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Teoria Geral

da Relação Jurídica
I. O negócio jurídico em geral 3
I.I. Negócio jurídico 3
I.II. Elementos do negócio jurídico 3
Declaração negocial 3
I.III. Conformação unilateral de relações jurídicas 4
I.IV. Classificações de negócio jurídico 4

II. A formação do negócio jurídico 7


II.I. Modalidades da declaração negocial 7
Declaração expressa 7
Declaração tácita 7
Silêncio 8
II.II. Forma da declaração negocial 8
Princípio da liberdade de forma 8
Modalidades dos documentos escritos 10
Publicidade 10
II.IV. Perfeição da declaração negocial 10
Desenvolvimento da declaração negocial no tempo 11
II.III. A conclusão do contrato 12
Proposta 12
Aceitação 14
Dissenso 15
Efeitos da conclusão do contrato 15
Cláusulas contratuais gerais 15
Culpa in contrahendo 15
II.IV. Representação 17
Representação legal 18
Representação voluntária 18

III. Os negócios jurídicos com eficácia limitada 19


III.I. Condição 19
III.II. Termo 20
III.III. Os negócios jurídicos com efeitos dependentes de ratificação 21
Ratificação 21
Insolvência 21
Representação sem poderes 21
Contrato para pessoa a nomear 22

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III.IV. Os negócios jurídicos com eficácia relativa 22
Falta de publicidade 22
Inoponibilidade da invalidade 23

IV. A interpretação e integração da declaração negocial 24


IV.I. Interpretação 24
IV.II. Integração 25

V. A invalidade do negócio jurídico 25


Invalidade 25
V.I. Modalidades da invalidade do negócio jurídico 25
Nulidade 25
Anulabilidade 26
V.II. Efeitos da nulidade e anulabilidade do negócio jurídico 26
V.III. Causas de nulidade do negócio jurídico 27
Incapacidade de gozo 27
Negócios celebrados contra a lei 27
Requisitos do objeto negocial 28
Fim contrário à lei ou à ordem pública 28
Inobservância da forma legal 28
Negócios celebrados com falta de vontade 29
Simulação 29
Reserva mental 30
Declaração não séria 30
Coação física 30
Erro na declaração 30
V.IV. Causas da anulabilidade 30
Regime da menoridade 30
Regime do maior acompanhado 31
Negócios usurários 32
Erro na declaração 32
Negócios celebrados com vícios da vontade 33

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I. O negócio jurídico em geral
I.I. Negócio jurídico
Declaração de vontade que visa a produção de efeitos jurídicos, que se produzem conforme a
ordem jurídica, de acordo com a vontade das partes .

Efeitos: constituição, modi cação ou extinção de deveres


Declaração de vontade ≠ Declarações de ciência
Visando a produção de efeitos jurídicos ≠ Relações de favor/cortesia e acordos de cavalheiros
(sem intenção de vinculação jurídica)

I.II. Elementos do negócio jurídico


Elementos naturais
Regras da ordem jurídica que complementam a regulamentação encontrada pelas partes (normas
supletivas). Não resultam da vontade das partes.
Elementos acidentais
Estipulações das partes que não integram o respetivo tipo negocial, mas que contêm cláusulas
suplementares ou acessórias (cláusulas sobre prazos ou condições, etc.). Resultam da vontade das
partes.
Elementos essenciais do negócio jurídico
Elementos que permitem caracterizar o negócio jurídico e distingui-los dos demais (preço
distingue contrato de compra e venda de doação, p.e.). Resultam da vontade das partes.
Realidades sem as quais o negócio jurídico não ganha existência.

- Declarantes
➡ Capacidade negocial (art. 67.º)
- Declaração de vontade (negocial)
➡ Vontade perfeita (sem vícios) (elem. int.)
➡ Coincidência com a declaração (elem. ext.)
- Objeto
➡ Determinabilidade
➡ Possibilidade
➡ Licitude

Cada elemento tem de preencher determinados pressupostos.


A ausência de um elemento implica a inexistência do negócio jurídico.
A ausência de um pressuposto implica a invalidade do negócio jurídico.

Declaração negocial
Meio de manifestação da vontade que visa a produção de efeitos jurídicos.
Composta pela vontade (elemento interno) e pela declaração/manifestação (elemento externo).

Sem a declaração negocial, o negócio jurídico é inexistente. A falta de declaração negocial pode
assumir duas formas:
• falta da declaração em si, ausência de manifestação - silêncio
• falta de uma declaração com caráter negocial, isto é, à qual não subjaz qualquer vontade
destinada à produção de efeitos jurídicos

A falta da declaração difere da vontade invalidamente manifestada ou formada. Neste último,


existe um negócio jurídico, todavia, os seus efeitos jurídicos, sempre de natureza negocial, são
prejudicados pela invalidade do ato.

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fi
Por vezes, como no caso dos contratos reais, para além das declarações negociais, são
necessários atos reais/materiais para que o negócio produza efeitos jurídicos (entrega da coisa,
p.e.).
I.III. Conformação unilateral de relações jurídicas
Um sujeito somente pode conformar relações jurídicas de uma maneira unilateral:
• no exercício de um direito já constituído (direito potestativo)
• quando o ato afeta apenas o património próprio (testamento)
• quando não são atingidos direitos de outrem (ocupação de coisas sem dono)
• quando o ato traz uma vantagem jurídica para o visado (proposta da conclusão de um
contrato)

Só existe auto-vinculação nos casos previstos na lei (art. 457.º). Contudo, pode existir condutas
criadoras de con ança, em que a lei prevê indemnizações por “dano da con ança” (art. 246.º in ne)
ou, no âmbito do abuso do direito, onde existe a gura do venire contra factum proprium, caso em
que o agente tem uma conduta contrária ao seu comportamento anterior, o qual gerou con ança na
outra parte.

Art. 457º
Só excecionalmente é possível uma conformação unilateral de relações jurídicas.
A constituição, modi cação e extinção de relações jurídicas provêm geralmente de consensos
entre as partes (exceção: direitos potestativos).

I.IV. Classi cações de negócio jurídico


Critério do número e modo de articulação das declarações de vontade (estrutura)
- Negócios unilaterais
Há apenas uma declaração de vontade de um lado ou várias declarações de vontade
paralelas de um lado. (mesmo sentido)

mesmo sentido

• não recetícios: para que o negócio jurídico se torne e caz, basta a mera emissão
da declaração de vontade, não havendo uma tomada de conhecimento do seu
conteúdo por parte de um destinatário ou uma chegada da declaração negocial ao seu
poder (não há destinatário)
testamento
promessa pública

• recetícios: para que o negócio jurídico se torne e caz, é necessário que o


destinatário conheça o conteúdo da declaração ou esta chegue ao seu poder
denúncia de um contrato de arrendamento sem prazo certo, oposição à renovação
de um contrato de arrendamento por prazo certo (necessidade de aviso de receção para
efeitos probatórios)

- Negócios plurilaterais
Negócios jurídicos que se compõem de duas ou mais declarações de vontade
provenientes de dois ou mais lados e cujos sentidos convergem.
Inclui negócios jurídicos bilaterais/contratos (sinónimos).
contrato de compra e venda

sentidos opostos, mas convergentes

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fi
fi
fi
fi
fi
fi
fi
fi
fi
Critério do conteúdo e obrigações deles decorrentes
Critério diferente do anterior, os contratos não deixam de ser sempre bilaterais quanto à sua
estrutura

- Contratos bilaterais
Geram obrigações para ambas as partes.
• Perfeitos/sinalagmáticos
Reciprocidade entre as obrigações/prestações das partes.
A prestação de uma parte é realizada em virtude e por causa da prestação da
outra (do ut des).
Negócios onerosos.
contrato de compra e venda

• Imperfeitos
Inicialmente, o contrato estabelece obrigações para apenas uma das partes.
Contudo, podem surgir, posteriormente, dependendo da execução do contrato,
obrigações para a outra parte.
mandato gratuito (arts. 1158.º, n.º1 e 1167º, al. d) )

- Contratos unilaterais
Criam obrigações para apenas uma das partes contraentes.
doação, mútuo, ainda que oneroso

As prestações/obrigações podem ser de:


- Execução imediata
Esgotam-se num ato de cumprimento.

- Execução duradoura
• Continuada
Contêm uma obrigação duradoura.
arrendamento, contrato de trabalho

• Reiterada
• Periódica
Contêm uma obrigação repetitiva, a realizar durante certo tempo.
contrato sobre o fornecimento repetido e regular de certa quantia de mercadorias

• Não periódica

Critério das atribuições patrimoniais efetuadas


- Negócios gratuitos
Existe um sacrifício patrimonial para apenas uma das partes contraentes.
A atribuição patrimonial é unilateral, existindo uma vantagem patrimonial do lado de quem
recebe.

- Negócios onerosos
Cada uma das partes realiza uma atribuição patrimonial à outra, como contrapartida ou
contraprestação.
Não é necessário um equilíbrio objetivo entre as atribuições feitas.
• comutativos
As atribuições patrimoniais estão de nidas/determinadas à partida.

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fi
• aleatórios
As partes sujeitam-se a uma álea, à possibilidade de se concretizar um risco de
ganhar ou perder, dependendo as atribuições do devir das circunstâncias.
contrato de seguro

• parciários
Participação no risco de certo empreendimento no que diz respeito aos lucros
esperados, como contraprestação a uma entrega realizada para o efeito.
parceria pecuária, participação nos lucros (art. 405º e 1146º)

- Negócios entre vivos


Destinam-se a produzir os seus efeitos em vida das partes.

- Negócios mortis causa


Destinam-se a produzir os seus efeitos depois da morte das partes ou de uma delas.

Critério da forma
- Negócios solenes (ou formais)
Exceção ao princípio da liberdade de forma.

- Negócios não solenes (ou não formais)


Seguem o princípio da liberdade de forma (art. 219º)

Critério da constituição
- Negócios consensuais
O contrato ca perfeito com o simples acordo das partes.

