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Bernardo Martins Zonta, Danton Capistrano Ferreira, Gustavo Sborz,

Iliane Medeiros Santos, Juan Peres de Oliveira, Lauro Schweitzer sebold, Ramon
Huntermann
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TANATOLOGIA: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

THANATOLOGY: A LITERATURE REVIEW

TANATOLOGÍA: UNA REVISIÓN DE LA LITERATURA

Bernardo Martins Zonta1


Danton Capistrano Ferreira2
Gustavo Sborz3
Iliane Medeiros Santos4
Juan Peres de Oliveira5
Lauro Schweitzer Sebold6
Ramon Huntermann7

DOI: 10.54751/revistafoco.v15n2-025
Recebido em: 05 de Setembro de 2022
Aceito em: 03 de Outubro 2022

RESUMO
A tanatologia é uma área de estudo recente, e pode ser definida de forma sintetizada
como o estudo da morte, segundo o dicionário Houaiss, a tanatologia é estabelecida
como a“Teoria ou estudo científico sobre a morte, suas causas e fenômenos a ela
ligados”. Por atanatologia abranger vários fenômenos ligados à morte isso a faz
uma ciência com com grande participação em outras áreas que possam estar
relacionadas direta ou indiretamentecom a morte, a exemplo dos cuidados paliativos,
1
Acadêmico de Medicina. Centro Universitário para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí
(UNIDAVI). Rua Guilherme Gemballa, 13, Jardim América, Rio do Sul - SC, CEP:89160-932.
E-mail: bernardo.zonta@unidavi.edu.br
2
Academico de Medicina. Centro Universitário para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí
(UNIDAVI). Rua Guilherme Gemballa, 13, Jardim América, Rio do Sul - SC, CEP:89160-932.
E-mail: danton.ferreira@unidavi.edu.br
3
Acadêmico de Medicina. Centro Universitário para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí
(UNIDAVI). Rua Guilherme Gemballa, 13, Jardim América, Rio do Sul - SC, CEP:89160-932.
E-mail: sborzgustavo@gmail.com
4
Doutora em Sociologia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Centro Universitário
para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí (UNIDAVI). Rua Guilherme Gemballa, 13, Jardim América,
Rio do Sul - SC, CEP:89160-932. E-mail: Ilianemedeiros@unidavi.edu.br
5
Acadêmico de Medicina. Centro Universitário para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí
(UNIDAVI). Rua Guilherme Gemballa, 13, Jardim América, Rio do Sul - SC, CEP:89160-932.
E-mail: juan.peres@unidavi.edu.br
6
Acadêmico de Medicina. Centro Universitário para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí
(UNIDAVI). Rua Guilherme Gemballa, 13, Jardim América, Rio do Sul - SC, CEP:89160-932.
E-mail: Lauro.sebold@unidavi.edu.br
7
Acadêmico de Medicina. Centro Universitário para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí
(UNIDAVI). Rua Guilherme Gemballa, 13, Jardim América, Rio do Sul - SC, CEP:89160-932.
E-mail: ramon.huntermann@unidavi.Edu.br

Revista Foco |Curitiba (PR)| v.15.n.2|e379| p.01-22 |2022


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TANATOLOGIA: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

antropologia forense, psicologia e fisiologia. O conhecimento da tanatologia sobre os


processos que acontecem no ante-mortem são de suma importância dentro dos
cuidados paliativos, pois é necessário ter a intelecção dosprocessos psicológicos que
apresentam o paciente em estágio de terminalidade, com a finalidade de responder
dúvidas que o mesmo possa apresentar, tentando amenizar o máximo possível o
sofrimento que o paciente irá passar durante todos os processos de uma morte iminente.
O entendimento dos processos post-mortem estão muito relacionados à antropologia
forense, tendo como braço fundamental da tanatologia. Tal ciência encarrega-se de
estudar ascausas que geraram a morte, investigando-se os diversos núcleos nos quais
o indivíduo encontra-se inserido, para que não apenas seja investigada a causa da
morte, mas a todo âmbito que aquele indivíduo encontrava-se circundado.

Palavras-chave: Tanatologia; antropologia forense; cuidados paliativos.

ABSTRACT
Thanatology is a recent area of study, and can be defined synthesized as the study of
death, according to the Houaiss dictionary, thanatology is established as the "Theory or
scientific study on death, its causes and phenomena linked to it". Because thanatology
covers several phenomena related to death this makes it a science with great
participation in other areas that may be directly or indirectly related to death, such as
palliative care, forensic anthropology, psychology and physiology. The knowledge of
thanatology about the processes that take place in the ante-mortem are of paramount
importance within palliative care, because it is necessary to have the information of the
psychological processes that present the patient in terminal stage, in order to answer
doubts that he can present, trying to alleviate as much as possible the suffering that the
patient will go through during all the processes of an imminent death. The understanding
of post-mortem processes are very related to forensic anthropology, having as a
fundamental arm of tanatology. This science is responsible for studying the causes that
generated death, investigating the various nuclei in which the individual is inserted, so
that not only the cause of death is investigated, but in every area thatthat individual was
surrounded.

Keywords: Thanatology, forensic; anthropology; palliative care.

