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Juan Carlo
João Deszaunet
Green Digital
Diagramação
Lura Editorial
Revisão
Daisy Rauchbach
Edio Araújo Copyright © 2018 by
Juan Carlo Anderson Godzikowski
Jaci Albuquerque
Impressão Todos os direitos desta edição
Lura Editorial são reservados ao autor.
Godzikowski, Anderson
Governança & nova economia/ Anderson Godzikowski.
1a Ed. Lura Editorial. São Paulo, 2018.
216 p.
ISBN 978-85-5849-158-7
CDD 330
Anderson Godz
Dedico este livro à memória do vovô Tadeu Godzikowski.
SUMÁRIO
Prefácio ....................................................................................................................... 11
Agradecimentos ................................................................................................... 13
Introdução ................................................................................................................ 15
Q
uando conheci o Anderson, há uns dois anos, lembro-me de ele
ter me contado que estava construindo seu trabalho de mestrado
sobre governança e compliance para startups. Notei o brilho em
seus olhos enquanto articulava sobre a importância do tema, enfatizando
a sua ampla experiência como empreendedor, investidor e profissional
de grandes empresas, além da sua formação na Fundação Dom Cabral.
O Anderson me impressionou ainda mais quando revelou que iria
escrever um livro sobre o tema, direcionado às pequenas e médias empre-
sas, porque queria apoiar a formação de um ecossistema empreendedor
mais maduro, responsável e bem sucedido.
Para entender o quão profundo é o interesse do Anderson, é preciso
contextualizar que as pequenas e médias empresas correspondem a
98% do total de CNPJs no Brasil. Juntas, contribuem para 27% do PIB
brasileiro e empregam mais da metade da mão de obra formal no país.
São números significativos, que poderiam ser ainda maiores se 25% das
empresas não morressem nos primeiros dois anos de existência.
Como fundador de uma startup que se tornou o maior escritório de
contabilidade do país, pude acompanhar o nascimento de mais de 5 mil
CNPJs e o dia a dia de milhares de empresas. Nestes cinco anos à frente
da Contabilizei, notei que empresas não morrem somente pelas causas que
o senso comum indica – falta de recursos, condições de mercado ruins,
ausência de planejamento estratégico, etc. A mortalidade das empresas
passa também pela falta de compliance e governança. Isso é representado
principalmente pelo desalinhamento entre sócios, ausência ou excesso
de controle, não cumprimento de normas e leis, entre outros motivos.
Com este livro, Anderson foi extremamente feliz ao apresentar os
fundamentos e práticas de mercado que visam a construção de modelos
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de governança e compliance capazes de acompanhar a evolução do
negócio nos seus diferentes estágios de crescimento. E, quem sabe, mais
empreendedores conseguirão aplicar os conhecimentos deste livro em
empresas mais fortes e preparadas para os desafios da nova economia.
Vitor Torres
Fundador e CEO
Contabilizei
A
gradeço à minha linda parceira de milhas e milhas, Kauane, e aos
meus dois filhos incríveis, Ana Julia e Benicio – vocês três engran-
decem e dão sentido maior à minha vida.
Aos meus pais, Edson e Rosane, que fizeram muito mais do que
imaginam, e entre tudo que me ensinaram, o principal: que eu posso
simplesmente ir. À minha avó Ernestina, por ensinar o cuidado como
ninguém, e à minha avó Niva, pelo exemplo de inquietude. À minha
irmã, Rosane, por me ensinar o pensar simples e ao meu sobrinho Israel,
por já ser um “grande cara grande”.
Ao meu irmão por escolha, Marcos Marcatto, obrigado por me ensinar
o que é amizade. Ao Armando Terribili, pela inspiração e paciência em
escrever certo pelas minhas linhas tortas. Ao Rodrigo Casagrande, pela
orientação no mestrado.
Um muito obrigado também aos empreendedores, investidores
e amigos que colaboraram com esse livro: Adriana Karam Koleski,
Alphonse Voigt, Ana Amélia Cunha Pereira, Axeu Aislan Beluca,
Bernardo Quintão, Bruno Dequech Ceschin, Diego Godoy, Fábio
Campos, Fábio Povoa, Fábio Koreeda, Felipe Lamounier, Francisco
Millarch, Francisco Santos, Guilherme Cunha Pereira, Guilherme
Krauss, Guilherme Vieira, Gustavo Caetano, João Del Valle, Jorge
Rocha, Jorge Sanchez, Léo Jianoti, Leonardo Mendes Junior, Manuel
Emílio Rodrigues, Milton Fabricio, Pedro Carlos Carmona Gallego,
Ney Queiroz Azevedo, Odilo Schwade Junior, Ovídio Felippe Jr, Osmar
Zózimo, Rafael Santiago, Ricardo Amorim, Ricardo Moraes, Rodrigo
Baer, Rodrigo Esteves, Rodrigo Ghedin, Rodrigo Schiavini, Thiago
Ayres, Vitor Torres, Vivian Muniz e Viviane Doelman.
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INTRODUÇÃO
O
s negócios e os modelos empresariais de gestão, operação e – por que
não? – de governança corporativa (GC) vêm sendo desafiados pelo
dinamismo da nova economia (NE). A governança corporativa, na
prática, consiste nas regras que dão sentido e rotina ao jogo empresarial
e devem conferir agilidade, autonomia e transparência aos jogadores –
sócios, investidores, integrantes de um negócio – independentemente do
seu porte ou da sua velocidade de crescimento.
Contudo, a maioria das ferramentas de administração não está
preparada para um ambiente de extrema incerteza. Essa é uma frase de
Eric Ries em um dos clássicos livros de startups: A Startup Enxuta. A
governança corporativa é, naturalmente, um dos instrumentos de gestão
desafiados por esse ambiente de incerteza.
Nascida nos anos 90, ela vem sendo aprimorada por mais de três
décadas, com saltos de maturidade após crises de compliance, como nos
episódios da Enron (2001), gigante americana da área de energia, e da
Lehman Brothers (2008), empresa de serviços financeiros. As histórias
dessas falências ganharam páginas de livros e telas de cinemas e se tor-
naram sinônimo de um descontrole empresarial e fraude que não se via
desde 1929, quando da primeira quebra da Bolsa americana.
Historicamente, tanto os episódios de manipulação americanos como
os recentes casos épicos de corrupção no Brasil, levam a uma reflexão
sobre a necessidade de profissionalização da administração dos negócios
e quanto à proteção dos acionistas em relação a eventuais abusos de
gestores e de stakeholders.
A governança não é uma pílula mágica que, sozinha, fará as mais de
quatro mil startups brasileiras sustentáveis ou transparentes. Entretanto, é
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incoerência empreender qualquer tipo de negócio desprezando o legado
de práticas que ajudaram a economia global a sanar o conflito entre pro-
priedade e gestão (conflito de agência). Até porque essa dor não deixa de
existir na nova economia. Ao contrário, ela aumenta!
Ainda assim, as práticas de governança foram, em sua maioria,
desenvolvidas em um contexto de crescimento mais linear do mercado.
Não havia tantas empresas digitais que crescem exponencialmente,
criptomoedas que desafiam as regulações, além de um grande fluxo de
investimentos que, cada vez mais, miram alvos que se movem a três dígi-
tos anuais. Nas boas práticas do mercado ou na literatura de governança
recente, também não se encontram recomendações de como o capital de
risco deve tratar outliers excêntricos. Eles surgem em garagens do Vale
do Silício, Israel, China, Índia, Brasil, ou em qualquer outro país, em um
mundo de inovação sem fronteiras.
Assim há, pelo menos, dois sentidos em que podemos analisar a
relação entre a governança corporativa e a nova economia:
Primeiro, as startups, partindo de sua criação até um porte significativo.
Nestas a governança precisa ser extremamente flexível e adaptável para
cada estágio do seu rápido crescimento. Essa flexibilidade, no entanto,
não significa superficialidade nas práticas ou fragilização dos controles.
Exemplo prático: reuniões semanais com investidores. Nestas, em vez
de somente DRE (Demonstração do Resultado do Exercício), relatórios
e números, os fundadores recebem perguntas do tipo “Como podemos
ajudá-los?”. Trata-se de uma relação muito mais próxima entre sócios e
investidores do que em sistemas de governança habituais.
Existem ainda outros desafios como fundos e investidores que,
corretamente, condicionam seus aportes ao poder de impedimento de
fundadores, conflitando diretamente seus sonhos. Outras regras, como
as de vesting equity e antidiluição, precisam ser definidas para resguar-
dar os detentores do capital nas sucessivas rodadas de investimento. Há
também situações específicas do ecossistema brasileiro que vão além do
custo Brasil e da corrupção. O mercado aqui, por exemplo, ainda não
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de startups, propondo reflexões sobre as práticas de governança para cada
etapa do intenso ciclo de crescimento de uma organização exponencial.
Em um dos bate-papos realizados, por exemplo, um executivo à frente
de inovações de uma grande empresa de São Paulo comentou o argu-
mento usado quando recebeu a seguinte questão: quais os critérios para
a empresa gastar um orçamento de R$ 2 milhões por ano na aceleradora
de startups sem ter a certeza de retorno? A resposta foi enfática: “medo
de ficar de fora!”. Parece haver novos critérios de seleção e priorização
de projetos e de investimentos.
