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Pontifícia Universidade Católica de Goiás

Escola de Ciências Sociais e da Saúde

Curso de Psicologia

Disciplina: Fundamentos da Educação Escolar

Professora: Maria Rita Sperb Sant’anna

Estudo sobre a construção subjetiva do pensamento pedagógico

Geovanna Lissa Mascarenhas de Freitas

Goiânia/2021
Estudo sobre a construção subjetiva do pensamento pedagógico

Geovanna Lissa Mascarenhas de Freitas

Para compreender a construção subjetiva do pensamento pedagógico partiremos de Bernard


Charlot, que é visto pelos professores de didática e pedagogos com mais tempo de formação
como um dos pedagogos brasileiros que influenciaram a pedagogia profundamente, e para
ele: “A educação é um triplo processo de humanização, socialização e entrada numa cultura,
singularização-subjetivação. Educa-se portanto um ser humano, um membro de uma
sociedade e de uma cultura, um sujeito singular. Podemos prestar mais atenção a uma
dimensão do que a outra, mas na realidade do processo educacional, as três permanecem
indissociáveis.” (Charlot 2006, p.15).

Desse modo, podemos entender que para Charlot a educação é tanto um instrumento de
tornar humano, quanto de criar oportunidades, quanto de envolvimento e trânsito social,
como porta para compreender e adentrar em culturas, pois dentro do ambiente educacional
cada indivíduo tem sua individualidade e subjetividade que abrange seus valores, sua cultura,
suas habilidades e seus déficits, e é papel da educação e dos educadores proporcionar o
acolhimento e inclusão desse indivíduo único e propiciar a ele eficácia no seu processo de
aprendizado, mesmo dentro de um sistema coletivo como as instituições de ensino.

Outro ponto relevante nesse estudo é a intencionalidade da educação, que se trata justamente
do compromisso desse professor/pedagogo em levar ao estudante eficácia no processo
educacional, ou seja a garantia que sua subjetividade será respeitada e compreendida e que
com isso haverá o emprego de práticas pedagógicas adequadas e por fim aprendizado
concreto, em que esse indivíduo consiga se apropriar e criticar todo conteúdo que lhe for
apresentado, pois tanto instituição como docente estarão em busca de não apenas entregar
materiais e explicações e sim mediar o aprendizado de maneira fluente e usual para os
indivíduos daquela sociedade.

Surge finalmente o grande questionamento postulado e respondido em parte por Franco


(2012, p. 48) “O que é, afinal, a Pedagogia? Antes de constitui-se como ciência, ela se
estabelece como uma prática social para organizar a educação em determinado tempo e
espaço, refletindo sobre suas finalidades e meios mais adequados, buscando a cada momento
compreender e transformar as práticas educativas, de forma que atinjam as finalidades
estabelecidas”

De acordo com Saviani (2008, p.3) “[...] a Pedagogia desenvolveu-se em íntima relação com
a prática educativa, constituindo-se como teoria ou ciência dessa prática, sendo, em
determinados contextos, identificada com o próprio modo intencional de realizar a
educação”, portanto a expressão Pedagogia abrange pensar, organizar e construir a educação
através da prática educativa, se trata, de forma sucinta, da busca de mecanismos e
ferramentas para entender o contexto social e individual a fim de reunir recursos e fornecer
para aqueles indivíduos instrumentos para mudança social através do desenvolvimento da
criticidade e do despertar no estudante a visão para o mundo com interesse e curiosidade,
fugindo da visão meramente óptica. Para atingir seu objetivo a pedagogia utiliza as práticas
pedagógicas eficientes empregadas pelos docentes, e para além disso cabe o constante debate
pedagógico, a fim de entender a sociedade na qual estão inseridos, suas necessidades,
vantagens e déficits e quais os conteúdos e estratégias adequadas para a subjetividade dos
indivíduos que estão dentro das instituições e das comunidades.

Corroborado por Meirieu (2010, p.13): “Pois se devêssemos ter um indicador do grau de
democracia de um nação, não seria impossível considerar a existência de debates
pedagógicos e a existência de pedagogos que se interrogam sobre a formação que convém dar
à criança e sobre o modo de chegar a isso, como indicadores particularmente significativos.”,
trazendo aqui também além do papel social da educação sua função política dentro do
contexto educacional em criticar e debater a educação dentro do contexto histórico.

