Adelson Sousa*

Já

IvÔGIAS
MWS COMUNS NA
ADOLESCÊNCIA

Como estar atento aos sinais?

A
adolescência é sem dúvidas o mais
intenso período de transformações
naturais na vida de uma pessoa,
afinal, representa a transição da infância
para a vida adulta. Ao entrar nesta fase, o
adolescente precisará se modificar para
enfrentar e se adaptar às diversas mu-
danças sociais e biológicas inerentes a
essa nova etapa. Mas quais são os com-
portamentos esperados na adolescência
e quando saber se estamos diante de um
quadro patológico, situação na qual o
auxílio profissional é indispensável?
Sociedade - A adolescência como construção social

Considero imprescindível a discussão dessa seus pais, irmãos, por determinadas figuras públi-
questão, reconhecendo que a importância de se cas, seja um cantor, um ator, um personagem ou
disseminar este tema reside no fato de que a bus- mesmo a adoção de padrões de modas e tendências
ca precoce por ajuda profissional, nas primeiras específicas do modelo almejado. Até então, nada es-
manifestações dos sintomas de um determinado pantoso, se consideramos que se trata de pessoas
transtorno, irá facilitar muito o tratamento e evitar que precisam se espelhar em modelos, já que ainda
um agravamento de um possível quadro patológico. não se vêm preparadas para adquirir determina-
Na adolescência sobretudo, esses sinais têm gran- das responsabilidades ou tomar sozinho algumas
des chances de passarem despercebidos diante das decisões. Faz parte de um jogo de descobertas e
inúmeras mudanças comportamentais esperadas e expansão em busca de se constituir e construir seu
apresentadas pelos jovens. lugar no mundo.
Para adentrar o assunto precisamos antes Agora consideremos que além desse con-
de tudo conhecer um pouco mais sobre a fase texto de exigências sociais e culturais, também
da adolescência, compreender criticamente esse num intervalo curtíssimo de tempo o adolescente
momento na vida de um sujeito e os mecanismos experimentará uma transformação corporal sem
biológicos, sociais e culturais envolvidos no pro- precedentes, onde mudanças muito significativas
cesso. A adolescência é um momento limítrofe, de e notáveis ocorrerão em seu corpo. Aqueles me-
diversas transformações biológicas e também um ninos, que até então eram só crianças, perceberão
momento pontual de expectativas de mudanças grandes mudanças ocorrendo no seu corpo, como
demarcado pela sociedade. Chegou a hora de dei- um engrossamento na voz e a presença de pelos
xar de ser criança e assumir responsabilidades pubianos. As meninas não ficarão atrás, e passarão
e novos comportamentos que até então não lhes por mudanças corporais ainda mais acentuadas.
era exigido. Se a condição de "criança" não será Agora terão que se preocupar com a medida do seu
mais aceita, então é momento de construção de sutiã, devido ao natural desenvolvimento de suas
uma nova identidade. A criança precisará sair do glândulas mamarias e consequente aumento do vo-
seu "mundinho particular" e acessar uma ampla lume dos seios e terão também que prestar atenção
gama de possibilidades até então desconhecidas. ao seu calendário mensal para que a menstruação,
É hora de formar um estilo próprio de existên-
cia, definir seus gostos musicais, construir uma
maneira nova de se vestir e se comunicar, enfim "A adolescência é um momento limítrofe, de diversas
transformações biológicas e também um momento
é um processo de abandono e distanciamento do
pontual de expectativas de mudanças demarcado
status de criança e buscar por características que pela sociedade."
o permita adentrar o universo aduho.
Apesar dos estigmas envolvendo a fase da
adolescência, ou como alguns preferem chamar,
da "aborrescência", por ser vista como um período
complicado de mudanças na vida, precisamos com-
preender que culturalmente existe uma imposição
social, ou para ser mais preciso, somos nós mes-
mos que impomos que nesta fase nossas crianças
se tornem adultos a qualquer preço. Então todo o
discurso das teorias do desenvolvimento e da psi-
cologia, de que cada pessoa se desenvolve em seu
próprio tempo serão ignorados e as expectativas
de mudança de comportamento acentuadas. Trago
esse ponto de vista para que possamos apurar nos-
so senso histórico-cuhural e compreendermos que
existe também uma expectativa e pressão social a
qual os adolescentes serão submetidos.
Então, não é de se espantar que nesta fase
os adolescentes apresentem diversas condutas inu-
sitadas e atípicas, mas que não necessariamente
indicam a existência de qualquer transtorno psi-
cológico, antes são consequência de uma busca por
maneiras e estratégias de enfrentamento para esta
etapa. Exemplo disso são alguns comportamentos
comuns que demonstram o processo de construção
de identidade, como a admiração ou imitação por

