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Psiquiatria Braz J. 2020 maio-jun;42(3):243-244

doi:10.1590/1516-4446-2019-0773
Associação Brasileira de Psiquiatria
00000000-0002-7316-1185

EDITORIAL

A ascensão e queda e ascensão dos benzodiazepínicos: um retorno do estigmatizado e reprimido Richard Balon,

10000-0001-8638-5842 Vladan Starcevic, 20000-0001-8638-5842

Edward Silberman, Fiammetta Cosci, 4,50000-0001-8638-5842 Steven 6,73 Giovanni A. Fava,

Rickels, 60000-0001-8638-5842 Antonio E. Nardi, 80000-0001-8638-5842 Karl 9 Carlos Salzman, 10

Dubovsky, Richard I. Shader, 110000-0001-8638-5842 Nicoletta Sonino6 ; para a Força-Tarefa Internacional sobre Benzodiazepínicos
1 2
Departamentos de Psiquiatria e Neurociências Comportamentais e Anestesiologia, Wayne State University, Detroit, Michigan, EUA. Disciplina de
Psiquiatria, Faculdade de Medicina e Saúde, Sydney Medical School, Nepean Clinical School, University of Sydney, Sydney, Austrália.
3 4
Departamento de Psiquiatria, Tufts Medical Center e Tufts University School of Medicine, Boston, Massachusetts, EUA. Departamento de Saúde
5
Ciências, Universidade de Florença, Florença, Itália. Departamento de Psiquiatria e Neuropsicologia, Maastricht University, Maastricht,
7
6 Holanda. Departamento de Psiquiatria, University of Buffalo, Buffalo, Nova York, EUA. Departamento de Psiquiatria, University of Colorado,
8 9
Denver, Colorado, EUA. Department of Psychiatry, Federal University of Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brazil. Departamento de Psiquiatria,
Universidade da Pensilvânia, Filadélfia, Pensilvânia, EUA. 10Departamento de Psiquiatria, Harvard University, Boston, Massachusetts, EUA.
11Centro para o Estudo do Desenvolvimento de Drogas, Departamento de Imunologia, Tufts University, Boston, Massachusetts, EUA.

Quem não se lembra do passado está condenado
a repeti-lo.
(George Santayana)
O caminho da descoberta variou para vários medicamentos
psicotrópicos, às vezes começando com descobertas fortuitas de
observadores perspicazes (por exemplo, a descoberta das
propriedades antidepressivas da imipramina por Roland Kuhn),
seguidas por pesquisas mais direcionadas para expandir o arsenal
com medicamentos semelhantes. Em meados da década de 1940,
Frank Berger observou que a mefenesina tinha propriedades
calmantes, mas não sedativas, em roedores. Esse composto
apresentava várias desvantagens, como duração de ação muito
curta e atividade fraca. Assim, Berger e um colega da Carter-
Wallace, uma pequena empresa farmacêutica, mais tarde
sintetizaram o meprobamato, superando as deficiências da
mefenesina. Em meados da década de 1950, o mepro bamate
tornou-se uma droga de grande sucesso sob o nome de Miltown,
apesar de não ter um desempenho melhor do que o placebo em
ensaios clínicos .
Dadas as vendas pesadas, outras empresas farmacêuticas
queriam entrar no mercado de tranqüilizantes. A Roche Pharma
ceuticals encarregou Leo Sternbach de desenvolver uma droga "eu
também" semelhante à meproba mate. Sternbach, no entanto,
seguindo outra observação fortuita, examinou um grupo de corantes
azóicos e, em meados da década de 1950, sintetizou o primeiro
benzodiazepínico, o clordiazepóxido. Mais tarde, ele sintetizou,
entre outras drogas, vários outros benzodiazepínicos, por exemplo,
diazepam, flunitrazepam e clonazepam.
Em 1977, os benzodiazepínicos se tornaram os medicamentos
mais prescritos em todo o mundo. Eles foram apreciados não
apenas por suas propriedades ansiolíticas, mas também por sua utilidade Em contraste, os benzodiazepínicos não foram aprovados para
na insônia, agitação, convulsões, espasmos musculares, abstinência
alcoólica e como pré-medicação cirúrgica.
A eficácia dos benzodiazepínicos em vários transtornos de
ansiedade e outras entidades diagnósticas (por exemplo, depressão
ansiosa2 ) foi estabelecida por meio de ensaios clínicos das décadas
de 1960 a 1990. Em seguida, os novos antidepressivos – inibidores
seletivos da recaptação da serotonina (SSRIs) chegaram durante a
década de 1990. Eles foram originalmente aprovados por agências
reguladoras para transtornos depressivos, mas as empresas
farmacêuticas começaram a buscar aprovação adicional para os
SSRIs serem usados em transtornos de ansiedade.
À medida que crescia o número de indicações de ISRS para
transtornos de ansiedade e alguns psiquiatras ficavam historicamente
apreensivos com a prescrição de benzodiazepínicos (principalmente
por medo de abuso), as prescrições de benzodiazepínicos para
transtornos de ansiedade diminuíram, especialmente entre os
psiquiatras. Assim, os benzodiazepínicos foram gradativamente
substituídos pelos ISRSs para essas indicações. Curiosamente, isso
aconteceu sem evidências sólidas de que os ISRSs fossem
superiores aos benzodiazepínicos.3 Pode-se perguntar por que
os psiquiatras prefeririam os ISRSs aos benzodiazepínicos em
transtornos de ansiedade sem evidências suficientes de melhor
eficácia e tolerabilidade. Parece-nos que os benzodiazepínicos
foram expostos a uma tempestade quase perfeita de vários fatores que trabalharam c
Primeiro, devido a circunstâncias históricas, a aprovação da
agência reguladora foi desvantajosa para os benzodiazepínicos.
A maioria deles foi aprovada antes da chegada do DSM-III, quando
havia apenas 3 diagnósticos de transtorno de ansiedade disponíveis
– neurose de ansiedade, neurose fóbica e neurose obsessiva-
compulsiva. O DSM-III estabeleceu novos diagnósticos de transtorno
de ansiedade, por exemplo, transtorno de pânico, transtorno de
ansiedade generalizada, fobia social, transtorno de estresse pós-
traumático, etc., e os ISRSs foram aprovados para muitos desses diagnósticos.