A nova economia pode desafiar o status quo da governança corporativa
em empresas tradicionais. Por isso, faz-se necessário manter práticas que
se comuniquem com as startups em novo ritmo que, quando desgover-
nado, pode oferecer riscos a uma velocidade totalmente diferente da que
os sistemas de governança tradicionais estão acostumados a enfrentar.
É nesse contexto que tanto empresas joviais como tradicionais têm
um mesmo desafio: encontrar modelos flexíveis que mantenham o ali-
nhamento das práticas a cada estágio de crescimento e/ou que promovam
relações adequadas com esses novos negócios. Sem isso, com a mesma
rapidez com que a nova economia nos surpreende, podemos ver surgir
novas “Enron ou Lehman Brothers digitais” ou, no limite, sufocar motores
da inovação com fardos de regulações e compliance pesados demais.
Não temos ainda, no Brasil, um ambiente que crie boas condições ao
empreendedorismo para qualquer tipo de empresa, e isso não é diferente
para startups. Há esforços recentes como o da Comissão de Valores Mo-
biliários (CVM) com a Instrução CVM 588 e do Conselho Monetário
Nacional com a regulamentação de fintechs.
A inovação sempre estará à frente da regulação. Logo, as práticas de
governança não precisam somente de atualização, mas de um modus
operandi oxigenado e vivo que, sobretudo, mantenha sua constante adap-
tação alinhada ao crescimento exponencial do negócio e hiperconectado
com as questões fiscais e regulatórias (que precisam ser aceleradas nos
próximos anos no Brasil).
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Este não é um livro que explorará detalhadamente a nova economia.
Também não insistirá em particularidades de gestão e operação de startups.
Há uma vasta literatura sobre esses temas em livros específicos, como o
próprio A Startup Enxuta, de Eric Ries; The Startup Owner’s Manual, de
Steve Blank e Bob Dorf; Venture Deals, de Brad Feld e Jason Mendelson,
além do belo e recente trabalho dos brasileiros Sandro Magaldi e José
Salibi Neto no livro Gestão do Amanhã.
A jornada aqui busca refletir sobre a relação entre esses dois importan-
tes temas das últimas décadas (governança corporativa e nova economia),
partindo da análise das boas práticas, passando pelo desafiador contexto
brasileiro e reunindo abordagens. Como no livro Organizações Exponenciais,
de Salim Ismail, Michael S. Malone e Yuri Van Geest (2015), que sugere
a capacitação do conselho de administração para que os representantes
estejam mais bem preparados frente às ameaças diruptivas ao negócio.
Ainda que temas contemporâneos, governança e nova economia
parecem estar se desenvolvendo em estradas diferentes. Mas se elas
levam a um mesmo destino, por que não discuti-las sob uma mesma
perspectiva? Essa é a inquietude que motivou este livro, cujo objetivo
é abrir caminho para o aprimoramento das práticas de governança e
para as discussões quanto a sua flexibilidade e escalabilidade de acordo
com o crescimento das startups. Em última análise, espera-se também
contribuir com o crescimento do ecossistema de startups no Brasil, de
forma a considerar os preceitos de longevidade, equidade, compliance
e responsabilidade corporativa como partes integrantes e indispensáveis
desse ecossistema inovador.
A jornada dos próximos capítulos será dividida em quatro seções. Na
Parte 1, “Explorando governança corporativa e nova economia”, equa-
lizamos conceitos e colocamos governança e nova economia sob uma
mesma perspectiva. Na Parte 2, são elencados outros aspectos importantes
para essa relação, e que vão além das dimensões do IBGC, batizadas de
“Growth Governance” (Governança do Crescimento). Já na Parte 3, “As
práticas de governança em uma visão sequencial e balanceada”, a proposta
é simplificar as práticas de governança corporativa para a nova economia,
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22 GOVERNANÇA & NOVA ECONOMIA
PARTE 1:
EXPLORANDO
GOVERNANÇA
CORPORATIVA
E NOVA
ECONOMIA
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CAPÍTULO 1: OS 10 FATORES
DE PRESSÃO DA NOVA
ECONOMIA NA GOVERNANÇA
2 Bug do Milênio: foi um medo coletivo de que, na virada de 1999 para 2000, os
computadores da época não entendessem a mudança e causassem uma pane geral em
sistemas e serviços. Isso porque, desde os anos 1960, eles usavam calendários internos
com dois dígitos. Depois do ano 99, viria o 00, que as máquinas entenderiam como
1900 e não como 2000. Mas o medo tinha pouco fundamento: muitos computadores
da época já vinham com as datas em quatro dígitos. Isso não impediu, porém, que
o pânico se espalhasse pelo globo e que fossem gastos cerca de US$ 300 bilhões
em todo o mundo em medidas preventivas. Na prática, o Bug do Milênio não fez
quase nada: houve falhas em terminais de ônibus na Austrália, em equipamentos
de medição de radiação no Japão e em alguns testes médicos na Inglaterra. Fonte:
Revista Superinteressante.
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Estudos históricos também oferecem alicerces importantes para o
incrível momento que estamos vivendo. A começar pela Lei de Moore,
pensada em 1965 por Gordon Moore, cofundador da Intel. Naquela época,
ele previu que o poder de processamento dos computadores dobraria a
cada 18 meses. Não é o que ocorre com nossos smartphones hoje? Na
mesma linha, Kurzweil, em ensaio de 2001 intitulado “A Teoria das Mu-
danças Aceleradas”, ampliou a Lei de Moore ao pregar um crescimento
exponencial do progresso tecnológico. O crescimento exponencial das
tecnologias que habilitam as startups encontra respaldo também na Lei
de Metcalfe, formulada pelo norte americano Robert Metcalfe em 1980,
que trata dos efeitos de rede e de seu crescimento. Ele afirma que “o valor
de um sistema de comunicação cresce na razão do quadrado do número
de usuários do sistema”. Alinhados também, estão os estudos de Jonathan
Koomey, da Universidade de Stanford, sobre o aumento da eficiência da
energia computacional, que dobraria a cada 1,6 ano desde meados da dé-
cada de 1940. Assim, os estudos de Moore, Kurzweil, Metcalfe e Koomey
sustentam as bases do crescimento exponencial das novas tecnologias, no
qual está alicerçado o crescimento das startups.
Convenhamos, seja a corrida do ouro, da tecnologia ou das startups,
nada é tão novo e nada é tão velho nesse jogo. Então, o que há de real-
mente novo?
A figura 1 a seguir apresenta alguns elementos da nova economia
que podem influenciar a governança.
Fonte: o autor.
3 Bay Area: nos EUA, o termo Vale do Silício não é muito usado, e sim Bay Area.
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O Vale é grande, o berço do empreendedorismo mundial, mas não é
o único celeiro de startups. Há outros ecossistemas que são pulmões dessa
nova economia. O mercado israelense, por exemplo, é considerado o maior
reduto de startups per capita no mundo – 6 mil negócios em operação
para oito milhões de habitantes. Já a China registrou, recentemente, um
boom de startups, subsidiado em parte pelo próprio governo, que entra
com aporte financeiro para aluguéis e treinamentos. Os resultados já são
visíveis e alcançam valores bilionários. A Xiaomi, tida como a “Apple da
China”, e a Didi Chuxing, a “Uber chinesa” (que desbancou a própria
Uber do país), são apenas a ponta do iceberg. A Xiaomi, por sinal, tende
a ser em 2018 o maior IPO4 da história, superando o recorde atual de
outro chinês, o Alibaba (U$ 25 bilhões).
Eric Ries afirma que, nos EUA, muito do investimento em startups
se degenerou para alimentação dos bancos em uma pressão intensa dos
mercados financeiros para alcançar a lucratividade de curto prazo. A pe-
renidade dos negócios digitais parece não ser um valor que está na lista
de prioridades de investidores e empreendedores. No Brasil, as expecta-
tivas mudam dependendo do estágio de investimento, como veremos a
seguir, mas é fato que a economia de crescimento linear não atende às
expectativas mais ousadas, fazendo com que mais investidores estejam
dispostos a enfrentar maiores riscos.
Startups não são apenas uma aposta de diversificação de investidores
ou um “medo de ficar de fora”. É cada vez maior o número de oportu-
nidades de investimentos (deal flows) e de grandes empreendedores que
já entregaram resultados e estão criando uma segunda ou uma terceira
empresa. Há mais capital do que boas oportunidades. Os investimentos
mais frequentes no dia a dia dos empreendedores significam muito
mais aliados para que as empresas da nova economia se desenvolvam
e ganhem escala. Mas, paradoxalmente, significam também uma área
maior para conflitos entre propriedade e gestão, ou seja, mais necessi-
dade de governança!
4 IPO: é a sigla em inglês para Initial Public Offering, ou Oferta Pública Inicial em
português. Uma oferta pública inicial de ações é o momento em que a empresa abre
seu capital e passa a ser listada na Bolsa de Valores.
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Portes
Segundo DIEESE (2013, p. 17), o porte das empresas pode ser clas-
sificado de acordo com a tabela 1:
COMÉRCIO
PORTES INDÚSTRIA
E SERVIÇOS
Microempresa (ME) Até 9 empregados Até 9 empregados
Fonte: SEBRAE-NA/ Dieese. Anuário do trabalho na micro e pequena empresa 2013, p. 17.
