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FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE LISBOA


CONTRATOS II – 3.º ANO TURMA A DIA

Caso n.º 1

Em 2 de março de 2017 António enviou uma carta a Bento dizendo: “Finalmente doo-
te o meu velho Mercedes que há tanto tempo cobiças”.
Recebida a carta a 4 de março, Bernardo apressa-se a responder por carta nesse dia
enviada, tendo dito: “Excelente notícia, meu amigo. Aceito de bom grado essa
doação”, tendo comprado, de imediato, produtos de limpeza especiais, no valor de
300 €.
No próprio dia 4, de noite, António recebe em sua casa a visita de Carlos, que lhe faz
uma proposta de compra, e vende a Carl o Mercedes por € 40.000.
Estamos perante um contrato de doação, regulado pelos artigos 940º a 979º CC, uma
vez que se reúnem os 3 requisitos característicos do contrato de doação: existe um
espirito e liberalidade de A, ou seja, uma intenção de beneficiar espontaneamente B,
uma diminuição patrimonial do A (pela perda do Mercedes) e um consequente
aumento patrimonial gerador de enriquecimento para B.
Tratando-se de um Mercedes, coisa móvel sujeita a registo, é necessário, quando não
acompanhada pela tradição da coisa, que seja reduzida a escrito, o que sucedeu
através da carta.
A proposta negocial tem eficácia a partir do momento em que a carta é recebida ou
conhecida pelo B, pelo art 224º, pelo que quando nesse mesmo dia B a aceita, esta
torna-se irrevogável.
A aceitação, por se tratar de um contrato real quoad effectum (eficaz a partir da sua
celebração - art 408/1) por se tratar de coisa movel art 947/2, desencadeia a
transmissão imediata do direito propriedade do Mercedes, pelo que a partir da
aceitação B torna-se proprietário do Mercedes.
Quando A retorna a vender o carro, este celebra um contrato de compra e vende de
bem alheio (de B), que é nula pelo art 892ºCC. Pelo art.894/1ºCC, C teria direito à
restituição integral do preço e, portanto, dos 40 000euros.

Caso n.º 2
Antónia, às portas da morte, escreve a Benedita, sua afilhada, no dia do casamento
desta (estando Antónia arrependida por pouco ter procurado a sua afilhada ao longo
da vida): “Dou-te todos os meus anéis”. Ao que Benedita responde, também por carta:

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CONTRATOS II – 3.º ANO TURMA A DIA

“Agradeço à madrinha”.
Quando dias depois, em reunião familiar, Antónia entrega os anéis a Benedita esta
assinala que falta um anel — o que tem um valiosíssimo relógio incorporado. Antónia
responde que se trata de um relógio e não de um anel — de resto, o seu relógio do dia-
a-dia.
Esta doação foi realizada por A, no dia do casamento de B, o que significa que não
houve convenção antenupcial (art 1756º CC), aplicar-se-á portanto as disposições dos
artigos d 940º a 969ºCC. Importa ter em conta os requisitos da proposta e aceitação
que se encontra nos artigos 224º CC, notando que a doação foi validamente celebrada
porque respeita os respetivos pressupostos.
Quanto à forma, importa atentar que o art 947º CC, e como estamos a falar de anéis, e
portanto móveis, o nº2 do mesmo. Trtando-se de coisa móvel, terá de ser
acompanhada pela tradição da coisa e deverá a mesma ser celebrada por escrito, o que
sucedeu nesta hipótese.
O problema que aqui se coloca tem a ver com a interpretação da vontade do doador
para determinar o objeto da doação. No caso há um erro sobre o objeto. Não há
duvida sobre o esprito de liberalidade da doadora de dar os anéis e não o relogio. Terá
que se atender dado que há casos em que nem sempre o sentido objetivo da
declaração corresponde à intenção do declarante. A declaração normalmente vale com
o sentido que lhe daria um declaratário normal daria e nesse sentido estaria-se perante
um erro de objeto.
Todavia existe uma regra especial para os casos duvidosos – art 237º - prevalece para
o disponente o sentido menos gravoso e como tal, o anel com relógio deveria ficar
para A, não sendo objeto da doação

