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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS

ESCOLA DE DIREITO DE SÃO PAULO

KLEBER DE NICOLA BISSOLATTI

A RECUPERAÇÃO JUDICIAL DO “GRUPO OI” E OS CRÉDITOS PÚBLICOS DA


ANATEL: UMA ANÁLISE SOBRE O TRATAMENTO CONFERIDO AOS
CRÉDITOS DE NATUREZA PÚBLICA E TRIBUTÁRIA NA RECUPERAÇÃO
JUDICIAL

SÃO PAULO
2021
KLEBER DE NICOLA BISSOLATTI

A RECUPERAÇÃO JUDICIAL DO “GRUPO OI” E OS CRÉDITOS PÚBLICOS DA


ANATEL: UMA ANÁLISE SOBRE O TRATAMENTO CONFERIDO AOS
CRÉDITOS DE NATUREZA PÚBLICA E TRIBUTÁRIA NA RECUPERAÇÃO
JUDICIAL

Dissertação apresentada ao programa de


Mestrado Profissional em Direito, da Escola de
Direito de São Paulo da Fundação Getulio
Vargas, como requisito para obtenção
do título de Mestre em Direito

SÃO PAULO
2021
Bissolatti, Kleber de Nicola.
A recuperação judicial do “Grupo Oi” e os créditos públicos da Anatel : uma
análise sobre o tratamento conferido aos créditos de natureza pública e
tributária na recuperação judicial / Kleber Bissolatti. - 2021.
104 fls.

Orientador: Cássio Cavalli.


Dissertação (mestrado profissional) - Fundação Getulio Vargas, Escola de
Direito de São Paulo.

1. Sociedades comerciais - Recuperação. 2. Empresas - Falência. 3. Crédito


público. 4. Agência Nacional de Telecomunicações (Brasil). I. Cavalli, Cássio.
II. Dissertação (mestrado profissional) - Escola de Direito de São Paulo. III.
Fundação Getulio Vargas. IV. Título.

CDU 347.736

Ficha Catalográfica elaborada por: Isabele Oliveira dos Santos Garcia CRB SP-
010191/O
Biblioteca Karl A. Boedecker da Fundação Getulio Vargas – SP
KLEBER DE NICOLA BISSOLATTI

A RECUPERAÇÃO JUDICIAL DO “GRUPO OI” E OS CRÉDITOS PÚBLICOS DA


ANATEL:UMA ANÁLISE SOBRE O TRATAMENTO CONFERIDO AOS
CRÉDITOS DE NATUREZA PÚBLICA E TRIBUTÁRIA NA RECUPERAÇÃO
JUDICIAL

Dissertação apresentada ao programa de


Mestrado Profissional em Direito, da Escola de
Direito de São Paulo da Fundação Getulio
Vargas, como requisito para obtenção
do título de Mestre em Direito.

Campo de Conhecimento: Direito Tributário

Data de aprovação 17/01/2021

Banca Examinadora

Prof. Dr. Cássio Machado Cavalli


FGV EDESP - (Orientador)

Professor Doutor Luciano de Souza Godoy


FGV EDESP

Professor Doutor Daniel Carnio Costa


Pontifícia Universidade Católica PUC/SP

Professor Doutor Manoel Justino


Universidade Presbiteriana Mackenzie
DEDICATORIA

Dedico esse trabalho, meus esforços e toda energia e amor aqui empreendidos à Deus e
minha família.

Aos meus pais, Salete e Azuil Lopes, que por vezes renunciaram aos sonhos pessoais
para que eu pudesse realizar o meu, fazendo dessa conquista, uma vitória, não só́ minha, mas
nossa. Tudo o que consegui, só́ foi possível graças ao amor, apoio e dedicação que vocês sempre
tiveram por mim. Sempre me ensinaram agir com respeito, simplicidade, dignidade,
honestidade e amor ao próximo. E graças à união de todos, os obstáculos foram ultrapassados,
vitórias foram conquistadas e alegrias divididas. Dedico a vocês esse trabalho de conclusão de
mais uma etapa de nossas vidas.

À minha amada esposa, Soraya Bissolatti, que tanto me ajudou nessa jornada inóspita
de afazeres acadêmicos, de noites em claro lendo, de jarras de café, agradeço todo seu carinho,
apoio e dedicação, em tempos de isolamento social, de dificuldades múltiplas, agradeço seu
carinho e cuidado com nossos filhos Henrique Bissolatti e Victor Bissolatti, com nossa união,
sua paciência e compreensão em minha jornada acadêmica.

Que Deus nos ilumine e proteja para que possamos seguir em frente!

Muitíssimo obrigado!
AGRADECIMENTOS

Antes e acima de tudo agradeço a Deus, por ter abençoado todos os dias da minha vida,
por iluminar meu caminho e me dar forças para seguir sempre em frente. A possibilitar cuidar
de minha família e contribuir para essa sociedade em que convivemos.

Agradeço ao professor Cassio Machado Cavalli a oportunidade de tê-lo como orientador


nesse trabalho, e com muito orgulho cito seu nome aqui, como um dos responsáveis pela minha
formação científica, por investir tempo e dedicação em meu desenvolvimento em pesquisa e
meu aprimoramento profissional.

Agradeço ao professor Cavalli a confiança, a amizade, os conselhos e toda a paciência.


O senhor professor é um exemplo de sabedoria, simplicidade, compreensão e competência.
Todos que trabalham com o senhor admiram sua dedicação e amor ao trabalho, à pesquisa e a
dedicação aos alunos e orientados que vai muito além do que o dever impõe, sempre
preocupado não só com a realização do trabalho, mas principalmente com o ser humano.
Aprendemos a trabalhar em grupo, a respeitar o próximo e, principalmente, que é muito mais
fácil e sadio multiplicar quando sabemos dividir. Seus orientandos sabem que sempre terão um
amigo e um lugar onde encontrarão apoio e palavras de sabedoria.

Na esperança de contar sempre com o privilégio da sua amizade,

Meu muitíssimo obrigado!


RESUMO

Esse trabalho cuida do debate sobre a possibilidade ou não de créditos públicos serem sujeitos à
recuperação judicial, a partir do caso concreto de maior relevância nacional até hoje e das relações entre
as Recuperandas e a agência reguladora do setor de telecomunicações (Agência Nacional de
Telecomunicações – ANATEL), a hipótese da recuperação judicial do Grupo OI e as relações
processuais e extraprocessuais com a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), em
especial, no debate da classificação concursal dos créditos relacionados à ANATEL.

PALAVRAS-CHAVE: Recuperação Judicial. Créditos públicos. Divergência de Créditos. Crédito Anatel.


ABSTRACT

This work takes care of the debate about the possibility or not of public credits to be subject into recivership
(“judicial recovery”), based on the concrete case of greater national relevance until today and of the
relations between the Recovering Companies in judicial rehabilitation and the regulatory agency of
telecommunications (ANATEL), the case in judicial reorganization of Grupo OI and the procedural and
extra-procedural relations with the ANATEL, in particular, the debate on the competitive classification of
credits related to ANATEL.

KEYWORDS: Judicial recovery. Public credits. Divergence of Credits. Anatel Credit. Judicial
rehabilitation.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..............................................................................................................................9
1. NOÇÕES PRELIMINARES .................................................................................................. 12
1.1 DIREITO COMERCIAL E EMPREENDEDORISMO ..................................................................................... 12
1.2 EMPRESA E IMPORTÂNCIA DO EMPRESÁRIO ........................................................................................ 13
1.3 BREVE HISTÓRICO DOS ATOS DE COMÉRCIO À TEORIA DA EMPRESA ................................................. 20
1.3.1 CORPORAÇÕES DE OFÍCIO................................................................................................................ 21
1.3.2 CÓDIGO COMERCIAL ........................................................................................................................ 22
1.3.3 NOVO CÓDIGO CIVIL........................................................................................................................ 23
2. RECUPERAÇÃO JUDICIAL: CONCEITOS E ASPECTOS ESSENCIAIS ..................................... 26
2.1 O QUE É UMA RECUPERAÇÃO JUDICIAL? ............................................................................................. 26
2.1.1 BREVE HISTÓRICO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL ................................................................................ 26
2.1.2 DIREITO FALIMENTAR E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS ...................................................................... 28
2.2 HISTÓRICO GERAL DO “GRUPO OI” ..................................................................................................... 41
2.2.1 A RECUPERAÇÃO JUDICIAL DO “GRUPO OI” ................................................................................... 42
2.2.2 RITO E FASES DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL PELA LEI Nº 11.101/05 ................................................... 43
2.2.3 JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL LEI Nº 11.101/05 ........................................................................ 45
2.2.4 AS INOVAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI Nº 11.101/05 .............................................................................. 48
2.3 PEDIDO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL DO GRUPO OI............................................................................. 54
2.3.1 ADMINISTRADOR JUDICIAL DO “CASO OI” ....................................................................................... 54
3 O CRÉDITO DA AGÊNCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES (ANATEL) ................ 57
3.1 CRÉDITOS SUJEITOS À RECUPERAÇÃO JUDICIAL E SIGNIFICADO DE EXISTÊNCIA DO CRÉDITO ........... 57
3.2 OS CRÉDITOS QUE NÃO SOFREM OS EFEITOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL ......................................... 59
3.3 CRÉDITOS QUE NÃO SE SUBMETEM AO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL ......................................... 60
3.4 CRÉDITOS E CLASSE DE CREDORES ..................................................................................................... 61
3.5 DIVERGÊNCIA DE CRÉDITO PELA ANATEL ........................................................................................ 62
3.5.1 PRELIMINAR DA ANATEL ................................................................................................................. 63
3.5.2 PEDIDO DA ANATEL .......................................................................................................................... 64
4 ANÁLISE CRÍTICA ............................................................................................................ 66
4.1 QUESTÕES ENFRENTADAS NO CASO “GRUPO OI” ............................................................................... 66
4.1.1 SÍNTESE DA MANIFESTAÇÃO DO ADMINISTRADOR JUDICIAL DO GRUPO OI ........................................ 66
4.1.2 DIVERGÊNCIA DE CRÉDITO ............................................................................................................... 66
4.1.3 FORO COMPETENTE ......................................................................................................................... 68
4.1.4 FORO COMPETENTE E REQUISITOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL ....................................................... 70
4.1.5 COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL - CRÉDITOS DA ANATEL ............................... 71
5 LIÇÕES E PRÓXIMOS PASSOS (CONCLUSÃO) .................................................................. 99
REFERÊNCIAS......................................................................................................................... 102
9

INTRODUÇÃO

A recuperação judicial é assunto atualíssimo não só em Direito Empresarial, mas em


todas as áreas afins e, em especial, tema fundamental para o Direito Falimentar, Direito
Tributário e Direito Societário, mas que versa também sobre a essência dos debates sobre a
empresa em dificuldade econômica, uma vez que não há não há empreendedorismo saudável
sem uma boa legislação que permita, ao empresário em crise, uma segunda chance para
recuperar seu negócio e voltar a gerar emprego, renda e tributo, dando ao mesmo tempo
previsibilidade e proteção aos direitos dos credores.
A crise econômica e inconstância política na qual vivemos e empreendemos é terreno
de alta instabilidade. Entre janeiro e agosto do ano de 2015, por exemplo, foram requeridas 766
recuperações judiciais no país segundo dados do Serasa Experian1. Desde a criação do indicador
em 2006 nunca se registrou um número tão elevado desses pedidos. As micro e pequenas
empresas lideraram os requerimentos de recuperação judicial de janeiro a agosto de 2015, com
393 pedidos, seguidas pelas médias, com 228 e pelas grandes empresas, com 145. O Indicador
também verificou aumento de requerimentos de recuperação judicial em agosto/2015 em
relação a julho/2015, passando de 135 pra 139, um aumento de 3,0%. Já na comparação entre
agosto/2015 e agosto/2014 a alta foi de 113,8%: de 65 para 139, ou seja, praticamente o dobro
de pedidos. No ano de 2019, o “indicador Serasa Experian de falências e recuperações, foram
feitos 142 pedidos de recuperação judicial em agosto/19, um aumento de 7,6% no comparativo
com o mesmo mês em 2018 (132) pedidos”2. Importante destacar que os números relativos até
o presente momento ainda estão em fase de consolidação.
Fato é que a crise econômica que assola o país nos últimos anos atingiu em cheio a
atividade empresarial e, como consequência, o número de recuperações judiciais e falências
cresceu exponencialmente. Por certo, a crise ocasionada pelo novo coronavírus (COVID-19),
com início no fim do ano de 2019 e com seu pico ainda longe de alcançar o máximo, assola o
mundo, secando as fontes de recursos, de circulação de mercadorias, comércios e atividade

1
SERASA EXPERIAN. Número de recuperações judiciais bate recorde histórico em 2015, revela Serasa
Experian. In: Serasa Experian. Disponível em: <http://noticias.serasaexperian.com.br/numero-de-recuperacoes-
judiciais-entre-janeiro-e-agosto-bate-recorde-revelaserasa-experian/>. Acesso em: 20.mai.2020.
2
SERASA EXPERIAN. Número de recuperações judiciais aumenta 7,6% em agosto de 2019, revela Serasa
Experian. In: Serasa Experian. Disponível em: https://www.serasaexperian.com.br/sala-de-imprensa/numero-de-
recuperacoes-judiciais-aumenta-76-em-agosto-de-2019-revela-serasa-experian. Acesso em: 20.mai.2020.
10

social, impactando diretamente na economia. Assim, dois fenômenos principais puderam ser
verificados dentro deste contexto.
O primeiro deles reside no fato de que novas questões, antes não enfrentadas, emergiram
através de problemas concretos que ainda não tinham sido tratados pela doutrina ou
jurisprudência, trazendo dúvidas e controvérsias em vários pontos e teses seguem não
pacificados gerando instabilidade a credores e a devedores, já que tanto juristas como o próprio
poder judiciário não estavam prontos para lidar com uma situação como o cenário que hoje se
apresenta não apenas no Brasil, mas em todo o mundo.
Outro fenômeno interessante é que muitos profissionais que não estavam acostumados
a lidar com o tema passaram a atuar nessa área; assim, advogados, magistrados, promotores,
contadores, administradores, mediadores e tantos outros passaram a atuar nesse que aqui
denominaremos “contencioso recuperacional”. Este nosso cenário econômico tomado pelo
processo da globalização e pelos avanços tecnológicos, é importante destacar a crescente
influência e participação da empresa como coração da sociedade contemporânea, estando ela,
sem dúvida, no centro da economia moderna, constituindo a célula fundamental de todo o
desenvolvimento industrial, econômico e social.
Existe total envolvimento direto com as áreas de concentração da pesquisa proposta, na
medida em que a atuação nesta seara tributária e em recuperações judiciais e falências é a área
de principal atuação do exercício profissional deste pesquisador no âmbito nacional, incluindo
ainda a administração judicial em casos de expressão nacional e internacional, lidando
diretamente com litígios na seara tributária e regulatória.
Atuando diretamente em processos de recuperação judicial e falência, nos deparamos,
regularmente, com o desequilíbrio na forma de cobrança e recebimento de créditos por parte
das Fazendas Públicas em face aos créditos privados. Os credores privados (com exceção
àqueles previstos no Art. 49, da LRF3), eis que seu crédito está sujeito aos efeitos dos processos

3
Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não
vencidos.
§ 1º Os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os obrigados,
fiadores e obrigados de regresso.
§ 2º As obrigações anteriores à recuperação judicial observarão as condições originalmente contratadas ou
definidas em lei, inclusive no que diz respeito aos encargos, salvo se de modo diverso ficar estabelecido no plano
de recuperação judicial.
§ 3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador
mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de
11

de recuperação judicial, não podendo por isso ferir o concurso de credores, devendo receber
seus créditos na forma do plano de recuperação aprovado e homologado.
Já as Fazendas Públicas, não medem esforços para lograr receber seus créditos, lançando
mão de todos os meios jurídicos para tanto como, por exemplo, o bloqueio “online” (BACEN-
JUD) das contas bancárias, leilões de bens, entre outros. E isso ocorre porque as ações de
execução fiscal, que são o veículo processual utilizado para cobrança de créditos públicos,
sejam tributários ou não, não são suspensas pelo deferimento do processamento da recuperação
judicial, permitindo então a constrição legal de bens do executado ainda que em recuperação
judicial. Essa experiência é bastante útil para repensar as relações entre as recuperandas e a
Administração Pública no tocante a cobrança dos créditos públicos, bem como a relativização
de exigências, como a apresentação de certidões negativas para participar de certames e
licitações públicas.
São diversas as nuances possíveis de análise dentro das questões atinentes à recuperação
judicial e seus desdobramentos nas muitas searas do direito, desde o direito comercial e
falimentar até mesmo nas relações trabalhistas e tributárias, ocasionando situações de
interessantes análises, como esta a que nos propomos realizar nas linhas que se seguem,
especificamente como nosso tema, aquelas acerca do Grupo OI e sobre o processo do pedido
de recuperação judicial.

irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de


venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os
direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se
permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º desta Lei, a venda ou a retirada
do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial.
§ 4º Não se sujeitará aos efeitos da recuperação judicial a importância a que se refere o inciso II do art. 86 desta
Lei.
§ 5º Tratando-se de crédito garantido por penhor sobre títulos de crédito, direitos creditórios, aplicações financeiras
ou valores mobiliários, poderão ser substituídas ou renovadas as garantias liquidadas ou vencidas durante a
recuperação judicial e, enquanto não renovadas ou substituídas, o valor eventualmente recebido em pagamento
das garantias permanecerá em conta vinculada durante o período de suspensão de que trata o § 4º do art. 6º desta
Lei.
(BRASIL. Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Fonte: Planalto. Disponível em:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 20.mai.2020).
12

1. NOÇÕES PRELIMINARES

1.1 DIREITO COMERCIAL E EMPREENDEDORISMO

Intuitivamente e o senso comum nos traz isso, o direito comercial é o direito do


comércio, e comércio, lato sensu, é o conjunto de atos exercidos habitualmente no sentido da
intermediação dentro da cadeia produtiva, com intuito de lucro. Vale dizer, de forma bem
simples que se trata do complexo de atos praticados habitualmente para levar produtos da sua
fonte ao consumidor. Todavia, modernamente tal concepção não corresponde à realidade, pois
o direito comercial abrange muito mais que simplesmente o antigo comércio de troca de
mercadorias, o outrora conhecido escambo.
O comércio remonta à Antiguidade e temos notícia do exercício dessa atividade por
vários povos, com destaque aos Fenícios, na Mesopotâmia (atual Iraque). Contudo, na
Antiguidade não podemos cogitar a existência de um “direito comercial” propriamente dito,
apesar de já existir regulamentações que visavam resguardar as partes envolvidas. É na
Antiguidade que surgem as primeiras normas regulamentando a atividade comercial as quais
remontam ao Código de Manu, na Índia, e ao Código de Hamurabi da Babilônia,
aproximadamente em 2.083 a.C., mas sem ainda configurar um sistema próprio de normas que
se pudesse chamar de direito comercial. Posteriormente, na região da Europa, os gregos também
elaboraram algumas normas, sem, contudo, corporificar um sistema orgânico de atos de
comércio, enquanto que os romanos criaram normas e institutas disciplinando o comércio que
se encontravam dentro do chamado ius civile, sem autonomia e que, todavia, em virtude da base
rural da economia romana, também não corporificaram algo que pudesse ser chamado
exatamente de “direito comercial”4.
Com o passar do tempo os comerciantes passaram a praticar atos acessórios, que
surgiram ligados a atividade comercial, mas logo se tornaram autônomos (chamados por alguns
autores de “títulos cambiários”, títulos de câmbio ou títulos de crédito), sendo utilizados
inclusive por quem não era comerciante. Não se podia mais, então, usar a concepção de direito
comercial como direito dos comerciantes por não ser mais suficiente ao ramo do direito que era

4
Cf. MENDONÇA, José Xavier Carvalho de. Tratado de Direito Comercial Brasileiro - Vol. 1. Campinas:
Bookseller, 2000, p. 630.
13

empregado, tornando-se necessário estender seu âmbito de aplicação para disciplinar essas
novas relações que não envolviam única e exclusivamente os comerciantes. Assim,
desenvolveu-se o sistema objetivista do direito, que desloca o centro do direito comercial para
os chamados “atos de comércio”, isto é, não focados na pessoa do comerciante, mas sim nos
atos por ele praticados. Tal sistema foi adotado pelo de Código Comercial Napoleônico, o qual
influenciou diretamente a elaboração do nosso Código Comercial, de 1850, posteriormente
complementado pelo Regulamento 737, também de 1850.
É na modernidade, contudo, que surge uma nova concepção que qualifica o direito
comercial como o direito das empresas, orientação maciçamente adotada na doutrina pátria
atual, apesar de ainda existir alguma resistência5. Nesta fase histórica, o direito comercial
reencontra sua justificação não na tutela do comerciante, mas na tutela do crédito e da circulação
de bens ou serviços a partir da orientação para o empreendimento com atividade que visa lucro,
mudando novamente sua órbita de atuação.
O Direito Comercial não deixou de ser ramo do direito privado, mas pode ser definido
para além da teoria dos “atos de comércio” como o conjunto de normas disciplinadoras da
atividade negocial do empresário e de qualquer pessoa física ou jurídica, destinada a fins de
natureza econômica, desde que habitual e dirigida à produção de bens ou serviços que visam
resultados patrimoniais ou lucrativos e que a exerça, com a racionalidade própria de "empresa",
ou seja, podemos definir como o corpo de normas, conceitos e princípios jurídicos que, no
domínio do Direito Privado, regem os atos, fatos e as relações jurídico comerciais.

