Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
REVISÃO REVIEW
revisão integrativa da literatura
Abstract There is currently widespread concern Resumo Atualmente, existe preocupação notó-
among researchers in debating questions that ge- ria dos pesquisadores em debater questões gerado-
nerate ethical conflicts within the scope of health ras de conflitos éticos, no âmbito assistencial, di-
care geared to the human being in the terminal recionada ao ser humano em fase de terminalida-
phase, especially euthanasia, dysthanasia and de, em particular, acerca da eutanásia, distanásia
orthothanasia. This study sought to characterize e ortotanásia. Este estudo objetivou caracterizar
the scientific production at the national level on a produção científica, no âmbito nacional, acer-
euthanasia, dysthanasia and orthothanasia. It ca da eutanásia, distanásia e ortotanásia. Trata-
involves an integrative review of the literature. se de uma revisão integrativa da literatura. O
The study universe consisted of 41 publications universo do estudo foi constituído por 41 publi-
related to the theme in question by means of a cações relacionadas ao tema investigado, medi-
survey conducted online in the Virtual Health ante a realização de um levantamento online, na
Library in the Capes Portal and in the Bioethical Biblioteca Virtual em Saúde, no Portal Capes e
Magazine. Of these, 25 articles comprised the sam- na Revista Bioética. Desses, 25 artigos compuse-
ple taking into consideration the established in- ram a amostra, considerando-se critérios de in-
clusion and exclusion criteria. Data collection oc- clusão e exclusão estabelecidos. A coleta de dados
curred in March 2013, by means of an instrument ocorreu em março de 2013, por meio de um ins-
containing information pertinent to the proposed trumento com informações pertinentes ao objeti-
objective. The key words used were euthanasia, vo proposto. Os descritores utilizados foram euta-
dysthanasia and orthothanasia. With respect to násia, distanásia e ortotanásia. No que se refere
the focus of the publications, three themes ao enfoque das publicações, emergiram três te-
emerged: Theme I – Euthanasia; Theme II – Dys- mas: Tema I - Eutanásia; Tema II - Distanásia e
thanasia and Theme III – Orthothanasia. The Tema III - Ortotanásia. Os estudos analisados ex-
studies analyzed reflected the current concern in pressam a preocupação atual diante de dilemas
terms of ethical dilemmas concerning care of the éticos, no que concerne ao cuidar do ser humano
1
Núcleo de Estudos e
human being in the end of life phase. Thus, it is na fase final de vida. Dessa forma, espera-se que
Pesquisas em Bioética,
Universidade Federal da hoped that this research can contribute to bolster esta pesquisa possa contribuir para fortalecer as
Paraíba. Cidade the critical reading with respect to the theme. leituras críticas a respeito da temática.
Universitária - Campus I,
Key words Euthanasia, Dysthanasia, Orthotha- Palavras-chave Eutanásia, Distanásia, Ortota-
Castelo Branco. 58.059-900
João Pessoa PB. nasia násia
zirleidefelix@hotmail.com
2734
Felix ZC et al.
Quadro 1. Distribuição dos artigos do Tema I, segundo título, modalidade, objetivos e conclusões das
publicações selecionadas para o estudo.
Título Modalidade Objetivo(s) Conclusão
Lidando com Revisão Discutir questões éticas Não obstante a persistência dos
pedidos de eutanásia: relacionadas com o final chamados casus perplexus, isto é, a não
a inserção do filtro da vida humana, desistência da solicitação de eutanásia, a
paliativo15 apresentando dados da proposta de cuidados paliativos torna
Holanda e Bélgica, países irrelevantes e desnecessárias muitas
que possuem legislação dessas solicitações.
específica e
políticaspúblicas em
relação à prática da
eutanásia.
continua
de conduta que podem ter como resultado a gação de prestar um serviço, uma terapia, uma
morte do paciente: 1- conduta omissiva – quan- medicação ao paciente, não o faz, convicto de
do o agente, mesmo tendo condição e/ou obri- que estará abreviando seu sofrimento, o que re-
2737
Eutanásia: Revisão Realizar uma reflexão teórica No aspecto legal está vedada
discutindo da eutanásia a fim de qualquer prática assistencial que
relatividade da proporcionar uma melhor ocasione a morte. Por ser um ato
bioética19 compreensão do processo de incontornável, não pode ser tratado
morte e o morrer à luz da com indiferença ou displicência.
bioética. Devem-se analisar as questões
legais, religiosas, bioéticas e culturais
para chegar num entendimento
mais próximo da convivência.
