha, agarre-
a.” Ele faz um punho com a mão.
“Ela não é um forte, querido.” Jenn envia ao marido um
olhar afetuoso, parece que acha que ele é fofo.
“Eu disse agarrar, não cercar.”
“Mesmo assim.” Jenn vira seu sorriso para mim, que se
transforma de afetuoso em compreensivo. “Uma mulher só quer
ser conquistada depois de ter conquistado. Resgatada depois
que fez o resgate. Então é uma escolha que ela faz ativamente,
em vez de uma dívida que precisa pagar. Acho que o grande gesto
que precisa fazer é pedir ajuda a ela.”
Fico ereto, pego de surpresa por sua sugestão. Que ideia
interessante.
“Mostre a ela que foi conquistado.” Seu sorriso fica doce e
ela acrescenta, “Quando foi a última vez que pediu ajuda a
alguém, Billy? Ou disse a eles o quanto precisa deles? Talvez
comece por aí.” Com mais um tapinha gentil, ela sai para se
juntar a Ashley e Shelly.
Olho para Jenn. Quando foi a última vez que pediu ajuda a
alguém? Sinceramente não consigo me lembrar.
“Mulher astuta.”
Tremo, percebo que Cletus ainda está perto de mim, com o
cotovelo ainda no meu ombro, a atenção fixa em algum momento
à distância, suspeito sua esposa com base no seu olhar.
“Diga-me uma coisa, querido irmão. É sobre isso que
continuo intrigado: você é extraordinariamente habilidoso com
mulheres, homens, gatos, cães e hamsters quando quer ser. Mas
particularmente as mulheres. Vi você em ação. Pode ser suave.
Quando quer, tem quase tanto carisma quanto Beau e ele é
basicamente considerado uma arma letal na maioria dos
estados. Então, por que desarma o charme com Scarlet?”
Não respondo. A resposta é complicada na melhor das
hipóteses, disfuncional e complicada na pior.
Cletus está certo. Sou bom com mulheres, quando quero e
quando tenho um objetivo em mente. Com minha família,
funcionários, colegas e até eleitores, o objetivo é claro: dou a eles
o que precisam de mim para que sejam bem-sucedidos, qualquer
que seja a coisa. Algumas pessoas precisam de elogios, outras
precisam de limites e disciplina, outras de charme e carisma,
outras ainda querem comunicação frequente.
E, no entanto, com Scarlet, mesmo quando éramos
adolescentes, não sabia como me aproximar dela. No começo,
porque não sabia o que ela precisava de mim para ter sucesso.
Depois que percebi que estava apaixonado por ela, era tarde
demais para descobrir as coisas. Ela já tinha ido. Quando voltou,
minhas tentativas de dar a ela o que pensava que precisava foi
um fracasso colossal após o outro.
O que nos leva a agora.
“Aqui está outro pensamento.” Meu irmão abaixa o cotovelo
para acariciar a barba com o polegar e o indicador. “Talvez
flertar.”
Olho para ele de lado.
“Você deveria flertar.” Ele concorda como se essa fosse a
resposta definitiva para todos os meus problemas. “Nem tudo
tem que ser sangue, suor e lágrimas. Você pode desfrutar da
mulher que ama, fazê-la sorrir, fazê-la se sentir bonita, especial.
O que pode machucar flertar?”
Abro minha boca para responder, mas no instante seguinte
ele me dá um tapa nas costas e diz, “Boa conversa.”
Então anda para Jenn e fica atrás dela, coloca as mãos no
seu quadril e se curva para sussurrar algo em seu ouvido que a
faz rir. Minha atenção volta para Scarlet e Drew. Suas cabeças
estão juntas, sorrisos amigáveis em seus rostos, embora o dela
pareça tenso nas bordas, cansado.
Você deveria flertar.
Drew se parece com um viking na maioria dos dias, ou com
um jogador de futebol profissional, e hoje ela parece
especialmente pequena em comparação a ele. Talvez, reflito com
remorso, parece tão pequena porque também parece esgotada,
como se carregasse um fardo de assuntos pesados.
Nunca pensei em Scarlet tão pequena antes. Seu espírito,
quando está feliz, quando canta, e agora sei quando se perde no
prazer, parece incontrolável para mim. Da mesma forma, seu
corpo é de tirar o fôlego, mas também não pode ser contido pelas
palavras pequeno ou grande, alto ou baixo. Ela é Scarlet, maior
que a vida, bonita da mesma maneira que fogos de artifício
iluminam o céu noturno.
Observo-a agora, me pergunto se essa ideia dela na minha
cabeça faz parte do problema.
Sua pele parece mais pálida do que o habitual; suas
bochechas não têm o típico tom rosado; até as sardas parecem
desbotadas. Pode ter toda a beleza explosiva e o espírito de um
foguete, mas também é apenas uma mulher que luta há muito
tempo. Adicionei coisas as suas lutas. Fui a causa de muitas
delas. Não quero mais fazer isso ou ser mais isso.
Quero ser o motivo pelo qual ela sorri.
Talvez flertar.
Jethro e Beau estavam certos quando disseram que estou
enferrujado, sem prática. Nestes últimos meses, em particular,
evitei todos os compromissos sociais. Tenho que me preparar,
descobrir minha estratégia de paquera enquanto avanço. O
tempo para diminuir essa distância entre nós, essa distância
que criei e seus planos de partir para Roma, é agora ou nunca.
Afasto-me do batente da porta, vou até onde Drew e Scarlet
estão sentados. Na minha abordagem, ela olha duas vezes, mas
depois me dá um olhar que parece mais interessado do que
cauteloso.
“Sc-Claire. Drew.” Aceno para os dois enquanto tropeço no
nome dela, direciono minha próxima pergunta para Drew.
“Imagino que gostaria de dançar com sua esposa?”
O grandalhão olha para mim, com o lado da boca preso
atrás da barba loira. “Imaginou certo.”
Estendo a mão.
Ele olha entre eu e minha mão. Então coloca o braço do
violão na minha palma. “Quando estiverem prontos para dançar,
me avise. Ash e eu podemos assumir.”
“Obrigado. Vamos avisar,” falo, troco outro aceno com meu
cunhado quando se levanta e se afasta para encontrar minha
irmã.
Meu olhar muda para Scarlet e nos observamos por
algumas batidas do meu coração. Planejei dizer, Este lugar está
ocupado?
Mas antes que possa dizer minha fala, ela diz, “Olá,
estranho.”
“Estranho?” Repito, testo a palavra, levanto uma
sobrancelha e depois balanço a cabeça. “Não. Não gosto dessa
palavra.”
Scarlet sorri levemente da minha resposta, seu sorriso a faz
parecer menos cansada, e ela aponta para o banquinho que
Drew acabou de desocupar. “Vai sentar aqui?” Ela pergunta.
“Este assento está ocupado?” Isso. Falo minha linha. Agora
estamos de volta aos trilhos.
“Está agora,” ela responde, como eu queria.
Então me sento no banquinho, faço questão de me
aproximar dela alguns centímetros. Isso me rende um olhar de
suspeita divertida. Não é um começo ruim.
Encontro seu olhar diretamente e, antes que possa pegar o
impulso, pergunto, “Sério, você se importa se eu sentar aqui?” A
última coisa que quero é ser alguém que ela tolera.
“Não, Billy. Não me importo.” Ela bate no meu ombro com
o seu e acrescenta baixinho, “Senti sua falta.”
Ouvir isso me aquece e sei o que quer dizer. Conversamos
de forma breve e intermitente nos últimos dias sobre nada de
importante. Não voltamos à polidez cômoda, mas tive o cuidado
de dar-lhe espaço. O que fiz não é uma coisa pequena a perdoar,
e certamente não me perdoei.
Olho para ela agora, engulo uma pedra de remorso e digo,
“Sinto muito.” Não disse isso desde a nossa conversa no riacho.
Antes de seguir em frente com qualquer flerte hoje à noite, sinto
que preciso dizer novamente, por ela, mas também por mim.
“Sinto muito.”
“Agradeço o pedido de desculpas,” ela diz, com um sorriso
que não reflete em seus olhos. “E eu também sinto muito.”
“Pelo quê?” Agora que estamos perto, a estudo.
Definitivamente parece cansada, e essa conversa só parece
pesar, o que não é meu objetivo.
“Por não lhe contar sobre Bethany.” Seu sorriso forçado
diminui em graus. “Ela realmente estava apenas tentando fazer
a coisa certa e cuidar de você.”
Conhecia minha mãe, conhecia suas intenções e acredito
que a interpretação de Scarlet da situação é verdadeira. No
entanto, isso ainda me irrita seriamente. Ninguém deveria ter
feito Scarlet parecer menos. Nunca.
Independentemente disso, não estou sentado aqui para
falar sobre o passado. Estou aqui para aliviar seu fardo, ajudá-
la a encontrar seu sorriso, então falo, “Obrigado por me dizer, e
você está perdoada.”
Seu olhar me diz que a surpreendi quando olha para mim.
“Realmente? Estou perdoada? Bem desse jeito?”
“Sim.” Aceno. “Jethro recentemente me lembrou algo que
nossa mãe costumava dizer, o que, ironicamente, parece
relevante. Sempre que nós, crianças, perdíamos a paciência um
com o outro, ela dizia, as pessoas só guardam rancores quando
não conseguem se perdoar.” Preciso tocá-la, mesmo que seja
apenas um pouquinho, levanto meus dedos em sua têmpora e
enfio seus cabelos atrás da orelha. “Não quero rancores entre
nós.”
Quando sorri desta vez, parece mais sincera, talvez até
aliviada. “Nem eu.”
“De fato,” murmuro, levanto o violão no meu colo, “Nem
quero roupas entre nós.”
Ela recua. “O que acabou de dizer?”
“Eu disse, não sei como fez aqueles hambúrgueres, para
todos nós.” Minto descaradamente, seguro seus olhos, examino
sua reação à minha ridícula falsidade antes de acrescentar: “O
jantar foi excepcional. Obrigado.”
Scarlet transformou nossas sobras de bolo de carne em
hambúrgueres. Foi bastante impressionante, mas essas
definitivamente não foram minhas palavras e sabemos disso.
Esse trabalho é melhor.
“De nada,” ela diz, hesitante, com a testa enrugada
enquanto sua boca se curva, como se não soubesse o que pensar
de mim.
Deslizo minha mão pelo braço do violão. “Quando posso
fazer o jantar para você?”
Seus olhos se arregalam, dão-me a sensação de que minha
pergunta a surpreende e a encanta. “Hã, quando quiser.”
“Sempre que eu quiser.” Toco um acorde, depois outro, a
barra de abertura de “Fine As Fine Can Be” de Gordon Lightfoot.
“Vou te segurar nisso.”
“Por favor faça.” Ela encolhe os ombros. “Que tal amanhã?”
“Amanhã estaremos em Veneza. Mas depois disso
estaremos em Roma. Farei isso então.”
As sobrancelhas dela se juntam. “Estaremos em Roma?”
“Está certa. Continuo com a intenção de perguntar: nossa
casa terá cozinha?” Considerando que meu coração está na
garganta quando faço a pergunta, fico impressionado com a
tranquilidade do meu tom.
Ela se vira mais completamente para me encarar. “Virá
comigo?”
“Claro.” Também me viro, organizo-me de tal forma que ela
e seu banco estão entre as minhas pernas. Por enquanto, tudo
bem. “Você acabou de me pedir para fazer seu jantar.”
Sua boca se abre e ela suspira por um segundo antes de
dizer, “Não fiz isso! Você ofereceu.”
“Scarlet, está tudo bem.” Toco as notas de abertura de “I
Will Always Love You” de Dolly Parton . “Não me importo. Mas
se quisesse que eu fosse a Roma, poderia ter perguntado.” Meus
lábios querem puxar para o lado em sua expressão incrédula e
adorável, mas consigo manter meu rosto reto.
Sua boca se abre mais e olha para mim como se fosse
louco, balança a cabeça. “Billy Winston, o que está fazendo?”
“Fazendo planos para o jantar.” Dou a ela um pequeno
sorriso e seu olhar cai nos meus lábios. Ela pisca, quando a
visão do meu sorriso também a surpreende.
Quando seus olhos se erguem, parecem mais nítidos.
“Quer vir a Roma comigo?” Ela pergunta.
“Claro que sim. Obrigado por perguntar. Aceito.”
Uma gargalhada explode dela, seus olhos grandes e
incrédulos, mas também inconfundivelmente encantados,
graças a Deus.
Ela empurra meu ombro com as pontas dos dedos. “Sua
cobra!”
“Ei agora.” Pego sua mão antes que possa se retirar e coloco
beijos suaves nas costas dos dedos e depois na parte interna do
pulso. A pele é tão macia e me lembra seus outros lugares
macios. “Se me chamar desse tipo de nome, posso mudar de
ideia.”
“Ah sim?” Ela divide sua atenção entre minha boca e olhos.
“Mudar de ideia sobre o quê? Me enganar e se convidar para
Roma?”
“Ah, não. Não vou mudar de ideia sobre isso. Eu te enganei,
você ofereceu, eu aceitei. Vamos passar uma semana juntos em
Roma.” Abaixo sua mão para a minha perna, inclino mais perto
enquanto pressiono seus dedos na minha coxa. Meu coração
dispara quando ela assume e desliza a mão mais alto.
O sorriso de Scarlet desaparece, mas seu olhar fica quente,
nebuloso, suas bochechas rosadas. “Então sobre o que vai
mudar de ideia?” Ela sussurra.
Abaixo meus olhos nos seus lábios, sua mão se move para
o interior da minha perna enquanto a minha pousa em seu
quadril. Enrosco meu dedo do meio no cinto do seu jeans e um
suspiro quente e curto escapa de sua boca. Meu sorriso
aumenta.
“Posso mudar de ideia sobre o jantar antes ou depois de...”
De repente, alguém estala os dedos entre nossos rostos.
Recuo, sigo o braço até a expressão ranzinza do meu irmão.
“Tudo bem, tudo bem. Maneira de superar, William. Mas
agora não é a hora. Vocês tiveram o dia todo para fazer isso,
coloquem um alfinete nisso.” Cletus coloca a mão entre os
nossos rostos e enfia a outra mão no bolso e retira uma caneta.
“O que vai tocar primeiro? E você aceita pedidos? Nesse caso,
Jethro quer 'La Vie en Rose' por aquela francesa. Se Roscoe
estivesse aqui, saberia como pronunciar corretamente.” Do
outro bolso, pega um pacote de post-its.
Enquanto Cletus fala, Scarlet puxa sua mão de volta e o
encara, pisca furiosamente como se realmente esqueceu onde
estava enquanto conversávamos, quero dizer, quando
flertávamos.
Bom.
Se Scarlet deixou nosso ambiente desvanecer-se para a
periferia, talvez um pouco de seu cansaço, preocupações e lutas
também desapareceram.
“A-acho que podemos atender a pedidos,” Scarlet gagueja,
olha de relance para mim.
Dou a ela um pequeno sorriso que, felizmente, a faz me dar
um segundo olhar. Por mais que aprecie o rubor que floresce
sobre seu pescoço e bochechas, aprecio a doce esperança em seu
olhar ainda mais.
“Aceitaremos pedidos dentro do razoável, Cletus.” Levanto
meu queixo para espiar meu irmão. “Scarlet não precisa cantar
a noite toda. E sem 'Bohemian Rhapsody'.”
“Bem, certo. Lá se vai essa ideia,” Cletus murmura e coça
a testa. Vira e levanta a voz para dirigir-se à sala, “Tudo bem,
escutem. Claire vai cantar e temos Billy no vilão. Billy também
vai cantar.”
“Nunca disse que vou cantar.”
“Como eu disse, Billy vai cantar,” ele diz, como se não falei
nada. “Se tiver algum pedido, tenho um bloco de papel aqui.
Basta anotá-los e nosso dueto ficará feliz em agradecer. Além
disso, Duane, sem se exibir, por favor. Todos sabemos que é o
dançarino, ou seja, sem elevações.”
“Jess acabou de ter um bebê, Cletus.” Duane dá a seus
olhos o começo de um rolar. “Não vou fazer nenhuma elevação.”
“Bom.”
“Mas haverá algumas rodadas e mergulhos,” Duane alerta,
passando o braço pela cintura da sua esposa.
“Bem.” Cletus olha por cima do ombro e fixa seu olhar
distraído em mim. “Decidiu o que vai tocar primeiro?”
Olho para Scarlet. Ela olha para mim. E antes que possa
pensar melhor, sugiro, “'Ring of Fire'?”
“Realmente vai cantar comigo?” Ela pergunta, parece estar
com medo de que puxe o tapete debaixo dela, mude de ideia no
último minuto. Seus olhos cautelosos e excitação cautelosa
fazem algo comigo, fazem meu peito apertar com
arrependimento.
Odeio dar a ela uma razão para me abordar com cautela,
em vez de confiar.
Inclino e falo apenas para seus ouvidos, “Prometo que, se
me quiser, cantarei com você quando ou onde quiser. Mas só
com você, Scarlet. Só quero cantar com você.”
Seus olhos brilham, seu sorriso se alarga e a felicidade
brilha nela, raios de sol, raios de lua e luz das estrelas.
Incontrolável.
Tira o fôlego.
Scarlet.

***

A última música que tocamos para todos é “Come Away


With Me” de Norah Jones. Eles pareciam estar com vontade de
fazer mais do que dançar até que todos os casais deixaram a
sala de música, citando todo tipo de desculpas desnecessárias.
Através de algum acordo implícito, continuei tocando violão
e ela continuou a cantar mesmo depois que todo mundo saiu da
sala. Acho que poderia ficar com ela para sempre, ouvindo sua
voz hipnótica, observando-a, estando perto. Mas no final,
tocamos apenas mais algumas músicas, uma versão suave de
“Free Fallin,” uma versão silenciosa de “I'm Fly Away.” No final
de “Broken Hearts,” Scarlet tenta esconder um bocejo atrás da
mão e sei que nosso tempo terminou.
“Vamos, dorminhoca.” Levanto e me estico, colocando o
violão em seu suporte.
“O quê? Não terminamos.”
“Você está exausta.” Aproximo do banquinho, onde ainda
está sentada, e deslizo meu dedo ao longo da linha da sua
mandíbula, até sua bochecha e sobre sua orelha, empurro meus
dedos em seus cabelos. “Vamos levá-la para a cama.”
Um segundo passa antes que percebo o que disse, durante
a qual seu sorriso cresce lentamente. De repente, ela não parece
tão cansada.
“Promessas, promessas,” sussurra, ergue o queixo, a luz
em seus olhos tão maliciosa quanto nervosa.
Sorrio tristemente com a minha falta de consideração, mas
também combato todo o apoio repentino do meu corpo pelo
deslize da língua, dou um passo para trás e lembro de que ainda
não contei a ela sobre Razor. Teremos uma semana em Roma,
durante a qual posso providenciar bastante champanhe, lençóis
de seda, pétalas de rosas e velas.
Esta noite foi um progresso. Ela sorriu a maior parte da
noite. Ouvir sua voz divina foi uma satisfação. Cantar com ela
novamente foi indescritível. Se isso, apenas cantar e beijar, for a
nossa vida juntos, morrerei um homem muito feliz. Obviamente,
a causa da morte provavelmente será uma frustração sexual
excessiva crônica.
Vou deixa-la na sua porta. Mas provavelmente também nos
beijaremos. Talvez eu a acompanhe para dentro, mas é isso. E
então vou tomar um banho frio.
“Você é fofa,” falo, minha voz grave quando ofereço minha
mão. “Vamos.”
Scarlet coloca os dedos na minha palma e se levanta,
permite-me levá-la para fora da sala. “Como eu sou fofa?”
Dou-lhe um olhar, mas é isso. Se tiver que listar todas as
maneiras que é fofa, ficaremos acordados por mais vinte e quatro
horas.
“Sabe como você é fofo?” Ela pergunta e sobe as escadas na
minha frente, dando uma vista magnífica de seu traseiro. Ainda
quero mordê-lo. Também quero...
Não sou uma boa pessoa.
“Não sou fofo,” falo rispidamente, engulo a súbita onda de
saliva. Talvez tome um banho de gelo.
“Você é bonito.” Ela olha por cima do ombro, sorri para
mim. “Sua barba espessa é especialmente fofa.”
Sem pensar, eu a acaricio. “Precisa ser aparada. Talvez
amanhã.”
Ela para no penúltimo degrau, vira para mim, com a mão
no quadril. “Que tal hoje à noite? Deixe-me fazer isso.”
“Perdão?”
“Deixe-me fazer isso.” Seus dedos levantam para acariciar
meu rosto, suas unhas arranham com leve pressão contra meu
queixo. Se eu fosse um gato, provavelmente ronronaria.
“Sinceramente adorarei aparar sua barba para você.”
Talvez depois de Roma, depois de termos resolvido o resto
de tudo e nós dois definirmos o caminho claro a seguir. Mas
agora?
Abro minha boca, um não automático nos meus lábios,
mas ela desce um passo, coloca-nos ao nível dos olhos e muito
mais perto.
Seus braços veem ao redor do meu pescoço e dá um
pequeno beijo no meu nariz. “Suas coisas de barbear estão no
banheiro?”
Concordo.
“Desça as escadas e pegue uma cadeira dobrável. Vou para
o seu quarto e preparo tudo.”
Abro minha boca novamente para dizer não, mas então ela
pressiona seus lábios nos meus, seus braços em volta do meu
pescoço apertam, traz seu corpo contra o meu. Minhas mãos
estão em seu quadril, puxo-a para mais perto, sua boca se abre
e deslizo para dentro, sua língua provoca a minha, aveludada e
doce.
E então ela se afasta, vira e sobe os últimos degraus. “Vá
pegar a cadeira e me encontre no seu quarto. Te vejo em um
minuto!”
CAPÍTULO 18

BILLY

Isso é uma tortura.


