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CX NA EDUCAÇÃO:

MUDANÇAS GERACIONAIS
Patrícia Prado

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As atividades dos atores consistem em fazer
conexões e alianças com novos elementos de
uma rede e, com isso, ser capazes de redefinir e
transformar os componentes dessa rede.

(CALLON, 1986, p. 93 apud SANTAELLA; LEMOS,


2010, p. 38)

Introdução

As tecnologias da informação e a internet mudaram completamente a forma como são


distribuídas e consumidas as informações. Atualmente, as pessoas estão conectadas
em rede; além de consumirem também geram informações. Por isso, é tão importante
o papel dos educadores em mostrar como se pode acessar e construir informações
de qualidade. No entanto, percebe-se que as novas gerações já nasceram com a
tecnologia nas mãos, têm muita facilidade de aprender a utilizar as novas tecnologias,
enquanto muitos de nós, educadores, ainda têm um pé no mundo analógico.
Nesta revista, vamos discutir sobre o comportamento
das novas gerações e como podemos produzir
conteúdos interessantes para entrarmos nesse mundo
VUCA (Volatility, Uncertainty, Complexity e Ambiguity,
ou: volátil, incerto, complexo e ambíguo) e interagir
com os millennials. Essa geração está motivando a
mudança de muitas coisas, a forma de se relacionar
com o trabalho e a transferência de conhecimento.
Segundo Rodriguez e Rodriguez (2013), o mundo VUCA
é o terreno comum onde diferentes gerações, como os
baby boomers, geração X e os millennials interagem, se
relacionam e constroem o futuro.
Essa diversidade está sendo alvo de muitas empresas,
justamente no que tange a conseguirem atender os
diferentes públicos. O estudo de Rodriguez e Rodriguez
mostra que estamos vivendo a renovação geracional
– estamos percebendo isso dentro das salas. Além
dessa renovação, há o peso das novas tecnologias e,
por essa razão, torna-se imperativo que delineemos as
características dessa geração.
Cenário atual

Hoje vivemos em um mundo bem diferente; nem precisamos fazer uma


análise muito longa. Há dez anos, não imaginávamos que uma das
maiores empresas de transporte não teria nenhum carro, como a Uber;
o mesmo se aplica ao universo dos hotéis, como o Airbnb – tudo isso no
âmbito do mundo dos negócios; mas, e na aprendizagem?

4 CX na educação: mudanças geracionais


Estamos percebendo uma movimentação para
se trabalhar novas tecnologias dentro da esfera
da educação. Sabemos que a internet trouxe
conectividade e muita interação e isso foi
responsável por diversas transformações. Quanto
mais os sistemas aumentam suas capacidades de
memória e transmissão, mais estamos expostos
ao excesso de informações. Nesses ambientes
extremamente dinâmicos e indeterminados,
Santaella e Lemos (2010) argumentam que é aí
onde o futuro está sendo decidido. Movimentos
marginais criativos estão alterando radicalmente
nosso mundo, forçando a mudança de estruturas
hierárquicas e de formatos verticais para horizontais
e inclusivos, invertendo as forças de poder. Esses
grupos são apaixonados, empreendem com afinco
e audácia e focam as suas energias em direcionar o
que está sendo desenvolvido.

Para quem
A geração dos millennials, também chamada de
é curioso geração Y, abrange os indivíduos que nasceram
entre 1980 e 1994. Essa geração se desenvolveu na
era da tecnologia e acompanhou toda a evolução
do analógico para o digital, ou seja, presenciou,
por exemplo, a transformação das fitas VHS em
DVDs e, posteriormente, em serviços de streaming.
São precedidos pela geração X e sucedidos pela Z –
estes últimos nascidos na era da informação.

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Nesse cenário complexo e altamente competitivo, o estudo realizado por
Rodriguez e Rodriguez (2013) traça algumas características do grupo social
dos millennials com as quais líderes e educadores terão de trabalhar. Entre
essas características estão:

Tecnologia:

os millennials têm muita familiaridade com as mídias digitais, são produtores de


conteúdo e buscam garantir a transferência de conhecimento por meio de canais
digitais.