1.2 EMPRESA E IMPORTÂNCIA DO EMPRESÁRIO

Como coloca Cavalli, “a relevância do tema da empresa, ou da firma, prescinde de


demonstrações”6. O autor nos traz a excepcional dificuldade da pesquisa e elaboração de um
conceito de empresa não só devido à pluralidade de estabelecimentos e de naturezas e essências
diversas, como também pela categorização jurídica das operações de cada espécie desse
gênero7. A noção inicial de empresa advém da prática da economia e seus atos, ligada à ideia
central da organização dos fatores da produção que são considerados, desde os estudos de Karl

5
Cf. MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1998, p. 29.
6
CAVALLI, Cassio. Empresa, Direito e Economia. Rio de janeiro: Editora Forense, 2013, p. 11.
7
Cf. CAVALLI, Cassio. Empresa. Ob. Cit. Rio de janeiro: Editora Forense, 2013, p. 12.
14

Marx, o capital, o trabalho e a natureza voltados para a realização de uma atividade econômica.
Fábio Nusdeo afirma que a "empresa é a unidade produtora cuja tarefa é combinar fatores de
produção com o fim de oferecer ao mercado bens ou serviços, não importa qual o estágio da
produção"8, ou seja, economicamente a empresa é a organização dos fatores da produção, como
o capital e o trabalho, com a finalidade específica e especial de obter ganhos.
A partir de tal acepção econômica é que se desenvolve o conceito jurídico de empresa,
o qual não nos é dado explicitamente pelo direito positivo, nem mesmo nos países em que a
teoria da empresa foi positivada inicialmente. Por se tratar de um conceito originalmente
econômico, alguns autores pretendiam negar importância a tal conceito, enquanto outros
pretendiam criar um conceito jurídico completamente diverso. Todavia, os resultados de tais
tentativas se mostraram insatisfatórios, tendo prevalecido a ideia de que o conceito jurídico de
empresa se assenta na verve econômica, pois o fenômeno é mesmo não somente econômico,
como igualmente sociológico, religioso ou político, apenas formulado de acordo com a visão e
a linguagem da ciência jurídica. A elaboração do conceito jurídico de empresa, portanto, nos
traz, a partir do marco teórico econômico, a identificação de qual a finalidade normativa
preponderante orientadora da doutrina comercialista ao enfrentar o tema, na esteira temática de
Cassio Cavalli9, obra referência na área e onde o autor problematiza com todo esmero as
diferenças entre o atual conceito de empresa, em especial a noção jurídica mater de empresa e
o anterior direito comercial, embasado nos atos de comércio e nos detalha as formas e origens
dos conceito econômico e jurídico de empresa.
Fato é que adotamos em nosso ordenamento um conceito normativo, ou melhor, o
conceito positivista-normativo partindo da teoria da norma e do ordenamento, isto é, essas
relações jurídicas estão sujeitas ao regime das normas jurídicas em geral e, em especial, hoje,
da teoria da empresa embasada em nosso Código Civil de 2002, cuja finalidade normativa
remonta à própria gênese legislativa pelos codificadores do século XIX10.A delimitação do
âmbito do Direito Comercial terá, pois, de se basear nas próprias normas jurídicas positivas,
nomeadamente, nas chamadas normas qualificadoras que são as que se caracterizam como
comercial em certa matéria e da empresa em outra, dizendo que pessoas são comerciantes e que
negócios são comerciais como complemento da teoria da empresa. O fato de tratar-se de ramo

8
NUSDEO, Fábio. Curso de Economia: Introdução ao Direito Econômico. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 1997, p. 285.
9
Cf. CAVALLI, Cassio. Ob. Cit. Rio de janeiro: Editora Forense, 2013, p. 27.
10
Cf. CAVALLI, Cassio. Ob. Cit. Rio de janeiro: Editora Forense, 2013, pp. 55 e 83.
15

de Direito Privado evidencia cuidar-se de relações entre sujeitos colocados em pé de igualdade


jurídica, ou seja, é um ramo de Direito Privado Especial, já que estabelece uma disciplina para
as relações jurídicas que se constituem no campo do comércio, a qual globalmente se afasta da
que o Direito Civil como ramo do Direito Privado Comum, da generalidade das relações
jurídicas privadas. Em nosso direito pátrio, hoje, o Código Civil regula também as atividades
de empresa e empresário. O nosso Direito a respeito das relações comerciais e mercantis é
informado por uma concepção essencial de liberdade de iniciativa, liberdade de concorrência,
mobilidade de pessoas e mercadorias, objeto legítimo de lucro, internacionalismo das relações
econômicas e as relações de comércio, como princípios dedicados e inseridos no bojo da Carta
Política Brasileira de 1988, bem como a novel legislação que institui e trata da Declaração dos
Direitos de Liberdade Econômica, Lei nº 13.874/2019.
Como dito, o comércio remonta à Antiguidade, havendo notícia do exercício desta
atividade por vários povos, desde o norte da África, ao Oriente Médio (o chamado “Crescente
Fértil”), atingindo ainda a Ásia e os povos Indo-Europeus. Contudo, em tal período ainda não
se podia cogitar da existência de um direito comercial, apesar de já existir alguma
regulamentação. O paradigma inefável aqui é atuar com um conceito econômico desenvolvido
por uma ciência jurídica, um conceito normativo de essência alienígena ao positivismo jurídico,
nele inserido, descrito e normatizado, a partir das fontes originais externas da prática da
atividade mercantil e comercial11.
Nesse âmbito de definições, origens e normatizações, de extrema relevância jurídica e
muito controvertido, a recuperação judicial a ser juridicamente definida adiante, necessita de
revisão constante e pesquisa dedicada, profunda, cautelosa e foi construída aqui, a partir de
operadores do direito que militam na área. A experiência demonstra que, em geral, as empresas
que se encontram em recuperação judicial acabam por deixar de cumprir várias obrigações com
órgãos públicos. Tais obrigações vão desde o descumprimento de obrigações acessórias até o
não-recolhimento de tributos e outras obrigações pecuniárias, sob o argumento de que tais
valores são “menos importantes” do que a folha de salário e a compra de matéria prima para
continuidade do desenvolvimento empresarial. Daí a relevância em se descrever a disciplina
legal e jurisprudencial do tratamento dispensado aos créditos públicos na recuperação judicial,

11
O conceito econômico é elaborado pelos juristas com o intuito de lhes evidenciar a estrutura, isto é o conjunto
de elementos que integram o conceito, assim temos que o conceito econômico de empresa é formado pelos seguinte
elementos: (a) organização dos fatores de produção, (b) ser voltada à obtenção de um produto destinado a troca
em mercado, isto é, voltado à satisfazer necessidades alheias (d) sob o risco do próprio empresário, (e) que colhe
os resultados da sua atividade a título de lucro.
16

uma vez que não parece haver consenso jurisprudencial e doutrinário quanto ao tema, à despeito
de sua incrível relevância e necessidade.
No entanto, com frequência, a existência de créditos públicos, dada a sua importância,
é decisiva para o desenrolar dos processos de recuperação de empresas. De um lado, situa-se o
interesse público a ser tutelado cuja intensidade se acentua ou atenua conforme seja a natureza
do crédito; doutro, encontra-se o interesse na recuperação da empresa, que pressupõe que se
encontre adequada solução para o endividamento com entes públicos. Nesse sentido, todos os
envolvidos no processo de recuperação judicial (devedora, credora e a própria sociedade) na
maioria das vezes, acabam sendo frustrados, eis que a administração pública obtém maiores e
mais rápidos benefícios do que os demais credores. A ausência de sistematização da disciplina
normativa a ser dispensada a créditos públicos em processos de recuperação judicial gera
insegurança jurídica para todos os atores desses processos.
A presente pesquisa, então, explora as relações jurídicas entre sociedades privadas em
recuperação judicial e credores públicos, principalmente no tocante ao tratamento a ser
conferido à tais créditos públicos (sejam eles de natureza tributária ou não) no âmbito do
processo de recuperação judicial, buscando a interpretação das melhores práticas de direito,
visando o equilíbrio social entre o soerguimento da empresa em dificuldades financeiras e
econômicas e a reestruturação das dívidas com o ente da administração pública, buscando o
adimplemento dos créditos públicos, abordando-se então o tratamento conferido aos créditos
públicos nos processos de recuperação judicial da empresa devedora, que podem ter natureza
tributária ou não. A análise das diferenças e semelhanças entre esses dois tipos é matéria
essencial para o estudo ora proposto, a saber, a diferença para fins da recuperação judicial entre
tributo como gênero, que abarca as espécies: impostos, taxas, contribuições sociais,
contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios, e as sanções aplicadas ao
descumprimento de uma obrigação principal ou acessória, multas “tributárias”, multas
decorrentes de processos de fiscalização por órgãos públicos e agências regulatórias,
indenizações por danos ambientais, bem como ao consumidor, e créditos decorrente de acordos
de leniência. Incluem-se também na análise as obrigações “acessórias” impostas pela agência
reguladora a empresas que atuam em setores regulados.
Claudio Renato do Cato Farág, diferencia tributo e multa, demonstrando que os tributos
são decorrentes de lei e incidentes sob fatos jurídicos previstos em lei e lícitos, enquanto as
multas, por sua vez, são sanções incidentes por descumprimento de leis ou contratos, ou seja,
incidentes sobre atos ilícitos, vejamos:
17

Em face da importância e relevância para as conclusões do trabalho,


destacamos a diferença entre o tributo e multa. O Código Tributário Nacional
apresenta que o tributo é prestação que não constitui sanção por ato ilícito.
Esse é o ponto nodal da distinção entre uma espécie tributária e a multa. Esta
decorre de ato ilícito, enquanto aquela decorre de atividade lícita, quer dizer,
o vínculo obrigacional na tributação recai sobre a atividade lícita, enquanto a
penalidade é apenação de atividade ilícita ou à disposição legal. A
conceituação de multa está ligada à aplicação de penalidade pecuniária por
infração à norma jurídica. João Roberto Parizatto conceitua multa como “a
pena pecuniária imposta a alguém em virtude da infringência de determinada
obrigação legal ou contratual. Tal infringência tanto pode ser à prática de
específico ajuste, ou seja, a uma obrigação de fazer ou não fazer, de entregar
ou não entregar ou mesmo de pagar uma quantia em época aprazada.12 (grifo
nosso).

Nessa mesma toada encontram-se os ensinamentos de Alfredo Augusto Becker:


A regra jurídica especificamente tributária é a que, incidindo sobre fato lícito,
irradia relação jurídica em cujo polo negativo situa-se, na posição de sujeito
passivo, uma pessoa qualquer e em cujo pólo positivo, situa-se, na posição de
sujeito ativo, um Órgão estatal de função executiva e com personalidade
jurídica. A relação jurídica tributária (como, aliás, qualquer outra relação
jurídica) vincula o sujeito passivo ao sujeito ativo, impondo ao sujeito passivo
o dever de efetuar uma predeterminada prestação e atribuindo ao sujeito ativo
o direito de obter a prestação.
O tributo é o objeto daquela prestação que satisfaz aquele dever.
[...]
A hipótese de incidência da regra jurídica tributária pode ser qualquer
fato (ato, fato ou estado de fato), desde que seja lícito. Caso contrário, se
for ilícito, o objeto da prestação não será tributo, mas sanção.13 (grifo
nosso)

Ainda nesta esteira temos os ensinamentos de Geraldo Ataliba, ao afirmar que


[...] o dever de levar dinheiro aos cofres (tesouro = fisco) do sujeito ativo
decorre do fato imponível. Este, por definição, é fato jurídico
constitucionalmente qualificado e legalmente definido, com conteúdo
econômico – por imperativo de isonomia (art. 5º, caput e inciso I, da CF) –
não qualificado como ilícito. Dos fatos ilícitos nascem multas e outras
consequências punitivas que não configuram tributo.14

Na mesma linha, João Dácio Rolim e Maria Inês Caldeira Pereira da Silva diferenciam
multa e tributo desta forma: “A multa é toda prestação pecuniária compulsória incidente em
decorrência da prática de um ato ilícito legal ou contratual, instituída em contrato a favor do

12
FARÁG, Cláudio do Canto. Multas Fiscais Regimes Jurídico e Limites de Gradação. São Paulo: Editora
Juarez de Oliveira, 2001, pp. 37-8.
13
BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. São Paulo: Lejus, 1998, p. 261-2.
14
ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. São Paulo: Malheiros Editores, 1992, p. 33.
18

particular ou do Estado. Diferencia-se do tributo pelo fato deste decorrer de um fato lícito, em
conformidade com a lei”15. E continua no sentido de que podemos anotar que existe uma
diferença na essência econômica entre tributos e multas. A tributação incide na atividade
econômica como um instituto legal que, qualificando a atividade empresa, estabelece a
transferência de riqueza do particular para o Estado.
Na mesma linha de raciocínio são as palavras de Carlos. M. Giuliani Forrouge:
As sanções fiscais oferecem acentuado particularismo, que justifica a sua
consideração independente, porém essencialmente têm caráter sancionatório,
para prevenir e reprimir as transgressões e não reparar qualquer dano, como
muito bem entendeu um tribunal argentino de maneira que, em sua essência,
são de natureza penas – com a condição de ser entendida esta expressão em
sentido genérico e não circunscrita à ilicitude contemplada pelo código penal.
Não se regem pelas normas deste, nem tampouco pertencem se chamou de
“direito penal administrativo” ou “direito penal econômico” cuja autonomia
é, para nós, inadmissível.16

De outro lado, a natureza econômica da multa não se refere a taxação dos bens e riquezas
e sua transferência ao Estado, consistindo, economicamente, como despesa para o contribuinte,
devendo assim, ser escriturada contabilmente. Sendo assim, podemos definir multa fiscal como
a penalidade pecuniária compulsória imposta ao sujeito passivo da obrigação tributária
principal pelo não pagamento do tributo na data prevista para o vencimento da obrigação ou
pelo descumprimento de qualquer outro dever instrumental, possuindo economicamente
natureza de despesa e juridicamente natureza de sanção. Com isso, notamos que a natureza
jurídica do tributo é determinada pelo fato gerador, de acordo com a legislação tributária em
vigor no Brasil17.
Partiremos, então, de um caso concreto de maior relevância nacional e de grande
exposição nacional e internacional, qual seja, o caso da recuperação judicial do Grupo OI à luz
das relações havidas entre as Recuperandas e a agência reguladora do setor de telecomunicações
(Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL). Nossa pesquisa, modelo e método
qualitativo, realizada mediante pesquisa bibliográfica especializada, pesquisa e discussão do

15
ROLIM, João Dácio; SILVA, Maria Inês Caldeira Pereira da. A Dedutibilidade ou não das Multas Moratórias
Perante o Imposto de Renda. In: Revista Dialética de Direito Tributário. nº 11, pp. 72-79, ago./1996, p.73.
16
FONROUGE, Carlos M. Giuliani. Conceitos de Direito Tributário. São Paulo: Lael, 1973, p. 239.
17
Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo
irrelevantes para qualificá-la:I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei;
II - a destinação legal do produto da sua arrecadação.
(BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional). Fonte: Planalto. Disponível
em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172.htm>. Acesso em: 05.mai.2020).
19

caso concreto apresentado, ainda em andamento perante a Justiça Brasileira, em especial a


hipótese da recuperação judicial do Grupo OI e as relações processuais e extraprocessuais com
a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), parte desse específico para o geral em
método lógico indutivo e, em especial, se debruça sobre o debate da classificação concursal dos
créditos relacionados à ANATEL.
Através do estudo do caso, de jurisprudências dissonantes, pareceres em Revistas
Jurídicas, além das Doutrinas nacionais e internacionais, somada à experiência na atividade
advocatícia tributária, desempenham papel fundamental na verticalidade da observação dos
fenômenos. Nosso modelo busca ainda identificar, de forma bastante clara, o tratamento que a
esses créditos foram conferidos face a natureza jurídica do instituto e as formas materiais e
processuais da recuperação judicial, sempre tendo em vista os princípios informadores da lei e
dos procedimentos especiais a que se submetem as partes. Essa análise pormenorizada permitirá
verificar quais as questões mais relevantes e soluções encontradas pelos atores do referido
processo, que tramita perante a 7ª Vara Empresarial da Comarca da Capital do Estado do Rio
de Janeiro, sob o nº 0203711-65.2016.8.19.0001.
Pesquisamos a apresentação de soluções para garantir a continuidade das atividades
empresariais, bem como do adimplemento dos valores relativos ao fisco, buscando a divisão
equilibrada do ônus, garantindo, desta feita, a função social tanto da empresa, quanto do fisco.
Nosso estudo aprofundado do caso concreto demonstrará as soluções apresentadas em relação
aos créditos anteriormente citados, bem como permitirá um outro prisma de enfrentamento de
tais questões, buscado a construção da solução adequada e a compreensão do cenário mais
amplo do litígio, que pressupõe o manejo de saberes que transcendem o campo estrito do
direito18.
Não é demais rememorar a importância do caso ora em estudo. A recuperação judicial
do Grupo OI é, sem sombra de dúvidas, o maior processo de nossa história. O valor do passivo
declarado ultrapassa R$ 65.000.000,00 (sessenta e cinco bilhões de Reais); são gerados mais
de 138 mil postos de trabalho e a função social das empresas também é demonstrada pelas
atividades de telecomunicação por elas exercidas em praticamente todo o território nacional.
Portanto, a relevância prática do caso em apreço justifica-se pelo fato de que parte significativa
das empresas em recuperação judicial possuem passivo junto ao ente público e quedam inertes

18
Trazemos a ênfase na construção de soluções a partir de abordagem multidisciplinar do tema empresarial em
nossa sociedade moderna, ultradinâmica e digital.
20

na busca da equalização desse passivo, sendo que tais empresas apresentam o plano de
reestruturação da dívida privada, quita “em tese” tais dívida privadas, mas acabam fadadas ao
fracasso devido ao elevado passivo fiscal que não recebeu o tratamento adequado no momento
oportuno, não se encontrando devidamente equalizadas, gerando um prejuízo à sociedade pela
perda da atividade empresarial e de todos os benefícios oriundos de sua função social, bem
como pela agressividade da cobrança por parte da Administração Pública que, muitas vezes,
coloca em risco a manutenção da atividade empresarial por buscar a satisfação de seu crédito
de forma mais gravosa sem considerar os interesses que permeiam o concurso de credores
estabelecido pela recuperação judicial.

1.3 BREVE HISTÓRICO DOS ATOS DE COMÉRCIO À TEORIA DA EMPRESA

Na antiguidade surgiram as primeiras normas regulamentando a atividade comercial,


temos que o direito comercial, enquanto sistema orgânico de normas propriamente dito, só é
possível de ser identificado na Idade Média (Século V ao Século XV) diante de uma
necessidade de regulamentar as relações entre os novos personagens que se apresentaram ao
mundo: os comerciantes. A atividade mercantil ganhou impulso em tal período, mostrando-se
insuficiente a regulamentação do direito romano.
A princípio, começa a se desenvolver um “direito comercial” de usos e costumes, oral,
essencialmente baseado nos costumes locais e a publicidade desses costumes com a formação
das corporações de mercadores principalmente nas regiões com saída para o Mediterrâneo,
destacando-se neste período Gênova, Florença, Veneza, surgidas em virtude das condições
avessas ao desenvolvimento do comércio. Era preciso que os comerciantes se unissem para ter
alguma força frente aos poderes feudais da época contra a troca e livre passagem entre seus
territórios. É a época da transição do regime feudal para o regime das monarquias absolutas e
o direito comercial surgiu, conforme se vê, não como obra legislativa do “Estado”, nem com a
confecção de códigos e outorga de regras, muito menos com a criação de jurisconsultos, mas
sim e especialmente com o trabalho dos próprios comerciantes, que o construíram com os seus
usos e com as suas regras que reunidos em classes, elaboraram e divulgaram, cabendo aqui
algumas importantes e relevantes considerações sobre este papel desempenhado e como o
desenvolvimento do direito comercial o acompanhou.
21

1.3.1 CORPORAÇÕES DE OFÍCIO

Historicamente, a primeira forma de identificação da pessoa que se dedicava aos atos


mercantis, modernamente chamado de empresário e com tratamento especial, bem diferente da
época em que eram apenas comerciantes. E foi através dos agrupamentos desses então
comerciantes e de interessados na expansão dessas atividades que se constituíram as
Corporações de Ofício. A Corporação de Ofício foi a primeira forma de identificação do
comerciante, isso porque o comércio era pouco desenvolvido e, para se protegerem e
desenvolverem sua atividade, reuniam-se em grupos específicos de acordo com as funções
exercidas. Esses grupos eram compostos apenas por aqueles comerciantes que possuíam
matrícula regular. Uma vez efetuada a matrícula, ingressava-se na Corporação e a partir de
então eram considerados comerciantes para todos os efeitos regulamentares da época. Nessas
organizações existiam também Tribunais que julgavam os comerciantes integrantes, os quais
determinavam as regras e as normas para regular o comércio e possíveis conflitos surgidos entre
os seus membros. A própria Corporação redigia essas normas e julgava seus pares.
Muito atuante e regularizada entre os comerciantes matriculados, ou seja, o critério que
identificava o comerciante passou a ser exatamente a posse desse título, dessa matrícula a
determinada Corporação de Ofício e não mais apenas o fato de desempenhar a atividade. Sendo
assim, se duas pessoas exercessem a mesma função mercantil, uma matriculada e a outra não,
somente a regularizada poderia receber o tratamento jurídico de comerciante. Logo, quem não
tinha matrícula na Corporação, não obstante desempenhasse a mesma atividade, não seria
considerado comerciante e, portanto, regidos pelo direito comum, o direito civil do local,
submetidos à justiça comum. Isso, na prática, resultava em um tratamento sem os privilégios
legais da categoria do comércio. Esse critério não perdurou por muito tempo na Europa, caindo
frente ao surgimento do Código de Napoleão, em 1806, juntamente com a derrocada dos
regimes absolutistas no Século XVIII, em especial atenção à Revolução Francesa (1789-1789)
e todos os seus desdobramentos históricos sentidos ainda hoje, tanto política como
juridicamente, nas sociedades ocidentalizadas.
Com o correr do tempo os comerciantes passaram a praticar atos acessórios, que
surgiram ligados à atividade comercial, mas logo se tornaram autônomos (como por exemplo
os títulos cambiários), sendo utilizados inclusive por quem não era comerciante. Já não era
suficiente a concepção de direito comercial como direito dos comerciantes e comerciantes como
os matriculados em alguma corporação de ofício, sendo necessário estender seu âmbito de
aplicação para disciplinar relações que não envolviam apenas os comerciantes.
22

Desenvolveu-se, então, a partir desse momento, o chamado “sistema objetivista”, o qual


desloca o centro do direito comercial do sujeito comerciante para os chamados atos de
comércio. Tal sistema, o da Teoria dos Atos de Comércio, foi adotado pelo Código Comercial
Napoleônico, que influenciou diretamente a elaboração do nosso Código Comercial, em 1850.
Uma legislação mais bem elaborada para todos os comerciantes e com os critérios dos atos de
comércio, inspirados em Napoleão que estabeleceu no Art. 1º, do Código Civil Francês que
seria considerado comerciante todo aquele que praticasse atos de comércio cujos requisitos
eram a habitualidade, o profissionalismo e a finalidade lucrativa, passando assim, a ser um novo
e mais abrangente critério para a identificação do comerciante. O ato de comércio era,
basicamente e no mais das vezes, um ato de intermediação em que o sujeito comprava produtos
para revender e tinha a intenção de obter lucro com essa venda. Esses atos de comércio, assim
definidos pelo Código de Napoleão, influenciaram toda Europa e as legislações que a seguiram.
O comerciante, chamado de “atravessador” pela Família Real Portuguesa, era um intermediário,
vez que diminuía a distância entre o produtor e o consumidor.

