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de sinais
brasileira
SOBRE AS AUTORAS
Ronice Müller de Quadros é ouvinte, pedagoga, mestre e doutora em Lingüística, pro-
fessora e pesquisadora na UFSC/EED/Nucleind, coordenadora do Grupo de Estudos
Surdos – GES, consultora em cursos de formação de professores para surdos e intér-
pretes de língua de sinais. ronice@ced.ufsc.br
Lodenir Becker Karnopp é mestre e doutora em Lingüística, professora e pesquisadora
da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA). Atua na área de lingüística das línguas
de sinais e educação de surdos.
CDU 376.353
Versão impressa
desta obra: 2004
2007
© Artmed Editora S.A., 2004
Capa
Mário Röhnelt
Preparação do original
Simone Dias Marques
Leitura Final
Joana Jurema Silva da Silva
Supervisão editorial
Mônica Ballejo Canto
Projeto e editoração
Armazém Digital Editoração Eletrônica – rcmv
SÃO PAULO
Av. Angélica, 1091 - Higienópolis
01227-100 São Paulo SP
Fone (11) 3665-1100 Fax (11) 3667-1333
IMPRESSO NO BRASIL
PRINTED IN BRAZIL
Às nossas filhas
Raquel e Martina
que desde que foram concebidas trilharam
esta caminhada em parceria conosco.
AGRADECIMENTOS
Lodenir
Gisele Ronice
Estudar uma língua é sempre ter que se haver com as questões inquie-
tantes que a linguagem, aqui grafada como hiperônimo, nos coloca. É ter que
enfrentar seus mistérios, arcar com as perguntas que cada uma das explica-
ções que esboçamos sobre ela faz esgarçar. Se escutarmos o murmúrio de tais
incertezas, não há como não nos deixarmos afetar pelas interpelações que nos
fazem, ora sobre o que nossos saberes ajudam a endossar ou fabricar (e os
poderes que exercem), ora sobre as idealizações que fazemos ao nos apoiar-
mos em uma versão teórica particular sobre isso, que escapa à nossa completa
assimilação, e que, abstratamente, chamamos “linguagem”.
Isso sempre nos coloca em uma certa posição de estrangeiridade tanto em
relação a nós mesmos, pois, no limite, apenas podemos nutrir a ilusão de que
sabemos o que falamos, como em relação ao outro, cuja fala, embora possa nos
a Milton José de Almeida (Brasil: UNICAMP) pelas conversas argutas sobre as nuvens.
“– Do que gostas, então, estrangeiro? Gosto das nuvens...
– das nuvens que passam...
– ao longe... as maravilhosas nuvens!” (Charles Baudelaire)
x PREFÁCIO
(...) devemos admitir que nossa compreensão de fenômenos não triviais é sem-
pre extremamente limitada. Se isto é verdadeiro para a Física, é mais verdadei-
ro ainda para a Lingüística. Compreendemos fragmentos de real, e podemos estar
certos de que toda hipótese interessante e significativa só será parcialmente verda-
deira (...) (p. 173, grifo do autor)
3Chomsky,N. Diálogos com Mitsou Ronat. São Paulo: Cultrix, s.d. (Editado em francês pela
Flammarion, 1977.)
SUMÁRIO
Prefácio ............................................................................................................... ix
Regina Maria de Souza
O QUE É LINGÜÍSTICA?
2Lingüística gerativa – estudo dos princípios que regem a linguagem – detém-se na identifica-
ção dos universais lingüísticos e na explicação da natureza mental da língua humana. A língua,
nessa concepção, apresenta a função preponderante de ser a “expressão do pensamento”.
LÍNGUA DE SINAIS BRASILEIRA 17
ÁREAS DA LINGÜÍSTICA
Fonética e fonologia
Fonética
Fonologia
Morfologia
Sintaxe
Semântica
Pragmática
que foi dito), dos atos de fala (como se organizam os atos de fala e quais as
condições que observam), das implicaturas (as coisas que estão subentendi-
das nas entrelinhas, incluindo o significado que não foi dito explicitamente) e
dos aspectos da estrutura conversacional (a estrutura das conversas entre duas
ou mais pessoas e a organização da tomada de turnos durante a conversação).
Um exemplo de implicatura seria o seguinte:
Interfaces da lingüística
Viu-se até agora que a lingüística pode ser definida como o estudo cientí-
fico da língua natural humana – uma ciência que descreve línguas em todos os
seus aspectos e formula teorias de como elas funcionam. Mas, o que exata-
mente é língua? Qual a diferença entre língua e linguagem? As pessoas fre-
qüentemente usam a palavra linguagem em uma variedade de sentidos:
linguagem musical, linguagem corporal, linguagem das abelhas, entre outras
possibilidades. Este livro, entretanto, utiliza essa palavra para significar o sis-
tema lingüístico que é geneticamente determinado para desenvolver-se nos
humanos. Os seres humanos podem utilizar uma língua de acordo com a
modalidade de percepção e produção desta: modalidade oral-auditiva (por-
tuguês, francês, inglês, etc.) ou modalidade visuoespacial (língua de sinais
brasileira, língua de sinais americana, língua de sinais francesa, etc.).
Mas como definir língua e linguagem? Como distinguir uma língua de
outros sistemas de comunicação?