Informação:

o maior canal de busca de informação é na internet, principalmente nas


redes sociais. Isso faz com que considerem ser ouvidos quando falam. São
superconfiantes em si próprios.
Diversidade:

esse conceito faz parte do ambiente natural e afeta diretamente a maneira como
se relacionam. Consideram a diversidade uma chave essencial para alcançar
os objetivos e esperam estar envolvidos em uma rede que fornece velocidade,
conveniência e flexibilidade.

Multitarefa:

realizam tarefas simultaneamente e acreditam que isso é performance. No


entanto, os estudos realizados por Watson e Strayer (2010) mostram que a
realização de tarefas simultâneas apresenta perda de eficiência na aprendizagem
porque tudo acaba ficando bem superficial. A forma dessa geração processar
informação tende a ser mais prática e orientada a “hands on”.

Autônomos:

têm menos respeito por estruturas hierárquicas, buscam ter mais tempo para
lazer e saúde e estão mais preocupados em realizar algo com propósito e que
faça a diferença.

Requerentes:

buscam recompensa por participar de atividades; em vez de recompensa por


realização. A gratificação imediata é um problema e impacta diretamente no nível
de comprometimento, pois este se torna raso.

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Velocidade:

são impacientes e não gostam de esperar por resultados, ou seja, são mais
imediatistas. Esperam informações, feedbacks, conquistas de maneira rápida.
Sweeney (2012) afirma que os millennials costumam ignorar processos, acordos,
decisões de grupo, cortesias e que questões éticas são comportamentos
tolerados.

Gafanhotos:

são inquietos e pulam de um lado para outro, como um gafanhoto. Sweeney


(2012) afirma que a geração millennial é cética a qualquer compromisso de longo
prazo.

Veleiros:

mostram um nível de pensamento crítico que é questionável, pois têm habilidade


de fazer diversas tarefas simultaneamente, o que lhes dá pouco tempo para uma
reflexão crítica. Destacam-se em apresentações, utilizam as ferramentas mais
recentes e se dão bem com os recursos digitais.
Uma visão comportamental

Com as características apontadas nasceram com algum artefato


por Rodriguez e Rodriguez tecnológico em casa (e pode parecer
(2013), é possível ter uma visão uma informação irrelevante, mas ter
comportamental dessa geração; essa gama de informação dentro de
contudo, sabemos que vivemos casa muda o processo cognitivo dos
um misto geracional e que, indivíduos).
muitas vezes, essas gerações se
Frente a esse cenário, o educador
chocam e conflitam. O professor
precisa estar atento a essas
de comportamento humano da
características e contexto para poder
Fundação Dom Cabral, Anderson
promover um desenvolvimento de
Sant’Anna, afirma, à revista Galileu,
aprendizagem focado, o que gera
que a geração Y busca dar sentido
mais trabalho e organização, é claro.
às coisas, ou seja, não se interessam
No entanto, tendo uma visão mais
por atividades que, na visão deles,
apurada desses perfis, o trabalho
não melhoram ou aperfeiçoam
fica menos penoso. Essa mudança
uma habilidade. Buscam propósito
geracional não para por aí: ainda
e, por isso, são tão inconstantes.
temos a geração Z.
Essa geração tem o berço digital,
Para quem
é curioso
No vídeo a seguir, a Fine Brothers Entertainment
fez um experimento apresentando computadores
antigos para crianças e gravou as reações delas
frente às antigas tecnologias. É importante
perceber o comportamento e as reações que elas
expressam ao utilizarem um computador antigo:

Delimitando as fronteiras
entre as gerações Y e Z
A geração Z abrange os nascidos após da virada do milênio. Segundo a
Pew Research Center, os pontos de corte geracionais não são uma ciência
exata, mas, para fins analíticos, apontam que a partir de 1997 pode haver
um corte significativo entre os millennials e a geração Z. São considerados
os fatores políticos, econômicos e sociais que definem os anos de
formação dos millennials.
A seguir, temos um gráfico do Pew Research Center que apresenta os
limites de corte de cada geração a partir de 1928. Assim, fica mais fácil
visualizar a história cronológica dos movimentos geracionais; afinal, hoje
podemos trabalhar em sala de aula com alunos que podem vir desde a
geração X até a Z.