1.3.2 CÓDIGO COMERCIAL

O Código Comercial Brasileiro datado de 1850 (ainda na época do Império) foi o único
que tivemos e ainda possui as ideias de Napoleão, cuja base fundamental é a referida Teoria
dos Atos de Comércio que considerava comerciante aquele que praticasse atos de comércio
desde que com habitualidade, profissionalismo e finalidade lucrativa. Como vimos, esse critério
já superava o objetivo da simples matrícula na Corporação de Ofício e, apesar de não ser a
ideal, essa teoria perdurou por bastante tempo.
Desde 1850, a atividade relevante da prestação de serviços e seu papel econômico
começou a crescer desenfreadamente, assim como o desenvolvimento da atividade comercial,
o desenvolvimento e avanços tecnológicos e as novas aspirações socioeconômicas fizeram com
que essa atividade se desenvolvesse exponencialmente e tornou-se da maior importância
econômica em todas as sociedades capitalistas, especialmente após a Revolução Industrial
(Século XVIII) e a invenção do tear mecânico.
Com o crescimento das prestações de serviços, o avanço e a importância econômica da
teoria dos atos de comércio foi tornando-se insuficiente e obsoleta, criando-se uma dificuldade
a ser enfrentada por algumas categorias de prestadores de serviços que não estavam incluídos
no ramo do Direito Comercial, mas sim sujeitos ao Direito Civil. Isso os impedia de se socorrer,
por exemplo, da regra que ampara o comerciante para se recuperar em caso de dificuldades
23

econômicas, então conhecida como “concordata”. Diante dessas e de outras dificuldades, o


projeto do atual Código Civil de 2002 buscou inspiração em uma outra teoria mais abrangente
do que a então em vigor que, assim, pudesse abarcar não somente àqueles ali já incluídos, mas
também os prestadores de serviço que desempenhassem atividade econômica relevante. Tal
teoria foi encontrada na Itália, em seu Código Civil de 1942, que adotou uma teoria que ampliou
este conceito. Na Itália Fascista essa teoria era chamada de “teoria da empresa”, que inspirou o
projeto do nosso Código Civil na década de 1970, finalmente aprovado em nosso país apenas
em 2002, entrando em vigor em 2003 (vacatio legis).
A Novel Legislação Civil insere a “Teoria da Empresa” e seu regulamento a partir do
Art. 966, encontrado no Livro II, dentro do Tomo “Do Direito de Empresa”, em seu Título I,
que regula “Do Empresário”, que por sua vez possui o Capítulo I, que dispõe sobre a
“Caracterização e a Inscrição” destes, afirmando que é considerado empresário quem exerce
profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou
de serviços, afora algumas atividades que possuem regulações próprias e especificidades, como
trabalhos intelectuais, científicos e artísticos19. Assim, nessa forma e matéria, o direito pátrio
substitui a teoria dos atos de comércio, por essa mais abrangente e traz sob seus cuidados
antigos praticantes do comércio e da categoria de comerciantes, hoje considerados empresários.
Além deles, outros que nunca foram considerados como comerciantes, são também
empresários, desde que a atividade por eles exercida seja econômica e organizada ou seja, uma
atividade empresarial, que pode ser exercida tanto pelo empresário individual quanto por uma
sociedade empresária.

1.3.3 NOVO CÓDIGO CIVIL

Foi resultado desse cenário moderno e da desproteção de quem praticava o comércio,


mas não atendia os requisitos da teoria antiga, que a promulgação do Código Civil Brasileiro
de 2002 surge, regulando agora o “Direito de Empresa”, marcando o abandono daquele sistema

19
Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a
produção ou a circulação de bens ou de serviços.
Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária
ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir
elemento de empresa.
(BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil). Fonte: Planalto. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 05.mai.2020).
24

tradicional consagrado pelo Código Comercial, de 1850, baseado no comerciante e no exercício


profissional da mercancia – teoria dos atos de comércio, trocando-o pela adoção do sistema do
empresário e da atividade empresarial – teoria da empresa e já obsoleto para o momento
histórico, econômico, social, político e jurídico vividos com o advento das tecnologias e o
desenvolvimento de novas formas de contatos, já durante o final do Século XX, muito mais
impulsionada no Século XXI. Assim, ao contrário do que se apresenta ao leigo, o Código
Comercial não é a principal fonte de consulta deste nosso ramo do Direito e, todavia, não é o
principal motivo pelo qual não esteja mais em vigor. Contudo, das três partes nas quais referido
Código Comercial se divide, ainda uma única permanece em vigor: a segunda parte, que versa
sobre o Comércio Marítimo e Aduaneiro, tema que possui regras cada vez mais específicas e
fora do nosso tema, mas fonte primária ao se tratar desse assunto.
Essa nossa nova concepção que qualifica o direito comercial como o direito das
empresas traz o direito comercial, como já comentamos, a um reencontro com suas origens,
daqui decorre a justificação não na tutela do comerciante, mas na tutela do crédito e da
circulação de bens ou serviços. Além da aceitação doutrinária, tal concepção, o conceito
econômico de empresa, influenciou os trabalhos de atualização do direito comercial positivo
brasileiro, sobretudo na elaboração do Código Civil de 2002 e as legislações posteriores que
vieram para complementá-lo. O referido Codex Civilis unifica a disciplina das matérias
mercantis e civis, similarmente ao ocorrido na Itália com seu Código Civil de 1942. Esse é
importante ponto, pois os delineamentos da agora adotada teoria da empresa, que mesmo antes
de ser acolhida pelo direito positivo já ajudou a solucionar questões extremamente complexas
do direito comercial, nos traz inovações e novas abordagens no direito falimentar e na
recuperação das empresas.
Importante ressaltar aqui que empresa e sociedade não podem se confundir. Empresa,
como já dito, é a atividade elencada no Art. 966, do Código Civil de 2002 e trata-se de atividade
econômica organizada, isto é, empresa é a atividade exercida pelo empresário, objeto de direito
e não sujeito de direito como o empresário ou a sociedade empresária. Atividade econômica é
sinônimo de atividade com fins lucrativos e geradora de empregos. Essa mudança de ótica do
Direito Comercial, cujo objeto de atuação sofreu profunda ampliação com a entrada em vigor
da nova codificação a partir de 2003 em decorrência da vacatio legis, na medida em que o
comerciante deixou de ser o centro nuclear do sistema e, na mesma medida em que se igualaram
os tipos de atividades econômicas produtivas (principalmente os de indústria e de serviços),
passando todos a figurar em um mesmo plano, qual seja, o da empresa como atividade
economicamente organizada para a produção ou oferta de bens ou serviços aos mercados, as
25

consequências foram, sem dúvida, de grande monta, a iniciar pela radical mudança estrutural
tradicional do Direito Comercial, alcançando inclusive sua própria denominação, que hoje não
trata esse direito como comercial, mas sim como "direito de empresa" ou "direito empresarial",
que possui abrangência de significação muito maior, em que o conceito econômico do
empresário, um status profissional, necessariamente contém o elemento da “atividade
organizativa-diretiva”20 que em nome próprio exerce além de outras, as atividades de organizar
fatores de produção, que juridicamente, nos trouxe a definição normativa de pessoa natural que
exerce em nome próprio, atividade empresária.

20
CAVALLI, Cassio. Ob. Cit. Rio de janeiro: Editora Forense, 2013, p. 111.
26

2. RECUPERAÇÃO JUDICIAL: CONCEITOS E ASPECTOS ESSENCIAIS

2.1 O QUE É UMA RECUPERAÇÃO JUDICIAL?

2.1.1 BREVE HISTÓRICO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL

A recuperação judicial é um instituto de natureza processual, um direito que tem o


objetivo de evitar que uma empresa ou empresário em dificuldade financeira feche as portas. É
um processo pelo qual o endividado consegue ganhar folego, com um prazo para continuar
operando enquanto negocia com seus credores e sob mediação da Justiça, em que as dívidas
ficam congeladas por determinado período para possibilitar a manutenção de operação.
Instituída no Brasil pela Lei nº 11.01/05, que substituiu a antiga Lei das Concordatas, de 1945,
na recuperação judicial é exigido que a empresa apresente um plano de reestruturação, que
precisa ser aprovado pelos seus credores.
Com o advento da Ditadura do Estado Novo (1937-1945), diante da necessidade de
criação de um anteprojeto falimentar viável e eficaz, em 1943 Alexandre Marcondes Filho,
então Ministro da Justiça, apresentou uma proposta elaborada pela comissão composta por
Hahnemann Guimarães, Noé Azevedo, Joaquim Canuto Mendes de Almeida, Filadelfo
Azevedo, Sílvio Marcondes e Luís Lopes Coelho, para que fosse produzida uma lei de falências
efetiva, sendo tal projeto transformado, dois anos depois, no Decreto nº 7.661/45. Publicada no
Pós-Segunda Grande Guerra Mundial (1939-1945), essa Lei de Falências possuía como
finalidade gerir por ela e visando integrar e fortalecer os Três Poderes existentes: Judiciário,
Executivo e Legislativo. Com a reforma da então “Nova Lei de Falências” (7.661/45), a
legislação implementou no ordenamento jurídico brasileiro a concessão de dois novos
institutos, quais sejam: as concordatas preventivas e as suspensivas pelo Estado.
Para melhor entendimento, faz-se necessário um breve esclarecimento acerca de ambos
os tipos de concordatas. A “concordata preventiva” tinha como objetivo fazer com que o
devedor comerciante, obedecendo aos requisitos e pressupostos legais, bem como sendo
concedido por sentença, evitasse a decretação da falência, possibilitando a recomposição do
patrimônio da empresa e a sua recuperação econômico-financeira através da postergação do
pagamento de seus créditos quirografários, o que não configurava um novo contrato entre
devedor e credor, mas sim um favor legal.
27

Já na categoria “suspensiva”, a concordata poderia ser usada quando a decretação de


falência já houvesse sido contraída, ou seja, aqui, a falência já foi decretada e o devedor, agora
falido, utilizará os meios processuais com o objetivo de suspender esses efeitos. Todavia, com
o decorrer da evolução do mercado econômico e crescimento político, foi-se percebendo que o
então Decreto nº 7.661/45 estava sendo utilizado bem mais como ferramenta para a prática de
fraudes do que para o seu real objetivo como auxiliador/facilitador da superação de crise ao
qual a empresa ou empresário passavam.
Conforme as finalidades que acima mencionamos e de acordo com o Decreto nº
7.661/45, eram considerados legitimados a requerer o pedido de falência: sociedade empresária
devedora em nome coletivo, sociedades por ações, devedor, também podendo ser requerida
pelo cônjuge sobrevivente, pelos herdeiros, pelo inventariante, sócio, credor comerciante,
credor com garantia real, consoante Art. 8º, § 1º, § 2º e § 3º cc. Art. 9º, I, II, III, alíneas “a”,
“b”, e “c”, todos do Decreto nº 7.661/45 (Lei de Falências)21. Sendo obedecidos todos os
requisitos estabelecidos no Decreto 7.661/45, finalmente a falência é decretada através de
sentença declaratória.

21
Art. 8º O comerciante que, sem relevante razão de direito, não pagar no vencimento obrigação líquida, deve,
dentro de trinta dias, requerer ao juiz a declaração da falência, expondo as causas desta e o estado dos seus
negócios, e juntando ao requerimento:
[...]
1º Tratando-se de sociedade em nome coletivo, de capital e indústria, em comandita simples, ou por cotas de
responsabilidade limitada, o requerimento pode ser assinado por todos os sócios, pelos que gerem a sociedade ou
têm o direito de usar a firma, ou pelo liquidante. Os sócios que não assinem o requerimento, podem opor-se à
declaração da falência e usar dos recursos admitidos nesta lei.
§ 2º Tratando-se de sociedade por ações, o requerimento deve ser assinado pelos seus representantes legais.
§ 3º O devedor apresentará, com o requerimento, os seus livros obrigatórios, os quais permanecerão em cartório
para serem entregues ao síndico, logo após o compromisso dêste.
Art. 9º A falência pode também ser requerida:
I - pelo cônjuge sobrevivente, pelos herdeiros do devedor ou pelo inventariante, nos casos dos arts. 1º e 2º, nº I;
II - pelo sócio, ainda que comanditário, exibindo o contrato social, e pelo acionista da sociedade por ações,
apresentando as suas ações;
III - pelo credor, exibindo título do seu crédito, ainda que não vencido, observadas, conforme o caso, as seguintes
condições:
a) credor comerciante, com domicílio no Brasil, se provar ter firma inscrita, ou contrato ou estatutos arquivados
no registro de comércio;
b) o credor com garantia real se a renunciar ou, querendo mantê-la, se provar que os bens não chegam para a
solução do seu crédito; esta prova será feita por exame pericial, na forma da lei processual, em processo
preparatório anterior ao pedido de falência se êste se fundar no artigo 1º, ou no prazo do artigo 12 se o pedido tiver
por fundamento o art. 2º;
c) o credor que não tiver domicílio no Brasil, se prestar caução às custas e ao pagamento da indenização de que
trata o art. 20.
(BRASIL. Decreto-Lei nº 7.661, de 21 de junho de 1945 (Lei de Falências). Fonte: Planalto. Disponível em:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del7661impressao.htm>. Acesso em: 04.abr.2020).
28

Com isso, vale ressaltar as lições dos autores Rubens Requião22 em conjunto com
Miranda Valverde e Waldemar Ferreira23, entendendo que a natureza jurídica da sentença
declaratória da falência é constitutiva, compreendendo que a sentença, com efeito, é mais do
que uma simples declaração de um estado de direito: ela declara ao mesmo tempo que cria a
massa falida objetiva e a massa falida subjetiva, constituída respectivamente pelos credores e
pelo patrimônio do falido, dando-lhe nítido status jurídico. O devedor, por sua vez, passa, ainda
em consequência da sentença falimentar, a ser impedido de exercer sua profissão comercial.
Por fim, para que possamos tratar melhor da atuação do Juiz dentro do processo recuperacional,
bem como todo o funcionamento do instituto da recuperação judicial, necessário antes entender
o conceito de Poder como fenómeno da relação social e do próprio Poder Judiciário na figura
do Estado-Juiz.

2.1.2 DIREITO FALIMENTAR E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS

Para continuar o estudo do caso em tela, fundamental trazer alguns itens sobre as formas
legais e procedimentais de nosso regulamento e tratar, primeiramente, de alguns institutos sobre
o tema que regem e definem as situações que serão analisadas mais a fundo no próximo
capítulo, assim iniciaremos com os estudos gerais sobre Direito das Empresas.

2.1.2.1 O DIREITO FALIMENTAR NO BRASIL

O Brasil ocupou sempre uma posição colonial em relação ao Estado Português e teve o
direito consubstanciado nas Ordenações do Reino cuja primeira foi a Ordenação Afonsina
(1446-1512) e depois de revista por D. Manoel, passou a se conceituar como Ordenações
Manuelinas (1512-1603). Nela predominavam os princípios do Direito Romano, reproduzindo,
através da falência, o direito estatutário italiano, o qual submetia o devedor a rigor excessivo.
As Ordenações Afonsinas revistas por ordem Del Rei D. Manuel, em 1521,
passando a se denominar Ordenações Manoelinas, regulavam também o
concurso de credores, que ocorria quando o patrimônio do devedor não
bastava para solver todos os seus débitos. Prevalecia, entretanto, ainda o

22
Cf. REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Falimentar - Vol. I. São Paulo: Editora Saraiva, 1995, p. 108.
23
Cf. VALVERDE, Trajano de Miranda. Comentários à Lei de Falências: Decreto-Lei n. 7.661, de 21 de junho
de 1945. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1999.
29

princípio do primeiro exeqüente, dada a influência do antigo direito


visigótico.24

Em 1603, surgiram as Ordenações Filipinas, que abrangiam a Espanha e Portugal e


influenciaram diretamente a aplicação do direito no Brasil, principalmente devido ao
crescimento das atividades mercantis na colônia, sendo interessante de se notar que, a despeito
de terem tais regramentos sido revogados em Portugal no ano de 1867, com a promulgação de
seu Código Civil, no Brasil permaneceram vigorantes até 1916, com a promulgação do Código
Civil de Clóvis Beviláqua. Nessa fase, sendo o devedor condenado por sentença que transitasse
em julgado, iniciava-se a execução e penhora de seus bens e, caso não houvessem bens
suficientes a responder pela totalidade da dívida, ele seria recolhido a cárcere privado até que a
adimplisse, cabendo-lhe a opção de fazer a cessão de seus bens em troca da liberdade. As lições
de Amador Paes de Almeida são claras: eram impostas ao devedor culposo penas que variavam
do degredo até a pena de morte, mas para aqueles que não agiram com culpa, era dado
tratamento diferente . Nesse sentido, traz as Ordenações Filipinas, no Livro LXVI, §8º, assim
dispunha:
E os que caírem em pobreza sem culpa suas, por receberem grandes perdas no
mar, ou na terra em seus tratos e comércios lícitos, não constando de algum
dolo, ou malícia, não incorrerão em pena algum crime. E neste caso serão os
autos remetidos ao Prior Cônsules do Consulado, que os procurarão concertar
e compor com seus credores, conforme o seu regimento

Como vimos, a necessidade de se estabelecer normas com o fim de estimular os


devedores a adimplir suas obrigações perdura desde a antiguidade. Inicialmente o
adimplemento forçado recaía sobre a pessoa do devedor, que se tornava escravo do credor pelo
tempo necessário ao pagamento da obrigação, da dívida, sendo este fator apontado até mesmo
como uma possibilidade dentro do liberalismo de John Locke, posto que a escravidão, ao seu
analisar, seria menos penosa do que a morte25. Essa alternativa de estímulo ao cumprimento das
obrigações transformou-se, em seguida, em execução de bens do devedor o que, em sociedades
capitalistas, constitui modalidade para tentar inibir o inadimplemento. Com o crescimento da
necessidade de se tutelar o direito de crédito e o aprimoramento dos mecanismos que servem a
essa finalidade, surge o Direito falimentar, cuja legislação, por nós recebida da Metrópole
Portugal, só passou a vigorar no Brasil após a Independência, quando se passou a aplicar

24
REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Falimentar. São Paulo: Editora Saraiva, 1991.
25
Cf. LOCKE, John. Dois Tratados Sobre o Governo. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1998.
30

também a Lei das Nações Civilizadas e o Código Napoleônico do ano de 1806. Logo após, já
no ano de 1850, foi promulgado o nosso Código Comercial, que dedicou a sua terceira parte
aos procedimentos de falência, denominados “quebras”, inaugurando assim, a primeira fase
histórica desse instituto no direito brasileiro e que se estenderia até o advento do regime
republicano.
Com a transição da Monarquia para a República, em 1889, surgiu a necessidade de
elaborar nova regulamentação sobre esse instituto da falência e, talvez, essa necessidade se
deveu aos novos anseios morais trazidos no bojo do regime republicano, principalmente pelas
influências liberais. Isto posto, o Governo Provisório da República do Brasil optou por revogar
as disposições sobre falências do Código Comercial através do Decreto nº 917 de 24 de outubro
de 1.890, que imprimiu razões mais liberais ou mesmo protecionistas, demonstrando que nesse
momento o estado de falência passou a ser caracterizado por atos ou fatos previstos
expressamente na lei e na impontualidade do pagamento da obrigação mercantil líquida e certa.
Essa nova espécie legislativa trouxe esperanças de conter a corrupção recorrente no âmbito
mercantil, sendo considerada um marco para o direito comercial em matéria falimentar e já
introduziu meios preventivos à decretação da falência, como a concordata preventiva, a
moratória, a cessão de bens e o acordo extrajudicial.
Seguindo a marcha das mudanças sensíveis testemunhadas no período Pós-Primeira
Guerra Mundial (1914-1918), surgiu a necessidade de revisar alguns pontos da Lei nº
2.024/1908 que não se adequavam à evolução comercial que ocorrera e estava em chamas
naquele momento. Nesse contexto, foi promulgada a Lei nº 5.746/1929, de autoria do professor
Waldemar Ferreira e em 21 de outubro de 1.943, um novo anteprojeto foi apresentado, agora
elaborado por uma comissão composta pelo Ministro da Justiça, Alexandre Marcondes Filho
que seria o futuro e já mencionado Decreto-Lei nº 7.661, de 21 de junho de 1.945. Essa nova
legislação teve como novidade, dentre outras, a extinção da figura do liquidatário, o fim da
subordinação da concessão da concordata preventiva à vontade dos credores, a abolição das
Assembleias dos Credores, diminuindo a influência destes, reforçando os poderes dos
magistrados; e as concordatas tanto a preventiva como a suspensiva que deixaram de ter a
natureza jurídica de contrato e passaram a ser consideradas benefícios concedido pelo Estado
ao devedor, através do Juiz que presidia o feito. Foi nessa época que se instaurou também a
marcha paralela do processo falimentar com o processo criminal.
O Decreto-Lei nº 7.661/1945 sofreu, posteriormente, muitas alterações, principalmente
no que concerne às concordatas e à classificação dos créditos e recursos cabíveis, sendo que a
falência deixou de ser um mero instrumento de liquidação com o encerramento das atividades
31

empresariais com a clara preocupação maior com a função social da empresa frente à sociedade,
o que já apontava para a criação de mecanismos novos e mais eficazes para preservar a empresa
e reconstruí-la, sem deixar, contudo, de proteger o direito de crédito. Por fim, rendendo-se à
tendência natural, influenciada pela nova revolução comercial resultante da Segunda Guerra
Mundial de manter ativa a fonte produtora e os postos de trabalho, bem como contribuir para o
aquecimento da economia nacional, promulgou-se, em 09 de fevereiro de 2005, a Lei nº 11.101,
legislação falimentar atualmente vigente.
Desde sua origem a falência é coberta de um caráter executivo e nosso Direito concursal
é claro no sentido de que se o devedor está sujeito à falência não cabe o concurso de preferência
no juízo da execução exclusiva ou ordinária. Assim, a falência e a vis atractiva desse juízo
falimentar substitui todos os outros concursos de juízos possíveis. O patrimônio realizável do
devedor é liquidado e o produto distribuído em pagamento aos credores em determinada ordem
de recebimento e, em não havendo bens, cessa a falência por falta de objeto. Uma vez cessada
a falência sem o pagamento integral dos credores, o direito de executar singularmente o devedor
é readquirido, a qualquer tempo, pelo saldo dos créditos e esses credores podem optar pela via
extraordinária ou coletiva para tanto. Um aspecto interessante a ser colocado aqui é que a
falência é remédio conservatório de direitos e tema da função de tutela preventiva contra a
fraude do devedor, impedindo assim a dilapidação ou dissipação do patrimônio em prejuízo dos
credores e o mesmo se estende à recuperação judicial.
Em um sistema econômico capitalista, cujas características principais são a garantia do
direito de propriedade e a liberdade de iniciativa e de competição, deve ser primordial o
exercício de atividades econômicas pelos agentes da iniciativa privada, com fundamento no
princípio da livre-iniciativa. Essas atividades econômicas são desempenhadas principalmente
pelo empresário e pela sociedade empresária ao exercerem, profissionalmente, atividade
econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou serviços como, nos traz a
própria Lei Civil no bojo do Art. 966. Em nosso sistema econômico capitalista a regra é: a
atividade empresária é vital para a economia brasileira, de modo que nossa Lei Maior, em seu
Art. 17026, ao cuidar dos princípios gerais da atividade econômica, coloca a livre-iniciativa

26
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
I - soberania nacional;
II - propriedade privada;
32

como fundamento da ordem econômica, ao lado da valorização do trabalho humano,


fundamentos estes que iluminam a estruturação de uma ordem econômica que objetiva
assegurar a todos a existência digna e alcançar a justiça social. Eis aqui a importância da
preservação da empresa, enquanto atividade econômica, que desempenha sua função social ao
gerar empregos, contratações e arrecadação tributária ao Estado de forma a contribuir para o
desenvolvimento econômico, social e cultural do Brasil.
Na esteira do melhor entendimento dogmático jurídico-econômico, a empresa cumpre
sua função social ao gerar empregos, tributos e riqueza, ao contribuir para o desenvolvimento
econômico, social e cultural da comunidade em que atua, de sua região ou do país, ao adotar
práticas empresariais sustentáveis visando à proteção do meio ambiente e ao respeitar os
direitos dos consumidores, desde que com estrita obediência às leis a que se encontra sujeita.
Foi exatamente o princípio da preservação da empresa, em razão de sua função social que
inspirou a edição da Nova Lei de Falências, que disciplina a recuperação judicial, a recuperação
extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. A recuperação judicial,
instrumento criado para propiciar a superação da crise econômico-financeira do devedor e
garantir a manutenção da fonte produtora, nesse passo e princípios, possui seus objetivos e
fundamentos enunciados expressamente pelo próprio diploma normativo em seu Art. 47 que
assevera que a recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise
econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do
emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da
empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica27.

