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Aula VII: Febre, Bacteremia &

Endocardite
Prof. Gilvano Amorim
Grandes Temas em Medicina Interna
Departamento de Clínica Médica
Faculdade de Medicina
Objetivos da aula
• Compreender a regulação clínica da temperatura;
• Compreender a fisiopatologia básica da febre;
• Significar “febre” clinicamente.
• Compreender o organismo humano como ambiente asséptico com
espaços colonizados;
• Compreender o evento “bacteremia” e seus significados;
• Compreender endocardite fisiopatológica e clinicamente.
Aspectos da Termorregulação
• Homeotermia x pecilotermia;
• O ser humano é homeotérmico.
• A temperatura de nosso corpo deve ser mantida constante
independentemente das condições ambientais.
• O corpo humano regula a temperatura corporal por meio de um
processo conhecido como termorregulação.
• A termorregulação envolve a interação de diversos mecanismos
fisiológicos e neurais.
• Dentre estes mecanismos temos a produção e dissipação de calor, o
controle da sudorese e o ajuste da circulação sanguínea.
Aspectos da Termorregulação
• A termorregulação é mantida por um centro de controle localizado no
hipotálamo;
• Este centro de controle recebe informações de termorreceptores
localizados na pele, no cérebro e nos órgãos internos.
• Se a temperatura corporal aumenta, o hipotálamo aciona mecanismos para
dissipar o calor, como a vasodilatação periférica (que aumenta o fluxo
sanguíneo para a pele) e a sudorese (que libera calor pela evaporação da
água).
• Se a temperatura corporal diminui, o hipotálamo aciona mecanismos para
produzir e reter calor, como a vasoconstrição periférica (que reduz o fluxo
sanguíneo para a pele) e a contração muscular (que gera calor por meio do
trabalho mecânico).
Temperatura como marco semiológico
• Temperatura do “axis corporis”;
• Formas de medida;
• Significado clínico: insulto hipotalâmico com perda do referencial de
temperatura normal (habitualmente eleva);
Febre
• Resposta fisiológica do organismo a diversos estímulos, incluindo
infecções, inflamações, doenças autoimunes, neoplasias e trauma.
• A fisiopatologia da febre envolve a interação de diversos mecanismos,
incluindo:
➢Liberação de mediadores inflamatórios;
➢Ativação de células imunes;
➢Aumento da produção de calor pelo organismo.
Febre – aspectos fisiopatológicos
• Produção de mediadores inflamatórios;
• Tal produção pode se dar por infecção por bactérias, vírus ou outros
agentes infecciosos ou outros insultos não infecciosos;
• Dentre tais mediadores inflamatórios temos interleucinas, o fator de
necrose tumoral alfa (TNF-α) e a prostaglandina E2 (PGE2);
• Esses mediadores são produzidos por células imunes, como os
macrófagos e as células dendríticas, e têm como principal função
estimular a resposta inflamatória.
Febre – aspectos fisiopatológicos
• A PGE2, em particular, tem um papel central na fisiopatologia da
febre.
• A produção de prostaglandina E (PGE) no núcleo pré-óptico anterior
(POA) está associada à febre.
• O POA é uma região do hipotálamo que atua como um centro
regulador da temperatura corporal.
• Na inflamação haverá produção de citocinas.
• As citocinas atuam no POA e estimulam a produção de PGE.
Febre – aspectos fisiopatológicos
• A PGE age no POA aumentando o "set-point" da temperatura
corporal, ou seja, o ponto de referência para o qual o corpo deve se
esforçar para manter sua temperatura.
• Isso resulta em uma elevação da temperatura corporal, resultando
em febre.
• Essa estimulação leva a uma diminuição do ponto de ajuste térmico
no POA, ou seja, o hipotálamo passa a considerar que a temperatura
corporal normal é mais alta do que o valor anteriormente
estabelecido. Com isso, o organismo passa a produzir e reter mais
calor, levando a uma elevação da temperatura corporal.
Febre – aspectos fisiopatológicos
• Febre aumenta gasto metabólico;
• Febre pode ser lesiva a órgãos nobres como o cérebro;
• No entanto, é uma resposta adaptativa que ajuda a combater
infecções, pois muitos microrganismos não conseguem sobreviver em
temperaturas elevadas.
• A febre estimula a produção de leucócitos e aumenta a resposta do
sistema imunológico.
Semiologia Clínica da Febre
• Febre é um estado decorrente da desregulação do termostato
hipotalâmico que se manifesta por manobras de conservação da
temperatura associadas a sua elevação.
• Temperatura corporal acima da faixa de: 37,5°C no sítio axilar; 37,8°C
no sítio oral e 38°C no sítio retal.
• Distinguível de hipertermia.
Febre X Hipertermia

• Ambas se apresentam como temperatura corporal aumentada;