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Investimentos são, definitivamente,
o ponto de inflexão para o incre-
mento das práticas de governança
corporativa. É quando uma nova
peça entra no tabuleiro.
Investidor-anjo
Pessoas físicas que, além do capital, entregam ao negócio conheci-
mento, experiência e oportunas redes de relacionamento – o chamado
“smart money”. Investidores-anjo são, em geral, a primeira experiência
dos fundadores de startups com recursos externos.
Aceleradoras e incubadoras
São organizações que aportam algum capital inicial junto a trei-
namento intensivo, coaching de produto e time, além da busca de
outros investidores.
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Capital semente (Seed) e/ou sindicatos
Grupos de investidores como, por exemplo, Anjos do Brasil, Founders
Institute, Curitiba Angels, entre outros. Trata-se de um investimento ainda
em nível inicial. Como normalmente há vários investidores envolvidos,
surge a figura do investidor-anjo líder. Esse tipo agrupa todos os anseios
e expectativas e polariza a interlocução de todos os investidores com o
empreendedor da startup. Com isso, evita que cada um dos investidores
interaja com o empreendedor. Em uma pequena empresa, o empreen-
dedor precisa concentrar seus esforços no negócio. Pelo maior trabalho,
o investidor-líder é normalmente remunerado por um percentual entre
5% e 10% sobre a valorização das cotas dos demais investidores.
Equity crowdfunding
A maior disponibilidade de capital ocorre também por fontes mais
pulverizadas. Crowdfundings são financiamentos coletivos que operam
on-line e financiam empresas em estágios iniciais. A EqSeed (www.eq-
seed.com), por exemplo, é uma plataforma de investimentos em startups
que funciona como um “investidor-líder”. Ela pré-seleciona as empresas
que abrirão as rodadas e disponibiliza a documentação principal das
mesmas. Dez por cento do que os investidores colocarem na startup fica
na plataforma e outros 10% são retidos sobre o rendimento – se houver.
A plataforma também promove webinars com empreendedores que estão
com rodadas abertas, seminários presenciais e estimula o relacionamento
próximo entre empreendedores e investidores. Existem outros exemplos
no Brasil, como Broota (www.broota.com.br) e StartMeUP (www.start-
meup.com.br), além de Kickante (www.kickante.com.br/), Catarse (www.
catarse.me), entre outras. Há ainda, algumas variações de crowdfunding:
donation-based crowdfunding, baseado em doações; reward-based crow-
dfunding, baseado em prêmios ou brinde em troca.
Venture builders
Aportam seu trabalho, normalmente de desenvolvimento de software
ou apps, em troca de participação na empresa.
Em geral, esses tipos de investidores estabelecem uma relação diferente
com os empreendedores do que investidores tradicionais. Todos aportam,
além do valor financeiro, conhecimento e rede de relacionamentos para
potencializar os negócios da startup. As expectativas de retorno também
são diferentes. No Brasil, investidores-anjo ficam em média de três a cinco
anos no negócio, enquanto VCs entre cinco e 12 anos.
Segundo o pesquisador Odilo Schwade Junior, em 2015, um estudo
publicado pela KPMG e a ABVCAP (Associação Brasileira de Private
Equity e Venture Capital) demonstra que, no Brasil, os investimentos
cresceram 39% com relação ao ano anterior, atingindo R$18,5 bilhões de
reais. Quanto ao total de capital comprometido em VC e Private Equity os
dados, obtidos com gestores de fundos, indicam que houve um aumento
de mais de 20% com relação a 2014 chegando a aproximadamente R$153,2
bilhões de reais, deste valor cerca de R$102,4 bilhões foram investidos
em empresas (ABVCAP, 2016).
Os contratos entre investidores e investidos são estabelecidos através
de dívida conversível (TDC – Título de Dívida Conversível), quando o
dinheiro entra no passivo da contabilidade como uma dívida atrelada a
algum evento futuro de nova rodada ou venda da empresa. Outra opção
é a compra de ações, quando o investidor adquire a opção de comprar
ações de empresa no futuro. Neste caso ele não entra no contrato social
(veja mais nos itens 3.4, 5.1 e 8.4) mas tem o direito de comprar ações
por um preço já acordado e atrelado a uma data ou evento. Há ainda,
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modelos ainda mais evoluídos como o SAFE6 (Simple Agreement for
Future Equity), que podem substituir as notas conversíveis, e são mais
interessantes para o empreendedor, pois não consideram uma eventual
descapitalização da empresa no vencimento de um título.
Outro ponto importante é sobre a realização dos seus ganhos. Em
geral, isso não ocorre necessariamente pelo EBITDA. O Twitter, por
exemplo, pela primeira vez, desde que foi criado (julho/2006), apresentou
um trimestre de lucro no período de outubro a dezembro de 2017. Foram
US$ 91 milhões no período. Um ano antes, a empresa havia ficado no
vermelho em US$ 167 milhões.
O mais provável para esses investidores é o retorno por meio da saída
do negócio pelas novas rodadas de investimento que o rápido crescimento
exige. Essas rodadas são chamadas de “estágios de investimento em star-
tups”, conforme veremos a seguir.
Pré-semente
Nível iniciante. Estágio no qual as startups tratam investimentos de
até R$ 1 milhão, interagindo com investidores-anjo, equity-crowdfoun-
ding ou aceleradores.
6 SAFE (Simple Agreement for Future Equity): modelo utilizado por grandes players
do mercado americano como 500Startups e Ycombinator, é uma evolucao do TDC.
Prevê um contrato simples entre um investidor e uma startup, no qual o investidor
fornece capital para a startup, e ela fornece um mandado para emitir ações para o
investidor mais tarde.
Venture capital
Empresas em nível de consolidação que tratam investimentos de
até R$ 30 milhões. Nesse patamar, a busca se concentra em fundos de
investimentos.
Private-equity
Empresa que trata com investimentos maiores de R$ 30 milhões e
que possui investimentos em fundos de investimentos.
O tempo entre as rodadas pode variar de acordo com a startup e
com o mercado. Entre uma e outra rodada, a primeira pergunta que um
bom investidor de risco se faz antes de realizar um novo aporte é: “se eu
investir nessa empresa nesse valor, há condição de sair numa próxima
rodada por 10 vezes o que ela vale hoje?”
A figura 3 a seguir apresenta os estágios acrescidos de Bootstrapping,
conceito comentado anteriormente.
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Entre uma e outra rodada, a primeira
pergunta que um bom investidor
de risco se faz antes de realizar um
novo aporte é: “se eu investir nessa
empresa nesse valor, há condição
de sair numa próxima rodada por
10 vezes o que ela vale hoje?”
ANDERSON GODZ 39
que, eventualmente, esteja discutindo uma nova tecnologia complexa
que transforma etanol em combustível espacial pode receber um aporte
muito maior do que startups dos modelos de negócio SaaS7 ou negócios
baseados em audiência (veja outros modelos de negócio na tabela 4). Vale
comentar os principais estágios na perspectiva de fundos de investimento:
Série A
Estágio no qual um produto já criado, com alguma receita financeira
de vendas, e há aportes para buscar vendas de maneira escalável.
Série B
Estágio no qual o investimento busca multiplicar em dez ou 20 vezes
o tamanho de uma máquina de vendas que já possua tração comprovada.
Por fim, vale equalizar alguns conceitos:
Pre-money e post-money
Pre-money é o valor da startup hoje, antes de receber investimento.
Já o post-money é o valor da startup depois de receber o investimento.
Exemplo: se a rodada de investimento precisa levantar R$ 200 mil e a
Branding9
A Ford continua mais conhecida que a Tesla. Hilton diante de Airbnb,
também. Contudo, mesmo com uma marca forte, em 2016 o Hilton valia
cerca de US$ 23 bilhões, enquanto o Airbnb o ultrapassou com US$ 25,5
bilhões. Alguns poucos toques em uma tela encurtam a experiência entre
um usuário e um novo branding. A facilidade e a conectividade habilitam
mais experimentações e reduzem a fidelidade a marcas. A experiência é
mais importante que o branding para um valuation.
ANDERSON GODZ 41
Faturamento ou dados?
O Facebook pagou US$ 19 bilhões pelo WhatsApp em 2014, e foi
gerada uma receita de apenas US$ 1.289 milhão nos primeiros nove meses.
Faturamento parece não ser mais tão decisivo para um valuation. Se os
dados são o novo petróleo, é preciso tratá-lo como um ativo.
Market share10
Também não é mais tão relevante. A concorrência estará cada vez
mais diluída pela acessibilidade.
Barreiras financeiras
Também são menos importantes, pois está muito mais barato inovar
e lançar qualquer tipo de produto. Para se criar um site de e-commerce
em 2005, era preciso gastar US$ 1 milhão. Hoje, US$ 5 mil. E tem mais:
segundo o livro Strech, uma empresa com limitações de recursos tende
a ser mais inovadora do que uma empresa com muitos recursos.
Barreiras tecnológicas
Essas somente ocorrem em casos muito extremos, como o do brasileiro
Fábio Teixeira, que é uma ameaça para ninguém menos que a NASA
por meio da Hypercubes, uma empresa que está construindo uma cons-
telação de pequenos satélites assistidos por inteligência artificial, capazes
de detectar a constituição molecular do objeto sendo observado a partir
do espaço. São satélites simples, de pequeno porte, com custos menores
e muito mais acessíveis para quantificar recursos naturais essenciais à
10 Market Share: é a participação de uma determinada empresa no mercado em que
ela está inserida.