Caso n.º 3
Em janeiro de 2019, António, viúvo, doou, por documento particular autenticado, à
sua filha Beatriz, maior acompanhada, uma moradia, tendo aposto uma cláusula de
reversão. Beatriz, solteira, faleceu em setembro de 2019, tendo deixado uma filha
maior, Cláudia. António quer saber se pode agora alienar a moradia.
Quid juris?
Estamos perante um contrato de doação entre A e B uma vez que se reúnem os 3
requisitos necessários: a existência de uma diminuição patrimonial por parte de A

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(moradia), uma atribuição patrimonial geradora de enriquecimento de B e uma


intenção de A de beneficiar B (espirito de liberalidade), pelo que será regulado pelos
artigos 940º a 979º do CC.
Presumindo-se que B era um maior acompanhado no momento da aceitação, art
950/2CC, B encontra-se inibido de receber livre e pessoalmente a doação (art 950/1
“ex vi” art 138ºss), não se podendo colocar em causa a capacidade de doar de A uma
vez que este tem capacidade para contratar e dispor dos seus bens (art 67º “ex vi” art
948º/1 e 2CC).
Ora, a doação da moradia (estando pelo art 947º/1 CC, de estar sujeita a escritura
pública ou documento particular autenticado) não tendo a ela nexa nenhuma restrição
de liberalidade, será considerada uma doação pura.
Atendendo ao facto de que a doação apenas pode beneficiar o donatário, a lei nada
estipula para o suprimento desta incapacidade. Estabelece por esta via, no art
951/2CC que em virtude da impossibilidade de suprimento e da existência de uma
doação pura, que os efeitos que produzam independentemente da aceitação de A,
maior acompanhada à data da proposta.
Tratando-se de um contrato quoad effectum (art 408/1) e presumindo-se que a forma
foi respeitada, a transmissão do direito da propriedade da moradia dá-se
independentemente da aceitação de A, torna-se este último proprietário do imóvel.
A estipulou uma clausula de reversão (art 960/1CC), implicando isto que, com a
morte de B, o direito de propriedade da moradia lhe seja devolvido e não se transmita
para os seus descendentes (salvo estipulação expressa de A, que in casu, não ocorreu).
Neste cenário, A poderia alienar o imóvel (art 1305ºCC).
Contudo, aludindo-se à natureza da coisa, o art 960/3 CC estabelece que a clausula
para ser oponível a terceiros, deveria ter sido registada, o que efetivamente não
ocorreu. Se posteriormente C viesse a alienar o imóvel (por o ter recebido por herança
por exemplo), não poderia A opor a clausula de reversão a este terceiro (da doação).

Caso n.º 4
Eugénia salvou a vida ao seu vizinho Francisco durante um incêndio ocorrido em
agosto de 2011. Reconhecido por aquela ação nobre, Francisco dirige a Eugénia, em
setembro de 2011, uma carta na qual propõe doar-lhe uma peça de arte antiga no valor

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de € 10.000.
Eugénia nada diz.
Francisco, entretanto, começa a sofrer da doença de Alzheimer, razão pela qual a sua
família o interdita em 2012.
Em julho de 2013, Eugénia fica desempregada e, querendo “começar de novo” e abrir
um negócio por conta própria, lembra-se da proposta de Francisco e aceita aquela
proposta, mediante carta que envia a Francisco.
Contudo, Maria, mulher de Francisco e sua tutora, afirma que desconhecia a suposta
dádiva e recusa-se a entregar a peça de arte antiga a Eugénia.
Quid juris?
Estamos perante um contrato de doação na sua modalidade remuneratória, uma vez
que se reúnem os pressupostos desta: há uma diminuição patrimonial de F, há uma
atribuição patrimonial geradora de enriquecimento de E e um espirito de liberalidade
de E por parte de F por a ter salvado do incêndio (atenda-se que não se trata de uma
remuneração por uma divida exigível) de forma livre e espontânea, art 941º
É de atentar que o objeto da doação é uma coisa móvel, trata-se de um quadro de arte
de grande valor, pelo que não sendo acompanhada (doação) pela tradição da coisa,
necessita de ser reduzida a escrito, o que se verificou com a escritura da carta, art
947/2CC.
F torna-se maior acompanhado antes da aceitação por parte de E, pergunta-se neste
âmbito se a doação poderá ocorrer.
O art 948/1 determina que têm capacidade para fazer doações todos os que podem
contratar (art 67º excluindo-se os menores e maiores acompanhados, art 123ºss e art
138 ss); contudo, esta (capacidade) é determinada no momento da declaração
negocial. Assim, ao tempo da declaração F era capaz, a doação a E é válida.
Uma vez que a doação apenas caduca com a morte art 945/1CC (tanto do doador
como do donatário, atenda-se ao caráter eminentemente pessoal da doação – art 969/2
CC) e F não revogou a sua proposta, art 969/1CC, poder-se-ia pensar que doação
continuava a poder ser aceite.
Contudo, uma vez que E o faz tardiamente, além da carta de aceitação esta tinha de o
declarar a F, ou a M, art 945/3CC. Não o fazendo, a declaração de aceitação de E é
ineficaz. M podia recusar entregar o quadro a E.

