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Caminhando em meio a nevasca Ulfgar sentia cada parte do corpo congelando, as

copas dos enormes pinheiros negros lhe davam pouca cobertura contra a força da neve.
Sentindo o perigo lhe rondando, o jovem caçador manteve os olhos e ouvidos atentos,
machado em punho cerrado e a certeza que a morte estava próxima, a espreita,
aguardando qualquer momento de fraqueza para dar o golpe final.
Podia ver ao longe uma formação rochosa, com sorte encontraria uma caverna para
se abrigar da intempere e possíveis predadores, talvez tivesse que lidar com um urso
pardo. Isso seria um grande problema, pensou. Mas qual alternativa lhe restava? Resolveu
encarar seu destino de braços abertos, afinal, era um homem agora.
Uivos agourentos romperam a quietude da floresta, um par de olhos surgiu entre as
árvores. Instintivamente os músculos do braço direito tensionaram ainda mais o cabo da
arma.
– Venha me pegar seu maldito, eu estou pronto! Você quer um pedaço meu? – Vociferou o
caçador batendo no peito em uma tentativa de intimidar seu oponente.
Um segundo par de olhos surgiu em resposta. E mais um, e outro. Em poucos
instantes eram dezenas de olhos raivosos lhe observando. Enfrentar um predador em
campo aberto tem seus riscos mas Ulfgar confiava em suas habilidades, tinha sido treinado
sua vida toda para isso. Já o combate contra uma matilha inteira era extremamente
arriscado até para o melhor dos caçadores.
Percebendo que estava em desvantagem o jovem caçador correu. A espeça camada
de neve agarrava-lhe as pernas como grilhões, os pulmões buscavam o ar gélido com
dificuldade e cada arfada queimava suas narinas As pernas gritavam em agonia a cada
passo dado mesmo assim Ulfgar não parou. Podia ver ao longe a entrada de uma caverna,
era sua única chance então acelerou o máximo que podia. Conseguia ouvir o farfalhar de
patas em seu encalço, sentia o fedor do hálito faminto cada vez mais perto.
Vinte metros o separavam do abrigo mas quanto mais corria mais distante parecia
estar de seu objetivo. O medo explodiu em seus pensamentos, corria com nunca antes e
mesmo assim ainda estava tão distante.
Havia chego ao limite, não conseguia dar nem mais um passo se quer. Seria esse o
fim de Ulfgar Tandrell? Mal tinha conquistado o respeito do clã e já sucumbiria ao
primeiro desafio real? O que diria aos Deuses se nem ao menos podia derrotar um bando
de lobos? Ideias iam e vinham em frações de segundos. Não se entregaria tão fácil, não
sem lutar, ao menos dois ou três levaria consigo.
Procurou em seu campo de visão algo que lhe desse alguma cobertura. Um grosso
tronco seria o bastante para escudar sua retaguarda. Sempre proteja as costas era o que seu
velho pai lhe dizia.
Usando o último folego que lhe restava Ulfgar jogou-se contra a imensa árvore
absorvendo o impacto do movimento com as costas enquanto posicionava o machado em
guarda, pronto para atacar.
Não podia acreditar no que estava vendo, centenas de lobos cobriam a floresta
boreal, quase não se podia ver a neve por baixo de tantas patas. Nunca tinha visto uma
matilha tão grande. Algo ainda mais estranho, nenhum lobo avançava, estavam todos
parados, olhos fixos e sem expressão. Um silêncio mórbido tomou conta de tudo, nem
mesmo o vai e vem dos galhos ou as batidas do coração podiam ser ouvidas.
Ulfgar aproveitou para retomar o folego e recuperar um pouco das forças perdidas
na exaustiva corrida. Não sabia ao certo o que fazer, apenas mantinha o machado em riste
esperando o próximo movimento do destino.
O mar de feras subitamente se abriu. Uma besta atros surgiu das sombras, traçando
caminho lentamente. Tinha o tamanho de um urso, seu pêlo era tão negro quanto carvão,
os olhos brilhavam em vermelho incandescente e suas garras eram tão grandes quanto
facas de caça.
Incrédulo Ulfgar relaxou a guarda incapaz de conceber o que se apresentava diante
de olhos. Sem aviso a fera avanço, um salto e estava em cima da presa. O reflexo instintivo
salvou a vida de Ulfgar, em um movimento rápido o guerreiro conseguiu posicionar o
cabo do machado entre os enormes dentes da fera.
O monstro mordia com violência buscando a face rosada de seu inimigo. Ulfgar
lutava como podia mas as forças que ainda tinha estavam lhe deixando aos poucos. Saliva
quente respingava em seus braços, a imensa boca raivosa estava a menos de um palmo. O
desespero aumentava cada vez mais.

– Vai deixar um animal selvagem qualquer acabar com a sua vida meu pequeno irmão? –
A voz era de Gerdar, o coração de Ulfgar se encheu de alegria e espareça, estava salvo.
– Ajude-me! – Suplicou o jovem – Não consigo aguentar mais!
– E porque eu ajudaria? Você não é um homem agora? Deveria ser capaz de lidar com esse
pequeno problema sozinho.
– Pequeno? Isso é um monstro Gerdar, pelos deuses irmão me ajude, eu estou com medo
de morrer!
– Como pode pensar em morrer Ulfgar? Você mesmo disse que seria o maior guerreiro
que o clã já teve, todo cheio de si por ter liderado a caçada.
– Meu irmão, eu lhe imploro, me ajude!
– Você é mesmo um covarde! Nunca será um líder! Vai morrer velho e com medo,
escondido uma casa qualquer sem provar que é digno dos deuses.
– Vá pro inferno seu maldito! Eu não preciso de você! Não preciso da sua ajuda! Vou te
provar que sou forte! – Esbravejou Ulfgar, o medo deu lugar a uma raiva irracional, a fúria
dominou seu peito explodindo pela garganta em forma de um urro ensandecido.

Ulfgar conseguiu desviar todo o peso da criatura para o lado saltando na direção
oposta, levantado a guarda novamente. Buscou na memória tudo que aprendera sobre o
combate com animais grandes, sabia que deveria se manter em movimento e atacar as
patas para prejudicar os movimentos da fera.
Os dois andaram em círculos pela neve, olhos nos olhos os dois se estudavam.
Ulfgar aguardava o bote, sabia da desvantagem se atacasse primeiro.

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