RESUMEN
La tanatología es un área de estudio reciente, y puede definirse sintéticamente como el
estudio de la muerte, según el diccionario Houaiss, la tanatología se establece como la
"Teoría o estudio científico sobre la muerte, sus causas y los fenómenos ligados a ella".
Porque la tanatología abarca diversos fenómenos vinculados a la muerte que la
convierten en una ciencia con gran participación en otras áreas que pueden estar
relacionadas directa o indirectamente con la muerte, como los cuidados paliativos, la
antropología forense, la psicología y la fisiología. El conocimiento de la tanatología sobre
los procesos que tienen lugar en el ante-mortem son de suma importancia dentro de los
cuidados paliativos, ya que es necesario tener la intelecção de los procesos psicológicos
que presentan el paciente en etapa de terminalidad, con el fin de responder a las dudas
que el mismo puede presentar, tratando de mitigar lo más posible el sufrimiento que el
paciente va a pasar durante todos los procesos de una muerte inminente. La
comprensión de los procesos post-mortem están estrechamente relacionados con la
antropología forense, teniendo como brazo fundamental la tanatología. Esta ciencia se
encarga de estudiar las causas que generaron la muerte, investigando los distintos
núcleos en los que está inserto el individuo, de manera que no sólo se investiga la causa
de la muerte, sino todo el entorno del que estaba rodeado ese individuo.

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Palabras clave: Tanatología; antropología forense; cuidados paliativos.

1.Introdução
A morte é definida por ser um processo inevitável e universal, ocorrendo
com todos os seres vivos. Caracterizar a morte somente como a cessação
permanente e irreversível de todas as funções biológicas seria uma maneira
muito simplista de observá-la, uma vez que ela compreende períodos que vão
desde o diagnóstico de uma doença terminal ao estudo de cadáveres após a
morte.
No presente artigo abordou-se sobre aspectos do período que antecede
a morte, os Cuidados Paliativos, trazendo desde seus conceitos a seu aspecto
histórico. Reconhecido como um método revolucionário de amparo à saúde, os
Cuidados Paliativos estão focados no cuidado holístico dos pacientes em estágio
terminal, minimizando seu sofrimento por controle dos sintomas e contemplando
os aspectos psicológicos e espirituais. Deste modo, promove-se a aceitação da
morte por parte do enfermo e familiares e a vivência deste processo natural,
superando assim a cultura de negação da morte.
Considerando a importância dos estudos diante de pesquisas
tanatológicas, sendo uma ferramenta de extrema importância, transpondo a
outros temas que regem a sociedade, a tanatologia é a parte da medicina legal
que aborda sobre a morte, dos fenômenos relacionados a ela, e a legislação que
lhe concerne. Ou seja, é uma ciência que vai surgir com a finalidade de
esclarecer a realidade da morte, as características ante e pós-morte e, desta
forma, colaborar para o diagnóstico diferencial médico-legal. No íntimo de
pesquisadores da tanatologia, ainda .existem divergências para conceituar a
morte, gerando diversas discussões.
Visto a importância do tema para os trabalhadores da saúde, este artigo
busca destrinchar o estudo tanatológico sob óptica dos fatores de complicação
do processo de luto nas mais diversas causas de morte, idade e culturas para
auxiliar esses profissionais a reconhecerem e compreenderem seus pacientes.

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Além das análises específicas acerca do processo de morte, será


abordada a questão da compreensão tanatológica ao longo dos diversos
períodos históricos, relacionando o contexto de cada período do passado
recente e do presente com a concepção e interpretação do ser humano no
período pré e pós-morte. É importante salientar que a interpretação do Homem
em qualquer decisão individual é regida principalmente pelo conhecimento e pelo
contexto em que cada indivíduo esteja inserido, ocasionando em uma gama de
variação de interpretação de ações em um mesmo período histórico. A
abordagem a ser destrinchada é em meio a uma conjuntura geral na concepção
ocidental, algo que está mais próximo do objetivo da pesquisa.
Como objetivo de estudo perante as análises tanatológicas, apresenta-se
como uma ferramenta de extrema utilidade, a Antropologia Forense. A prática
dessa ciência nos compreende identificar diversidades perante o material
ofertado, como, idade, sexo, hierarquização social, trabalho, causa da morte,
situação social entre outras coisas sobre o estudado. É de extrema importância
abordar os protocolos de forma correta, pois, o material histórico é um patrimônio
cultural de toda sociedade, e, o estudo do cadáver nos suscita entender sobre
diversos núcleos nos quais o indivíduo estava inserido.

2. Materiais e métodos
Foi realizada uma pesquisa bibliográfica, buscando informações sobre
Tanatologia, por meio de pesquisas no Google Acadêmico®, PubMed®, na base
de dados SciELO®, livros, artigos e demais trabalhos que versam sobre o tema.

3. Ante Mortem
3.1 Cuidados Paliativos
Segundo Cabe-Willians Wilson (2009), a faixa etária que mais cresce na
civilização contemporânea são idosos com idade entre 80 e 89 anos. Apesar
disso, o aumento do grupo populacional correspondente a esta idade não
implica, necessariamente, em uma melhor qualidade na velhice ou após o
processo de adoecimento. A evolução científica na área da saúde, somado à
intensa procura para a cura de doenças, segundo Galriça Neto (2010), fez

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surgir uma cultura de negação da morte, postergando os estudos e intervenções