Eutanásia e sua Revisão Tecer considerações sobre a Entende-se ser importante uma
relação com casos natureza dos seguintes espécie de “exegese” dos termos
terminais, doenças conceitos médicos: coma, médicos envolvidos na discussão,
incuráveis, estados estado neurovegetativo com esclarecimento de seus
neurovegetativos, persistente e coma respectivos conceitos, que vêm a ser
estados sequelares irreversível, morte encefálica o que nos propomos a fazer no
graves ou de e morte (ou “morte texto que segue, associado ao final,
sofrimento intenso e circulatória”), eutanásia, a breve análise da Resolução do
irreversível e morte distanásia, ortotanásia e CFM 1805/2006 e do novo Código
encefálica8 estado terminal. de Ética Médica,Resolução CFM
1931/2009.
Eutanásia: a última Revisão Analisar um dos mais antigos A busca por respostas se a prática da
viagem13 dilemas da raça humana: a eutanásia deve se transformar em
eutanásia, ou seja, o direito um direito, não virá em pouco
de terminar com a própria tempo. No Brasil, há projetos
vida, buscando assim uma tramitando no Congresso Nacional
morte com dignidade e sem nesse sentido, mas o que não
sofrimento. podemos perder de vista é que a
prática da eutanásia, mesmo
quando reconhecida no
ordenamento legal, é um direito
subjetivo, podendo fazer uso dela
quem quiser.
Quadro 2. Distribuição dos artigos do Tema II, segundo título, modalidade, objetivos e conclusões das
publicações selecionadas para o estudo.
Título Modalidade Objetivo(s) Conclusão
continua
sulta na morte; 2- conduta ativa direta – aplica- eutanásia em pacientes terminais, constata-se que
ção de terapias analgésicas com a intenção pri- alguns profissionais compreendem parcialmen-
mordial de aliviar as dores do paciente terminal, te o conceito de eutanásia, e outros, totalmente.
sabendo que essa medicação resultará no faleci- Também houve unanimidade entre os profissio-
mento dele; 3- conduta ativa indireta – é aquela nais que discordaram da prática da eutanásia,
que, motivada por convicções humanitárias, leva porquanto é considerada crime, de acordo com
o agente a produzir a morte antecipada de um a lei brasileira, e os principais motivos são as
paciente que esteja com uma doença incurável, questões religiosas e éticas12.
com sofrimento atroz e qualidade de vida ínfi- A eutanásia pode ocorrer por dois meios: de
ma, mas que, sozinho, não seja capaz de se suici- forma voluntária, realizada pelo próprio pacien-
dar. Antes disso, o paciente terá expressado o seu te ou a pedido dele, ou de forma involuntária,
consentimento. quando é realizada por outrem com ou sem o
No que concerne às percepções de enfermei- consentimento do paciente. Quanto ao tipo de
ros e médicos intensivistas sobre a prática da ação, a eutanásia ativa é a que se caracteriza pelo
2739
O profissional de Artigo de Teve-se por objetivo identificar Concluiu-se que não há consenso
saúde frente à Revisão qual é a problemática na literatura com relação aos
distanásia: uma vivenciada pelos profissionais critérios para a retirada ou
revisão integrativa26 de saúde com relação à manutenção do suporte
manutenção do suporte de terapêutico frente ao paciente que
vida oferecido ao paciente sem está em processo de morte. Assim,
possibilidade de cura, destacou-se que a bioética pode ser
conhecido como distanásia. uma ferramenta eficaz na busca
pela decisão mais prudente frente
aos conflitos éticos decorrentes da
terminalidade.