- Negócios reais (quod constitutionem)


É preciso, para além do acordo, um ato material.
Este ato material nem sempre implica a transferência de propriedade.
comodato (art. 1129º), depósito (art. 1185º), mútuo (art. 1142º) e doação de coisas móveis quando não é
feita por escrito (art. 947º)

Critério da natureza da relação jurídica ou efeitos


- Negócios obrigacionais
Vale, quanto à sua celebração e conteúdo, o princípio da liberdade contratual.

- Negócios reais (quod e ectum)


Por virtude do numerus clausus, o princípio da liberdade contratual está afastado quanto à
xação do conteúdo do contrato.

- Negócios familiares
O princípio da liberdade contratual está excluído, ganhando, todavia, alguma relevância nos
negócios familiares patrimoniais conforme a sua natureza obrigacional ou real.

- Negócios sucessórios
Não há liberdade contratual. A autonomia privada é realizada por meio de um negócio jurídico
unilateral: o testamento.

- Negócios patrimoniais

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fi
fi
ff
Referentes a disposições e atribuições de bens.

- Negócios pessoais
Dirigidos a relações de caráter pessoal ou determinantes do nosso estado civil.

Critério dos riscos/importância do ato para o património


- Negócios de disposição
Alteram a substância dos bens ou do património administrado, afetando o capital administrado e
a raiz dos direitos patrimoniais.

- Atos de mera administração


Correspondem a uma gestão patrimonial limitada, comedida e prudente, destinada à
conservação e fruti cação normal dos bens, mantendo intacta a sua raiz.

Elementos da vontade
• Vontade de ação
• Vontade de declaração
• Vontade negocial

II. A formação do negócio jurídico


O primeiro passo para um negócio jurídico consiste numa declaração de vontade, elemento
essencial e condição sine qua non de um negócio jurídico.

Principio da relatividade contratual


Art. 406, nº2
Os contratos produzem efeitos inter partes: os efeitos dos contratos não se produzem sobre
terceiros.

II.I. Modalidades da declaração negocial


Princípio da liberdade declarativa
Em sintonia com os princípios da autonomia privada e da liberdade contratual, o Código Civil
consagra o princípio da liberdade declarativa. Contudo, há casos em que exige que as declarações
negociais sejam feitas de maneira expressa, afastando a modalidade de declaração tácita e o
silêncio (arts. 589.º e 590.º, n.º 2, 595.º, n.º 2).
O Código Civil parte do princípio da liberdade declarativa e distingue três modalidades em que a
vontade pode ser revelada (parte objetiva da declaração de vontade).

Declaração expressa
Art. 217.º.
Declaração feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio direto de manifestação da vontade
(gestos ou sinais).
Manifestação direta da vontade, destinada unicamente ou principalmente à exteriorização da
vontade negocial.

Declaração tácita
Art. 217.º.
Deduz-se de factos que, com toda a probabilidade, revelam a vontade do declarante.
Manifestação indireta da vontade, baseada num comportamento que não visa diretamente a
exteriorização da vontade que se considera declarada por essa forma.

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fi
Silêncio
Art. 218.º.
Absoluta omissão da conduta.
Ausência de manifestação da vontade.
O silêncio, por via de regra, não tem valor declarativo (do silêncio não se pode retirar a aceitação
ou a recusa).
Apenas quando a lei, uso ou convenção prévia das partes lho atribuir é que o silêncio tem valor
declarativo.

Há situações em que o silêncio tem valor declarativo (arts. 224.º, n.º 2 e 3, 334.º, 923.º, n.º 2, e
1163.º).
O silêncio é uma maneira de reação; não é, à partida, possível tomar iniciativa por meio de
silêncio.

Ex.: Uma encomenda não solicitada, acompanhada por uma carta que contém a informação de
que, caso o recetor não se manifestar num determinado prazo, será considerado que aceita comprar
o bem.
Inválido, pois não existiu convenção entre as partes, não houve consenso, do silêncio não se
pode retirar a aceitação

II.II. Forma da declaração negocial


Princípio da liberdade de forma
Art. 219.º.
Em sintonia com o princípio da liberdade contratual (art. 217.º), o Código Civil consagra o princípio
da liberdade de forma (art. 219.º)
Em princípio, as declarações são feitas “livremente”, tanto quanto à modalidade como quanto à
forma.
Os declarantes, por via de regra, não são obrigados a adotar uma forma; contudo, a lei não exclui
a possibilidade de, dentro do princípio da liberdade de forma, escolherem voluntariamente uma
forma qualquer - forma convencional.

Adoção de forma voluntária


As razões que podem levar as partes à adoção de uma forma voluntária são:
• Clareza quanto ao momento de conclusão do negócio e seu conteúdo
• Segurança e facilitação da prova
• Prevenção de litígios
• Melhor ponderação das decisões a tomar (proteção das partes)

Âmbito da forma voluntária


Art. 222.º.
Forma escrita que não é imposta nem por lei, nem por convenção das partes.
A vontade do(s) declarante(s) determina a forma adotada.
O art. 222.º, n.º1, de ne que a adoção, livre, da forma escrita não afeta ou prejudica eventuais
estipulações acessórias verbais, desde que correspondam à vontade das partes (e a lei não as
sujeite à forma escrita).
Não é possível provar as convenções verbais através de prova testemunhal (art. 394.º).

Âmbito da forma convencional


Art. 223.º.

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fi
A lei não estipula uma forma especí ca; contudo, as partes convencionam uma forma especí ca
(não apenas a forma escrita) para determinadas declarações futuras.
A vontade do(s) declarante(s) determina a forma adotada.
Segundo H. Hoerster, as partes têm liberdade para afastar a convenção quanto à forma,
vinculando-se a outra. Esse abandono não requer, sequer, a observância de uma forma especial;
pode até ser feito pela realização, sem sujeição à forma voluntariamente exigida, do negócio.
O art. 223.º prevê dois tipos de efeitos diferentes, em função da altura em que a estipulação (da
forma voluntária) foi feita, provocados pela forma escolhida:

Art. 223.º, n.º 1


Presunção legal iuris tantum (art. 350.º).
Presume-se que as partes, tendo primeiro convencionado a forma, apenas se querem vincular, no
futuro, por meio dela (presunção de essencialidade).
A convenção da forma da declaração é anterior ou contemporânea da celebração do negócio.
Sem a observância da forma convencionada, não haverá vinculação entre as partes, a não ser
que o contrário seja provado.

Art. 223.º, n.º 2


Presunção legal iuris tantum (art. 350.º).
A lei presume que, ao convencionarem uma forma especí ca estando já o contrato em vigor, as
partes não visam substituir o contrato, mas consolidá-lo.
A convenção da forma da declaração é posterior à celebração do negócio.
As partes, mediante a forma convencionada, pretendem facilitar a prova (forma ad probationem),
depois de o negócio já estar validamente celebrado.
A consolidação do negócio pode prender-se com tornar as suas cláusulas mais percetíveis.

Inobservância da forma convencional


Em caso de inobservância da forma convencional, a lei presume que as partes não se
querem vincular.

Âmbito da forma legal


Art. 221.º.
Exceção ao princípio da liberdade de forma.
A lei determina a forma adotada: a declaração deve constar de documento escrito.
A exigência da forma legal destina-se a servir a autonomia privada, baseando-se em razões de
ordem pública que o legislador considera serem superiores aos interesses das partes.
As partes podem fazer estipulações acessórias fora do documento legalmente exigido, sendo
estas situações reguladas de 2 maneiras distintas:

Art. 221.º, n.º 1


As estipulações acessórias anteriores ou contemporâneas do documento legalmente exigido
para a declaração negocial que não respeitam a forma especí ca prescrita para esta são, em
princípio, nulas (presume-se que as partes não quiseram incluir as cláusulas verbais acessórias no
documento), exceto quando a razão determinante da forma não se lhes aplique (o que não implique
uma ampliação ou redução do objeto de contrato, à partida, não implica a forma especí ca) e se prove
corresponderem à vontade do declarante (art. 394.º - prova testemunhal).
Cláusulas relativas ao lugar ou cumprimento da obrigação, forma e quitação do cumprimento não são abrangidas pela
razão de exigência da forma

Art. 221.º, n.º 2

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Quanto às estipulações posteriores ao documento, são, em princípio, válidas, só estando
sujeitas à forma legal prescrita para a declaração as que, por razões de exigência especial, lhes
forem aplicáveis.

Inobservância da forma legal


Art. 220.º.
A observância da forma legal, quando exigida, é um pressuposto de validade do negócio
(formalidade ad substantiam).
A inobservância da forma legalmente exigida determina a nulidade da declaração.

Modalidades dos documentos escritos


Art. 363.º.
Os documentos escritos podem ser autênticos (escritura pública - solenidade acrescida) ou
particulares (documentos escritos que são apenas assinados pelas partes).

Documentos autênticos
Documentos exarados pelas autoridades públicas, nos limites da sua competência, pelo notário
ou outro o cial público provido de fé pública.
Quando a lei exige um documento autêntico, este pode ser substituído por outro de valor
probatório superior, como a escritura pública.
O notário deve explicar o teor do contrato e aferir a capacidade das partes de o celebrar.

Documentos particulares
Os documentos que não são autênticos são considerados particulares.
Os documentos particulares são havidos por autenticados quando con rmados pelas partes,
perante um notário.

Art. 377.º
Os documentos particulares autenticados têm a mesma força probatória dos documentos
autênticos, mas não os substituem em casos em que a lei os exija.

Art. 26.º, n.º 1, DL 7/2004


O documento eletrónico tem a força probatória de um documento particular (assinado) quando
estiver assinado com uma assinatura eletrónica quali cada, com um certi cado em vigor.

Publicidade
Certos negócios estão, depois de celebrados por meio de ato formal ou não, sujeitos a
publicidade, nomeadamente a registo.
A publicidade ou a sua falta em nada afetam o negócio jurídico, pois este já está concluído. A
falta de publicidade apenas determina que o negócio não é oponível a terceiros, embora produzindo
todos os seus efeitos entre as partes.
Contudo, existem situações nas quais a falta de publicidade determina que o negócio jurídico
apenas produza efeitos latentes (uma vez que não pode ser invocado) ou nem sequer produza
efeitos, devido à ausência de um requisito fundamental.