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Caso n.º 5
Sabendo das dificuldades financeiras por que a irmã, Diana, tem passado, Daniel
ofereceu-lhe, entre outros eletrodomésticos, o seu antigo frigorífico com arca
congeladora. Sucede que este não funciona muito bem, designadamente não congela
os alimentos. Diana quer devolver o frigorífico ao irmão, até porque lhe ofereceram
outro sem defeitos.
Quid juris?
Estamos perante um contrato de doação uma vez que se reúnem 3 pressupostos
característicos deste contrato: uma diminuição patrimonial de Daniel (o frigorifico),
uma atribuição patrimonial geradora de enriquecimento para Diana (o mesmo
frigorifico) e verifica-se, também, o espírito de liberalidade de Daniel (intenção de
beneficiar Diana).
Daniel e Diana serão, em principio, no momento da declaração negocial, capazes, art
948º e 950ºCC
Sendo o objeto da doação uma coisa móvel (frigorifico) não acompanhada pela
tradição da coisa, seria necessário a sua redução a escrito art 947/2 in fine. Nada se
diz no enunciado sobre isto, presume-se que a aceitação foi acompanhada pela
tradição da coisa.
Ora, é enunciado que a arca congeladora do frigorifico doado não funciona, uma clara
limitação à funcionalidade da coisa; pergunta-se neste âmbito se o doador responderá
pelo vício da coisa.
O art 957/1, in casu, desresponsabiliza o doador isto porque: não se responsabilizou
expressamente pelo vicio, nem procedeu com dolo da doutrina (: parte da doutrina,
nomeadamente italiana, entende dolo como má fé nos termos do art 253º e admitindo
a responsabilidade do Daniel se houver consciência dos vícios e este tiverem sido
ocultados de Diana; outra parte da doutrina entende dolo como intenção de prejudicar
o donatário, não pelo menor valor que o frigorifico como coisa viciada teria em
relação a um frigorifico com arca congelada, mas em virtude do uso que o donatário
poderia fazer com ela – neste sentido o pro AV e PL) porque Diana sabia que a arca
não funcionava quando a recebeu.
Tendo recebido mais eletrodomésticos, não querendo o frigorifico em especifico,
atendendo ao facto que não se estipulou uma clausula acessória para este efeito e ao
facto de que o direito de propriedade do frigorifico já se transmitiu (art 954ºCCa)) ,

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CONTRATOS II – 3.º ANO TURMA A DIA

Diana é proprietária do frigorifico, pelo que poderá efetuar uma nova proposta de
doação a Daniel, agora, só relativa ao frigorifico (não poderá revogar a doação art
969/1 CC porque já foi aceite e não se verifica nenhum caso de ingratidão art 970º,
2034º e 2166º “ex vi” 974º CC).