Suas mãos no meu ombro, debaixo da minha mandíbula,
posicionando meu queixo como ela quer; o joelho apoiado na
cadeira entre as minhas pernas; o toque leve de seus dedos, seu
corpo roçando acidentalmente contra o meu.
Tortura.
E ela muda. Eu apareci com a cadeira dobrável, usando os
cinco minutos de nossa separação para fortalecer mentalmente
para aparar minha barba, apenas para descobrir que ela se
trocou em algum tipo de camisola branca de algodão que
termina no meio da coxa. É por isso que quando ofereceu uma
toalha quente para cobrir meus olhos, aceitei, imaginando que
seria capaz de me distrair, manter minha mente ocupada caso
não pudesse vê-la.
Minha mente não coopera.
“Só para constar, eu gosto do seu rosto. Muito...” ela diz,
com um sorriso na voz.
Você? Quer sentar nele? Aperto minha mandíbula com o
pensamento errado, apenas uma dentre uma infinidade de
sugestões desagradáveis que me ocorreram nos últimos dez
minutos.
Ela já aparou o excesso de comprimento, modelou com a
tesoura e escovou os recortes. Agora termina com dedos gentis.
“Ai está,” ela murmura, sua mão no meu ombro tenciona
antes de se afastar. “Só um segundo. Está confortável?"
Não.
“Mmm.”
“OK. Não se mexa.”
Ouço o farfalhar de tecido, talvez uma toalha, e então ela
volta, o calor de seu corpo uma anomalia gravitacional. Eu tive
que enfiar meus dedos nas minhas coxas para não alcançá-la e
talvez incentivá-la a sentar no meu colo e colocar esses dedos
gentis para melhor uso.
Tortura.
A mão dela segura meu queixo; a pressão do joelho entre
as minhas coxas; sua respiração suave sobre o meu rosto, ela
tem alguma ideia? Entende como cada toque de pena e suspiro
suave dobra a dor no meu corpo, a necessidade excruciante de
colocar minhas mãos nela?
Fui empurrado para cima dessa fronteira entre prazer e
dor, êxtase e agonia. Não consigo pensar, cada inspiração como
fogo. Estou sufocando e oficialmente atingi meu limite.
Mas assim que levanto minhas mãos para afastá-la, ela diz:
“Pronto. Acabei.”
A toalha nos meus olhos é puxada para o lado, passa no
meu rosto, enquanto minhas mãos, agora sem propósito,
procuravam seu quadril e compreendo o quão verdadeiramente
fino é o tecido de sua camisola. Isso também é tortura, mas não
tão grave, já que minha mente, de repente, decide que afastá-la
deixou de ser uma opção.
Abro meus olhos. Ela paira acima de mim, sua atenção
acompanha o progresso da toalha quente no meu queixo.
“Quer um espelho?" Ela pergunta, e meu olhar cai em sua
boca.
Ela é tão malditamente sexy, uma deusa da carnalidade e
doçura. Agora que a provei, também sei todas as suas cores. O
tom de seus lábios é exatamente o mesmo que seu clitóris, um
fato que nunca esquecerei toda vez que nos beijarmos.
“Não,” digo, minhas mãos descem pelo quadril até a barra
da camisola. Sem pedir permissão, levo meu dedo do meio para
o ápice de suas coxas e gentilmente a acaricio por baixo da
calcinha.
Os movimentos dela param.
“Eu preciso de você,” digo, as palavras com significados
diferentes.
Ela fecha os olhos, uma onda de ar a deixa, suas mãos
caem nos meus ombros, agarrando-os como se quisesse se
manter de pé.
Minha outra palma acaricia a parte de trás de sua coxa e
fico paralisado pelo arranjo caótico de suas feições, sua perda
abrupta de compostura. Deslizo minha mão na parte de trás de
sua calcinha, amasso a carne de sua bunda enquanto continuo
minhas carícias leves em seu centro.
“Eu preciso de você,” repito gentilmente e afasto o pedaço
de tecido, desenhando um círculo terno em torno de sua
entrada, encontrando-a exatamente como lembro, quente,
molhada e tão fodidamente macia.
As pernas de Scarlet parecem balançar, e ela engole em
seco, as mãos nos meus ombros agarram um punhado da minha
camiseta. “Por favor, Billy,” ela ofega, sua voz alta e tensa. “Eu
também preciso de você. Muito.”
Levanto e puxo sua camisola para cima enquanto tropeça
para trás, a cadeira atrás de mim vira na minha pressa. Seu
sutiã sai em seguida e eu a levanto em meus braços, carregando-
a para a cama em três grandes passos. Seus dedos no meu
cabelo, sua boca se funde com a minha e desisto de seus lábios
apenas o tempo suficiente para arrancar minha camisa e deitar
ao lado dela. Não consigo parar de tocar seu corpo, minha mão
em seu peito e seguro sua delicada suavidade, deslizando para
suas costas, e a agarro. Quero senti-la em todos os lugares, de
uma só vez, com todas as minhas partes.
Ela arranca a boca, tragando ar. “Billy.”
“Muito áspero?” Pergunto no pescoço e passo por cima
dela, precisando da sensação e visão dela debaixo de mim.
“Não, Deus, não, eu apenas... tire suas calças.”
Minha mão desliza para a frente do quadril e depois para
baixo, segurando-a e incentivo a abrir as pernas para mim, para
poder alcançar sua calcinha e mergulhar meus dedos por
dentro. Gemo instável, inclino para morder sua mandíbula, seu
pescoço, tirando sua umidade do corpo e pintando o círculo em
torno de seu clitóris com dois dedos. “Quero fazer amor com
você.”
“Eu também quero você,” ela diz com uma respiração curta
e agitada, com as mãos frenéticas na minha calça, puxando o
zíper e empurrando os dedos para dentro para me agarrar e
acariciar. Assobio e pressiono sua mão, meu quadril treme.
Porra. Preciso estar dentro dela.
Com pressa, ela me ajuda a tirar minha calça e boxer, mas
capturo suas mãos antes que possa tirar sua calcinha.
“Deixe-me,” digo, faminto por um gosto de sua doçura
aveludada.
Seus lábios se separam quando deslizo por seu corpo e
mordo sua cintura, puxando sua calcinha mais baixa com meus
dentes. Deslizo a renda até os joelhos, depois os tornozelos,
ajoelho entre as pernas abertas e descubro seu corpo nos meus
olhos. E então, com água na boca, provo sua excitação com a
parte plana da minha língua, mantendo seu olhar além dos
montes macios de seus seios, provocando a parte de trás das
pernas com as pontas dos dedos antes de entrar com dois dedos.
Scarlet pressiona a cabeça contra o colchão, arqueia as
costas para fora da cama. “Espere... preciso, eu quero...”
Sei o que ela precisa, o que quer. Com mais um beijo
francês sugador, levanto e coloco meu quadril contra o dela,
usando minha ereção para acariciá-la sem preâmbulos, a não
ser um inferno de contenção.
Ela engasga, os olhos reviram quando as pálpebras se
fecham, os dedos giram nos lençóis ao lado do corpo e as costas
arqueiam novamente. Ela abre mais as pernas, como se
antecipasse e acomodasse o meu peso, descobrindo todos os
seus lugares mais vulneráveis para minha gratificação, seu
pescoço, seios e estômago, a entrada apertada de seu corpo.
Um convite.
“Billy,” ela diz com um desespero à beira da angústia, e isso
alimenta uma parte faminta de mim. Não consigo o suficiente de
seu desespero, de seus prazeres, de me pedir e me querer.
Inclino novamente para provar sua pele na junção de seu
pescoço e ombro. Meus dedos puxam seu mamilo, mordendo-a
enquanto continuo acariciando a parte mais macia dela com a
parte mais dura de mim.
Ali. O seu calor pulsa sob meus lábios, seu coração
dispara. Seu peito sobe e desce com respirações rápidas, como
se ela lutasse com a antecipação do que pode vir a seguir.
“Billy, Deus, por favor.” Um sussurro e um gemido, uma
pitada de frustração. Seus cílios se erguem e ela olha para mim,
com os olhos turvos, frenéticos e suplicantes.
Agarro e me levanto de joelhos, posicionando a cabeça do
meu pau e movendo um polegar para rastrear o feixe de nervos
inchados e escorregadios acima de sua entrada. Maldições
escapam dela enquanto continua ofegando, seus lindos seios
saltam a cada subida e queda do peito, deslocando o quadril
para forçar e acelerar o meu progresso.
Entro nela.
Ela estremece e eu também, e saboreio o momento.
Saboreio a visão de seu corpo disposto em exibição, raios
de sol, raios de lua e luz das estrelas, a beleza de sua
vulnerabilidade e rendição. Saboreio o olhar enevoado e
enlouquecido em seus olhos. Saboreio a sensação de seu calor
sedoso ao redor do meu pau e o fato de que sei, sem sombra de
dúvida, que nunca será suficiente. Perseguirei esse sentimento
pelo resto da minha vida, como um drogado, como um viciado.
Esse momento perfeito em que a angústia de nosso passado
compartilhado encontra a felicidade de nosso presente e tudo
está exatamente do jeito que deve ser.
E então eu me mudo.
Ancoro uma mão ao seu quadril para controlar o ângulo,
inclino para frente para poder rolar meu quadril, garantindo que
seu clitóris se estique a cada golpe. Ela choraminga, amaldiçoa,
toma o nome do Senhor em vão, suas mãos amassam meus
músculos, suas unhas cravam em minha carne. Ela parece
perdida para seu próprio desejo, sem sentido, compreensiva e
gananciosa e eu adoro. Amo como a destruí, porque ela me
destruiu da mesma forma.
Mas assim que ela abre os olhos e nossos olhares travam,
ela goza como um cometa, seu canal tenciona e os espasmos ao
meu redor vem em explosões violentas enquanto seu corpo se
curva. Ela me alcança. Um choro, um gemido, sons e sensações
irracionais que me empurram além da razão. Dirijo para ela,
meus golpes cobiçosos e significativamente menos atenciosos
com o prazer dela, quando algum instinto primordial exige que
eu a reivindique, entrando em seu corpo, enchendo-a com meu
gozo e alegro-me hedonisticamente com a nossa falta de
restrição.
O desejo é tocá-la sem fim, reunir seu corpo flexível contra
mim enquanto rolo para o lado, tomando cuidado para não
esmagá-la com o meu peso. Para onde vou, ela segue, resistindo
e apenas colocando beijos sonolentos no meu peito e garganta,
seus braços entrelaçam em volta do meu pescoço.
“Eu te amo,” ela sussurra entre beijos, ainda sem fôlego,
claramente exausta. “Deus, como eu te amo. Amo todas as
partes de você e quero que façamos amor todos os dias, dez vezes
por dia pelo resto de nossas vidas.”
“Combinado.”
Ela se aconchega mais perto, e faz carinho em minha
barba. “Nunca quero que nos separemos.”
“Combinado.” Eu a incentivo a envolver sua perna sobre a
minha, minha mão desliza por sua coxa até seu traseiro.
“Isso significa que comemos todas as refeições juntos a
partir de agora.”
“Combinado.”
“E tomamos banho juntos.”
Porra, sim, penso, mas beijo sua testa, dizendo outro:
“Combinado.”
O fato é que ela pode me pedir qualquer coisa agora e a
resposta provavelmente será Concordo. Como o espírito de
Scarlet, minha felicidade e satisfação no momento não podem
ser confinadas. É simplesmente além da expressão.
Ou razão.

***

A razão me caça no meio da noite.


Acordo assustado, sem saber onde estou, enredado nos fios
de um pesadelo. Uma vez que compreendo meu ambiente, e que
estou sozinho na cama, penso por um momento se fazer amor
com Scarlet também foi um sonho. Meus olhos se ajustam, o
sangue para de correr entre meus ouvidos e ouço o chuveiro
ligado. Estou nu.
Não é um sonho.
O medo incha logo abaixo das minhas costelas e esfrego os
olhos com a base das palmas das mãos. Nós não usamos
camisinha.
Essa foi a semente do meu pesadelo, o fato irreversível do
qual surgiram vários cenários de caos e miséria. Em todas as
interações dos meus pesadelos, Scarlet estava grávida. Mas o
que aconteceu depois foi como assistir a um desfile de histórias
de horror escritas por Stephen King. No final de cada uma, ela
me odiava.
Levanto da cama e vou até o banheiro. Preciso vê-la,
determinar o que precisa de mim, o que posso fazer para tornar
as coisas certas e arrumar minha imprudência e egoísmo.
Empurro a porta, piscando contra o brilho. Ela não acendeu
todas as luzes, apenas uma acima do chuveiro de vidro,
iluminando a forma dela, mas não os detalhes.
Dou dois passos em direção ao chuveiro antes de parar,
um tipo diferente de razão surge quando a inércia do sono
desaparece. A lucidez se materializa como um barman sábio,
apontando fatos que já sei. Ela não me odeia.
“Billy?”
Scarlet entra em foco vívido, espreitando pela porta do
chuveiro, a maior parte do corpo escondida por vidro fosco. Um
sorriso tímido levanta sua boca mais alto de um lado enquanto
sua atenção se move sobre o meu corpo.
“Você quer...” Ela bufa, revirando os olhos, seu sorriso
crescendo. “Quero dizer, quer se juntar a mim?”
Minha mente me diz para hesitar, pensar. Enquanto meus
pés já me carregam para frente. Ela abre mais a porta, recuando.
Logo estou dentro do pequeno chuveiro e compartilhando o fluxo
quente de água com uma Scarlet vigilante, o braço dela faz uma
tentativa valente, e falha, de cobrir os seios.
“Acordei você?” Ela pergunta, sua voz mais alta que o
normal e falhando um pouco na última palavra.
Respiro o vapor e respondo sem pensar: “Tive um
pesadelo.”
Sua timidez desaparece, sua testa se enruga e ela dá um
meio passo em minha direção. “Ah não. Você está bem?”
Uma risada leve e depreciativa sai de mim quando percebo
o que admiti, e levanto meus olhos para a parede atrás dela.
“Estou bem. Não sei por que te disse isso. Ainda acordando, eu
acho.
Scarlet coloca as mãos nos meus bíceps, aproximando-se.
“Vamos lavar a louça e então você me conta, ok?”
Como se puxado, meu olhar cai para o dela novamente e
estudo seu lindo rosto virado para cima, imaginando quais os
verdadeiros pensamentos de Scarlet sobre a questão do
preservativo. Está preocupada com a gravidez? Nem sei se está
no controle da natalidade. Nós não conversamos sobre isso.
Fomos completamente imprudentes.
“Scarlet...”
Ela inclina a cabeça para o lado, olha para mim, seu olhar
suave e aberto. “O que há de errado?”
“Nós não usamos proteção.”
“Oh.” Ela pisca várias vezes. “Você está certo, nós não
fizemos.”
“Eu sinto muito.”
Agora ela sorri levemente, suas bochechas esquentam de
uma maneira que não tem nada a ver com a água quente. “Eu
poderia nos parar. Dizer algo também, mas não disse.”
Esse raciocínio é contra meu senso de justiça. “Eu deveria
nos parar.”
Suas sobrancelhas se unem como a minha declaração,
seus dedos cravam nos meus braços, seus lábios pressionam
juntos em uma linha infeliz. “Por favor, não diga isso.”
“Eu deveria ter...”
“Por favor, não se desculpe pelo que aconteceu.” Agora ela
fecha os olhos, a voz um sussurro, como se fizesse uma oração.
“Por favor, não se arrependa, nem um pouco, nenhuma parte ou
o que isso possa significar. Porque não me arrependo.”
Olho para ela e suas palavras memoráveis, a umidade
escorre em seus cílios, o rosa de suas bochechas, a curva
descendente de seus lábios, e memorizo esse momento. Todos
os vestígios do meu medo anterior desaparecem, tudo, uma
sensação consumidora de retidão e alegria toma seu lugar.
Coloco minhas mãos na cintura dela apenas para deslizá-
las pelas costas e trazer seu corpo macio para o meu, segurando-
a e orando a Deus que nunca queira que eu a deixe ir.
CAPÍTULO 19

BILLY

Veneza era... é... linda. É um desses lugares que faz você


acreditar que os contos de fadas são possíveis e é exatamente
como imagina que é. Exceto a presença de todos os outros
turistas, e me misturo com os turistas.
“Você parece um camponês.” Cletus me olha de cima a
baixo. “Ou um personal trainer chamado Stefano, de Nova
Jersey.”
Não falo nada, me recuso a mostrar minha irritação. No
entanto, Cletus está correto. Pareço um camponês.
Normalmente, uso um terno para trabalhar todos os dias. Gosto
de usar terno para trabalhar todos os dias. Não estou
acostumado a me vestir como um personal trainer chamado
Stefano em público.
Hoje de manhã, no último minuto, deixei meus irmãos
gêmeos me convencerem a usar shorts de ginástica e uma
camiseta para Veneza. Eles apareceram no meu quarto, Beau
vestindo bermuda e camiseta, me avisou que estaria quente e
que eu ficaria infeliz vestido com roupas finas. Da mesma forma,
o resto da minha família estava vestida da mesma forma quando
saímos da vila para a estação.
Então, quando o trem parou na parada de Veneza, todos se
moveram para os banheiros.
“Ah. Pensou que eu quis dizer em Veneza? Não, não. Quis
dizer no trem,” Beau esclarece, de olhos arregalados e inocente.
Mentiroso. Posso ver através de suas declarações
enganosas muito bem agora.
Isso aconteceu algumas horas atrás. Atualmente, já fomos
no Palazzo Ducale, o Palácio Do Doge, e agora estamos a
caminho de um passeio de gôndola no meio da tarde. Beau
parece particularmente ansioso em fazer nossa reserva a tempo.
“O que precisa fazer é usar sapatos italianos, pretos.”
Cletus levanta a perna da calça (da calça que vestiu), mostra-me
um par de sapatos de couro italiano muito agradáveis. “Então se
mistura com os locais. Mas parece que você é de Jersey Shore5
ou algo assim, Stefano.”
Alguém bate no meu ombro do meu outro lado, e olho por
cima, espero os comentários provocadores de Jethro. Ele
também se veste como um cavalheiro hoje. Todo mundo. Exceto
eu.
Mas não é Jethro, é Scarlet.
Meu sorriso é imediato. “Oi.”

5
Jersey Shore é um reality show produzido pela MTV norte-americana que segue oito pessoas que moram em
uma mesma casa, seguindo seus afazeres diários na costa da Nova Jersey americana.
Depois de tomar um banho quase casto juntos no meio da
noite, voltamos para a cama emaranhados. Não contei a ela
sobre os pesadelos, nenhuma razão para ter que suportar esse
fardo também.
De manhã, Scarlet me acordou com beijos, mas evitou
minhas tentativas de puxá-la de volta para a cama, correndo
para se preparar para a viagem. No entanto, me deixou um rolo
de canela, uma xícara grande de café preto e um poema,

Eu te amei noite passada.


Gostaria de te amar agora, mas
Há um trem para pegar.
-Fada da floresta

Atualmente, ela sorri para mim, carinho e compaixão em


seus olhos. “Também pareço uma camponesa.” Ela aponta para
a calça de ioga, tênis e camiseta. “Jessica me disse que estaria
quente e que não deveria me vestir bem.”
A irritação volta a brilhar e olho para as costas de Beau.
Obviamente, essa é a ideia de piada da minha família.
Scarlet enrola os dedos em meu pulso, desliza a palma da
mão contra a minha e envia um choque quente pelo meu braço.
“Não fique irritado. Você sempre parece bonito. Hoje podemos
ficar mal-humorados juntos.”
Meus olhos a percorrem com apreciação. “Impossível.”
“O que é impossível?”
“Você estar desarrumada.”
Seus olhos se estreitam em mim, como se não está
impressionada, mas seu sorriso persiste. “Muito bom, Stefano.”
Sorrio de novo.
Suas bochechas rosadas, seu olhar feliz, decido que talvez
isso não seja tão ruim.
Scarlet parece significativamente menos cansada e abatida
hoje do que na noite anterior. Apesar das provocações de Cletus,
fico grato ao meu irmão. Encontrar prazer na mulher que amo,
dar-lhe razões para sorrir, é a resposta certa. Meu único
arrependimento é que Scarlet e eu não dançamos na noite
passada, um descuido que planejo corrigir assim que chegarmos
a Roma.
Só mais dois dias.
“Estamos aqui,” Beau anuncia por cima do ombro. “Todo
mundo espera um pouco, deixe-me falar com a pessoa das
reservas. Cletus entrará em contato com você e já voltamos.”
Scarlet se inclina para perto. Abaixo minha cabeça para
dar-lhe meu ouvido quando baixa sua voz para um sussurro.
“Deixe-me adivinhar, eles só podem levar duas pessoas por
gôndola.”
Assim que diz as palavras, Cletus dá um passo à frente,
vira-se para enfrentar todos nós e anuncia, “Eles só podem levar
duas pessoas por gôndola, então teremos que fazer dupla.”
Scarlet sorri, seus ombros tremem quando seu queixo cai
no peito.
“Quais são as chances?” Inclino-me para sussurrar e a faço
rir mais. Pego-me sorrindo também, e é aí que sei que minha
família finalmente me derrubou.
Os barcos cabem mais de duas pessoas. Os canais estão
cheios de gôndolas com quatro e cinco pessoas. Mas claro. Tanto
faz. Eles querem que tenhamos um passeio de barco só para
nós, tudo bem. Se lutar contra isso, descobrirão uma maneira
de fazer isso acontecer de qualquer maneira. Além disso, neste
caso, fazer um passeio de gôndola com apenas Scarlet é a minha
preferência.
Eu me rendo.
“Eu e Jenn juntos em um barco, obviamente. Beau e
Shelly, Jethro e Sienna, Ash e Drew e acho que isso deixa Billy
e Scar- e, Claire. O xerife e a Sra. James, Duane e Jess, Maya, e
todas as crianças ficaram na casa. Agora, todo mundo me dá
seus telefones e carteiras.”
“O que é isso? Um assalto?” Sienna pergunta bem-
humorada.
“Não dessa vez. Tenho uma bolsa impermeável aqui.”
Cletus retira uma sacola plástica do bolso e a balança. “Melhor
me dar suas coisas para mantê-las secas.”
Ainda rindo, Scarlet caminha em direção ao meu irmão,
entrega seu telefone e carteira. “Tudo bem, Cletus. Que barco é
o nosso?”
Penso ouvir Jethro murmurar algo para Sienna como, “Isso
foi muito mais fácil do que pensei que seria.” E viro para
inspecioná-lo.
Ele me dá um sorriso de merda, mas não diz mais nada.
Logo mostram nosso barco e estamos na água, mas é
importante mencionar que nosso gondoleiro é o maior humano
que já encontrei. É italiano, parece estar treinando para uma
competição de homens fortes e não fala inglês, exceto a frase
“Sente-se lá,” que parece suspeita como uma ameaça.
Como Veneza, o barco em si é bonito. Madeira rica e escura
com detalhes nas esculturas inclinadas e em espiral. Almofadas
de veludo vermelho cobrem os assentos e uma faixa vermelha
pendurada do arco até a popa. Quero questionar nosso
gondoleiro em relação à idade do barco, ele parece extremamente
bem conservado e antigo, e acabo de tentar me comunicar
quando ele aponta para Scarlet sentada ao meu lado, a mão na
minha perna, nossos dedos entrelaçados, e depois aponta para
o assento no centro do barco mais perto dele.
“Sente-se lá,” diz.
Ela olha para mim e eu olho para ela.
“Não, obrigada,” diz e inclina-se mais firmemente contra o
meu lado.
Ele para o barco. Aponta para ela, aponta para o assento.
“Sente-se lá.”
“Não, grazie. Não, obrigado,” respondo por ela, sinto seu
desconforto.
Ele solta a pá... ou o remo? e dá um passo à frente, os olhos
em Scarlet de uma maneira que me faz levantar e me colocar na
frente dela.
“Para trás.” Minha adrenalina aumenta, acompanhada pelo
foco frio e calmo que sinto toda vez que me encontro em uma
dessas situações.
Isso não quer dizer que muitas vezes me encontrei cara a
cara com um gondoleiro mal-humorado do tamanho do André,
o Gigante6. Mais do que isso, enfrentei a minha parte justa de
grandes e burros Iron Wraiths; sempre estive em menor número,
e sempre mantive meu juízo sobre mim. O remo pode ser uma
arma. O mesmo pode acontecer com a faixa.
Implacável, o homem avança. Eu me agacho, apoio meus
pés enquanto o observo vir.
Mas então Scarlet se levanta de repente e se mexe para se
mover ao meu redor. “Está bem. Posso sentar no banco central.
Está bem.”
Eu a pego e o barco balança, perturba-me, e o que acontece
a seguir me deixa perplexo.
Em um minuto, seguro Scarlet, e no seguinte ela é
apanhada e jogada gentilmente no canal pelo nosso gondoleiro.
Minha confusão atordoada dura apenas uma fração de segundo,
mas meu julgamento está comprometido. Em vez de prender o
barco primeiro, estendo a mão para o lado para puxá-la de volta.