• A febre é a elevação anormal da temperatura corporal por alteração
do termostato hipotalâmico;
• Hipertermia é a produção de calor corporal excessiva pela falha nos
mecanismos que controlam a temperatura.
Febre X Hipertermia
• Hipertermia: desencadeia mecanismos de dissipação de calor como
vasodilatação periférica, sudorese e perspiração aumentada.
• Febre: desencadeia mecanismos de conservação de calor como tremores,
calafrios, vasoconstrição com achado de extremidades frias, desejo de se
agasalhar e postura fetal.
• Febre: perda da termorregulação e comportamento circadiano da
temperatura.
• Hipertermia: preservação da termorregulação e comportamento
circadiano.
• Comportamento circadiano: temperatura máxima entre 16 e 20hrs e
mínima entre 4 e 6hrs.
Hipotermia
• A hipotermia é uma condição médica em que a temperatura corporal
central cai abaixo de 36,5 a 37,5 graus Celsius.
• Pode ser causada por exposição prolongada a baixas temperaturas,
imersão em água fria ou ventos frios, e pode ser agravada pela falta
de roupas adequadas ou por condições médicas subjacentes.
Hipotermia
Os sintomas da hipotermia variam dependendo da gravidade da condição e
incluem:
• Tremores incontroláveis
• Pele pálida e fria
• Respiração lenta e superficial
• Fala arrastada
• Perda de coordenação motora
• Confusão e dificuldade de pensamento
• Fadiga extrema ou sonolência
• Batimentos cardíacos lentos e irregulares.
ECG na hipotermia
• Bradicardia abaixo de 40bpm
• Ondas T achatadas ou invertidas
• Intervalo PR prolongado
• Ondas Q amplas e profundas
• Ondas J ou de Osborne
Síndrome FOI
• Temperatura axilar acima de 38,3oC.
• Febre de duração maior que 3 semanas.
• Sem diagnóstico após três consultas ou três dias de internação
hospitalar.
Bacteremia
• O sangue como espaço asséptico;
• Bacteremia é a presença de bactérias na corrente sanguínea.
• Pode ser assintomática e corriqueira;
• Dependendo da magnitude e virulência do agente, pode levar a uma
infecção grave ou septicemia;
• Pode ser causada por uma variedade de bactérias, como
Staphylococcus aureus, Streptococcus pneumoniae, Escherichia coli e
Klebsiella pneumoniae, entre outras.
Bacteremia
• Pode ser disseminação de flora natural ou contaminante (exemplo,
instrumentalização de alças intestinais);
• Pode ser uma complicação de outras infecções, como infecções do
trato urinário, infecções respiratórias e infecções de feridas cirúrgicas.
• Cateteres e dispositivos médicos: A presença de cateteres e
dispositivos médicos no corpo pode aumentar o risco de bacteremia.
• Imunossupressão: uso de medicamentos imunossupressores, como
corticosteroides e quimioterapia, e doenças que afetam o sistema
imunológico, como HIV/AIDS e câncer.
Bacteremia
• As manifestações clínicas da bacteremia podem variar de acordo com
a gravidade e a causa da infecção.
• Em alguns casos, a bacteremia pode ser assintomática e pode ser
detectada apenas por meio de hemocultura.
• Em outros casos, a bacteremia pode levar a sintomas como febre,
calafrios, sudorese, dor de cabeça, fadiga, dor muscular e articular,
náuseas e vômitos.
• Em casos mais graves, a bacteremia pode levar a sintomas como
hipotensão, insuficiência respiratória, insuficiência renal e confusão
mental.
Inflamação de Folhetos cardíacos

• Pericárdio: Pericardite.
• Miocárdio: Miocardite.
• Endocárdio: Endocardite.
Endocardite: conceito

Processo inflamatório de natureza infecciosa da superfície do


endocárdio, previamente íntegra ou não, habitualmente causado por
bactérias (ou fungos. Raramente vírus).
Endocardite: Aspectos preliminares
• Aspectos clínicos: febre, sopros cardíacos, petéquias, anemia,
fenômenos embólicos e perda ponderal.
• Vegetações podem fenômenos mecânicos valvares, destruição
tecidual (abscesso miocárdico, aneurisma micótico) e eventos
embólicos sépticos.
• O diagnóstico baseia-se em hemocultura e demonstração de
vegetação.
Endocardite: Aspectos preliminares
• Pode ocorrer em qualquer idade.
• Homens são afetados com uma frequência duas vezes maior do que
mulheres.
• Grupos de risco:
➢Usuários de fármacos endovenosos;
➢Portadores de cateteres endovenosos.
➢Droga adictos;
➢Imunocomprometidos;
➢Valvulopatias e valvas cardíacas protéticas;
➢Portadores de CDI, MP ou outros dispositivos intracardíaco.
Endocardite: Aspectos preliminares
• EI geralmente envolve valvas cardíacas.
• Cardiopatias congênitas, valvopatias reumáticas, valva aórtica bicúspide,
prolapso mitral, doença de Barlow, calcificações valvares, miocardiopatia
hipertrófica, coarctação da aorta, persistência do canal arterial e defeitos
de septo interventricular são condições de risco.
• Histórico de EI aumenta o risco de EI.
• A endocardite infecciosa ocorre com mais frequência do lado esquerdo
(p. ex., valva aórtica ou mitral).
• Em usuários de drogas EV a incidência de endocardite do lado direito é de
cerca de 30 a 70%.
Endocardite
• Infecção microbiana do revestimento endotelial do coração.
• A lesão característica de endocardite é a vegetação, um coágulo de
plaquetas e fibrina infectado, contendo ainda leucócitos e hemácias.
• A vegetação pode estar localizada em qualquer sítio do endotélio,
mas freqüentemente ocorre nas superfícies endoteliais das válvulas
cardíacas e próteses valvares.
Endocardite versus colonoscopia?!
Fatores de Risco