III - função social da propriedade;


IV - livre concorrência;
V - defesa do consumidor;
VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos
produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;
VII - redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII - busca do pleno emprego;
IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua
sede e administração no País.
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de
autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.
(BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Fonte: Planalto.
Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 10.fev.2020).
27
Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira
do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos
credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
(BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005 (Lei de Falências). Fonte: Planalto. Disponível em:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 10.fev.2020).
33

Assim, é que a recuperação judicial é o instrumento próprio destinado à recuperação da


empresa com o principal objetivo de garantir a sua função social, sendo que a Nova Lei de
Falências e Recuperação de Empresas inseriu no sistema de resolução de insolvências brasileiro
alguns institutos inovadores, com destaque para a recuperação judicial de empresas. É diretriz
de orientação a compreensão global de que uma legislação falimentar necessária e eficaz deve
tutelar os direitos e interesses dos agentes que a ela se submetem diretamente e, da mesma
forma, também dos sujeitos que integram a cadeia produtiva da atividade econômica
desenvolvida por esses agentes, tais como os trabalhadores, os fornecedores e as instituições
financeiras que a financiam. Com efeito, referida lei tem como pressuposto harmonizar e
equilibrar os interesses dos empresários e sociedades empresárias em colapso, que se socorrem
da recuperação judicial considerando sua finalidade precípua de viabilizar a superação da crise
econômico-financeira que eventualmente os acometa, com os anseios de seus credores, tendo
em vista que as bases econômicas contratadas anteriormente à crise assim o foram com apoio
nas previsões legais que asseguram o resgate dos créditos.
Entre as inovações, uma das mais notáveis, que veremos detalhadamente em seu tempo,
é o tratamento que recebe o crédito tributário nesse sistema, cujo teor normativo tem a
composição atribuída ao Administrador Judicial prioritariamente ao Ministério da Fazenda e a
seus órgãos vinculados da Receita Federal e da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional. A
carência, na legislação atualmente em vigor, de normatização específica sobre a matéria
tributária, sempre foi apontada pelos estudiosos da matéria como um problema a ser enfrentado,
tendo a jurisprudência exercido relevante papel no estabelecimento dos caminhos que Fazendas
Públicas e contribuintes podem e devem trilhar, principalmente no que diz respeito à cobrança
forçada do crédito tributário nas execuções fiscais. Numa época em que somente a Fazenda
Nacional possui mais de dois trilhões de reais acumulados em dívida ativa, tem-se ideia do
impacto das questões tributárias no âmbito das recuperações e das falências, em que as
empresas invariavelmente acumulam passivos tributários milionários e, em alguns casos,
bilionários seguidos de sua insolvência nestas searas.
Desde os primórdios, o devedor, sendo ele comerciante ou não, de imediato passou a
ser submetido, sob a esfera do que podemos denominar grosso modo de direito falimentar,
mesmo não havendo naquela época regulamentação para tal, quando a falência era considerada
um crime, cuja prática era penalizada com prisão, suplícios e reprimendas físicas, podendo até
o devedor sofrer mutilação, como exemplo premente no Código de Hamurabi. Além da pena
corpórea de sofrimento e mutilações, a exemplo da Roma Antiga, houve um tempo a partir do
qual encontramos registros de atividades mercantis e cumprimento de obrigações em que
34

podemos observar, de forma anacrônica, o instituto da falência. Foi na época em que existia a
figura do escravo por dívida como pena ao mau-devedor, ou seja, havia a obrigação de pagar
as suas dívidas sob pena de privação de liberdade, tornando-se escravo do credor e pagando até
mesmo de forma perpétua ou com a própria vida a depender do tamanho desta dívida.
Diante dessa situação legítima e legal da época, na qual os devedores eram submetidos,
assim como a própria escravidão era reconhecida, sobreveio a edição da Lex Poetelia Papiria28,
em 428 a.C., de modo que a prática, proveniente dos credores, de atos que ferissem ou
renunciasse a liberdade do devedor ou de um membro da família como forma de pagamento da
dívida foi banida. Essa referida lei veio a percorrer um sentindo contrário à pena de
responsabilidade pessoal, passando então a ser responsabilizado o patrimônio do devedor, o
que configurou uma evolução das penas no direito mercantil da época. Mas mesmo após a sua
edição sobraram vestígios e questões sensíveis ao seu cumprimento e ao cumprimento do dever
de pagar ou restituir, como quando o devedor que não possuísse patrimônio suficiente para
saldar o débito realizaria o pagamento e cumprimento da obrigação.
Já no período da Idade Média, diante do nascimento e a inicial construção de um direito
comercial, o ordenamento jurídico criou determinadas regras, as quais foram identificadas pela
doutrina, para a execução desses devedores insolventes. Em seguida, numa linha do tempo, foi
elaborado o Código Napoleônico (por alguns autores conhecido como Code de Commerce),
que provocou o surgimento de dois ramos autônomos e independentes reguladores do
mercantilismo da época, quais sejam: de um lado, o direito civil como instituto de direito
privado, aplicável em praticamente todas as relações jurídicas privadas; doutro, o direito
comercial, um direito especializado aplicável às matérias relacionadas as atividades mercantis
e aos futuros atos de comércio.
Assim, de forma resumida, o direito falimentar passou a não mais se preocupar com a
responsabilidade pessoal do devedor insolvente, criminalizando sua conduta, mas sim e
principalmente com a preservação da empresa, razão em que o legislador, ao editar as leis
falimentares e “recuperacionais”, preocupou-se em tentar recuperar a empresa, visto que, em
muitos casos, é relevante a sua atuação perante a sociedade. Em uma sociedade mercantil, o
patrimônio é uma garantia dos credores e quando o empresário ou sociedade empresária se

28
Nota do Autor: A Lex Poetelia Papiria foi uma lei da República Romana que aboliu o nexum, ou seja, o acordo
pelo qual um devedor dava como garantia de um empréstimo a escravidão de si próprio em nome do credor em
troca da extinção do débito.
35

encontra em crise financeira e seu patrimônio já não é mais suficiente para saldar as dívidas
contraídas, inevitavelmente, deixará de honrar pagamentos de dívidas assumidas.
A falência é um processo de execução coletiva do patrimônio desse devedor empresário,
que organiza a distribuição proporcional do resultado do patrimônio entre todos os credores.
Nesse sentido, a falência promove o afastamento do devedor de suas atividades, isto é, o
devedor deixa de gerir a atividade empresarial visando preservar a utilização produtiva de bens
e recursos, de modo que esses credores que têm créditos vencidos ou que estão prestes a vencer
terão maior chance de escapar da inadimplência do devedor, uma vez que os outros credores
estão impedidos de cobrá-lo antes do vencimento da obrigação.
Com a edição do Código Civil Italiano e a formulação da teoria da empresa, o direito
comercial deixou de ser, como tradicionalmente o foi, o direito do comerciante (período
subjetivo das corporações de ofício) ou o direito dos atos de comércio (período objetivo da
codificação napoleônica), para ser o direito da empresa, fazendo-o abranger uma gama muito
maior de relações jurídicas e, para haver harmonia ao novo regime legal, os diversos institutos
comerciais, como a Falência e a Recuperação Judicial, deverão ser interpretados à luz dessa
nova teoria, vetorizada pelos novos princípios, o que ampliará a incidência das normas
comerciais para diversos setores da economia.
Consubstanciado no intento de evitar a injustiça do não-pagamento dos credores, pois
os primeiros cobradores receberiam a integralidade de seus créditos, desfavorecendo os demais
credores que muito pouco ou talvez nada receberiam, o instituto da falência foi criado para
assegurar a igualdade de oportunidades aos credores de um empresário ou sociedade empresária
insolvente e insuscetível de recuperação judicial. O princípio conditio creditorum é
consubstanciado na igualdade de condição aos credores, isto porque, com exceção das
preferências impostas por lei, todos os credores, de forma igualitária, concorrem à distribuição
proporcional do ativo do devedor, decorrente da venda judicial dos bens verificados e
arrecadados, configurando um processo de execução coletiva ou concursal no qual todo o
patrimônio de um empresário declarado falido – pessoa física ou jurídica – é arrecadado. Esse
expediente visa o pagamento da universalidade de seus credores, de forma completa ou, ao
menos, proporcional. Trata-se de um processo judicial complexo que compreende a arrecadação
dos bens, sua administração e conservação, bem como a verificação e o acertamento dos
créditos, para posterior liquidação dos bens e rateio entre os credores, além da punição de atos
criminosos praticados pelo devedor.
36

2.1.2.2 OBJETO E FINALIDADES DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL

Quanto ao objeto e finalidades da Recuperação Judicial, a doutrina é bastante uníssona,


tendo em vista que a Lei nº 11.101/05 traz, de forma clara e objetiva, os fins a que serve o
instituto, sem deixar margens para maiores questionamentos e consequentes interpretações.
Interpretando o já mencionado Art. 47, da Lei de Falências, podemos dizer que o instituto da
Recuperação Judicial tem por objeto a reestruturação das atividades empresariais, o saneamento
do estado de crise econômico-financeira e o consequente reerguimento do empresário ou da
sociedade empresária, com vistas a evitar sua falência. Nesse sentido, ao dispor sobre o assunto,
podemos entender que “sanear”, aqui, significa equacionar o evento que gera dificuldade para
a manutenção da atividade tal como originalmente organizada a fim de preservar os negócios
sociais, a manutenção dos empregos e, igualmente, satisfazer os direitos e interesses dos
credores, seguindo os princípios que a informam.
Acerca das finalidades do instituto, entendendo finalidade como a destinação do
reerguimento empresarial diante da crise, podemos considerar uma divisão em duas categorias
ou grupos maiores quanto à imediatez: a recuperação judicial tem por finalidades imediatas a
preservação dos negócios sociais, a continuidade do emprego e a satisfação dos direitos e
interesses dos credores e, por finalidades mediatas, estimular a atividade empresarial, o trabalho
humano e a economia creditícia.

2.1.2.3 PRINCIPAIS EFEITOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL

Durante o curso da ação de recuperação judicial, alguns efeitos decorrem desse instituto,
efeitos estes que ora tem origem no texto legal, com ocorrência obrigatória, ora são
provenientes da aplicação das considerações legais ao caso concreto, com a ponderação de
princípios, objetivos e finalidades do arcabouço legal que rege o tema. Necessário considerar,
ainda, que os efeitos da recuperação judicial também se dividem de acordo com o período de
seu nascimento: alguns são oriundos de um primeiro momento processual, o deferimento do
37

processamento da ação de recuperação judicial29 e outros surgem a partir da concessão da


recuperação judicial30, após a aprovação do plano apresentado pelo devedor.
Inicialmente, é válido tratar de um efeito, que poucos autores abordam, por sua
excepcionalidade, mas que merece espaço neste trabalho. Trata-se de efeito que decorre do
simples Administrador Judicial na ação de recuperação judicial, em que os Arts. 95 e 96, VII,
da Lei nº 11.101/0531, interpretados conjuntamente, determinam que o pedido de recuperação
judicial, apresentado no prazo da contestação de pedido de falência preexistente, impede que
esta seja decretada, ou seja, suspende o pedido falimentar. Dissecando o referido efeito, Fábio
Ulhôa Coelho elucida que “para que importe a suspensão do pedido de falência, o pedido de
recuperação judicial deve ser apresentado durante o prazo da contestação. Se a apresentação é
posterior, enquanto não tiver sido proferido o despacho de processamento da recuperação
judicial, a suspensão não se verifica”32.
Todavia, a suspensão dos pedidos falimentares nos termos supramencionados é efeito
legal que sofre duras críticas de parte da doutrina especializada no assunto. Ocorre que tal efeito
propicia o uso indevido do instituto recuperatório. Em outras palavras, graças a essa sistemática
qualquer empresário ou sociedade empresária que ocupe a posição de devedor, mesmo que
ainda não tendo obtido o benefício da recuperação, pode obstruir a regular tramitação dos
pedidos de falência ajuizados por seus credores, com o intuito exclusivo de retardar o
cumprimento de suas obrigações. Nesse sentido, se posiciona novamente Fábio Ulhôa Coelho
ao explicar que “quando a intenção é unicamente retardar o cumprimento das obrigações

29
Art. 52. Estando em termos a documentação exigida no art. 51 desta Lei, o juiz deferirá o processamento da
recuperação judicial e, no mesmo ato:
(BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005 (Lei de Falências). Fonte: Planalto. Disponível em:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 10.fev.2020).
30
Art. 58. Cumpridas as exigências desta Lei, o juiz concederá a recuperação judicial do devedor cujo plano não
tenha sofrido objeção de credor nos termos do art. 55 desta Lei ou tenha sido aprovado pela assembleia-geral de
credores na forma do art. 45 desta Lei.
(BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005 (Lei de Falências). Fonte: Planalto. Disponível em:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 10.fev.2020).
31
Art. 95. Dentro do prazo de contestação, o devedor poderá pleitear sua recuperação judicial.
Art. 96. A falência requerida com base no art. 94, inciso I do caput, desta Lei, não será decretada se o requerido
provar:
[...]
VII – apresentação de pedido de recuperação judicial no prazo da contestação, observados os requisitos do art. 51
desta Lei;
(BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005 (Lei de Falências). Fonte: Planalto. Disponível em:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 10.fev.2020).
32
COELHO, Fábio Ulhôa. Comentários à Lei de Falências. São Paulo: Editora Saraiva, 2011, p. 96.
38

passivas, a previsão legal da suspensão do pedido de falência pelo simples Administrador


judicial da recuperação judicial presta-se à concretização da fraude” 33.
Outro importante efeito da recuperação judicial e talvez um dos mais relevantes, é a
suspensão das ações e execuções em trâmite contra o requerente do pleito recuperatório. Tal
efeito decorre do Ar. 52, inciso III, da Lei nº 11.101/05, que assim dispõe:
Art. 52. Estando em termos a documentação exigida no art. 51 desta Lei, o
juiz deferirá o processamento da recuperação judicial e, no mesmo ato:
[...]
III – ordenará a suspensão de todas as ações ou execuções contra o devedor,
na forma do art. 6o desta Lei, permanecendo os respectivos autos no juízo
onde se processam, ressalvadas as ações previstas nos §§ 1º, 2º e 7º do art. 6º
desta Lei e as relativas a créditos excetuados na forma dos §§ 3º e 4° do art.
49 desta Lei.

Este dispositivo soluciona alguns pontos ensejadores de discussões infindáveis existente


no antigo sistema de resolução de insolvências. O primeiro deles refere-se à competência para
processar as ações ou execuções contra o devedor. Nesse sentido, apesar do conceito de juízo
universal, a Lei nº 11.101/05 deixa claro que aquelas ações suspensas permanecerão no juízo
de origem, não há declínio de competência para o juízo recuperatório. Acerca do tema, Manoel
Justino Bezerra Filho afirma que:
[...] ao determinar a suspensão das ações e execuções, deixa desde logo
claramente fixado que os autos permanecerão na Vara na qual já estão.
Portanto, nesse aspecto, ficam superadas as antigas discussões relativas à
competência em tais casos e, se tais ações vierem a prosseguir futuramente,
terão seu andamento ante o mesmo juiz perante o qual já se encontravam.34

Outro ponto relevante da suspensão ora examinada é sobre quais ações ela recai, isto é,
quais ações, excepcionalmente, não se suspendem em face do deferimento do processamento
da recuperação judicial do devedor. O inciso III, do Art. 52, da Lei nº 11.101/05 é bastante
pontual ao estabelecer as exceções a este feito da recuperação judicial. Não são suspensas,
portanto, as ações que demandam quantias ilíquidas (Art. 6º, §1º), as ações trabalhistas até a
fixação do valor devido (Art. 6º, §2º), as execuções fiscais (Art. 6º, §7º) e as execuções
promovidas por credores absolutamente não sujeitos à recuperação judicial, quais sejam, os
titulares de créditos derivados de antecipação aos exportadores, o proprietários fiduciários, o
arrendador mercantil e o vendedor ou promitente vendedor de imóvel ou bem cujo contrato

33
COELHO, Fábio Ulhôa. Ob. Cit. São Paulo: Editora Saraiva, 2011, p. 96.
34
BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de Recuperação de Empresas e Falência Comentada. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 166.
39

contenham cláusulas de irrevogabilidade ou irretratabilidade ou com reserva de domínio (Art.


49, §§ 3º e 4º)35. Devemos esclarecer, ainda, que a suspensão aqui tratada é, sem sobra de
dúvidas e interpretações fora do estrito texto, temporária, tendo seu termo final determinado
nos termos da lei falimentar. Nesse sentido, o § 4º, do Art. 6º, da Lei nº 11.101/05, determina
que:
Art. 6º [...]
[...]
§ 4º Na recuperação judicial, a suspensão de que trata o caput deste artigo em
hipótese nenhuma excederá o prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta)
dias contado do deferimento do processamento da recuperação,
restabelecendo-se, após o decurso do prazo, o direito dos credores de iniciar
ou continuar suas ações e execuções, independentemente de pronunciamento
judicial.

Ainda que não exista nenhuma previsão legal nesse sentido, resta, logicamente evidente,
que também faz cessar esse efeito a aprovação e homologação do plano de recuperação judicial,
uma vez que, a partir deste momento, opera-se a novação dos créditos sujeitos à recuperação
judicial (outro efeito que adiante será tratado de forma mais detida), cessando a sua
exigibilidade e, portanto, levando à extinção das ações e execuções neles fundadas. Todavia,
não obstante a preocupação do legislador em enfatizar o caráter improrrogável do prazo de

35
Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso
da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do
sócio solidário.
§ 1º Terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida.
§ 2º É permitido pleitear, perante o administrador judicial, habilitação, exclusão ou modificação de créditos
derivados da relação de trabalho, mas as ações de natureza trabalhista, inclusive as impugnações a que se refere o
art. 8º desta Lei, serão processadas perante a justiça especializada até a apuração do respectivo crédito, que será
inscrito no quadro-geral de credores pelo valor determinado em sentença.
[...]
§ 7º As execuções de natureza fiscal não são suspensas pelo deferimento da recuperação judicial, ressalvada a
concessão de parcelamento nos termos do Código Tributário Nacional e da legislação ordinária específica.
[...]
Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não
vencidos.
[...]
§ 3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador
mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de
irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de
venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os
direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se
permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º desta Lei, a venda ou a retirada
do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial.
§ 4º Não se sujeitará aos efeitos da recuperação judicial a importância a que se refere o inciso II do art. 86 desta
Lei.
(BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005 (Lei de Falências). Fonte: Planalto. Disponível em:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 10.fev.2020).
40

suspensão das ações e execuções contra a recuperanda, o Superior Tribunal de Justiça vem
mitigando a aplicação do Art. 6º, § 4º, da Lei 11.101/05, com suporte no princípio da
preservação da empresa, sempre que a sociedade obedecer aos comandos impostos pela
legislação e não estiver, direta ou indiretamente, contribuindo para a demora na aprovação do
plano por ela apresentado. Outro efeito da recuperação judicial, este decorrente da homologação
do plano de recuperação judicial, é a novação dos créditos anteriores ao pedido recuperatório.
Tal efeito tem previsão legal expressa no Art. 59, da Lei nº 11.101/0536.
Acerca do instituto, incluído no título do Código Civil referente ao adimplemento e
extinção das obrigações, seu Art. 360 determina que ocorre novação, dentre outras hipóteses,
quando o devedor contrai com o credor nova dívida para extinguir e substituir a anterior37. A
novação, instituto de nosso Direito Civil, é uma interessante modalidade de extinção de
obrigações em virtude da constituição de uma nova obrigação que venha ocupar o lugar da
primitiva. Nesta espécie de pagamento indireto, percebemos que em único ato, uma nova dívida
assume a posição de outra, que desaparece. Via de consequência, a novação envolve a ideia de
substituição de uma obrigação, pela intenção das partes de novar, manifestada mediante acordo,
cessando o vínculo anterior com a aquisição de novo direito de crédito. O mesmo ato jurídico
que ceifa uma obrigação é o gérmen para o brotar de outra.
A priori, todos os credores anteriores ao pedido recuperatório se sujeitam aos termos do
plano de recuperação judicial homologado em juízo e, por consequência, são atingidos por esta
novação. Nesse contexto, note-se que ainda os que se opuseram ao plano e votaram pela sua
rejeição em assembleia geral de credores devem acatar os termos aprovados pela maioria dos
credores, que substituirão àqueles originalmente pactuados com o devedor. A novação, termo
e instituto do direito civil trazido das obrigações, estabelecida na legislação falimentar é
limitada em seus efeitos, haja vista que não se estende aos coobrigados, fiadores e demais
obrigados de regresso do devedor, nos termos do Art. 49, § 1º, da lei nº 11.101/05. Observe-se

36
Art. 59. O plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor
e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1º do art. 50 desta Lei.
(BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005 (Lei de Falências). Fonte: Planalto. Disponível em:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 10.fev.2020).
37
Art. 360. Dá-se a novação:
I - quando o devedor contrai com o credor nova dívida para extinguir e substituir a anterior;
II - quando novo devedor sucede ao antigo, ficando este quite com o credor;
III - quando, em virtude de obrigação nova, outro credor é substituído ao antigo, ficando o devedor quite com este.
(BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil). Fonte: Planalto. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 05.mai.2020).
41

a tal posição é reiterada pelo Art. 59, da mesma Lei de Falências, quando faz ressalva expressa
ao mencionar que a novação se dá “sem prejuízo das garantias”.
Outra característica peculiar da novação que ocorre nesta hipótese é sua
condicionalidade. Nessa direção são as lições de Fábio Ulhôa Coelho:
As novações, alterações e renegociações realizadas no âmbito da recuperação
judicial são sempre condicionais. Quer dizer, valem e são eficazes unicamente
na hipótese de o plano de recuperação ser implementado e ter sucesso. Caso
se verifique a convolação da recuperação da recuperação judicial em falência,
os credores retornam, com todos os seus direitos, ao status quo ante.38

O que queremos debater é que a novação ocorrida com a aprovação e homologação do


plano de recuperação judicial opera sob verdadeira condição suspensiva. Isto é, o crédito
anterior ao pedido recuperatório é substituído por nova dívida delimitada no plano sendo de
plano extinto. Todavia, o descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano acarreta
convolação da recuperação judicial em falência e reconstitui os direitos e garantias dos credores
nos termos originalmente contratados, como eram antes de operada a novação39. Assim, o efeito
novador ocorrido no curso do processo de recuperação judicial é limitado e condicionado,
operando-se somente em relação ao devedor principal e sustentando-se enquanto as obrigações
estipuladas são devidamente cumpridas.