Patentes
O Dropbox possui mais de 90 delas para um valuation de US$ 10
bilhões, enquanto a WeWork não possui nenhuma para um valuation de
US$ 16 bilhões. O Evernote possui 31 patentes e vale US$ 2 bilhões; a
Uber, com menos da metade, 15 patentes, vale mais de US$ 62 bilhões.
ANDERSON GODZ 43
cadastro de cinco minutos e colocando sua própria casa para alugar. E
outras sete bilhões de pessoas podem potencialmente fazer o mesmo, em
qualquer parte do mundo. Agora.
Assim, os valuations estão se tornando mais complexos e as muitas
variáveis não podem ser tratadas de forma isolada.
ANDERSON GODZ 45
de uma empresa ou organização? Como se darão as relações entre partes
interessadas e conselhos interconectados? Isso já está acontecendo! To-
dos os intermediários em todas as cadeias de valor serão automatizáveis,
autoexecutáveis, com custo marginal tendendo a zero. E o salto quântico
que essas tecnologias estão causando na governança do futuro está acon-
tecendo numa velocidade incrível!
ANDERSON GODZ 47
Como blockchain pode mudar a governança do
mundo?
Todos conhecem as características de um sistema político de de-
mocracia direta, no qual todos têm poder de voto direto sobre todas as
pautas, e o sistema político de democracia representativa, no qual o voto
direto elege um representante para atuar em seu nome por um mandato
temporário e a votar em todas as pautas de seu melhor interesse. A direta
garante poder de voto igual para todos, embora não funcione quando
se pensa em escala. A representatividade garante governabilidade, mas
origina o conflito entre agente e principal.
Mas a blockchain mudou o jogo e permitiu a realização de uma
antiga utopia ou mito político: o de que existe um meio-termo entre
ambos os formatos democráticos experimentados até então. É a evolução
do sistema que torna o antigo obsoleto. O conceito de democracia líquida
consiste em ter o poder de votar em todos os temas e, ao mesmo tempo,
o poder de delegar seu poder de voto em cada votação ou cada grupo de
votações para quem você confia em cada tema. No ambiente da gover-
nança corporativa, significa dizer que os acionistas ou beneficiários finais
de uma companhia podem votar em todas as decisões a serem tomadas
e/ou delegar as decisões a um executivo ou rede de executivos para cada
tema. Contudo, não de maneira ampla e por tempo de mandato e, sim, de
forma específica e dinâmica, tema por tema, revogável a qualquer tempo.
Viveremos em um mundo com, exponencialmente, menor necessidade
de centralização de poder, pois poderemos, tecnologicamente, operar
de forma mais peer-to-peer, descentralizada, sem que as organizações se
tornem um caos desgovernado e anárquico. E com registros imutáveis,
todas as suas decisões como gestor serão registradas, analisadas, compa-
radas e automatizadas.
O Jupter, um ecossistema de inovação em Curitiba, está desenvol-
vendo, prototipando e testando um sistema de registro de decisões em
assembleia de acionistas, conselhos e comitês. As decisões, registradas na
blockchain, são verificáveis por qualquer participante. Atualmente em fase
ANDERSON GODZ 49
É fato que o mundo descentralizado e acelerado das inovações gera
maiores desafios, mas essas regulações demoram muito. As citadas acima
são de 2017 e 2018, mas o crowdfunding iniciou no Brasil em 2011 e, desde
2016, pelo menos 200 fintechs já captaram cerca de US$ 160 milhões.
Parte dessa demora se deve também ao fato de que os modelos fiscais e
regulatórios brasileiros partem da premissa de desconfiança.
O desafio de fazer com que as regulações acompanhem a velocidade
dos negócios diruptivos é mundial. Em abril de 2018, as atenções do
mundo digital estavam voltadas para Mark Zuckerberg e seus depoimen-
tos ao Congresso norte-americano. Ele deixou algumas lacunas em suas
respostas, como quando afirmou que o Facebook não é um monopólio
e, questionado, não soube citar um concorrente. Em outra situação, foi
marcante – e até virou meme – um exemplo da distância entre a regulação
e a inovação. Alguns senadores americanos mostraram não saber que a
rede social vive de anúncios. Orrin Hatch fez uma pergunta, no mínimo,
estranha a Mark: “Como o Facebook consegue sustentar seu modelo
de negócios se os usuários não pagam nada?”. Zuckerberg, claramente
perplexo, respondeu: “Senador, nós temos anúncios”. Se os agentes que
promovem as regulações num mercado desenvolvido como o americano
não possuem conhecimento a respeito do modelo de negócios da nova
economia, como poderão promover um conjunto de medidas legais para
rapidamente regular esse assunto? Multiplique esse desafio do Facebook
pelos inúmeros países em que opera e suas respectivas legislações.
A maior lacuna entre as inovações e as questões legais e regulatórias
gera outro efeito, que são os conflitos éticos. Grandes discussões podem
ser geradas pelo uso ético da inteligência artificial com decisões que en-
volvem vidas. Um carro autônomo, por exemplo, diante de uma provável
colisão com um pedestre, pode decidir matar os próprios passageiros.
Se naturalmente já é complicado seguir as regulações quando se
tem o mapa, imagine quando ele ainda não existe. Com a velocidade
das inovações cada vez maior, o vácuo da governança também tende a
aumentar. Paradoxalmente, quando as questões legais, éticas e regulatórias
ANDERSON GODZ 51
vezes, um sistema de governança não é capaz de absorver. Atualmente,
existem mais de dez mil startups no Vale e 90% delas morrerão.
A tolerância também passa por questões sexuais e étnicas. Nas em-
presas do Vale é incrível como as pessoas são tolerantes a outros povos
e, consequentemente, acabam tendo uma visão ampliada dos problemas
mundiais e capturando sempre novos pontos de vista (é até mesmo uma
cultura diferente do tradicional capitalismo americano).
Pensar globalmente não é prioridade do empreendedor brasileiro,
pois temos muitos problemas e um mercado considerável de cerca de
200 milhões de pessoas. Mas se compararmos com o mercado mundial
de mais de sete bilhões, não é tão grande assim. A Argentina possui um
pouco mais de 40 milhões de habitantes, mas tem empresas digitais como
Mercado Livre e Decolar que pensam globalmente.
Talentos são um desafio especial nessas empresas. Busca-se, louca-
mente, outliers com incrível capacidade de entrega. Pessoas diferentes,
realizadoras, que são motivadas por equity. Não se trata apenas dos foun-
ders principais, mas das pessoas- chaves, de um time de fundadores. Essa
galera quer entrar “com o bacon e não com o ovo”. No Brasil, por outro
lado, temos 70% de empresas familiares. Quem detém o capital é, nor-
malmente, o dono. Na nova economia dono é quem possui a capacidade
de realizar o novo. Mais vale o jóquei do que o cavalo. Gustavo Caetano,
CEO da Samba Tech e autor do livro Pense Simples, certa vez comentou:
“Se o fundador não mantiver uma participação significativa, em algum
momento de pressão, ele abandona a startup e começa outra do zero”.
Defendo há algum tempo que um percentual da empresa seja dis-
tribuído a um time nuclear. Não tenho dúvida de que esse foi um dos
motivos do sucesso da minha primeira startup. Só que em uma determi-
nada situação, ao buscar uma nova pessoa sênior, ouvi: “Eu conheço você,
mas não conheço os demais”, ou seja, o modelo encontrou uma parede
que, até então, não era um problema. Nem todo mundo quer colocar seu
CPF em risco. Por outro lado, há déficit de desenvolvedores, cientistas de
dados e outras novas posições, tanto no Brasil como no mundo.
Habilidade de relacionamento
Ao criar a primeira startup em 2010, o termo “startup” sequer era
usual no Brasil. Na época, poderia se chamar simplesmente “dar um jeito
de pagar as contas da casa”. Diferenças de expectativas com meu sócio,
fizeram-me, em 2016, experimentar pela primeira vez o exit11 (esse nome
bacana para a dura experiência de sair do negócio que você criou do
zero). A nova economia tem feito experiências de sucessão e de saídas de
sócios ocorrerem com maior frequência e de forma mais abrupta. Numa
era de relacionamentos superficiais e de fundadores seriais, é preciso ter
a habilidade de passar por uma separação societária e continuar, por
exemplo, tomando café com seus ex-sócios.
ANDERSON GODZ 53
A nova economia tem feito expe-
riências de sucessão e de saídas de
sócios ocorrerem com maior frequên-
cia. Numa era de relacionamentos
superficiais e de fundadores seriais,
é preciso ter a habilidade de passar
por uma separação societária.
ANDERSON GODZ 55
Tabela 3 – Tipos de startups.
TIPOS DE STARTUPS
Empreendedor apaixonado pelo seu trabalho, que cria
Lifestyle startups uma startup para dar vazão a uma paixão pessoal, ta-
lento ou vocação.
Há, entretanto, quem siga outra linha. Se a startup não for um negó-
cio repetível, escalável e em condições de extrema incerteza, não é uma
startup, e sim uma pequena empresa.