II.IV. Perfeição da declaração negocial


Para a declaração negocial, é relevante não só o seu conteúdo e a forma, mas também o
momento da sua e cácia (perfeição), precedido pelo momento da emissão.
Para que os efeitos jurídicos de uma declaração negocial se produzam é preciso que esta, depois
de ser produzida, adquira e cácia (“tornar-se e caz”).

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O momento da e cácia tem relevância sob três aspetos:
• Esclarece se foi feita tempestivamente ou não
• Separa as esferas de poder do declarante e do declaratário (declarações recetícios),
determinando quem arca com o risco de uma transmissão errada da declaração
• Determina o momento a partir do qual o declarante ca vinculado à sua proposta (importante
para conclusão do contrato)

Ao aspeto estrutural da declaração (conteúdo e forma) soma-se também o aspeto temporal: o


desenvolvimento da declaração no tempo.

Desenvolvimento da declaração negocial no tempo


Uma declaração negocial pode apresentar, sequencialmente, 4 fases:

Situam-se na esfera de controlo do declarante:


• Exteriorização
- A declaração é manifestada, o declarante exprime a sua vontade (escrever a carta).

• Expedição
- Momento de envio da declaração (enviar a carta)
A exteriorização e a expedição conduzem ou coincidem com a emissão da declaração: momento
em que a declaração sai da esfera de poder do declarante com a vontade deste, ganhando
existência.

Situam-se na esfera de controlo do declaratário:


• Receção
- Chegada ao poder do declaratário, em termos que normalmente lhe permitam tomar
conhecimento do seu conteúdo (carta na caixa de correio)

• Conhecimento
- Tomada de conhecimento da declaração (abre e lê a carta)
Pode haver sobreposição cronológica dos vários momentos.
É necessário distinguir entre declarações recetícias e declarações não recetícias, que não se
dirigem a um destinatário, de maneira que nelas não se podem veri car os momentos da receção e
do conhecimento por parte de um declaratário.
O Código Civil parte da premissa lógica de que a declaração negocial ganha existência jurídica
no momento da sua emissão.
Tendo sido emitida e ganhado existência, a declaração torna-se e caz nos termos do art. 224.º.

Art. 224.º, n.º 1, 1.ª parte


Declarações negociais recetícias: têm um destinatário concreto.
Tornam-se e cazes no momento da receção ou no momento do conhecimento (aquele que
ocorrer primeiro).
Por via de regra, as declarações feitas por escrito tornam-se e cazes com a receção; as
declarações verbais dirigidas a um presente tornam-se e cazes com a tomada de conhecimento.
Quando há prova do conhecimento efetivo, não é necessário provar a receção para efeitos da
perfeição da declaração negocial. No caso da veri cação da chegada ao poder, não se exige
conhecimento efetivo por parte do destinatário.

Caso o destinatário não tenha condições para conhecer efetivamente o conteúdo da


declaração negocial, a declaração é considerada ine caz - art. 224.º, n.º 3
Caso só por culpa do destinatário não tenha sido recebida a declaração, a declaração é
considerada e caz - art. 224.º, n.º 2

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Art. 224.º, n.º 1, 2.ª parte
Declarações negociais não recetícias: não têm um destinatário concreto.
Tornam-se e cazes no momento da exteriorização ou expedição.
Tornam-se e cazes logo que a vontade do declarante se manifesta na forma adequada.
Vale igualmente para os casos previstos no art. 225.º.
Manifestação na forma adequada
No caso do testamento, é no momento da exteriorização, através da forma legal, que
começa a produzir efeitos.
No caso da promessa pública, é no momento da expedição que se torna e caz.

Art. 224.º, n.º 2


Uma declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida é
considerada e caz.

Art. 224.º, n.º 3


Uma declaração recebida pelo destinatário em condições de, sem culpa sua, não poder tomar
conhecimento, é considerada ine caz.
Chegada ao poder
Chegada à proximidade do destinatário (ou de alguém com competência de recebimento),
em condições o que, dentro de aquilo que é a normalidade do tráfego jurídico, lhe permitem a
tomada de conhecimento.

Art. 225.º
Manifestação da forma adequada: publicação num dos jornais da residência do declarante,
quando se dirija a pessoa desconhecida ou cujo paradeiro seja pelo declarante ignorado.

Art. 226.º
Norma geral.
A morte ou incapacidade do declarante, posterior à emissão da declaração, não prejudica a sua
e cácia.
Se o declarante, enquanto o destinatário não receber a declaração ou dela não tiver
conhecimento, perder a disposição do direito a que ela se refere, a declaração é ine caz.

II.III. A conclusão do contrato


Para a conclusão do contrato, é necessária uma proposta e caz e uma aceitação e caz, que
expressam o consenso entre as partes.

Proposta
A proposta exprime uma vontade rme e precisa de contratar.

A proposta é rme porque manifesta uma vontade de vinculação jurídica de acordo com o tipo
negocial concreto.
A proposta distingue-se do convite a contratar. Pelo convite a contratar, o agente não visa
vincular-se juridicamente, mas suscitar interesse nos demais.
“Vendo a minha bicicleta pelo melhor preço” é apenas um convite a contratar.

A proposta é precisa porque basta um simples “sim” para que o contrato que concluído.

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A proposta é su cientemente completa e clara, contendo todas as cláusulas necessárias ao
contrato, sendo passível de ser aceite apenas com um “sim”. Identi ca claramente o objeto e os
termos do contrato.

A proposta tornar-se e caz (art. 224.º) signi ca que, durante um certo período de tempo, vincula
o proponente aos seus termos, sendo irrevogável. (art. 230.º)

Irrevogabilidade da proposta
Art. 230.º.
➡ Em princípio, todas as propostas são irrevogáveis, salvo exceções.
➡ A proposta, todavia, nunca pode ser revogada depois de ser aceite, tendo em conta
que a aceitação e caz leva à conclusão do contrato.
➡ Na hipótese de retratação, caso a proposta e a retratação sejam efetivamente
conhecidas pelo destinatário em simultâneo ou a retratação antes da proposta, esta ca
sem efeito (não há expectativas frustradas).
➡ Na hipótese de proposta dirigida ao público, a revogação deve ser feita na forma de
oferta ou em forma equivalente.

Duração da proposta
Art. 228.º.
➡ Se o prazo foi xado pelo proponente ou convencionado pelas partes, a proposta
mantém-se até ao prazo ndar.
➡ Em caso de pedido de resposta imediata, o aceitante deve utilizar um meio de
expedição tão ou mais célere do que aquele usado para a proposta.
➡ Se não foi xado prazo e a proposta foi enviada a pessoa ausente ou, por escrito, a
pessoa presente, a proposta mantém-se até cinco dias após o prazo da alínea anterior
(b) ).
➡ Se não foi xado prazo e a proposta foi enviada a pessoa presente, verbalmente,
supõe-se que a proposta apenas pode ser aceite imediatamente (prof. Hoerster)

A aceitação tem de tornar-se e caz dentro do período de tempo em que a proposta está em
vigor, para que o contrato seja concluído.

Suponhamos um caso no qual o proponente enviou uma proposta de contrato de compra e venda por carta ao
destinatário, no dia Y, sendo esta entregue dois dias depois.
Seja o dia X o dia da chegada ao poder do destinatário da proposta.

X X+1 X+2 X+3 X+4 X+5 X+6 X+7 X+8

A proposta é e caz até ao dia X+8.

Morte ou incapacidade do proponente ou destinatário


A r t . 231.º, n.º 1
Norma especial (art. 226.º, n.º1).
Na maior parte das vezes, a morte do proponente obsta à conclusão do contrato, visto que a
aceitação não poderá tornar-se e caz na pessoa de um morto. O morto não pode tomar
conhecimento da aceitação nem tampouco pode esta chegar ao seu poder (declarações recetícias -
art. 224.º, n.º 1, 1ª parte).

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Nos termos do art. 234.º, a morte do proponente não obsta à conclusão do contrato.
Nesses casos, basta a conduta da outra parte demonstrar a intenção de aceitar a proposta para que
o contrato que concluído.

Art. 231.º, n.º 2


A proposta já é e caz, a aceitação já foi expedida, mas o aceitante morre ou torna-se
incapaz. A proposta torna-se ine caz (cai no vazio), uma vez que o proponente visava vincular-se
diante do aceitante e não de outra pessoa.

Aceitação
Tem de ser tempestiva: tem de produzir os seus efeitos dentro de um certo período de tempo.
A aceitação, a partir do momento em que se torna e caz, não pode ser revogada, uma vez que
o contrato ca concluído com a aceitação e caz.
A partir do momento da aceitação e caz, o contrato produz os seus efeitos (art. 408.º)

Receção tardia
Art. 229.º.
Em caso de receção tardia da aceitação, a norma geral (art. 229.º, n.º 2, 2.ª parte) de ne que
a formação do contrato depende de nova proposta e nova aceitação.
O proponente pode considerar a aceitação e caz, desde que esta tenha sido expedida em
tempo oportuno.
Caso o proponente não considere a aceitação e caz, deve avisar o aceitante de que o
contrato não se concluiu, sob pena de responder pelos prejuízos causados.

Aceitação com modi cações


Art. 233.º.
➡ A aceitação com modi cações equivale à rejeição da proposta.
➡ Caso a modi cação seja su cientemente precisa, equivale a nova proposta.
(contraproposta).

Dispensa da declaração da aceitação


Art. 234.º.
Geralmente, a declaração da aceitação é recetícia.
Prescinde-se do caráter recetício da declaração. A aceitação não pode ser revogada, porque
logo com a adoção da conduta ca o contrato concluído.