6
André René Roussimoff, mais conhecido pelo seu nome de ringue André the Giant, foi wrestler profissional
e ator francês, naturalizado americano, tinha 2,14 m de altura e pesava 200kg.
É quando sou empurrado da gôndola.
A água está mais fria que a piscina, mas minha mente
ainda está em Scarlet. Levanto para a superfície, procuro
freneticamente qualquer sinal dela e encontro-a imediatamente,
na água a poucos metros de distância, com os olhos arregalados
de choque.
“Você está bem?” Ela nada para mim, segura meu rosto e
procura meus olhos.
“Estou bem. Você está bem?” Afasto o cabelo dela do rosto.
Ela assente, atordoada. “Não entendo. O que acabou de
acontecer?”
Várias gôndolas estão por perto, mas vejo nosso gondoleiro
a uns dez metros ou mais de distância, guiando seu barco pelos
canais com uma velocidade impressionante. “Ele nos queria fora
do seu barco, então nos jogou.” Falo as palavras, embora ainda
não acredite nelas.
Ela balança a cabeça rapidamente. “Por que faria isso?”
“Ah, ei, vocês.”
Viramos para o som de Cletus, encontro ele e Jenn
descansando em segurança em sua gôndola, reclinados em
almofadas de veludo. Jenn segura uma taça de champanhe e
tem a decência de parecer simpática.
“Vocês deveriam nadar para lá,” ela diz, aponta para algum
lugar atrás de nós. “Vejo uma escada saindo da água.”
Mas Scarlet grita sobre ela, sua voz cheia de fúria. “Cletus!
Você fez isso! Contratou aquele homem para nos empurrar para
fora da gôndola. Vou te pegar por isso, nem que seja a última
coisa que faço!”
“Suas acusações são infundadas e francamente
insultantes. E, por favor, peço que modere seu tom. Somos
família, afinal. Ou seremos em breve.”
“Cletus.” A voz de Jethro soa de um barco à nossa direita.
“Quando disse aquilo sobre o cavalo, não sabia que queria
literalmente afogá-los.”
“Ah, eles não vão se afogar, são realmente bons nadadores.”
Ashley, de sua gôndola, é a responsável por essa observação
pragmática, acrescenta, “Agora sabe o que tive que lidar
enquanto crescia, Claire. Sinto muito, não fazia ideia do que
esses hooligans haviam planejado.”
Shelly inclina-se sobre Beau para gritar, “Certifique-se de
chegar a tempo para a reserva do passeio amanhã.”
“Você pode querer se limpar primeiro.” Beau envia um
sorriso brilhante para nós, sua gôndola mais distante. “Não acho
que a água do esgoto seja apropriada para os lugares que você
vai.”
“Então é por isso que queria que usássemos essas roupas.”
Agora tudo faz sentido.
“Beauford Faulkner Winston! Foi ideia sua?” Scarlet
aponta para o ruivo. “Você está no meu último nervo.”
“Isso não é verdade, Claire. Você ainda tem muitos nervos.”
Ele sorri afetuosamente para a irmã, mas claramente se diverte.
“Como essa foi sua ideia, Beau, acho que você tem muita
coragem,” Cletus entra na conversa.
“Você definitivamente foi além com esta, Beau,” acrescenta
Jenn.
Apesar das circunstâncias, apesar de tudo, sorrio do seu
jogo de palavras.
A cabeça de Scarlet vira em minha direção, seus grandes
olhos procuram no meu rosto como se fosse um estranho. “Você
está rindo?”
Paro de rir.
“Vamos lá, pessoal. Por favor. Nadem até aquela escada,”
insiste Jennifer. “Prometo, seu dia vai melhorar.”
Com mais um olhar ameaçador para Beau, Scarlet nada
em direção à escada. Olho em volta para meus irmãos, cada um
por sua vez, e rapidamente a alcanço.
“Você está bem?” Pergunto e já planejo minha vingança
contra os gêmeos.
Ela acena com força. Mas então sorri, fecha os olhos. “Não
acredito no Beau. Não posso acreditar nele.”
“Ele e Duane sempre foram grandes em piadas práticas.
Onde Cletus pode nos trancar no porão por uma hora, Beau e
Duane sempre parecem levar as coisas para o próximo nível. Vou
corrigi-los.”
“Não.” Os olhos dela se estreitam e brilham perigosamente
quando sobe o primeiro degrau da escada. “Deixe-me lidar com
eles.”
Assim que subimos a escada para a calçada, somos
recebidos por um grupo de pessoas gentis com grandes toalhas
que parecem estar nos esperando. Uma mulher dá um passo à
frente e se apresenta como a Sra. Olsen, nossa anfitriã pela
próxima hora. Nos conduz a uma casa antiga próxima e
excepcionalmente boa. Scarlet é direcionada para um lado e
tentam me direcionar para outro caminho.
“Não. Vamos ficar juntos.” Pela segunda vez em quinze
minutos, piso na frente dela, agarro sua mão. Já tive o suficiente
de brincadeiras.
A Sra. Olsen se separa da assembleia novamente e se
aproxima de nós com um grande sorriso. “Ah, talvez esta nota
ajude?”
Ela me entrega um envelope, que abro. Dentro há um
cartão com um endereço rabiscado de um lado, uma chave e
uma nota no rabisco arrumado de Cletus.

Caros William e Scarlet,


Nós nos cansamos de vocês encontrarem razões para fugir,
se atirando para fora de barcos e coisas do tipo, então estão
sozinhos esta noite e amanhã.
Por favor, aproveite o jantar muito romântico que Jennifer
organizou, comprou e pagou. A comida e o vinho já foram
selecionados, sem necessidade de pedidos, e ela esteve esta
manhã para fazer sua sobremesa.
As roupas que usarão e o cabelo arrumado e maquiagem da
Scarlet serão fornecidos pela equipe italiana de estilistas e roupas
de Jethro e Sienna. Deixe-os limparem vocês.
Sra. Olsen é uma boa amiga de Jess e Duane, podem
agradecê-la mais tarde pelo uso de sua casa.
Ashley e Drew (e Bethany) foram responsáveis por suas
acomodações esta noite, se estiver procurando alguém para
culpar por isso, consulte o administrador quando fizer o check-in,
eles mostrarão como chegar ao restaurante (alerta de spoiler: fica
ao lado).
A excursão particular às vidrarias venezianas que
agendamos pela manhã é com um dos colegas da escola de Shelly
da Universidade de Chicago. Realmente acho que vai gostar. É
algo especial.
Simone e Roscoe enviam seu amor, já que não podem
realmente enviar muito mais, visto que ambos estão sob os
cuidados de enfermeiras na casa de Payton, no Tennessee. Mas
imaginei que, dado o tamanho de seus corações, o amor é
suficiente.
Divirtam-se. Ou não.
― Cletus

***

“Não consigo decidir se a melhor coisa da Itália é arte,


comida ou pessoas.” Scarlet pousa o garfo, encara o prato, a mão
cobre sua barriga. “Não posso terminar isso, mas é tão bom. E
isso me deixa triste.”
Sorrio para seu enigma, embora esteja aliviado por ela estar
cheia. Toda vez que o garçom coloca um novo prato na nossa
frente, ela dá uma mordida, revira os olhos e suspira de prazer.
De onde me sento ao seu lado, o jantar é cheio de distrações.
Para dizer o mínimo.
“Nós sempre podemos embalá-lo para mais tarde.” Coloco
meu guardanapo em cima da mesa, recosto na cadeira e aprecio
a vista, onde tem Scarlet com lábios vermelho escarlate, unhas
vermelhas escarlate, em um delicioso vestido vermelho escarlate
que abraça sua forma.
Meus irmãos se superaram.
Foi um pouco mais convincente depois que a Sra. Olsen
entregou o bilhete de Cletus, principalmente Scarlet me
assegurando que estava bem conosco nos separando, mas
acabei sozinho em um quarto com chuveiro, um terno novinho
em folha e sapatos italianos apenas do meu tamanho. Depois de
um banho longo e necessário, vesti as roupas e quase perdoei os
gêmeos. Quase.
O corte perfeitamente personalizado para minhas medidas,
o que me fez pensar se Jethro entrou em contato com meu
alfaiate em Knoxville.
Um barbeiro entrou com uma oferta para aparar e modelar
minha barba. Recusei, mas permiti que cortasse meu cabelo. Eu
o negligenciei por semanas e estava muito mais longo do que
meu costume. Satisfeito com a aparência do meu cabelo, o
barbeiro saiu murmurando palavras italianas desconhecidas.
Decidi que, antes de voltar à Itália, aprenderei o idioma.
Saí do quarto e caminhei pela casa, refazendo meus passos
para a grande entrada por onde entramos. Uma grande escada
em espiral curva-se para cima, de um piso de mármore preto e
branco até um teto com claraboia de vidro com chumbo. No
centro da entrada há uma grande mesa circular de madeira com
uma quantidade enorme de girassóis erguendo-se de um vaso
azul cobalto.
A casa é linda, irreal. Como um sonho. Mas então Scarlet
apareceu, vestida com seu vestido vermelho, seus cabelos ruivos
caindo sobre os ombros, um sorriso grande e feliz em seu lindo
rosto.
Se isso é um sonho, nunca quero acordar.
“Você acha que o quarto do hotel tem uma geladeira?”
Scarlet pega seu vinho e toma um gole. “Odiaria desperdiçar
isso.”
“E ainda temos a sobremesa,” lembro a ela e também pego
meu vinho. Perdi a conta de quantos copos tivemos. Apesar de
breves, há um novo vinho em cada prato, talvez oito? “Mesmo
que o quarto tenha uma geladeira, acho que Cletus nos matará
se não comermos a sobremesa aqui.”
O cartão que a Sra. Olsen entregou anteriormente continha
o endereço do hotel boutique onde Ashley e Drew
providenciaram a acomodação. Fizemos o check-in mais cedo e
fomos apresentados ao nosso quarto, uma suíte espaçosa com
vista para o mar.
Minha família também deixou champanhe esfriando e duas
caixas na cama, uma rotulada a dela e a outra dele. Em vez de
espiar dentro, caminhamos para o restaurante para não nos
atrasarmos. Não sei ao certo o que qualifica um hotel como um
“hotel boutique.” Se tiver que arriscar um palpite, acho que os
detalhes refinados, tamanho pequeno e vontade de ser
subornado por famílias bem-intencionadas, mas intrometidas.
“Sinto muito. Não posso comer nenhuma sobremesa.” Ela
parece verdadeiramente consternada. “Vai ter que comer a
minha e vai ter que me ajudar a tirar esse vestido.”
“Tudo bem,” concordo rapidamente, rápido demais, e isso
puxa um sorriso dela.
“Não é assim.” Ela estreita os olhos em mim. “Quis dizer, é
um milagre fechar em primeiro lugar.”
“Então você definitivamente deve tirá-lo.”
Ela solta um suspiro preso, seu olhar se estreita ainda
mais, mas também está sorrindo. “O que vou fazer com você?”
“Tenho algumas ideias.”
Agora ela sorri, revira os olhos, suas bochechas passam de
rosa para vermelho, e sorrio também.
Isso é ótimo, e não quero dizer a comida ou o ambiente
impecável e discreto desse restaurante sofisticado. Podemos
comer em um café, em uma pizzaria ao ar livre ou em qualquer
lugar enquanto estivermos juntos.
“Você sabe que este é o nosso primeiro encontro.” Scarlet
cruza os braços sob os seios, inclina a cabeça para o lado
enquanto seu olhar se move sobre mim.
Penso sobre isso, percebo que está certa. “O primeiro de
muitos.”
“Sim, bem dito. O primeiro de muitos. Embora este seja
difícil de vencer. O que devemos fazer para o nosso segundo
encontro?”
“Está assumindo que minha família ainda não planejou.”
Ela sorri novamente e me delicio com sua felicidade, inclino
para a frente, preciso estar mais perto, coloco meu cotovelo no
canto da mesa entre nós. “Mas se eu escolher, digo que vamos
dançar.”
“Dançar?” Ela também se inclina para a frente, imita minha
postura, traz nossos rostos a centímetros. “Podemos dançar
agora.”
“Aqui?” Questiono, embora percebo imediatamente que
está certa. O restaurante tem uma pequena varanda nos fundos
com vista para o oceano, e a música é suave, parece uma versão
italiana de big band dos anos 40 ou equivalente. É perfeita para
uma dança lenta.
“Sim.” Ela acena uma vez, seu sorriso cresce e seu olhar
baixa para os meus lábios. “Ou podemos salvar a dança para o
nosso segundo encontro e voltar para o hotel agora.”
Hesito, debato. Ambas as opções parecem egoístas. É isso
que posso esperar da nossa vida juntos? Suspeito que cada
momento com Scarlet, não importa onde estamos ou o que
estamos fazendo, será uma satisfação.
Incapaz de ficar quieto por mais tempo sabendo que ela
pode estar em meus braços, cubro a mão em seu colo com a
minha, entrelaço nossos dedos e a puxo para seus pés.
“Vamos.”
“Onde vamos?”
“Vamos dançar.”
Chego à varanda, levo-a até a beira mais distante, bem
contra a grade onde estamos entre as estrelas acima e o reflexo
do luar na água abaixo. Trago seu corpo até o meu, levanto seus
braços para o meu pescoço, e coloco minhas mãos em sua
cintura. Ela me observa com um sorriso suave enquanto faço
isso, suas unhas arranham a parte de trás do meu pescoço com
uma leve pressão.
Depois de um breve momento, seguro-a e nossos corpos se
movem ao som da música, Scarlet diz, “Por que sim, Billy. Queria
dançar em vez de voltar para o quarto agora. Obrigada por
perguntar.”
Meus lábios se curvam, puxam para o lado. “Esta é a sua
maneira de me dizer que sou mandão?”
“Não. Por que te diria? Já sabe disso.”
Sorrio e ela sorri, seus olhos caem no meu sorriso. A
música é em italiano, um tenor canta uma balada romântica que
não reconheço, mas fico feliz pela lentidão. Quem inventou o
conceito de dança lenta foi um gênio.
Nossos corpos se encaixam perfeitamente, e ela está quente
e macia. Não nos beijamos como eu queria o dia todo e meus
dedos flexionam com a sensação dela balançando no momento
perfeito comigo. Inquieto, dou um beijo em seu braço, perto do
seu ombro, sua pele brilha banhada pela luz das estrelas.
Seus lábios carnudos me distraem. Podem estar pintados
de vermelho agora, mas estou intimamente familiarizado com a
cor real deles. Talvez a dança lenta não seja uma ideia tão genial.
“Ei,” ela sussurra e me traz de volta ao agora e a
curiosidade óbvia em seus olhos. “O que está em sua cabeça?”
Deslizo minhas mãos nas suas costas, preciso de mais dela
em meus braços, enquanto luto para pensar em um tópico
apropriado de conversa não relacionado às cores de seu corpo.
“Como foi sua semana?”
“Como foi minha semana? Era nisso que pensava?”
Seguro-a mais apertado, me torturo com suas curvas
generosas sob muitas camadas de roupa. “Conte-me sobre sua
semana.”
“Foi muito boa, considerando todas as coisas.” Scarlet
relaxa contra mim, embora seu tom esconda confusão.
Descansa sua têmpora contra minha mandíbula, sua respiração
faz cócegas no meu pescoço. “Fiz algum trabalho. Então Jethro,
Ashley e eu levamos as crianças para uma fazenda de cabras-
da-caxemira7 nos arredores de Radda.”

7
A expressão cabra-da-caxemira faz referência a uma série de linhagens de cabras criadas no entorno da
região da Caxemira, notórios pelo uso de suas pelagens na produção de tecidos.
“Uma fazenda de cabras-da-caxemira?” Sorrio, apesar da
maneira como meu sangue continua bombeando em minhas
veias, grosso e quente. “Conhecendo Jet e Ash, o fio deve estar
envolvido.”
“Está. Mas as crianças também tiveram a chance de
alimentar as cabras.”
Balanço a cabeça, pergunto inexpressivamente, “Você
alimentou as cabras?”
Scarlet faz uma pausa, inclina o queixo para trás quando
seus olhos retornam aos meus. Procura meu rosto, como se essa
fosse uma pergunta complicada.
“Alimentei,” finalmente admite. “Nós as alimentamos com
milho; comeram das nossas mãos. Faz um pouco de cócegas.”
“Não é difícil de acreditar.”
“O quê? Que fez cócegas?”
“Não. Que as teve comendo na palma da sua mão.”
Seus olhos se movem entre os meus, prateados à luz da
lua, e um lento e amplo sorriso reivindica suas feições.
Ela sorri, balança a cabeça e coloca a bochecha no meu
peito. “Ah, você é fofo.”
“Sou fofo?” Não é a palavra que eu esperava.
“Muito. E para constar, gosto desta versão de Billy
Winston. Muito. Ele é divertido.”
Agora estou sorrindo de novo. “Bom saber.”
“A propósito,” seus braços deslizam do meu pescoço para
envolver meu peito “Como foi sua semana?”
“Tudo bem,” respondo honestamente, decido que a
conversa da minha semana vai definitivamente diminuir o fogo
na base da minha espinha. “Recebi várias ligações telefônicas,
tentei encaixar todas antes de partirmos.”
“Como estão as coisas da corrida no Senado?”
Ela não poderia escolher um tópico menos sexy. “Estamos
apenas nas fases iniciais do planejamento agora,” falo, sinto
meu corpo se acalmar. “Angariação de fundos, organização dos
grupos comunitários. Vai aumentar depois do primeiro ano, se
decidir fazer isso de verdade.”
“Você não decidiu?”
“Não.”
Scarlet recosta-se novamente e me inspeciona. “Você
parece irritado com alguma coisa, soa irritado também.”
“Percebeu isso?”
“Percebi. O que há de errado?”
Sinto meus lábios achatarem. “Tenho que lançar a
colaboração de campanha que o partido enviou. Isso é um pé no
saco, mas pode esperar até eu voltar.”
“Isso é um pé no saco? Como assim?” Ela parece realmente
interessada.
“Continuam vendo problemas onde não existem.”
“Como o quê?”
“Ele parece irritado que tenho barba. Quer que raspe.”
Seu rosto fica imediatamente severo. “Você está
brincando.”
“Não estou.”
“Por favor, diga que não está tirando sua barba.” Seus
braços me apertam e uma faísca de algo brilha em seus olhos.
Parece possessividade. “De fato, me prometa.”
Sorrio. “Não sabia que gostava tanto da minha barba.”
“Claro que gosto. Me dá um motivo para tocar seu rosto.”
Como se para demonstrar a verdade de sua afirmação, coça
levemente as unhas. “Gosto de acariciá-la. O que mais é um
problema que realmente não existe?”
Aperto sua mão na minha bochecha por um segundo antes
de levar seus dedos aos meus lábios para um beijo rápido, e
respondo sua pergunta sem pensar, “Ele também diz que não
pode me eleger a menos que eu seja casado.”
Scarlet para de balançar. Na verdade, simplesmente para.
Levo um momento para perceber o que disse. Quando faço, meu
peito se contrai desconfortavelmente, a dor surda lateja para
fora, lembra-me o quanto essa mulher controla todos os
aspectos da minha fisiologia.
“Scarlet...”
“É isso mesmo?” Ela sussurra, sua mão desliza do meu
rosto. “Faz alguma diferença quem é a mulher? Ou qualquer
uma serve?”
“Como eu disse, vou demitir esse cara quando voltar. Ele é
cheio de merda.” Encaro-a atentamente, quero ter certeza de que
vê e entende que estou falando sério.
Mas seus olhos se estreitam, parecem focar para dentro,
como se essa informação lhe dá muito o que considerar. “Eu
acho...” ela começa, para, lambe os lábios e depois me devolve o
olhar. “Você sabe do que estão me chamando nas notícias?”
Sou incapaz de controlar a severidade do meu cenho
franzido ou meu brilho de raiva. Li as notícias. Sei que a
chamam de Filha do Diabo8.
“Eles não deveriam estar te chamando assim. Essas
pessoas são lixo.”
Ela consegue dar um sorriso fraco, seus braços caem
enquanto continuo a abraçá-la. “Billy.”
“Scarlet.”
“Já pensou sobre isso?”
“Sobre o quê?” Grunho. Mesmo sabendo exatamente o que
está prestes a dizer e espero que decida não dizer.
“Realmente acha que pode ganhar uma corrida ao Senado
se você e eu estivermos juntos?” Parte da minha fúria deve ser
visível no meu rosto, porque é rápida em acrescentar, “Quero
dizer, publicamente. Se estivermos juntos publicamente.”
Cuidadoso em manter o volume da minha voz baixo,
pergunto, “De que outra maneira podemos estar juntos,
Scarlet?”
Ela olha para mim, seu olhar procura, seus lábios abrem
como se as palavras estivessem na ponta da língua.