Em geral, todas as abordagens consideram um ponto em comum:
um ritmo de crescimento agressivo e que apenas a ideia em si não vale
nada ou vale muito pouco. Importante será a capacidade de entrega e
a rapidez de escala. O propósito da Conta Azul, startup de sistemas de
gestão empresarial na nuvem sediada em Joinville (SC), exemplifica bem
esse espírito: “Somos uma empresa inovadora que cresce rapidamente”.
O livro Organizações Exponenciais define: “São aquelas cujo impacto
(ou resultado) é desproporcionalmente grande – pelo menos, dez vezes
maior – comparado ao de seus pares, devido ao uso de novas técnicas
organizacionais que alavancam as tecnologias aceleradas”.
SOFT WARE COMO Nesse modelo o cliente paga uma mensalidade, o que
SERVIÇO – “SA AS” gera receitas recorrentes.
PAGAMENTO POR USO É o modelo em que o cliente paga por uso, tornando
OU COMPR A UNITÁRIA mais complicado manter o fluxo de caixa.
Produtos consolidados pelos quais o cliente paga por
LICENCIAMENTO uma licença em tempo mais longo, gerando receita
recorrente.
Fonte: adaptado de Pedro Waengertner (ABRAII).
ANDERSON GODZ 59
Figura 5 – Visão do PTM (Propósito Transformador Massivo).
Algoritmos
São mais objetivos, escaláveis e flexíveis que os seres humanos, portanto,
chaves para organizações comprometidas com um forte crescimento. Como
exemplo, o Google multiplicou em 125 vezes suas receitas, gerando US$
500 mil a cada três dias, utilizando o algoritmo PageRank, que classifica
a popularidade de páginas web por número de cliques.
Ativos alavancados
Quando startups não tratam recursos escassos, a não propriedade
de um ativo pode ser um acelerador. O Waze, por exemplo, usa os smar-
tphones de seus usuários para capturar informações do trânsito, sem a
necessidade de um “parque de equipamentos”.
Engajamento
É um elemento fundamental para ações da organização em relação
à comunidade e à multidão, e para a criação de redes externas. Como
exemplo, a EyeWire criou um jogo de colaboração que acelerou o processo
de mapeamento e construção de um neurônio em 3D (cada neurônio leva
50 horas para ser desenvolvido), o que já resultou em 130 mil pessoas de
145 países mapeando mais de 100 neurônios simultaneamente.
Seguindo para o lado esquerdo da metáfora do cérebro, a de ideias,
área em que há predomínio de ordem, controle e estabilidade, há outros
cinco atributos: interface, dashboard, experimentação, autonomia e so-
ciais, conforme segue:
ANDERSON GODZ 61
Interface
São processos de filtragem e comparação pelos quais as empresas
podem ligar fatores externos às estruturas de controles internos. Como
exemplo, o Google AdWords, uma interface para o cliente que foi
completamente automatizada, dispensando envolvimento manual de
funcionários do Google.
Dashboards
Método de controle dos principais dados do negócio em painel
único, cascateado, para gestão em tempo real, o que permite medições
e adaptações rápidas para atingir o objetivo maior. Como exemplo temos
a Intel, que acompanha as metas individuais, da equipe e da empresa, de
uma forma aberta e transparente, em ciclos de no máximo três meses.
Experimentação
A constante experimentação e interação dos processos são uma ma-
neira de reduzir riscos. Como exemplo, a Adobe Systems, que lançou
o KickStart Innovation Workshop, programa em que os colaboradores
recebem uma caixa vermelha contendo um guia e um cartão pré-pago
de US$ 1.000 para ser usado em investimento-anjo, tendo 45 dias para
experimentar e validar ideias inovadoras com esse recurso.
Autonomia
Equipes autoorganizadas e multidisciplinares que operam com auto-
ridade descentralizada. É um pré-requisito em grande parte das startups
para a inovação. Um exemplo é a Valve Software, empresa que não possui
estrutura gerencial clássica nem cadeias hierárquicas, contrata pessoas
inovadoras e permite que seus colaboradores escolham os projetos de que
participam. A Valve tem receita por colaborador maior do que qualquer
outra empresa de jogos.
ANDERSON GODZ 63
segundo ano (na base já triplicada!), e depois duplicando sucessivamente
mais três vezes em três anos.
Em apenas dois meses, o aplicativo de inteligência artificial Olívia,
do empreendedor brasileiro Cristiano Oliveira, teve 40 mil downloads nos
EUA e é uma grande promessa para o mercado de serviços financeiros.
A Warren, startup que tem uma plataforma de investimentos on-line,
levou apenas seis meses para adquirir seis mil clientes, sendo que um
banco comum levaria seis anos. Tanto Olivia como Warren são casos de
sucesso que foram suportados por ecossistemas (Olívia é sediada no Vale)
e organizações em rede (Warren é investido por sócios da plataforma
StartSe, entre outros).
Ecossistemas como o Vale surgem a partir de um tripé formado por
capital, empreendedores e academia, no caso, Stanford, Berkley, Singula-
rity University, entre outros. Complementam o conjunto, as incubadoras
/ aceleradoras, empresas interessadas em inovar, provedores de serviços,
venture builders, laboratórios de pesquisa e desenvolvimento, além do
poder público, entidades governamentais e agências regulatórias e de
fomento, conforme figura a seguir:
ANDERSON GODZ 65
Figura 7 – Mapa do ecossistema brasileiro de startups.
Fonte: Medium.com
ANDERSON GODZ 67
Peter Diamandis, empreendedor norte-americano, cofundador da
Singularity University e CEO da X Prize Foundation, afirma que a
inovação passa por seis estágios: digitalização, decepção, disrupção, des-
materialização, desmonetização e democratização. Nesse conceito, há
primeiro a digitalização de algo até então analógico, seguido da decepção
de vê-lo ainda mais rápido que o digital. É então que a tecnologia, em
determinado ponto, abre uma série de potencialidades jamais imaginadas,
e a disrupção, a verdadeira mudança, se torna real. Na fase da desmate-
rialização, as soluções antigas passam a não existir em suas versões físicas,
há transformação do que era físico para o digital. Em seguida, a tecno-
logia tende a fazer produtos ficarem cada vez mais baratos e acessíveis, é
quando ocorre a desmonetização. Por fim, no momento em que alguma
coisa se torna digitalizada e desmonetizada, fica acessível a muito mais
pessoas, que podem ficar tecnologicamente mais empoderadas, tendo
maior alcance a serviços, informações e fontes de receita.
O clássico caso da Kodak pode ser analisado por esses seis estágios
de Peter Diamandis. Embora ela tenha inventado a câmera digital em
1975 (digitalização), deixou de investir pesadamente na nova tecnologia
e manteve o sistema de negócios de câmeras e filmes tradicionais, pois
a tecnologia ainda não era sólida (decepção). Mas a partir de um dado
momento as câmeras digitais passam a se tornar realmente melhores
(disrupção). Quando a Kodak percebeu, era tarde demais. Já não era mais
possível acompanhar a digitalização do setor, e os problemas começaram
a aparecer. Em 2008 − um ano após o lançamento do iPhone, o primeiro
smartphone com câmera digital de alta qualidade −, o mercado da Kodak
não existia mais. Com toda a série de smartphones que veio na sequên-
cia, qualquer um poderia ter sua própria câmera digital em forma de
aplicativo gratuito e salvar as fotos no próprio smartphone. A compra de
filmes fotográficos não fazia mais sentido (desmonetização). Em pouco
tempo, o filme fotográfico desapareceu (desmaterialização). As pessoas
começaram a criar o hábito de não mais imprimir todas as fotos. Com a
popularização de aplicativos como o Instagram, o compartilhamento de
imagens se tornou gratuito, rápido e democratizado (democratização).
16 Member get member: por exemplo, o Airbnb incentiva que seus clientes indiquem
amigos para se tornarem clientes, oferecendo créditos para futuras acomodações.
17 Em 1998, Bill Gates, fundador da Microsoft, testemunhou pela primeira vez no
Congresso Americano. Sua receita anual era de U$ 14,5 bilhões. No caso dos teste-
munhos de Zuckerberg, em 2018, estima-se que o Facebook tenha uma receita anual
de U$ 55,4 bilhões.
ANDERSON GODZ 69
economia conseguem fazer o que a Netflix fez, crescer exponencialmente
sem despertar reações públicas ou regulatórias. Uma boa governança
pode atrair bons conselheiros. E ambos, não só melhoram o negócio,
mas também a reputação destes, mitigando os riscos da hiperexposição.
ANDERSON GODZ 71
O efeito agora é um décimo fator, reflexo de todos os outros fatores
de pressão apresentados nesse capítulo, que se somam as 15 tendências
apresentadas na figura 8.
Diante desse panorama, pode haver uma sensação de que tudo está
ocorrendo neste exato instante e que, de alguma forma, estamos em débito.
Se temos essa sensação sob o prisma individual, o que nos faz acreditar
que nosso atual conselho ou as práticas de governança estabelecidas são
capazes de responder a esse contexto?
Yuval Noah Hahari comenta no livro Homodeus: “Não podemos
pisar nos freios porque ninguém sabe onde os freios estão. Embora alguns
especialistas conheçam bem os desenvolvimentos em algum campo,
ninguém é especialista em tudo. Ninguém, portanto, é capaz de ligar
todos os pontos e enxergar o quadro completo. Como ninguém consegue
compreender o sistema todo, ninguém pode fazê-lo parar”.