Revogação da aceitação
Art. 235.º.
➡ Caso o destinatário rejeite a proposta, mas depois a aceite, a aceitação prevalece,
desde que chegue ao poder ou seja conhecida pelo proponente ao mesmo tempo ou
antes da rejeição
➡ A aceitação pode ser revogada por declaração, desde que a revogação chegue ao
poder ou seja dele conhecida ao mesmo tempo ou antes da aceitação

Morte ou incapacidade do aceitante


Art. 231.º, n,º 2.
Norma especial em relação ao art. 226.º, norma geral.
Não modi ca o caráter da aceitação; aquilo que estipula é a ine cácia da proposta.
O contrato não ca concluído. A norma visa proteger o proponente, que, no momento em
que emitiu a sua proposta, contava vincular-se perante um destinatário e não perante os seus
herdeiros.

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Dissenso
Art. 232.º.
O dissenso pode ser manifesto ou latente.
No dissenso manifesto, as partes têm consciência de que discordam.
No dissenso latente/oculto, as partes acreditam que concordam, erroneamente.

Efeitos da conclusão do contrato


Efeitos reais
O art. 408.º, n.º 1, estabelece o princípio da consensualidade: em regra, a constituição ou
transferência de direitos reais (sobre coisa determinada) dá-se por mero efeito do contrato, isto é,
pelo consenso das partes.
O art. 796.º, n.º 1, estabelece que, nos contratos que constituam ou trans ram um direito real
sobre uma coisa, em regra, é no momento da conclusão do contrato que o risco de perecimento ou
deterioração da coisa passa do alienante para o adquirente.

No caso do contrato de compra e venda, uma vez celebrado, produz um efeito real (art. 879.º, al.
a) ) e efeitos obrigacionais (art. 879.º, als. b) e c) ).

- A transmissão da propriedade da coisa ou da titularidade do direito,


• produz-se no momento da conclusão do contrato
- A obrigação de entregar a coisa
• comportamento subsequente à conclusão do contrato, destinado ao seu cumprimento
- A obrigação de pagar o preço acordado
• comportamento subsequente à conclusão do contrato, destinado ao seu cumprimento
A necessidade de se conhecer o momento exato da conclusão do contrato está intimamente
ligada com a importância dos efeitos reais e obrigacionais do mesmo.

Cláusulas contratuais gerais


Decreto-Lei n.º 446/85.
Clausulado pré-elaborado por uma das partes, destinado a ser aceite, sem mais, pela outra.

É natural que a parte que elabora o clausulado o faça tendo em vista os seus interesses,
eventualmente com prejuízos para a outra parte.
Existe o risco de desconhecimento das cláusulas: assim, a lei determina deveres de
comunicação e informação à parte que elabora o contrato. Existe ainda o risco de cláusulas
abusivas, que sejam contrárias à boa fé.
A lei visa corrigir as assimetrias entre as duas partes.

O DL estipula que as cláusulas contratuais gerais inseridas em propostas cam incluídas nos
contratos pela aceitação, cumpridas determinadas disposições legais:
• As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes - dever de
informação
• As cláusulas especi camente acordadas prevalecem sobre quaisquer cláusulas contratuais
gerais
• As cláusulas não comunicadas cam excluídas dos contratos singulares
• São proibidas todas as cláusulas gerais contrárias à boa fé.

Culpa in contrahendo
Art. 227.º.

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O início de negociações com vista à conclusão de um contrato estabelece uma relação jurídica
pré-contratual. Essa relação jurídica pré-contratual gera deveres de lealdade, obrigações de
informar, deveres no sentido de observar um comportamento segundo as regras da boa fé e, até,
relações especiais de con ança.
O art. 227.º. estipula que, tanto nos preliminares (convites a contratar, formulações das
propostas, etc.), como na formação do contrato, as partes devem proceder segundo as regras da
boa fé, sob pena de responder pelos danos culposamente causados à outra parte”. A lei estabelece,
assim, uma obrigação de indemnizar por culpa in contrahendo.

O artigo 227.º visa proteger o processo de formação do contrato em todas as suas fases
(preliminares e formação). A culpa in contrahendo pode surgir nos casos em que:
• o negócio não chega a ser celebrado
• o negócio é celebrado, mas sofre de uma invalidade
• o negócio é celebrado, mas, devido a uma conduta censurável e violadora da boa fé de uma
parte, é desvantajoso para a outra

Os pressupostos da aplicação do artigo 227.º. são a existência de culpa, danos e o


comportamento violador da boa fé.
Enquanto o contrato não é celebrado, as partes têm a liberdade de romper as negociações,
exceto quando alcançarem um desenvolvimento tal que uma parte se sente autorizada a con ar na
realização do contrato e realiza despesas ou abstém-se de outros negócios em favor da celebração
desse contrato.

O instituto da culpa in contrahendo abstrai da existência de um contrato, sendo considerada


uma obrigação extracontratual legal (ou quase-contratual). Prescreve nos termos do artigo 498.º.

Contratação eletrónica
Decreto-Lei n.º 24/2014.
Regula a contratação à distância, da qual a contratação eletrónica é um subsetor.
Contratação feita por via de uma plataforma digital. A sua declaração negocial permite-se que
seja feita por via dessa plataforma.

Decreto-Lei n.º 7/2004 - Lei de Comércio Eletrónico.


Regula o comércio online.
Art. 32.º
1 - A oferta de produtos ou serviços em linha representa uma proposta contratual quando contiver todos os
elementos necessários para que o contrato que concluído com a simples aceitação do destinatário,
representando, caso contrário, um convite a contratar.

Em regra, aquilo que temos na plataforma digital é já uma proposta. O cliente, ao efetuar a
encomenda, está já a aceitar.
Num terceiro momento, a entidade tem de acusar a receção da encomenda.
Num quarto momento, o consumidor tem ainda de con rmar a encomenda que fez.
Este esquema pode ser visto como um sistema de “duplo clique”, segundo o qual só existiria
conclusão do contrato no momento em que o aceitante reiterasse a sua aceitação (4º momento).

Contudo, o Prof. Hoerster defende que o contrato ca celebrado com a encomenda (aceitação).
O terceiro momento é apenas uma obrigação legal e o quarto momento apenas o dar conhecimento
ao proponente de que não se vai utilizar a prerrogativa, concedida por lei, de revogar a aceitação
feita, tornando a encomenda de nitiva.
Assim, o risco da contratação eletrónica ca do lado do proponente, garantindo maior proteção
ao consumidor.

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II.IV. Representação
Arts. 258.º - 269.º
Um indivíduo pode conferir poder a outra pessoa para formular e manifestar declarações
negociais em seu nome.
Os efeitos dos negócios concluídos pelo representante produzem-se, direta e imediatamente, na
esfera jurídica do representado.
Um indivíduo (o representante) emite a declaração negocial em nome de outrem (o representado),
e não em pro nomine sua, dentro dos poderes que lhe competem.

A representação é um meio para emitir uma declaração negocial.


A representação voluntária resulta de um negócio jurídico.
A representação legal resulta da lei (menores de idade).

Distinções do representante
Núncio
O representante formula uma declaração negocial, tendo sempre, por mais pequena que seja, uma margem
decisória, dependendo dos poderes que lhe foram conferidos. Tem, pelo menos, a decisão de formular ou não
a declaração negocial.
O núncio apenas transmite uma declaração negocial que já foi formulada.
Mediador
O mediador não formula declarações negociais, visa apenas aproximar os interesses das partes.
Mandatário sem poderes de representação
O mandatário pratica o ato jurídico por conta do mandante, mas não em seu nome. Os efeitos jurídicos
produzem-se na esfera jurídica do mandatário que, depois, os transmitirá para a esfera do mandante (art.
1180.º).
O mandato é um contrato e a procuração é um negócio jurídico unilateral.
Contrato a favor de terceiro
No contrato a favor de terceiro, uma das partes assume a obrigação de efetuar uma determinada prestação
a um terceiro (art. 443.º).
Contrato para pessoa a nomear
O contrato para pessoa a nomear permite a uma das partes ser substituída por outra pessoa, a nomear,
depois de celebrado o contrato (art. 452.º).

Efeitos da representação
Art. 258.º.
Os pressupostos para a produção de efeitos jurídicos em virtude de representação são os
seguintes:
- Um negócio jurídico
- Realizado pelo representante em nome do representado
- Nos limites dos poderes que lhe competem
Satisfeitos estes requisitos, o negócio jurídico produz plenamente os seus efeitos na esfera do
representado.

Falta ou vícios da vontade e estados subjetivos relevantes


Art. 259.º.
Como o representante emite uma declaração negocial própria, é na sua pessoa que se deve
averiguar, para efeitos de nulidade ou anulabilidade da declaração, a falta ou vício da vontade (dolo
ou culpa), exceto nos elementos em que tenha sido decisiva a vontade do representado.
A invocação da nulidade ou anulabilidade cabe sempre ao representado, porque é na sua pessoa
que se produzem os efeitos jurídicos do negócio.

Ao representado de má fé não aproveita a boa fé do representante.


Um indivíduo de má fé não pode recorrer a um representante para celebrar um negócio contrário
à boa fé.

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Justi cação dos poderes do representante
Art. 260.º
A pessoa a quem é dirigida a declaração negocial emitida pelo representante pode requerer que
este faça prova dos seus poderes, sob pena de a declaração não poder produzir os seus efeitos.
O representante nunca pode estar numa posição jurídica mais favorável do que o representado
(art. 259.º, n.º 2).

Negócio consigo mesmo


Art. 261.º
O negócio consigo mesmo pode consistir numa celebração em nome próprio ou em
representação de terceiro (dupla representação) (C representa tanto A como B e celebra um contrato
entre A e B).
Em regra, o negócio consigo mesmo é anulável.
As exceções são duas: a situação em que o representado tenha especi camente consentido na
celebração (consigo mesmo) ou em que o negócio excluía, por sua natureza, con itos de interesse
(em que quase tudo está predeterminado: objeto, preço, prazo, etc. - bilhete para um espetáculo,
contabilista de uma empresa processa o seu salário)
A lei pretende acautelar o risco de con itos de interesses, podendo o representante preterir os
interesses do representado, em prol dos seus mesmos interesses (negócio celebrado pelo
representante em nome próprio).