2.2 HISTÓRICO GERAL DO “GRUPO OI”

Em linhas gerais, o Grupo OI teve origem na junção de duas gigantes nacionais no setor
de telecomunicações, a TNL e a Brasil Telecom S.A. (“BRASIL TELECOM”), em 2009. Essas
sociedades nasceram a partir da privatização do sistema TELEBRÁS, em 1998. O Grupo OI
iniciou suas atividades com a prestação de serviços de telefonia fixa e incorporou ao seu
portfólio serviços de telefonia móvel, internet, TV por assinatura, dentre outros, passando a ser
um dos maiores provedores de serviços de telecomunicações do país com presença nacional
integrada em uma só marca, oferecendo uma variedade de produtos sob a marca “Oi” e que
hoje está presente em quase a totalidade dos 5.570 municípios brasileiros, atendendo

38
COELHO, Fábio Ulhôa. Ob. Cit. São Paulo: Editora Saraiva, 2008, p. 105.
39
Cf. COELHO, Fábio Ulhôa. Ob. Cit. São Paulo: Editora Saraiva, 2008.
42

aproximadamente 70 milhões de clientes, conforme pesquisa levantada nos autos do processo


de Recuperação Judicial, no ano de 2016.
A unificação do marketing dos serviços sob a marca “Oi” contribuiu significativamente
para a criação de uma identidade, tornando-a uma das principais marcas do mercado de
telecomunicações no país, que está entre as vinte e cinco mais valiosas do Brasil nos últimos 4
anos, de acordo com a Interbrand. O Grupo OI possui aproximadamente 330 mil km de cabos
de fibra ótica instalados e distribuídos por todos os estados brasileiros, o que corresponde a um
investimento de aproximadamente R$ 14,9 bilhões, sendo um dos maiores operadores de
telefonia fixa da América do Sul em número de linhas, com 14,9 milhões em operação. Isso
torna o Grupo OI hoje o maior prestador de serviços de telefonia fixa do Brasil, com uma
parcela de mercado de 34,4% do total, compreendendo todo o território nacional. Objeto de
nosso estudo, essa Recuperanda tem cerca de 14,9 milhões de linhas de telefone fixos em
operação, atendendo a residências, empresas e telefonia de uso público. Além disso, o Grupo
OI detém 5,7 milhões de acessos à internet banda larga. Por fim, há aproximadamente 1,2
milhão de assinaturas de TV. Foi talvez o primeiro provedor de serviços de telecomunicações
do Brasil a atingir presença nacional totalmente integrada em uma só marca e, conforme já́
colocado aqui, comercializa esses produtos convergentes exclusivamente sob a marca “Oi”, a
exemplo dos pacotes “Oi Voz Total” (telefonia fixa e móvel) e “Oi Total” (telefonia fixa,
móvel, internet e televisão).
Em suma, trata-se de um dos maiores conglomerados empresariais do país, com
relevância em múltiplas áreas da economia e da sociedade como um todo cuja dificuldade
econômica exerce tremendo impacto social e tributário.

2.2.1 A RECUPERAÇÃO JUDICIAL DO “GRUPO OI”

O Grupo OI peticionou ao Juízo empresarial do Foro da Comarca da Capital do Estado


do Rio de Janeiro no dia 20 de junho de 2016, com fundamento nos Ars. 47 e 48, da Lei nº
11.101/2005 (“LFR”), e requereu sua Recuperação Judicial por diversas razões de fato e
direito. Dentre os pedidos iniciais, o grupo recuperando pede inicialmente a concessão do juízo
de uma tutela de urgência, qual seja, a suspensão de todas as ações e execuções contra as
empresas recuperandas e pertencentes ao grupo, de modo a evitar que constrições judiciais
sejam realizadas no período compreendido entre o ajuizamento da recuperação judicial e o
deferimento do seu processamento. Pede, ainda, a suspensão da eficácia das cláusulas que
preveem o ajuizamento de recuperação judicial como causa de rescisão de contrato, a dispensa
43

da apresentação de certidões negativas em qualquer circunstância relacionada às recuperandas,


até mesmo para que exerçam suas atividades (incluindo certidão negativa de débitos referentes
às receitas administradas pela ANATEL e certidão negativa de distribuição de pedidos de
falência e recuperação judicial).
Por fim, requereu ainda que seja deferido o processamento da recuperação judicial das
sociedades OI, TNL, OI MÓVEL, COPART 4, COPART 5, PTIF e OI COOP, usando como
base legal o Art. 52, da Lei nº 11.101/05, seguindo o seu trâmite regular, inclusive para a
oportuna concessão da recuperação judicial, pedindo como consequência do pedido principal
as condições processuais para tanto como, por exemplo, a nomeação do administrador judicial,
a dispensa de apresentação de certidões negativas para que as recuperandas exerçam suas
atividades (incluindo certidão negativa de débitos referentes as receitas administradas pela
ANATEL e certidão negativa de distribuição de pedidos de falência e recuperação judicial); a
suspensão de todas as ações e execuções existentes contra as recuperandas, na forma do Art.
6º, da Lei nº 11.101/05; a intimação do ilustre membro do Parquet e a comunicação às Fazendas
Publicas Federal e Estaduais de todos os Estados da Federação.

2.2.2 RITO E FASES DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL PELA LEI Nº 11.101/05

Já trouxemos que o procedimento da recuperação judicial em nada se assemelha com o


procedimento comum ordinário conscrito no Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015),
pois cuida de matéria especial e por demais específica, com detalhes da lide mercantil que não
caberiam naquele sistema geral de normas processuais do contencioso cível. Trata-se, pois, de
um procedimento especial, ou melhor, um procedimento especialíssimo – e isso, inclusive, traz
algumas dificuldades na compatibilização entre as previsões do Código de Processo Civil e a
Lei de Recuperação e Falência. Vale destacar aqui que a Lei nº 11.101/05 não nos traz de forma
linear, passo a passo, o procedimento da Recuperação Judicial, o que dificulta um pouco a
compreensão desse processo e consequente procedimento recuperacional somente a partir da
leitura da lei, com o que deparamos no dia a dia no cotidiano forense. Assim, podemos sintetizar
o mais básico de todo o procedimento de forma breve, a seguir.
Inicia-se formalmente com uma petição inicial na qual a empresa pleiteia a própria
recuperação judicial e indica a relação de credores, na forma do Art. 51, da Lei nº 11.101/2005.
Deferido o pedido pelo Juiz competente, nos ditames do Art. 52, será por ele nomeado o
administrador judicial que pode ser advogado, contador, economista ou administrador de
empresas, pessoa física ou jurídica, que atue na área da advocacia, contabilidade ou auditoria,
44

como determina o Art. 21 da referida lei. A partir desse momento ocorre a suspensão, pelo
prazo de 180 dias, dos processos contra a empresa em recuperação – é o denominado “stay
period”, do Art. 6º, caput e § 4º, da Lei nº 11.101/2005. Segue-se então à publicação de edital
com a 1ª relação de credores sempre a partir da lista inicial apresentada pela ora denominada
“recuperanda”, conforme o disposto no Art. 52, § 1º, da Lei nº 11.101/05 e, então, dentro do
prazo de 15 dias a partir da publicação desse referido edital, segue-se a apresentação, perante o
administrador judicial, de divergência em casos onde o credor entenda que os valores ou classe
de créditos constantes do edital não estão corretos ou a habilitação de créditos que não constem
da relação inicial apresentada pela recuperanda.
Importante ressaltar que não existe sucumbência quanto a essas peças, como dispõe o
Art. 7º, § 1º, da Lei nº 11.101/05. A publicação de Edital com a 2ª relação de credores (Art. 7º,
§ 2º) é necessária dada a universalidade do juízo, relação essa apresentada pelo Administrador
Judicial, trazendo então a sua resposta a respeito de cada uma das divergências ou habilitações
apresentadas pelos credores. A partir da publicação desse 2º edital, em 10 dias, perante o juiz,
pode ocorrer impugnação e acontece a discussão quanto à presença, ausência, valor ou classe
de um crédito constante desta segunda listagem de credores, que será autuada em apartado e,
após contraditório e eventual dilação probatória, terá uma decisão do juiz. Nesse caso, há a
possibilidade de condenação nos ônus da sucumbência (Art. 8º), sendo que da decisão que
julgar a impugnação cabe agravo de instrumento (Art. 17).
Após as decisões de impugnações pelo juiz, será publicada a 3ª e última relação de
credores, ou seja, o quadro geral de credores, consoante Art. 18, da Lei nº 11.101/05. Em
paralelo temporal à apuração dos créditos corre o prazo para a apresentação do plano de
recuperação judicial pela recuperanda, que tem o prazo de 60 dias contados da publicação do
deferimento da Recuperação Judicial, como nos traz o Art. 53, do dispositivo legal. Os credores
terão o prazo de 30 dias para apresentarem objeção ao Pedido de Recuperação Judicial, prazo
esse contado a partir da publicação do 2º edital de credores, de acordo com o Art. 55. Caso
ocorra a apresentação de alguma oposição, será designada a Assembleia-Geral de Credores para
que decida acerca do pedido de recuperação judicial, aprovando ou rejeitando de forma
fundamentada, pelas diversas classes de credores (Art. 35, I, "a" e Art. 56, ambos da Lei nº
11.101/2005). Detalhe que essa Assembleia-Geral de Credores não é realizada em juízo, não
contando com a presença do juiz, sendo presidida diretamente pelo Administrador judicial.
Assim, uma vez aprovado o plano na Assembleia-Geral, o juiz deverá homologá-lo de
forma a conceder a recuperação judicial. Uma vez homologado, haverá a fiscalização de seu
cumprimento pelo juízo da Recuperação pelo prazo de 2 anos, findo o qual ocorrerá a extinção
45

dessa Recuperação Judicial e a empresa prosseguirá com sua atuação, na forma do Art. 63 da
Lei nº 11.101/05.

2.2.3 JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL LEI Nº 11.101/05

O Juízo da Falência, diferentemente do Juiz da Recuperação Judicial, é tido por


universal: todos os credores estão sujeitos ao mesmo juízo falimentar, independente do tipo de
crédito. Nesse caso, como os credores se submetem ao juízo universal, a Lei prevê uma ordem
e categorias específicas (Art. 83). Admitem-se, ainda, os credores extraconcursais na falência,
previstos no Art. 84, da Lei nº 11.101/05 e se referem às despesas com arrecadação,
administração, realização do ativo e distribuição de seu produto, custas do processo de falência,
impostos e contribuições incidentes após a decretação de falência, obrigações resultantes de
atos jurídicos válidos praticados no âmbito da falência, dentre outros. Na maioria dos casos,
trata-se de créditos inerentes à continuidade da empresa após o início do processo falimentar.
Diferente do processo da falência, que é conhecida como uma forma de Juízo universal
(tal como o Juízo sucessório), a Recuperação Judicial não abrange todos os créditos do devedor,
a despeito do que preceitua o Art. 49, da Lei 11.101/05. Nesse contexto, o juízo dito
recuperacional é limitado, porque há nele credores que são sujeitos e que são não sujeitos ao
crivo do processo de recuperação judicial. Esta é, de fato, a principal classificação dos créditos
de uma empresa em recuperação judicial: aqueles que se submetem ao plano de recuperação
judicial por imposição legal, sob pena de nada conseguir se não se sujeitar a tal juízo e aqueles
que estão fora da recuperação judicial e podem executar seus créditos autonomamente. Ou seja,
nem todos os credores da empresa em recuperação serão chamados ao processo para que haja
a negociação dos seus créditos. De fato, os seguintes créditos não são abrangidos pela
recuperação judicial:

• De natureza tributária, por força do Art. 57, da Lei nº 11.101/05 e do


Art. 187, do Código Tributário Nacional;
• Dos credores do devedor (em recuperação judicial) contra os
coobrigados, fiadores e obrigados de regresso, por força do Art. 49, §
1º, da Lei nº 11.101/05; e
• Decorrentes de importâncias entregues ao devedor como adiantamento
em contrato de câmbio para exportação, por força do Art. 49, § 4º e Art.
86, II, ambos da Lei nº 11.101/05.
46

2.2.3.1 ATUAÇÃO DO ADVOGADO DO CREDOR NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL

Importante salientar aqui os momentos mais atuantes do advogado do credor no


procedimento da recuperação judicial.
O advogado do credor atuará em momentos distintos, especialmente após a publicação
do 1º edital, com a apresentação de divergência ou habilitação a ser protocolada apenas e
exclusivamente perante o Administrador Judicial. E é isso que acontece na prática,
exclusivamente por meio eletrônico, ou em menor ocorrência, perante o Administrador judicial.
Outra hipótese, mais rara ainda, é apresentar em juízo, mas isso sempre será a depender da
determinação do próprio juiz da causa. De qualquer forma, no edital o rito se consubstancia, já
que nele estão descritas as formas e endereçamentos dos pedidos.
Atuará, ainda, após a publicação do 2º edital, no momento da apresentação de
impugnação e após a apresentação do Pedido de Recuperação Judicial, com a apresentação de
objeção ao plano, ambas a serem protocoladas ao Juízo Falimentar. Além disso, participará de
forma ativa na Assembleia-Geral de Credores, notadamente para votar pela aprovação ou
rejeição do referido Plano de Recuperação Judicial proposto ou, ainda, pela abstenção. Essa
atuação é específica do procedimento de recuperação judicial, sem prejuízo da suspensão das
ações contra a recuperanda, por força do “stay period” já citado.

2.2.3.2 CONTROLE DE LEGALIDADE NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL

Outra possibilidade de atuação do Juiz na análise do plano de recuperação judicial


negociado entre os devedores e credores é o controle direto da legalidade dos atos processuais
e estaremos novamente diante de divergências doutrinárias no seu entendimento.
No início da vigência da Nova Lei de Falência a doutrina majoritária entendia que
decisões tomadas pelos credores em assembleia-geral vinculava o juiz, não havendo margem
de discricionariedade para decidir em contrário. Nesse sentido, segue entendimento do autor
Alberto Camiña Moreira:
[...] à aprovação do plano pela assembleia de credores segue-se o
pronunciamento judicial vinculado a essa vontade. [...] Não é o juiz que
concede a recuperação; são os credores. O juiz homologa a vontade dos
credores, expressa em assembleia e registrada em ata; o juiz deve proceder à
verificação meramente formal da atuação da assembleia de credores, quórum
de instalação e de deliberação, enfim, a regularidade do procedimento. [...] O
47

juiz não examina o conteúdo do plano aceito; assim como não examina o
conteúdo dos acordos que ele homologa frequentemente no processo.40

Seguindo basicamente a mesma linha, alguns outros autores entendem que, quanto à
deliberação da assembleia-geral de credores, os poderes do magistrado são limitados à
verificação de formalidades, cuja compreensão paira sob a seguinte alegação:
[...] dentre as regrais gerais sobre as assembleias de credores que merecem ser
ressuscitadas estão: a) o juiz as presidirá, mantendo o respeito e a ordem das
discussões, resolvendo de pronto as dúvidas que suscitarem (poder de polícia
do juiz); b) este poder, porém, não o autoriza a ingerir-se no mérito das
discussões e deliberações, salvo quando contrárias à lei; c) a intervenção do
juiz é meramente formal e serve para a documentação dos resultados da
assembleia.41

Entendemos que à época inicial da vigência da Nova Lei havia um posicionamento


acerca da intervenção do juiz nas assembleias-gerais de credores sob o fundamento de
interferência meramente formal. Hoje, com o passar do tempo de das atuações judicias nos
pedidos de recuperação, analisados seus problemas, causas e consequências de forma mais
detalhada, esse entendimento doutrinário foi sendo reformulado no sentido de admitir que o
magistrado também realizasse o controle de legalidade material, havendo a análise de situações
em que se caraterizada algum tipo de suspeita ou mesmo a efetivação do ilícito nos trâmites do
processo, como fraudes, abusos de direito de voto, má-fé, entre outros.
Parece mesmo que o magistrado está intrinsecamente vinculado à decisão da
assembleia-geral de credores no que diz respeito ao conteúdo negocial do plano, pois
verificadas todas as condições, a recuperação deverá ser concedida pelo magistrado. O
vocábulo “poderá” empregado no texto legal (Art. 58, § 1º) não quer traduzir uma faculdade do
juiz, mas sim um poder-dever. Só não irá concedê-la caso verifique a ocorrência de ilegalidade
no conteúdo do plano ou nas pré-condições para o devedor entrar em recuperação.
Válido ainda trazer o entendimento do Ministro Luís Felipe Salomão, do Superior
Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.359.311/SP, em que sustentou a
ideia de que a própria Lei nº 11.101/05 (LRE) traz a permissão para o juiz conceder a

40
MOREIRA, Alberto Camiña. Poderes da Assembleia de Credores, do Juiz e Atividade do Ministério Público.
In: PAIVA, Luiz Fernando Valente de (Org.) Direito Falimentar e Nova Lei de Falências e Recuperação de
Empresas. São Paulo: Editora Quartier Latin, 2005, pp. 248 e ss.
41
SIMIONATO, Frederico Augusto Monte. Tratado de Direito Falimentar. Rio de Janeiro: Editora Forense,
2008, p. 101.
48

recuperação judicial mesmo diante de decisão contrária tomada na assembleia geral de credores,
desde que preenchidos os requisitos do Art. 58 e seguintes, da referida lei42.
Há sempre a necessidade do controle jurisdicional, em matéria processual pública, cujas
extensão e profundidade interferem diretamente em decisões tomadas pelos credores acerca do
plano de recuperação judicial em assembleia geral de credores, sempre com base na sua
competência jurisdicional e no estrito cumprimento do dever legal, observado ainda a faculdade
do juízo, conforme o Art. 58, § 1º, da Lei nº 11.101/05, exceção em que poderá conceder a
recuperação judicial com base em plano que não obteve aprovação na forma do Art. 45, da
referida lei, desde que seja obedecida de forma cumulativa as regras contidas no Art. 58, caput
e incisos, da Lei nº 11.101/05.
Com o passar do tempo com o debate acadêmico e jurisprudencial as alterações dos
posicionamentos acerca do tema são naturais pois o dinamismo das empresas, meios e
tecnologia proporcionam novos parâmetros a cada dia, sem perder de vista o farol
principiológico que traz a moldura e o vetor de interpretação no sentido da superação da crise
econômico-financeira da empresa e sempre será dado aos credores e à recuperanda a
possibilidade de negociar os meios de superação de crise da empresa, na mesma em que o Juízo
possui o poder-dever de supervisão, objetivando a satisfação de todos os envolvidos dentro dos
ditames legais que é sua possibilidade e necessidade de atuação.