Caso n.º 6
Décio, advogado reformado, doou à sobrinha, Débora, recém-licenciada em Direito, a
sua biblioteca jurídica, que mandou instalar no escritório desta. Dias depois, Décio
recebeu (como é hábito, aliás), um exemplar da Revista da Ordem dos Advogados
desse ano. Débora apresentou-se em casa de Décio reclamando a entrega do exemplar.
Quid iuris?
Estamos perante um contrato de doação, uma vez que reúne os seus três pressupostos
característicos deste contrato: uma diminuição patrimonial de Décio (biblioteca), uma
atribuição patrimonial geradora de enriquecimento para Débora (a mesma biblioteca)
e espírito de liberalidade (intenção de Décio de beneficiar Débora), art. 940º CC.
Décio e Débora presumem-se capazes de doar e receber doação à data da declaração
negocial, art 67º, art.948º e art 950º CC respetivamente.
Uma biblioteca é uma coisa composta (art 206ºCC) e móvel, pelo que se a doação não
for acompanhada pela tradição da coisa necessita de ser reduzida a escrito, art 947º/2
in fine, CC, o que se presume ter tido lugar.
Sendo os sujeitos capazes, o objeto da doação possível e determinado, e respeitando-
se a forma do contrato prevista por lei, a doação da biblioteca é válida.
O grande problema que aqui se coloca é saber se o exemplar anual da Revista da
Ordem dos Advogados que Décio recebeu posteriormente à doação estaria ou não
incluída na mesma e, consequentemente, saber se a donatária poderia ou não reclamá-
la.
Numa primeira via, afirmar-se-ia que a revista, individualmente considerada, seria um
bem futuro (art. 211ºCC) e, como tal, a doação não seria permitida, art 942º/1 CC.
Débora não poderia reclamar a entrega do exemplar.
O nº2 desse mesmo artigo possibilita, contudo, que os bens singulares (livros/revistas)
que venham integrar a universalidade (biblioteca) se considerem doados, se a
universalidade de facto continuar no uso e fruição do doador, salvo estipulação
contrária do doador.

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In casu, não nos parece que Décio continue a usar e usufruir da biblioteca isto porque
ele é um advogado reformado (presumindo-se um afastamento do seu estudo e ofício
jurídicos) e, também, pelo facto de ter mandado instalar a biblioteca no escritório de
Débora (materializando o distanciamento).
Assim, a revista jurídica, apesar de eventualmente poder vir a pertencer à biblioteca
(se Décio assim o determinar no futuro), não poderá ser reclamada por Débora.

Caso n.º 7
Dália, preocupada com o futuro de Duarte, seu afilhado, decide doar-lhe as rendas de
um imóvel que tem arrendado a Ana. Ana deixou de pagar as rendas (no valor de
€1.000,00 mensais) e Duarte apresenta-se em sua casa exigindo o pagamento e
ameaçando com o despejo.
Quid iuris?
Estamos perante um contrato de doação, uma vez que reúne os seus três pressupostos
característicos deste contrato: uma diminuição patrimonial de Dália (por transmitir a
sua posição enquanto credor a Duarte e sacrificar as rendas que iriam para o seu
património se não as doasse ), uma atribuição patrimonial geradora de enriquecimento
para Duarte e espírito de liberalidade (intenção de Dália de beneficiar Duarte), art.
940º CC.
Por se tratar do direito de crédito a receber as rendas, pelo art 219º a forma é livre.
Dália e Duarte presumem-se capazes tanto para doar como receber a doação, art 948º
e art 950º CC respetivamente.
A doação é valida.
Pergunta-se se Duarte, perante a falta de pagamento de rendas as pode exigir e se
poderá despejar Dália.
Uma vez que Duarte passa a ser credor do recebimento das prestações, poderá exigir
as rendas diretamente a Ana; não poderá, contudo, despejar Dália. Para poder despejar
Dália, Duarte precisaria de ser fundamentalmente proprietário do imóvel e se ter
verificado uma quebra de confiança objetiva, um incumprimento de tal forma grave
que o despejo fosse justificativo; continuando a ser Dália a proprietária, só ela poderia
despejar Ana.