Representação legal
Os incapazes carecem de capacidade de exercício para nomear um representante voluntário (art.
123.º), a não ser que haja uma exceção à sua incapacidade (art. 127.º).
Contudo, caso não fosse possível suprir a sua incapacidade, os incapazes cariam excluídos do
trá co jurídico negocial, daí a gura do representante legal, que permite integrar estes no trá co
jurídico negocial.

Representação voluntária
A representação voluntária assenta numa procuração.

Procuração
Art. 262.º
A procuração é o ato de, voluntariamente, atribuir poderes representativos a outrem.
É um negócio jurídico unilateral.
A procuração é independente da relação jurídica de base (procuração como negócio abstrato).
A procuração deve revestir da mesma forma exigida para o negócio que o procurador deva
realizar.

Capacidade do procurador
Art. 263.º
Ao procurador não se exige mais do que capacidade fáctica: capacidade de entender e querer de
acordo com o negócio jurídico.

Substituição do procurador
Art. 264.º
O procurador só pode fazer-se substituir por outrem se o representado o permitir ou se a
faculdade de substituição resultar do conteúdo da procuração ou da relação jurídica que a
determina.
O procurador só é responsável pelo substituto caso tenha agido com culpa na sua escolha ou
nas instruções dadas.

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O procurador pode servir-se de auxiliares na execução da procuração, se outra coisa não resultar
do negócio ou da natureza do ato a realizar.

Extinção da procuração
Art. 265.º
A procuração extingue-se por renúncia do procurador ou quando a relação jurídica de base
cessa.
A procuração é livremente revogável pelo representado, salvo convenção em contrário ou
renúncia ao direito de revogação.
Se a procuração tiver ocorrido também no interesse do procurador ou de terceiro, não pode ser
revogada sem acordo do interessado, salvo justa causa.

Proteção de terceiros
Art. 266.º
A revogação ou modi cação da procuração devem ser levadas ao conhecimento de terceiros sob
meios idóneos, sob pena de não lhes serem oponíveis, salvo quando tinham conhecimento.
As restantes causas extintivas da procuração não podem ser opostas a terceiros que, sem culpa,
as tenham ignorado.

Representação sem poderes


Art. 268.º
Há duas modalidades: falta e excesso.
Na situação de excesso, existem poderes de representação, mas este excede-os.
Na situação de falta, não existem poderes de representação.
Se a contraparte desconhecia a falta de poderes de representação no momento em que celebrou
o negócio, pode livremente revogar o negócio até o negócio ser rati cado.
Se a contraparte conhecia a falta de poderes de representação no momento em que celebrou o
negócio, deve xar um prazo para a rati cação, prazo o qual, uma vez cumprido sem ter feita a
rati cação, determina a negação da rati cação

Abuso de representação
Art. 269.º
O representante está genericamente capacitado para celebrar um negócio daquele tipo, contudo,
desrespeita conscientemente a nalidade tida em vista pelo representado com a atribuição da
procuração.
Para que o abuso de representação conduza, nos termos do art. 268.º, n.º 1, à ine cácia perante
o representado do negócio celebrado pelo representante, é necessário que a outra parte conheça
ou deva conhecer o abuso.
Caso seja ine caz para o representado, este poderá sempre rati car o negócio.

III. Os negócios jurídicos com e cácia limitada


Negócios jurídicos que, embora válidos, não produzem plenamente os seus efeitos.

III.I. Condição
Art. 270.º
Acontecimento futuro e incerto ao qual as partes subordinam a produção ou resolução dos
efeitos jurídicos de um negócio.

A condição pode ser suspensiva ou resolutiva:


• suspensiva: acontecimento ao qual as partes subordinam o início da produção dos efeitos
jurídicos do negócio

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• resolutiva: acontecimento ao qual as partes subordinam a resolução dos efeitos jurídicos do
negócio

Ex.: na reserva de propriedade, o alienante apenas transmite a propriedade da coisa aquando do


cumprimento total ou parcial da outra parte: é essa a condição para a transferência de propriedade.
Condição distingue-se de pressupostos/condições legais, impostas por lei.

Condições ilícitas ou impossíveis


Art. 271.º, n.º 1
Uma condição contrária à lei, à ordem pública ou aos bons costumes determina a nulidade do
negócio jurídico.
Não são permitidas condições demasiado limitativas da liberdade pessoal (p. ex., arts. 2232.º e
2233.º).
Nota: podemos ter como condições lícitas comportamentos ilícitos (“dou-te caso não voltes a matar”,
matar como condição resolutiva).

Art. 271.º, n.º 2


Uma condição impossível não é incerta, logo, trata-se de uma condição imprópria.
Um negócio jurídico que contenha uma condição suspensiva que seja física ou legalmente
impossível (vender uma coisa ao seu proprietário) é considerado nulo.
Num negócio jurídico que contenha uma condição resolutiva que seja física ou legalmente
impossível, considera-se a condição como não escrita.

Pendência da condição
Arts. 272.º a 274.º
Consagra o princípio da boa fé aplicado às partes que se subordinam a certas condições.

Veri cação e não veri cação da condição


Art. 275.º
Ficção legal.
A certeza de que uma cláusula não se vai veri car equivale à sua não veri cação (ganhar a uma
equipa que deixou de existir). Disto resulta a consolidação do negócio
Caso a parte que ca prejudicada
No caso de não veri cação da condição suspensiva, não se produzem os efeitos de nitivos e
cessam os efeitos provisórios.
No caso de não veri cação da condição resolutiva, o negócio jurídico é consolidado e os seus
efeitos passam a ser produzidos de forma estável.

Retroatividade da condição
Art. 276.º
Os efeitos da veri cação da condição são, em princípio, retroativos, quer a condição seja
suspensiva ou resolutiva.
No caso dos contratos duradouros (arrendamento), exclui-se o caráter retroativo da veri cação
da condição.

III.II. Termo
Acontecimento futuro e certo ao qual as partes subordinam o início ou cessação dos efeitos do
negócio jurídico.

O termo pode ser:


- determinado / certus an certus quando (datas de nidas)
- indeterminado / certus an incertus quando (irá ocorrer, mas não se sabe quando)

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- inicial/suspensivo (marca o início da produção dos efeitos do negócio jurídico)
- nal/extintivo (marca o m da produção dos efeitos do negócio jurídico)

Encargo
Também é cláusula acessória e acidental e resulta da vontade das partes.
Impõe uma obrigação a uma das partes, mas não in uencia a produção dos efeitos jurídicos do
negócio.

III.III. Os negócios jurídicos com efeitos dependentes de rati cação


Apenas uma das partes do negócio está vinculada juridicamente, uma vez que a outra parte não
detinha poderes para estabelecer um vínculo correspondente.
Se a parte em relação à qual o negócio não produz efeitos quiser chamá-los a si, pode fazê-lo
por meio da rati cação.
Existem 3 casos de negócios com efeitos dependentes de rati cação:
• Negócios celebrados pelo insolvente
• Representação sem poderes
• Contrato para pessoa a nomear

Rati cação
Negócio jurídico unilateral que visa conferir e cácia plena a um outro negócio que dela carece.
Em princípio, a rati cação deve observar a mesma forma do negócio a rati car.

Insolvência
Art. 1.º, CIRE.
Insolvente
Art. 3.º, CIRE.
É considerado insolvente aquele que não consegue fazer face às suas obrigações vencidas.

Efeitos da insolvência
Art. 81.º, CIRE.
O insolvente é privado dos poderes de administração e disposição dos bens integrantes da
massa insolvente.
É o administrador de insolvência que passa a administrar a massa insolvente.

O negócio praticado pelo insolvente não e inválido, mas é ine caz em relação à massa
insolvente, vinculando apenas a contraparte.
Se o administrador da insolvência quiser chamar à massa insolvente os efeitos do negócio, pode
rati car os negócios celebrados pelo insolvente.
Caso o administrador não rati que o negócio, o insolvente responde à outra parte por
incumprimento do contrato se não conseguir realizar a contraprestação.

Representação sem poderes


Art. 268.º
O negócio que uma pessoa sem poderes de representação celebra em nome de outrem é
ine caz em relação a este último.
Contudo, através da rati cação, a parte em relação à qual não se produzem os efeitos do
negócio pode chamar a si os seus efeitos.

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Enquanto o negócio não for rati cado, a outra parte tem a faculdade de revogar ou rejeitar o
negócio, desfazendo a vinculação estabelecida, exceto se, no momento da conclusão, conhecia a
falta de poderes do representante.
O representante sem poderes de representação responde perante a outra parte com base na
culpa na formação dos contratos (art. 227.º).

Contrato para pessoa a nomear


Art. 452.º a 456.º
Negócios jurídicos em que uma das partes pode reservar o direito de nomear um terceiro que
adquira os direitos e assuma as obrigações provenientes desse contrato.
A nomeação carece de rati cação (pelo nomeado), sob pena de ine cácia do negócio em relação
a este.
Se rati cado, a pessoa nomeada adquire os direitos e assume as obrigações provenientes do
contrato.
Se não rati cado, o contrato produz os seus efeitos relativamente ao representante sem poderes
(contraente originário).

III.IV. Os negócios jurídicos com e cácia relativa


Nos negócios com e cácia relativa, há uma plena vinculação entre as partes, com plena
produção dos efeitos, não sendo, estes, porém, oponíveis a terceiros, que não os conhecem devido
à falta de publicidade dos negócios.
A e cácia relativa tem por objetivo a proteção da con ança de terceiros e do tráfego jurídico em
geral.
Existem 2 situações comuns que conduzem os negócios jurídicos a terem e cácia relativa: a falta
de publicidade e a inoponibilidade da invalidade do negócio por uma das partes contra a outra.

Falta de publicidade
Por questões de segurança jurídica, é necessário que alguns negócios, considerados relevantes,
sejam registados.
O registo visa proteger a expectativa de terceiros, conferindo segurança ao tráfego jurídico.

O registo tem função e e cácia declarativa: visa dar conta dos factos. Não atribui direitos (visão
clássica); contudo, a sua falta pode ter consequências.
A aquisição e venda de bens imóveis deve ser sujeita a registo, para que seja dada publicidade à
situação jurídica dos bens.