8
No original é Devil’s Daughter em referência ao MC que o pai dela faz parte.
“Não. De jeito nenhum.” Balanço minha cabeça. “Nem
pense nisso.”
“Billy. Se estar comigo publicamente significa...”
Ainda balançando a cabeça, seguro seus dedos e a puxo de
volta para a sala de jantar principal, passo nela até a porta.
Vamos conversar sobre isso, mas não vou fazer isso com vozes
abafadas na varanda de um restaurante.
Como se fôssemos algum tipo de segredo.
CAPÍTULO 20

CLAIRE

Marcho para o quarto de hotel, viro quando chego ao centro


dele e encaro um lívido Billy Winston. “Não estou dizendo que
seria para sempre. Estou apenas dizendo...”
“Não.” Ele anda de um lado para o outro na minha frente,
seus olhos brilham como fogo.
Talvez uma abordagem diferente seja prudente.
“Não acha que já desistiu o suficiente por mim?” Coloco
meus punhos no quadril. “Em que universo vou permitir que
não faça sua corrida ao Senado, tudo pelo que trabalhou, apenas
para que possamos sair para jantar em público? Nós podemos
pedir! Qual é a desvantagem de adiar? Só até...” procuro em meu
cérebro, tento estimar um prazo adequado que precisamos
esperar.
Não no próximo ano, a corrida ao Senado ainda continuará.
O ano depois? Mas somente se minha gravadora concordar
em suavizar a imagem de Claire McClure. Caso contrário, vou
terminar meus dois últimos álbuns contratualmente obrigados
por eles e procurarei um selo diferente. Então, três anos?
Quatro? Não. Não são quatro. Até então, ele terá uma campanha
de reeleição.
“Até quando?” Ele para de andar. “Quanto tempo dessa
vez? Terminei de nos colocar em espera. E seu nome não deve
ser impresso no mesmo jornal que o do seu pai. Seus nomes
nem deveriam ser falados juntos, ele não tem nada a ver com
você.”
“Meu amor, não é só ele, ou que estão me chamando de
Filha do Diabo. É a minha gravadora. Eles me pintaram como a
megera da música country, não importa que eu cante bluegrass,
mas mesmo que meu pai não estivesse no noticiário, tornar
público o nosso relacionamento não faz sentido para a sua
carreira.”
“Não decidi concorrer à cadeira no Senado.”
“Isso é ridículo.” Levanto um dedo de aviso. “Não se atreva
a desistir da sua candidatura por minha causa.”
Ele faz uma pausa e me considera. Parte de sua fúria
desaparece. “E se não fosse por sua causa? E se tivesse que
desistir por um motivo diferente?”
Inacreditável. “Ah sim? Como o quê?” Cruzo os braços, olho
para ele. Ele me deixa louca. Cletus estava certo sobre Billy
disputar o prêmio de Mártir Mais Honorável.
“Como...” Seu olhar procura antes de se virar para dentro.
“E se eu estiver na cadeia?”
“Na cadeia? Por quê?”
“Preciso te contar uma coisa.” O olhar de Billy volta ao meu
e o segura. Não gosto do olhar dele.
Uma fissura de alarme me faz diminuir a distância entre
nós e alcançar sua mão. “O quê? O que é isso?”
Ele baixa os olhos para onde nossos dedos estão
entrelaçados e o pomo de Adão se move como se lutando para
engolir. “Fiz uma coisa. Não me arrependo, mas é ilegal. E,
quando voltar ao Tennessee, posso ser preso por isso, se não me
entregar primeiro.”
Ele parece tão severo, tão resignado, como se já aceitou seu
destino. Todo esse tempo que estamos nos reconectando,
encontrando o caminho de volta um para o outro, isso está
pesando sobre ele?
Levanto a palma da mão com o meu peito, pressiono-a
entre as minhas, meu coração subitamente se descontrola. “O
que aconteceu? O que você fez?”
Billy olha ao redor do quarto e depois me puxa para o sofá,
sentamos um ao lado do outro. Uma vez que estamos
acomodados, segura minha mão, embala, estuda, parece que é
a última vez que a vê, ou a mim.
“Você está me assustando,” solto, encaro seu perfil
sombrio, luto contra o desejo de subir em seu colo ou nos
algemar juntos. Nota para mim, sempre traga algemas.
“Sou assustador.” A inclinação de seus lábios me diz que
está frustrado, mas não comigo.
“Não. Você não é.” Agora está realmente me assustando.
“Apenas me diga o que aconteceu. Vamos descobrir isso.”
“A noite em que você... Razor, a noite em que Razor atacou
Roscoe e eu os encontrei... cortei as mãos dele.”
Ele pisca uma vez e depois levanta os olhos para os meus,
seus olhos azuis firmes enquanto se preparam e me inspecionam
por minha reação.
Enquanto isso, estou confusa e posso fazer pouco mais do
que encará-lo e repetir suas palavras uma e outra vez em minha
cabeça, procuro o significado. Cortei suas mãos. Cortei suas
mãos. Cortei suas mãos.
“As mãos de quem?”
“Razor.”
Recuo, meu aperto nele aumenta instintivamente. “Você fez
o quê?”
“Quando ouvi os tiros naquela noite, virei o carro e voltei
para o restaurante.” Mais uma vez, enquanto Billy fala, parece
tão calmo, resignado com algum destino misterioso. “Entrei e
Razor estava de pé sobre Simone, a faca levantada. Eu o
nocauteei e depois coloquei gelo em Roscoe e Simone, esse é o
fim da história oficial.”
“Certo?”
“O FBI não divulgou o fato de que, em algum momento
entre nocautear Razor e a ambulância chegar, suas mãos
estavam cortadas. Scarlet, cortei seus tendões ao meio, direto
na palma da mão. Seu pai nunca mais será capaz de pegar ou
segurar algo.”
Originado na base do meu crânio, um arrepio percorre
minha espinha e estremeço, luto para entender a confusão de
emoções disputando o primeiro lugar.
“Não me arrependo,” ele diz calmamente, feroz diante do
meu silêncio contínuo. “Depois do que ele fez com você, depois
do que fez comigo, não me arrependo. Mas não fiz isso por você.
Fiz isso por mim mesmo. E faria de novo.”
Lágrimas inundam e picam meus olhos e nariz quando olho
para ele. Meu caro Billy, com a voz de um anjo e o coração de
um leão. O doce garoto que me trazia chocolate quente e
pãezinhos de canela no inverno, que trocava meus curativos e
me enfiava em sua casa para não dormir no frio. Foi a primeira
pessoa a perguntar sobre minhas esperanças e sonhos, para me
fazer acreditar na possibilidade. E era a única pessoa em quem
eu confiava para me segurar, mantendo a vigilância e os
monstros à distância.
Meu amor. O homem mais forte e melhor que já conheci. O
que a vida fez com ele?
Jogo meus braços em volta do seu pescoço, subo em seu
colo. “Sinto muito, sinto muito.”
“Shh. Não se desculpe.” Seus braços veem ao meu redor,
me abraçam com força enquanto monto seu quadril. “Você não
tem nada para se desculpar.”
Mas tenho. Eu o expus ao meu pai, mostrei a Billy minhas
cicatrizes e ele foi espancado por minha causa. Não consigo
imaginar o tipo de raiva purulenta que carrega. Não posso
acreditar que seu ressentimento já não o engoliu inteiro.
E em tudo isso, não me entendo ou o que estou sentindo.
Meu coração cansado tanto se alegra como chora. Vivi minha
vida inteira com medo do meu pai. A razão me diz que ele está
na prisão e nunca mais pode me machucar ou a mais ninguém.
A razão me diz que os quartos duplos de pânico em minha casa,
tanto em Green Valley quanto em Nashville, são absurdos. A
razão me diz para viver minha vida sem constantemente olhar
por cima do ombro por sua forma nas sombras. Pesadelos não
se importam com a razão.
Agora ele nunca mais vai segurar uma faca novamente.
Meu consolo nesse fato é palpável, uma coisa corporal. E, no
entanto, a que custo? Desprezo que meu pai inspirou tanto ódio
em Billy que cometeu esse ato violento. Talvez Billy estivesse
quebrado, talvez não. No mínimo, sua alma está ferida e isso é
inaceitável.
Sou uma confusão de horror e alívio horrorizado, sem saber
como me sentir ou o que sentir primeiro. Mas uma coisa é certa,
não há nenhuma maneira no inferno que Billy vá para a cadeia
por isso. De maneira nenhuma. Nenhuma. Fodida. Maneira.
“O que posso fazer para corrigir isso?” Choramingo contra
seu pescoço, quero poder tirar esse fardo dele, quero poder fazer
tudo desaparecer.
“Nada.” Seus dedos enfiam nos meus cabelos, acariciam e
depois acariciam minhas costas. “Tudo está correto.”
“O que você vai fazer?”
Ele dá um beijo no meu pescoço, fala contra a minha pele,
“Eu não sei.”
“Você não será preso por isso.” Seguro-o com toda a minha
força.
“Veremos.”
Abruptamente, me inclino, seguro seus ombros e capturo
seus olhos. “Não. Não vamos ver. Não vai para a cadeia por isso.
Não vai. Não se entregará. Podemos... viajar para sempre. Mudar
para um país sem tratado de extradição com os EUA.”
Sua boca se inclina com um sorriso cansado, mas seus
olhos se aquecem enquanto passam pelo meu rosto. “E viver do
quê?”
“Posso trabalhar em qualquer lugar.” Dou de ombros. “E
voltarei aos Estados Unidos para o material promocional. Vou
ser sua mamãe doce9.”
Suas mãos deslizam pelas minhas costas até descansarem
logo acima do meu traseiro. “Não. Não, não quero isso. Sentirei
falta da minha família. Eles podem não precisar mais de mim,
mas ainda preciso deles da mesma forma.”
“Mas, Billy...” O desespero constrói uma montanha no meu
peito, dolorosa e apertada. “A polícia tem provas suficientes para
acusá-lo?”

9
No original é sugar momma o feminino de sugar daddy.
“O FBI está conduzindo a investigação e, não. Acho que
não, não. É a palavra dele contra o meu silêncio.”
“Mas por que ficar calado? Por que não dizer que não fez
isso?”
Seu sorriso cansado cresce. “Não vou mentir.”
Aperto meus dedos no tecido de sua camisa, frustração
constrói uma nova montanha ao lado do desespero, mas quente
como um vulcão. “Sim. Você vai mentir. Dirá que não fez isso e
então será a palavra dele contra a sua, não o seu silêncio.”
Billy abaixa a testa no meu ombro.
“Por favor. Por favor. Minta. Minta e acabe com isso.”
“Estou cansado, Scarlet,” ele sussurra. “Estou tão
cansado.”
Meu peito dói, tudo dói. Firmo meu lábio e voz antes que
meu queixo possa dar uma oscilação traidora ou minha garganta
entupa de emoção. Levanto meus olhos para o teto, pisco para
parar novas lágrimas.
Claro que está cansado. Carrega tantos encargos sozinho
por tantos anos. Não é de admirar que sua família ache
conveniente interferir. Billy precisa de uma pausa, um oásis, um
lugar seguro. Precisa ser protegido. E resgatado.
“Está bem, está bem.” Empurro meus dedos nos cabelos
curtos na parte de trás do seu pescoço, massageio, toco.
“Conversamos depois. Mas hoje à noite, por enquanto, deixa
para lá. Deixe-me lidar com isso.”
Ele suspira como se a respiração viesse de seus ossos. Suas
mãos deslizam para baixo e me pressionam para a frente,
inadvertidamente passam pelo meu vestido no processo. Não me
importo.
Tudo o que importa é mostrar a ele o quanto eu o amo e
preciso dele, e quão essencial é para mim. Porque agora que nos
encontramos, nunca o deixarei ir.

***

Billy dormiu.
Nós nos beijamos. Ele tirou o paletó, sapatos, meias, cinto,
camisa e gravata. Tantas camadas de roupas. Então nos
abraçamos e nos beijamos. Eventualmente, ele dormiu, enrolado
em volta de mim, suas exalações caindo contra o meu ombro.
Enquanto isso, canalizo meu Cletus interno e planejo.
Ben me disse algumas vezes que eu não entendia a
diferença entre certo e errado como outras pessoas. Talvez
minha infância seja a questão, como fui criada, uma
desconfiança intrínseca da lei. Meu cérebro prioriza honra e
justiça em detrimento da legalidade. As leis variam de acordo
com o local e o horário, a documentação necessária, o devido
processo e a interpretação. Não pode contar com a lei para servir
à justiça.
A honra não precisa ser explicada. Apenas ser. Dentro da
maioria das pessoas existem impulsos honrosos, quer ouçam ou
não. A honra é a razão pela qual a maioria das pessoas torce
pelo oprimido e nunca questiona o porquê.
O que Billy fez não é lícito, mas é justiça, e agora se recusa
a mentir por algum senso de honra insano, um sentimento de
honra que não compartilho. Não neste caso.
Mentirei por ele. Vou salvá-lo.
Ao longo da minha vida, sempre que possível, me
entorpecer era preferível a sufocar o medo. O medo, como
emoção, me fascina, meu relacionamento com ele é um pêndulo.
Para sobreviver, o medo é essencial. Para viver verdadeiramente,
o medo é prejudicial. Mas, nessas últimas semanas com Billy,
percebi que se temer o que não posso controlar, terei medo de
tudo.
A resposta não é me esconder do que mais me assusta, mas
chamar, confrontá-lo, destruí-lo.
Inquieta, me afasto, devagar e com cuidado, dos braços de
Billy e vou na ponta dos pés até o banheiro, paro brevemente
quando vejo a caixa Dela que foi deixada na cama, mas que
deixamos de lado antes. Pego, fecho a porta do banheiro e
acendo a luz. Depois que a tampa é removida, encontro meu
telefone, passaporte e carteira e tomo como um sinal.
Sei o que tenho que fazer.
Também dentro da caixa há uma roupa limpa; os Winston
obviamente pegaram apenas para escondê-la aqui. Usando
minhas roupas íntimas, mapeio meus próximos movimentos, o
que preciso fazer para voar de volta para Nashville o mais rápido
possível, como entrar em contato com Simone Payton, como
acelerar o Cletus sem falar demais e comprometê-lo.
Não quero colocar ele ou qualquer um dos Winston em
risco legal, mas preciso da ajuda deles para que meu plano dê
certo. Nos uniremos, como um time, para resgatar Billy.
Eliminaremos a ameaça do meu pai e usarei o Nashville Music
Festival como uma matéria de capa.
Enquanto puxo as roupas da caixa, paro, observo meu
reflexo no espelho. Especificamente, o conjunto determinado da
minha mandíbula. Não gosto de espelhos. Não gosto de me ver,
uma réplica da minha mãe desinteressada me encara, marcada
com a faca do meu pai.
Billy acha que você é linda.
Minha atenção se volta para o meu estômago e me viro,
olho por cima do ombro as cicatrizes nas minhas costas. Elas
diminuíram, mas ao contrário dos meus braços e pernas, não
responderam à terapia cosmética a laser. Essas marcas são
basicamente invisíveis agora, o suficiente para me sentir
confortável usando roupa de banho e tops. Mas nas minhas
costas nunca desapareceram completamente.
O tempo todo que estive com Ben, ele nunca notou minhas
cicatrizes. Fomos íntimos, mas sempre no escuro. Ele mal me
tocou durante ou depois, e nunca senti o desejo de compartilhar
o fardo do meu passado com ele. Ele não carregava fardos com
graça, não gostava de ser necessário se isso significasse dar mais
do que recebia. Compreendo isso claramente agora.
Mas Billy viu minhas costas. Mudou minhas ataduras
quando tinha catorze anos, e deve tê-las visto novamente ontem
à noite no chuveiro. Billy carrega meus fardos comigo. Todo esse
tempo, os carregou silenciosamente e depois me pediu mais.
Estar com Billy agora é como voltar para casa para mim,
para a pessoa que já fui. Ela tinha cicatrizes, lutou e viveu
tempos sombrios. E, no entanto, sinto falta dela, sua bravura,
sua força feroz, seu senso de justiça. Não percebi o quanto senti
sua falta até o momento, no precipício de enfrentar meus
pesadelos.
Scarlet St. Claire é totalmente sua própria pessoa, é ela
quem Billy vê. É a mulher que considera bonita, e é ela que olha
para mim agora.
Coloco as roupas de volta no balcão, tiro meu sutiã e
calcinha e os coloco de lado. Volto ao quarto, deixo a porta do
banheiro aberta para permitir que a luz preencha o espaço. Subo
de volta na cama e me aproximo o máximo possível do meu
homem bonito. Então me arrasto por alguns minutos, observo-
o dormir, e nem me sinto estranha por isso. É meu com tanta
certeza quanto sou dele. Nós pertencemos um ao outro.
Compreendo isso claramente agora também.
Levanto em meu cotovelo, coloco um beijo prolongado no
canto da sua boca. Então outro. Então um no queixo.
“Scarlet,” ele murmura, mexe-se.
Sorrio, gosto que me associe com beijos, mesmo quando
dorme.
“Preciso de você,” sussurro, beijo seus lábios
completamente desta vez, deslizo minha mão sob sua camiseta
para sentir sua forma sedutora, o cabelo em seu peito, os
músculos sólidos por baixo.
Billy acorda, com os olhos abertos, ainda atordoado pelo
sono. Testemunho o momento exato em que entro em foco. Ele
me alcança, geme quando descobre que estou nua.
“Scarlet,” murmura entre beijos lentos e arrastados. “Se
isso é um sonho, não me acorde.”
“Não é um sonho.”
“Então me toque.” Envolve meu pulso, redireciona minha
palma para a frente da calça, me incentiva a desabotoar seu
zíper e alcançar dentro. Uma emoção corre pelo meu braço com
o contato ousado e meu estômago revira com um calor adorável.
Enquanto me rola de costas, sua boca abaixa para amar meus
seios, sua mão grande acaricia e depois abre minhas pernas, ele
ganha vida na minha mão. Duro e pronto, seu quadril rola,
imitam seus movimentos sedutores da noite passada.
Mas a camiseta dele ainda está e quero sua pele. Quero
tudo seu.
Levanto-me delicadamente da cama e desloco a palma da
mão para o meu peito, de joelhos, agarro a barra da camiseta e
puxo para cima e para fora. Ele permite, mas então está em cima
de mim novamente, me empurra para trás, sobe acima para se
despir de sua calça e boxer.
Apoia-se em um braço, usa o joelho para gentilmente
afastar o meu enquanto desliza a palma da mão do meu quadril,
sobre meu estômago, minhas costelas, mais alto, seus
movimentos lentos, quase como um sonho. Observa sua mão no
meu corpo e minhas respostas instintivas a todos os seus
toques.
Isso é tão diferente da noite passada. A noite anterior foi
um frenesi faminto. Mas agora ele demora a brincar comigo,
move a coxa entre as minhas pernas abertas, aplica fricção e
pressão. Minha necessidade é construída. Minha mão agarra
enquanto ele continua seus toques carinhosos, lambe e chupa
carinhosamente meus seios, meu pescoço, minha orelha, como
se eu fosse um bufê de alimentos finos para serem degustados.
“Preciso de você,” ofego, tremo, meus dedos apontam
reflexivamente, meu corpo tenso com antecipação. “Por favor.”
Sinto seu sorriso no meu pescoço quando recoloca sua
coxa com os dedos, acaricia-me, segura-me. “Adoro quando diz,
por favor. Tão educada.” Ele me morde, acalma o local com uma
lambida enquanto seus dedos imitam o redemoinho de sua
língua.
Ele gosta de mim dizendo por favor? Tudo bem, então.
“Por favor,” repito, tento alcançá-lo. “Por favor.”
Sinto a mudança nele, o enrijecimento de seus músculos
no estômago e nos lados. Finalmente, ele se estabelece entre
minhas pernas abertas, agarra-me e captura minha boca com
um beijo enquanto me enche em um golpe fluido. Estremeço
novamente, empurro minha cabeça contra a cama, minhas
costas arqueiam, estica-me com a invasão vital.
“Diga obrigado.” Sua voz é rouca enquanto se move, seu
quadril rola ao invés de empurrar, esfrega a parte mais crucial
da minha anatomia com cada golpe deslizante.
Gemo em vez de dizer obrigada, ofego, além das palavras.
Só posso sentir a textura de sua pele áspera e quente, seu corpo
duro, sua mão em mim, puxa e rola meu mamilo. A dor quente
e pesada entre minhas pernas se intensifica, enrola-se até que
perco completamente o domínio da posse de mim, espiralando.
Abruptamente, ele fica de joelhos, as mãos entre o meu
quadril e me levanta, seu olhar avidamente se move sobre o meu
rosto enquanto me perco para o prazer disso. Fecho os olhos,
meu corpo curva ao me separar, e ele ainda se move.
Tremores desaparecem, meus cílios se abrem e encontro
seu olhar, atordoado, quente e ganancioso, esperando por mim.
Seus olhos seguem para o meu peito, estômago e, finalmente,
para onde entra em mim. Desliza uma mão para a frente do meu
quadril, esfrega um círculo em volta do meu clitóris com o
polegar, faz minha respiração engatar enquanto meu corpo se
enrola novamente com uma repentina nitidez.
Agarro os lençóis na minha insensatez, procuro por
segurança, desmonto mais uma vez, a dor acompanhada apenas
pelo prazer. Vagamente, estou ciente de que desta vez ele
também se perde, deita em cima de mim, sua boca aperta a
minha enquanto seu quadril estremece, empurra bruscamente,
me enche completamente.
“Eu te amo.” As palavras saem dele quando se recompõe e
me esmaga contra seu peito, rola-nos para o lado. “Casa comigo,
por favor. Casa comigo.”
Ele parece tão perdido, tão vulnerável. Mesmo depois da
minha felicidade, o som do seu apelo aperta meu coração, sóbrio
com a intoxicação do momento e solidifica minha decisão de
resgatá-lo. Empurro contra seu peito para me libertar, capturo
seu rosto em minhas mãos, seguro seu olhar intensamente para
que possa ver a clareza no meu.
“Casarei com você. Será meu marido, serei sua esposa. E
vou mantê-lo seguro.”
Ele pisca, como se minhas palavras o assustassem. Ou
talvez não percebeu que expressou suas esperanças em voz alta.
Então acrescento, “Mas primeiro precisa me perguntar
vinte e quatro horas depois de fazermos amor, quando estiver
convencida de que pensa direito.”
Um sorriso surpreso e alegre divide seu rosto, seu olhar
repentinamente afiado, mas então franze a testa tão de repente.
“Não usamos camisinha.”
Sorrio, balanço a cabeça e beijo seus lábios. “Não. Não
usamos. E posso engravidar. E não conversamos se isso é algo
que você deseja.”
“É. Mas é alguma coisa...”
“Sim. Com você sim.” Coloco beijos leves sobre seus olhos,
mas quando me inclino para trás, ele ainda franze a testa.
“Não quero que se sinta coagida,” ele diz solenemente, seu
olhar procura, seus braços apertam ao redor do meu corpo.
“Você está de brincadeira? Isso é uma piada?”
Uma sugestão de sorriso suaviza suas feições, mas seu tom
fica pensativo. “Continuo dizendo a mim que não há pressa,
devemos tomar nosso tempo, nos conhecermos como somos
agora.”
Incapaz de manter o impulso, inclino-me para frente e
mordisco sua orelha, sussurro, “Como isso é para você?”
“Nada bom.” Sua voz é grave, suas mãos deslizam para o
meu traseiro. “Não sei como ser cauteloso com você.”
Isso me faz sorrir.
“Vamos adicionar isso à lista de itens a serem discutidos.
Volte a dormir.” Viro, aconchego minhas costas contra sua frente
enquanto ele acaricia minha orelha.
“Você conseguiu o que queria e agora me deixa dormir? É
isso?” Pergunta com óbvio humor e carinho.
“Sim. Mas me reservo o direito de acordá-lo se forem
necessários serviços adicionais.”
Ele sorri, um som profundo e estridente, faz cócegas nas
minhas costelas com uma mão e me segura refém com a outra.
“Bom,” ele sussurra calorosamente contra o meu ouvido e
apalpa meu peito. “Vivo para estar em serviço.”
Meu corpo gosta do som disso, e meu coração ama o sorriso
em sua voz. É o meu cérebro que termina a festa, me lembrando
porque preciso que Billy durma.
Ele colocou tudo em risco por mim uma e outra vez,
arriscou sua segurança, sua liberdade, sua saúde, sua alma.
Disse que suas ações e decisões para me salvar de Razor foram
por ele e agora finalmente entendo. Não era uma dívida para
pagar. Ele me amava, e então Billy fez o que foi necessário para
me manter segura.
Não posso deixá-lo ir para a cadeia. O que estou prestes a
fazer é por mim. Eu o amo e farei o que for preciso para mantê-lo
seguro.
“Hora de dormir,” sussurro, forço meu corpo a relaxar.
Ele beija meu ombro, e sinto-o se mover, se posicionando
em uma posição confortável o tempo todo enquanto me segura.
Espero até sua respiração se acalmar. Espero até que esteja
dormindo novamente. E então espero meia hora a mais, ouço-o,
sinto a pressão do seu corpo, memorizo-o.
Então levanto, tomo banho, me visto, pego meu telefone,
passaporte e carteira e escrevo uma nota rápida para Billy antes
de sair.

Querido Billy,
Fui convidada para me apresentar no Nashville Music
Festival, mas estava com muito medo de me comprometer. Você
me fez corajosa, sua força me inspira a ser corajosa, e então
decidi ir. Não consegui dormir e, se quero chegar a tempo, tenho
que sair agora.
Encontro você em Roma no final da semana e retomaremos
exatamente de onde paramos (ou seja, você nu, eu nua, prestação
de serviços etc.). Aqui está um poema para você:

Passado. Presente. Futuro.


Nunca vou me arrepender de nenhum
Momento de amar você.