Ademais, temos prática pedagógica dos professores, que é a maleta de ferramentas que os
mesmos dispõem no processo de ensinar, ou seja, é o conjunto de estratégias e recursos que
os docentes utilizam para atingir a subjetividade de seus estudantes e conseguir de fato
exercer a pedagogia. A intencionalidade pedagógica começa com a construção de uma prática
pedagógica eficiente, completa e em constante evolução, para que nenhum aluno seja deixado
pelo caminho e todos consigam de fato aprender e se apropriar dos conteúdos apresentados,
apenas dessa forma o papel e objetivo da educação serão alcançados, ou seja, dessa maneira
conseguiremos formar indivíduos críticos e com potencial de mudança social.

Nessa perspectiva se tem a importância da formação adequada desse professor para que o
mesmo consiga captar as necessidades e subjetividades dos estudantes e a partir disso
construir sua prática pedagógica de maneira maleável, visando um profissional eficiente que
consiga de fato atender toda a sua demanda de alunos e sua necessidade educacional. Porém o
que Franco (2012, p.40) nós traz é que ”As práticas pedagógicas, construídas e buscadas
historicamente, já não parecem produzir possibilidades de ensino ao professor nem de
aprendizagem aos alunos, aliás, tais práticas já não parecem ser trabalhadas em processos de
formação inicial de docentes", evidenciando um problema na qual a consequência é
justamente a não eficiência da educação, ou seja, não haverá aprendizado por parte da
comunidade acadêmica.

Por outro lado temos quando a intencionalidade pedagógica não se concretiza por o docente
estar em um estado, por vezes mecânico, em que a prática pedagógica passa a adequar-se
somente a ele e se perde o objetivo de aprendizados, e podem ser inúmeras razões mas que
levam aos mesmo resultado, uma prática pedagógica pobre e estática em que o professor não
mais se importa com o aproveitamento e apreensão por parte do discente, como Franco
(2012, p.40) coloca “[...], e percebo a dificuldade de docentes em organizar uma prática que
ensine os alunos. A impressão que fica é que a prática do professor é para ser exercida
independentemente dos alunos e de sua aprendizagem.”, gerando novamente uma deficiência
no processo educativo, ao excluir alunos aos quais aquela prática não atinge impossibilitando
os mesmos de ter um real aprendizado.

Para dar continuidade no entendimento da construção subjetiva do pensamento pedagógico


vamos recorrer a grandes pensadores como Sócrates, Comenius, Rousseau, Pestalozzi,
Dewey, Anísio Teixeira, Paulo Freire e Dermeval Saviani.

Na visão de Franco (2012, p. 45) “Pedagogicamente falando, Sócrates destaca o papel da


aprendizagem e do sujeito aprendente. Repudia o método retórico dos sofistas, a imposição
de um saber alheio às reflexões do sujeito; impõe-se pelo desejo ardente de aprender,
conhecer-se a si mesmo e buscar a verdade. Pode-se dizer que leva às últimas consequências
a proposta do diálogo como método de aprender. Ele dizia que o "ensino é sempre mais que o
ensino”, propondo talvez um princípio bastante caro à pedagogia contemporânea: não basta a
transmissão de conhecimentos, sem os mecanismos de contrapartida do sujeito.”.

A grande contribuição de Sócrates foi a técnica da Maiêutica1 que de acordo com Melo
(2019, p. 41), “[...] consiste basicamente em tentar guiar o interlocutor a produção de novos
conceitos e ideias a partir do despojamento de tudo aquilo que se supõe saber. Temos aqui um
passo importante para o conhecimento, uma vez que o indivíduo faz jus à etimologia da
palavra maiêutica como a arte de partejar. No caso, Sócrates não fazia parto de homens, mas
parto de ideias. Sua arte consistia em fazer seus contemporâneos reconhecerem sua
ignorância e a partir daí chegar a constatação dos limites do conhecimento, da
impossibilidade de formular uma definição”, através da utilização desse método o pensador
propunha que para se chegar ao aprendizado era primeiro haver a dúvida utilizando-se do
dialogo, questionar dentro de si tudo aquilo que se tinha como verdade para por fim lapidar o
real conhecimento.

Franco (2012, p. 45) afirma ainda que “Como pressuposto do método socrático está a
intenção de fazer o sujeito aprender por si e pôr em movimento seus próprios mecanismos
mentais, em um processo de busca da própria atividade mental”, aqui há o posicionamento do
individuo que aprende não como elemento passivo no processo educacional e sim explorador
de suas potencialidades e responsavél ativo do aprendizado, outra grande contribuição de
Sócrates para a pedagogia, o auxilio na confirmação da necessidade em dividir entre aluno e
professor a tarefa de buscar o conhecimento.

Gauthier e Tardif (2010, p. 52) também corroboram com o papel de Sócrates da visão do
estudante como elemento ativo na construção pedagógica, ao postular que: “A educação
socrática comporta a ideia de um processo de aprendizagem concreto, através do qual o
aprendiz forja o seu próprio pensamento, constrói e fundamenta suas próprias convicções por
meio de interações verbais com o educador.”.