Consequências
Se a publicidade for omitida, o negócio pode ser invocado entre as partes ou entre os seus
herdeiros, mas pode não ser oponível a todos os terceiros.
Os factos sujeitos a registo só produzem efeitos em relação a terceiros para efeitos de registo a
partir do momento do registo.
O negócio, ainda que não registado, produz efeitos erga omnes invocáveis em situações de
responsabilidade civil, etc.

Terceiros para efeitos de registo


Aqueles que adquirem de um transmitente comum direitos parcial ou totalmente incompatíveis
entre si sobre o mesmo objeto.

Prioridade de registo
Art. 6.º, CRP
O direito inscrito/registado (e não adquirido) em primeiro lugar prevalece sobre os que se lhe
seguirem.
O registo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito (art. 7.º, CRP)

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Aquisição tabular
Art. 6.º, CRed. Pred.
Para que se dê aquisição por prioridade de registo (aquisição tabular), é necessário que:
➡ o primeiro adquirente não registe a aquisição
➡ o segundo adquirente (que possui um direito legal relativo - art. 892.º) proceda ao seu registo
➡ o segundo adquirente esteja de boa fé, isto é, desconhecer a discrepância entre a situação
do registo e a situação real do prédio (art. 892.º)

O direito é legal porque resulta da lei (art. 892.º) e não do contrato e é relativo porque refere-se
apenas ao vendedor, o único que não pode opor-lhe a nulidade do negócio (arts. 286.º e 892.º).
O direito legal relativo atribuído pelo art. 892.º é fortalecido (direito absoluto) caso o comprador
leve o negócio a registo, prejudicando o primeiro negócio, não sujeito a registo. O segundo
adquirente passa a ser o proprietário.
O negócio nulo pode produzir um direito legal relativo (art. 892.º). Pode produzir efeitos de
natureza negocial por força da lei - efeitos laterais. Os seus efeitos típicos não são produzidos, pois
carece de um pressuposto considerado pela lei essencial.

Art. 408.º
Os efeitos reais produzem-se por mero efeito do contrato.
Art. 879.º
Um dos efeitos reais é a transmissão do direito de propriedade.
Art. 892.º
Princípio nemo plus iuris, ninguém pode transmitir mais direitos do que aqueles que possui.
A venda de bens alheios por vendedor sem legitimidade para a realizar é nula.
O vendedor sem legitimidade para a venda não pode opor a nulidade ao comprador de boa fé. O
comprador de boa fé está protegido apenas em relação ao vendedor (direito legal relativo).
Mesmo que a transmissão da propriedade não seja sujeita a registo, aquele que transmitiu a propriedade
não pode (voltar a) vendê-la a outrem, pois já não possui o direito de propriedade.
Art. 954.º
Mesmo que a transmissão da propriedade não seja sujeita a registo, aquele que transmitiu a propriedade
não pode doá-la a outrem, pois já não possui o direito de propriedade.
Art. 4.º, CRP
Os factos sujeitos a registo, ainda que não registados, produzem os seus efeitos inter partes.

Inoponibilidade da invalidade
Nos casos de inoponibilidade da invalidade, o negócio é nulo.
Assim sendo, não produz os seus efeitos típicos, mas apenas efeitos laterais, de natureza
negocial. Segundo o art. 892.º, é nula a venda de bens alheios por quem não tem legitimidade para
os vender; todavia, o vendedor não pode opor a nulidade ao comprador de boa fé.
No caso da doação (art. 956.º), a solução é a mesma. Esta regra fundamental, exceção ao art. 286.º,
estende-se também ao art. 939.º.
Existe, então, uma e cácia estritamente relativa entre as partes de um negócio nulo, resultante da
inoponibilidade da invalidade do mesmo, por virtude da boa fé de uma delas (geralmente o
comprador).
Esta e cácia relativa produz-se como efeito lateral de um negócio nulo, por comando da lei.
A posição jurídica da parte de boa fé ca reduzida a um direito legal relativo, pois a lei de ne que,
(apenas) entre as partes, os efeitos produzem-se regularmente.

Direito e Gestão Xavier Cunha 23


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IV. A interpretação e integração da declaração negocial
IV.I. Interpretação
Interpretar é xar o sentido e o alcance com que a declaração negocial, enquanto enunciado
verbal, deve valer.

A interpretação é necessária quando, atentando ao enunciado linguístico:


• a declaração negocial não é clara ou unívoca (comporta mais do que um sentido) e
• as partes não estão de acordo quanto ao sentido da declaração.
A declaração negocial (elemento externo) é o objeto da interpretação; contudo, a nalidade é
desvendar a vontade (elemento interno).

Na interpretação da declaração negocial, encontramos duas correntes:


• subjetivista (relevam a vontade real do declarante)
• objetivista (relevam a vontade compreendida pelo declaratário - segurança jurídica)
Nota: em matéria de testamento, declaração unilateral não recetícia, existem normas próprias de direito
sucessório para os interpretar.

Art. 236.º, n.º 1, 1.ª parte


Dirige-se apenas às declarações recetícias (têm declaratário).
Consagra a teoria da impressão do destinatário.
Declaratário normal
Declaratário medianamente instruído e diligente, no sentido da compreensão da declaração e da
recolha dos elementos necessários para a tarefa interpretativa.
Prevalência do sentido objetivo da declaração (o apreendido pelo declaratário). Se a objetivação for longe
demais, gera-se discrepância entre vontade real do declarante e conteúdo da declaração, que pode levar o
declarante a anular a declaração, por erro sobre o mesmo (art. 247.º) (insegurança jurídica).

Art. 236.º, n.º 1, 2.ª parte


O declarante deve contar com o sentido da sua declaração apreendido pelo declaratário.
Pretende acautelar riscos de entendimentos não cobertos pela vontade do declarante.
Para a doutrina objetivista, o sentido da declaração deve ser imputável ao declarante, logo, o declarante
deve contar sempre com o sentido da declaração.
Para a doutrina subjetivista, é uma porta aberta à procura da vontade do declarante.

Art. 236.º, n.º 2


Sempre que o declaratário conhecer a vontade real do declarante, é de acordo com ela que a
declaração vale (não há expectativas a tutelar).
Falsa demonstratio non nocet
(Uma falsa demonstração/formulação da declaração não prejudica a vontade real das partes)
A vontade real é que conta.
A falsa demonstratio pode ser o resultado de ignorância, linguagem desleixada ou codi cada.
Na falsa demonstratio, as partes querem o declarado, apesar da designação não ser correta. Na simulação,
há falta de vontade de querer o declarado.

Art. 237.º
Norma subsidiária (caso não seja possível chegar ao sentido pelo art. 236.º).
O sentido com que a declaração vale é:
• negócios gratuitos: o menos gravoso para o disponente (este já está a atuar gratuitamente)
• negócios onerosos: o que conduzir ao maior equilíbrio entre as partes (sinalagma)
Art. 238.º
Nos casos em que a lei exige uma forma para o negócio jurídico, o sentido retirado da declaração
deve ter um mínimo de correspondência no texto do documento, ainda que imperfeitamente

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expresso, a não ser que outro corresponda à vontade real dos declarantes e a forma exigida não se
oponha a essa validade.

Se, esgotadas todas as possibilidades, não for possível atribuir sentido algum, a declaração é
simplesmente ine caz.

IV.II. Integração
A declaração não apresenta um sentido obscuro ou equívoco, mas lacunas, que as partes
desconhecem.
Se as partes conhecem as lacunas, o contrato não se concluiu (art. 232.º).

Art. 239.º
No preenchimento de lacunas, recorrer-se-á, por ordem, a:
1. Normas supletivas
2. Boa fé
• justiça contratual atual
3. Vontade hipotética
• no momento da emissão da declaração

Se a vontade hipotética dos declarantes se opuser à boa fé, a boa fé prevalece. Contudo,
buscamos a vontade hipotética que, se não estiver de desacordo com a boa fé, vale como sentido
da declaração.
A integração nunca pode:
• chegar a um resultado que contrarie visivelmente a vontade das partes
• substituir ou alargar o objeto do negócio jurídico

V. A invalidade do negócio jurídico


Invalidade
Desconformidade do negócio com as exigências legais que foram estabelecidas para ele, de
acordo com as suas funções na ordem jurídica (violação de norma imperativa, partes sem capacidade
negocial, objeto ilícito).
De ciência genética do negócio, na sua formação.
Elemento intrínseco da declaração.
É no momento da emissão da declaração negocial que se afere se esta é válida ou não.

E cácia
Produção ou não produção dos efeitos da declaração negocial.
Elemento extrínseco da declaração.
A e cácia ou ine cácia é posterior à validade ou invalidade.
Um negócio inválido ou nulo (art. 892.º) não produz os seus efeitos.
Assim, a ine cácia em sentido amplo engloba a invalidade e a ine cácia em sentido restrito.

V.I. Modalidades da invalidade do negócio jurídico


Art. 285.º e ss.

Nulidade
Um negócio nulo não produz os seus efeitos típicos.
Contudo, pode produzir efeitos laterais, de natureza negocial, mas por força da lei.

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Se as partes, no plano dos factos, se comportam como se os efeitos tivessem sido produzidos,
uma, ou ambas, tem de invocar a nulidade em juízo.
A sentença de nulidade é meramente uma declaração, não altera a situação jurídica (já é nulo).

Se não estiver preenchido certo pressuposto obrigatório, então o negócio é nulo e não produz os
seus efeitos típicos (no caso da compra e venda, os previstos no art. 879.º).

Art. 286.º
A nulidade é invocável a todo o tempo (sem dependência de prazo), por qualquer interessado.
Pode ser o ciosamente declarada pelo tribunal (ex o cio).

Interessado
Titular de uma situação jurídica que sai jurídica ou economicamente prejudicada pela
existência do negócio nulo (tem de existir um interesse jurídico ou económico).

Anulabilidade
O negócio anulável começa por produzir os seu efeitos, de forma provisória.
Os efeitos podem vir a cessar se certas pessoas invocarem a sua anulabilidade.
A sentença de anulabilidade não é meramente declarativa, mas sim constitutiva.