-Amor, Scarlet
CAPÍTULO 21

CLAIRE

“Cletus.”
“Scarlet?”
“Acordei você?" Olho ao meu redor, apaziguada por todos
os assentos vazios ao redor da minha cadeira no aeroporto.
Ainda assim, faço questão de manter minha voz baixa para não
ser ouvida.
“Não. Estava apenas acordando.” Sua voz rouca me diz que
está mentindo.
Mas não tenho tempo para ser educada. “Preciso falar com
você sobre algo muito importante. Preciso de sua ajuda.”
Sem hesitar e soando muito mais alerta, ele diz: “Prossiga.”
“Estou no aeroporto, prestes a voar de volta para
Nashville.” Não quero mentir, mas também não quero expor ele
ou Simone ou qualquer outra pessoa a riscos desnecessários.
“Não sei quantos detalhes sabe sobre a noite em que Billy
resgatou Simone e Roscoe no restaurante, mas o FBI está
investigando Billy por agredir meu pai enquanto estava
inconsciente. Acham que Billy cortou as mãos dele.”
Agora Cletus hesita antes de perguntar: “Billy disse que
cortou as mãos de Razor?”
“Ele te contou?” Rebato.
Ele fica quieto por um instante, como se essa pergunta
fosse um enigma. “Não. Não falou comigo sobre isso e não
perguntei a ele, mas suspeito.” Sua voz me lembra de Billy, tão
severo, resignado. “Falei com Simone sobre isso, no entanto. Ela
me deu um aviso amigável sobre a investigação do FBI. Entre
você e eu, isso está pesando na minha mente.”
“Acho que tenho um plano," sussurro, rastreando um
homem de terno enquanto passa perto de mim.
“Você tem um plano?”
“Eu tenho. Mas preciso da sua ajuda. Preciso que você e
Simone me levem para ver meu pai amanhã, assim que eu
chegar em Nashville.
“Scarlet. Não. Você não será exposta a isso ...”
“Ouça-me, apenas espere um minuto e ouça. Suponho que
Razor não fale com ninguém, certo? Provavelmente nem mesmo
sua equipe jurídica. Mas ele falará comigo.”
Cletus grunhe. “Por que diabos gostaria de falar com ele?”
“Acho que, se Simone me ajudar a vê-lo, posso fazer com
que Razor admita que ele cortou suas próprias mãos.”
“Espere. Você não acredita que Billy cortou as mãos de
Razor?”
Escolhendo minhas palavras com muito cuidado, digo:
“Acho que Razor vai admitir para mim que incriminou Billy.
Acho que posso fazer uma declaração ao FBI jurando isso como
fato. E então acho que desistirão da investigação e seu irmão
não irá para a cadeia. É isso que acredito.”
Ouço um farfalhar, depois o som de passos, depois uma
porta se fecha. “Espero que esteja feliz. Agora estou sentado no
banheiro, no raiar do dia, para que Jenn não possa ouvir seu
plano de cometer perjúrio.”
“Quem disse que é perjúrio?”
“Scarlet.”
“Tem uma ideia melhor?”
“Bem. Bem. Digamos que você vá ver Razor. Digamos que
jure para cima e para baixo, esquerda e direita que ele admitiu
ter incriminado Billy. Não acha suspeito que esteja voando de
volta à cidade apenas para se encontrar com seu pai e inocentar
o homem com quem está em um relacionamento sério, prestes a
se casar, dar à luz uma ninhada de bebês e viver feliz para
sempre?”
Apesar da situação problemática, não posso evitar minha
diversão involuntária. Se der um centímetro a Cletus, ele levará
um ano-luz.
“Não. Porque não estou na cidade para ver meu pai.
Realmente estou indo para me apresentar no Nashville Music
Festival. Ver meu pai é apenas um capricho, uma curiosidade.
Não tenho segundas intenções.”
“Oh sim? Então, que tal estar em um relacionamento com
Billy? Não acha que perceberão sua intenção?”
“Não se não souberem que Billy e eu estamos juntos. Até
agora, ninguém sabe. Billy e eu estaremos em Roma e, quando
voltarmos aos Estados Unidos, tudo estará acabado. O FBI já
terá encerrado o caso, interrompido a investigação.” Dúvidas
razoáveis contam muito. É também por isso que estou pensando
que se Simone puder pedir a um ou mais agentes que de alguma
forma ouçam meu lado da conversa, não será apenas a minha
palavra.”
“Essas conversas entre presos e visitantes são
completamente privadas. Ninguém ouvirá a menos que ele
concorde. Acha que Razor concordará em deixar o FBI ouvir a
conversa dele com você?”
“Ele não precisa. De fato, é melhor que não ouçam o que
ele disser. Mas quero que me ouçam. Quero que ouçam o que eu
disser. Então ninguém estará mentindo.”
“Exceto você.”
“Nunca disse que iria mentir. Eu simplesmente...”
“Certo, certo. Você acha que pode fazê-lo admitir que ele
cortou suas próprias mãos.” Ele resmunga mais uma vez, algo
indistinto, mas depois diz: “Simone fala muito bem daquele
agente Nelson. Ela faria mais sentido.”
Um flash de esperança explode no meu peito e me sento
mais ereta. “Isso significa que vai ajudar?”
“Na escala de uma a dez das coisas ilegais que eu fiz,
desculpe, supostamente ilegal, isso é como três. Talvez até dois
pontos cinco...” ele murmura. “Não podemos deixar ninguém
saber o que planeja. Não estou colocando Simone ou mais
ninguém em risco. Diremos a todos que está lá para o festival,
mas teve um desejo repentino de visitar o velho pai na prisão.”
“Ninguém está em perigo, nem você, nem eu, porque não
estou fazendo nada ilegal.”
Ele ignora minha afirmação. “Billy ficará louco quando
descobrir que deixei você ficar cara a cara com esse monstro.”
“Você não está me deixando fazer nada, Cletus. Esta é a
minha decisão. Só estou pedindo para me ajudar a entrar na
prisão. Isso é tudo.”
“Mesmo assim, Billy não vai gostar disso quando
descobrir.”
“Eu sei," digo honestamente. “Sei que não vai. Mas Cletus,
eu não podia contar. Entende isso, certo?”
“Entendo.” Ele parece cansado. “Melhor que a maioria, eu
entendo que às vezes é melhor pedir perdão do que permissão,
especialmente quando se trata de proteger aqueles que ama.
Mas depois precisa dizer a verdade.”
“Eu vou.”
“Imediatamente. Sem guardar segredos nobres e tristes.
Vou trancar vocês juntos em outro porão.”
“Eu direi a ele. Sem mais segredos. Mas você não acha que
é hora de alguém se aproximar e ajudá-lo? Ele fez muito, não
apenas por mim, mas por você, sua família, por Green Valley,
pelo Tennessee. Alguém tem que colocá-lo em primeiro lugar.
Alguém tem que mantê-lo seguro.”
“Não se trata de pagar uma dívida, não é? Sabe que ele fez
o que fez porquê ...”
“Porque me ama," termino por ele. “E juro, não se trata de
pagar uma dívida. Entre pessoas que se amam, não há dívida,
apenas excedente. Estou fazendo isso por mim.”
“Está voltando para Nashville para conversar com Razor
Dennings. Certo. Parece legítimo.”
“Isso é um sim? Vai me ajudar?”
Meu amigo resmunga alguma coisa, suspira, resmunga
outra coisa, mas acaba dizendo: “Tudo bem. Sim. Eu ajudo.”

***

Quando você é a única civil com uma multidão de agentes


do FBI e é escoltada para a Instituição de Segurança Máxima de
Riverbend em Nashville, cercada pela referida multidão de
agentes, atrai olhares curiosos, encaradas e olhares
atravessados. Isso é especialmente verdade quando é a primeira
visitante que Razor Dennings concorda em ver ou conversar fora
de sua equipe jurídica.
Ou talvez os funcionários e guardas dão uma segunda
olhada, porque me reconheceram como a atual menina má do
bluegrass do país? Duvido.
Construa um muro. Um tijolo de cada vez. Não deixe nada
entrar. Não o deixe entrar.
Repito essas palavras para mim desde que deixei o hotel
em Veneza quase vinte e quatro horas antes, um antigo
encorajamento que não repetia há quase duas décadas. Pensei
que tinha me preparado, pensei que construí o muro que me
manteria numa segurança dormente. Mas caminhar por esse
lugar me lembra o complexo dos Iron Wraith, com todas as
paredes de cimento, escadas aleatórias, labirinto de corredores,
e agora eu começo a suar frio.
Para Billy. Faça isso por Billy. Pense em Billy.
Isso ajuda.
“Por aqui, Sra. McClure.” A agente especial Hisako Nelson
abre uma porta de metal preto e gesticula para eu entrar. “Em
alguns minutos, seu pai estará na segunda bancada. Atenda o
telefone se quiser falar com ele. Como pediu, ficarei fora de vista,
ouvindo. Se quiser encerrar a discussão, basta se levantar e sair.
OK?”
Concordo com a cabeça, mas hesito do lado de dentro da
porta, meus pés se recusam a dar outro passo à frente. Estou
com tanto medo. Sei que ele não pode me tocar, estará atrás da
divisória de vidro, há guardas, é uma prisão de segurança
máxima, ele não pode nem segurar uma faca e, no entanto, o
medo me paralisa.
“Senhora. McClure?”
Olho para a agente Nelson. Amiga de Simone, lembro.
A agente Nelson me pegou no aeroporto com sua equipe do
FBI. Ela não fez nenhum esforço para disfarçar sua inspeção em
mim na época, e não faz nenhum esforço para disfarçar isso
agora.
“Senhora. McClure, tem certeza de que quer fazer isso?”
Concordo novamente.
Sua inspeção se intensifica. “Você parece aterrorizada.”
“Estou,” sussurro.
A agente se põe de pé, parece agitada, e olha atrás de mim
para a equipe de agentes. “Para trás. Nos dê um minuto.”
Ouço passos relutantes no piso de madeira enquanto os
agentes atrás de mim se afastam, dando-nos espaço. Hisako
Nelson me lembra a atriz Linda Park, só que mais alta, com uma
voz mais profunda e uma atitude de não levar em consideração.
Seu olhar acompanha a retirada de seus colegas agentes e
depois volta para mim. “Por que está aqui? Se está com tanto
medo dele, e acredite eu entendo, ele é aterrorizante, por que
voar da Itália para vê-lo?”
Pratiquei essa parte, e meu desejo de ser crível pelo bem de
Billy afasta minha paralisia pelo terror. Nesse momento.
“Ele não é o motivo de eu estar em Nashville. Não voei de
volta para vê-lo.”
“Não é?”
“Não.” Brinco com a borda do meu suéter. “Estou aqui me
apresentando no Nashville Music Festival. Meu... meu pai foi
preso enquanto estava no exterior.”
“E ainda assim, aqui está você.” Seu olhar se estreita,
movendo-se sobre mim como se meus objetivos estivessem
escritos em algum lugar nas minhas roupas. “Novamente, se ele
te assusta, por que está aqui?”
Aperto meus lábios, dobro meu queixo em uma
demonstração de defesa. “Ele é meu pai.”
“Ele é um assassino em série.”
“Isso não está provado.” Bom Deus, sinto que ficarei
enjoada assim que as palavras saem da minha boca.
Seu lábio se curva em uma demonstração de repulsa
repentina. “Sabe, conheci sua mãe. Você se parece muito com
ela, soa como ela também.”
A fria determinação e desapego que escapam assim que
entramos na prisão fazem um súbito reaparecimento.
Obviamente, a agente Nelson acredita no meu ato até agora. E
isso é bom. Não preciso do respeito dela, mas preciso que ela
confie que não tenho motivos ocultos. Assim, me comparar com
minha mãe é um excelente começo.
“Estou pronta,” digo, encontrando seu olhar diretamente.
“Continue.” Ela aponta para o corredor com desdém.
Afasto-me dela, envolta em minha capa de dormência e
determinação e digo para meus pés se moverem, digo para meus
pés pararem no segundo estande. Digo ao meu corpo para sentar
na cadeira de frente para o vidro. Digo a mim para cruzar os
braços. Para esperar.
Pelo canto do olho, noto, e me alegro, que a agente Nelson
não fechou a porta e outros agentes começam a se reunir. Sei
que não serão capazes de ouvir o lado de meu pai na conversa,
mas, enquanto ela mantiver a porta aberta um pouco, ouvirão
tudo o que eu digo. O que significa que tenho que ser crível.
Tenho que dizer minhas falas perfeitamente.
Construa um muro. Um tijolo de cada vez. Não deixe nada
entrar. Não o deixe entrar.
Não me permito pensar no que acontecerá a seguir. A
verdade é que não tenho ideia do que esperar, mas o objetivo é
conversar com ele por quinze minutos, no máximo, e depois sair.
É isso aí. Isso é tudo. Posso fazer isso. Para Billy. Faça isso por
Billy. Pense em Billy.
Um zumbido alto seguido pelo som de uma porta
destrancando me arranca dos meus pensamentos e me encolho.
Meus músculos ficam tensos, prontos para fugir, e prendo a
respiração. Uso uma alavanca mental para forçar minhas feições
a relaxar, ou pelo menos parecer relaxada e limpo
cuidadosamente meu rosto de toda expressão.
Luto com meu coração frenético, recuo dentro de mim e
digo à minha mente para me levar para longe daqui. Pense em
Billy. Pense em Veneza. Pense em campos de cevada e papoulas
vermelhas. Meu coração desacelera mesmo quando uma voz
dentro da minha cabeça grita para eu sair, correr, fugir. Eu a
sufoco.
Vagamente, sei que ele se senta no banco do outro lado do
vidro e a bile sobe pelo meu esôfago. Eu me sinto um pouco
fraca. Preciso respirar. É isso. Pense em Billy. Encho o pulmão
de ar revigorante, seguro e levanto meu olhar.
Aqueles olhos azuis elétricos, que são inevitáveis nos meus
pesadelos, me encaram por trás dos óculos de aros grossos.
Respiro lentamente. Ainda são aterrorizantes. Firmo meus
lábios. Seguro seu olhar. Meu queixo dói.
Ele me observa por alguns segundos, inspeciona enquanto
me sento perfeitamente imóvel, uma onda de repulsa segue a
trilha de seus olhos. Meu coração não diminui com precisão,
mas para de galopar. Então ele se muda. Eu me encolho
instintivamente, apesar de tudo o que faz é pegar o telefone.
Desajeitadamente, o segura pressionado entre as costas das
mãos. Assisto enquanto usa uma combinação de queixo, ombro
e lateral dos dedos flácidos para posicioná-lo no lugar.
Pisco, minha carranca genuína quando observo esse
homem algemado e sua tentativa estranha de segurar um
telefone. Enquanto luta, eu me permito olhar verdadeiramente,
ver meu pai como é agora e não a figura ameaçadora em minha
memória.
Seu cabelo preto, uma vez comprido, está cortado curto.
Usa um macacão de cor creme, muito folgado para o corpo
magro, que se mistura com a pele pálida. As lentes grandes de
seus óculos parecem grandes demais para seu rosto fino. Não
posso deixar de pensar, ele está muito menor do que me lembro.
Então ele levanta o queixo em direção ao receptor do meu
lado e murmura algo como: Pegue.
Eu faço.
Assim que trago ao ouvido, sua voz diz: “Menina,” mas sai
levemente distorcida pela conexão, como falar com alguém
através de um copo de papel. Olhos estreitados, ele continua sua
inspeção penetrante em mim. “Não posso acreditar que está
aqui.”
“Também não posso.” Minha voz está plana, mas algo sobre
isso ou minhas palavras o fazem abrir um sorriso.
“Humor seco e fodido.” Ele levanta o queixo, tentando
aproximar a boca do receptor. “Por que está aqui? Hã? Você
trabalha para a justiça também?”
“Sou cantora. Trabalho para mim.”
Essa declaração parece diverti-lo também. “Sim, eu sei.
Eles te chamam de a Filha do Diabo. Gosto muito disso. Você
me deixa orgulhoso.”
Engulo em seco contra outro aumento ameaçador de ácido
do estômago, mudo de posição, de repente quero um banho
quente e escaldante.
“O que você quer?” Seu olhar avalia, mais afiado. “E não
me diga que é nada. Só vem ver seu pai quando quer alguma
coisa.”
Contemplo sua afirmação enquanto falo sem examinar
minhas palavras, estimulada por uma repentina curiosidade
mórbida. “Quero alguma coisa.”
Para Billy. Faça isso por Billy. Pense em Billy... Mas também
pense em si mesma.
“Essa é minha garota.”
“Mas como vou ganhar? Você não pode segurar uma faca.
O que aconteceu com suas mãos?”
“O maldito Billy Winston aconteceu com as minhas mãos.
Mas vou vê-lo apodrecer.”
A curiosidade mórbida torna-se outra coisa ao som do
nome de Billy passando por seus lábios. Como ele ousa dizer o
nome de Billy.
Em vez de medo, sinto raiva pelo que fez comigo, pelo que
fez com Billy e todas aquelas famílias. Sobe como uma onda,
lavando toda ansiedade e preocupação. Sou uma guerreira da
justiça. Ando nas asas da justiça. Destruirei esse homem.
Protegerei e manterei Billy seguro. E sim, farei isso por Billy.
Mas também farei isso por mim. Por todas as pequenas
Scarlets por aí, abusadas, negligenciadas e com tanto medo.
Farei isso pela garota que fui. A garota que se contentava em
apenas sobreviver, que não ousava sonhar ou esperar por mais.
Farei isso por ela. Farei isso por um futuro livre de medo.
Pense em Scarlet.
Algo sobre a mudança na minha expressão o deixa
perplexo. Seu olhar dispara sobre mim, confusão atrás dos
olhos.
Agora é a hora. Faça isso agora.
“O que? Por que você faria isso? O que diabos o possuiu
para cortar suas próprias mãos?” Digo alto o suficiente para a
agente Nelson ouvir.
Ele começa a se inclinar para a frente, mas depois se detém
quando o telefone desliza um pouco do ombro. “Do que diabos
está falando?” Rosna, claramente distraído e frustrado por sua
incapacidade de segurar o telefone.
“Para se vingar de Darrell?” Faço uma pausa, como se
estivesse pensando. “Isso não faz sentido. Como cortar suas
próprias mãos te vingaria de Darrell?”
Razor me encara, seus lábios se separam um pouco como
se não tivesse certeza do que está acontecendo ou do que acabei
de dizer. Olho para ele, finjo confiar em cada palavra dele.
Preciso que sua boca se mova. Não importa o que ele diga, só
preciso que fale.
E então ele fala. “O filho de Darrell Winston é a razão pela
qual não posso segurar este telefone agora...”
Por Scarlet.
“Você segurou entre os joelhos?” Faço uma cara
horrorizada. “Você odeia tanto Darrell Winston que se mutilaria
apenas para enquadrar o filho dele?”
Ele pisca, claramente perplexo e olha para mim como se
perdi minhas bolas de gude. Mas então, no instante seguinte, os
olhos de meu pai se arregalam em entendimento. Assisto quando
tudo se encaixa no lugar para ele, o que estou fazendo, por que
estou aqui, e a satisfação bate como um tambor no meu peito.
Isso mesmo, filho da puta. Fim de jogo.
“Sua puta.” Seu insulto é mais um murmúrio do que som
quando seus olhos chocados se movem sobre mim, como se eu
fosse uma estranha, ou como se ele me visse pela primeira vez.
Minha boca se curva, um sorriso de gratificação que
somente ele é capaz de ver. “Gostaria que não tivesse me dito
isso. Não tenho escolha a não ser contar ao FBI a verdade sobre
o que fez com você. Não posso ser cúmplice em suas tentativas
de enquadrar um homem inocente.”
Meu pai explode, lançando-se de seu assento. Apesar do
fato de que está do outro lado do vidro e acorrentado, recuo, meu
coração pula na garganta e decola como um coelho assustado.
A maneira como olha para mim, como um animal selvagem, com
assassinato em seus olhos, sei que nunca irei esquecer. E ele se
joga contra o vidro várias vezes, cuspindo enquanto grita, me
dizendo que vai me matar, até que dois guardas entram e tentam
impedi-lo.
Seus gritos enfurecidos podem ser ouvidos através do
telefone que ainda tenho pressionado no meu ouvido. Então
desligo. Fico de pé. Viro. Volto para a porta de metal preta com
as pernas bambas, permito que meus passos vacilem quando
avisto a agente Nelson ali de pé, com os braços cruzados.
“Alguma coisa que queira compartilhar com o FBI,
senhorita McClure? Antes de ir para seu show?”
Passo por ela e entro no corredor, encosto na parede para
me apoiar e me encolho novamente quando o zumbido enche o
ar, seguido por uma porta pesada, esperançosamente
impenetrável, sendo fechada.
Não acredito que acabei de fazer isso.
“Você precisa de um minuto?” Ela aparece no meu cotovelo,
com os braços ainda cruzados. “Podemos levá-la de volta ao
nosso escritório, se não quiser conversar aqui.”
Levantando uma mão trêmula na minha testa, não tenho
que fingir estar chocada. “Ele disse que cortou as próprias mãos
para culpar o filho de Darrell Winston. Mas, juro, foi tudo o que
ele disse. Nem sei por que me disse.”
O olhar perceptivo da agente se move sobre mim, seus
traços ilegíveis. “Esta é sua declaração oficial? Gostaria de
assinar uma declaração?”
Hesito, espero parecer arrasada e sei que ainda pareço
assustada. Obviamente, quero fazer uma declaração oficial, a
declaração oficial é o ponto principal disso. Mas Cletus me disse
que isso pode levantar suspeitas se eu parecer muito disposta a
fazer. Assim, a hesitação.
Meu coração está fora de controle. Fecho os olhos, mas
rapidamente os abro novamente quando uma imagem de meu
pai passa pela minha mente, louco, homicida. Logo depois de
deixar este lugar, estou ligando para o meu terapeuta.
“Senhora. McClure, é aqui ou no escritório do FBI. Sua
escolha.”
“Tenho que fazer uma declaração oficial?” Preciso me
concentrar. A parte difícil acabou. Se não me recompuser, tudo
isso será um desperdício. “Mas, por que não posso te contar? E
se... e se as pessoas descobrirem que delatei meu pai?” Espero
que isso seja hesitação suficiente, porque não acho que posso
continuar com isso por muito mais tempo.
A agente Nelson troca um olhar com alguém por cima do
meu ombro. Os outros agentes. Esqueci por um momento que
ainda estão presentes e envio uma oração para o alto. Por favor,
Deus, se isso funcionar, nunca mais mentirei sobre nada.
“Depois do que todos acabamos de ouvir, terá que fazer
uma declaração oficial. Mas podemos pedir que o Tribunal
mantenha oculta sua identidade,” ela diz judiciosamente. “Sinto
muito, mas é o melhor que podemos oferecer.”
CAPÍTULO 22