ato de provocar a morte por fins misericordio- Outra pesquisa alude que, na Holanda, o fato
sos, sem sofrimento do paciente, e a eutanásia de a eutanásia já estar legalizada não significa
passiva trata-se da não iniciação de uma ação que está totalmente liberada. Ao contrário, em
médica ou interrupção de uma medida extraor- primeiro lugar, a eutanásia limita-se a um ato
dinária, objetivando abrandar o sofrimento, se- médico; em segundo, o ato é submetido a sete
guida de morte do paciente12,17,19. condições, entre elas: a doença deve ser incurável
Estudo aponta que, de outra forma, a euta- e causar sofrimento ao paciente; o pedido do can-
násia trata-se, com grande possibilidade, sim- didato à eutanásia deve ser voluntário e refletido,
plesmente, de um modo qualificado de homicí- no qual cada caso deve ser analisado particular-
dio, seja porque a vítima não pode se defender, mente e preencher os requisitos da lei18.
seja por justificada confiança. Com efeito, em No Brasil, o ordenamento jurídico manifes-
países que adotam a eutanásia, considera-se que ta-se flagrantemente contrário à prática da euta-
a intenção de quem provoca a morte deve ser de násia, considerando-a crime pela legislação pe-
livrar aquele que está para morrer de uma condi- nal, que afirma que, se o autor do crime agiu por
ção insuportável – sofrimentos intoleráveis ou compaixão, a pedido da vítima, para lhe abrevi-
uma situação de indignidade e de desamparo ex- ar o sofrimento físico insuportável, em razão de
tremo provocado pela doença8. doença grave: pena-reclusão, de três a seis
A eutanásia é permitida na Holanda, desde anos18,20. Porém, averígua-se que há vários pro-
2001, e na Bélgica, a partir de 200215,17. No terri- jetos tramitando no Congresso Nacional nesse
tório do norte da Austrália, vigorou uma legisla- sentido, principalmente respaldando-se na au-
ção que permitia a eutanásia voluntária ativa de tonomia do paciente18.
1995 até 1997, quando o Parlamento Federal em- Em vista disso, torna-se legítima a indagação
bargou a lei. A maioria dos estados dos Estados acerca do alcance do princípio de autonomia da
Unidos e do Canadá tem legislações que permi- pessoa nas controvérsias morais em relação à
tem que os médicos suspendam os tratamentos eutanásia. Assinala-se14 que o princípio de res-
com a autorização do paciente ou de seu repre- peito à autonomia tem sustentado cogentes ar-
sentante. O estado norte-americano do Oregon gumentos bioéticos em defesa da eutanásia. Nes-
aprovou uma lei, em 1999, que permite o suicí- se âmbito, é mister que seja respeitada a liberda-
dio assistido por médicos17. de de escolha do homem que padece, isto é, sua
2740
Felix ZC et al.
Quadro 3. Distribuição dos artigos do Tema III, segundo título, modalidade, objetivos e conclusões das
publicações selecionadas para o estudo.
Título Modalidade Objetivo(s) Conclusão
Reflexões legais e Revisão Apresentar bases éticas, A decisão de não prolongar a vida é
éticas sobre o final científicas e legais frente demasiado complexa, mas o limite para
da vida: uma à ortotanásia e os dilemas investir está nitidamente ligado à
discussão sobre a do final da vida, em concepção de morte digna aliada à plena
ortotanásia9 especial na visão bioética consciência das limitações de
da dignidade e dos intervenção. Parece claro que o ideal seria
direitos humanos. ouvir, sentir e pensar com o sujeito que
sofre a amarga presença do evento
inevitável da morte, para que dessa
relação complexa possa surgir a solução
mais correta possível para cada caso.
