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PROJETO MARIO TRAVASSOS

ARTIGO DE OPINIÃO

O TREINAMENTO NEUROMUCULAR NO DESEMPENHO OPERACIONAL E


PREVENÇÃO DE LESÕES MUSCULOESQUELÉTICAS EM MILITARES DO
SEGMENTO FEMININO

NOME COMPLETO - POSTO (OMITIR PARA SUBMISSÃO NO OJS)


(Opinião de inteira responsabilidade do autor)

2023
TÍTULO DO ARTIGO DE OPINIÃO

Nome completo1 (omitir para submissão no OJS)

1 INTRODUÇÃO

As atividades militares, especialmente aquelas de natureza operacional,


apresentam riscos que exigem a implementação de ações preventivas visando a
redução de acidentes. Não obstante a adequada adoção dessas medidas, entre as
consequências comuns das atividades militares, tanto em tempos de paz quanto em
combate, destacam-se as lesões musculoesqueléticas, que representam um
problema de saúde significativo no âmbito militar.
As lesões musculoesqueléticas afetam diretamente a prontidão da Força
Terrestre, representam custos significativos para o Sistema de Saúde, além de
poderem causar limitações biomecânicas, dores crônicas e invalidez permanente.
Segundo Hauret K et al. (2017), no Exército dos Estados Unidos, militares do
sexo feminino apresentaram uma incidência de lesões musculoesqueléticas 1,3 maior
do que militares do sexo masculino. Molloy et al. (2020), identificou diferenças na
distribuição anatômica das lesões entre militares norte-americanos homens e
mulheres, destacando que as militares norte-americanas possuíam sete vezes mais
probabilidade de sofrer fraturas por estresse no colo do fêmur e taxas mais altas de
lesões traumáticas nas costas/abdômen e extremidades inferiores do quadril.
O ingresso de mulheres combatentes na Linha de Ensino Militar Bélico do
Exército Brasileiro iniciou-se no ano de 2017. Em 2023, a Força ampliou essa
oportunidade, possibilitando às mulheres que ingressarem na Escola Preparatória de
Cadetes do Exército no ano de 2024, optarem por realizar o curso de Comunicações
durante a formação na Academia Militar das Agulhas Negras.
Não é difícil imaginar, portanto, a possibilidade de que, em breve, mulheres
combatentes também estejam integrando as especialidades das demais armas de
apoio e das armas-base, desempenhando as mesmas funções operacionais que hoje
ainda são exclusivas ao segmento masculino.
Sendo assim, torna-se importante o desenvolvimento de estudos na área do
treinamento físico militar que busquem mitigar o desenvolvimento de lesões
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musculoesqueléticas durante as atividades militares para o público de militares do


segmento feminino.
Nesta senda, este artigo se propõe a apresentar como o treinamento
neuromuscular pode contribuir no desempenho operacional e na prevenção de lesões
musculoesqueléticas em militares do sexo feminino.

2 CARACTERÍSTICAS NEUROMUSCULARES E DESEMPENHO FÍSICO

A individualidade biológica é um dos fatores a ser considerado na prescrição


do treinamento físico, essencial para que o exercício atinja o objetivo de promoção da
saúde e de melhora da performance física, evitando sobrecargas excessivas que
possam desencadear uma lesão.
Nesse contexto, é importante destacar que homens e mulheres possuem
diferenças fisiológicas no que tange a composição corporal, desempenho
neuromuscular e desempenho aeróbico.
No que diz respeito à composição corporal, Leitão et al. (2000) destacaram que
os homens apresentam uma maior massa muscular, tanto em termos absolutos
quanto em termos relativos (em relação ao peso corporal total), bem como fibras
musculares com maior volume, o que possibilita maior potência e resistência
muscular. Por outro lado, as mulheres possuem um maior percentual de gordura
corporal total, o que resulta em uma eficiência termorregulatória reduzida durante a
prática de exercícios em ambientes quentes.
De acordo com Nindl et al. (2016), em consonância com Vicennati et al. (2006),
essa característica masculina é atribuída às maiores concentrações de testosterona,
que possibilitam o desenvolvimento de músculos maiores e mais fortes durante a
puberdade.
Os homens possuem, ainda, maior quantidade de fibras musculares tipo II
(contração rápida) e proporção maior de fibras tipo II sobre fibras tipo I (contração
lenta) (NINDL et al., 2016).
Outra diferença importante entre os gêneros é a densidade mineral óssea,
característica relacionada à força dos ossos e ao menor risco de fraturas. Devido a
fatores hormonais, mulheres adultas atingem menor densidade óssea máxima se
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comparada com os homens. Uma dieta adequada associada ao treinamento de força


contribui para para a prevenção de lesões em mulheres (NINDL et al., 2016).