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 recém descoberta, não a constranja de surpresa.
Sem falar que conhecerão e algumas até se fami-
liarizarão com as famosas cólicas menstruais, que
em alguns casos serão eternas companheiras.
Acabaram as mudanças? Claro que não.
Ainda em meio a tudo isso, experimentarão uma
verdadeira erupção hormonal, que traz consigo
mudanças visíveis no espelho como as acnes ou
espinhas e outras não tão visíveis, mas que serão
sentidas. Esse período da puberdade influenciará
diretamente os aspectos emocionais dos adolescen-
tes, seus comportamentos, humor, temperamento e
' sobretudo seus desejos sexuais. As alterações hor-
monais aflorarão a libido e sensibilidade corporal,
consequentemente também o desejo sexual, sendo
geralmente essa fase o início da descoberta e v i -
vência de uma sexualidade até então adormecida.
Diante dessas mudanças naturais esperadas
no corpo e comportamento do adolescente, precisa-
mos de uma redobrada atenção para diferir com-
portamentos que possam ser típicos da fase daque-
les que possam sugerir algum tipo de transtorno
associado. Sobretudo na adolescência, sintomas de
transtornos podem se confundir com variações
comportamentais típicas da idade, atrasando um
possível diagnóstico.
Existem uma infinidade de transtornos que "Nessa fase da vida, o adolescente, mesmo num '
podem se desenvolver ou se manifestar também desenvolvimento sadio, certamente irá apresentar
na adolescência de modo que não seria possí- modificações de humor e comportamento, o que não
vel descrever todos aqui, mas nos ateremos aos necessariamente é um sinal de problema."
transtornos de humor, transtornos alimentares e
transtornos relacionados ao uso de substancias antes desenvolvidas por ele mesmo.
f , psicoativos, frequentes nesta fase, e que em co- Também sinais de ansiedade precisam ser
mum, têm o potencial de passar despercebidos considerados, e se revelam na conduta do adoles-
mesmo pelo próprio adolescente. Vamos entender cente através de agitação corporal e dificuldade
um pouco sobre os sintomas que podem dar sinais de concentração e dificuldade para se manter nas
de suas ocorrências. mesmas tarefas, por exemplo ao estudar ou assistir
A fim de identificar características de com- filmes e séries terá dificuldade em manterse con-
portamento de um adolescente que dê indícios de centrado num mesmo foco, alternando as tarefas
transtornos de humor e careça de ajuda e interven- ou episódios com frequência.
ção profissional é importante estar atento a alguns Ainda devemos nos atentar a fatores como
sinais. Aos transtornos de humor, estão associados baixo autoestima, que é quando o adolescente tem
doenças como a depressão ou transtorno bipolar uma má concepção sobre si mesmo, se achando
f afetivo e podem ser observados no comportamento desinteressante ou inferior a outras pessoas, com
; de alguns adolescentes. discurso de culpa ou de inutilidade, confusão de
Nessa fase da vida, o adolescente, mesmo num pensamentos e em alguns casos até pensamentos
desenvolvimento sadio, certamente irá apresentar de morte, ou ideação suicida.
modificações de humor e comportamento, o que A importância primordial da atenção a possí-
não necessariamente é um sinal de problema. Es- veis sintomas é que a incidência da depressão na
tado irritadiço, raiva e sentimentos de incompre- infância ou adolescência, acentua o risco de exis-
? ensão, tristeza e desânimo, são comuns nesta fase. tência de outros distúrbios bipolares, que é onde
Mas, se esses estados e esses comportamentos são essas fases depressivas se alternam com outras de
persistentes, se tornam um sinal de alerta. mania, na qual o adolescente demonstra compor-
É importante se atentar a sintomas como tamento eufórico, agitação psicomotora, insónia,
quando o adolescente aparenta tristeza e as- ideias de grandeza e outros comportamentos que
pecto deprimido durante grande parte do dia, podem trazer-lhe riscos.
muitas vezes esboçando falta de Interesse ou O tratamento da doença envolve psicoterapia,
prazer por atividades diárias necessárias ou uso de medicamentos e a participação da família,

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Sociedade - A adolescência como construção social

que é sempre fundamental para êxito do processo.