Ao trazer esta visão de Hahari para o âmbito da governança, perce-
be-se a necessidade definir práticas que respondam a esse contexto. E isto
é justamente o que será explorado no restante deste livro.
ANDERSON GODZ 73
CAPÍTULO 2: GOVERNANÇA
CORPORATIVA
ANDERSON GODZ 75
A necessidade de contar com um instrumento como esse nas or-
ganizações vem do “conflito de agência” entre proprietário e gestores
de empresas. Muitas vezes, isso ocorre devido a divergências de ideias
entre as partes. Com a governança corporativa, esse cenário ganha mais
transparência.
O IBGC define o sistema como a forma pela qual empresas e de-
mais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, a partir do
relacionamento entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos
de fiscalização e controle e demais partes interessadas. De acordo com o
órgão, as boas práticas de governança corporativa convertem princípios
básicos em recomendações bastante objetivas. A governança torna possível
alinhar interesses para preservar e otimizar o valor econômico da orga-
nização em longo prazo, facilitando o acesso a recursos e contribuindo
para a qualidade da gestão, a longevidade e o bem comum.
Em outras palavras, governança corporativa bem estruturada significa
ordem na casa. É mais do que um sistema. É o papel que conselhos de
administração exercem para aprimorar o ganho de acionistas e mediar
conflitos entre partes, como os próprios acionistas, administradores, au-
ditores externos, minoritários, conselhos fiscais, credores, colaboradores
e clientes.
Ainda conforme o IBGC, esse sistema deve ser pautado pelos prin-
cípios da transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade
corporativa. Isso é um desafio para empresas de rápido crescimento e para
organizações consolidadas no mercado. Quais práticas de governança cor-
porativa são compatíveis com cada modelo? É o que veremos mais adiante.
Nas visões da OECD, de Monks e Minow e do IBGC, é possível
verificar que a abrangência da governança corporativa no que tange aos
objetivos, aos envolvidos e ao sentido, é comum. Todos abordam a gover-
nança como um sistema para organizar, executar e alcançar os objetivos da
empresa. Portanto, há consenso que a governança corporativa se apresenta
como as regras que dão sentido e rotina a um jogo. Mas, nenhuma dessas
definições aborda a velocidade de crescimento das empresas como uma
perspectiva relevante nesse jogo.
ANDERSON GODZ 77
pelo mercado de capitais; e tradição jurídica do Código Civil Francês,
com baixo enforcement18. A essas origens se somaram mais duas fortes
influências, ocasionadas pelos programas políticos dos últimos anos:
privatizações e abertura dos mercados.
Ainda segundo Leal e Camuri, nesse modelo: predomina a alavan-
cagem; os mercados de capitais são pouco expressivos; a propriedade das
grandes corporações é concentrada; a gestão é exercida por acionistas
majoritários; os conflitos acontecem entre as forças polarizadas dos acio-
nistas, constantemente desencadeados pelos minoritários, que possuem
fraca proteção; e, por fim, há o ambiente regulatório ainda em transição.
Ressalta-se a relevância da contribuição de Leal e Camuri para o tema
deste livro, no que se refere ao predomínio de alavancagem no modelo
latino-americano. Alavancagem é justamente umas das características
das startups devido à forte necessidade de investimentos e de capital de
giro para sustentar o crescimento rápido.
ANDERSON GODZ 79
O instituto tem à disposição palestras, fóruns, conferências, trei-
namentos e possibilidades de networking entre profissionais, além de
publicações e pesquisas. Há ainda um programa de certificação para
conselheiros de administração e conselheiros fiscais, que permite ao
participante adquirir mais conhecimento sobre um conjunto de temas
necessários para seu bom desempenho dentro das organizações. Ao obter
essa certificação, o conselheiro passa a integrar o Banco de Conselheiros
Certificados do IBGC.
Assembleia/sócios:
Também chamada de assembleia geral, é onde as partes societárias
integrantes definem questões como aumento/redução de capital social,
eleição/destituição de conselheiros, avaliação das contas do conselho de
administração, possíveis fusões, cisões, dissoluções e liquidações societárias
e aprovações de remunerações dos administradores.
ANDERSON GODZ 81
Conselho de administração (CA):
Órgão colegiado encarregado do processo de decisão de uma orga-
nização em relação ao seu direcionamento estratégico e suportado por
uma secretaria de governança.
Conselho fiscal:
Colegiado criado pelos associados, sócios ou, de forma geral, os
participantes de uma associação ou sociedade empresária, visando a
acompanhar a sua entidade.
Auditoria (independente/interna):
Auditoria interna tem a responsabilidade de monitorar e avaliar a
adequação do ambiente de controles internos e das normas e procedi-
mentos estabelecidos pela gestão. A externa tem a atribuição básica de
verificar se os demonstrativos financeiros refletem adequadamente a
realidade da sociedade.
Nesse contexto, o IBGC estabeleceu um código com princípios bá-
sicos de governança distribuídos em cinco dimensões: sócios, conselho
de administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle, e conduta
e conflito de interesses, conforme figura a seguir.
ANDERSON GODZ 83
2.5 OS 58 FUNDAMENTOS
Tabela 5 – Fundamentos da dimensão sócios.
SÓCIOS
FUNDAMENTO CONCEITO (SEGUNDO O IBGC)
“Uma ação é igual a um voto”. Assim é a estrutura de alinhamen-
1. CONCEITO to dos interesses dos sócios, tendo o poder político representado
“ UMA AÇÃO, pelo direito do voto. As exceções, se permitidas, devem contemplar
UM VOTO” quaisquer assimetrias e salvaguardar eventuais desalinhamentos,
pois é necessário manter o tratamento equitativo entre os sócios.
ANDERSON GODZ 85
Tabela 6 – Fundamentos da dimensão conselho de administração.
CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
FUNDAMENTO CONCEITO (SEGUNDO O IBGC)
Entre as atribuições do conselho de administração está a de de-
cidir os rumos estratégicos do negócio e monitorar a diretoria,
11. ATRIBUIÇÕES atuando como elo entre esta e os sócios. Tem a responsabilidade
de salvaguardar os princípios, valores, objeto social e sistema de
governança corporativa da organização.
ANDERSON GODZ 87
CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
FUNDAMENTO CONCEITO (SEGUNDO O IBGC)
As organizações devem ser devidamente informadas sobre even-
25. CONSELHOS IN- tual ou potencial conflito de interesses oriundos da atuação de
TERCONECTADOS conselheiros em outras empresas, seja como conselheiro, mem-
bro de comitê ou executivo.
26. REMUNERAÇÃO
Os conselheiros devem ser adequadamente remunerados, consi-
DOS CONSELHEI-
derando as condições de mercado, as qualificações, o valor gera-
ROS DE ADMINIS-
do à organização, e os riscos da atividade.
TRAÇÃO
27. ORÇAMENTO
Para uma atuação independente e benéfica à organização, o conse-
DO CONSELHO
lho deve ter algum recurso financeiro para suportar assessoria de
E CONSULTAS
terceiros, se necessário, e exercer suas atividades de forma idônea.
EXTERNAS
ANDERSON GODZ 89
Tabela 8 – Fundamentos da dimensão órgãos de fiscalização e controle.
48. GERENCIA-
MENTO DE RISCOS, Os agentes de governança têm responsabilidade em assegurar
CONTROLES que toda a organização esteja em conformidade com os seus
INTERNOS E princípios e valores. A efetividade desse processo constitui o sis-
CONFORMIDADE tema de conformidade (compliance) da organização.
(COMPLIANCE)
Fonte: o autor.
ANDERSON GODZ 91
CONDUTA E CONFLITO DE INTERESSES
FUNDAMENTO CONCEITO (SEGUNDO O IBGC)
As informações devem ser divulgadas de forma simultânea a to-
dos os sócios e investidores de modo a cumprir a equidade. O
56. POLÍTICA DE
IBGC recomenda a criação de uma área de relacionamento com
DIVULGAÇÃO DE
investidores ou a contratação de um serviço de informação ao
INFORMAÇÕES
mercado para garantir um tratamento correto das informações e
a demanda da comunicação ao mercado.
58. POLÍTICA DE
Além de violarem preceitos éticos, condutas ilícitas podem com-
PREVENÇÃO E
prometer a imagem e reputação da organização e de seus colabo-
DETECÇÃO DE
radores, deteriorar seu valor econômico e impactar sua sustenta-
ATOS DE NATURE-
bilidade e longevidade.
ZA ILÍCITA
Fonte: o autor
ANDERSON GODZ 95
CAPÍTULO 3: UMA NOVA
DIMENSÃO DA GOVERNANÇA
PARA A NOVA ECONOMIA:
GROWTH GOVERNANCE
3.1 MENTORIA
Empreender uma startup requer uma grande resiliência. Transformar
uma organização também. O aprendizado é que deve haver um suporte
direto aos empreendedores. Fazer a mentoria de alguém desintoxicado
do dia a dia, mas que possua o know-how do que se busca e, sobretudo,
dos desafios que recaem sobre os sócios.