Sabe-se que para o vocábulo inglês language encontram-se, no portugu-
ês, dois vocábulos: língua e linguagem. A diferença entre as duas palavras
está correlacionada, até certo ponto, com a diferença entre os dois sentidos da
palavra inglesa language. A palavra linguagem aplica-se não apenas às lín-
guas português, inglês, espanhol, mas a uma série de outros sistemas de co-
municação, notação ou cálculo, que são sistemas artificiais e não naturais. Por
exemplo, em português, a palavra linguagem é usada com referência à lin-
guagem em geral, e a palavra língua aplica-se às diferentes línguas. O vocábu-
lo linguagem, em português, é mais abrangente que o vocábulo língua, não só
porque é usado para se referir às linguagens em geral, mas também porque é
aplicado aos sistemas de comunicação, sejam naturais ou artificiais, humanos
ou não.
O lingüista, a princípio, lida com as línguas naturais. Para Lyons (1987),
a pergunta “o que é língua e linguagem?” traz em si a pressuposição de que
cada uma das milhares de línguas naturais, reconhecidamente distintas, é um
caso específico de algo mais geral. O que o lingüista quer saber é se as línguas
naturais, todas, possuem em comum algo que não pertença a outros sistemas
de comunicação, humano ou não, de tal forma que seja correto aplicar a cada
uma delas a palavra “língua”, negando-se a aplicação deste termo a outros
sistemas de comunicação.
Uma breve revisão da literatura permite encontrar uma série de defini-
ções de língua. Tais definições fornecem subsídios para a indicação de proprie-
dades consideradas pela lingüística essenciais às línguas naturais. Saussure
(1995, p. 17) coloca que “língua não se confunde com linguagem: é somente
LÍNGUA DE SINAIS BRASILEIRA 25
Flexibilidade e versatilidade
Segundo Lyons (1981), pode-se usar a língua para dar vazão às emoções
e sentimentos; para solicitar a cooperação de companheiros; para ameaçar ou
prometer; para dar ordens, fazer perguntas ou afirmações. É possível fazer
referência ao passado, presente e futuro; a realidades remotas em relação à
situação de enunciação – até mesmo a coisas que não existem. Nenhum outro
26 QUADROS & KARNOPP
Arbitrariedade
Descontinuidade
Criatividade/produtividade
Dupla articulação
Padrão
Dependência estrutural
A criança
Ela gritou.
A criança doente e machucada
(...)para Whitney, que considera a língua uma instituição social da mesma espé-
cie que todas as outras, é por acaso e por simples razões de comodidade que nos
servimos do aparelho vocal como instrumento da língua; os homens poderiam
também ter escolhido o gesto e empregar imagens visuais em lugar de imagens
acústicas.
Mito 1
5Obviamente que as marcações não-manuais associadas a estes sinais não são equivalen-
tes: a primeira envolve a expressão facial de negação e a segunda, de interrogação.
LÍNGUA DE SINAIS BRASILEIRA 33
Mito 2
Mito 3
Mito 4
Mito 5
Mito 6
PASSAR-UM-PELO-OUTRO
LÍNGUA DE SINAIS BRASILEIRA 39
foi feita uma junção de palavras por hifens, como ilustrado no sinal PASSAR-
UM-PELO-OUTRO.
As palavras que são expressas através do alfabeto manual são representa-
das pelas letras do alfabeto separadas por hifens, conforme aparece no exem-
plo C-A-N-C-U-N.6
C-A-N-C-U-N
6O alfabeto manual representa as letras do alfabeto das línguas orais. É usado por surdos
para identificar nomes próprios e palavras da língua portuguesa, quando necessário.
40 QUADROS & KARNOPP
<PINTAR-COM-ROLO>cl
a) intensidade do sinal + , ++
<ENTREGAR-PARA-ALGUÉM>do
<QUE>qu
<QUE>qu~~
LÍNGUA DE SINAIS BRASILEIRA 43
<QUE>qu~
f) Interrogativa 4 – são aquelas que objetivam uma resposta sim ou não < > sn
8O sinal do verbo que está traduzido/transcrito como GOSTAR aparece em vários exem-
plos por não incorporar a negação como o sinal comumente traduzido como GOSTAR o
faz. Vale destacar que há diferença entre este GOSTAR e o outro GOSTAR, que talvez
justifique em alguns casos a tradução deste sinal como DESEJAR. No entanto, preferiu-se
manter a tradução usada aqui, embora em alguns contextos seja de fato DESEJAR, mas
não necessariamente nos contextos aqui apresentados.
LÍNGUA DE SINAIS BRASILEIRA 45
Vale ainda mencionar que o termo LIBRAS é comumente usado para refe-
rir a língua de sinais brasileira em nosso País. No entanto, optou-se por não
utilizar nenhuma sigla para referir a língua em estudo, pois há também outras
siglas para referi-la, como, por exemplo, a sigla LSB, utilizada internacional-
mente, seguindo os padrões de identificação para as línguas de sinais.
LÍNGUA DE SINAIS BRASILEIRA 47
INTRODUÇÃO
1No original: Contrary to how the average individual defines deafness – that is, as an
audiological impairment – deaf people define themselves culturally and linguistically.
2No original: The phonologist’s task is to ascertain which are the minimal units of the system,
which aspects of this signal are contrastive, and how these units are constrained by the sensory
differences and similarities between signed and spoken languages.