1
MAIÊUTICA (gr. M.oaeimxti xé^vri; in.Maieutics-, fr. Maícutique; ai. Müeittik; it.Maieulica). Arte cia
parteira; m Teeteto de Platão, Sócrates compara seus ensinamentos a essa arte, porquanto consistem em dar à luz
conhecimentos que se formam na mente de seus discípulos: "Tenho isso em comum com as parteiras: sou estéril
de sabedoria; e aquilo que há anos muitos censuram em mim, que interrogo os outros, mas nunca respondo por
mim porque não tenho pensamentos sábios a expor, é censura justa" Cleet., 15c) (ABBAGNANO, 2007, p.637).
Desse modo é claro que atráves da Maiêutica Sócrates ajuda a construir uma pedagogia
centrada no dialogo, que exije mais do que apenas a transmição de uma ideia ou teoria, e sim
a troca o questionamento e a criticidade acerca de qualquer tema e na participação ativa do
estudante que constroi uma educação bilateral e integrada em que se tem a apropriação de
conteúdos atráves de um esforço multuo e o equilibrio entre o buscar e o receber.
Outro pensador importante para entender o pensamento pedagógico foi Comenius, que de
acordo com Franco (2012, p. 49) “pensa no sentido da educação; esforça-se para
operacionalizar a democratização do acesso à escola e da permanência nela; preocupa-se com
o caráter humanizador da educação; considera a adequação da educação aos estágios de
desenvolvimento das crianças e busca, ainda, caminhos para o prazer da aprendizagem.”.
Nessa fala temos a visão desse pensador como peça fundamental para ver a educação com
papel inclusivo, que respeita a individualidade de seus alunos, sua subjetividade, dificuldades
e potencialidades e que busca por fim que haja gozo no aprender.
Outro ponto apontado por Franco (2012, p. 47) que Comenius “ convidada os educadores a
pensar sobre a questão educacional, propondo a utopia da criação de um método capaz de
ensinar tudo a todos.” e sobre suas obras, Houssaye (1993, p. 21) comenta: “deve ser
considerada como a primeira tentativa sintética para constituir a Pedagogia como ciência
autônoma”.
Ademais Franco (2012, p. 50 e 51) apresenta que: “Comenius marca a subjetividade
pedagógica ao propor um sentido de Didática, como organização do ensino e criação de
sentido para ele; a perspectiva do ensino como arte de fazer a educação; a educação como
instrumento importantes de democratização da sociedade; a destinação da educação a todos e
a crença e fé na possibilidade de todos poderem aprender com prazer e alegria.Enfatizo a
questão da universalidade do ensino; da criação de um discurso pedagógico, em que o
método de ensino (como ensinar) se subjuga a uma profunda reflexão sobre as finalidades do
ensino (o que estudar) e aos objetivos da educação (para que ensinar)”.
Em suma, as contribuições de Comenius se baseiam no seu esforço em buscar uma educação
inclusiva, que buscava ir além de distribuir teorias e sim democratizar o conhecimento e levar
da maneira adequada para cada estudante o conteúdo pretendido para que dessa forma o
objetivo da educação fosse alcançado e tanto o educador quanto o educanto fossem
beneficiados e se sentissem realizados no processo.
Temos também Rousseau, outro pensador revolucionario para a pedagogia o qual podemos
analisar para entender a construção subjetiva do pensamento pedagógico, nas palavras de
Franco (2012, p. 52) “Considera-se que Rousseau fez uma revolução na Pedagogia por
abordar o pensamento da criança não como o de um adulto em miniatura, mas como o de um
ser que possui uma natureza específica, concentrando-se em aprofundar o processo de
desenvolvimento da infância para a maturidade e criando, pode-se dizer uma teoria da
infância.”, ao conceber a criança como ser em desenvolvimento durante o processo
pedagogico o filosofo proporciona a pedagogia a tarefa de se adequar a esse individuo e sua
etapa cognitiva, ou seja, coloca como responsabilidade da educação o analisar e se moldar de
acordo com as capacidades e necessidades desses individuos.
Outras grandes contribuições de Rousseau para a pedagogia se baseiam em sua preocupação
a cerca do papel do professor, do educando e da educação em si. Gauthier e Taudif (2010, p.
130) apresentam que: “Rousseau elabora, pois uma pedagogia ativa (a criança participa
inteiramente do processo de aprendizagem), concreta (ela recorre à observação),
essencialmente utilitária (ela prepara para a vida entre os membros da sociedade), centrada na
experimentação e não no estudo livresco ou nos discursos magistrais (são as coisas e não os
discursos que devem falar…)” .
Ademais temos Pestalozzi, pensador suíço que apresenta em seus trabalho para com a