Correspondência: Richard Balon, Departamento de Psiquiatria, Tolan Park
Building 3A, 3901 Chrysler Service Dr, Detroit, MI, 48309, EUA.
E-mail: rbalon@wayne.edu Enviado
em 03 de novembro de 2019, aceito em 07 de novembro de 2019, Epub em 09 de março de 2020.
Como citar este artigo: Balon R, Starcevic V, Silberman E, Cosci F,
Dubovsky S, Fava GA, et al. A ascensão e queda e ascensão dos
benzodiazepínicos: um retorno dos estigmatizados e reprimidos.
Psiquiatria Braz J. 2020;42:243-244. http://dx.doi.org/
10.1590/1516-4446-2019-0773 _
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244 R Ballon et ai.
essas indicações, uma vez que estavam em sua maioria fora da patente e
seus fabricantes não estavam dispostos a gastar dinheiro em novos
ensaios clínicos. A exceção foi o alprazolam, que foi investigado e
aprovado para transtorno do pânico.
O clonazepam também foi aprovado posteriormente para o transtorno do pânico.
Muitos psiquiatras foram treinados para usar medicamentos apenas para
indicações aprovadas e muitas seguradoras têm pago pelo uso de
medicamentos apenas para indicações aprovadas.
Em segundo lugar, os SSRIs foram recebidos com muito entusiasmo,
enquanto muitas de suas desvantagens, como altas taxas de resposta ao
placebo em ensaios clínicos e seus efeitos adversos, eram desconhecidas
ou negligenciadas. Por exemplo, a frequência relatada originalmente de
disfunção sexual associada à fluoxetina foi de 1,8% (com base em relatos
espontâneos). Agora sabemos que a incidência de disfunção sexual
associada aos ISRSs é muito maior. Além disso, quando os ISRSs foram
introduzidos, uma síndrome de descontinuação após sua cessação não
foi mencionada, o que foi considerado uma vantagem significativa sobre
os sintomas de descontinuação de benzodiazepínicos, que muitas vezes
eram retratados como perigosos.
Em terceiro lugar, a indústria farmacêutica tem feito um trabalho
maravilhoso promovendo os ISRSs enquanto menciona sutilmente as
propriedades desvantajosas dos benzodiazepínicos, apesar do fato de os
benzodiazepínicos serem comparativamente ou mais eficazes e terem
menos efeitos colaterais do que os antidepressivos mais antigos no
tratamento do transtorno de ansiedade generalizada,3 ou de os ISRS
terem um perfil de efeitos colaterais menos favorável do que os
benzodiazepínicos no tratamento agudo do transtorno do pânico.4
Em quarto lugar, os benzodiazepínicos têm sido constantemente
estigmatizados por alegações de abuso de substâncias e síndrome de
abstinência, apesar da falta de evidências de que são abusados quando
prescritos adequadamente a pacientes que ainda não abusam de
substâncias e apesar da evidência de que quase sempre são abusados
no contexto de uso indevido e abuso de outras substâncias . Isso, de certa
forma, foi uma chave para fazer os médicos acreditarem que os
benzodiazepínicos causam dependência, enquanto os antidepressivos
não.
Quinto, com a terapia cognitivo-comportamental ganhando
proeminência no tratamento do transtorno de ansiedade, os psiquiatras