de saúde voltados para um término de vida apropriado, em situações em que a
cura não seja garantida. Deste modo, a morte e seu processo pelos profissionais
de saúde foram desprezadas e vistas como insucesso e fracasso.
Diante desse retrato complexo e desafiador da realidade, os Cuidados
Paliativos se apresentam como uma forma inovadora de assistência na área da
saúde e vêm ganhando espaço no Brasil na última década. Diferencia-se
fundamentalmente da medicina curativa por focar no cuidado integral, através da
prevenção e do controle de sintomas, para todos os pacientes que enfrentam
doenças graves, ameaçadoras da vida. Esse conceito se aplica, de fato, ao
paciente e seu entorno, que adoece e sofre junto – familiares, cuidadores e
também a equipe de saúde (Matsumoto, 2012 apud GOMES; ETHERO, 2016).
Os cuidados paliativos começaram durante a Idade Média e as Cruzadas,
no período da Antiguidade por organizações religiosas. Nesta época, era comum
a existência de casas denominadas de Hospices, que correspondiam a
hospedarias destinadas a cuidar de peregrinos e viajantes, abrigando pobres,
realizando pobres e, principalmente, realizando o trabalho de alívio de
sofrimentos do que a busca pela cura. O termo paliativo, do latim pallium,
posteriormente utilizado, remete ao manto utilizado pelos cavaleiros das
Cruzadas para protegerem-se de tempestades. A nomenclatura reflete sua ideia
principal, proteger e amparar (MATSUMOTO, 2012).
Oficialmente, através da médica, enfermeira e assistente social Cicely
Saunders, os Cuidados Paliativos vieram a surgir na década de 1960. Cicely
dedicou seus esforços ao alívio do sofrimento humano e iniciou os cuidados
paliativos criando no ano de 1967, em Londres, o St. Christophers Hospice,
primeiro atendimento a oferecer cuidados holísticos aos enfermos, preocupando-
se com seus sintomas, além de amenizar o processo de adoecimento psicológico
e físicos e enfrentamento da morte. (Du Boulay, 2007).
Poucos anos depois, em 1970, a psiquiatra suíça residente nos Estados
Unidos, Elisabeth Kübler-Ross, trouxe esta revolução para a América, após
conhecer Cicely Saunders. Em 1974, no estado de Connecticut, nos Estado

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Unidos, Elisabeth fundou um hospice, fato este que alavancou os cuidados


paliativos que passaram a ser utilizados em diversos países em enfermos
ausentes de possibilidade terapêutica para cura. (MATSUMOTO, 2012).
No ano de 1990 então, a Organização Mundial da Saúde - OMS
reconheceu os cuidados paliativos e definiu seus conceitos que, inicialmente,
estavam voltados para enfermos portadores de câncer, sendo um eixo para
o tratamento destes pacientes (OMS, 2007).
Atualmente, a OMS possui um conceito amplo das ações promovidas
pelos cuidados paliativos, além do espectro de pacientes a serem submetidos
ao tratamento ter sido expandido:

Cuidados Paliativos são uma abordagem para melhoria da qualidade


de vida de pacientes e familiares que enfrentam uma doença
ameaçadora da vida, através da prevenção e do alívio do sofrimento,
através da identificação precoce e impecável avaliação e tratamento
da dor e outros problemas, físicos, psicossociais e espirituais (OMS,
2002)

A partir dos conceitos da OMS, Matsumoto (2012) elencou os principais


princípios dos cuidados paliativos:
1. Promover o alívio da dor e outros sintomas desagradáveis a partir
da prescrição de fármacos (Morfina, Haloperidol, Diazepam e Nistatina),
além de contemplar os aspectos psicológicos e espirituais. Os sinais e
sintomas de enfermos em fase final de vida são muito similares,
independente da doença que seja. Os sintomas mais comuns, que
surgem nos últimos momentos de vida e são assistidos aos pacientes em
cuidados Paliativos são: “anorexia, astenia, confusão mental,
constipação, boca seca, dispnéia, náuseas e vômitos, dor, delírio,
sudorese e disfunção urinária, além de alteração do sono/vigília e
depressão.” (KIRA, 2008).
2. Afirmar a vida e considerar a morte como um processo normal da
vida
3. Não acelerar nem adiar a morte, deixando claro que cuidados
paliativos não possuem relação alguma com a eutanasia
4. Integrar os aspectos psicológicos e espirituais no cuidado ao
paciente. A doença terminal e o processo de luto com o qual paciente e

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família são obrigados a conviver é uma novidade que ambos não estão
preparados. Isto traz sentimentos de angústia, medo e depressivos que a
espiritualidade individual conforta cada enfermo.
5. Oferecer um sistema de suporte que possibilite o paciente viver tão
ativamente quanto possível, até o momento da sua morte.
6. Oferecer sistema de suporte para auxiliar os familiares durante a
doença do paciente e a enfrentar o luto. Transtornos de saúde mental têm
um impacto importante na vida das pessoas e na sociedade. Uma melhor
assistência paliativa reduz potencialmente esse impacto no núcleo
familiar e social do paciente que também adoece

7. Abordagem multiprofissional para focar as necessidades dos


pacientes e seus familiares, incluindo acompanhamento no luto.
8. Melhorar a qualidade de vida e influenciar positivamente o curso
da doença, ou seja, controlar os sintomas do processo de adoecimento
do paciente, atender seus desejos e suas necessidades e permitir o
convívio com seus familiares
9. Deve ser iniciado o mais precocemente possível, juntamente com
outras medidas de prolongamento da vida, como a quimioterapia e a
radioterapia, e incluir todas as investigações necessárias para melhor
compreender e controlar situações clínicas estressantes. Segundo a
definição da OMS (2007), os cuidados paliativos devem ser iniciados
desde o diagnóstico de doenças graves, progressivas e incuráveis, que
ameacem a continuidade da vida. No entanto, se isto fosse cumprido
como deveria, grande contingente dos pacientes continuaria sem auxílio
paliativo, pois não há disponibilidade de profissionais da área da saúde
que daria conta de atender os enfermos (ARANTES, 2012).
Deste modo, pode ser listado como o principal guia para assistência em
cuidados paliativos: “prevenção e controle de sintomas; intervenção
psicossocial e espiritual; paciente e família como unidade de cuidados;
autonomia e independência, comunicação e trabalho em equipe
multiprofissional” (GOMES; OTHERO, 2016) .