2.2.4 AS INOVAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI Nº 11.101/05

Os tributos constituem a principal fonte de receitas do Estado. Com o uso adequado das
receitas, o Estado cumpre uma de suas funções primordiais, que é a da busca do bem comum,
conjunto de todas as condições de vida social que favoreçam o desenvolvimento integral da
personalidade humana e de sua sociedade. O Código Tributário Nacional (CTN) define tributo

42
DIREITO EMPRESARIAL. PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. APROVAÇÃO EM ASSEMBLEIA.
CONTROLE DE LEGALIDADE. VIABILIDADE ECONÔMICO-FINANCEIRA. CONTROLE JUDICIAL.
IMPOSSIBILIDADE.
1. Cumpridas as exigências legais, o juiz deve conceder a recuperação judicial do devedor cujo plano tenha sido
aprovado em assembleia (art. 58, caput, da Lei n. 11.101/2005), não lhe sendo dado se imiscuir no aspecto da
viabilidade econômica da empresa, uma vez que tal questão é de exclusiva apreciação assemblear.
2. O magistrado deve exercer o controle de legalidade do plano de recuperação - no que se insere o repúdio à
fraude e ao abuso de direito -, mas não o controle de sua viabilidade econômica. Nesse sentido, Enunciados n. 44
e 46 da I Jornada de Direito Comercial CJF/STJ.
3. Recurso especial não provido.
(SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp nº 1.359.311/SP (2012/0046844-8). Quarta Turma do Superior
Tribunal de Justiça. Rel. Min. Luís Felipe Salomão. Julgado em: 09/09/2014).
49

como “toda prestação pecuniária compulsória” (Art. 3º). No entanto, apesar de o tributo ser
uma prestação compulsória, é considerável o fato de muitos se furtarem desse dever por meio
da sua sonegação ou do simples inadimplemento.
Assim, devido ao déficit arrecadatório que o descumprimento de tal obrigação acarreta,
toda a sociedade arca com o ônus de serviços estatais deficitários, já que, ao menos, na teoria,
a qualidade dos serviços públicos está diretamente relacionada a uma arrecadação eficiente que
dá suporte financeiro ao Estado no exercício de suas atividades. Nesse quadro de sonegação ou
de inadimplência de tributos, o Estado se utiliza de meios administrativos para coagir os
contribuintes ao cumprimento da prestação tributária. Porém, nos casos em que o contribuinte
resiste à pretensão estatal, o crédito tributário é inscrito em dívida ativa, surgindo, então, um
título executivo. A Certidão de Dívida Ativa (CDA), título executivo extrajudicial, instruirá a
petição inicial da execução fiscal, regida pela Lei nº 6.830/80.
Por sua vez, a Lei nº 11.101/05 trouxe importante reforma no ordenamento jurídico
brasileiro, seja com nova roupagem dada ao processo falimentar, seja com a introdução do
procedimento de recuperação judicial das empresas. Tal reforma enfatizou a necessidade de
preservação da empresa por força de sua função social, segundo o Art. 187, de mencionada
lei43. A norma exclui, do processo de recuperação judicial, somente o crédito tributário; não há
referência à dívida ativa tributária. Nesse ponto, a Lei nº 11.101/2005, em seu Art. 1º, é expressa
em estabelecer que as disposições contidas naquele texto legal são destinadas ao empresário e
à sociedade empresária, ou seja, àqueles que exercem atividade econômica organizada para a
produção ou a circulação de bens ou serviços, nos termos dos Arts. 966 e 982, ambos do Código
Civil. Em outras palavras, portanto, a Lei nº 11.101/05 vem disciplinar a insolvência
empresarial, com o objetivo primordial de tornar possível a manutenção das atividades da
empresa em crise e viabilizar o seu reerguimento.
Anteriormente ao advento do atual texto legal, durante o trâmite do Projeto originário
da Câmara dos Deputados (PL 4.376/93) e por ocasião de sua passagem pelo Senado Federal
(no qual recebeu o nº PLC 71/2003), foram elencados no Relatório trazido pelo Relator do
Projeto na Comissão de Assuntos Econômicos, Senador Ramez Tebet (PMDB), doze princípios

43
Art. 187. Intimado da sentença que decreta a falência ou concede a recuperação judicial, o Ministério Público,
verificando a ocorrência de qualquer crime previsto nesta Lei, promoverá imediatamente a competente ação penal
ou, se entender necessário, requisitará a abertura de inquérito policial.
(BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005 (Lei de Falências). Fonte: Planalto. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 15.jan.2020).
50

norteadores da análise do projeto e das propostas de modificações em relação ao texto que havia
sido aprovado na Câmara dos Deputados.
Tais princípios, desde o início já elaborados e trabalhados aqui, traduzem a busca da
adequação do texto ideal à realidade atual, pari passu ao momento em que se encontra a
economia nacional, o desenvolvimento das atividades empresariais, a necessidade de
preservação das empresas e os efeitos de caráter social, bem como na viabilidade do
recebimento dos créditos por parte dos respectivos credores. Estes princípios foram assim
dispostos, e aqui os nomearemos, novamente, de forma sucinta, do ponto do vista interno do
procedimento e são eles: Princípio da Preservação da empresa; da Separação dos conceitos de
Empresa e de Empresário; da Recuperação das sociedades e empresários recuperáveis, da
Retirada do mercado de sociedades ou empresários não recuperáveis; da Proteção aos
trabalhadores, da Redução do custo do crédito no Brasil; da Celeridade e eficiência dos
processos judiciais; da Segurança Jurídica; da Participação ativa dos credores, da Maximização
do valor dos ativos do falido; da Desburocratização da recuperação de microempresas e
empresas de pequeno porte (EPP) e do Rigor na punição de Crimes Falimentares à Recuperação
Judicial.
Assim, com esse embasamento principiológico, foi possível estabelecer condições para
o conteúdo da nova Lei, ora em análise, no sentido de ser efetivado os objetivos pretendidos,
com a ressalva de que o atendimento de todos os enunciados propiciou, na prática, conflitos
entre alguns deles. A proporcionalidade aqui foi alcançada na superação desses conflitos, pelo
maior alcance e pela busca do equilíbrio aplicados nas modificações da redação aprovada pelo
Senado Federal. Quanto aos eventuais conflitos na utilização dos aludidos princípios, o Relator
Senador Ramez Tebet (PMDB) assinalou com propriedade o esclarecimento necessário para
permitir a evolução das discussões e propostas de alteração no texto, ao asseverar que nesses
casos é necessário sopesar as possíveis consequências sociais e econômicas e buscar o ponto
de conciliação, a configuração mais justa e que represente o máximo benefício possível à
sociedade.
Além disso, deve ser destacado que o novo direcionamento para o sistema falimentar
brasileiro trazido pela Lei nº 11.101/05 há muito já era idealizado e proposto pelos mais ilustres
doutrinadores, que defendiam uma legislação capaz de gerar progresso econômico e social,
reestruturando as empresas em crise e não as liquidando. Já em 1974, Rubens Requião44

44
Cf. REQUIÃO, Rubens. Ob. Cit. São Paulo: Editora Saraiva, 1998, p. 249.
51

alertava para a necessidade de transformações que garantissem aos credores a par condicio
creditorum45, mas que, principalmente, trouxessem mecanismos de sobrevivência da empresa,
em prol do interesse social e dos próprios credores da empresa. Dessa forma, o enfoque legal
passaria das causas da falência ou dos bens que responderiam pelo passivo para as
possibilidades de recuperação da empresa. Rubens Requião entendia que:
[…] o escopo final do instituto falimentar não é outorgar ao Estado a função
de assegurar a realização da par condicio creditorum entre os credores, como
sustentava o pensamento clássico. Mais do que a igualdade entre os credores
na liquidação falimentar do patrimônio do devedor, muito mais do que a
segurança do crédito – pontos de vista respeitáveis na doutrina antiga -, é o
saneamento da atividade empresarial que constitui a finalidade primeira
do instituto da falência, nas concepções modernas de atuação judicial do
Estado.46 (grifo nosso)

Em 1991, ante a crise econômica que assolava o mundial, o Brasil teve seu crescimento
freado, de modo que constatamos que o caminho para erguer nosso país era aquele que evitasse
a falência e preservasse as empresas e empresários, como fonte geradora de renda, emprego,
impostos e divisas. A manutenção dos postos de trabalho asseguraria o poder de compra da
população, movimentando a economia nacional e pondo fim à crise.
Todavia, o mecanismo consagrado pelo diploma falimentar anterior – a concordata –
havia passado a funcionar como ato preparatório da falência, utilizado pelo empresário de má-
fé para protelar a declaração de “quebra” e conseguir tempo para desviar bens e fraudar
credores. Entendemos que quando uma empresa está precisando de ajuda para uma eficaz
administração econômica devido a problemas financeiros ou, por outro lado, quando passa por
dificuldades gerenciais em virtude da sucessão de controlador ou de incompatibilidade entre
sócios, ou mesmo as técnicas de aquisição e fusão, que em inglês literalmente significa “união
de risco”, a ajuda na sua recuperação por procedimentos próprios, apontam para a saída para a
crise. Quando esse empresário não pode mais se autofinanciar, quer pelo aporte de recursos dos
próprios sócios, quer pela capitalização através de novas ações ou debêntures; quando uma
empresa não mais consegue financiamento bancário, por representar um grande risco, somente
o auxílio estatal pode salvá-la e novos mecanismos foram criados para essa administração

45
Nota do Autor: É o princípio que informa o direito falimentar buscando posicionar de forma privilegiada alguns
tipos de crédito, dar eficácia às garantias legais e contratuais e dispensar tratamento igualitário aos credores da
mesma posição.
46
REQUIÃO, Rubens. Ob. Cit. São Paulo: Editora Saraiva, 1998, p. 250.
52

judicializada com a preocupação precípua que norteia o legislador quando da elaboração da


nova lei de falências (Lei nº 11.101/05), no sentido da preservação da empresa.
Nesse ambiente jurídico, a Nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas trouxe
importantes inovações ao regime pátrio de resolução das insolvências, dentre as quais se
destacam, a título exemplificativo, a eliminação da concordata suspensiva; a possibilidade de
rápida realização do ativo prioritariamente em bloco, também a exigência de um valor mínimo
para que o credor requeira a falência do devedor; e ainda a alteração da ordem de classificação
dos créditos, junto a isso temos o tratamento singular e diferenciado às Microempresas e
Empresas de Pequeno Porte. Ao rol de inovações deste novo ordenamento, inclui-se, ainda, a
eliminação de qualquer risco de sucessão tributária, previdenciária e trabalhista, para o
empresário ou grupo corporativo que adquirir o fundo de comércio ou o estabelecimento
comercial da empresa falida, previsto no Art. 141, II, desse diploma falimentar47.
Em virtude da alteração no âmbito tributário, restou a necessidade de modificações na
legislação tributária, uma vez que, possivelmente, com a nova classificação no quadro de
credores na falência, o Estado precisaria se adequar à nova legislação. Nesse cenário, em 09 de
fevereiro de 2005, foi sancionada e publicada a Lei Complementar nº 118, que altera e
acrescenta dispositivos à Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional)
e dispõe sobre a interpretação do Art. 168, I, desta lei48. Assim, por meio da LC nº 118/05, foi
inserido o § 3º no Art. 155-A, do Código Tributário Nacional, determinando que Lei específica
disporia sobre as condições de parcelamento dos créditos tributários do devedor em recuperação
judicial.
No entanto, ainda tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 245/04, de autoria
do Senado Federal, que se refere ao “Programa de Recuperação Fiscal Federal”, visando o
parcelamento especial para devedores que tenham iniciado Plano de Recuperação Judicial.

47
Art. 141. Na alienação conjunta ou separada de ativos, inclusive da empresa ou de suas filiais, promovida sob
qualquer das modalidades de que trata este artigo:
[...]
II – o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do
devedor, inclusive as de natureza tributária, as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes
de trabalho.
(BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005 (Lei de Falências). Fonte: Planalto. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 15.jan.2020).
48
Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados:
I - nas hipótese dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário;
(BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional). Fonte: Planalto. Disponível
em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172.htm>. Acesso em: 15.jan.2020).
53

Foi acrescentado, ainda, com a edição daquela espécie legislativa, os parágrafos 1º, 2º e
3º ao Art. 133, do Código Tributário Nacional49, estipulando novas regras sobre empresas em
processo de falência ou de recuperação judicial. Com estas alterações o investidor terá mais
segurança para adquirir ativos de determinada sociedade em alienação judicial, sem que possa
ser, futuramente, responsabilizado por dívidas fiscais existentes. A negociação que ocorre no
âmbito da recuperação judicial ou falência não se vislumbra em relação aos créditos de
titularidade do Estado, que não pode por em risco seu crédito. Nesse contexto, a Lei
Complementar nº 118/05 incluiu os Arts. 191 e 191-A, ambos no Código Tributário Nacional,
que assim estabelecem:
Art. 191. A extinção das obrigações do falido requer prova de quitação de
todos os tributos.
Art. 191-A. A concessão de recuperação judicial depende da apresentação da
prova de quitação de todos os tributos, observado o disposto nos artigos.151,
205 e 206 desta Lei.

Não obstante ser inconteste a importância evolutiva que podemos atribuir a essas novas
regras e meios de favorecimento ao reerguimento do empresário e sociedade empresária em
crise, as modificações que tornaram a Lei nº 11.101/05 deveras inovadora se referem aos
institutos da Recuperação Judicial e da Recuperação Extrajudicial de empresas, sendo aquela
tratada de maneira mais detida nos próximos capítulos do presente trabalho.

49
Art. 133. A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por qualquer título, fundo de
comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e continuar a respectiva exploração, sob a
mesma ou outra razão social ou sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou
estabelecimento adquirido, devidos até à data do ato:
[...]
§ 1º O disposto no caput deste artigo não se aplica na hipótese de alienação judicial:
I – em processo de falência;
II – de filial ou unidade produtiva isolada, em processo de recuperação judicial.
§ 2º Não se aplica o disposto no § 1º deste artigo quando o adquirente for:
I – sócio da sociedade falida ou em recuperação judicial, ou sociedade controlada pelo devedor falido ou em
recuperação judicial;
II – parente, em linha reta ou colateral até o 4º (quarto) grau, consanguíneo ou afim, do devedor falido ou em
recuperação judicial ou de qualquer de seus sócios; ou
III – identificado como agente do falido ou do devedor em recuperação judicial com o objetivo de fraudar a
sucessão tributária.
§ 3º Em processo da falência, o produto da alienação judicial de empresa, filial ou unidade produtiva isolada
permanecerá em conta de depósito à disposição do juízo de falência pelo prazo de 1 (um) ano, contado da data de
alienação, somente podendo ser utilizado para o pagamento de créditos extraconcursais ou de créditos que
preferem ao tributário.
(BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional). Fonte: Planalto. Disponível
em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172.htm>. Acesso em: 15.jan.2020).
54

2.3 PEDIDO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL DO GRUPO OI

Como já exposto e aqui resumimos, o pedido inicial e preliminar é a concessão de uma


tutela de urgência visando a suspensão de todas as ações e execuções contra as recuperandas,
que se justifica para evitar que constrições judiciais sejam realizadas no período compreendido
entre o ajuizamento desse pedido de recuperação judicial e o deferimento do seu
processamento. Pede ainda:

(i) a suspensão da eficácia das cláusulas que prevêem o ajuizamento


de recuperação judicial como causa de rescisão de contrato;
(ii) a dispensa da apresentação de certidões negativas em qualquer
circunstância relacionada as RECUPERANDAS, inclusive para que
exerçam suas atividades (incluindo certidão negativa de débitos
referentes as receitas administradas pela ANATEL e certidão negativa
de distribuição de pedidos de falência e recuperação judicial); e
(iii) que seja deferido o processamento da recuperação judicial das
sociedades OI, TNL, OI MÓVEL, COPART 4, COPART 5, PTIF e OI
COOP.

Usam como fundamento legal do pedido o Art. 52, da Lei nº 11.101/05, seguindo o seu
tramite regular que será aceito quando concedida a recuperação judicial. Como consequências
logicas e teleológicas dos pedidos e causas de pedir, pelo rito identificado, pedem ainda a
nomeação do Administrador judicial, a dispensa de apresentação de certidões negativas naquele
sentido de que as recuperandas exerçam suas atividades (incluindo certidão negativa de débitos
referentes as receitas administradas pela ANATEL e certidão negativa de distribuição de
pedidos de falência e recuperação judicial), além da suspensão de todas as ações e execuções
existentes contra as autoras do pedido e intimações de praxe.

2.3.1 ADMINISTRADOR JUDICIAL DO “CASO OI”

2.3.1.1 ESCLARECIMENTO PRÉVIO


55

O Administrador Judicial, em suas regulares funções, esclarece sobre a preliminar de


competência de juízo arguida pela ANATEL e entende, antes de tudo, que apesar de a
ANATEL dizer que seu crédito não é objeto de divergência, por ser inaplicável ao seu direito
as disposições da Lei nº 11.101/05, o certo é que o simples fato de o crédito ter sido arrolado
pelas Recuperandas (Grupo OI) já é suficiente para se exigir a observância do rito
estabelecido na Lei nº 11.101/05. E continua seu entendimento e decisão no sentido que que
a divergência de crédito permite, amplamente, a defesa da ANATEL, seja na questão preliminar
por ela levantada sobre a competência, seja sobre o mérito em si, sob a exclusão ou não do seu
crédito. O mecanismo instituído pela Lei 11.101/05, diz o Administrador Judicial, é suficiente
para a tutela dos direitos que a ANATEL entende possuir, tanto no âmbito administrativo, como
no jurisdicional, com o devido processo e ampla defesa assegurados, oportunidade em que,
frisa, a ANATEL discutirá seus direitos com a máxima amplitude.

2.3.1.2 DIVERGÊNCIA DE CRÉDITO

Por esse motivo o Administrador Judicial recebe o pedido feito pela Anatel como
divergência de crédito em sede de recuperação judicial. Antes, porém, de passar ao exame das
questões de fundo, referido administrador deixa claro sua posição sobre a possibilidade de
submeter créditos não-tributários à recuperação judicial. Começa essa posição explicando que,
na Recuperação Judicial do Grupo OI, existem diversos órgãos públicos titulares de créditos
relacionados e que não se insurgiram quanto a isso. Cita, por exemplo, diversos Municípios,
Estados e autarquias federais e estaduais, além, é claro, dos Estados Federativos membros.
Assim, deixa claro que existem credores públicos que não discordam da presença do seu nome
no rol de credores do Grupo OI, isto é, credores públicos que entendem que o crédito não-
tributário pode e deve ser submetido ao processo de recuperação. Fato é que o administrador
judicial desse caso já decide antecipadamente que esses credores públicos têm razão. Com isso,
já́ se adianta em sua posição de que sim, o crédito não-tributário pode e deve ser submetido ao
processo de recuperação.
A alegada impossibilidade de transigir ou de participar de assembleia-geral de credores,
afirma o Administrador Judicial, é uma questão interna da ANATEL e deixa à agência a
competência de resolver a questão. Uma vez submetido, bem entendido, por força de lei, o
crédito público ao processo de recuperação judicial, em que a transação é inerente, cumpre ao
respectivo órgão tomar as providências devidas para tal fim. É um assunto que extrapola a
esfera do processo de recuperação e que não é levado em consideração pelo administrador nesse
56

processo. Dessa forma, continua o parecer, cabe ao Estado preparar-se para essa nova realidade,
pois o processo de recuperação pressupõe a transigência em relação a todos os credores
submetidos, posição com a qual concordamos.
57

3 O CRÉDITO DA AGÊNCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES (ANATEL)

3.1 CRÉDITOS SUJEITOS À RECUPERAÇÃO JUDICIAL E SIGNIFICADO DE EXISTÊNCIA DO


CRÉDITO

A Lei nº 11.101/05, como já vimos, denominada Nova Lei de Falência, estabeleceu


como regra de identificação dos créditos sujeitos à recuperação judicial o critério temporal,
excepcionando pontualmente hipóteses relacionadas à natureza dos créditos, de modo que, a
princípio, a recuperação abarcará todos os créditos existentes (mesmo aqueles ainda não
vencidos) na data do ajuizamento da ação, conforme o inúmeras vezes mencionado Art. 49.
A este respeito, vale apontar que o legislador, ao prover a Lei nº 11.101/05, objetivou
comparativamente ao anterior instituto da concordata (que alcançava apenas créditos
quirografários), ampliar o "âmbito de abrangência dos efeitos do processo" recuperacional,
incrementando as chances de êxito, à luz da função prevista no Art. 47, da Nova Lei de
Falências, qual seja, viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do
devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e
dos interesses dos credores, promovendo, assim a preservação da empresa, sua função social e
o estímulo à atividade econômica.
O mesmo Art. 49 exclui, nos §§ 3º e 4º, os créditos decorrentes de contratos de alienação
fiduciária, arrendamento mercantil, compra e venda de imóvel com cláusula de irrevogabilidade
ou irretratabilidade, venda com reserva de domínio e de adiantamento a contrato de câmbio
para exportação. Também está excluído, por disposição do Art. 187 do Código Tributário
Nacional, o crédito tributário50.
Todos os créditos que não se sujeitam à recuperação judicial em razão de sua natureza
conservam as condições originalmente pactuadas e as respectivas ações de cobrança também
não se submetem ao “stay period” previsto no Art. 6º, da Lei nº 11.101/05. No entanto, para

50
Art. 187. A cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência,
recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento.
Parágrafo único. O concurso de preferência somente se verifica entre pessoas jurídicas de direito público, na
seguinte ordem:
I - União;
II - Estados, Distrito Federal e Territórios, conjuntamente e pró rata;
III - Municípios, conjuntamente e pró rata.
(BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional). Fonte: Planalto. Disponível
em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172.htm>. Acesso em: 15.jan.2020).
58

evitar que a não-sujeição dos créditos excetuados inviabilizasse a continuidade da empresa e a


superação da situação de crise econômico-financeira – que é o objetivo da recuperação judicial
– o próprio legislador vedou a retomada de bens essenciais à produção dados em garantia aos
credores previstos Art. 49, § 3º (instituições financeiras) pelo mesmo prazo fixado no Art. 6º, §
4º, ambos da Lei nº 11.101/05.
Assim, afora os problemas de fluxo de caixa que a recuperanda pode sofrer em razão da
"trava bancária" – que não compõe o objeto do presente estudo, apesar de sua importância –,
"verdadeira modalidade de autotutela do exercício do direito de crédito, que menoscaba o Poder
Judiciário e escapa à blindagem de que trata a parte final do parágrafo 3º do art. 49”51, os demais
créditos que não se sujeitam à recuperação não sofrem a novação prevista no Art. 59, da Lei nº
11.101/05, podendo tornar-se exigíveis no momento e nas condições acordadas previamente
entre as partes, o que, a depender do volume, pode impactar sobremaneira o soerguimento das
atividades da pessoa jurídica em recuperação.
Além disso, a incerteza em que se encontram os créditos objeto do presente estudo
atrapalha o andamento da recuperação e dificulta a negociação com os credores a ela sujeitos,
que não têm exata noção do montante disponível para os seus pagamentos. Assim, o ideal seria
que se aumentasse a clareza sobre os créditos considerados "existentes" no momento do
ajuizamento da ação que contenha o pedido de recuperação judicial a fim de, com isso, estimar-
se com maior exatidão o fluxo de caixa disponível para o desempenho das atividades pela
recuperanda e para a negociação com os credores sujeitos ao plano. Questionamos aqui, neste
sentido, se por existentes devem ser considerados apenas os créditos já quantificáveis (líquidos,
consolidados) ou também aqueles que, embora ilíquidos, já possam ser identificados como
devidos no momento do ajuizamento da ação, pois já conhecida a existência de relação
obrigacional a este tempo.
Em obra dedicada ao trabalho de construção da jurisprudência a respeito do instituto da
Recuperação Judicial, Luiz Roberto Ayoub e Cássio Cavalli informam que o crédito
considerado existente ao tempo do pedido independe do acréscimo da eficácia da pretensão ou
da ação. Informam também que o crédito existente "pode ser contratual, extracontratual ou

51
ARRUDA, Pablo Gonçalves e. A Trava Bancária na Recuperação Judicial. In: Migalhas (04.dez.2015).
Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/268578/a-sujeicao-ou-nao-de-creditos-iliquidos-a-
recuperacao-judicial-e-os-poderes-politicos-dos-credores>. Acesso em: 17.jul.2017.
59

cambiário, contanto que tenha nascido por fato anterior ao pedido de recuperação, pouco
importando que eventual sentença condenatória seja posterior ao pedido”52.