Cuidados paliativos Revisão Discutir sobre a Dessa forma, não concordamos com o
e ortotanásia28 associação dos cuidados posicionamento do Mistério Público
paliativos à ortotanásia. Federal e acreditamos ser legítimo e
eticamente correto, o médico, embasado
em suas convicções, abdicar de prover
tratamentos que estendem dolorosa e
precariamente a vida. A vida é um direito
a ser asseverado e não uma imposição
incondicional a ser cumprida.
Opinião dos médicos Original Avaliar o impacto da A maioria dos médicos foi favorável à
das Unidades de resolução CFM 1.805/ prática da ortotanásia, princípio que visa
Terapia Intensiva do 2006 na opinião dos diminuir o sofrimento do paciente e de
Complexo Hospital médicos que trabalham seus familiares, desde que respeitada a
das Clínicas sobre a nas Unidades de Terapia vontade da pessoa ou de seu
ortotanásia29 Intensiva (UTI) do representante legal, devidamente
Complexo Hospital das fundamentada e registrada no prontuário
Clínicas. e que o paciente continue a receber todos
os cuidados necessários para aliviar os
sintomas que levam ao sofrimento,
sendo assegurada a assistência integral.
continua
2741
Termalidade da vida Original Avaliar o posicionamento A maioria dos familiares entrevistada foi
em terapia intensiva: dos familiares sobre a a favor da ortotanásia, e gostaria de
posicionamento dos ortotanásia, ao se participar da tomada de decisão de
familiares sobre considerar controle dos qualidade de final de vida.
ortotanásia32 sintomas, preferência do
paciente e influência da
satisfação da
comunicação do
tratamento informado
pela equipe médica.
advertem não apenas a delimitação das frontei- avanços tecnológicos na área de Saúde contribu-
ras entre vida e morte e estabelecem temas que em para a conquista de benefícios na vida do
revelam tensões quanto à noção de pessoa no paciente. Entretanto, no uso exagerado de novas
Ocidente e seus direitos. Uma distinção se faz terapias, a exemplo das utilizadas em pacientes
necessária, no que diz respeito à possibilidade de fora de possibilidades terapêuticas de cura, emer-
escolha: o nascituro é incapaz de se manifestar, gem dilemas sociais, institucionais, profissionais
de modo que o direito de escolha é atribuído à e, principalmente, éticos e legais.
mãe, ao Estado ou a instâncias religiosas. No caso Destaca-se que, embora menos propalada que
do doente terminal, as demandas se relacionam a eutanásia, a distanásia é, ainda que inconscien-
à concessão do direito de escolha em relação aos temente, mais praticada21. Nesse ponto, assina-
desígnios da própria morte15. la-se que, na iminência da morte, inicia-se uma
Nesse prisma, em vários países, como Esta- nova etapa na vida do paciente, em que o ato de
dos Unidos e Inglaterra, os defensores da legaliza- curar deve ser substituído pelo cuidar, que, no
ção do aborto e da eutanásia se unem, pelo fato entanto, não pode ser encarado como prêmio de
de ambas as questões envolverem a discussão do consolação, quando não existem mais possibili-
estatuto da vida, da autonomia individual e dos dades terapêuticas. Logo, ao discutir sobre a dis-
direitos sobre a vida. Os debates estão sendo con- tanásia, a temática da eutanásia entra em ques-
duzidos no mundo ocidental por grupos de inte- tão, indicando que os dois conceitos caminham
resse e movimentos políticos e religiosos, procu- lado a lado26.