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O paciente sobre cuidados paliativos deseja ser compreendido,


necessitando que os profissionais de saúde resgatem o relacionamento
interpessoal empático, possuindo uma relação alicerçada na compaixão,
respeito e humildade. A implementação desses princípios só é possível através
de habilidades de comunicação com estes pacientes terminais. Deve-se buscar
a comunicação aberta e ativa, em um processo de confiança e vínculo com o
paciente e a família, considerando-se sempre a disponibilidade de informações
através da verdade lenta juntamente a técnicas como o protocolo Spike. (SILVA;
ARAÚJO, 2012)

3.2 Processo de luto


O processo de luto é caracterizado pelas fortes emoções e sentimentos
que a expectativa de perda ou morte de alguém. Ao contrário do que muitos
pensam o luto começa no recebimento da notícia da doença nos casos de
pacientes em estado de terminalidade, sendo este um processo multifacetado
onde diversos fatores biológicos-psicológicos regem o comportamento e atitude
daqueles que o vivem, e devem ser entendidos pelos profissionais responsáveis
pelos cuidados paliativos a fim de gerar um melhor acolhimento.
As pesquisas sobre luto verificam como as perdas afetam estruturas de
significado na vida, em situação de transição existencial. Dados
epidemiológicos apontam que ocorrem mortes após viuvez por supressão do
sistema imunológico, como aponta Parkes (1998). Distúrbios psíquicos podem
se manifestar como sintomas físicos e médicos são procurados por pessoas
enlutadas com vários sintomas incluindo: depressão, insônia, anorexia, aumento
no uso de álcool e drogas. Estes sintomas são relacionados ao processo de luto
e não vistos como doença, como atestam os estudos do autor, que apontam
singularidades no processo de luto, enfatizando o importante papel de aspectos
culturais, fases do desenvolvimento e fatores de risco para o luto complicado.
Atualmente, a preocupação é com o luto de idosos, pela perda de pessoas de
referência, problemas financeiros, solidão e doenças graves. Idosos estão
enterrando filhos adultos, vivendo, por vezes sozinhos, esta perda tão difícil. O
luto parental é tema atual em virtude do aumento da violência nas grandes

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cidades, como aponta Rangel (2005). O luto complicado, anteriormente


considerado patológico, suscita controvérsias. Segundo Franco (2010), é preciso
cuidado para não classificar lutos como disfuncionais. É fundamental que sejam
identificados fatores de risco; tendências sócio-culturais e observar o que é
necessário ser cuidado em pessoas enlutadas. Suicídios e acidentes trazem
sofrimento, envolvendo violência e culpa, por outro lado, doenças prolongadas
com sofrimento são desgastantes, dificultando o luto.
Maria Helena Franco especialista brasileira em luto e membro do
International Work Group on Death, Dying and Bereavement apresenta as
questões pesquisadas sobre o tema no mundo e no Brasil. Em obra coordenada
por ela (Franco, 2010) indica que o luto é processo normal de elaboração de
perdas, como doença aparece a versão atual do DSM V. Nesta obra, luto, que
se estende por mais de duas semanas, é considerado como depressão,
necessitando atendimento profissional, uma forma de medicalização de um
processo natural da existência, como forma de elaboração de perdas. A autora
enfatiza a polêmica da questão ao diferenciar o pesar suscitado pela perda de
pessoas significativas e a depressão. Teorias mais recentes buscam
compreender as singularidades do processo de luto, a história pessoal e a
construção de significados a partir da elaboração da perda. Há a compreensão
de que vínculos são contínuos e não se encerram com a morte. A compreensão
do processo dual do luto, citado por Mazzorra (2009), considera o sofrimento
pela perda concomitante com a tentativa de reorganização da vida. Pessoas
enlutadas oscilam entre as duas funções na readaptação da vida sem o morto.
Elizabeth Kubler-Ross, médica psiquiatra suíça foi uma dos primeiros
profissionais a tratar e versar os aspectos psicossociais em pacientes terminais.
Ela tratou em seu livro On Death Or Dying (1969) as cinco fases do processo de
luto nos pacientes que receberam o prognóstico de terminalidade. Essas fases
são descritas a seguir.

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3.2.1 Estágio de Negação


O estágio de negação consiste na negação do diagnóstico negativo de
ente próximo ou de si mesmo, podendo muitas das vezes pacientes busquem
explicações homéricas para invalidar o parecer médico. Segundo Kubler-Ross
(1969) “A negação, ou pelo menos a negação parcial, é usada por quase todos
os pacientes, ou nos primeiros estágios da doença ou logo após a constatação,
ou, às vezes, numa fase posterior.”
Este estágio pode funcionar como um escudo, protegendo o paciente da
notícia intensa nos períodos prévios, até que o mesmo possa raciocinar sobre a
mesma. Kubler-Ross ainda afirma que “a negação é uma defesa temporária,
sendo logo substituída por uma aceitação parcial.”

3.2.2 Estágio de Raiva


O estágio de negação é seguido pelo estágio da raiva, onde o paciente
apresenta um quadro emocional bastante intempestivo, onde rompantes de raiva
são comuns, e direcionados a qualquer pessoa ou objeto. Segundo Kubler-Ross
“Contrastando com o estágio de negação é muito difícil, do ponto de vista da
família e do pessoal hospitalar, lidar com o estágio da raiva. Deve-se isso ao fato
de esta raiva se propagar em todas as direções e projetar-se no ambiente, muitas
vezes sem razão plausível.”

3.2.3 Estágio de Barganha


O estágio da Barganha é posterior ao da raiva, aqui o paciente costuma
se acalmar e buscar de diversas maneiras de reverter o seu quadro, onde o
mesmo tem a falsa ideia ou convicção que sua terminalidade pode ser revertida,
e busca meios para atingir uma cura inexorável para sua doença. Parafraseando
Kubler-Ross (1969) "A barganha, na realidade, é uma tentativa de adiamento;
tem de incluir um prêmio oferecido “por bom comportamento”.
Nesse estágio é comum que pacientes realizem promessas, contando
com que alguma “entidade” curem suas enfermidade caso a promessa seja
cumprida.