Embora nas boas práticas de governança exista o fundamento de
educação continuada dos conselheiros, a mentoria o antecede, e o com-
plementa. Trata-se de um trabalho de apoio mais pessoal, como válvula
de escape aos desafios do início do negócio, da pressão do crescimento
e/ou da transformação. Dentre os vários aspectos que podem ser tratados
nessa prática, destacam-se:
ANDERSON GODZ 97
Questão financeira
A remuneração via salário não pode ser o foco do empreendedor. Nor-
malmente, os negócios no início não oferecem condições para retiradas.
Os dividendos são alinhados através do fundamento de governança que
veremos mais à frente, mas esse é um tema delicado, que muitas vezes
precisa ser tratado em uma mentoria, pois muitos possuem o mindset do
trabalho remunerado, CLT, etc. E mesmo que não possuam, o anseio por
resultados vai drenando as forças. Por isso, também a Growth Governance
recomenda tratar o tema desde o Canvas da Governança. Ninguém está
dizendo que o empreendedor deve padecer necessidades, mas, em geral,
empreender significa que a maior parte dos ganhos estará atrelada ao
sucesso do negócio. Na maioria das rodadas de investimento até uma
Série A, é pouco provável que o empreendedor tenha uma secundária.
Habitualmente, ela ocorre em dois casos: quando o empreendedor possui
um grande problema pessoal que requer caixa para resolver (doença e
tratamentos graves na família) e os investidores concordam com uma re-
tirada para que esse problema não afete a performance do empreendedor,
ou quando o desafio na próxima rodada será tão maior que é bom que o
empreendedor esteja absolutamente resolvido financeiramente para ter
a altivez de enfrentar os grandes desafios que terá pela frente.
Sucessões e exits
Sair da operação para deixar a startup andar será cada vez mais
comum. Rodrigo Schiavini, da SmartHint, saiu da primeira empresa
que criou a pedido dos demais sócios. Com o fundador da Uber, Travis
ANDERSON GODZ 99
e de práticas de controle e governança, foi convidado para atuar
como secretário do conselho e pôde aprimorar o modelo. Mais
um empreendedor digital foi incorporado e as reuniões foram
organizadas e melhor preparadas. Por fim, a CEO convidou
também os principais diretores do negócio para uma conexão
imediata das recomendações com as práticas do dia seguinte.
Não há tempo a perder!
3.3 CARISMA
Steve Jobs irradiava compliance na Apple através do seu carisma.
Muitas startups possuem líderes que são outliers e, naturalmente, re-
presentam uma dimensão messiânica para a organização. Ao primeiro
olhar, confiar em carisma para estabelecer a governança pode parecer
extremamente frágil, mas talvez seja a forma mais eficaz em um cená-
rio tão volátil, em que repentinas mudanças no negócio geram naturais
lacunas nos controles.
Assim, o mais eficaz mesmo é tocar o coração das pessoas. Isso
pode ser feito pelo exemplo do líder, desde as pequenas ações. Há muita
proximidade das lideranças de uma startup junto aos times. Muitos fou-
nders se mobilizam para os negócios sem a perspectiva do dinheiro ou
da secundária (Altivez financeira). Isso é um belo exemplo que irradia
governança, mas poucos têm essa condição.
3.5 REVISÕES
No capítulo 1, refletimos sobre o efeito agora, ecossistemas e orga-
nizações em rede e o timing to legal. Entretanto, ainda estamos vivendo
uma primeira geração de negócios que resolvem problemas absolutamente
comuns para o ser humano, como mobilidade, alimentação, sociabilização,
entre outros. Mesmo assim, os desafios de governança já são intensos.
Prioridades
Quais são as prioridades pessoais desse negócio em relação a saúde
pessoal, bem-estar, atividades físicas e espirituais, família, amigos, além
de outros negócios e hobbies?
Caráter
Não há oportunidade de negócio que deva prescindir desse cuidado.
Essas questões precisam ser provocadas para anteceder qualquer negócio,
sobretudo no atual contexto brasileiro, estigmatizado pela corrupção e
falta de ética.
Ética
Como reagiremos a questões antiéticas? E se nos depararmos com
a situação de pagamento de propina, o que faremos? Levaremos nossos
clientes a happy hours? Faremos premiações ou lembranças de final de ano?
Objetivos
Aqui entram as expectativas e os objetivos de cada envolvido acerca
do negócio. É preciso deixar claro o que cada um quer ganhar, quer seja
uma questão financeira ou não. Se sim, quanto e em quanto tempo?
Velocidade
Qual a velocidade de crescimento que estamos dispostos a empreen-
der? Embora nos negócios pouca coisa seja previsível, vale o exercício de
provocar as expectativas de médio e longo prazos. Por exemplo, daqui
a dez anos você venderia ou compraria as outras cotas dessa empresa?
Mudanças ou pivots
Muitas coisas mudarão na jornada que se inicia, inclusive, as respos-
tas a essas perguntas. E não há problema nisso, desde que todos estejam
cientes das regras do jogo e do ponto de partida da expectativa. Problema
existe se não houver referência e se as expectativas não estiverem claras
desde o início.
Riscos
Qual a tolerância a riscos? Quais riscos os envolvidos estão dispostos
a correr? E quais não estão?
Tempo
Quanto tempo por semana estarão dedicando?
Papéis e responsabilidades
Quem será o líder que dará a última palavra? No crescimento intenso,
haverá impasses e tensões que precisarão ser rapidamente equacionados.
Ter uma única voz que decide é vital, mesmo que exista igualdade entre
os cofundadores. Nesses casos, uma boa prática pode ser a de eleger um
CEO por período, colocando essa regra no Canvas para que todos a
reconheçam. Essa também pode ser uma estratégia para quando ainda
não se sabe qual founder terá mais habilidade para liderar a tese de MVP
vencedora. Além do decisor, é muito importante definir o responsável
pelos dados e como tratar isto como um ativo. Deve-se também definir os
responsáveis por vender, entregar e tratar com investidores. O empreendedor
Guilherme Krauss sugere que seja definido quem representará a empresa
institucionalmente, em eventos e na mídia. Se essas responsabilidades
também tiverem um prazo, defina como e com qual periodicidade elas
serão reavaliadas.
Perfil de reforços
Quais novos sócios precisaremos no curto espaço de tempo para
completar o time fundador? Temos um consenso sobre o perfil dos pro-
fissionais que desejamos nos próximos meses?
Sempre que possível, solicite o apoio de um conselheiro ou advisor
externo e independente, evitando que os vícios nas relações tornem a
dinâmica inócua.
Fonte: o autor.
Figura 14 – Os 15 fundamentos.
Fonte: o autor.
Fonte: o autor.
5.2 MENTORIA
Para empreendedores nesse estágio a Mentoria é um fundamento
muito útil. Há muitos altos e baixos em uma startup. Não se deve tomar
decisões importantes quando muito triste, nem muito eufórico. Nas duas
pontas não residem boas ações. A euforia do crescimento cega para o
controle e pode gerar quase um antídoto para a austeridade.
Em meio a sentimentos extremos de euforia e tristeza, a mentoria
ajuda a evitar decisões erradas quando, por exemplo, um protótipo ou
teste não funcionar, ou mesmo, quando se estiver muito alegre devido a
um pitch que gerou um investidor interessado.
O empreendedor precisa ser individualista para acreditar e entregar
um negócio independentemente do que as pessoas dizem, mas, parado-
xalmente, não pode fazer isso sozinho. Como poucos empreendedores
sabem ouvir, a relação do mentorado com seu mentor pode ter um au-
xílio: indicadores. Mentorados inteligentes e focados levam números à
mesa do café.
5.4 CONFIDENCIALIDADE
Por fim, o fundamento da Confidencialidade. Na primeira vez que
fui ao Vale, vinha trabalhando há alguns meses em um novo negócio
de economia colaborativa. Aproveitei a oportunidade para falar com
alguns investidores, mas não estava habituado a esse jogo, sobretudo no
mercado americano. Logo na primeira agenda, entendi isso muito bem.
Comecei dizendo ao investidor que tinha uma grande ideia na mão e
apresentei alguns números do mercado. Rapidamente saquei um NDA
(non disclosure agreement). Assim que o coloquei na mesa, o investidor
se levantou e, antes de ir embora, disse-me apenas uma coisa: “você não
é daqui, certo?”.
Como vimos na Parte 1 (“Explorando governança corporativa e nova
economia”), o IBGC define que “algumas deliberações do conselho re-
querem confidencialidade, especialmente, quando abordarem temas de
interesse estratégico ainda não amadurecidos ou que coloquem em risco
interesse legítimo da organização”.
Fonte: o autor.
Atribuições da diretoria
O primeiro dos três fundamentos deste estágio é o das Atribuições
da diretoria. Ao revisitarmos a visão geral do sistema de governança do
IBGC no capítulo 4 (A governança na nova economia), percebemos um
esquema de atribuições muito particular das startups: founder, hipster,
6.2 RELACIONAMENTOS
6.3 REVISÕES
Aqui, com novas relações, e ao completar sete fundamentos iniciados
e dois estágios percorridos, é um primeiro momento oportuno para que
as práticas de governança possam ser reavaliadas de acordo com o funda-
mento Revisões, visto no capítulo 3 (Uma nova dimensão da governança
para a nova economia: Growth Governance).
Fonte: o autor.
7.2 TRANSPARÊNCIA
Nesse estágio sobe a régua quanto à transparência das informações.
Até então, o fundamento de Carisma supria a ausência de alguns padrões
básicos quanto às informações sobre o negócio. É importante usar esse
fundamento para organizar e dar adequada visibilidade ao cap table.