foram bombardeados com sugestões (baseadas em quase nenhuma
evidência) de que é prejudicial combinar a terapia cognitivo-comportamental
com benzodiazepínicos, enquanto a combinação da terapia cognitivo-
comportamental com antidepressivos pode ser benéfica.
Apesar desses fatores, os benzodiazepínicos continuam sendo
frequentemente prescritos em todo o mundo. As taxas em que eles
Psiquiatria Braz J. 2020;42(3)
são prescritos variam de um país para outro, mas os relatórios sugerem
que essas taxas são constantes ou até mesmo crescentes. Por exemplo,
as prescrições de benzodiazepínicos para adultos mais velhos nos EUA
aumentaram entre 2003 e 2012.6 Existem várias razões para a
popularidade contínua dos benzodiazepínicos e sua "ressurreição". Sua
eficácia é comparável, se não melhor, à dos antidepressivos nos
transtornos de ansiedade. Eles também funcionam bem na depressão
ansiosa.2 Quando usados em transtornos de ansiedade, seu perfil de
efeitos colaterais parece melhor do que o dos ISRSs e outros
antidepressivos. Os benzodiazepínicos são agentes versáteis que podem
ser usados intermitentemente, para tratamento de curto prazo, tratamento
de longo prazo e talvez até indefinidamente, se prescritos e administrados
adequadamente.
Chegou a hora de reavaliar adequadamente o lugar dos
benzodiazepínicos no arsenal da psiquiatria. Não devemos privar nossos
pacientes de medicamentos eficazes e bem tolerados por causa de
contratempos históricos, preconceitos pessoais e especializados e
propaganda negativa de marketing. A história da ascensão e queda dos
pinheiros benzodiaze e sua estigmatização e supressão deve ser um
alerta para outras classes de medicamentos psicotrópicos e para o campo
em geral.
Divulgação
Os autores informam que não há conflitos de interesse.
Referências
1 Greenblatt DJ, Shader RI. Meprobamato: um estudo do uso irracional de
drogas. Am J Psiquiatria. 1971;127:1297-303.
2 Benasi G, Guidi J, Offidani E, Balon R, Rickels K, Fava GA.
Benzodiazepínicos como monoterapia em transtornos depressivos: uma
revisão sistemática. Psicoter Psicossomo. 2018;87:65-74.
3 Offidani E, Guidi J, Tomba E, Fava GA. Eficácia e tolerabilidade de
benzodiazepínicos versus antidepressivos em transtornos de ansiedade:
uma revisão sistemática e meta-análise. Psicoter Psicossomo.
2013;82:355-62.
4 Quagliato LA, Coaci F, Shader RI, Silberman EK, Starcevic V, Balon R, et
al. Inibidores seletivos da recaptação da serotonina e benzodiazepínicos
no transtorno do pânico: uma meta-análise dos efeitos colaterais comuns
no tratamento agudo. J Psychopharmacol. 2019;33:1340-51.
5 Associação Americana de Psiquiatria (APA). Dependência, toxicidade e
abuso de benzodiazepínicos. Um relatório da força-tarefa. Washington:
APA; 1990.
6 Maust DT, Blow FC, Wiechers IR, Kales HC, Marcus SC. Tendências
nacionais em tratamento com antidepressivos, benzodiazepínicos e outros
sedativos hipnóticos para idosos em atendimento psiquiátrico e primário.
Psiquiatria J Clin. 2017;78:e363-71.