No caso da observância desses sintomas ê impor-
tante buscar um profissional de psicologia, ou um
psiquiatra para buscar um diagnóstico da situação.
Também essa fase é muito propícia para
o desenvolvimento de transtornos alimentares,
nosso segundo foco. Isso porque na busca de um
corpo ideal que muitas vezes está associado à
aceitação em determinados grupos ou manuten-
ção da autoestima, os jovens podem desenvol-
ver alguns comportamentos que são indícios de
transtornos alimentares.
Neste grupo estão, por exemplo, a anorexia e

a bulimia, geralmente referidas como "Ana" e "Mia",
respectivamente, num jargão adolescente. A anore
xia se trata de uma intensa diminuição de ingestão
de alimentos, enquanto na bulimia o adolescente
cria o hábito de comer, muitas vezes compulsiva-
mente e posteriormente provocar vómito, antes que
o seu organismo faça a digestão.
Em geral, nos transtornos alimentares, o sinal
mais esperado é que o adolescente de algum modo
transpareça atitudes de exacerbada ou desneces-
sária preocupação com seu corpo e atenção dema-
siada a assuntos relacionados.
Nesses casos é importante ficar atento às mu-
danças no comportamento do adolescente, como
por exemplo, no interesse por dietas "milagrosas"
que geralmente veiculam nas redes sócias e obser
var sinais no momento e pós refeições principal-
mente, que podem ser desde ingerir quantidades
mínimas de comida até o uso do banheiro sempre
minutos depois de se alimentar, o que pode sugerir
indução de vómitos.
Muitas vezes também o adolescente evita par-
ticipar das refeições em família e prefere tornar
esse momento particular, se alimentando em ho
rário diferenciado ou levando o alimento para o
quarto, onde não estarão sob vigilância ou controle
de outras pessoas.
Para os transtornos alimentares o tratamen-
to tem um viés multidisciplinar. Em conjunto, psi-
cólogo, nutricionista e psiquiatra podem através
de tratamento psicoterapêutico, medicamentoso e
com revisões na dieta alimentar proceder o tra-
tamento necessário. Lembrando sempre que tam-
bém nestes casos o apoio da família é fundamen-
tal para o tratamento.
Por fim, vamos abordar os transtornos re-
lacionados ao uso de substâncias psicoativas ou
popularmente falando o uso de drogas, que talvez
seja um dos mais problemáticos transtornos, comu-
mente observados na adolescência, visto que estão
relacionados muitas vezes a associação com com-
portamentos criminosos ainda que sejam para a
aquisição da substância.
No grupo de substancias que provocam al-
gum grau de dependência estão desde drogas
I
É PRECISO DESCONSTRUIR OS
ESTIGMAS RELACIONADOS À
i BUSCA POR UM PROFISSIONAL
IDA ÁREA DA SAÚDE MçiTtAL
" E TORNAR UM HÁBITO
COMUM CONSULTAS COM
TAIS PROFISSIONAIS DE TAIS
MODALIDADES (...)
lícitas, como cigarro e álcool, até as não permiti-
das como maconha, cocaína, crack, êxtase e mesmo
substâncias adquiridas em farmácias com proprie-
dades psicoativas.
Apesar da alta incidência na adolescên-
cia o uso dessas substancias, representa ris-
cos sobretudo pela capacidade de, associada as
predisposições de seus usuários, provocarem
dependência química ou psicológica. Os sinais
mais claros de que um adolescente esteja de-
senvolvendo um transtorno associado ao uso de
substancias psicoativas é perceptível pela inci-
dência de uma série de comportamentos.
Em geral a conduta do adolescente estará vol-
tada cada vez mais para dar manutenção a situações
na qual o uso da substância seja possível. Por exem-
plo, no uso abusivo de bebida alcoólica, o adolescente
age sempre de modo a estar com pessoas e em locais
onde existam maior facilidade de acesso à substância.
Assim o adolescente pode passar a frequentar cada
vez mais bares e baladas, ou encontros com amigos,
sendo que em comum, há sempre uma associação ao
uso excessivo de bebidas alcoólicas. Em muitos casos
o próprio adolescente não consegue ainda perceber
a gravidade da situação em que está inserido e sus-
tenta um discurso de que controla o uso e pode inter
romper a qualquer momento como uma maneira de
normalizar seu comportamento.
A medida que cria uma dependência bioló-
gica e psicológica com a substancia psicoativa, o