Caso n.º 8

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Por escritura pública, Domingos doou à Associação das Mães Desvalidas um prédio
onde a mesma instalou a sua sede. Da escritura constava a seguinte cláusula:
«A AMD compromete-se a suportar a totalidade dos custos de frequência do ensino
secundário ou superior de, no mínimo, dez mães adolescentes recenseadas na
freguesia X por ano, desde que estas não tenham meios próprios para tanto. É
aplicável o artigo 966.º do Código Civil.».
Sucede, porém, que, em virtude do grande sucesso das últimas campanhas públicas de
planeamento familiar, já há três anos que não há na freguesia X mães adolescentes.
Domingos pretende saber o que pode fazer.
Estamos perante um contrato de doação uma vez que os três requisitos característicos
deste contrato se reúnem: uma diminuição patrimonial por parte de Domingos
(prédio), uma atribuição patrimonial geradora de enriquecimento à Associação e a
existência de um espirito de liberalidade, art 940º CC.
Ora, em primeiro lugar, como o objeto da doação é um prédio carece de escritura
publica, o que foi cumprido, art 942/1.
Relativamente à capacidade:
Domingos presume-se uma pessoa capaz de doar nos termos do art 948º/ do CC, art
67ºCC
A Associação de Mães Desvalidas é uma pessoa coletiva que não estando inibida de
receber doações, tem capacidade passiva, art 950º/1 CC.
A clausula que consta da escritura publica, é um encargo, por se tratar de uma
restrição na qual a Associação, ao receber o prédio se autoobriga a financiar os seus
custos de ensino de 10 mães adolescentes recenseadas na freguesia X, estamos
perante uma doação modal, art 963º/1CC.
Atendendo ao enunciado, conseguimos extrair que não existiam mães adolescentes na
região X, como tal o encargo não fisicamente possível, dando-se como não escrita nos
termos do art 2230º/1CC “ex vi” art 967ºCC. O encargo seria então ineficaz não
prejudicando o donatário, a Associação, salvo declaração contrária de Domingos, o
que não ocorreu.
Assim, a Associação continua a ter direito à doação do prédio, mas isenta de encargos.
Uma vez que não podia ser exigido à Associação o cumprimento do encargo (art
965ºCC), Domingos também não podia resolvê-lo nos termos do art 966ºCC, uma vez
que não se pode falar propriamente em incumprimento. Relembre-se ainda que

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também não se poderia revogar, uma vez que a Associação já aceitou a doação, art
969º/1CC.

Caso n.º 9

Ana, famosa atriz, adoece gravemente com um problema oncológico e é internada.


Enquanto está internada doa um valioso anel de diamantes, pertença da sua falecida
mãe e pelo qual tinha elevada estima, à médica assistente e encarregue das suas
sessões de tratamento. A médica recebe a joia e agradece o reconhecimento de Ana.
Ainda durante o internamento, Ana doa o seu colar de esmeraldas a Beatriz sua
agente.
Passados dez meses, quando sai do hospital, Ana está curada. Assim que Ana sai do
hospital, a sua irmã, Carla, estudante de Direito, refere-lhe que a doação feita à
médica é inválida. Carla informa ainda a irmã que Beatriz a burlou, causando-lhe um
prejuízo de 500.000 euros.
Ana não sabe o que pensar quanto à doação feita à médica e está decidida a abrir
processo-crime contra Beatriz e a também a exigir-lhe a restituição do colar de
esmeraldas.
Quid iuris?

Estamos perante um contrato de doação uma vez que os três requisitos característicos
deste contrato se reúnem: uma diminuição patrimonial por parte de Ana (anel de
diamantes e colar de esmeraldas), uma atribuição patrimonial geradora de
enriquecimento à médica e à Beatriz e a existência de um espírito de liberalidade, art
940º CC.
O anel de diamantes e o colar de esmeraldas são coisas móveis pelo que, a aceitação
sendo acompanhada pela tradição da coisa não depende de nenhuma formalidade
externa, art 942º/2 1ªparte CC.
Ana presume-se capaz de doar, uma vez que ao tempo da declaração negocial, art
948º/2, esta tem capacidade para contratar (art 67ºCC)
A médica e Beatriz também têm capacidade de receber a doação, uma vez que à data
da aceitação, não estão especialmente inibidas por lei, para o fazer art 950ºCC.
Colocam-se então duas perguntas: se a doação do anel à médica é válida e se