rando influenciar a reforma das legislações vigen- Em uma pesquisa23 realizada com enfermei-
tes sobre tais temas. Os que se opõem à eutanásia ros, identificou-se que a distanásia, em seu dia a
argumentam que cabe aos profissionais da área dia, como uma morte sofrida, com muita dor,
de Saúde cuidar e investir com a finalidade de sal- introduzindo tratamento agressivo que só pro-
var vidas, ao invés de provocar a morte. Em espe- longa o processo de morrer. Desse modo, consta-
cial, os médicos que prestam assistência em cui- ta-se que também existe o prolongamento do
dados paliativos são contrários à eutanásia, por- sofrimento, e não da vida, consequentemente, sem
que consideram que as demandas de doentes ter- nenhum benefício terapêutico e acarretando gas-
minais por essa intervenção só ocorrem devido a tos elevados para a instituição24. Sob esse prisma,
uma assistência em saúde precária15,17. Paralela- os enfermeiros identificaram a distanásia, mas
mente, condenam a eutanásia os movimentos ba- referiram que não a utilizam e proporcionam a
seados em crenças religiosas, que afirmam a san- ortotanásia, sempre priorizando o conforto e o
tidade da vida, argumentando que, uma vez acei- alívio da dor e do sofrimento, em ambiente tran-
ta, a prática da eutanásia involuntária, especial- quilo e agradável, visando à qualidade de vida,
mente no caso de idosos, em certo tempo se tor- sem a utilização de prolongamentos abusivos de
nará viável por pressões econômicas17. tecnologias23. Contemplou-se, ainda, que, na fase
Em relação aos cuidados paliativos e à euta- final da vida dos pacientes, há muito que se fazer
násia, ressalta-se que essa filosofia do cuidar pre- por eles, proporcionando o relacionamento in-
ocupa-se com o indivíduo e com sua dignidade, terpessoal entre a equipe, com destaque, princi-
respeitando-a como ser humano, valorizando sua palmente, para uma comunicação mais eficaz23,24.
dor e o seu sofrimento. Logo, com o manejo ade- Nessa perspectiva, ressalta-se que a comuni-
quado de sinais e de sintomas, pode-se evitar a cação entre a equipe de enfermagem e o paciente
solicitação da eutanásia pelos próprios pacientes terminal e sua família pode contribuir para evi-
e/ou familiares. Conclui-se, então, que a propos- tar situações de distanásia e prevenir o sofrimen-
ta de cuidados paliativos torna irrelevantes e des- to, a frustração e a inquietação. Convém enfati-
necessárias muitas solicitações de eutanásia15. zar que, embora não seja função do enfermeiro
Ante as considerações apresentadas, ficou decidir interromper ou alterar as condutas no
notória a preocupação dos pesquisadores em tratamento dos pacientes, ele deve ser inserido
debater questões geradoras de conflitos éticos, nas discussões, uma vez que é o profissional que
no âmbito assistencial, direcionada ao ser hu- permanece por mais tempo com os pacientes25.
mano em fase de terminalidade, em particular, a No concernente às manifestações das vonta-
eutanásia. Ademais, os estudos analisados evi- des antecipadas do paciente, estudo21 discorre
denciaram o reconhecimento do valor da refle- sobre a ampla aceitação por parte dos médicos
xão bioética em tais questões. em respeitá-las quando ele estiver incapacitado
Quanto às publicações inseridas no tema II, de se comunicar e permite propor que tais mani-
evidenciadas no Quadro 2, averígua-se que os festações, também denominadas diretivas ante-
2743
Nesse sentido, em nosso país, vêm se firman- tuais e valorizar a dignidade humana. Por fim,
do alguns posicionamentos e discussões trans- observa-se que, apesar de o termo ortotanásia
disciplinares sobre a aplicabilidade da ortotaná- ser pouco conhecido, é uma situação que ocorre
sia, como forma de tutelar uma morte digna, no cotidiano do ambiente hospitalar, e o profis-
sedimentam-se com suporte em princípios (bio) sional da área de Saúde participa desse processo
- éticos, sobretudo o da autonomia da vontade, atuando como um elo entre paciente, família e
e no primado constitucional da dignidade do ser equipe. Destaca-se, ainda, para a necessidade da
humano, com diretrizes que envolvem o bem formação profissional da equipe de saúde, no
mais supremo do ser humano – a vida revestida que concerne ao processo de assistência aos paci-
de dignidade30. entes em fase final e seus familiares, com vistas a
Tal concepção pode ser constatada nos de- promover um cuidado holístico e humanizado.