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Definição das gerações por Idade de cada
ano de nascimento geração em 2019

Geração Z
1997-2012
Entre 7 e 22 anos

Millennials
1981-96
Entre 23 e 38 anos

Geração X
1965-80
Entre 39 e 54 anos

Baby boomers
1946-64
Entre 55 e 73 anos

Silenciosos
1928-45 Entre 74 e 91 anos

1920 1940 1960 1980 2000 2020

Figura 1 – Gráfico das gerações


Fonte: adaptado de Dimock (2019)

Analisando o gráfico, é possível traçar uma contextualização com


a evolução tecnológica. A rápida evolução de como as pessoas se
comunicam e interagem é outra consideração que molda a geração.
Os baby boomers cresceram enquanto a televisão se expandia
dramaticamente, mudando seu estilo de vida e sua conexão com o
mundo de maneiras fundamentais. A geração X se desenvolveu enquanto
a revolução dos computadores estava se firmando, e os millennials
amadureceram durante a explosão da internet. Já a geração Z nasceu em
uma era totalmente digitalizada – nem imaginam como fazer pesquisas
sem o Google.

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A nova relação com o saber
A realidade complexa com o trabalho no futuro tem mais a ver
o mercado de trabalho se com aprender, transmitir saberes e
reformulando, postos e cargos produzir conhecimentos.
em extinção e outros nascendo,
Segundo Levy (1999, p. 157), todas
além da mistura geracional, são
essas transformações, unidas ao
desafios para os educadores. No
desenvolvimento do ciberespaço
entanto, são também um campo
e às interações no universo
de oportunidades. Em tempos
digital, “amplificam, exteriorizam
de fake news e pós-verdades, a
e modificam numerosas funções
responsabilidade que temos no
cognitivas humanas: memória
que se refere a orientar sobre
(banco de dados, hiperdocumentos,
como buscar, filtrar, sintetizar e
arquivos digitais de todos os tipos),
estruturar informações nunca foi
imaginação (simulações), percepção
tão necessária. Pela primeira vez
(sensores digitais, telepresença,
em nossa evolução, a maioria das
realidades virtuais), raciocínios
competências adquiridas por uma
(inteligência artificial, modelização
pessoa no começo da sua jornada
de fenômenos complexos)”.
profissional pode ficar obsoleta no
final da carreira. Observamos que

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“O ciberespaço é novo meio
de comunicação que surge
da interconexão mundial dos
computadores. O termo especifica
não apenas a infraestrutura material
da comunicação digital, mas também
o universo oceânico de informações
que ela abriga, assim como os seres
humanos que navegam e alimentam
esse universo.” Levy (1999, p. 17)

Para quem
é curioso
Um momento de descontração: neste vídeo, Bill
Gates explica sobre a internet e como se davam
as interações lá no início da rede. Sabemos que
muitas coisas podem ser feitas de maneiras
diferentes – Gates fala das diferenças que o
universo digital trouxe para nossa realidade.

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A visão hierárquica e generalista autônomos, tomam decisões
de ensino, que foi construída e em relação ao que e a quando
consolidada ao longo dos anos, aprendem o que lhes interessa.
entra em conflito com os perfis e Esse ambiente virtual estimula
comportamento das novas gerações regiões do cérebro que ativam
junto com a evolução tecnológica. o paralelismo – uma função que
A partir da última década, o possibilita o desenvolvimento
percurso e perfis de competências das duas regiões do cérebro,
são singulares e buscam espaços permitindo um raciocínio rápido
de “conhecimentos emergentes, e flexível. A neuropsicóloga
abertos, contínuos, em fluxo, Mariana Assed afirma que “toda
não lineares, se reorganizando vez que você expõe uma série de
de acordo com os objetivos ou estímulos, ocorrem modificações
contextos, nos quais cada um ocupa nas sinapses – as responsáveis
uma posição singular e evolutiva.” pelos vários caminhos dentro do
(LEVY, 1999, p. 158). cérebro. Isso ajuda a formar novas
conexões” (MESQUITA, 2015, n.p.).
Com as tecnologias sendo
Essas conexões estruturam novas
usadas ativamente no dia a dia,
formações neurais e fazem com que
os millennials e a geração Z são
a geração Z tenha formas diferentes
considerados multitarefas e
de aprendizado.
chamados de nativos digitais.
Superinformados e mais
Cabeças No Brasil, 54% dos usuários das
hiperconectadas redes sociais têm entre 18 e 24
anos. Cerca de 72 milhões de
Embora tropecem no raciocínio e na crítica, internautas acessam o
os “nativos digitais” da geração Z disparam Facebook pelo menos uma vez
sinapses cerebrais com velocidade e por mês. Os mais jovens
automatismo. Entenda essa agilidade. passam até três horas por
dia diante das telas.