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3.2.4 Estágio da Depressão


Neste estágio o paciente faz a transição de uma ideia fictícia de uma
possível resolução de seu caso para a fria realidade de seu prognóstico, o que
acompanha uma profunda depressão e desolação. O paciente pode ter o desejo
de permanecer longos períodos de tempo recluso em seu quarto em um estágio
anedonia e anergia.

Quando o paciente em fase terminal não pode mais negar sua doença,
quando é forçado a submeter-se a mais uma cirurgia ou hospitalização,
quando começa a apresentar novos sintomas e tornar-se mais
debilitado e mais magro, não pode mais esconder a doença, Seu
alheamento ou estoicismo, sua revolta e raiva cederão lugar a um
sentimento de grande perda KUBLER-ROSS (1969).

3.2.5 Estágio de Aceitação

Um paciente que tiver tido tempo necessário (isto é, que não tiver tido
uma morte súbita e inesperada) e tiver recebido alguma ajuda para
superar tudo conforme descrevemos anteriormente atingirá um estágio
em que não mais sentirá depressão nem raiva quanto a seu destino”
Kubler-Ross (1969).

Neste estágio, os pacientes aceitam seu porvir iminente, o que após de


tanto tempo em uma luta incansável contra a morte inevitável, o que geralmente
ocasiona num sentimento de alívio, fazendo com que o paciente possa se
alimentar e dormir melhor. Ainda segundo Kubler-Ross (1969) “Não se
confunda aceitação com um estágio de felicidade. É quase uma fuga de
sentimentos. É como se a dor tivesse esvanecido, a luta tivesse cessado e fosse
chegado o momento do repouso derradeiro antes da longa viagem”.

4. Mors
4.1 Tanatologia
A tanatologia forense é a parte da medicina legal que aborda sobre a
morte, dos fenômenos relacionados e da legislação que lhe é concernente. Ou
seja, é uma ciência que vai surgir com a finalidade de esclarecer a realidade da
morte, as características ante e pós-morte e, desta forma, colaborar para o

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diagnóstico diferencial médico-legal. O exame tanatológico constitui-se de


grande importância pericial, definindo tempo, causa e até o local da morte,
utilizando-se também de características peculiares presentes no cadáver,
podendo até finalizar um caso de difícil elucidação por meio da análise e exame
dos arcos dentais.

4.2 Conceito de morte, critérios, protocolo e o ser médico frente a isso


Tanatologia médico-legal é a parte da Medicina Legal que estuda a morte
e o morto, e as suas repercussões na esfera jurídico-social. Hoje, por meio dos
critérios estabelecidos pelo Conselho Federal de Medicina (Resolução CFM no
1.480/97), a morte, para fins de remoção de órgãos e tecidos para transplantes,
está definida pelo que se chama de morte encefálica. Por sua vez, a Resolução
CFM no 1.826/2007 dispõe sobre a legalidade e o caráter ético da suspensão
dos procedimentos de suportes terapêuticos quando da determinação de morte
encefálica de indivíduo não doador, em conformidade com a Lei no 9.434, de 4
de fevereiro de 1997.
A definição mais simples e tradicional de morte é aquela que a
considerava como a cessação total e permanente das funções vitais, e assim
a lei admitia, sem procurar se aprofundar em seus detalhes. Esse conceito,
antes admitido, constituiu-se por muito tempo ponto pacífico, até que surgiram
os modernos processos de transplantação de órgãos e tecidos, passando, daí
em diante, a se rever o exato momento de considerar alguém morto. Não se
pode atualmente aplaudir a ideia de que o corpo só pode estar em dois estados
– de vida ou de morte –, pois é sabido que a morte se produz por etapas
sucessivas, em determinado espaço de tempo, individualizado e dependente de
sua causa, e, por isso, não é ela simplesmente um momento ou um instante,
como defendem os espiritualistas, mas um verdadeiro processo.
Antes, em 1967, Breecher de Harvard (Med. Tribune, N.Y., 25 de
dezembro de 1967) disse: “Os desejos de aceitar os critérios de lesão cerebral
irreversível para formular uma nova concepção de morte procedem de certos
interesses criados.” E, entre esses interesses criados, citou os das famílias que
desejam acabar com a interminável agonia, suprimindo as medidas de

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reanimação; os dos cirurgiões, que buscam órgãos frescos para transplante; e


os da sociedade em geral, alarmada ante os gastos da assistência dos casos
desesperadores e considerados irrecuperáveis.
O critério de morte cerebral, entre outros, é baseado na cessação da
atividade elétrica do cérebro, tanto do córtex como das estruturas mais
profundas. Porém, a interpretação pelo EEG criou várias controvérsias.
Wertheimer e Jouvet (Press Medical, 1969, 67, 87) foram os primeiros a propor
uma nova definição, a de morte encefálica, baseada em critérios clínicos e
eletroencefalográficos. Um EEG silencioso é indício de morte quando
persistente. No entanto, as intoxicações barbitúricas têm demonstrado que o
EEG aparentemente isoelétrico pode persistir durante horas ou dias, podendo o
paciente restabelecer-se (Haider e cols., British Medical Journal, trad. do A., p.
314, 3 de agosto de 1968 – Estatística de 5 casos).
Revilard de Lyon propõe, ainda, a interrupção da circulação cerebral
comprovada por angiografia e a ausência de reação à atropina.
Gerin e Frache apresentam como prova irrefutável e irreversível da morte
o eletroencefalograma associado à injeção intracardíaca de epinefrina. A
permanência de um traçado nulo, sem a mais leve oscilação, permite um
diagnóstico de morte real (Villanova y Morales, Injertos y Transplantes del
Cadáver, Madri: Editora Paz Montalvo, 1969).
A Sociedade Alemã de Cirurgia pediu ao seu comitê de reanimação e
transplante de órgãos uma definição de morte. O comitê, ao apreciar em Der
Chirurg (abril de 1968, 38, 196) e em outras revistas alemãs, informou que, na
prática, existem três condições para precisar a morte:

I. O cérebro está morto quando: a) observam-se os sinais


clássicos de morte ou b) a depressãocirculatória tenha provocado uma
parada respiratória ou cardíaca que não responde ao tratamento no
final da doença incurável e progressiva ou no curso de uma perda
gradual das funções vitais;
II. A morte cerebral pode produzir-se antes que cessem os
batimentos cardíacos(traumatismos cerebrais); considerar-se-á que o
cérebro está morto depois de 12 h de inconsciência com falta de
respiração espontânea, midríase bilateral e EEG isoelétrico, ou quando
o angiograma revela cessação da circulação intracraniana durante 30
min;

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III. Pode ocorrer que o coração pare e o sistema nervoso central


esteja intacto ou com possibilidades de se recuperar. Convém, então,
iniciar a reanimação: se os batimentos cardíacos não reaparecerem,
pode-se dar como morto o paciente, porém, se reaparecerem, inclusive
sem se restabelecer a consciência ou respiração espontânea, deve-se
seguir aplicando-se as normas usuais de assistência intensiva até que
fique demonstrada a morte encefálica.

O diagnóstico de ME no Brasil é atualmente baseado na Resolução nº


2.173/17 que substituiu a de nº 1480/97 do CFM. Essa resolução orienta
inclusive a elaboração de protocolos, aprovados pelas Comissões de Ética de
cada instituição, para esse fim. “Nesses 20 anos de vigência da Resolução nº
1.480/97, mais de 100 mil diagnósticos de morte encefálica foram realizados no
Brasil, sem que ocorresse qualquer contestação. No entanto, as transformações
sociais e a evolução da medicina levaram o CFM a atualizar os critérios”,
explicou o relator da Resolução nº 2.173/17, neurologista Hideraldo Cabeça.
De acordo com a lei nº 9.434/97, a retirada de tecidos, órgãos ou partes do corpo
humano destinados a transplante ou tratamento deverá ser precedida de
diagnóstico de morte encefálica, constatada por dois médicos não participantes
das equipes de remoção e de transplante, mediante a utilização de critérios
clínicos e tecnológicos definidos por resolução do CFM. A Resolução CFM nº
2.173/17 estabelece que os procedimentos para a determinação da morte
encefálica devem ser iniciados em todos os pacientes que apresentem coma não
perceptivo, ausência de reatividade supraespinhal e apneia persistente.
O médico atual, formado para exercer uma medicina cada vez mais
sofisticada, com exames, procedimentos cirúrgicos e fármacos cada vez mais
complexos e caros, muitas vezes pressionado por longas jornadas de trabalho e
plantões estafantes, acaba por criar mecanismos psicológicos de defesa contra
a morte, a qual representa a frustração total de todas as suas expectativas e
esforços (além de lhe trazer sempre a consciência da própria morte, uma vez
que somente o tempo o separa da situação do paciente moribundo à sua
frente). Por outro lado, a sociedade atual tem exigido do médico, de forma cada
vez mais intensa, um posicionamento ético e legal imediato a respeito de todos
os assuntos, principalmente os relacionados com a morte. Vale lembrar também
que esta nossa sociedade pluralista atual encontra-se totalmente à mercê de

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formadores de opinião de intenções nem sempre retas. Cabe, portanto, ao


médico, primeiramente a reflexão e o amadurecimento dos seus próprios
conceitos pessoais a respeito da morte, para um adequado posicionamento
individual e posteriormente coletivo a respeito do assunto morte encefálica. É
também imprescindível o estudo e a atualização constantes dos conceitos e
critérios relacionados com o seu diagnóstico. Somente dessa forma estará o
médico bem preparado para enfrentar esta conflituosa e desafiante situação,
cada vez mais frequente em sua prática diária.

4.3 Aspectos biopsicossociais do luto


O luto é um objeto de estudo de diversas áreas da saúde, este processo
de adoecimento pode partir do intenso sofrimento psicológico para o físico, o
qual pode apresentar sintomas como: alterações no sistema imunológico,
insônia, etilismo e anorexia. Parkes, grande estudioso da área, considera o luto
uma profunda transição existencial. Assim, sendo um prejuízo primariamente
emocional, diversos autores buscam compreender os rituais e a passagem por
esse processo nos diversos aspectos biopsicossociais envolvidos.
O estilo de vida pós industrialização também intensifica esse sofrimento
psicológico, rotinas diárias conturbadas, ansiedade quanto ao futuro do país e o
medo de demissão são exemplos de fatores impeditivos de um período de luto
adequado para lidar com esses sentimentos, assim pode ser um fator de
intensificação e cronificação dos sintomas citados no parágrafo acima. Em
consonância, a urbanização trouxe consigo um número elevado de mortes de
acidentes de trânsito, abuso de drogas ou violência, todas essas citadas fatores
de risco para lutos complicados. (KÓVACS, 2008).
O processo de luto pode ser agravado por indivíduos que tentam reprimir
os sentimentos ligados à dor. Assim, culturas que tendem a “padronificar”
pessoas e negar sentimentos pode ser um fator de complicação nesse processo.
Nesse viés, por exemplo, adolescentes muitas vezes por uma tendência em se
isolar e reprimir suas emoções, não tem seu luto reconhecido e podem ter
grandes dificuldades nessa “transição existencial”. (KÓVACS, 2008).

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A forma como a morte ocorre também influencia em como as pessoas irão


lidar com isso. Processos de morte de longa duração, em doenças crônicas ou
degenerativas podem causar um sentimento de “ambivalência” entre tristeza
pela morte do ente querido e alívio pelo fim do sofrimento, mas isso pode causar
culpa às pessoas próximas durante o luto e agravar o processo. Soma-se, ainda,
a afinidade do indivíduo com o falecido como um fator para lutos complicados
(KÓVACS, 2008).