3 TREINAMENTO NEUROMUSCULAR NA PREVENÇÃO DE LESÕES

Com relação às adaptações proporcionadas pelo treinamento neuromuscular,


Fleck e Kraemer (2006, p. 124 e 125) afirmam que:

A densidade mineral óssea (DMO) aumenta, como resultado do treinamento


de força, quando os ossos são colocados sob volume e intensidade suficientes
para tanto (Kelley, Kelley e Tran, 2001)
(...)
O treinamento de força é um meio efetivo de aumentar a DMO em mulheres
de todas as idades. Nichols, Sanborn e Love (2001) examinaram os efeitos de
15 meses de treinamento de força na DMO de moças adolescentes (14 a 17
anos de idade) e reportaram que a força de membros inferiores aumentou em
40%, o que foi associado a um aumento da DMO do colo do fêmur (1,035 a
1,073 g/cm²)
(...)
Adaptações fisiológicas em ligamentos e tendões que ocorrem após o
treinamento de força podem auxiliar na prevenção de lesões. A atividade física
promove incremento no metabolismo, na espessura, no peso e na força dos
ligamentos (Staff, 1982; Tipton et al., 1975). Ligamentos lesionados recuperam
sua força original mais rapidamente se eram treinados antes da lesão (Staff,
1982; Tipton et al., 1975).

Em seu estudo, Kraemer et al. (2001) compararam 6 diferentes programas de


treinamento, com seis meses de duração, numa amostra composta apenas por
mulheres. Dentre os programas avaliados, quatro combinavam exercícios
neuromusculares e aeróbicos, um programa continha apenas exercícios aeróbicos e
um outro foi baseado em exercícios calistênicos. Dos quatro programas que
combinavam exercícios neuromusculares e aeróbicos, dois trabalhavam a
musculatura superior e inferior do corpo e dois trabalhavam apenas a superior. Desses
dois grupos, um programa estava destinado ao desenvolvimento de força/hipertrofia,
com exercícios cujas séries variavam entre 8 e 12 repetições máximas; e outro estava
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destinado ao desenvolvimento de força/potência, com séries variando entre 3 e 8


repetições máximas.
Após a conclusão dos programas de treinamento, a amostra foi avaliada por
meio de testes ocupacionais. Kraemer et al. (2001) puderam observar que o
treinamento da musculatura superior e inferior proporcionou melhor desempenho das
tarefas ocupacionais; a adaptação e a melhora do desempenho neuromuscular
ocorreu durante todo o programa de treinamento, não havendo períodos em que o
rendimento tenha atingido um platô; as diferenças no desempenho físico entre
homens e mulheres foram reduzidas, principalmente no que se refere ao transporte
de cargas.
Segundo Nindl et al. (2016), o treinamento neuromuscular com foco no
desenvolvimento de força, potência, força de membros superiores e transporte de
carga pesada é uma boa estratégia para o treinamento físico militar de mulheres,
buscando uma melhor eficácia no desempenho de tarefas ocupacionais militares e na
prevenção de lesões.
No que se refere ao preparo físico para o transporte de cargas, Knapik et al.
(2012) observou que a combinação do treinamento neuromuscular com o aeróbico
realizado 3 vezes por semana, se mostrou mais eficaz do que o neuromuscular ou
aeróbico realizado isoladamente. Além disso, verificou que os maiores ganhos foram
obtidos quando o programa de treinamento incluía o transporte progressivo de cargas
uma vez por semana, mostrando a importância do princípio da especificidade.
Grier et al. (2015) comparou quatro grupos de mulheres baseados em seus
programas de treinamento físico: um primeiro grupo adotava um programa de cross-
training (método de treinamento que combina exercícios aeróbicos e de força
realizados em circuito), o segundo grupo possuía um programa de treinamento de
corrida, o terceiro grupo possuía um treinamento de força e o quarto grupo não
adotava nenhum programa de treinamento. O grupo que adotou o programa de cross-
training obteve o melhor resultado nos exercícios de resistência muscular (flexão de
braços e abdominal) no teste de aptidão física do Exército dos Estados Unidos
comparado aos três outros grupos. O grupo de mulheres que realizavam cross-training
apresentaram também 65% menos propensão de sofrerem uma lesão relacionada ao
levantamento/movimento de objetos pesados quando comparada ao grupo de
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treinamento com pesos. Em contrapartida, teve maior propensão de desenvolver


lesões relacionadas à corrida quando comparada com este grupo.