pedagogia uma visão democratica e atenciosa com a criança e seu processo de
desenvolvimento, buscando adequar a educação de maneira social e psicologico para que essa
criança se sinta inclusa e atendida dentro da educação.
“O maior serviço de Pestalozzi prestou ao ideal democrático reside, sem dúvida, na
criação de um programa de escolas populares, na supressão de métodos brutais de repressão
na escola e na formação de pessoal docente” (apud SOETARD, 2009, p. 18).
Cabe também citar o pensador norte-americano Dewey e suas contribuições para a pedagogia
e para Franco (2012, p. 60 e 61) “Ambos, Pestalozzi e Dewey, tomam como princípio
pedagógico a experiência e a ação; ambos enaltecem a democracia como princípio de vida
coletiva; ambos se preocupam com a educação integral e com os ritmos de desenvolvimento -
a autonomia é uma conquista da responsabilidade. Ambos valorizam a educação e o trabalho
e se inserem “numa filosofia da ação que não se reduz à conquista de resultados materiais,
mas que visa também à dimensão humanista da educação. O sentido se constrói na ação e
através da experiÊncia” (TEITELBAUN; APPLE, 2001, p.198).
Desse modo, temos dois pensadores, cada qual com sua individualidade em localidades
diferentes observando a necessidade de uma educação mais humana em que o trato para com
o estudante vá além do resultado, de notas e da entrega de trabalhos e chegue ao verdadeiro
conhecimento, aquele que constroi criticidade que permite aprimoramento e mudança social.
Já sobre o pensador brasileiro Anísio Teixeira temos Franco (2012, p. 62) afirmando que:
“pode-se destacar a forma de encarar a função social da escola: não apenas local de instrução,
mas espaço de reconstrução social, de democratização da sociedade.” e também é marcador
por seu proposito pelo qual “Persegue insistentemente a necessidade de educação e ensino
para todos, valorizando a educação do povo e chegando a propor uma ação descentralizada
do Estado (municipalização), de forma participativa e democrática (TEIXEIRA, 1976, p. 75).
Diante do apresentado sobre Anísio Teixeira podemos evidenciar seu caracter cidadão em sua
luta pela democratização da educação, o respeiro da individualidade dos alunos no ambito de
sua cultura e identidade, além da busca pelo objetivo inicial da educação em cumprir seu
papel social de munir esses cidadão de conhecimento para que o mesmo esteja apto para
melhorar essa sociedade na qual está inserido.
Ademais cabe citar Paulo Freire, pensador brasileiro que promoveu revoluções na pedagogia
no mundo todo ao pensar uma educação libertadora, para entende-lo um pouco melhor
recorremos à Franco (2010, p. 68) que postula:
“Por meio de uma prática mediada pelo diálogo e pela valorização da cultura do aluno, Paulo
Freire vê na educação uma forma política de transformar a sociedade, para que esta se torne
mais justa e mais solidária.
Ele revoluciona o pensamento pedagógico, introduzindo a concepção dialética na educação e
propondo perspectivas essenciais para mudar as raízes históricas de uma educação elitista e
lançar as bases de uma pedagogia revolucionária, apostando na educação como instrumento e
libertação.”
Os postulamentos de Paulo Freire trouxe tanta reflexão e revolução dentro da pedagogia que
são utilizados mundialmente para referenciar e guiar as dicussões e aprimoramentos dentro
do pensamento pedagógico.
Por fim vemos a importância desses filosofos, pedagogos e grandes pensadores para que seja
viavel pensar na construção subjetiva do pensamento pedagógico tanto em ambito local,
dentro de uma escola específica ou um bairro, quanto em ambito mundial nos grandes
congressos e feiras cientificas destinadas a educação, espaços esses que estão dispostos e
interessados justamente na adequação da pedagogia para que a intencionalidade educacional
se de e que o professor esteja motivado e preparado para guiar o aluno para o real
aprendizado.
Referência

FRANCO, Maria Amélia do Rosário Santoro. Pedagogia e prática docente. São Paulo:
Cortez, 2012, p. 37-71.

MELO, Francisco Cleano Lima. Metodologia do ensino da Filosofia no ensino médio, na


perspectiva da maiêutica Socrática. 2019. 86 f. Dissertação (Mestrado em Filosofia) -
Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2019.

ABBAGNANO , Nicola . Dicionário de Filosofia . Tradução da 1º edição brasileira


coordenada e revisada por Alfredo Bossi; revisão da tradução e tradução de novos textos
Ivoni Castilho Benedetti. 5. ed. São Paulo : Martins Fontes, 2007.

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