BILLY

“Não surte.”
Olho por cima do ombro para Cletus, um tanto surpreso ao
encontrá-lo pairando na porta do meu quarto.
“Oh. Está falando comigo de novo?” Verifico meu telefone,
vejo que tenho duas horas até minha próxima ligação. Não estou
ansioso por isso. Karl, o incompetente contato de campanha,
encontrou algo novo para entrar em pânico e quer conversar.
De pé da minha cadeira, cruzo os braços e recosto na mesa.
“Já me desculpei com Jenn.”
Desde que voltei ontem de Veneza, Cletus claramente me
evita. Suspeito que isso seja por alguns motivos. Um, Scarlet não
está comigo. Segundo, deixamos o restaurante em Veneza sem
comer a sobremesa que Jenn preparou. Dos dois, meu irmão
provavelmente considera o último um pecado maior.
Ele é mais fanático pelas sobremesas de sua esposa do que
pela própria salsicha caseira de javali. Para colocar isso em
perspectiva, uma vez recusei uma segunda porção de salsicha e
um padre apareceu à nossa porta no dia seguinte, pronto para
conduzir um exorcismo no demônio que obviamente tomou
posse da minha alma.
“Quando não estava falando com você?” Mãos enfiadas nos
bolsos, ele desce lentamente as duas escadas para o meu quarto.
“Apenas estava ocupado, isso é tudo.”
“Certo.” Estudo meu irmão, tomo nota de como sua atenção
parece estar em todos os lugares, menos em mim, um sinal
revelador de que está desconfortável.
“Este é um quarto agradável.” Ele arrasta um dedo ao longo
da parte superior da minha cômoda. Inspeciona o dedo. “Deveria
espanar.”
“Você já esteve neste quarto antes. O que está pensando,
Cletus?” Passei a maior parte de ontem antes de voltar para à
vila vagando por Florença, observando por conta própria e
pensando nas coisas. Pensei especialmente sobre o momento
logo depois que fizemos amor em Veneza, quando Scarlet disse
que seria minha esposa.
Por isso, quando me encontrei na Ponte Vecchio, uma
quadra cheia de joalherias que fazem a ponte sobre o Arno,
comprei anéis para nós. No mínimo, mesmo que me recuse,
Scarlet aprenderá que nunca blefei.
Pigarreando, Cletus coloca a mão no bolso e balança de um
lado para o outro, dando uma espiada rápida em mim. “Então,
posso ter feito algo, ou concordado com algo, que me preocupa,
por assim dizer.”
“Preocupado como frustrado? Ou preocupado como
ansioso?”
“Ansioso.” Ele franze o cenho, parecendo ansioso. “Não me
arrependo, e confio que, com o tempo verá que foi a decisão certa
para todos os envolvidos, mas uh. . .”
Espero ele continuar. A propensão de Cletus a se preocupar
nem sempre é um motivo para me preocupar. Às vezes se apega
a mirtilos. Às vezes, se apega a alarmante falta de pequenas
colheres na cozinha da casa grande. Por outro lado, às vezes se
concentra em planejar a queda das organizações criminosas.
Basicamente, sua ansiedade pode ser qualquer coisa.
Quando não continua falando, mas continua a lutar
visivelmente, me endireito da mesa, vou até ele e coloco uma
mão gentil no ombro dele. “Ei. Está bem. Diga-me como posso
ajudar.”
“É Scarlet.”
Fico tenso, preocupação faz meu coração gaguejar.
Ela desapareceu no meio da noite, deixando-me uma nota
sobre participar de um festival de música gigante no Tennessee,
mas também me deixou confuso. Queria ser um apoio para ela.
Nunca a seguraria. Então, embora não estou chateado por ela
sair para perseguir seus sonhos, fiquei decepcionado. Gostaria
que me pedisse para ir com ela, eu a seguiria em qualquer lugar.
No entanto, sua promessa de me encontrar em Roma no final da
semana ajudou a acalmar parte da dor.
Mas agora, examinando o perfil ansioso de meu irmão, a
preocupação aumenta. “Scarlet?”
“Ela fez isso para ajudar.”
Fico parado, perguntando baixinho: “O que? O que ela fez?”
Cletus fecha os olhos. “Ela vai lhe dizer quando encontra-
lo, ela me prometeu.”
“Então pode me dizer agora e salvá-la do problema.”
“Ok,” ele concorda imediatamente, como se estivesse
esperando que eu fizesse essa mesma sugestão. Abre os olhos e
encara os meus. “De alguma forma, Scarlet constatou que Razor
o acusou de agressão com sua própria faca enquanto ele estava
inconsciente na lanchonete. Então, ela decidiu voar de volta
para Nashville, visitá-lo na prisão e ver se pode fazê-lo admitir
que está mentindo. E, portanto, fazer uma declaração oficial ao
FBI e limpar seu nome.”
“Ela o quê ?!” Minha mão cai.
Meu irmão estremece com a minha pergunta gritada, com
os ombros contraídos. “Decidiu voar de volta para Nashville,
visitar...”
“Eu ouvi você na primeira vez, Cletus!” Viro as costas para
o meu irmão e passo os dedos pelos cabelos. Conheço meu irmão
o suficiente para saber o que realmente quer dizer. Scarlet voou
para Nashville para visitar Razor para poder mentir para o FBI.
Meu cérebro pega fogo. Meu coração deixa meu corpo. Ando
de um lado para o outro, me sinto enjaulado, impotente. Odeio
me sentir impotente. Não posso... eu não posso... “E você sabia?
Sabia que ela ia fazer isso? O que estava pensando? E que diabos
você estava pensando? Deixá-la ir ver aquele homem? Tem
alguma ideia do que ele fez com ela? Que tipo de inferno a fez
passar?”
“É por isso que estou consertando.”
“Certo, você deveria consertar!”
“Quero dizer, além do confronto com o pai, o plano dela é
sólido.”
“Foda-se o plano!” Paro antes de limpar a mesa do meu
laptop, telefone, vaso e lâmpada e ouvir o barulho da destruição.
“Não. O plano é bom. E isso evita que você vá para a cadeia,
o que...”
Avanço em meu irmão, minhas mãos fechadas em punhos.
“Não me importo em ir para a cadeia, Cletus. Fiz o que fiz e não
sinto muito por isso, e será um dia frio no inferno antes de deixar
Scarlet passar pelo horror de encarar o pai apenas para me
proteger.”
“Ah? Quer dizer como você se colocou diante do horror de
encarar o pai dela apenas para protegê-la?”
Olho para ele. “Isso foi diferente.”
“E por que foi diferente?”
“Porque...” não consigo focar no meu irmão através do
vermelho nublando minha visão. Como ela pôde fazer isso? Por
que se colocou nisso?
“Acho que ela fez isso porque te ama,” Cletus diz, e percebo
que disse pelo menos uma de minhas perguntas em voz alta.
“Ela mentiu para mim. Disse que ia para Nashville para se
apresentar em um show.
Cletus balança a cabeça antes que eu termine minha frase.
“Ela não mentiu para você. Está indo para Nashville para se
apresentar naquele concerto. É amanhã.”
“Sabe o que quero dizer. Ela me enganou.”
“Sim. Provavelmente porque sabia que tentaria detê-la.”
“Muito bem, eu tentaria detê-la. Teria me entregado.
Teria...”
“Ido para a cadeia,” ele termina por mim. “E então ela o
visitaria semanalmente, em vez de visitar o pai apenas uma vez.
Parece um futuro tão bom para todos vocês. Não consigo
imaginar por que ela tomou as coisas, e sua felicidade, em suas
próprias mãos como fez. Que egoísta.”
Com os punhos no quadril, faço uma careta para o meu
irmão e para o absurdo dele. Enquanto faço uma careta e ele
encontra meu olhar enfurecido, suas palavras penetram a
barreira da raiva em volta do meu cérebro.
Relutantemente, aceito que tem razão. Mas não posso
aceitar completamente o argumento dele.
Em um nível visceral, o pensamento de Scarlet ver seu pai
novamente me adoece e me enfurece. A mera ideia é abominável
para todas as partes do meu ser. Mesmo enquanto brigo com
meu irmão, luto para controlar a intensidade violenta da minha
ira fervente.
Odeio o homem. Fui eu quem cortou suas mãos, não
Scarlet. E não me arrependo da decisão, não me arrependo ou
sinto um pingo de contrição até agora, agora que ela pagará o
preço.
“Se ela for pega mentindo por mim, nós dois iremos para a
cadeia,” aponto o óbvio, medo e raiva cobre minha garganta.
Apenas o pensamento dela na prisão, sofrendo pelo meu ato de
vingança, fico louco.
“Então não seja pego,” diz, como se fosse tão simples.
Olho para o meu irmão. E então olho para meu irmão,
percebendo que não parece mais ansioso. Na verdade, quase
parece satisfeito se não considerar a linha severa da boca e o
leve tom de tristeza atrás dos olhos.
Diante de mim, ele dá de ombros como se estivesse
cansado. “Entendo sua raiva e odeio que ela teve que fazer isso.”
“Ela já fez isso?”
Ele concorda.
A angústia enche meus pulmões como um peso de chumbo,
uma dor afunda no meu estômago. A necessidade de estar com
ela, de confortá-la agora, obscurece abruptamente minha
frustração.
“Se houvesse alguma maneira de fazer isso sem enviar
Scarlet para a batalha,” ele continua, “eu faria. Mas ela estava
desesperada para fazer alguma coisa. Como estava inflexível,
achei melhor ajudar do que impedir. Não havia razão para
dificultar as coisas para ela.”
“Poderia pará-la, me dizer o que planejou.”
“Não. Acho que não.” Os olhos dele brilham, mas a linha
da boca permanece firme. “Sei que isso pode ser uma pílula
difícil de engolir, porque foi para mim, mas não pode usar a capa
de herói o tempo todo. Em alguns casos, você é o salvador,
outras vezes é o socorrido. É assim que funciona. E pode ficar
aqui, fervendo em seu caldeirão azedo por não ser o herói desta
vez, ou pode pegar o avião de Sienna de volta a Nashville e
agradecer a sua mulher por salvar sua bunda.”
“Não posso, posso? Depois do que acabou de passar, ela
precisa de mim agora. Teve que passar pelo inferno, enfrentando
Razor. Mas se eu voar para lá e formos vistos juntos, isso minará
sua credibilidade.”
“Está certo. Ela precisa de você, então vá até ela. Esgueire-
se, se encontrem às escondidas. Mais uma vez, apenas não seja
pego.”
“'Apenas não seja pego,' hein? Como se fosse tão fácil.”
“É fácil, Billy. Sabe quantas vezes eu violei a lei e não fui
pego?”
“Não quero saber...”
“Muitas vezes. Se pude fazer muitas vezes, você pode fazer
uma vez.”
“Não é só isso, Cletus.” Aqui vamos nós novamente. “Não
quero que seja assim. Não quero que sejamos um segredo.”
“Comprometa-se um pouco, Billy. Meu contato no FBI acha
que, assim que encerrarem a investigação, definitivamente
permanecerá encerrada, mesmo quando forem a público.
Estamos falando de uma semana, duas semanas no máximo
sendo cautelosos, e a maior parte desse tempo será quando
forem à Roma. Ninguém em Roma se importa com um
congressista do Tennessee e uma estrela da música country
cantando sobre o fettuccine. E Scarlet não apenas fez um
trabalho infernal, como o FBI não está tão interessado em
investigá-lo, para começar. Acha que alguém se importa em
obter justiça para Razor Dennings colocando o homem que o
pegou na cadeia? Não. A justiça pode ser cega, mas não é tão
cega.” Puxando a mão do bolso, ele verifica o relógio no pulso.
“Oh. Acabou o tempo. Se quer confortar sua mulher, precisa ir.
Não há necessidade de fazer as malas, tenho certeza de que sua
fada do terno terá algo para você na chegada em Nashville.”
“Você é um furtivo, Cletus,” digo cansado e pego meu
telefone da mesa colocando no bolso.
“Verdade.” Ele balança a cabeça, pensativo e acrescenta:
“Mas não é mais apenas você carregando o fardo, Billy. Goste ou
não, às vezes a única maneira de vencer é se render.”

***

Talvez se estivesse mais calmo, com a mente mais clara,


seria mais receptivo à histeria de Karl. Ou, se não receptivo,
desdenhoso. Mas não estou calmo e minha mente não está clara.
A questão é que não deveria atender o telefone. Enquanto
viajava, todas as dez chamadas anteriores foram para o correio
de voz. Andando no camarim de Scarlet nos bastidores do
festival, esperando que ela aparecesse, cometi o erro de atender
sua décima primeira ligação.
“Billy.”
Cerro os dentes. “Esse é meu nome.”
“Você tem sido impossível de alcançar e temos uma
emergência. Não se preocupe, lidei com as coisas. Por agora.”
Ele parece estar sem fôlego.
“Bom.”
Karl espera que eu pergunte sobre a emergência. Não
pergunto. Não é meu hábito fazer uma pergunta quando sei que
a outra pessoa está ansiosa para fornecer uma resposta. Isso
seria um desperdício de ar. Em vez disso, deixo meu olhar vagar
pelo conteúdo do camarim, pelos grandes buquês de flores, pelos
sacos de presentes, pelas bandejas de aperitivos com aparência
gourmet, pelas várias garrafas de champanhe, refrigerante e
água no gelo.
Minha mão se fecha sobre a pequena caixa de veludo no
meu bolso, nervoso e antecipação amarram um nó no meu
estômago.
Eventualmente, o silêncio ultrapassa a capacidade de
paciência de Karl. “A situação é sombria. Catastrófica. Estamos
olhando para o barril da derrota. Ainda não começamos a
pesquisa, mas sei que perderá, a menos que resolvamos alguns
de seus problemas rapidamente. Existe alguma chance de
Payton estar aberta a um compromisso de conveniência? Só até
a campanha para o Senado terminar no próximo ano. Implore se
precisar.”
“Eu não imploro.”
Karl faz uma série de sons crepitantes.
O suficiente. Já tive o suficiente.
Antes que ele recupere sua capacidade de falar, acrescento:
“Não vou concorrer. Eu me retiro. Diga a eles para encontrar
outra pessoa. Adeus.”
Bem. Está decidido. Andando.
Termino a ligação, tiro Karl da cabeça com facilidade e toco
no ícone de mensagem novamente, para o caso de ter perdido
outra mensagem de texto de Scarlet. Não encontro novas
mensagens, percorro as que ela me enviou enquanto estava no
avião. Não as recebi até depois do pouso.

Scarlet: Sinto sua falta e me desculpe por ter saído tão


de repente. Se tiver tempo para conversar hoje, me avise.
Scarlet: Espero que não esteja chateado comigo por
sair, mas se estiver, entendo completamente.
Scarlet: Um poema
Quando estamos com raiva,
Vamos marcar um encontro, fazer as pazes
Sexo dentro de uma hora
Apesar da desordem dos meus pensamentos, essa última
mensagem me tira um sorriso. A maior parte da minha raiva se
dissipou quando o avião de Sienna pousou. Scarlet está prestes
a se apresentar na frente de uma enorme multidão depois de
encarar o pai, depois de mentir para o FBI. Principalmente,
estou ansioso para colocar meus olhos e mãos nela, para
confirmar que está segura e bem.
E se não estiver segura e bem, farei o que ela precisar.
A porta se abre e olho para cima, meu coração sobe na
minha garganta. Ouço alguém cumprimentá-la, chamá-la de
Claire. Ouço a voz dela quando agradece, calma e serena. Então
dá um passo para trás no vestiário, ainda não me vendo,
enquanto tenho certeza de que meus olhos saem da minha
cabeça.
De pé de perfil, vestindo calça de couro como uma segunda
pele, que, tecnicamente acho que são, uma blusa preta decotada
e tênis Converse, ela acena, sorrindo para quem continua além
da porta.
Mas então, como se sentisse que não está sozinha, seus
olhos se voltam para o camarim e ela olha duas vezes quando
me vê, sua expressão se transforma em choque.
A pessoa com quem ela fala deve ter notado, porque um
segundo depois um homem usando um fone de ouvido entra,
olhando para onde Scarlet olha, seus olhos também arregalam.
“Bem, olá,” ele diz, olhando para baixo e depois para cima
no meu novo traje que a fada entregou na minha chegada a
Nashville. “Você está...” Ele olha para Scarlet, depois de volta
para mim. “É um dos presentes dela?”
A pergunta parece tirar Scarlet de seu transe, e suas
bochechas ficam rosadas. Abre a boca como se quisesse
responder, mas já estou respondendo.
“Sim. Sou um dos presentes dela. Não posso tê-la me
apresentando.” Ninguém deve saber que o congressista Billy
Winston está envolvido com a estrela da música country Claire
McClure, pelo menos não por mais algumas semanas.
O homem sorri, enviando um sorriso malicioso para Scarlet
quando sai da sala. “Vou garantir que não seja perturbada.”
Visivelmente perturbada, ela olha para o homem, depois
para mim e depois para a porta que fechou rapidamente,
deixando-nos sozinhos e sem ser incomodados.
Ela exala um suspiro curto e atormentado e me encara,
cruza os braços sob os seios, o olhar cauteloso. “O que está
fazendo aqui?”
“Cletus me disse. Se alguém perguntar, sou Alex Greene,
de Chicago. Não adianta dar voltas.”
Um lampejo de dor e consternação prende suas feições
pouco antes dela deixar cair o queixo, escondendo o rosto com
seus longos cabelos cor de cobre. “Por favor, não fique com
raiva.”
Se restava alguma raiva residual, desaparece
completamente ao ver seus ombros caídos e o som de agonia em
sua voz.
Chego nela em três passos, a puxo contra mim e em meus
braços, tranquilizada pelo contato e pela sensação dela. “O que
eu posso fazer?”
Scarlet se aconchega embaixo do meu queixo, seus braços
apertam ao redor do meu tronco e respira fundo, como se
pudesse me puxar para dentro de seu corpo, respirando-me.
“Não fique bravo.”
“Não estou. Estava com raiva, principalmente com Cletus.
Mas não estou agora.”
“Sinto muito. Não conseguia pensar em outra maneira. Não
posso te perder de novo.” A voz dela fica embargada.
Deslizo um dedo sob seu queixo, levanto-o para colocar um
beijo suave em seus lábios antes de falar contra ela. “Da próxima
vez, fale comigo. Por favor. Nos dê uma chance de descobrir isso
juntos.”
“OK. OK. Eu vou. Eu juro.” Ela rouba outro beijo, os olhos
arregalados e vidrados. “Aprendi minha lição.”
Sinto minha boca engatar de um lado. “Aprendi minha lição
também.”
“Você aprendeu?” Sua voz falha, sua cabeça recua um
centímetro. “Lição sobre o quê?”
Luto contra um sorriso diante da ironia e cito meu irmão:
“'Às vezes, a única maneira de vencer é se render'.”
Uma risada escapa de seu peito e relaxo enquanto seu
sorriso cresce. “Esse é um dos dizeres da sua mãe?”
“Não. Mas suponho que agora seja um ditado familiar,”
respondo secamente enquanto olho nos olhos dela. Ela ainda
parece inquieta, frenética, e meu estômago revira com o
pensamento dela de frente para o pai. “Scarlet. O que posso
fazer? Você está segura, com ou sem mim. Não importa o que
decida para o seu futuro, ele nunca tocará em você. Eu juro.
Acredite em mim.”
O queixo dela treme e aperta os lábios, lágrimas se
acumulam nos olhos. “Oh, não foi tão ruim,” ela sussurra, a
rachadura em sua compostura aumenta com sua mentira.
O olhar em seus olhos, o terror que obviamente sentiu ao
confrontar o pai, me lembra uma Scarlet de quatorze anos de
idade. Também me traz à mente um garoto de dezesseis anos,
frustrado com o meu desamparo.
Fungando, ela força os lábios em um sorriso. “Sabe o que?
Isso é uma mentira. Foi terrível, e odiei.” Agora ela sorri, como
se se sentisse ridícula. “E sabe a pior parte? Esqueci o quão
solitário é ter medo assim.”
“Você não está sozinha,” digo ferozmente, seguro sua
bochecha e limpo uma lágrima rebelde, memorizando a
sensação aveludada de sua pele.
“Você também não está sozinho.” Seu tom também e feroz,
e seu sorriso depreciativo desaparece. “Estou aqui.” Pontua
essas palavras dando-me um leve movimento, seus olhos fixos
nos meus. “Estou bem aqui. Seus fardos são meus, assim como
suas esperanças e sonhos. Quero tudo isso. Quero compartilhar
tudo com você. Por favor. Confie em mim para ser forte.”
“Confio em você.” Passo a mão pelas costas dela,
pressionando-a para mais perto, meus olhos flutuam para seus
lábios. “Eu te amo.”
“Eu te amo.” Quando ela sorri desta vez, é sutil, mas
também é sereno.
Levo um momento para olhar para ela, minha amada,
antes de perguntar baixinho: “O que posso fazer para ajudá-la a
se preparar?”
“Me preparar? Para quê?”
“Para o show.”
Ela fica rígida. “Oh meu Deus. Esqueci totalmente.”
Afrouxo os braços e ela se afasta. Com grande relutância, a deixo
ir. Por agora.
Temos muito tempo. Não precisa correr.
“Meu cabelo está arrumado. Minha maquiadora deve estar
aqui em breve.” Ela olha ao redor da sala, girando em um meio
círculo. “Preciso me aquecer.”
“Posso ajudar com isso.” Avisto algumas guitarras no
canto, vou até lá, seleciono a Martin D-45 e a admiro a caminho
do sofá. “Esta é uma boa guitarra.”
“Você gosta dela?”
Balanço a cabeça, tocando alguns acordes. “Bom som.”
De pé na minha frente, me vendo tocar por meio minuto,
ela coloca as mãos no quadril. “É estranho que estou com um
pouco de ciúmes?”
“Com ciúmes?”
“Sim.”
“Sobre o que?”
Ela aponta para o instrumento, sentando-se ao meu lado.
“Suas mãos estão por toda parte e isso fica no seu colo.”
Isso me fez rir, e olho para ela pelo canto dos meus olhos.
“Se quer se aquecer no meu colo, estou mais do que disposto.”
E isso a faz rir, mas também a faz corar.
Toco a introdução do primeiro single de seu último álbum,
uma música intitulada “When Winter Sings,” inclino para mais
perto e roço meu braço contra o dela. “O que quer que eu toque?
Para o aquecimento.”
Sua atenção se move entre minhas mãos e meus olhos, os
dela ficam pensativos. “Ei, então, tenho uma pergunta,” ela diz
de repente, me fazendo pensar que não quer se aquecer ainda.
“Como chegou aqui tão rápido?”
“Você sabe que Sienna tem um avião?”
“Você pegou o avião dela?”
“Sim.” Mudo para “Free Fallin.” “E, aparentemente, Sienna
tem a capacidade de garantir passes nos bastidores e acesso
ilimitado a qualquer evento de concerto no mundo. Foi assim
que entrei no seu camarim.”
Para constar, não gosto das implicações disso. Em algum
momento, Scarlet e eu teremos que conversar sobre aumentar a
segurança dela.
Mas então ela me surpreende dizendo: “Bem, isso é
angustiante.”
Eu a estudo e seguro meu silêncio.
Seu olhar perde o foco, voltando-se para dentro. “Eu devia
falar com meus seguranças. Só os tenho para shows e eventos,
mas não devem deixar as pessoas no meu camarim, não importa
quem sejam.” Ela parece pensar sobre isso por alguns segundos,
e então sua atenção volta para mim. "A menos que seja você, é
claro.”
“Claro,” concordo. Porque é claro.
Seus olhos vagam por mim em meu novo traje. “Tenho
outra pergunta.”
“Sim.”
Agora ela sorri. “Não perguntei ainda.”
“Seja o que for, provavelmente vou dizer que sim.”
Seu olhar aquece, e se inclina para mais perto, uma mão
suaviza a frente da minha gravata, sua voz baixa ao perguntar:
“Então, você é meu presente?”
A caixa de veludo no meu bolso pressiona insistentemente
contra a minha perna enquanto olho para ela, mas decido que
agora não é a hora certa. Ela está prestes a subir no palco, se
apresentar para milhares de pessoas. Não precisa de sua
atenção dividida.
Ponho de lado o violão, também me inclino para perto e
deslizo a palma da mão pela coxa dela. “Gostaria de ser um
presente para você.”
“Você é um presente para mim.” Com os olhos enevoados
de felicidade, ela sobe no meu colo e enrola os braços em volta
do meu pescoço. “Nunca duvide disso.”
Abraçando-me, ela descansa a cabeça no meu ombro e dá
um beijo no meu pescoço. E a seguro, saboreando a doçura do
momento.
Escalamos montanhas para chegar aqui, atravessamos
mares tempestuosos. Não tenho ilusões, nossa navegação futura
será tranquila. Mas, esperançosamente, dadas as últimas
semanas e tudo pelo que lutamos, resolveremos e
compartilharemos, qualquer que seja o caminho que
percorrermos, estaremos juntos a partir de agora.
CAPÍTULO 23