4 CONCLUSÃO

Com base nos resultados dos estudos científicos apresentados, foi constatado
que, apesar das diferenças fisiológicas existentes entre homens e mulheres, as quais
podem levantar questionamentos sobre a eficácia das mulheres em combate, a
implementação de um programa de treinamento concorrente, que englobe exercícios
neuromusculares e aeróbicos, além de atividades ocupacionais de natureza militar
(como a marcha com equipamento individual, por exemplo), demonstrou ser efetivo
na redução dessas diferenças. Essa abordagem contribui para um aprimoramento da
performance física e operacional das mulheres militares, além de prevenir o
surgimento de lesões musculoesqueléticas.
O Exército Brasileiro possui o Caderno de Instrução Transporte de Carga
Individual (2017) que se destina a otimizar o treinamento físico militar, visando o
transporte de carga individual em marchas militares. Neste propósito, elenca
exercícios que fortalecem a musculatura de estabilização do tronco, essenciais para
o desempenho de atividades operacionais, a manutenção do equilíbrio durante sua
execução e a redução de lesões musculoesqueléticas.
Tais orientações podem e devem ser seguidas também pelas mulheres
militares. Contudo, visto a necessidade do treinamento muscular de membros
superiores, que muitas vezes se mostra deficiente no público feminino se comparado
ao masculino, seria interessante que o referido caderno de instrução abordasse
exercícios que desenvolvessem também essas regiões (deltóide, latíssimo do dorso
e bíceps braquial, por exemplo).
Por fim, é importante destacar que o planejamento do treinamento físico militar
deve sempre considerar a individualidade biológica de cada gênero e o princípio da
especificidade, buscando a maior semelhança dos exercícios propostos no plano de
treinamento com as tarefas específicas da atividade militar.
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REFERÊNCIAS

MOLLOY, J. M. et al. Musculoskeletal Injuries and United States Army Readiness


Part I: Overview of Injuries and their Strategic Impact. Military Medicine, v. 185, n. 9-
10, p. e1461-e1471, setembro-outubro 2020. Disponível em:
https://academic.oup.com/milmed/article/185/9-10/e1461/5805225. Acesso em: 25
jun. 2023.

HAURET, K. G. et al. Injury surveillance and longitudinal studies for gender


integration in the Army. In: Second Annual Assessment, 2017. PHR n. S.0047783-
17, 2018. Disponível em: https://apps.dtic.mil/dtic/tr/fulltext/u2/1062039.pdf. Acesso
em: 25 jun.2023.

LEITÃO, M. B. et al. Posicionamento oficial da Sociedade Brasileira de Medicina


do Esporte: atividade física e saúde na mulher. Rev Bras Med Esp, São Paulo,
6(6):215-220, Dez 2000. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/rbme/a/f46JSmFrmYHKtDVLh8K6J3r/?lang=pt. Acesso em 25
jun. 2023.

VICENNATI, V. et al. Sex difference in the relationship between the hypothalamic-


pituitary-adrenal axis and sex hormones in obesity. Obesity (Silver Spring).
2006;14(2):235-243. Disponível em:
https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1038/oby.2006.30. Acesso em 25 jun. 2023.

KRAEMER, W. J. et al. Effect of resistance training on women's strength/power


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Disponível em: https://journals.lww.com/acsm-
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Acesso em: 25 jun. 2023.

FLECK, S. J.; KRAEMER, W. J. Fundamentos do Treinamento de Força Muscular.


3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2006. 124-125p.

KNAPIK, J. J. et al. A systematic review of the effects of physical training on load


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Acesso em: 25 jun, 2023.

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Army Med Dep J. 2015 Apr-Jun:33-41. PMID: 26101904. Disponível em
https://www.researchgate.net/publication/279308587_The_Effects_of_Cross-
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BRASIL. Exército Brasileiro. COTER. EB70-CI-11.406: Transporte de Carga


Individual. Brasília, DF, 2017.

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