Segundo Kóvacs apud Rando (1992/1993): Há consequências sérias


quando não se cuida de pessoas que apresentam risco para processos
de luto complicado. É fundamental: (a) identificar fatores de risco; (b)
delinear tendências sócio-culturais e tecnológicas que possam
exacerbá-las;(c) observar o que é necessário ser trabalhado para se
evitar um luto complicado.

Em cada época da história da humanidade, cada sociedade compreendia


e lidava com o processo de morte de maneira diferente, com suas próprias
particularidades. Para fazer uma correta interpretação, é necessário analisar o
contexto ao qual cada cultura está inserida e como cada grupo entende sobre o
pré e pós-morte, considerando sua religiosidade e costume.

É importante compreender que tudo o que for efetivamente dito,


insinuado ou mal esclarecido será interpretado: as pessoas e famílias
escutam por meio de filtros históricos, culturais e étnicos muito
diferentes. Logo, a experiência da doença não pode ser considerada
um simples reflexo do processo patológico no sentido biomédico do
termo; e sim uma construção cultural expressa em ‘maneiras
específicas de pensar e agir’. O saber profano dos entrevistados
obedece à sua visão do mundo para dizer dos sofrimentos ou
surpresas que o corpo revela, mas a medicina não escuta deste ouvido,
pois participa de uma cultura sábia, própria para um grupo restrito com
outros valores e conhecimentos. A língua do médico não é a de quem
vive a experiência corporal, imersa em atitudes e valores culturais
próprios, que a cultura médica desconhece. (GIACOMIN et al. pp.
2491-2492)

De Franco (2017) afirma que de forma geral, o processo de


industrialização da sociedade contemporânea esvaziou o conteúdo religioso da
morte como elaboração de um projeto coletivo de enfrentamento do caos
provocado pela morte. O autor retrata que em função das concepções da
extrema capacidade produtiva e da difusão de uma mentalidade social focada
no individualismo do século XX, o mundo ocidental acabou por afastar a morte

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do convívio social, no entanto, apesar de todos esses esforços a ciência ainda


não conseguiu vencer a morte, apesar da ideologia reinante de que nossa
sociedade é uma sociedade que propicia o florescimento da vida. Um claro
exemplo, é a valorização do mito da vida com “o pensamento de que podemos
produzir vida, graças a nossa ciência médica, a nossa agricultura, a nossa
zootecnia e a nosso ‘progresso’” RODRIGUES (2006).
Nesse sentido, de modo geral pode-se dividir a compreensão social de
morte em dois períodos, antes e depois da industrialização. “Até o início do
século XX a morte era um fator de comoção social que sempre se exprimia por
meio de uma série de comportamentos rituais notadamente de matrizes
religiosas diversas para que a comunidade e seus membros conseguissem se
reencontrar diante do caos provado pela morte de um de seus membros” DE
FRANCO (2017). Após esse período, a “morte, que deixa de ser “tudo”, parte
constituinte da vida normal e do ciclo pessoal, para se tornar “nada”, ocultada do
dia-a-dia, tratada com aparente indiferença” RODRIGUES (2006).
Outro fator importante na mudança da representação social da morte é o
avanço da tecnologia no decorrer do século XX. De Lucas Freitas (2013), afirma
que a morte no hospital passou a ser mais representativa do que o processo de
morte com parentes ou sozinho. Os progressos da ciência permitem prolongar a
vida, os pacientes podem ser condenados a meses ou anos de vida vegetativa
ligados a tubos e aparelhos, ou seja, fora extirpado do moribundo não só o saber
sobre sua própria morte, como também, seu direito a ela – é a morte interdita
que se apresenta (ARIÈS, 2003).

É cada vez mais perceptível o quanto o mundo ocidental evita a


angústia e busca a neutralização do desconforto e da dor psíquica
(Elias, 2001; Ariès, 2003). Os contextos de hiper-medicalização e de
discrição emocional presentes em nossa cultura contemporânea são
dois fatores relevantes na compreensão da vivência do luto (Kouri,
2005, 2010).A negação do luto ocorre por meio de práticas sociais tais
como, por exemplo, a imposição da volta ao trabalho após sete dias,
como se houvesse um período pré-determinado para a passagem por
esse processo. (DE LUCAS FREITAS, 2013 apud Elias, Ariès, Kouri).

Analisando a interpretação humano em relação com o (cada vez mais)

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rápido avanço tecnológico na área da saúde, De Lucas Freitas (2013) abre uma
discussão no sentido de que a modernidade está sempre associada à baixa
produtividade e falta de capacidade de lidar com seus sentimentos e isso não é
tolerado pela modernidade. Expressões vinculadas à tristeza, frustração e perda
possuem baixa tolerância frente à sociedade ocidental contemporânea, sendo
necessário ressignificar o valor da perda aos enlutados.
Nesse sentido, Freud, foi o primeiro a abrir discussões relacionadas ao
luto. Segundo o autor, o luto é uma vivência normal, específica diante da perda
significativa de um objeto. Tais vivências estão conscientes e implicam em um
empobrecimento do mundo desde a falta de seu objeto de investimento. Seus
sintomas seriam os mesmos da melancolia, com exceção da autoestima que não
se encontraria perturbada (Freud, 1917/2010).
Dessa forma, Da Soledade (2021) retrata que na sociedade
contemporânea atual pode-se observar o comportamento de vigiar e punir
desenvolvidos por Focault para disciplinar a partir do uso das redes sociais, onde
o sujeito diante de uma necessidade de aprovação do outro se expõe e este
outro, ao se colocar na posição de vigia e através do senso de moralidade, decide
aprovar ou não o comportamento do sujeito exposto. Sendo a cultura do
cancelamento uma maneira de disciplinar o indivíduo que tem seu
comportamento desaprovado, este é julgado e sua penalidade é ser esquecido,
após sofrer diversos ataques virtuais, esquecimento este que pode ter como
consequência a morte virtual, midiática e/ou social do homem.
Trazendo para o contexto do século XXI, “uma nova ruptura social sobre
a morte e o morrer está ocorrendo, o COVID obrigou a sociedade a “encarar a
morte de frente”. Morte esta que antes era velada, evitada, pouco comentada e
agora “bate à porta” fazendo com que os indivíduos saiam da ilusória "zona de
conforto", que se configura ao evitar até mesmo falar da morte." DA SOLEDADE,
2021. Em paralelo à isso, Hortegas; Santos (2020), traz uma visão de que a
pandemia da COVID-19 trouxe uma mudança radical no processo fúnebre, uma
vez que há uma diminuição da possibilidade de reunir familiares e amigos no
compartilhamento do luto. Hoje a preparação do corpo passa a ser fechada
devido ao risco de transmissão do vírus e pode induzir o aumento do sentimento