Com a ampliação dos stakeholders, dos canais de comunicação e das
expectativas, é importante estabelecer alguns padrões.
7.3 INFORMAÇÕES
Fonte: o autor.
Conselho consultivo
Um conselho consultivo é um elemento que pode ser iniciado no
estágio Seed, integrando o fundamento de Conselhos (inicial) para pre-
parar um conselho de administração a partir dos próximos estágios. Em
outra pesquisa realizada junto ao mesmo grupo de grandes investidores
e conselheiros de administração no Brasil, nota-se que há um salto de
48% para 80% de aplicabilidade de um conselho consultivo a partir do
estágio Seed, conforme figura a seguir:
Fonte: o autor.
Política de dividendos
Tanto o contrato social como o acordo de acionistas trazem um
maior formalismo às relações e, naturalmente, algumas políticas internas
iniciais começam a ser necessárias. Uma delas é a política de dividendos,
que deve considerar a saúde do fluxo de caixa e a necessidade de inves-
timentos da empresa. Nesse elemento, quanto mais clara estiver a forma
como será feita a retirada de cada sócio e, como serão destinados os lucros
líquidos da empresa, melhor será para os acionistas. Afinal, surpresas
nesse quesito, além de não serem interessantes para o bom andamento
do negócio, podem gerar crises internas. Neste ponto surgem perguntas
do tipo: Os lucros serão reinvestidos? Haverá distribuição para os sócios
por meio do pró-labore? Em organizações de crescimento exponencial,
os dividendos precisam ser minimizados para dar sustentação ao intenso
crescimento (alavancagem).
Presidente do conselho
O terceiro elemento desse fundamento, Conselhos (inicial), visa
preparar a formação de um conselho consultivo, inicialmente, e de admi-
nistração, a seguir, pois ambos se aproximam. Logo, surge uma delicada
questão, a definição do presidente do conselho. Embora desnecessária a
formalização nesse momento, é preciso começar a discutir quem exercerá
esse papel. As reflexões sobre a função de decisor, iniciadas no Canvas da
Governança, ganham contornos mais formais. Não será mais adequado,
Conflito de interesses
Outra política a ser estabelecida nesse estágio é a do conflito de
interesses. Um exemplo desse tipo de conflito, segundo o site Olhar Di-
gital, foi a saída de Eric Schmidt, então CEO do Google, do conselho
administrativo da Apple, em um acordo bilateral, devido a conflito de
interesses entre as duas empresas. No estágio Seed é preciso começar a
desenhar e implantar regras que evitem conflitos.
Estatuto/Contrato social
No estágio Seed, quanto às questões jurídicas e societárias, é impor-
tante definir um estatuto ou um contrato social. Ambos são a “certidão
de nascimento da empresa”. Enquanto o estatuto social é utilizado pelas
sociedades em ações e entidades sem fins lucrativos, o contrato social é
utilizado pelas demais sociedades (Ltda. usa contrato social, enquanto
S/A usa estatuto). São esses documentos que estabelecem a forma de
funcionamento da organização, incluindo as alçadas e as atribuições
de cada agente de governança. Devem ser considerados os seguintes
Fonte: o autor.
Remuneração da diretoria
Segundo Kaluan (2014), em um estudo divulgado pelo site The
Next Web, a média salarial de um CEO em startups em São Paulo não
passa dos US$ 50 mil por ano. Já a média global fica entre US$ 39,9 mil
e US$ 70,1 mil por ano. Peter Thiel, que além de cofundador do PayPal
é também um megainvestidor, afirma que “quanto menor o salário do
CEO, mais chances de sucesso ele tem”.
Nesse estágio cabe avaliar a criação de uma política de remuneração,
que seja submetida para aprovação do conselho. O IBGC recomenda
que “as organizações devem ter um procedimento formal e transparente
de aprovação de suas políticas de remuneração aos diretores, incluindo
eventuais benefícios e incentivos de longo prazo pagos em ações ou nelas
referenciados”. Nesse fundamento deve se incluir, para as remunerações do
CEO, founder, hipster, hacker e hustler mecanismos de freios e contrapesos,
de modo que uma pessoa não delibere sobre sua própria remuneração.
Avaliação da diretoria
Como vimos no primeiro capítulo (Os 10 fatores de pressão da nova
economia na governança), os OKRs são uma ferramenta muito utilizada
em startups para avaliação e acompanhamento de metas. No estágio Série
A, pode-se implementá-las como processo de avaliação da diretoria e,
atrelado às metas, definir regras de impedimento do CEO fundador com
critérios e procedimentos de avaliação bem claros, para a eventualidade
desse impedimento (no Brasil isso não é comum).
Há vários indicadores que são específicos para empresas digitais, que
podem ser aplicados de acordo com o modelo de negócio ou estratégia.
Carisma
Como já vimos na Parte 2, é uma ferramenta de engajamento para
qualquer negócio, que também pode servir para a liderança de um con-
selho. Mas seja em uma startup ou em uma empresa maior, ele precisa
ser autêntico: não há porta-voz em uma reunião de conselho!
Jorge Rocha, líder da Gavea Angels SP, comenta que é preciso evitar
“sufocar” uma startup com estruturas e controles que ela não necessita.
Portanto, neste estágio vale uma avaliação específica de quais, dentre
essas funções acima, podem ser utilizadas no conselho da empresa. De
todo modo, é importante também que as principais lideranças estejam
familiarizadas com esse conjunto de funções possíveis e, assim, definir o
que melhor responde às necessidades específicas de cada negócio.
Auditoria interna
A partir do estágio Série A, recomenda-se avaliar a criação de uma
auditoria interna como um primeiro passo de preparação para auditorias
independentes. Dessa forma, os controles internos e as normas começam
a ser padronizados e geridos por um ponto focal.
Fonte: o autor.
ANDERSON GODZ 173
10.1 CONSELHOS (AVANÇADO)
Planejamento da sucessão
Nesse estágio é preciso um planejamento formal de sucessão do CEO
e de líderes-chave para minimizar os riscos quanto à continuidade do
negócio. Em que pese ainda possam restar incertezas sobre a estratégia e
o modelo de negócio, e estas de fato influenciam os requisitos e os perfis
Fonte: o autor.
Conselho fiscal
Embora seja uma exigência apenas da lei brasileira (não existe em
nenhum outro país do mundo) e, somente para as empresas de capital
aberto, implantar um conselho fiscal pode servir de preparação para
auditorias externas, prática que pode ser comum a partir dos próximos
estágios, além de começar a irradiar um sentido de compliance e de revi-
sões independentes da gestão. Mesmo não sendo startup, vale o exemplo
da associação PMI – Project Management Institute – Paraná, com 450
membros, que reforçou o papel de seu conselho fiscal sob direcionamento
do então presidente Thiago Ayres. Segundo Ayres, “há uma série de bene-
fícios, como transparência, redução de riscos financeiros e patrimoniais
(seja por incompetência ou ética) e maior aderência ao compliance fiscal
com boas práticas, assegurando que os recursos da organização sejam
aplicados como previsto em sua constituição. Portanto se aplica a uma
fábrica, um condomínio, uma ONG ou uma startup!”.
Mediação e arbitragem
Vale aqui lembrar um dos fatores de pressão abordados no primeiro
capítulo: fundadores excêntricos, como idealizadores da empresa, têm
habitualmente uma forte ascendência sobre a equipe, sócios e investido-
res, dando a impressão de que reduzem a necessidade de mecanismos
de mediação e arbitragem.
O IBGC recomenda que os conflitos sejam, preferencialmente, re-
solvidos mediante negociação entre as partes. No entanto, com o avanço
dos estágios de financiamento e a entrada de mais sócios, conflitos mais
agudos podem acontecer. E eles ocorrem mesmo que, desde os primei-
ros estágios, tenham sido aplicados os fundamentos, como o acordo de
fundadores, revisões, Canvas da Governança, etc.
Assim, o IBGC recomenda a inclusão de cláusulas de mediação
e arbitragem no estatuto/contrato social ou em um contrato específico
firmado entre as partes. Isso visa estabelecer “formas ágeis e eficazes de
resolução de controvérsias e divergências entre sócios e administradores”.
Fonte: o autor.
Conselho de família
O crescimento de um negócio traz consigo desafios típicos de gran-
des empresas. Lidar com as famílias dos fundadores e investidores é um
desses desafios. É possível que tenham surgido, nesse estágio, disputas e
conflitos. Pode haver também alguns privilégios que se confundem com
direitos adquiridos.
O fundamento conselho de família surge como um instrumento que
pode ajudar a imprimir mais disciplina na atuação dos membros da empresa.
Esse conselho, na definição do IBGC, é o órgão responsável por manter
os assuntos de ordem familiar separados dos assuntos da organização. A
ideia é, justamente, evitar a interferência indevida sobre a organização
de assuntos de interesse exclusivo da família. Os objetivos do conselho de
família não se confundem com os do conselho de administração, voltados
unicamente para à organização, segundo o IBGC.
Em geral, o conselho de família funciona fora da empresa. É como
se fosse um fórum no qual familiares podem discutir conflitos antes de
levar um posicionamento definido para os demais sócios da organização.
Fonte: o autor.
Fonte: o autor.
Fonte: o autor.
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