BILLY

Passamos as próximas semanas em Roma, Scarlet


terminando seu último álbum, eu trabalhando remotamente
algumas vezes, mas cada vez mais apenas preparando o jantar,
esfregando seus pés após um longo dia e fazendo amor com ela
a noite toda.
Roma foi incrível.
Mas não a pedi em casamento. Planejei várias vezes, nos
jardins da Villa Borghese, sob o teto da Capela Sistina, no
restaurante do outro lado do quarteirão do nosso apartamento
que rapidamente se tornou nosso favorito e, no entanto, quando
chegava a hora, nenhum momento parecia o certo.
Em vez de voar diretamente para Nashville através de uma
companhia aérea comercial, que era o plano original, Sienna nos
subornou para que parássemos no Green Valley primeiro
enviando seu avião particular. Jethro também enviou outro
terno novo para mim, assinando o cartão com, Seu fada
madrinha do terno, que fez Scarlet rir.
Pousamos no meio da tarde. Ashley nos encontra no
aeroporto com Bethany e Ben, que estão notavelmente
empolgados em nos ver. Não há saudação como uma saudação
de criança, beijos e abraços e exclamações de amor eterno, bem
como demonstrações de afeto.
“O que você tem aí, Ben?” Scarlet aponta para uma bola de
algo em sua mão enquanto caminhamos para o carro de Ashley.
“Esta é uma bola para usar na secadora. Ajuda as roupas
a secarem mais rápido e a sra. Winters da biblioteca é uma
bruxa.”
“Bom.” Scarlet olha para mim e nós assentimos um para o
outro, pegando sua declaração. “Está bem então.”
Não demora muito tempo para chegar à propriedade,
apenas quarenta minutos, mas quando chegamos, sinto uma
pontada estranha no peito e um estranho momento de tristeza.
Pela primeira vez na minha vida, não parece voltar para casa.
Estava presente o tempo todo em que Jethro a limpou,
restaurou, escolheu cores e pintou o exterior, escolheu as tintas,
guarnições e intradorsos novos e refinou a varanda. Mas vendo
agora, a coleção de todos os seus anos de trabalho duro,
mudanças e toques pessoais, percebo que não é nosso lar. Agora
é de Jethro, Sienna e os filhos deles.
E sou um visitante.
“Você está bem?” Scarlet pergunta do meu ombro,
deslizando a mão na minha.
Balanço a cabeça, coloco meu braço em volta dos ombros
dela, e afasto a dor transitória da minha voz enquanto respondo:
“Eu ficarei.”
Dentro há uma agitação de atividades, e logo perco a noção
de Scarlet quando é puxada para a cozinha para fazer sabão com
Jenn e Shelly. Enquanto isso, Jethro, Roscoe, Drew e eu
atravessamos o campo em direção ao galpão de madeira.
“Acredite ou não, estamos com pouca madeira” Jethro
gargalha, como se isso fosse a coisa mais engraçada do mundo.
“Nunca pensei que veria o dia.”
“Como foi em Roma?” Roscoe pergunta, arregaçando as
mangas da camisa.
Meu olhar cintila em seus antebraços e depois volta a seus
olhos, parando antes de dizer: Você não está cortando lenha.
Ainda está se recuperando, para poder arregaçar as mangas da
camisa.
O fato é que Roscoe cresceu. Não precisa mais de mim
pairando, checando suas decisões, resolvendo problemas, se
preocupando. Sempre poderei ver o menino nele, mas agora ele
precisa que eu o trate como um homem.
Então digo: “Foi ótimo.”
“Quanto tempo vocês vão ficar?” Jethro toma um gole de
sua cerveja. “Sienna não conseguiu uma resposta direta de
Claire.”
“Apenas alguns dias. Obrigado por nos deixar ficar na casa
da garagem.”
“Claro.” Meu irmão sorri para mim mesmo quando sua
testa se franze. “Você é bem-vindo para ficar para sempre.”
“Eu sei.” Espio o campo, estudando a montanha que se
ergue diante de nós, envolta em todos os seus vários tons de
verde. “Mas acho que está na hora.”
“E a fábrica? Quando voltará ao trabalho?” Drew puxa uma
garrafa de cerveja do bolso lateral da calça cargo e abre a tampa.
Para o registro, não é uma novidade. O homem parece
capaz de abrir qualquer coisa com as próprias mãos, cerveja,
armadilha para ursos. Além disso, costuma usar os bolsos da
calça cargo como porta cerveja. Pensei em comprar uma para os
fins de semana apenas para esse fim.
“Voltarei às operações da fábrica no próximo mês, mas
Dolly me quer em Nashville agora em tempo integral. Funciona
desde que o congresso estadual voltará às Sessões Ordinárias
em breve. Posso dirigir o escritório nacional da fábrica a partir
daí.” O que não digo a eles é que Scarlet e eu teremos uma
reunião com um corretor de imóveis na próxima semana para
examinar as casas. O apartamento dela é bonito, mas tem
apenas um quarto, pouco mobiliado, com uma cozinha que
parece um selo postal equipado.
A mulher merece uma grande cozinha com todos os
adereços, e é isso que ela terá.
“Vai voltar para a fábrica?” Jethro parece confuso com esta
informação. “A última vez que ouvi falar, estava concorrendo a
uma cadeira no senado.”
Solto um grunhido curto e insatisfeito no fundo da
garganta antes que possa pegá-lo.
Roscoe responde por mim. “Não. Ele se retirou.”
Roscoe sabe desde que estávamos em Roma.
O Partido quer me fazer mudar de ideia, prometendo um
novo contato com a campanha, mas o navio partiu. Não quero o
assento, um fato que se tornou óbvio quando não senti nada
além de alivio depois de demitir Karl. Por um tempo, Scarlet
ficou preocupada por eu fazer isso por ela. Mas agora está
convencida de que fiz isso por mim, o que é verdade.
“Pode ser bom que vocês não fiquem no Green Valley, na
verdade. Provavelmente melhor se ninguém na cidade souber
onde está com certeza.” Jethro coça a nuca, sua expressão
pensativa. “Os Wraiths estão uma bagunça, perdendo membros
à esquerda e à direita. Agora que a liderança está na prisão,
ninguém está por perto para infligir ordem. Estão entrando em
todo tipo de merda bagunçada. Melhor Claire não estar aqui.”
Drew franze a testa para mim, depois para Jethro. “Você
quer dizer instilar ordem?”
“Não. Quero dizer infligir.” Jethro nos dá um sorriso que
não alcança seus olhos. “O tipo de liderança de Razor foi
definitivamente uma aflição.”
Meu irmão diz a verdade. Mas agora, a aflição de Razor
Dennings não é oficialmente da minha conta.
Logo depois que Scarlet e eu chegamos a Roma, recebi uma
ligação de Dani Payton, dizendo que ouvira através de sua irmã
mais nova, a agente do FBI, que todas as acusações contra mim
foram retiradas e o caso encerrado. O perjúrio de Scarlet
funcionou e agora estou fora do gancho, livre do escárnio.
Ainda não estou muito conformado com isso, mas estou
tentando me render.
“Ei. A propósito, já pediu para ela se casar com você?” Essa
pergunta vem de Roscoe e lhe vale um olhar de lado.
O anel no meu bolso de repente parece mais pesado.
“Você perguntou a Simone?” Jethro pergunta, com um
sorriso de comer merda.
Roscoe faz uma careta. “Gostaria de perguntar hoje se
pensasse que ela diria sim.”
“Pergunte não apenas quando for a hora certa, mas
também quando for o momento certo. Não apresse as coisas só
porque está ansioso para torná-las oficiais. Geralmente você
pergunta apenas uma vez. Faça valer a pena.” Drew diz isso
como se tivesse uma vasta experiência no assunto.
“Por que não acha que Simone diria que sim?” Para não se
intimidar, Jethro cutuca Roscoe. “É por causa da sua barba?”
A mão de Roscoe chega à sua mandíbula. “O que há de
errado com minha barba?”
“Claire tem aquele show na próxima semana? No Texas?”
Drew, sempre o diplomata, redireciona a conversa para longe
das provocações de Jethro.
“Sim,” confirmo.
“Você vai, certo? Lembre-me e lhe darei o nome de alguns
bons restaurantes em Austin.”
“Obrigado.” Envio um olhar agradecido ao meu cunhado.
“Eu apreciaria.”
A última vez que assisti Scarlet cantar para uma plateia foi
no Nashville Music Festival há mais de um mês atrás. Assisti do
palco, de pé nos bastidores. Sem surpresa, ela foi ótima. Porque
é ótima. Scarlet é uma grandeza que ganha vida.
Em um ponto da apresentação dela, fiquei um pouco
emocionado, pensando naquele dia em que cantamos juntos na
floresta atrás da casa da minha família, como olhou para o meu
violão de trinta dólares como se fosse feito de mágica. Ela apenas
começava a sonhar. Eu me maravilho com ela agora,
comandando uma plateia de milhares, segurando-as em suas
garras, comendo na palma de sua mão.
Aparentemente, não é apenas os Billy e as cabras.
Depois, voltei quando ela se encontrou com o pessoal VIP,
autografando coisas, posando para fotos, sorrindo e ouvindo
cada pessoa, fazendo-as se sentirem especiais. Mas realmente,
ela é. É singular. Faz tudo mais brilhante. Outras pessoas
apenas se deleitam, brilhando por associação.
Quando seus seguranças finalmente cortaram a linha e ela
foi levada, eu a vi virar a cabeça, seu olhar procurando.
Ela está te procurando.
Nossa, como os tempos mudaram. Costumava procurá-la e
estava escondida nas sombras. Mas agora, ao refletir sobre isso,
decido que tudo está exatamente como deve ser. Nunca me senti
confortável com os holofotes, com atenção. De pé nos bastidores
esperar Scarlet é um dos meus lugares favoritos.
Depois de cortar madeira e beber cerveja por uma hora,
fazemos uma breve verificação de perímetro da propriedade, até
a linha das árvores, e depois voltamos para casa.
É na linha das árvores que uma ideia se forma, uma noção,
e faço um plano. O que tenho em mente é uma surpresa e
imagino que a parte complicada será convencê-la a sair sem
dizer o porquê.
No entanto, assim que entramos pela porta dos fundos,
somos recebidos com o som do caos. As damas estão
gargalhando, Beau, que eu não tinha visto, grita, e um grupo de
corpos estão entre Scarlet e a gêmea, como se quisessem
protegê-la.
Ao me ver, Scarlet se aproxima, pega minha mão e me puxa
de volta para fora, dizendo: “Vá, vá, vá!”
Perplexo, deixo que ela me arraste no meio do campo de
flores silvestres ainda no final do verão antes de pará-la. “O que
está acontecendo?”
Ela olha rapidamente para a casa, um sorriso alegre no
rosto quando algumas risadas escapam dela. “Vingança por
Veneza.”
“Vingança?” Estudo seus olhos brilhantes, sua expressão
feliz e depois olho para a varanda dos fundos, meio que
esperando um Beau enfurecido sair correndo de casa. “O que
você fez?”
Scarlet sorri seriamente, o som um pouco sinistro. “Depois
de obter o consentimento de Sienna e Jet, coloquei um balde de
óleo vegetal na entrada da cozinha e chamei Beau para dentro.”
Recuo. “E então jogou na cabeça dele?”
Ela cobre a boca, ainda rindo. “Mas então... oh meu Deus,
Billy. As penas.” Ela se dobra, segurando a barriga, os ombros
tremem.
Como a alegria dela é contagiosa, eu também sorrio,
balançando a cabeça e tentando segui-la. “Penas?”
“Ele subiu as escadas... banheiro...” Ela aponta para o céu.
“Penas...” Agora faz um movimento de chuva com as mãos.
“Outro balde... e elas... elas... o rosto dele! A barba dele!” Ela
bufa, o que apenas a faz sorrir mais, com lágrimas de alegria nos
olhos.
Reviro os olhos, agarro sua mão e a puxo pelo restante do
campo, fazendo uma anotação mental para nunca fazer uma
brincadeira com minha amada.
Depois de um longo tempo, sua risada diminui para
algumas risadas breves e ela parece perceber que a estou
levando a algum lugar específico. “Onde estamos indo?” Ela
funga, limpando a umidade embaixo dos olhos.
“Você vai ver,” digo, sorrindo um pouco e lutando contra
um estranho ataque de nervosismo.
Ela suspira, parecendo feliz, e me segue.
Alguns segundos depois, corre alguns passos para que
estejamos caminhando lado a lado e pergunta: “Então, por que
uma cabra?”
Olho para ela. “Desculpa?”
“Por que sua tatuagem é uma cabra? Continuo querendo
perguntar.”
Sorrio, olhando para longe e reviro os olhos para o meu eu
mais jovem. “É... é meio engraçado agora, em retrospecto.”
“Conte-me.” Ela puxa meu braço. “Nada pode ser tão
engraçado quanto ver Beau coberto de penas.”
“Você se lembra daquela noite em que cheguei à sua casa
e exigi que fosse comigo?” É bizarro trazer isso à tona sem a
labareda de desejo, irritação ou desolação.
“Sim. Eu lembro,” responde calmamente, talvez tenha
pensamentos semelhantes.
“Você se lembra do que disse? Depois que te beijei e nos
beijamos? Mas então parei e você ficou com raiva.”
“Uh...” Seus olhos se movem para cima e para a direita e,
de repente, voltam aos meus, arregalados de realização. “Você
fez uma tatuagem de cabra porque eu disse que preferia dormir
com uma cabra do que você?”
Rindo de novo, concordo. “Sim. Fiquei bêbado e fiz uma
tatuagem de cabra. Foi o que aconteceu.”
“Você é louco.”
“Estava louco de amor por você, e talvez um pouco
dramático demais. E literal.”
Scarlet fica quieta por um momento quando nos
aproximamos da linha das árvores e pergunta: “Você se
arrepende? Já desejou ter tatuado outra coisa?”
“Não. Eu não.” Paro na primeira árvore, olho para dentro
da floresta, tentando me orientar.
“Hã.”
“É um lembrete,” digo distraidamente, decidindo puxá-la
alguns passos para o oeste e espero encontrar o caminho.
“Um lembrete do que? Não ficar bêbado e depois ir fazer
tatuagens?”
“Não. É um lembrete de nós dois, e que eu queria ser
alguém que a merecia.” Faço uma parada novamente,
encontrando as duas árvores que reconheço e depois me viro
para encará-la.
Ela está me olhando com os olhos estreitados. “Porque eu
mereço uma cabra?”
Sorrio para ela, inclino minha cabeça para dar um beijo em
seu pescoço e depois sussurro em seu ouvido: “Baaa.”
Ela sorri, bate no meu braço e se afasta. “Você é um louco.”
“Pensei que era uma cabra.”
“Você é.” Seus dedos acariciam minha barba. “É meu Billy
Goat Gruff.”
Estranhamente, gosto do som disso, então decido manter.
“Ok, vamos lá.” Dou um passo na floresta e mais uma vez
ela segue.
No entanto, depois de alguns metros, ela sorri.
“O que?” Pergunto, olhando para ela por cima do ombro.
“Oh, eu simplesmente não posso acreditar que está
entrando aqui de bom grado e estou pensando que é melhor
tomar nota para poder nos levar para fora antes do jantar.”
“Você é muito engraçada.” Dou a ela um olhar plano.
“Eu sei.” Ela sorri, parecendo fofa e presunçosa.
Caminhamos um pouco devagar, procurando entre os
galhos e arbustos caídos.
Um minuto depois, sinto a mão dela se contrair na minha,
apertar e depois soltar enquanto seus passos diminuem. “Billy.
Onde estamos indo?”
“Quero te mostrar algo.” Não olho para ela dessa vez. O
nervoso volta, tornando difícil de engolir, e dou um tapinha
automático no bolso da calça. A caixa ainda está aqui.
Sei o momento em que ela avista a cabana porque fica sem
fôlego e para de andar. Dou a ela um minuto e depois puxo sua
mão, guiando-a para a frente o resto do caminho.
Subimos a pequena colina juntos e faço questão de ir
devagar, dando-lhe tempo para se ajustar ao que ela vê e só olho
para ela quando chegamos à base dos degraus.
“Billy.” Seus olhos ficam na porta e na moldura, nas
paredes de troncos, nos degraus de pedra e na fundação. E então
estão em mim, cheios de admiração. “O que você fez?”
Levo a mão dela aos meus lábios e beijo as costas. “Deixe-
me mostrar o interior.”
Subimos os degraus e empurro a porta, revelando o interior
pequeno, mas arrumado. Não está bem iluminado pelas janelas.
Deixando-a do lado de dentro, vou até a lâmpada de querosene
em cima da mesa e acendo um fósforo. Quando o espaço está
cheio de luz, volto para estudá-la.
Desta vez, ela olha para mim. “Você construiu isso?”
Balanço a cabeça e olho em volta, meus olhos demorando
na colcha cobrindo a cama. É a mesma colcha que ela usava
quando este local era seu acampamento. “Tentei iniciar a
construção no outono depois de receber alta da clínica de
reabilitação, naquele ano depois que saiu. Mas logo ficou claro
que eu não sabia o que diabos fazia.” Mais uma vez, sorrio do
meu antigo eu. “Não sabia uma única coisa sobre construir uma
cabana. Então, adiamos.”
“Nós?”
“Duane e eu construímos juntos.”
“Quando vocês construíram?” Ela vai até a lareira,
inspeciona as pedras incrustadas no chão e me pergunto se ela
as reconhece. São as mesmas pedras que reunimos no riacho
naquele fim de semana depois do Dia de Ação de Graças, as que
cercavam sua fogueira.
“Começamos logo depois que você se casou com Ben.”
“Então você passou o verão construindo uma cabana.”
Não é uma pergunta, então não respondo. Em vez disso, a
observo ali, seu olhar ainda arregalado de admiração. Então ela
se move de um lugar para outro, toca a lareira, as paredes, a
mesinha, as cadeiras. Até toca o bastão de fogo no canto, uma
bolha de riso deixando-a quando encontra meus olhos.
“Isso é um bastão de fogo?”
Concordo, não quero falar. Talvez seja um hábito que me
mantém em silêncio. Quando construía e mais tarde, quando
vinha visitar sozinho para me sentir perto dela, nunca falava.
Não havia com quem conversar.
Terminando de dar a volta, Scarlet para na frente da cama
e depois se vira e senta nela, saltando para cima e para baixo
como se quisesse testar o colchão.
“Esta cama com certeza é confortável.” Ela abaixa a voz
para dizer isso, o que, depois de passar todo esse tempo com ela
em Roma, agora sei que significa que tem certas atividades em
mente.
Torço meus lábios para o lado, vendo-a me observar. “É?”
Ela para de pular. “O que? Nunca dormiu nela?”
“Não. Nunca dormi.”
Minha resposta parece confundi-la. “Você passou muito
tempo aqui?”
“Passei. Especialmente no inverno. Em novembro, todos os
anos, passava um tempo aqui.”
Deita de lado e apoia-se em seu cotovelo, seu olhar flutua
sobre mim. “Tem algum plano?”
“Plano?”
Um sorriso atrevido reivindica seus lábios. “Se eu viesse
aqui, com você, quais seriam seus planos?”
Seguro uma risada. “Bem, isso parecia tão completamente
fora do reino das possibilidades"
“Não, mas você tem planos.” Ela rola de costas, com os
olhos ainda em mim. “Posso dizer.”
Agora meu olhar flutua sobre ela, as encostas e curvas de
seu corpo, seus cabelos espalhados na colcha, o brilho sedutor
em seus olhos. “Está certa,” digo rispidamente, reconhecendo a
resposta agora familiar em meu próprio corpo ao vê-la me olha
como está.
Mas primeiro, quero dizer a verdade. “No começo, tinha
planos de oferecer a você, como um lugar seguro. Para mostrar
a você que havia mais de um. Algum lugar que já foi seu lugar
seguro, poderia ser novamente. Mas então,” me afasto da parede
e vou para a beira da cama, ajoelhando-me ao lado de onde ela
está, “enquanto as coisas progrediam entre nós na Itália...”
“Sim?”
Levanto minha mão na testa dela, deslizo meus dedos em
seus cabelos. “Vi que encontrou seu lugar seguro por conta
própria e não precisava mais deste. E isso foi bom.”
O olhar dela fica interrogativo. “Isso foi bom?”
“Sim,” sussurro, meus olhos agora fixos em seus lábios,
minha cor favorita. “Abriu outras possibilidades para seu uso.”
A boca dela se curva. “Tal como?”
Devagar, sem pressa, tiro os sapatos, a camisa e depois
pego o cinto para desabotoá-lo.
Ela engole em seco, seu sorriso desaparece enquanto me
observa observá-la.
“Não vai me dizer?” Ela pergunta, sua voz um pouco sem
fôlego quando abro o zíper.
“Tire suas roupas.” Coloco minha mão no bolso, segurando
a caixa de veludo.
Os cílios dela tremem. “Por quê?”
“Porque prefiro te mostrar.”
Uma labareda de calor se acende atrás de seus olhos e
obedece, morde o lábio enquanto tira a blusa e o sutiã primeiro
e depois a calça. Eu me rendo ao meu desejo, olhá-la, vê-la se
despir, segurar o olhar e não desviar. Por tanto tempo, não me
foi permitido nem um olhar. Mas agora está espalhada diante de
mim como uma oferta, seu corpo bonito e sedutor
completamente nu na cama.
Faminto por ela, sussurro: “Scarlet, já faz mais de vinte e
quatro horas desde que fizemos amor?”
O nariz dela enruga um pouco, o olhar não perde o calor.
“Está certo, já faz muito tempo.”
Ela não entende o que estou perguntando, então me
ajoelho na frente dela puxando a caixa. Ela vira a cabeça para
me observar, mas quando coloco a caixa entre nós e a abro, ela
não parece vê-la. Seus olhos estão fixos e sem hesitar nos meus.
“Scarlet,” sussurro.
“Sim?” Ela sussurra de volta.
Pego o anel da caixa e o ergo entre nós até que seus olhos
se concentrem na minha oferta.
“Você quer se casar comigo?”
Não sei por que esse é o momento. Não sei por que nenhum
dos outros que vieram antes não foi. Talvez porque não mostrei
a ela nossa cabana ainda? Ou porque eu simplesmente queria
que estivéssemos aqui, onde tudo começou e me apaixonei
irrevogavelmente por ela.
Mas sei que minhas suspeitas na Toscana foram
comprovadas. Cada momento com essa mulher parece uma
indulgência, especialmente o momento em que seus olhos
surpresos retornam aos meus e ela chora, me dizendo que sim,
será minha esposa.
Scarlet ainda é a cor da minha alma. Mas agora que
finalmente estamos juntos, ela também pinta meus dias e noites
no espectro requintado e no brilho incontrolável de seu espírito.
EPÍLOGO