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de solidão individual dos indivíduos que passam por esse processo sozinho,
fazendo com que, de certa forma, a interpretação da morte volte a ser aquela que
se destacou no início do século XX com um aumento da individualidade, porém
com um aumento doenças relacionadas à isso, como depressão, fruto da
crescente indução à coletividade ocorrida a partir do século XXI.

5. Post mortem
A realização da causa mortis é de extrema importância para a tanatologia.
Nesse viés, ressalta-se a necessidade da antropologia forense, visto que, o
reflexo de muitas culturas se dá através de rituais e cerimônias fúnebres, tanto
quanto, a antropologia forense estuda a ancestralidade e padrões de vida das
sociedades, sendo exemplos o trabalho, posição social, idade, gênero,
reprodução e condições de saúde oferecidas
A coleta de materiais humanos é feita de forma cuidadosa. Assim, são
cautelosamente selecionadas todas as partes humanas e descartadas as não
humanas, entretanto, raros erros sobre isso acontecem. Esse meio é feito
por peritos legais e agentes de necrópsia, e é necessária uma capacitação.
A metodologia para a retirada de materiais humanos para a investigação
antropológica em cadáveres totalmente esqueletizados e em estado de
conservação é iniciado pela limpeza com escovas de cerdas macias para a
remoção de materiais indesejados para a pesquisa, tanto quanto, é utilizado a
lavação de partes ósseas com água corrente e detergente neutro.
Já para cadáveres em em putrefação é utilizado materiais cirúrgicos com
o intuito de descartar materiais sem utilidade para a investigação, tomando
todo o cuidado necessário para não remover as partes que ainda possuem
alguma utilidade antropológica. Assim, as partes sem uso são colocadas em uma
máquina que liquefaz tal partes, é uma adaptação de fritadeiras industriais pelo
aquecimento de ar, e só são adquiridas por fabricação específica e perante
requisição legal. O Processo constitui em deixar o cadáver por 24 horas entre a
temperatura de 80-90c, e não deixar que ele atinja a fervura, durante esse
processo de desnudamento, é expressamente não indicado o uso de produtos

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químicos. Concomitante a isso, é de extrema importância que sejam retiradas


amostras do DNA de tecidos duros (crânio e dentes) do indivíduo estudado. Após
isso, devem ser colhidos fêmur e esterno, desde que não causem prejuízos para
o andamento do estudo.
Após esta etapa, é iniciado a investigação sobre o material coletado. A
primeira etapa consiste em posicionar anatomicamente as partes ósseas sobre
uma mesa, é de suma importância atentar-se à lateralidade de todas as peças.
Após a realização deste, é então utilizado o protocolo LAF/CEMEL para realizar
o REAF (Relato de Exame de Antropologia Forense), o protocolo consiste em
uma comparação de acidentes ósseos, desgastamentos, fraturas, patologias e
malformações perante um enorme banco de dados que reúne diversas amostras
dos mais diversos estudos antropológicos anteriormente catalogados. Alguns
dos ossos são reunidos em chamados "óssos múltiplos" como por exemplo
vértebras e costelas, já que, não é possível relatar com precisão suas posições
anatômicas. Após a morte, uma retirada muito importante é da cartilagem
tireóide, pois ela é capaz de determinar o sexo do cadáver estudado. Outra coisa
imprescindível para ser coletada é a arcada dentária. São analisadas posições
e presença anatômica, cáries, tártaro e quantidade de dentes.
Assim, após todos esses dados coletados é realizada a avaliação de
caracteristicas de indivíduo, que são checadas pelos seguintes óssos: Sexo
(pelve, crânio e cartilágem tireóidea) ancestralidade (crânio e caixa torácica,
variável.) idade em adultos (clavícula, sínfise púbica, articulação sacroilíaca e
quarta costela) idade em crianças e adolescentes (lâminas epifisárias) estimativa
de destreza manual (úmero, clavícula e rádio). Como supracitado, todos esses
dados devem ser meticulosamente comparados com o banco de dados
LAF/CEMEL do REAF.

6.Conclusão
A Tanatologia é uma área de estudo com alto teor filosófico e de difícil
compreensão, tendo em vista o material lúdico o qual é estudado. Porém é de
essencial importância para os profissionais da área de saúde que eventualmente
trabalham com enlutados, a compreensão do processo de luto no período ante-

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mortem e post-mortem, assim como todos os processos associados. E também


da importância da intelecção dos estágios de luto adjuvante aos cuidados
paliativos, com o intuito de consolar o paciente em terminalidade e seus
familiares, melhorando assim a relação médico-paciente e empoderando e
dignificando os pacientes que enfrenta o destino inexorável de sua
terminalidade.

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