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Resumo: Este capítulo tem como objetivo a reflexão sobre a presença negra na cidade de
Manaus, em movimentos negros que se articulam na cidade a partir de 1978 até 1988, período
que marca o surgimento nacional do Movimento Negro Unificado (MNU), e do Movimento
Alma Negra (MOAN) no Estado do Amazonas, esse último fundado em 1979 por Nestor
Nascimento. Visualizando a partir da imprensa e das leituras bibliográficas que o movimento
negro é historicamente “ponta de lança” na luta antirracista e em defesa da democracia no
país, experiência que contribui para a compreensão do processo amplo de resistência à
ditadura civil-militar (1964-1985), também na região norte. Trata-se de pensar, nesse conjunto
de relações e representações, dimensões vivas da luta de classes na cidade, buscando entender
o processo histórico de formação de coletividades e identidades novas, a reivindicação do
direito à participação política e à igualdade social e econômica, de democracia e liberdade.
O MOAN se inspirou no Movimento Negro Unificado MNU, que surgiu em 1978 em São
Paulo, como uma forma de resistir ao racismo e à ditadura militar no Brasil. O MOAN também fundou
a Associação dos Moradores e Amigos do bairro Praça 14, onde existe o Quilombo do Santo Benedito,
uma comunidade quilombola urbana reconhecida pela Fundação Palmares, as atividades
desenvolvidas pelo MOAN foram fundamentais para fomentar o debate racial em Manaus, através de
ações culturais, debates dentro da universidade e muitas outras o MOAN possibilitou o surgimento de
outros movimentos de luta antirracista em Manaus. Um exemplo das atividades desenvolvidas foi a II
Semana da Consciência Negra que trouxe as atividades seguintes:
Logo, o MOAN foi importante na consolidação das lutas dos movimentos negros em
Manaus, principalmente pelas ações desencadeadas pelos seus integrantes, que engajados ao
Movimento Negro Nacional, Latino Americano, e Internacional, conseguiram realizar em
Manaus um evento em comemoração ao Centenário da Abolição da Escravatura celebrado no
Brasil em 1988. A partir das lutas envidadas pelo MOAN foi criado em 1988 o “Conselho de
Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra”, com vistas a assessorar o Governo
do Amazonas, na programação do Centenário da Abolição da Escravatura sediado em
Manaus. No jornal do Comércio, a atividade é noticiada: “Abolição da escravatura tem
exposição Histórica”.
Neste sentido, Evelina Dagnino (2004) alerta para a ideia de que é nesse período que
se consolida uma disputa entre dois projetos políticos divergentes no cenário brasileiro: um
projeto político “democratizante”, que teria como principais elementos propulsores os
movimentos sociais nacionais das décadas de 1970/80 – que, por sua vez, possuem como
marco fundador o restabelecimento da democracia formal e apostam na possibilidade da ação
conjunta do Estado e sociedade civil em prol do aprofundamento democrático.
E, em contrapartida, um projeto neoliberal, que defenderia a necessidade do Estado
brasileiro se isentar de seu papel garantidor de direitos sociais. A imprensa também disputa e é
disputada por esses projetos, por isso sua importância para a análise da consolidação dos
movimentos negros em Manaus, visando compreender sua atuação e organização, assim como
consolidar novos debates históricos sobre a presença negra no Amazonas, visando também
apresentar apontamentos sobre esses “novos sujeitos históricos” que se colocam na luta
antirracista e por direitos em Manaus.
O golpe civil-militar de 1964 representou uma derrota, ainda que temporária, para a
luta política dos negros. Ele desarticulou uma coalizão de forças que palmilhava no
enfrentamento do “preconceito de cor” no país. O Movimento Negro organizado entrou em
refluxo. Seus militantes eram estigmatizados e acusados pelos militares de criar um problema
que supostamente não existia: o racismo. De acordo com Gonzalez (1982, 10), a repressão
“desmobilizou as lideranças negras, lançando-as numa espécie de semiclandestinidade”.
A imprensa negra, por sua vez, se organizou e passou a difundir seus ideais, com os
jornais Árvore das Palavras (1974), O Quadro (1974), em São Paulo; Biluga (1974), em São
Caetano/SP, e Nagô (1975), em São Carlos/SP. Em Porto Alegre, nasceu o Grupo Palmares
(1971), o primeiro no país a defender a substituição das comemorações do 13 de Maio
(referência ao poder do Estado) para o 20 de Novembro (referência à luta dos movimentos de
libertação/morte de Zumbi), assim como em Manaus foi formado o Movimento Alma Negra
em 1979.
Vale elencar que a participação dos negros em processos eleitorais também era pauta
comum dentre os movimentos negros, isso para possibilitar que fossem eleitos candidatos
comprometidos com as pautas do movimento negro, como o combate ao racismo, a
valorização da cultura e da identidade negra, a garantia dos direitos sociais e a reforma
agrária. Bem como apresentar emendas populares à constituinte que contemplassem as
demandas do movimento negro, como o reconhecimento dos remanescentes das comunidades
dos quilombos, a criminalização do racismo, a obrigatoriedade do ensino de história e cultura
afro-brasileira nas escolas, entre outras. E mobilizar a população negra para exercer sua
cidadania e seu voto consciente, rompendo com as estruturas racistas e elitistas que
dominavam o cenário político brasileiro.
Através da participação política dos negros nesses processos foi possível a eleição de
vários parlamentares negros para a constituinte, como Abdias do Nascimento, Benedita da
Silva, Carlos Alberto Caó, Lélia Gonzalez, Mário Juruna, entre outros. E também a aprovação
de várias emendas populares apresentadas pelo movimento negro, como o Artigo 68 das
Disposições Constitucionais Transitórias, que obriga o Estado a emitir títulos de propriedade
definitiva aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas
terras; a Lei no 7.716/89, conhecida como lei Caó, a qual criminaliza o racismo sem permitir
pagamento de fiança; e a Lei 10.639/03, responsável por instituir a obrigatoriedade do ensino
de História e Cultura Afro-Brasileira nos estabelecimentos de Ensino Fundamental e Médio,
privados ou públicos.
Vilma Reis (2005) aponta que as mulheres negras são corpos historicamente
perpassados pelo controle e pela punição devido ao passado escravocrata brasileiro, o que
pode ser pensado como uma justificativa para a negativa de que se tenha uma mulher negra
em uma casa:
FONTES
BIBLIOTECA PÚBLICA DO ESTADO DO AMAZONAS
Acervo Jornal A Crítica (1967-1989)
HEMEROTECA DIGITAL
Acervo Jornal do Comércio (1967-1989)
MNU – MOVIMENTO NEGRO UNIFICADO AMAZONAS
Acervo de Imagens (1980-1990)
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