SCARLET

“Tiberius Monroe Winston, levante as calças agora.” Luto


para parecer zangada e manter o riso fora da minha voz. “Se
precisar ir, vá até o banheiro no trailer. Não onde quer que esteja
e regar as plantas.”
“Ele fez a mesma coisa na casa de Tommy Weller, quando
fomos para a festa na piscina,” Bea inclina-se para sussurrar.
“Apenas caminhei até a borda da tela e puxei seu calção de
banho. Foi horrível.”
Aos dez anos, Bea parece horrorizada com tudo o que seus
irmãos mais novos fazem. Por um lado, não a culpo exatamente.
São adoravelmente horripilantes a maior parte do tempo. Por
outro lado, ela é uma malandra maior do que todos os outros
irmãos juntos.
Luto com os lábios para formar uma linha firme, anoto
mentalmente para pedir desculpas à esposa de Hank Weller e
chamo nosso terceiro filho: “Marcus, por favor, acompanhe seu
irmãozinho ao banheiro?”
Tanto quanto possível, fazemos o máximo para incentivar
os dois meninos mais velhos, Marcus e Trajan, a assumir a
responsabilidade pelos dois meninos mais novos, Constantino e
Tibério. Billy está convencido de que Beatrice e Dulcinea serão
poupadas do tipo de provocação que sua irmã sofreu com seus
irmãos.
No entanto, às vezes eu me preocupo que o pêndulo esteja
indo muito longe na outra direção. Nossas meninas gêmeas
herdaram mais do que apenas os cabelos ruivos de seus tios e
os olhos azuis do céu de verão.
“Mas ele já terminou.” Marcus, usa sua expressão típica e
atualmente monta a barraca com Dulci e Constantine, gesticula
para onde Tibério, de três anos, está realmente terminando.
“Não podemos apenas...”
“Marcus Cash, por favor, faça como sua mãe diz,” a voz de
Billy interrompe e me viro, procurando meu marido enquanto
nosso filho mais velho obedece imediatamente.
“Vocês já voltaram?” Coloco minha mão no meu quadril,
olhando entre as sacolas de compras que Billy carrega e Trajan
corre para alcançá-lo. “Isso foi rápido.”
Geralmente, sempre que acampamos atrás da casa dos
Winston, Billy e o que for que as crianças concordam ficam por
várias horas na loja. Este dia, em particular, na sexta-feira da
nossa viagem anual de acampamento no fim de semana do Dia
do Trabalho, sempre parece uma bagunça no Piggly Wiggly.
“Eles abriram um novo mercado no caminho, onde
costumava estar o Corner Shoppe. Reduzimos o tempo de trajeto
pela metade. Além disso, encontrei Patty. Ela mandou um oi.”
Com seu sorriso escondido, Billy para na minha frente para um
beijo, como é seu hábito. Nós sempre nos cumprimentamos com
um beijo.
“Oi linda,” ele diz calmamente, as íris azuis glaciais da
Toscana se movem entre as minhas.
“Oi lindo.” Não consigo parar meu sorriso. Mas então, por
que iria querer?
“Constantine! Volte aqui e ajude,” Dulci chama o
irmãozinho.
“Você pegou os marshmallows?” Constantine espia as
sacolas e aparentemente abandonou a barraca.
“Sim, temos todos os s'mores.” Trajan pousa um saco de
pano, pega uma caixa de biscoitos e me dá um sorriso com três
dentes faltando. “Podemos fazê-los agora?”
“Não nós não podemos.” Dulci pega a caixa das suas mãos
e a coloca de volta no saco. “Apenas uma das barracas está
montada. Tia Simone e tio Roscoe estarão aqui a qualquer
momento e não quero montar barracas quando chegarem.”
Dulci está apaixonada por sua tia Simone e quer se tornar
uma cientista forense, assim como Trajan está apaixonado por
seu tio Roscoe e quer se tornar um veterinário. Sempre que os
visitamos em Washington, DC, Dulci e Trajan ficam mais alguns
dias e Roscoe os leva para casa.
É tão interessante para mim como essas sugestões e
eventos pontuais rapidamente se tornaram tradições familiares.
Dois anos atrás, Simone sugeriu que Dulci e Trajan ficassem
mais três dias, e agora é isso que sempre fazem. Essa viagem de
acampamento do Dia do Trabalho foi sugerida por Sienna há
sete anos para garantir que a família passasse um tempo de
qualidade juntos fora das agitadas épocas de Ação de Graças e
Natal. Agora é o que fazemos todos os anos e sempre é o mesmo.
Cada família chega quando pode na sexta ou no sábado. As
crianças correm como animais selvagens na floresta, nadam no
riacho, constroem fortes e finalmente tomam banho no domingo
à noite ou na segunda-feira, pouco antes de partirmos.
Enquanto isso, os adultos socializam e cozinham.
Depois do jantar na última noite, as crianças assam
marshmallows em volta da fogueira enquanto os adultos se
reúnem em torno de uma segunda fogueira. Também na última
noite, todos os primos com mais de seis anos acampam com
Cletus e Jenn, enquanto todos os pequeninos ficam na casa
grande com os pais.
Bem, todos os pequeninos, exceto nosso Tibério e
Constantino e o menininho de Jenn e Cletus, Linus. Nossos dois
filhos mais novos gostam de ficar com Beau e Shelley em sua
casa no lago. Suspeito que isso os faça sentir especiais. Tibério,
em particular, desenvolveu um vínculo especial com Shelly e seu
papagaio. Linus fica com seus pais e todos os filhos grandes.
Atualmente, sigo Billy ao redor da mesa e afasto as mãos
quando ele começa a descarregar as compras. “Deixe Bea e eu
fazermos isso. Vai ajudar com as barracas?”
“Sim.” Rouba outro beijo rápido, além de um golpe furtivo
e agarra e bate nas minhas costas, Billy marcha para as
barracas com nossos filhos atrás, deixando-me rindo de sua
ousadia. Pagarei ele mais tarde.
“Isso é tudo de geladeira. Vou levar para os refrigeradores.”
Bea espia dentro de uma das sacolas e coloca seus longos
cabelos ruivos atrás da orelha. “Uh, oh. Papai comprou
cachorros-quentes. Pensei que o tio Cletus vinha?”
“Ele vem.” Pego as coisas de s'mores, com a intenção de
colocá-las em algum lugar fora do alcance de pequenas mãos.
“Esconda os cachorros-quentes sob o gelo para que seu tio não
os veja. Ou, melhor ainda, coloque-os na geladeira do trailer.”
“Quando eles chegarão aqui?” Bea começa a acomodar
todos os produtos perecíveis em dois sacos. “E quando Ben,
Andy e Pedro estarão vindo?”
“Cletus vem antes do jantar. E Ben, Andy e Pedro ainda
estão na escola até as três. Eles não foram embora hoje. Mas seu
tio Jethro deve aparecer com lenha a qualquer momento.”
“E tio Beau e tia Shelly?” Bea pega as duas sacolas. “E o tio
Duane, tia Jess e Liam?”
“Acho que em torno de quatro ou cinco. Estão todos
visitando os Wellers, acho. Também pode me trazer os assados
de marshmallow em seu caminho de volta?”
“Sim, mamãe.” Bea se ajoelha na frente de um dos
refrigeradores.
Enquanto isso, giro em um meio círculo, garantindo que
todas as mesas de piquenique tenham toalhas de mesa, pratos
de papel, talheres, guardanapos e similares.
“Hey Ash, Bethany,” grito para minha cunhada e sobrinha
do outro lado da clareira. A área foi limpa das árvores seis verões
atrás, para que pudéssemos ter um grande acampamento. “Você
tem tudo para aquelas mesas? Tenho muitos pratos de papel.”
“Isso é bom.” Ashley levanta um polegar no ar. “Mas
quando Marcus voltar, mande-o aqui. Zander precisa de ajuda.”
“Não preciso de ajuda!” O rosnado teimoso do meu
sobrinho irrompe de algum lugar atrás de uma barraca de
aparência estranha perto do lado de Ashley.
Mesmo a quinze metros de distância, pego o olhar divertido
de Ash.
“Dê a Marcus a chance de ajudar, Zander. Sabe como ele
admira você,” a voz de Billy, embora não seja elevada, é alta e
incisiva o suficiente para ser ouvida através da clareira.
“Oh. OK. Claro, tio Billy,” Zander responde, parece
significativamente menos frustrado, e Ashley e eu reviramos os
lábios entre os dentes em uníssono.
Marcus e Zander nasceram com apenas uma semana de
diferença, com Zander sendo mais velho. Descobri, observando
como Billy interagia com Zander, que a melhor maneira de fazer
nosso sobrinho fazer a coisa certa é lembrá-lo de como os outros
contam com ele, o admiram, precisam dele.
Essa é uma das atitudes especiais do meu marido. Nunca
levanta a voz com nossos filhos ou sobrinhas e sobrinhos.
Simplesmente puxa a corda dentro de cada pessoa que os fazem
querer darem o seu melhor.
De repente, o som de uma voz corta o ar, proclamando:
“Cheguei!”
Todas as crianças param o que estão fazendo, com a cabeça
girando. E então partem, fazendo um tumulto louco enquanto
pisam na linha das árvores.
Billy se inclina ao redor da barraca semi-montada e
trocamos um olhar. “Você pensaria que ele é o Papai Noel com a
maneira como agem.” Ele caminha até o poste da barraca que
Constantino deixou cair às pressas para cumprimentar seu tio
Cletus. “Pensei que ele viria mais tarde?”
“Também achei. Jenn tinha aquela coisa em Louisville,
pensei que estariam aqui para o jantar.”
Billy deixa cair abruptamente o poste da barraca,
caminhando rapidamente até mim. “Onde está a bolsa com os
cachorros-quentes?”
“Deve estar no refrigerador. Bea iria colocá-lo no trailer.”
“Vou fazer isso.” Billy pega a bolsa e vai embora.
“Não se perca!” Digo para ele.
“Não vou me perder, mulher!” Ele responde.
Agora eu sorrio e Ashley também. Por meio de um acordo
tácito, caminhamos uma em direção a outra quando o som de
Cletus e as crianças se aproximando fica mais alto.
“As primeiras palavras de sua boca serão sobre pânico ou
salsicha.” Ashley revira os olhos, mas seu tom é amoroso.
“Ou mirtilos,” inclino-me para sussurrar, já que Cletus e
seu grupo de admiradores estão quase chegado ao
acampamento.
Todos os meus filhos têm um relacionamento especial com
cada uma de suas tias e tios, e gosto de pensar que tenho um
relacionamento especial com cada uma das minhas sobrinhas e
sobrinhos. Dito isto, Cletus e Jenn estão em um nível diferente.
Se cada um dos sete irmãos Winston representasse um dia da
semana, Cletus e Jenn seriam sábado.
Ao ver Ashley e eu, Cletus para e ergue uma bolsa gigante
com uma mão. “Pode parar de entrar em pânico. Trouxe minha
salsicha,” ele levanta um saco de papel com a outra mão, “e os
muffins de panqueca de mirtilo de Jenn.”
“Ele comeu a maioria deles no carro no caminho.” Essa
afirmação seca vem de sua filha Viola, parada entre Roscoe e
Simone e segurando as duas mãos enquanto Pavlov, o cão
envelhecido de Cletus e Jenn, ofega cansadamente na frente
deles, como se guardasse a pequena senhorita.
Cletus faz uma careta para a filha de seis anos, claramente
tentando esconder o sorriso, estreitando os olhos. “Dedo duro.”
Roscoe sorri, pega Viola e a coloca no quadril. “Deixe minha
viola em paz.”
Enquanto isso, Ashley e eu avançamos para entrar na fila
atrás de Dulci para cumprimentar e abraçar uma Simone rindo.
“Ela o envolve em torno de seu dedo.” Os olhos castanhos
de Simone brilham. “Ficaria com ciúmes se ela também não
tivesse me enrolado em seu dedo.”
Viola coloca as mãos em ambos os lados da barba de
Roscoe e olha para ele. “Eu amo você, tio Roscoe.”
“Sei que ama. E eu amo você,” ele diz suavemente,
acariciando seu nariz e dando-lhe um sorriso carinhoso
enquanto Cletus observa a troca com um sorriso distraído.
“Vamos Cletus. Melhor entregar essa salsicha.” Depois de
abraçar Simone, vou até meu amigo e pego a sacola de suas
mãos, quase a deixando cair. “Deus, esta sacola está muito
pesada.”
“Claro que está pesada.” A expressão de Cletus fica
subitamente severa. “Minha salsicha é famosa por muitos de
seus atributos, e não menos importante é o seu comprimento
substancial e...”
“Densidade?” Forneço categoricamente.
Ele faz uma careta como se minha resposta o
decepcionasse. “Ia dizer circunferência, obviamente.”
Roscoe revira os olhos, assim como Ashley, e Simone
sorriem. Felizmente, nenhum dos meninos mais velhos de
Sienna e Jethro estão aqui, então a declaração de Cletus passa
por cima de todas as cabeças das crianças.
Afasto-me do meu cunhado e grito por cima do ombro:
“Bem, vou colocá-la no refrigerador, para ver se não encolhe.”
“Encolher?!” Cletus parece engasgar com a palavra.
Aperto meus lábios quando Ashley diz ao irmão para
acalmar seus nervos, e então ele diz algo sobre uma afronta às
suas habilidades de defumar carne. Então Roscoe pergunta por
que a carne precisava ser defumada em primeiro lugar e faz
alguma referência a salsichas podres, o que faz as crianças
rirem, salsichas.
Será um longo fim de semana.
E estou ansiosa por cada minuto.

***

Os próximos dias são previsivelmente loucos.


Além do típico caos de primos, Duane, Jess e seus filhos
ainda estão um pouco cansados, mesmo estando na cidade
desde quarta-feira. Beau e Shelly frequentemente viajam para
vê-los onde quer que estejam, assim como Jethro e sua família.
Nós os encontramos duas vezes, uma no Peru e outra no
Canadá, mas as viagens pelo mundo são difíceis para a nossa
grande família, com as crianças na escola e nos esportes, na
música e nos acampamentos durante o verão.
O mais velho deles impressiona seus primos falando muito
bem japonês. E depois, Jenn chega e impressiona a todos,
falando melhor ainda japonês.
Como previsto, as crianças brincam, fazem bagunça,
mergulham no riacho, constroem fortes de madeira e os adultos
fatiam presunto, trocam histórias, antigas e novas. É notável ter
todos em um só lugar. Os fins de semana sempre me parecem
um milagre e sempre passam rápido demais.
Depois do jantar da última noite, arrumamos as crianças
em volta da fogueira, colocando Ben e Bethany no comando do
fogo, e Andy e Liam no comando dos s'mores. A regra é não mais
do que dois s´mores por criança, o que significa que a maioria
delas terá três ou quatro se os meninos mais velhos não
comerem tudo primeiro.
“Nunca pensei que diria isso, e não tome isso como
permissão para o futuro uso de minhas salsichas gloriosas, mas
estou feliz que comprou esses cachorros-quentes.” Cletus senta-
se ao meu lado e de Billy, virando-se para Jethro e Sienna do
outro lado. “Você nunca alimenta seus filhos?”
Hoje, como foi nossa tradição na noite passada, os adultos
estão sentados ao redor de uma segunda fogueira, não muito
longe das crianças. A maioria de nós compartilha cadeiras de
acampamento, exceto Roscoe e Simone, que estão sentados
juntos em um cobertor, e Jenn e Cletus, assim como Linus que
dorme nos braços de Jenn.
Jethro suspira enquanto Sienna sorri. “Você descobrirá,
Cletus, quando Linus completar doze ou treze anos. Os
adolescentes comem seu peso diariamente.”
“É um fato científico,” Beau concorda, seu tom
completamente sério. “Acho que li em algum lugar que
adolescentes comem até o dobro do seu peso todos os dias.”
“Você não leu isso, Beauford.” Cletus lança a meu irmão
um olhar não impressionado, o que apenas faz o ruivo sorrir.
“Lembro-me de meu irmão comendo todas as nossas
sobras quando adolescente,” Simone diz de seu lugar, deitada
entre as pernas de Roscoe, de costas contra seu peito. “Minha
mãe dizia que tinha que dobrar todas as receitas até que ele
estivesse fora de casa.”
“Não consigo imaginar qual era a conta de supermercado
da nossa mãe toda semana, se esse fosse o caso.” Roscoe vira os
lábios contra a têmpora de Simone, dando-lhe um beijo.
“Não era tão ruim. Ela tinha maneiras criativas de
complementar os mantimentos comprados na loja, o que reduzia
o total,” Billy diz, e o estudo quando seu olhar fica distante.
Por um longo tempo, ele lutou para reconciliar sua
memória de Bethany com a mulher que me pediu para deixar
seu filho em paz. Odiava que, ao compartilhar esse segredo,
manchei sua visão de sua mãe maravilhosa.
Mas uma noite, quando Jethro nos visitava em Nashville, o
mais velho Winston citou um dos dizeres de Bethany: Não jogue
fora uma pintura porque não gosta de uma pincelada.
Bethany não era perfeita, mas nem eu. Nem Billy. Eu o
lembrei do ditado mais tarde naquela noite, encorajando-o a
reavaliar como permitia que essa decisão única e solitária de sua
mãe prejudicasse uma vida inteira de amor. Isso, finalmente,
pareceu fazer a diferença. Isso lhe permitiu fazer as pazes.
“Está certo.” Duane aponta para Billy, concordando. “Ela
não trocava carne de veado com os Hills? para dar aulas aos
filhos?”
“Sim. Tinha um acordo semelhante com o Sr. Badcock, por
suas galinhas e ovos,” Cletus diz, esfregando o queixo,
pensativo.
“Pobre Sr. Badcock,” Jenn murmura, e vejo ela e Cletus
compartilharem um olhar através do fogo.
“Ela fez trocas com o Sr. Badcock até conseguirmos nossas
próprias galinhas,” Ashley acrescenta baixinho, de onde está
sentada no colo de Drew, girando distraidamente os longos
cabelos loiros do marido ao redor de um dedo.
“E a lenha comercializada com Nancy Danvish e Old Man
Blout por vegetais e similares,” Jethro diz. “Lembro-me de cortar
três metros de lenha em um verão apenas para descobrir no
outono que ela os trocou por vegetais.”
“E então ela fez você comer os legumes?” Sienna pergunta,
diversão em sua voz.
“Certo. Tinha certeza de que seria capaz de comer esses
feijões verdes, vendo como cortei a madeira.”
“Não esqueça a abóbora amarela,” Billy diz.
“Ugh. Odeio abóbora amarela.” Jethro faz uma careta que
me lembra tanto Constantino quando lhe servi abóbora amarela,
que quase perco o fôlego.
“O que há com você e comidas amarelas? Bananas,
abóbora, milho.” Cletus cutuca Jetro.
Sinto os ombros de Billy tremer e olho para ele. Ele me olha
quando sua risada desaparece, deixando para trás um sorriso
feliz.
O irmão Winston mais velho encolhe os ombros, o olhar se
move para a esposa, um sorriso lento se espalha por suas
feições. “Gosto de mamão.”
“Isso não é verde por fora e laranja por dentro?” Roscoe
pergunta.
“Quando está maduro, fica amarelo por fora, e é o meu
favorito,” Jethro continua, seus olhos presos nos de Sienna.
“Na mesma nota...” Sienna se levanta, agarra a mão do
marido para puxá-lo para cima. “Devemos reunir os pequenos e
levá-los de volta para casa. Está ficando tarde.”
Posso sentir a relutância no comportamento de todos,
esticando e pegando suas bebidas. Assisto do meu lugar no colo
de Billy enquanto cada um dos Winstons se junta com seu
companheiro.
Drew puxa Ashley para um beijo carinhoso, olha para ela
como se fosse responsável por tudo de bonito no mundo. Jessica
anda para trás, puxa Duane junto com ela, um sorriso atrevido
nos lábios. Jethro e Sienna saem do círculo de fogo, de mãos
dadas. Cletus vai até Jenn e pega o filho adormecido,
embalando-o enquanto Jenn se levanta e dá um beijo na
bochecha de Linus primeiro, depois na de Cletus. Beau brinca
com a trança de Shelly e ela dá seu sorriso de tirar o fôlego e
levanta a mão para segurar sua mandíbula. Uma vez que estão
de pé, Roscoe se inclina para sussurrar algo no ouvido de
Simone e ela sorri, estendendo a mão para beliscar as costas
dele.
É sempre nesse ponto todo ano que engasgo um pouco e
tenho que engolir contra o nó de emoção na minha garganta.
Todo esse amor, todas essas pessoas boas, não posso acreditar
que pertenço a elas. Estive sozinha por grande parte da minha
vida. Por mais grata que seja por estar aqui, por mais que
valorize esses momentos e essa família, parte de mim teme que
essas bênçãos não durem.
“Ei.” A voz estridente de Billy me tira da reflexão conflitante,
e sua mão desliza pela minha perna. “Está pronta para dormir?”
Em vez de ficar de pé, eu o enfrento e pressiono nossas
testas juntas. “Eu amo você, Billy Winston.”
Eu o sinto sorrir. “Eu te amo, Scarlet Winston.”
Sua declaração me faz sorrir. Foi ideia minha mudar meu
nome para Scarlet Claire Winston antes de nos casarmos e
manter meu nome artístico como Claire McClure. A separação
entre minha vida profissional e minha vida pessoal foi uma
dádiva de Deus ao longo dos anos. Nunca me senti mais como
eu do que quando o oficial perguntou: Você, Scarlet Claire
Winston, aceita William Shakespeare Winston para ser seu
marido?
“Quer checar as crianças?” Levanto meus dedos em sua
barba, coçando levemente sua mandíbula com minhas unhas.
“Pode fazer Constantino e Tibério ficarem prontos para Beau e
Shelly enquanto arrumo a cabana?”
Ele balança a cabeça e ergue o queixo para um beijo gentil,
mas depois sussurra: “Espero que esteja nua quando eu
chegar.”
Seu tom de provocação, ainda que autoritário, afugenta
qualquer melancolia residual que sinto e me levanto, estico e me
afasto antes de provocar: “Sim, vamos ver isso.”
“Scarlet...”
Sorrindo, eu me afasto antes que ele possa me agarrar
novamente e corro para a escuridão antes que possa me seguir.
Então ouço os sons do acampamento desaparecerem,
diminuindo o passo para caminhar e não me incomodo em pegar
minha lanterna.
Sempre que estamos em Green Valley, que geralmente é
apenas uma vez por ano durante este fim de semana de
acampamento, sempre fazemos questão de passar uma noite
juntos em nosso lugar, onde nossa história começou. Conheço
todas as árvores e arbustos ao longo do caminho. Sei exatamente
onde os degraus começam, quantos subir e, uma vez lá dentro,
onde os fósforos estão no manto.
Acendo a lâmpada de querosene na mesinha, viro para o
colchão e tiro a capa de poeira. Mantemos os cobertores e os
lençóis em uma pequena arca de cedro, e começo a trabalhar na
preparação do espaço, varro o chão, espano o manto, início uma
pequena fogueira, faço a cama.
Ao longo dos anos, Billy e Jethro acrescentaram um
banheiro, trabalhando juntos para cavar um poço, administrar
os canos, adicionar o séptico. Billy também se ofereceu para
adicionar uma cozinha ao mesmo tempo, mas vetei a ideia.
Gosto da simplicidade da nossa cabana. Gosto da maneira como
preserva o passado, ao mesmo tempo em que comemoramos
nosso presente.
Tudo pronto, tiro meus sapatos, coloco-os na porta e depois
tiro todas as minhas roupas, exceto minha calcinha. Um
pequeno ato de rebeldia, mas provavelmente não inesperado. Se
algum dia eu cumprir todos os desejos do meu marido, ele
provavelmente examinará minha cabeça.
Sorrindo com o pensamento, deslizo para baixo das
cobertas frescas, descanso minha bochecha no travesseiro de
frente para a porta e canto.
Canto todas as músicas de amor que escrevi para ele ao
longo dos anos, começando com o meu primeiro álbum. Canto
até que ele entra pela porta, um grande sorriso, bem, grande
para Billy Winston, em seu rosto, seus olhos brilham felizes.
Canto enquanto se despe e se prepara para dormir. Canto
quando apaga a lâmpada e se junta a mim, quando suas mãos
encontram meu corpo na luz tremeluzente da lareira, e ele sorri
quando descobre que não estou completamente nua.
Canto e sorrio quando ele passa minha calcinha pelo meu
quadril e pernas, volta para mim mais uma vez e me pega em
seus braços. E então meu coração canta quando me beija, me
toca e me faz dele.
Quando era jovem, vivia para sobreviver. Evitava
esperanças e sonhos, contentes com a segurança da
sobrevivência.
Mas agora sei mais. Nada dura para sempre. Nenhuma
música, nem felicidade, nem miséria. A mera sobrevivência não
é mais segura do que viver para esperanças e sonhos. No final,
sempre haverá o fim.
Então, por que não sonhar? Por que não esperar? Por que
não viver a vida com fé selvagem e abandono? Por que não correr
o risco? Caso contrário, todos esses momentos, pequenos ou
significativos, o paraíso na terra, seriam perdidos pelo medo.
Não estou com medo. Não mais. E nunca mais.

FIM.

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