3.2 OS CRÉDITOS QUE NÃO SOFREM OS EFEITOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL

Na sistemática atual da recuperação judicial os credores da empresa insolvente


participam ativamente do processo, em especial porque são estes mesmos que aprovam ou
rejeitam o plano. Nessa ótica, o Art. 49, da Lei Falimentar é preciso quanto à abrangência dos
efeitos da recuperação judicial ao determinar os sujeitos que participarão da recuperação
judicial na data do pedido.
É notório que a recuperação judicial abrange diversos créditos. Tal amplitude justifica-
se pela importância, para o devedor, de seu plano de recuperação atingir a maior parte possível
do seu passivo. Os credores submetidos à recuperação deverão negociar com o devedor de
forma que o plano eventualmente aprovado contemple minimamente os anseios de todos e,
assim, tenha êxito em sua finalidade. Justifica-se, também, pelo objetivo precípuo da
recuperação judicial, qual seja a solução da crise econômico-financeira da empresa devedora,
tendo em vista que quanto mais créditos forem alcançados pela recuperação, mais créditos serão
novados e negociados de modo a atender à solução da crise.
Se por um lado é interessante para o devedor a maior abrangência possível da
recuperação judicial em relação ao seu passivo, para o credor a sujeição de seus créditos ao
plano se mostraria, em um primeiro momento, a melhor solução. Isso porque a empresa que
perde a solvência perde também a capacidade de cumprir suas obrigações da forma que foram
originalmente assumidas. Assim, sujeitando-se aos efeitos da recuperação judicial, a
possibilidade de satisfação integral dos interesses dos credores desaparece, passando-se a visar
à minimização das perdas. A plena satisfação de seus interesses somente ocorreria se a empresa
não estivesse em um processo desse tipo, ou seja, estivesse pagando seus credores e
trabalhadores de forma pontual a integralmente. Porém, como isso não está ocorrendo
(pagamentos das obrigações de forma pontual e integral), o que significaria maximizar os
interesses, o objetivo passa a ser outro: minimizar as perdas.

52
AYOUB, Luiz Roberto; CAVALLI, Cássio. A Construção Jurisprudencial da Recuperação Judicial de
Empresas. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2017, p.37.
60

3.3 CRÉDITOS QUE NÃO SE SUBMETEM AO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL

Todavia, não obstante a abrangência do atual modelo de recuperação judicial de


empresas, há determinados créditos que não se submetem a este instituto. O que se objetiva
com essa exclusão é estimular determinados agentes, cuja importância para a manutenção da
atividade econômica é patente, a contratar com os agentes mercantis, por meio da garantia de
que seu crédito não será afetado por eventual crise financeira que as torne insolvente. O
processo de recuperação judicial, não obstante seu elevado propósito apontado no Art. 47, da
Lei Falimentar, não alcança todas as dívidas da empresa, o que representa, no sentir de muitos,
sério entrave à efetiva reestruturação das dívidas e o soerguimento financeira da empresa.
Com efeito, a lei exclui certos créditos do processo de recuperação judicial. Em linhas
gerais, são os créditos titularizados por instituições financeiras (Art. 49, §§ 3º e 4º, da Lei nº
11.101/05, sobre os quais não discorreremos) e pelo Poder Público. Assim como nem todos os
créditos de instituições financeiras estão excluídos do processo de recuperação judicial, nem
todos os créditos titularizados pelo Poder Público estão afastados desse processo.
Inicialmente, por interpretação a contrário sensu do Art. 49, caput, da Lei nº 11.101/05,
concluímos que os credores cujos créditos se constituíram posteriormente à distribuição do
pedido de recuperação estarão excluídos dos efeitos do benefício. A regra disposta desta forma
tem a finalidade de garantir o acesso do devedor ao crédito e viabilizar o objetivo maior que é
a recuperação da empresa. Nesse sentido, podemos acrescentar que a exclusão legal prevista no
dispositivo supracitado faz sentido, pois, do contrário, ninguém concederia crédito, ou mais
crédito, a um devedor em situação de crise econômico-financeira para depois receber seus
haveres no regime de recuperação judicial.
Além dos créditos tributários, consoante disposto no Art. 6º, § 7º, cc. Art. 57, ambos da
Lei nº 11.101/05, também não se sujeitam aos efeitos da recuperação a importância entregue ao
devedor, em moeda corrente nacional, decorrente de adiantamento a contrato de câmbio para
exportação (Art. 49, § 4º, cc. Art. 86, II, ambos da Lei nº 11.101/05) e os créditos do proprietário
fiduciário de bens móveis e imóveis, do arrendador mercantil, do proprietário ou promitente
vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou
irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias e os créditos de proprietários em
contrato de venda com reserva de domínio (Art. 49, § 3º, da Lei nº 11.101/05). Existe, porém,
atualmente, acalorada discussão jurisprudencial acerca da sujeição ou não ao plano de
61

recuperação judicial dos créditos decorrentes da cessão fiduciária de direitos creditórios futuros
oferecidos em garantia na obtenção de empréstimos bancários. O cerne da questão está na
operação de mútuo bancário garantida pela comumente chamada “trava bancária”, utilizada
maciçamente pelas instituições financeiras, assunto de grandes debates, por hora deixados de
lado pois fora de nosso escopo.

3.4 CRÉDITOS E CLASSE DE CREDORES

A legislação falimentar, para fins de composição e deliberação em assembleia geral,


dividiu os credores em 4 classes distintas, sendo elas: (i) composta pelos detentores de créditos
trabalhistas, incluídos aqui tanto os titulares de créditos derivados da legislação trabalhista
quanto aqueles titulares de créditos que derivam de acidente de trabalho; (ii) composta por
titulares dos créditos com garantia real, ou seja, aqueles em que a satisfação do direito do credor
encontra-se garantida por todo o parte do patrimônio do devedor; (iii) composta por todos os
outros credores que não se encaixam nas duas anteriores, que são os titulares de créditos
quirografários, com privilégio especial, com privilégio geral ou subordinados e (iv) composta
por créditos de credores optantes pela sistemática de tributação do Simples Nacional, ou seja,
Microempresas e Empresas de Pequeno Porte. Tal classe de credores foi incluída na Lei de
Insolvência pela Lei Complementar n. 147, de 7 de agosto de 2014.
É possível, entretanto, que um mesmo credor, pelo mesmo crédito, pertença a duas
classes distintas na recuperação judicial, isto porque, por exemplo, diferente dos titulares de
créditos trabalhistas e de acidente de trabalho, que votam em conjunto como integrantes da
Classe I, os titulares de créditos com garantia real votam como integrantes da Classe II até o
limite do bem dado em garantia e, pelo restante do crédito que exceda àquele valor, com os
credores integrantes da Classe III, conforme determinação legal Art. 41, § 2º, da Lei nº
11.101/0553.
É necessário elucidar que o objetivo da divisão dos credores em classes com vistas à
deliberação e votação em assembleia-geral é formar vontades convergentes sem distorções
entres os interesses particulares de cada credor. A ausência da referida divisão levaria à

53
Cf. COELHO, Fábio Ulhôa. Ob. Cit. São Paulo: Editora Saraiva, 2008.
62

prevalência dos interesses daqueles credores de maior volume creditório em detrimento dos
demais, o que é evitado pelo atual sistema, considerando que o plano deve ser aprovado em
todas as classes – ressalvada a hipótese de “cram down”54.
O que queremos dizer é que os interesses de um credor com garantia real, por exemplo,
nem sempre são conciliáveis com os de um credor quirografário, principalmente se for
considerado que no caso de falência este provavelmente não receberá seu crédito e, por isso,
tende a se comportar de maneira mais maleável durante as deliberações assembleares. Dessa
forma, caso os credores não fossem divididos em classes e um credor com garantia real
detivesse crédito expressivo na recuperação, a aprovação do plano seria mais difícil,
prejudicando o interesse de outros credores, para os quais a falência não seria interessante.
Considerando a coerente finalidade desta distribuição de credores, parta da doutrina,
encabeçada por Fábio Ulhôa Coelho55, desfere duras críticas à inclusão dos credores
quirografários e dos titulares de privilégios numa mesma classe. Segundo o autor, este credores
deveriam pertencer à mesma classe dos credores com garantia real, tendo em vista que possuem
preferência na falência que por ventura se siga e, por isso, tendem a ser menos receptivos à
alterações, novações ou renegociações de seus créditos no âmbito da recuperação judicial.
Vale ressaltar, por zelo, que a divisão da assembleia-geral de credores em classes é
medida que serve apenas ao momento do cômputo de votos. Isso posto, entendemos que durante
a deliberação sobre os temas que compõem a pauta da assembleia, qualquer credor e a qualquer
tempo possui direito a voz, ainda que a matéria discutida não deva ser votada pela classe de
credores à qual pertence e foi categorizado. Existem, ainda, aqueles créditos que, por
determinação legal, não se submetem aos efeitos da recuperação judicial, não se inserem no
concurso de credores para o recebimento do que lhes é devido. Esse crédito a doutrina
denominou “extraconcursal”.

3.5 DIVERGÊNCIA DE CRÉDITO PELA ANATEL

54
Nota do Autor: Previsto pelo §1º, do artigo 58, da Lei nº 11.101/05, o instituto do “Cram Down” consiste em
uma faculdade dada ao juiz em aprovar o plano de recuperação judicial rejeitado por alguma classe de credores,
observados determinado requisitos formais que condicionam a atuação do magistrado
55
Cf. COELHO, Fábio Ulhôa. Ob. Cit. São Paulo: Editora Saraiva, 2008.
63

Em data de 11 de outubro de 2016, a Agência Nacional de Telecomunicações


(ANATEL) apresentou ao Administrador Judicial a Divergência de Crédito apontada, com o
fim de questionar a inclusão de seu crédito no montante de R$ 11.092.265.985,57 (onze bilhões
noventa e dois milhões duzentos e sessenta e cinco mil novecentos e oitenta e cinco reais e
cinquenta e sete centavos), na Lista de Credores como quirografária.

3.5.1 PRELIMINAR DA ANATEL

Alegou em preliminar que o juízo estadual é incompetente para decidir sobre a inclusão
e classificação do crédito da ANATEL, por ser ela um ente público federal. Em sede de
preliminar, a ANATEL levantou a questão da incompetência do Juízo da recuperação judicial,
a autarquia entende que é titular de crédito público federal. Afirma que: “há risco de que haja
pronunciamento judicial, no âmbito estadual, cujo teor pode rebaixar o crédito público federal,
devidamente inscrito em divida ativa e em processo de execução fiscal, a crédito
quirografário” e deduz, com respeito a entendimentos contrários, que nem a Justiça Estadual
nem a Justiça Federal podem rebaixar o crédito da ANATEL. A tanto não se equipara a
submissão a determinado regime jurídico, previsto em lei, que é o de que se cuida. O correto
enquadramento jurídico da questão pode e deve ser feito pela Justiça competente, que é a Justiça
Estadual.
A base legal da ANATEL, invocada em sua peça processual de contestação do crédito
em sede preliminar de competência, traz em seu bojo de sustentação o Art. 109, I, da
Constituição Federal56 e precedente do Sodalício Superior Tribunal de Justiça, que sustenta seja
aplicável à espécie. Não questiona a competência da Justiça Estadual na hipótese de falência;
rejeita-a para a recuperação judicial, “nos termos dos princípios da legalidade e da
indisponibilidade e do Art. 29, da Lei nº 6.830/1980 e Art. 6º, § 7º, da Lei nº 11.101/05”. A
competência, no entender da autarquia, é da Justiça Federal para julgar questões a respeito dos
seus créditos, a saber:

56
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de
autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça
Eleitoral e à Justiça do Trabalho;
(BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Fonte: Planalto.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em:
20.nov.2018).
64

(i) o crédito público federal não está submetido à recuperação


judicial, nos termos dos princípios da legalidade e da indisponibilidade
e dos artigos. 29 da Lei n. 6830/1980 e art. 6o, da Lei n. 11.101/2005;
(ii) a sistemática prevista na Recuperação Judicial, quanto à
habilitação, impugnação ou divergências de créditos, não vale para os
credores públicos, pois não são passiveis de negociação em
Assembleia-Geral de Credores;
(iii) os créditos da ANATEL, oriundos de multas administrativas,
sujeitos à inscrição na dívida ativa, são créditos privilegiados, que têm
a mesma posição dos créditos tributários, que não podem ser incluídos
na Recuperação Judicial (são extraconcursais);
(iv) os créditos tributários e os não tributários, embora tenham
diferenças, são espécies de crédito publico cuja cobrança é realizada
de maneira uniforme nos termos da legislação em vigor. A seu ver,
quando o crédito é incluído na dívida ativa, não há mais distinção entre
as espécies de crédito público, e sua cobrança é regida pelos mesmos
princípios e regras, privilégios e garantias (Arts. 1º e 2º, da Lei nº
6.830/1980 e Arts. 6º e 68, da lei nº 11.101/2005). (grifos nossos).

3.5.2 PEDIDO DA ANATEL

Em caráter subsidiário, a ANATEL questiona o administrador a proposta que lhe foi a


ele dirigida pelo Grupo OI no Plano de Recuperação Judicial e questiona, entre outros, os
créditos de Classe III, as assim qualificadas multas Administrativas.
A ANATEL se coloca, face à proposta de mediação constante do Plano de Recuperação,
como não-obrigada a se submeter ao procedimento (Art. 2º, § 2º, da Lei nº 13.140/2015 e Art.
166, do Código de Processo Civil), e completa asseverando que as Recuperandas não podem
criar para os créditos públicos um rito próprio, segundo ela, não previsto em lei, a ser negociado
à parte. Entende que o caso não aceita a mediação e ainda dispõe que não pode se submeter à
modalidade de pagamento geral, pois suas previsões desrespeitariam a legislação que trata de
parcelamento de créditos públicos, dentre outras questões.
65

Segue o procedimento e ritos próprios e, ao final, solicita informações das Recuperandas


acerca do detalhamento do crédito incluído no rol de credores, pedindo especificações de suas
natureza e origem e apresentam como devidos os seguintes valores:

(i) o valor de R$ 10.018.979.592,64 (dez bilhões dezoito milhões


novecentos e dezenove mil quinhentos e noventa e dois reais e sessenta
e quatro centavos), a título de multa;
(ii) o valor de R$ 4.552.086.929,88 (quatro bilhões quinhentos e
cinquenta e dois milhões oitenta e seis mil novecentos e vinte e nove
reais e oitenta e oito centavos), a título de crédito tributário;
(iii) o valor de R$ 1.081.963.197,73 (hum bilhão oitenta e um milhões
novecentos e sessenta e três mil cento e noventa e sete reais e setenta e
três centavos), a título de crédito de outras naturezas,
(iv) o valor de R$ 1.223.851.884,07 (hum bilhão duzentos e vinte e
três milhões oitocentos e cinquenta e um mil oitocentos e oitenta e
quatro reais e sete centavos), a título de encargo legal e
(v) o valor de R$ 4.583.085.046,45 (quatro bilhões quinhentos e
oitenta e três milhões oitenta e cinco mil e quarenta e seis reais e
quarenta e cinco centavos), a título de multas estimadas, o que
evidenciaria uma divergência de valores.

Segundo a petição da ANATEL, o valor total do seu crédito é de R$ 15.653.029.720,25


(quinze bilhões seiscentos e cinquenta e três milhões vinte e nove mil setecentos e vinte reais e
vinte e cinco centavos). Eis, em síntese, as questões trazidas pela ANATEL e enfrentadas pelo
Administrador Judicial.
66

4 ANÁLISE CRÍTICA

4.1 QUESTÕES ENFRENTADAS NO CASO “GRUPO OI”

4.1.1 SÍNTESE DA MANIFESTAÇÃO DO ADMINISTRADOR JUDICIAL DO GRUPO OI

A manifestação de lavra do Administrador Judicial considerou que o crédito da Anatel


no importe de R$ 11.093.373.667,13 (onze bilhões noventa e três milhões trezentos e setenta e
três mil seiscentos e sessenta e sete reais e treze centavos), deve ser listado na Classe III
(Credores Quirografários) e sujeito aos efeitos da recuperação judicial. Neste valor incluem-se:
(i) Multas por inadimplemento de crédito tributário; (ii) Multas administrativas; e (iii) Encargos
legais. Assim, não se sujeitam à recuperação judicial e não estão listados os créditos
tributários da ANATEL, que são os decorrentes de:

a. - Contribuição para o Fomento de Radiodifusão Pública (CRFP);


b. - Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações
(FUST);
c. - Taxa de Fiscalização de Funcionamento (TFF); e
d. - Taxa de Fiscalização e Instalação (TFI).

Importante destacar que existiram, dentre as multas aplicadas, grande parte decorrem de
fiscalizações e descumprimento de obrigações para com a ANATEL. Além disso existem
valores decorrentes aos processos que se transformaram em Termos de Ajuste de Conduta –
TAC’s e, posteriormente, inseridos na lista de credores da referido processo de recuperação
judicial. Outrossim, durante o processo e as negociações para a aprovação do Plano de
Recuperação, a ANATEL declinou que os valores das multas inseridos na lista de credores,
fossem objeto de novo TAC, cujo objeto seria a conversão da dívida pública em investimentos
no setor de telecomunicações.

4.1.2 DIVERGÊNCIA DE CRÉDITO


67

Conforme amplamente pesquisado, o maior crédito da lista de credores é da ANATEL.


Importante destacar que os créditos da ANATEL são constituídos em parte por tributos (taxas
de fiscalização), além de multas, juros e encargos.
Os valores relacionados às multas, juros e encargos não tem natureza tributária, pois não
se enquadram nos Arts. 3º e 4º, ambos do Código Tributário Nacional, muito menos no Art.
149, da Constituição Federal57 e na jurisprudência que reconhece a existência das cinco espécies
do gênero tributo, a saber, Impostos, Taxas, Contribuições de Melhoria, Contribuições Sociais
e Empréstimos Compulsórios. Portanto, apesar de se tratar de tributos, os valores referentes a
multa, juros, encargos e outros, têm sim a natureza de créditos públicos.
Assim, uma vez que os referidos créditos públicos não têm natureza tributária, devem
ser incluídos na lista de credores de uma recuperação judicial na classe dos créditos
quirografários. Os mesmos argumentos utilizados para inclusão dos créditos públicos
decorrentes de penalidades e demais encargos, desde que não sejam tributos, conforme
depreende-se do Art. 83, da Lei nº 11.101/0558, deve ser aplicada aos casos em Recuperação

57
Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico
e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas,
observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às
contribuições a que alude o dispositivo.
(BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Fonte: Planalto.
Disponível: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em:
20.nov.2018).
58
Art. 83. A classificação dos créditos na falência obedece à seguinte ordem:
I – os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos por credor,
e os decorrentes de acidentes de trabalho;
II - créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado;
III – créditos tributários, independentemente da sua natureza e tempo de constituição, excetuadas as multas
tributárias;
IV – créditos com privilégio especial, a saber:
a) os previstos no art. 964 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002;
b) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta Lei;
c) aqueles a cujos titulares a lei confira o direito de retenção sobre a coisa dada em garantia;
d) aqueles em favor dos microempreendedores individuais e das microempresas e empresas de pequeno porte de
que trata a Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006;
V – créditos com privilégio geral, a saber:
a) os previstos no art. 965 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002;
b) os previstos no parágrafo único do art. 67 desta Lei;
c) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta Lei;
VI – créditos quirografários, a saber:
a) aqueles não previstos nos demais incisos deste artigo;
b) os saldos dos créditos não cobertos pelo produto da alienação dos bens vinculados ao seu pagamento;
c) os saldos dos créditos derivados da legislação do trabalho que excederem o limite estabelecido no inciso I do
caput deste artigo;
68

Judicial. Os credores que nunca participaram da gestão da empresa em recuperação judicial não
podem ser impactados em seu recebimento por créditos decorrente de multas, juros, encargos e
demais, eis que tais créditos públicos não têm natureza tributária.
Entendemos que os referidos créditos públicos são sujeitos aos efeitos da recuperação
judicial, devendo ser incluídos na lista de credores, na Classe III, dos credores quirografários.
Nesse caso, os pagamentos dos credores trabalhistas nunca seriam impactados por cobrança de
dívidas decorrentes de penalidade operada pelos administradores das empresas em recuperação
judicial.

4.1.3 FORO COMPETENTE

Os limites e competências da atuação do juiz no processo de recuperação judicial devem


ser analisados em prol da argumentação acadêmica objeto desse trabalho.
Por isso, pretendemos identificar e expor os aspectos importantes relativos a atuação do
Estado-Juiz no processo de recuperação judicial, sob uma perspectiva que parte do ponto de
vista de quem já trabalhou e trabalha com afinco com processos dessa natureza. Independente
da natureza da recuperação judicial, conhecimento, constitutiva ou declaratória, contratual ou
não ou mesmo de jurisdição voluntária, sua concessão depende da intervenção do Poder
Judiciário. Tal intervenção, que não pode ocorrer de ofício, dependerá de provocação dos
interessados por meio de uma ação. O exercício dessa ação pública é condição imprescindível
para se obter a solução da crise empresarial. Ela representará, em última análise, o pedido de
recuperação judicial.