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í. -
adolescente vai dando maior importância ao seu
uso e estará cada vez mais motivado a encontrá-la.
A partir daí alguns comportamentos são espera-
dos, como o abandono de antigas amizades com as
quais o uso da droga não seja possível e a asso
ciação a pessoas que também fazem o uso de tais
substâncias. Perda de interesses por outras ativi
dades como estudos e atividades físicas, também
são normalmente observados.
Existe um outro agravante no uso de subs-
tâncias psicoativas que é um fator chamado tole-
rância, que se resume no fato do indivíduo precisar
cada vez usar uma maior quantidade da substân-
cia para atingir os mesmos efeitos esperados. Então
na busca por evitar os sintomas da abstinência,
que são as perturbações desagradáveis que o indi-
víduo sente quando tenta abandonar o uso, e dar
manutenção ao seu bem-estar, a tendência do ado
lescente com um transtorno associado ao uso de
substancias psicoativas acentuado é buscar cada
vez mais acesso a esta.
A observância dos sinais aqui discutidos i n -
dica, mas não necessariamente afirmam que um
adolescente tenha ou esteja desenvolvendo um de-
terminado transtorno psicológico. Sobretudo nesta
fase de efervescência de transformações sociais,
comportamentais e hormonais, um diagnóstico
preciso requer um olhar minucioso de um pro
fissional qualificado para o fazer O problema é
que mesmo nos dias de hoje ainda existem alguns
estigmas sociais de que buscar um psiquiatra ou
psicólogos seja admitir uma "loucura", e em alguns
casos o medo de descobrir algo com o qual não se
queira deparar como a existência de uma doença
ou um transtorno de ordem psicológica pode retar-
dar a busca pelo profissional.
Ao perceber sinais que podem indicar com-
portamentos problemáticos com o adolescente é
primordial buscar auxilio profissional, pois um
tratamento tardio pode ser o maior agravante no
desenvolvimento de um determinado transtorno.
Quanto antes um tratamento for iniciado, certa-
mente mais eficaz será.
Então não devemos hesitar em buscar um
serviço de auxilio, é importante que professores,
pais e comunidade, tenham acesso a informa
ções sobre os sinais desses transtornos. É preci
so desconstruir os estigmas relacionados à bus-
ca por um profissional da área da saúde mental
e tornar um hábito comum consultas com tais
profissionais de tais modalidades; dessa forma,
se evita que que determinados transtornos se
estendam por tempos, sem um adequado trata-
mento que poderia trazer mais qualidade a vida
ao adolescente.
* Adelson Sousa é psicólogo (CRP 03/8956) pós-graduado em
Gestalt-Terapia pela Escola Baiana de Medicina e Saúde Pública,
com formação em Prevenção ao Uso Indevido de Drogas pela
Universidade Federal de Santa Catarina. É psicólogo clínico e
facilitador de grupos terapêuticos.
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 G R A N D E S T E M A S DO C O N H E C I M E N T O

ESPECIAL ADOLESCÊNCIA E BULLYING

ESCOLA E
AUTOESTIMA
O desenvolvimento da niDS
personalidade durante
o período^ escolar

CONSTRUÇÃO
E GÊNER(
A construção social .r
e o desenvolviment&j
conceito de adolesc,èr^

'M
INTERÇAÍCÍTO
CULTURAL
Sair de casa e viver erh^:
outro país cria novas. '
perspectivas pessoais

S ÁLCOOLE
1 DROGAS
m O período de autoafirmação
^ é crítico para lidar com os
2 desafios dos vícios e da
aceitação social