poimentos de profissionais de uma averiguação32,
que teve como escopo conhecer a percepção do
enfermeiro em relação à ortotanásia. De acordo Considerações Finais
com os resultados, os profissionais se mostra-
ram favoráveis a sua execução, pois referiram Os artigos examinados neste estudo refletiram
que se sentem competentes e gratificados quan- sobre os dilemas bioéticos: eutanásia, distanásia
do conseguem manter o paciente como “ser com- e ortotanásia. Muitas são as discussões envolvi-
pleto” até sua morte. Eles acrescentaram que, a das, uma vez que o processo de cuidar envolve
partir do momento em que os profissionais da situações entre vida e morte, conforto e sofri-
área de Saúde e a família do paciente conseguem mento, entre outros. Nesse prisma, a Bioética,
atentar para a morte como um fato natural e como campo de reflexão, promove um melhor
inevitável, a aceitação da ortotanásia vem como direcionamento para situações que geram os re-
consequência, e isso contribui para que haja uma feridos dilemas.
morte digna. Observou-se, através das publicações, que,
Em outra pesquisa29, realizada com o objeti- no Brasil, o ordenamento jurídico manifesta-se
vo de avaliar o impacto da resolução CFM 1.805/ contrário à prática de eutanásia, por considera-
2006 na opinião dos médicos que trabalham nas la crime de acordo com a legislação penal. Po-
Unidades de Terapia Intensiva (UTI) do Com- rém, esse tema vem sendo debatido entre filóso-
plexo Hospital das Clínicas, constatou-se que a fos, religiosos, profissionais da área de Saúde e
maioria dos envolvidos no estudo foi favorável à operadores do Direito, com vários projetos que
implementação da prática da ortotanásia, visan- tramitam no Congresso Nacional. Quanto à dis-
do diminuir o sofrimento do paciente e de seus tanásia, percebeu-se que não existe consenso na
familiares, desde que respeitada sua vontade ou literatura em relação aos critérios para a retirada
a de seu representante legal, devidamente funda- e a manutenção do suporte terapêutico frente ao
mentada e registrada no prontuário, e que o pa- paciente no processo de morrer. Nesse contexto,
ciente continue a receber todos os cuidados ne- evidencia-se que a Bioética pode ser uma ferra-
cessários para aliviar os sintomas que levem ao menta eficaz na busca da decisão mais prudente
sofrimento e lhe sejam assegurados assistência frente aos conflitos éticos em detrimento da ter-
integral, conforto físico, psíquico, social e espiri- minalidade.
tual, e o direito a alta hospitalar. As publicações assinalaram, ainda, que alguns
Assim como os profissionais, a família tam- posicionamentos vêm se firmando acerca da apli-
bém é a favor da prática da ortotanásia. Tais acha- cabilidade da ortotanásia como forma de tutelar
dos foram verificados em uma pesquisa32 que teve uma morte digna, fundamentando-se em prin-
como escopo avaliar o posicionamento dos fa- cípios, sobretudo no da autonomia e do bem
miliares sobre tal prática. Os autores constata- mais precioso do ser humano – a vida revestida
ram que os familiares também gostariam de par- de dignidade. Ante o exposto, espera-se que este
ticipar da tomada de decisão no momento final estudo possa contribuir para fortalecer as leitu-
da vida. ras críticas a respeito da temática. No entanto, é
Diante dessas ponderações, entende-se que a necessário desenvolver novas pesquisas, prove-
ortotanásia emerge como um instrumento no nientes de dados empíricos que possam servir de
sentido de proporcionar uma assistência holísti- subsídios para respaldar a prática de profissio-
ca e integral ao paciente, atentar para as suas nais da área de saúde no cuidado com o paciente
necessidades físicas, psicológicas, sociais e espiri- terminal e sua família.