2 O córtex motor dirige o


automatismo de clicar
e processa emoções e 3 Telas digitais e videogames
pensamentos. estimulam o circuito de
recompensa neurológico
para a liberação da
dopamina, o “hormônio
do prazer”.

1
4
Diante da tela, o
sinal captado pelo O córtex pré-frontal
olho é enviado acelera as sinapses.
pelo nervo óptico Mas só o treino inibe
às áreas visuais do reações impulsivas e
cérebro situadas permite a reflexão.
atrás do órgão.

Figura 2 – Infografia apresentada pela Revista Planeta explicitando as


áreas do cérebro que são ativadas por meio das interações digitais
Fonte: adaptado de Mesquita (2015)

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Nem tudo que está na rede é ruim. Utilizar essas ferramentas
para o desenvolvimento dos alunos é extremamente
importante e prático; claro que precisa haver um pouco
mais de esforço dos não nativos digitais. A interação é uma
palavra forte, pois possibilita a independência, a autonomia
e a descoberta autodidata. Esses estímulos multitarefas lhes
proporcionam atenção simultânea – ao mesmo tempo em
que conversam no WhatsApp, jogam videogames on-line e
compartilham vivências nas redes sociais.

#Dicas Podemos utilizar essas características para planejar


Práticas aulas que utilizem esses gatilhos com o fim de buscar
engajamento, vivência e aprendizado através do
conteúdo didático. É uma grande oportunidade
para conhecer as novas tecnologias e trazer esse
conhecimento para viabilizar uma interação com mais
proximidade da realidade na qual os jovens estão
inseridos.

Por exemplo, em uma aula de História, pode-se criar


personagens para os alunos, solicitar que cada um crie
uma conta no Twitter, pedir que estudem o perfil de cada
personagem e interajam via rede social para contar a
história.

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O potencial do
Customer Experience

Podemos pensar em formas de envolver os estudantes através


dessas ferramentas, utilizadas como mecanismos de interação
para promover discussão entre eles sobre alguma temática.
Por isso, é tão importante conhecer esse novo perfil e entender
como constroem a informação; assim, será possível planejar
aulas que estejam alinhadas a essas novas realidades. O
Customer Experience busca explicitar a jornada para auxiliar na
identificação da melhor ferramenta dentro da temática que o
educador quer explorar.

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REFERÊNCIAS
CALLON, M. Society in the making: the study of technology as a tool for sociological
analysis. In: BIJKER, W et al. (ed.). The social construction of technological
systems. New directions in the sociology and history of technology. Cambridge: Mit
Press, 1986. pp. 83-103.

DIMOCK, M. Defining generations: Where Millennials end and Generation Z


begins. Pew Research Center. Washington (DC), 2019. Disponível em: https://pewrsr.
ch/3dHYcbQ. Acesso em: 16 jun. 2021.

LÉVY, P. Cibercultura. Trad. Carlos Irineu da Costa. São Paulo: Editora 34, 1999.

LOIOLA, R. Geração Y. Revista Galileu, Edição 219, out./2009. Disponível em: http://
revistagalileu.globo.com/Revista/Galileu/0,,EDG87165-7943-219,00-GERACAO+Y.
html. Acesso em: 16 jun. 2021.

MESQUITA, R. V. Cérebros digitais. Revista Planeta, Edição 508, maio/2015. São


Paulo (SP): Editora Três, 2015.

RODRIGUEZ, A.; RODRIGUEZ, Y. Metaphors for today’s leadership: VUCA world,


millennial and “Cloud Leaders”. Journal of Management Development, vol. 34 n. 7,
pp. 854-866, 2015.

SANTAELLA, L.; LEMOS, R. Redes sociais digitais: a cognição conectiva do Twitter.


São Paulo (SP): Editora Paulus, 2010.

SWEENEY, R. Millennial behaviors and higher education focus group results: How are
millennials different from previous generations at the same age? NJIT Journal, New
Jersey Institute of Technology, mar./2012.

WATSON, J.M.; STRAYER, D. L. Supertaskers: profiles in extraordinary multi-tasking


ability. Psychonomic Bulletin and Review, nol. 17 n. 4, pp. 479-485, 2010.

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