Art. 287.º
Tem legitimidade para invocar a anulabilidade aquele em favor de quem a lei estabelece a
anulabilidade.
A anulabilidade é invocável até um ano após a cessação do vício que lhe serve de fundamento.
Enquanto o negócio não for cumprido (enquanto uma das partes não cumpriu com a sua prestação:
pagamento do preço, etc.), a anulabilidade pode ser invocada sem dependência de prazo.
Se o legitimado não invocar a anulabilidade no prazo previsto, o seu direito extingue-se e o
negócio consolida-se, passando a ser inatacável.

Art. 288.º
O negócio jurídico anulável pode ser consolidado através da con rmação (art. 288.º, n.º 1).s

Con rmação
Negócio jurídico unilateral que visa sanar um negócio jurídico anulável.
Não carece de forma especial.
Paralelo à rati cação.

V.II. Efeitos da nulidade e anulabilidade do negócio jurídico


Art. 289.º
Quando se invoca a anulabilidade, pretende-se que os efeitos provisórios sejam destruídos
retroativamente.
A sentença de anulabilidade é constitutiva e origina a retransmissão do direito de propriedade
para a esfera jurídica do declarante.
Declarada a nulidade ou anulabilidade, todas as prestações devem ser restituídas.

Art. 291.º
A nulidade ou anulabilidade não são oponíveis a terceiros de boa fé, no que respeita à
aquisição, a título oneroso, de bens imóveis ou móveis sujeitos a registo, se o registo for anterior ao
registo da ação de nulidade ou anulação.
No caso de transmissões em cadeia, quando a propriedade da coisa já foi transmitida mais vezes
posteriormente ao negócio nulo, ao aplicar-se o art. 289.º, a segurança jurídica seria posta em
causa.

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Cinco pressupostos:
• Negócios cujo objeto são bens imóveis ou bens móveis sujeitos a registo
• Aquisição a título oneroso
• Aquisição por terceiro de boa fé (art. 291.º, n.º 3)
• Registo de aquisição anterior ao registo de nulidade ou anulação ou ao registo do acordo
entre as partes acerca da invalidade do negócio (art. 3.º, n.º 1, CRP)
• Ação (de nulidade ou anulabilidade) proposta e registada depois dos 3 anos posteriores à
conclusão do primeiro negócio

Não prejudica os direitos de terceiros: permite consolidar um direito relativo num direito absoluto,
um direito provisório num direito de nitivo.
O período de 3 anos visa dar oportunidade ao primeiro adquirente, no negócio nulo ou anulável, a
sanar a invalidade ou resolver a situação.

V.III. Causas de nulidade do negócio jurídico


Incapacidade de gozo
Capacidade negocial de gozo
Suscetibilidade de ser titular de relações jurídicas.
Capacidade para ser titular de direitos e de obrigações.

Capacidade negocial de exercício


Capacidade de celebrar negócios jurídicos.
Um menor pode ser titular de um direito de propriedade, tendo assim capacidade negocial de gozo.
Contudo, não tem capacidade negocial de exercício.

A personalidade jurídica é insuscetível de ser limitada, já a capacidade jurídica (de gozo) é


suscetível de o ser.
Existem 3 incapacidades negociais de gozo:
- casamento (art. 1601.º)
- per lhação (art. 1850.º)
- testamento (art. 2189.º)
Existem incapacidades negociais insupríveis, isto é, ninguém pode celebrar os negócios jurídicos
por si, uma vez que são atos pessoalíssimos.

Incapacidade de gozo de pessoas coletivas


Art. 160.º
Princípio da especialidade do m (n.º 1): ingressam na sua capacidade jurídica os direitos e
obrigações necessários à prossecução dos seus ns. Excetuam-se os direitos e obrigações
vedados por lei ou inseparáveis da personalidade singular.
Remete-se para o art. 294.º, em relação às consequências (nulidade).

Negócios celebrados contra a lei


Art. 294.º
Norma geral.
Por regra, a consequência jurídica da celebração de negócios contra norma de caráter imperativo
é a nulidade.

Existem duas exceções:


- A lei pode prever outras consequências: a anulabilidade, outros tipos de efeitos (art. 1306.º -
e cácia limitada, apenas obrigacional)
- A nulidade, enquanto sanção, não é adequada para certos negócios (quando não se pretende
proibir ou restringir o conteúdo do negócio jurídico)

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Também cabem no âmbito do art. 294.º os negócios sucedâneos, paralelos ou celebrados com
fraude à lei. São negócios que não contrariam diretamente a letra de nenhuma norma imperativa
mas que violam o seu espírito, pois as partes conseguem alcançar, por via desse negócio, o mesmo
resultado prático que a lei proibiu.

Requisitos do objeto negocial


Art. 280.º, n.º 1
Fisicamente impossível
A prestação não é realizável no plano dos factos ou segundo a lei da natureza (impossibilidade
fáctica, real, objetiva).
Contrato de compra e venda de uma casa que ruiu no momento ou antes da conclusão do contrato,
deixou de existir

Legalmente impossível
A lei não fornece um tipo ou meios para a realização do negócio ou não concebe os seus efeitos
jurídicos.
Venda de uma coisa ao proprietário, casamento de pessoas coletivas, fusão de pessoas singulares

Contrário à lei
O objeto é física e legalmente possível, todavia, contraria uma norma imperativa.

Indeterminável
O objeto do negócio não é passível de concretização, não são determinados/avançados pelas
partes critérios para determinar o objeto
Entrega de “um animal” ou de “uma coisa”, ança genérica

Art. 280.º, n.º 2


Contrário à ordem pública
Ordem pública compreende os princípios fundamentais de um certo ordenamento jurídico, por
regra, com assento constitucional. A ordem pública é um conceito jurídico sistemático.

Ofensivo dos bons costumes


Conceito (não jurídico) extrassistemático, aberto e mutável. Abre a porta às conceções ético-
morais em dada comunidade, num dado momento. Por isso, deve ser visto caso a caso, em cada
comunidade e momento.

Fim contrário à lei ou à ordem pública


Art. 281.º
Negócios em que as prestações a que as partes se vinculam são lícitas, mas o intuito de ambas
as partes é contrário à lei ou à ordem pública ou ofensivo dos bons costumes, são nulos.
Existe pelo menos a consciência da nalidade ilícita.
Se o preço for mais elevado em virtude da nalidade, não há dúvida de que o m é comum a
ambas as partes.

Inobservância da forma legal


Art. 220.º
A imposição de uma forma legal é motivada por interesses públicos; assim, a consequência da
sua inobservância é a mais gravosa: a nulidade (art. 220.º).

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Negócios celebrados com falta de vontade
Em regra, o elemento interno e o elemento externo coincidem: a vontade real coincide com a
vontade declarada.
Contudo, podem existir situações em que tal não suceda: casos em que existe divergência entre
a vontade e a declaração.
Dentro das divergências, existem:

- Divergências intencionais:
• simulação (art. 240.º, ss.)
• reserva mental (art. 244.º)
• declaração não séria (art. 245.º)
- Divergências não intencionais
- Forçadas
• Coação física (246.º)
- Ignoradas
• Falta de consciência da declaração (art. 246.º)
• Erro na declaração (art. 247.º, ss)

Simulação
Art. 240.º, ss
Divergência entre a vontade real e a vontade declarada por acordo entre o declarante e o
declaratário, com o intuito de enganar terceiros.
Três requisitos: divergência entre vontade real e declarada + acordo entre declarante e
declaratário + intuito de enganar terceiros.
A simulação pode ser:
- Absoluta: as partes não querem concluir negócio algum
- Relativa: o negócio simulado visa um outro negócio, dissimulado. Esse outro negócio é
dissimulado sob a aparência de um ato de conteúdo ou de objeto diverso ou concluído entre
pessoas que não aquelas que nele efetivamente intervieram. Temos um negócio simulado e um
negócio dissimulado.
• Objetiva: as partes ocultam o negócio dissimulado celebrando outro de conteúdo diverso.
Pode ser quanto à natureza ou ao valor.
A celebra um contrato de compra e venda com B (negócio simulado), quando na verdade quer doar
(negócio dissimulado) (natureza)
A celebra um contrato de compra e venda com B por 150.000€ (negócio simulado), quando na
verdade o preço é de 100.000€ (negócio dissimulado) (valor)
• Subjetiva: interposição ctícia de pessoas. Simulação de uma parte do negócio.
A vende a C que vende a B, quando na verdade A queria vender a B (art. 2196.º —> 953.º)
A simulação relativa subjetiva distingue-se do mandatário; neste último exige uma interposição real de
pessoas.

Simulação inocente: não visa prejudicar terceiros


Simulação fraudulenta: visa prejudicar terceiros

Legitimidade para invocar nulidade da simulação


Art. 242.º
Para efeitos do art. 286.º, um interessado é um sujeito de qualquer relação jurídica afetada na
sua consistência jurídico-prática, pelos efeitos a que o negócio jurídico se dirigia.
Os simuladores podem invocar a nulidade do negócio simulado (art . 242.º, n.º 1), contudo, com a
restrição de prova do art. 394.º, n.º 2.
Os herdeiros legitimários podem também invocar a nulidade, caso a simulação tenha tido o
intuito de os prejudicar.
A legitimidade dos credores está regulada no art. 605.º.

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Inoponibilidade da simulação
Art. 243.º (norma especial em relação ao art. 291.º).
O simulador ou os herdeiros que lhe sucedam não pode opor a nulidade da simulação contra
terceiro de boa fé.
A boa fé consiste na ignorância da simulação no momento da conclusão do negócio.

Negócio dissimulado
Art. 241.º
A validade do negócio dissimulado não é prejudicada pela nulidade do negócio simulado.
Se o negócio dissimulado for formal (solene), só é válido se tiver sido observada a forma legal.
Dois entendimentos: a forma do negócio simulado não aproveita ao negócio dissimulado (Prof.
Hoerster) ou a foram do negócio simulado aproveita ao negócio simulado.

Reserva mental
Art. 244.º
Divergência entre a vontade real e a vontade declarada com o intuito de enganar o declaratário.
A divergência é intencional.