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pretendendo abrir um processo-crime contra Beatriz, se poderá exigir o retorno do


colar.
Para responder à primeira pergunta teremos de atender ao artigo 2194º “ex vi” art
953ºCC com as devidas adaptações, determinando, assim, que é nula toda a doação
efetuada durante o período de doença do doador, independentemente se o doador vier
a falecer dela ou não (o que se quer é tutelar os interesses do doador que se encontra
numa situação de especial fragilidade).
Assim, a doação do anel seria nula, Carla (irmã de Ana) teria razão.
Se efetivamente Ana profundamente grata de a médica lhe ter salvado a vida
continuasse a querer que a médica ficasse com o anel, então pelo art 968º, poderia
confirmar a doação. Ou então poderia meramente celebrar um novo contrato de
doação após a sua cura.
Relativamente à segunda questão, não se poderá falar numa indisponibilidade relativa,
art 953ºCC e, como tal, a doação de Beatriz não poderá ser declarada nula, mas
poderá ser revogada, nos termos do art 970º, por ingratidão.
O artigo 974º explicita que Ana poderá revogar por ingratidão se se verificar alguma
das ocorrências da indignidade (art2034ºCC) ou deserdação (art2166ºCC).
In casu, Beatriz burlou (crime doloso cuja pena vai até aos 3 anos de prisão, art
217º/1CP) a doadora, mas ainda não tinha sido condenada por isso.
Contudo, o artigo 2166º/2 estabelece que o deserdado será equiparado ao indigno,
logo a condenação poderá ser posterior à doação, mas só o crime relevará para o
efeito., preenchendo-se, portanto, a hipótese da alínea a) do art 2166º.
Assim, havendo fundamento de deserdação e não se verificando nenhuma das causas
de exclusão do art.975ºCC (não nos parece que a doadora queira perdoar Beatriz
depois desta lhe causar prejuizo de 50 000 euros e de se ter aproveitado de uma altura
de especial vulnearbilidade), Ana poderá revogar o contrato de doação. Poderá propor
uma ação para este efeito, uma vez que ainda não passou um ano desde que a doadora
soube do crime (art 976º/1CC) e, desta forma, conseguirá reaver o seu anel, art 978º/2
CC.

Caso n.º 10
Duarte, viúvo, é proprietário de duas vivendas geminadas e habita uma delas, estando

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CONTRATOS II – 3.º ANO TURMA A DIA

a outra por habitar.


Duarte viu a sua locomoção diminuída em razão de um acidente de viação. A sua
sobrinha, Elisa, de 20 anos, tem assistido o tio, levando comida diariamente a casa.
Duarte constituiu, por escritura pública, direito de usufruto a favor da sua sobrinha
Elisa sobre a vivenda que tem estado desabitada. Na escritura de doação, Duarte fez
constar uma cláusula que determina que, se Elisa casar, o contrato cessa a produção
dos seus efeitos.
Quid iuris?

Em primeiro lugar, é de aludir que os 3 pressupostos do contrato de doação estão


preenchidos, art 940º CC.
Duarte e Elisa são capazes nos termos do art 948º e 950 respetivamente do CC.
Acrescentei ainda que Duarte apesar da sua locomoção limitada, não é considerado
maior acompanhado e, como tal, não se estará perante um caso de indisponibilidade
relativa, art 2192ºCC
O enunciado não nos diz, mas eu presumo que a casa onde Duarte constituiu usufruto
a favor de Elisa, nos termos do art 958º/1 CC, tenha sido doada a outra pessoa e
partindo desta premissa, e foi neste sentido que eu resolvi o caso.
Duarte ao fixar uma cláusula que determina que o contrato cessa a produção dos seus
efeitos, está a colocar doação de usufruto sob condição, uma doação modal, art 963º
CC. A condição terá de obedecer às regras estabelecidas em matéria testamentaria nos
termos do artigo art 2230º e ss ex vi 967ºCC e 963/2 CC.
Ora, no caso, a condição da doação modal era uma condição resolutiva, 270ºCC, na
qual se Elisa se casasse, o efeito do contrato cessaria. Atendendo ao art 2233º/1 CC, a
condição de donatária celebrar ou não casamento é contrária à lei, pelo que numa
primeira acepção poderia pensar-se que estaríamos perante uma cláusula não escrita,
art 2230º/1CC. Contudo, é de atentar que o nº2 desse mesmo artigo consagra, numa
interpretação adaptada para o regime da doação determinando que a reserva de
usufruto a favor de Elisa poderá produzir efeito enquanto ela for solteira. Assim, a
condição é válida. Atenda-se que a clausula terá de ser registada nos termos do art 94º
b) CRP.

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