2745
ZC Félix trabalhou na análise e interpretação dos 1. Machado KDG, Passini L, Hossne WS. A formação
dados e na redação do artigo. SFG Costa traba- em cuidados paliativos da equipe que atua em uni-
dade de terapia intensiva: um olhar da bioética.
lhou na revisão crítica e na aprovação da versão Centro Universitário São Camilo 2007; 1(1):34-42.
a ser publicada. AMPM Alves trabalhou na aná- 2. Melo AGC, Caponero R. Cuidados paliativos: abor-
lise e interpretação dos dados e na redação do dagem contínua e integral.. In: Santos FS, organiza-
artigo. CG Andrade trabalhou na análise e inter- dor. Cuidados paliativos: discutindo a vida, a morte
pretação dos dados, na redação do artigo e na e o morrer.. São Paulo: Atheneu; 2009.
3. Queiroz MVO, Jorge MSB, Santos MLO. Portador
aprovação da versão a ser publicada. MCS Du- de insuficiência renal crônica em hemodiálise: sig-
arte trabalhou na redação do artigo. FM Brito nificados da experiência vivida na implementação
trabalhou na redação do artigo. do cuidado. Acta sci, Health sci 2008; 30(1):73-79.
4. Ferrai CMM, Silva L, Paganine MC, Padilha KG,
Gandolpho MA. Uma leitura bioética sobre cuida-
dos paliativos: caracterização da produção cientí-
fica sobre o tema. Rev Bioeth 2008; 2(1):99-104.
5. Batista KT, Barreto FSC, Miranda A, Garrafa V. Re-
flexões bioéticas nos dilemas do fim da vida. Brasí-
lia méd 2009; 46(1):54-62.
6. Biondo CA, Silva MJP, Secco LMD. Distanásia, eu-
tanásia e ortotanásia: percepções dos enfermei-
ros de unidades de terapia intensiva e implicações
na assistência. Rev Lat Am Enfermagem 2009; 17(5):
613-619.
7. Selli ML, Alves JS. Distanásia: percepção dos pro-
fissionais da enfermagem. Rev Lat Am Enferma-
gem 2009; 17(4):1-6.
8. Pittelli SD, Oliveira RA. Eutanásia e sua relação
com casos terminais, doenças incuráveis, estados
neurovegetativos, estados sequelares graves ou de
sofrimento intenso e irreversível e morte encefáli-
ca. Saúde, Ética & Justiça 2009; 14(1):32-39.
9. Junges JR. Reflexões legais e éticas sobre o final da
vida: uma discussão sobre a ortotanásia. Rev Bioet
2010; 18(2):275-288.
10. Villas-Bôas ME. A ortotanásia e o direito penal bra-
sileiro. Rev Bioet 2008; 1(16):61-83.
11. Mendes KDS, Silveira RCCP, Galvão CM. Revisão
integrativa: método de pesquisa para a incorpora-
ção de evidências na saúde e na enfermagem. Texto
Contexto Enferm 2008; 17(4):758-764.
12. Ribeiro KV, Soares MCS, Gonçalves CC, Medeiros
IRN, Silva G. Eutanásia em paciente terminal: con-
cepções de médicos e enfermeiros intensivistas.
Enferm foco 2011; 2(1):28-32.
13. Lopes CRA. Eutanásia: a última viagem. Rev. Facul-
dade de Direito da UERJ 2011; 1(19):1-26.
14. Siqueira-Batista R, Schramm FR. A eutanásia e os
paradoxos da autonomia. Cien Saude Colet 2008;
13(1):207-221.
15. Pessini L. Lidando com pedidos de eutanásia: a
inserção do filtro paliativo. Rev Bioet 2010; 18(3):549-
560.
16. Siqueira-Batista R, Schramm FR. A bioética da pro-
teção e a compaixão laica: o debate moral sobre a
eutanásia. Cien Saude Colet 2009; 14(4):1241-1250.
17. Gomes EC, Menezes RA. Aborto e eutanásia: dile-
mas contemporâneos sobre os limites da vida. Phy-
sis 2008; 18(1):77-103.
18. Perim SF, Heringer A. A eutanásia no Brasil. Rev
Dir e Just 2008; 11:13-36.
2746
Felix ZC et al.