Envelhecimento populacional, particularmente associado à


comorbidades:
• diabetes;
• insuficiência renal crônica;
• anemia (10%);

Aumento da infecção endocárdica por estafilococos;


Quadro clínico

“Uma das características mais importantes da endocardite e para a qual


menos atenção se dá é a ocorrência de manchas efêmeras de um
eritema nodular doloroso, especialmente na pele das mãos e dos pés.
A situação mais comum é a presença destas manchas próximo à ponta
dos dedos, que podem estar ligeiramente edemaciados”.
William Osler (1909)
Quadro clínico
• Quadro mais exuberante na endocardite aguda e mais arrastado na
endocardite subaguda:
• Síndrome febril: Febre com calafrios e sudorese associadas;
• Sopro cardíaco: Novos sopros ou mudança de sopros prévios, principalmente
no quadro agudo;
• Esplenomegalia: Principalmente na forma subaguda;
• Fenômenos embólicos: Petéquias; nódulos de Osler; lesões de Janeway;
hemorragia intracraniana; embolia séptica;
manchas de Splinter (hemorragias subungueais);
• Fenômenos imunológicos: Poliartralgia; manchas de Roth; glomerulonefrite;
baqueteamento digital; nódulos de Osler.
Petéquias
Nódulos de Osler

Dosler=Dor
Manchas de Janeway
Já nem sinto! = não dor
Manchas ungueais de Spintler
Manchas de Roth
Agentes
Associações comuns
• Endocardite em usuário de drogas IV (pp. em valva tricúspide):
Staphylococcus aureus;
Pseudomonas aeruginosa;
Candida;
• Endocardite por Enterococos: Relação com manipulação do trato geniturinário;
• Endocardite por
Streptococcus bovis:
Relação com malignidade do trato gastrointestinal e pólipos colônicos (indicada
colonoscopia);
• Endocardite com hemoculturas negativas: Grupo HACEK (
Haemophylus, Actinobacillus, Cardiobacterium hominis, Eikenella corrodens,
Kingella kingae). Podem demorar
de 14-21 dias para crescer em meio de cultura.
Diagnóstico
• Suspeição
• Lesão cardíaca
• Padrão de comportamento
• Bacteremia
• Fenômeno embólico
• Hemocultura e/ou cultura +
Critérios de DUKE
Critérios de DUKE
Diagnóstico
• Hemograma;
• Hemocultura (2 amostras com intervalo de 30 minutos ou coleta de
10 ml de sangue, em sítios diferentes; caso não haja crescimento
bacteriano, nova amostra deverá ser coletada após 24 horas);
• VHS, proteína C reativa;
• ECG;
• Ecocardiograma transtorácico (sensibilidade para detecção de
vegetações entre 60 e 70%);
• Ecocardiograma trans-esofágico (sensibilidade para detecção de
vegetações entre 75 e 95% com especificidade entre 85 e 98%).
Diagnóstico Diferencial
• Mixoma atrial
• Febre reumática aguda
• Lúpus eritematoso sistêmico / doenças do colágeno
• Endocardite marântica
• Síndrome antifosfolipídio
• Síndrome do carcinóide
• Carcinoma de célula renal
• Púrpura trombótica trombocitopênica
Candidatos a profilaxia
• Pacientes com próteses valvares (mecânicas, biológicas ou homoenxertos);
• Pacientes com antecedente de endocardite infecciosa (mesmo sem
diagnóstico de cardiopatia);
• Pacientes com cardiopatia congênita (exceto CIA ostium secundum
isolado);
• Pacientes com valvopatia reumática (mesmo após correção cirúrgica);
• Pacientes com valvopatias adquiridas (doenças degenerativas, p. ex.);
• Pacientes com prolapso de valva mitral associado a regurgitação mitral;
• Pacientes com miocardiopatia hipertrófica.
Procedimentos & profilaxia
• Tratamento e procedimentos dentários nos quais se espera
sangramento da mucosa ou gengiva;
• Cirurgia que envolve mucosas respiratórias ou intestinal,
tonsilectomia e/ou adenoidectomia, cirurgia de próstata, de vias
biliares ou histerectomia vaginal;
• Escleroterapia de varizes esofagianas;
• Dilatação do esôfago;
• Dilatação uretral;
• Parto vaginal na presença de infecção;
• Incisão e drenagem de tecido infectado.
Obrigado!
Aula VII: Febre, Bacteremia &
Endocardite
Prof. Gilvano Amorim
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