Caso a reserva mental seja desconhecida do destinatário, não prejudica a validade da


declaração.
Caso a reserva mental seja conhecida do destinatário, tem os efeitos da simulação.
Por vezes, o direito poderia existir, mas seria um abuso do direito (art. 334.º), pois conduziria a
uma solução não razoável.

Declaração não séria


Art. 245.º
Divergência entre a vontade real e a vontade declarada na qual não se pretende enganar
ninguém; a declaração é feita na expectativa que a outra parte não desconheça a falta de vontade.
A divergência é intencional.
A declaração não séria carece de quaisquer efeitos (negocial): nem volitivo- nais, nem laterais -
nulidade agravada.

Caso o declaratário fosse induzido a crer na seriedade da declaração, tem o direito a ser
indemnizado pelos prejuízos que tiver sofrido.

Coação física

Erro na declaração
Há vontade de ação, mas não há vontade de declaração.
A consequência jurídica é a mera anulabilidade.
António acena a Berto no momento do leilão e é entendido como ato de demonstração da vontade de
comprar pelo preço leiloado.

V.IV. Causas da anulabilidade


Regime da menoridade
Art. 122.º
É menor quem ainda não completou 18 anos de idade.

Art. 123.º

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Carecem de capacidade de exercício os menores de idade.

Art. 129.º
A incapacidade dos menores termina quando eles atingem a maioridade (à meia-noite do dia dos
18 anos) ou são emancipados.
São emancipados pelo casamento (arts 132.º e 133.º).
Art. 133.º
A emancipação atribui ao menor plena capacidade de exercício, salva a exceção do art. 1649.º.

Art. 124.º
O menor pode ser sujeito de um negócio jurídico, através da representação legal.
São representantes legais do menor os pais ou tutores legais.

Art. 127.º
Exceções à incapacidade dos menores:
- os atos de administração ou disposição de bens que o maior de dezasseis anos haja
adquirido por seu trabalho
- os negócios jurídicos próprios da vida corrente do menor que, estando ao alcance da sua
capacidade natural, só impliquem despesas, ou disposições de bens, de pequena importância
- os negócios jurídicos relativos à pro ssão, arte ou ofício que o menor tenha sido autorizado
a exercer, ou os praticados no exercício dessa pro ssão, arte ou ofício

Art. 125.º
Os negócios celebrados pelo menor são anuláveis.
Remissão para art. 287.º, n.º 2.
A anulabilidade é sanável em certas condições:
- Pelos pais, do tutor legal ou administrador de bens, desde que a acção seja proposta no prazo de um
ano a contar do conhecimento que o requerente haja tido do negócio, mas nunca depois de o menor
atingir a maioridade ou ser emancipado, salvo o disposto no artigo 131.º
- Pelo próprio menor, no prazo de um ano a contar da sua maioridade/emancipação, desde que o
negócio permaneça anulável
- Por qualquer herdeiro do menor, no prazo de um ano a contar da morte deste, ocorrida (a morte)
antes de expirar o prazo referido na alínea anterior

Os pais podem anular, con rmar (caso o pudessem também celebrar (art. 125.º, n.º 2, remete
para 1889.º) (art. 288.º) ou deixar passar o prazo para invocar a anulabilidade, permitindo a
consolidação do negócio.
Caso o negócio não esteja cumprido (art. 287.º, n.º 2), os prazos contam-se de forma distinta.

Art. 126.º
Relaciona-se com art. 253.º.
O menor que atuou com dolo para se fazer passar por maior/emancipado na celebração do
negócio não tem o direito de invocar a anulabilidade.
Os herdeiros não podem invocar a anulabilidade.
Os pais/representantes legais, para Mota Pinto e Carvalho Fernandes, não podem invocar a
anulabilidade (interpretação extensiva/extensão teleológica).
Para Hoerster, os pais/representantes legais podem invocar a anulabilidade (interpretação declarativa).

Regime do maior acompanhado


Lei 49/2018 e arts. 138.º, ss
A medida de acompanhamento não conduz necessária e inexoravelmente à restrição da
capacidade negocial de exercício.
Na prática, muitas vezes há restrição da capacidade negocial de exercício.

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Acompanhado
Art. 138.º
Maior impossibilitado de exercer, plena, pessoal e conscientemente, os seus direitos e de cumprir
os seus deveres bene cia de medidas de acompanhamento.
Art. 139.º
Remissão para art. 891.º, ss, CPC
Não há maior acompanhado sem uma sentença judicial. O acompanhamento, as mais das vezes,
conduz a uma restrição da capacidade de exercício, da liberdade da pessoa, pelo que não pode ser
decidido sem uma sentença judicial.
Durante o processo, podem ser determinadas medidas de acompanhamento provisórias e
urgentes.
Art. 140.º
O acompanhamento rege-se pelo princípio da subsidariedade (não supletividade).
O acompanhante tem deveres gerais de cooperação e assistência (direito da família).
Art. 141.º
O acompanhamento pode ser requerido pelo próprio ou pelo cônjuge, unido de facto ou qualquer
parente sucessível, com autorização deste, ou pelo Ministério Público.
A autorização pode ser prescindida quando não possa ser dada livre e conscientemente.
Art. 142.º
O acompanhamento pode ser requerido dentro do ano anterior à maioridade, produzindo efeitos
a partir desta.
Art. 145.º
O acompanhamento limita-se ao necessário (subsidariedade, art. 140.º).
O acompanhante pode ter funções de representação geral ou especial (representação legal),
administração de bens, autorização prévia para a prática de determinados atos (instituto da
assistência) e intervenções de outro tipo, devidamente explicitadas.
Para os atos de disposição de bens imóveis, é sempre necessária autorização judicial.
Art. 154.º
Os negócios celebrados pelo maior acompanhado são anuláveis:
• Posteriores ao registo de acompanhamento
• Durante a pendência do processo
O Prof. Hoerster considera que é possível anular o negócio um ano após o registo do
acompanhamento (cessação do vício), pelo acompanhante.

Negócios usurários
Arts. 282.º a 284.º
Negócios em que existe uma situação de fragilidade aproveitada pela outra parte.
Requisitos:
• Exploração consciente da fragilidade da outra pessoa
• Desequilíbrio excessivo e injusti cado das prestações
O negócio é anulável.
Contudo, a parte lesada pode, em vez da anulação, requerer a modi cação do negócio segundo
juízos de equidade.

Erro na declaração
Arts. 247.º a 250.º
Divergência não intencional.
O problema está na manifestação da vontade, o elemento externo, a declaração, devido a erro.
O contrato conclui-se (difere do dissenso oculto/latente), mas a sanção é a anulabilidade, desde
que o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a essencialidade do elemento sobre o qual
incidiu o erro.
Se for possível, de acordo com as regras da interpretação, atribuir um sentido comum à
declaração, o contrato conclui-se.

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O erro de cálculo ou de escrita apenas dá o direito à reti cação deste. A reti cação pode ser feita
a todo o tempo.
O erro na transmissão da declaração (núncio) torna a declaração anulável nos termos do art.
247.º.

Negócios celebrados com vícios da vontade


Difere da falta da vontade, onde o problema está no elemento externo (declaração).
Nos vícios da vontade, o problema está na formação da vontade. A manifestação da vontade é
conforme, contudo, a vontade não seria aquela se não fosse o vício.
A vontade não seria aquela em condições normais, devido ao vício.

Erro
Arts. 251.º e 252.º
Desfasamento entre a representação intelectual e a realidade.
O erro que recaia sobre os motivos determinantes da vontade só é causa de anulação se as
partes houverem reconhecido por acordo a essencialidade do motivo.
O erro sobre a pessoa (identidade, qualidade, etc.) ou o objeto do negócio (autor de um quadro) torna
o negócio anulável nos termos do art. 247.º.
O erro sobre a base do negócio só releva se é comum a ambas as partes e remete para o art.
437.º sobre a alteração superveniente das circunstâncias. Será possível modi car ou resolver o
contrato, pela parte lesada.
A base do negócio consiste no ambiente circunstancial envolvente do negócio.

Dolo
Arts. 253.º e 254.º
Erro determinado por outra pessoa (não só me enganei, fui enganado).
Por detrás do dolo, há sempre um erro.
Qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência de induzir
ou manter em erro o autor da declaração (dolo ativo), bem como a dissimulação, pelo declaratário
ou terceiro, do erro do declarante (dolo negativo).
Há dolo lícito: as sugestões ou artifícios usuais, considerados legítimos no comércio jurídico
(exagero das qualidades do objeto), e a dissimulação do erro, quando o declaratário não tiver
nenhum dever de elucidar o declarante.
Dever de elucidar o declarante: art. 227.º, boa fé na formação dos contratos.
O declarante cuja vontade tenha sido determinada por dolo pode anular a declaração. A
anulabilidade não é excluída se o dolo for bilateral. Não há mais pressupostos, uma vez que o dolo é
mais grave.
Dolo de terceiro: declaração só é anulável se o declaratário tinha ou deveria ter conhecimento
dele. Contudo, se do negócio resultarem benefícios para terceiro, que agiu com dolo, é anulável a
parte do negócio que gerou o benefício para o terceiro doloso.
Quem pode anular, segundo a norma geral, é aquele em favor de quem a lei estabeleceu a
anulabilidade (art. 287.º).

Coação moral
Arts. 255.º e 256.º
Existe uma vontade de emitir a declaração negocial, contudo, esta não existiria caso não
existisse coação moral.
O declarante tem margem de escolha.
A declaração negocial é determinada pelo receio de um mal de que o declarante foi ilìcitamente
ameaçado, com o m de obter dele a declaração.
Requisitos:
• Determinada pelo receio de um mal
• Ameaça ilícita de um mal
• Intuito de obter dele a declaração

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A ameaça pode ser dirigida ao indivíduo ou a terceiros. Não constitui coação a ameaça do
exercício normal do direito nem o receio de desagradar a quem se respeita muito.
A declaração negocial determinada por coação é anulável, mesmo que a coação provenha de
terceiro. Neste caso, é necessário que o mal seja grave e o receio da consumação seja justi cado.

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