VII – as multas contratuais e as penas pecuniárias por infração das leis penais ou administrativas, inclusive as
multas tributárias;
VIII – créditos subordinados, a saber:
a) os assim previstos em lei ou em contrato;
b) os créditos dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatício.
§ 1º Para os fins do inciso II do caput deste artigo, será considerado como valor do bem objeto de garantia real a
importância efetivamente arrecadada com sua venda, ou, no caso de alienação em bloco, o valor de avaliação do
bem individualmente considerado.
§ 2º Não são oponíveis à massa os valores decorrentes de direito de sócio ao recebimento de sua parcela do capital
social na liquidação da sociedade.
§ 3º As cláusulas penais dos contratos unilaterais não serão atendidas se as obrigações neles estipuladas se
vencerem em virtude da falência.
§ 4º Os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão considerados quirografários.
(BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005 (Lei de Falências). Fonte: Planalto. Disponível em:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 10.fev.2020).
69

Essa ação de recuperação judicial, como a aqui analisada, é adjudicada em sua


competência por matéria e território, perante o juízo especializado do principal estabelecimento
do devedor em crise e seguirá um rito especial constante da Lei nº 11.101/2005, sendo a
propositura da ação e o despacho do juiz que defere o processamento da recuperação judicial
chamado de fase postulatória. Já colocamos que a atuação do Judiciário, enquanto representante
do Estado, torna-se imprescindível diante do processo de recuperação judicial no que tange às
implicações que o empresário poderá sofrer sob as constantes mudanças do mercado em que
ele opera. O Estado-Juiz assume o processo com o dever de zelar e aplicar as condições de
renegociação das dívidas, fiscalizar, juntamente com a administração do administrador judicial,
um terceiro auxiliar, as atividades do devedor e o cumprimento do plano de recuperação,
atuando sob a perspectiva de rentabilidade e fazendo com que haja uma sadia recuperação da
empresa com o intuito de resolver a situação economicamente problemática da forma mais justa
e equânime. Existe aqui claramente uma responsabilidade direta do magistrado na atuação dos
processos de recuperação de empresas, concorrente àquela do administrador judicial da
recuperação judicial e somados aos imprescindíveis princípios fomentadores dessas
procedimento já expostos no início desse trabalho.
A lei exige homologação do juiz de direito e a atuação do Estado como regulador e
provedor de sanidade dos atos públicos, regularidade, temporalidade, necessidade assim como
fiscalização do contraditório e da ampla defesa no sentido de equanimidade de oportunidades
de todas as partes envolvidas. Eis porque a assembleia-geral de credores não pode deliberar de
forma absoluta e soberana quando algum ato abusivo ou ilegal se configurar. Não pode um
plano, mesmo que aprovado por maioria pela assembleia, produzir efeitos de modo a contrariar
a lei, a coisa julgada, o direito adquirido, os princípios gerais do direito e a jurisprudência, sob
o frágil argumento de que a assembleia-geral de credores seria absolutamente soberana.
Uma das competências do Estado-Juiz competente para presidir o processo é o
deferimento do processamento da recuperação judicial, conforme Art. 52, caput e seus incisos,
da Lei 11.101/05, momento no qual o juiz deve se restringir ao cumprimento e observância das
exigências legais impostas na legislação pertinente, devendo não interferir em possíveis
decisões, palpites ou sugestões no que diz respeito, por exemplo, aos aspectos da viabilidade
econômica da empresa, sob risco, inclusive, do comprometimento da sua imparcialidade. A
proporcionalidade de nosso ordenamento jurídico, princípio que tem como corolário o instituto
dos freios e contrapesos, a limitação de atuação judicial se faz pela fiscalização interna, em que
cada ente possuidor de prerrogativas de poder, seja o Legislativo ou Executivo, irá fiscalizar o
outro para que se evite a afronta das autonomias em que cada um dispõe. Nossa jurisprudência
70

entende que o Poder Judiciário pode interferir nas decisões das assembleias para que promova
um controle quanto à licitude das providências59.
Entendemos então que o exercício pelo magistrado do controle de legalidade é de
significativa importância, pois, embora não haja possibilidade de manifestar-se acerca da
viabilidade econômica do devedor – constituindo uma limitação –, o responsável pela condução
do processo possui legitimidade para intervir e evitar possíveis fraudes e abusos de direitos no
plano de recuperação judicial – sendo esta uma competência.

4.1.4 FORO COMPETENTE E REQUISITOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL

Entende-se como foro competente, pelo requisito territorial, o do principal


estabelecimento do devedor, onde o juiz irá analisar toda documentação entregue pelo autor
(polo ativo) e, obedecendo e atendendo todos os requisitos contidos no Art. 51, da Lei nº
11.101/05, deferirá o processamento da recuperação judicial. Em conformidade ao Art. 3º, da
Lei nº 11.101/05, é competente para homologar o plano de recuperação extrajudicial, deferir a
recuperação judicial ou decretar a falência o juízo do local do principal estabelecimento do
devedor ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil, isso é claro e sem divergências.
A questão que surge aqui é que a partir do momento em que a execução da atividade
empresarial é exercida em diversas localidades, há dúvidas acerca de onde seria o tal principal
estabelecimento. Diante dessa situação, como a lei não especifica de forma clara, levanta-se
uma série de opiniões. Enquanto vigorava a Lei anterior, podíamos entender o principal
estabelecimento como a sede contratual, na medida em que em tal lugar se encontraria o
empresário para a citação. Todavia, durante a vigência do regime atual, podemos entender que
o principal estabelecimento é aquele constante do respectivo registro da empresa. A doutrina
majoritária entende como foro do principal estabelecimento do devedor não aquele que

59
O Sodalício Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de Recurso Especial interposto por empresas que
incluíram cláusula no plano de recuperação judicial favorecendo parte dos sócios e prejudicando outros, durante a
realização de uma Assembleia Geral de Credores, assim definiu em conformidade ao voto da Senhora Ministra
Nancy Andrighi, de acordo com seu ementário:
RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. APROVAÇÃO DE PLANO PELA ASSEMBLEIA DE
CREDORES. INGERÊNCIA JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. CONTROLE DE LEGALIDADE DAS
DISPOSIÇÕES DO PLANO. POSSIBILIDADE. RECURSO IMPROVIDO.
1. A assembleia de credores é soberana em suas decisões quanto aos planos de recuperação judicial. Contudo, as
deliberações desse plano estão sujeitas aos requisitos de validade dos atos jurídicos em geral, requisitos esses que
estão sujeitos a controle judicial.2. Recurso especial conhecido e não provido. [...]
(SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp. 1.314.209/SP (2012/0053130-7). Terceira Turma do Superior
Tribunal de Justiça. Rel. Min. Nancy Andrighi. Julgado em: 22/05/2012).
71

corresponde exatamente à sede administrativa da empresa, mas onde se tem a maior


concentração de negócios dela, ou seja, o de maior importância econômica. Exemplo disso
podemos citar como o caso da Viação Aérea Riograndense (VARIG), tendo em vista ser esta
uma sociedade empresária com sede em Porto Alegre/RS, mas que teve seu pedido de
recuperação judicial judicializado e processado no Foro da Comarca do Estado do Rio de
Janeiro. O legislador acentuou que o foro competente seria o do principal estabelecimento do
devedor, mas realizando uma interpretação ampla e até admissível, é perfeitamente aceito a
posição de que o foro competente pode ser a localidade que se concentra o maior volume de
atividades da respectiva empresa.
Com relação aos requisitos para a aceitação do pedido e, consequentemente,
deferimento do processo recuperacional, estando a petição inicial que contém o pedido de
recuperação em termos com o Art. 52, da Lei nº 11.101/05, temos que se toda a documentação
exigida no Art. 51, desta mesma Lei, o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial.
Todavia em caso de desacordo com as determinações constantes deste dispositivo legal, o Juiz
não deve indeferi-la de imediato. Enquanto que na redação da lei anterior haveria a decretação
da falência do devedor, hoje a Nova lei abre a possibilidade ao magistrado, agindo de maneira
prudente, determinar a emenda da inicial, possibilitando uma nova oportunidade ao autor para
que este atenda a todos os requisitos exigidos e tenha o seu pedido de recuperação judicial
deferido. Esse requisito tem por finalidade verificar se os sócios não estão enriquecendo
ilicitamente em detrimento da empresa, tendo em vista a necessidade de o devedor apresentar
previamente o seu patrimônio para eventual penhora do credor em ação futura.
Portanto e se for o caso, após o atendimento de algumas exigências legais, estando o
pedido em concordância com os Arts. 48 e 51, ambos da Lei nº 11.101/05, bem como atender
ao que se é exigido no momento da apresentação do plano de recuperação judicial, conforme o
Art. 53, da mesma lei, o juiz ordenará a publicação de edital contendo aviso aos credores sobre
o recebimento do plano de recuperação e fixando o prazo para a manifestação de eventuais
objeções que podem ser o consentimento dos credores quanto ao plano apresentado; a
aprovação do plano em assembleia geral, ou quase aprovação do plano seguido do deferimento
pelo juiz, a Recuperação Judicial será concedida.

4.1.5 COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL - CRÉDITOS DA ANATEL


72

A ANATEL, por sua vez, invocou o disposto no Art. 109, I, da Constituição Federal,
para tentar estabelecer a competência do juízo federal para processamento e julgamento do seu
pedido quanto ao crédito em face do Grupo OI.
E, como não há expressa menção à recuperação judicial como exceção à regra
constitucional de competência, o Grupo OI argumentou que a Justiça Federal conservaria
competência para julgar disputas relacionadas a seu crédito. Invocou também o disposto no Art.
29, da Lei 6.830/80 e o Art. 6º, § 7º, da Lei 11.101/05. Em que pese a argumentação da
ANATEL, o Administrador Judicial entendeu que é do juiz da recuperação judicial, isto é, o
juiz estadual, a competência para disputas relacionadas a multas administrativas e, por
consequência, do crédito da ANATEL.
Para reconhecer a competência do juízo estadual, o Administrador Judicial invocou o
precedente o acórdão emanado do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, nos autos do
Agravo de Instrumento nº 670.247.4/3-00, proferido pelo Rel. Des. Manoel Queiroz Pereira
Calças, da Câmara Reservada à Falência e Recuperação, em 26/01/2010, e que teve votação
unânime no seguinte sentido:
Cumpre ressaltar inicialmente que a competência do Juízo (Estadual) da
Recuperação Judicial para apreciar os atos emanados de autoridades federais
que atinjam empresas em recuperação decorre do art. 109, inciso I, da
Constituição Federal”. É que, consoante anotou o Des. Pereira Calças,
"Apesar de a Carta Federal excepcionar a competência da justiça federal nas
ações em que a União ou autarquia federal sejam partes ou interessadas
quando se tratar de falência, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e
do Superior Tribunal de Justiça tem entendido que, em se tratando de
recuperação judicial, instituto criado pela Lei n" 11.101/2005, que revogou a
antiga Lei de Falências (Decreto-lei n° 7.661/45), que também tem natureza
de concurso de credores, deve-se centralizar no Juízo da Recuperação Judicial
a competência para as decisões que interfiram no cumprimento e na execução
do plano de recuperação.” Ademais, "União Federal e Anac devem cumprir o
princípio constitucional da preservação da empresa que decorre da função
social da empresa (art. 170, III, CF).

Também e no mesmo sentido, a competência do juízo da recuperação judicial para


disputas havidas entre a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) e a recuperação judicial
da Pantanal Linhas Aéreas também não foi questionada no Sodalício Superior Tribunal de
Justiça, por meio do AgRg na SLS 1.161, Corte Especial, julgado em 03/03/2010 e tendo o Rel.
Ministro Cesar Asfor Rocha.
Nosso Superior Tribunal de Justiça recentemente igualmente decidiu que créditos da
Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), devem ser pagos conforme plano de
recuperação judicial, conforme entendimento esposado no AgRg nos EDcl no CC 136.508,
73

julgado em 12/08/2015, com o Ministro João Otávio de Noronha como Relator, em votação
unânime que assim decidiu:
Os valores quantificados em procedimento administrativo perante órgão
regulador da atividade econômica da empresa, geralmente derivados de
obrigações anteriores à data do pedido de recuperação judicial, quando objeto
de liquidação, devem ser recebidos dentro do procedimento recuperatório em
igualdade com todos aqueles oriundos de credores da mesma espécie.

O mesmo Superior Tribunal de Justiça igualmente entendeu pela competência do juiz


da recuperação judicial em ação de reintegração de posse movida pela Empresa Brasileira de
Infraestrutura Aeroportuária (INFRAERO) na CC 123.092, julgado em 28/11/2012, tendo
como relator o Ministro Herman Benjamin, julgando que:
Trata-se na origem de Ação de Reintegração de Posse movida pela Infraero
contra a ora requerente em razão de atraso e falta de pagamento referente a área
localizada no Aeroporto de Congonhas/SP objeto de concessão de uso. A ação
foi proposta perante Vara Federal da Seção Judiciária de São Paulo. A liminar
foi deferida; e o mandado de citação, expedido. 2. Há notícia de que, nesse
ínterim, tenha-se deferido pedido de recuperação judicial. Tal fato foi
comunicado nos autos da ação possessória e acompanhado de pedido de
suspensão da Ação e recolhimento do mandado. O pedido, contudo, foi
indeferido com base no entendimento de que a ação deve ser suspensa, mas não
o cumprimento da liminar, porquanto o esbulho ocorreu antes do deferimento
do pedido de recuperação judicial. 3. A vara especializada é competente para
decidir acerca das medidas que venham a atingir o patrimônio ou negócios
jurídicos de empresa em recuperação judicial. Precedentes do STJ que
envolvem a Infraero. 4. Não há razão para cindir suspensão do processo e dos
efeitos da liminar. À luz do princípio da preservação da empresa, convém
permitir que o juízo especializado examine os efeitos decorrentes da demanda
reintegratória para a manutenção da célula empresarial, inclusive aqueles
derivados da liminar. Nesse momento, poder-se-á cotejar o momento do
esbulho e eventual ilegitimidade do prolongamento do contrato. Tal exame deve
levar em conta a prevalência do interesse público sobre o privado, bem como a
ratio da recuperação judicial, que não é, nem se propõe a ser, instrumento de
manutenção de ocupação ou uso ilícitos de bens do Estado. 5. Conflito de
Competência conhecido para confirmar a liminar e declarar competente o Juízo
da 1ª Vara de Falências e Recuperações judiciais da Comarca de São Paulo-SP.

Por fim, no caso do Grupo OI, o Administrador Judicial competente remeteu ao disposto
no Art. 45, I, do Código de Processo Civil que trazemos aqui para melhor enquadramento do
tema vergastado:
Art. 45. Tramitando o processo perante outro juízo, os autos serão remetidos
ao juízo federal competente se nele intervier a União, suas empresas públicas,
entidades autárquicas e fundações, ou conselho de fiscalização de atividade
profissional, na qualidade de parte ou de terceiro interveniente, exceto as
ações:
I - de recuperação judicial, falência, insolvência civil e acidente de trabalho;
74

4.1.5.1 POSIÇÃO DO ADMINISTRADOR JUDICIAL

O Administrador Judicial tem a posição clara de que o crédito da ANATEL, arrolado


na recuperação judicial do Grupo OI, deverá ser apreciado pelo Juízo da Recuperação Judicial
e entende que a autarquia deve discutir sua posição jurídica em todas as instâncias, sem que
haja o deslocamento do feito à Justiça Federal. E de fato, não é possível, nem sequer em tese,
o desmembramento da controvérsia, criando um duplo juízo da recuperação judicial, de sorte a
estabelecer um outro juízo, um juízo de adequação de procedimentos outro, decidindo se o
crédito está ou não submetido ao processo de recuperação, como muito bem coloca o
Administrador Judicial.
De fato, apenas um órgão jurisdicional deve concentrar o exame dessa questão, sendo
por isso que o Superior Tribunal de Justiça, sabiamente, atribui ao Juízo da recuperação judicial
a competência para deliberar sobre a submissão de créditos a esse processo.

4.1.5.2 SOBRE O MÉRITO

Nunca é demais nos atentarmos para a natureza jurídica dos tributos, para, a partir daí,
reconhecermos, entendermos e classificarmos determinados atos, fatos e negócios jurídicos.
Assim, a título de esclarecimento, os tributos são valores devidos aos entes públicos,
constituídos em lei, por força dos Arts. 145, 146, 148, 149, 150 e 154, todos da Constituição
Federal. Tais dispositivos constitucionais, regulados pela Lei nº 5.172/1966 (recebida com
manto de Lei Complementar), determina, com a mais absoluta clareza, o que é tributo, bem
como o diferencia dos encargos cuja natureza jurídica não são tributárias, por exemplo as
multas, conforme predispõe o Art. 3º, do Código Tributário Nacional.
Por sua vez, os demais encargos acessórios cobrados, serão cobrados dos contribuintes
(sujeitos passivos da relação tributária) caso os tributos em si não sejam pagos na data aprazada
e prevista em lei específica. Tais encargos, quaisquer que sejam, multa, juros, correções
monetárias e etc., não possuem natureza tributária, eis que somente existem em razão do
descumprimento da obrigação tributária principal, que é justamente o pagamento do tributo,
que incide somente sobre fatos fenomênicos que não sejam constituídos por atos ilícitos.
Portanto, os Tributos, em regras gerais, não estão sujeitos aos efeitos de uma Recuperação
Judicial, conforme previsão legal conscrita nos Arts. 186, 187, 188, todos do Código Tributário
Nacional e Arts. 29 e 31, ambos da Lei de Execuções Fiscais, porém todos os valores acessórios,
75

devidos por atos ilícitos, como por exemplo a falta de pagamento do próprio tributo, estão
sujeitos aos efeitos do processo recuperacional ou falimentar.
Contudo, observamos contradição no próprio Código Tributário, eis que, em seu Art.
133, §§ 1º, 2º e 3º, fica clara a participação e a submissão do crédito tributário aos efeitos do
Plano de Recuperação Judicial aprovado, posto que o resultado da venda de ativos (Unidade
Produtiva Isolada, contida no Art. 60, da Lei nº 11.101/05), pois a Fazenda Pública somente
terá seu crédito extinto pelo pagamento após o pagamento de créditos extraconcursais e
daqueles que preferem ao tributário.
Assim, uma vez que os referidos créditos públicos não têm natureza tributária, devem
ser incluídos na lista de credores de uma recuperação judicial na classe dos créditos
quirografários e, por sua vez, serem pagos na forma do Plano de Recuperação Judicial aprovado
em assembleia-geral de credores. Os mesmos argumentos utilizados para inclusão dos créditos
públicos decorrentes de penalidades e demais encargos, desde que não sejam tributos, conforme
depreende-se do Art. 83, VII, da Lei nº 11.101/5, deve ser aplicada aos casos atinentes à
Recuperação Judicial.
Veja-se ainda que os credores que nunca participaram da gestão da empresa em
recuperação judicial não podem ser impactados em seu recebimento por créditos decorrente de
multas, juros, encargos e etc., eis que tais créditos públicos não têm natureza tributária.
Entendemos que os referidos créditos públicos são sujeitos aos efeitos da recuperação
judicial, devendo ser incluídos na lista de credores, na Classe III, dos credores quirografários.
Nesse caso, os pagamentos dos credores trabalhistas nunca seriam impactados por cobrança de
dívidas decorrentes de penalidade operada pelos administradores das empresas em recuperação
judicial.

4.1.5.3 DÍVIDA ATIVA

Dívida ativa é composta pelo valor do tributo devido, bem como da correção monetária,
multa, juros e demais encargos previstos em lei ou contrato. Importante observar que em toda
a norma constante da Lei nº 6830/1980 (Lei de Execução Fiscal), que regula a cobrança judicial
dos tributos e seus encargos, sempre há, para fins de cobrança, a divisão entre tributos e os
demais encargos, cuja natureza jurídica não é de tributo, conforme Art. 2º, §§ 2º e 5º, II, Art.
8º, Art. 9º, Art. 19, II e Art. 34, § 1º, todos de referida lei:
Art. 2º - Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como
tributária ou não tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as
76

alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para


elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos
Municípios e do Distrito Federal.
[...]
§ 2º - A Dívida Ativa da Fazenda Pública, compreendendo a tributária e a não
tributária, abrange atualização monetária, juros e multa de mora e demais
encargos previstos em lei ou contrato.
[...]
§ 5º - O Termo de Inscrição de Dívida Ativa deverá conter:
[...]
II - o valor originário da dívida, bem como o termo inicial e a forma de calcular
os juros de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato;
[...]
Art. 8º - O executado será citado para, no prazo de 5 (cinco) dias, pagar a
dívida com os juros e multa de mora e encargos indicados na Certidão de
Dívida Ativa, ou garantir a execução, observadas as seguintes normas:
[...]
Art. 9º - Em garantia da execução, pelo valor da dívida, juros e multa de mora
e encargos indicados na Certidão de Dívida Ativa, o executado poderá:
[...]
Art. 19 - Não sendo embargada a execução ou sendo rejeitados os embargos,
no caso de garantia prestada por terceiro, será este intimado, sob pena de
contra ele prosseguir a execução nos próprios autos, para, no prazo de 15
(quinze) dias:
[...]
II - pagar o valor da dívida, juros e multa de mora e demais encargos,
indicados na Certidão de Dívida Ativa pelos quais se obrigou se a garantia for
fidejussória.
[...]
Art. 34 - Das sentenças de primeira instância proferidas em execuções de valor
igual ou inferior a 50 (cinquenta) Obrigações Reajustáveis do Tesouro
Nacional - ORTN, só se admitirão embargos infringentes e de declaração.
§ 1º - Para os efeitos deste artigo considerar-se-á o valor da dívida
monetariamente atualizado e acrescido de multa e juros de mora e de mais
encargos legais, na data da distribuição.

Da simples leitura dos dispositivos acima, sempre que temos uma Dívida Ativa, o
legislador separa, claramente, o tributo dos demais encargos, comprovando, mais uma vez que
o tributo não tem a mesma natureza jurídica dos demais encargos cobrados na mesma Dívida
Ativa!
O crédito exigido pela ANATEL no caso da Recuperação Judicial do Grupo OI é
realmente e como no mais das vezes, é composto de verbas mistas como assevera o
Administrador Judicial, sendo que cada uma delas possui uma natureza jurídica própria.
Examinar o mérito do protesto trazido pela ANATEL exige a interpretação conjugada e
sistêmica de várias normas. Assim, apresentamos a seguir as naturezas jurídicas específicas
de cada verba trazida à tona pela questão da ANATEL.
77

a. CRÉDITO TRIBUTÁRIO

No processo de Recuperação Judicial, parte do crédito titularizado pela ANATEL é de


natureza tributária e sobre isso não há controvérsia entre a OI e a ANATEL a respeito dessa
qualificação jurídica e suas consequências, uma vez que se trata de Contribuição para o
Fomento de Radiodifusão Pública (CRFP), Fundo de Universalização dos Serviços de
Telecomunicações (FUST); Taxa de Fiscalização de Funcionamento (TFF) e Taxa de
Fiscalização de Instalação (TFI).
Em tal manifestação, o Administrador Judicial faz uma referência direta ao Art. 187, do
Código Tributário Nacional, ao afirmar que a cobrança judicial do crédito tributário não é
sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, recuperação judicial, concordata,
inventário ou arrolamento. Dessa forma, a lei exclui de pronto do processo de recuperação
judicial o crédito tributário.
Por amor à argumentação, sabemos que há uma discussão acalorada à respeito desse
assunto, qual seja, se essa regra do Art. 187, do Código Tributário Nacional tem preferência à
regra prevista no Art. 49, da Lei 11.101/05, segundo a qual “estão sujeitos à recuperação judicial
todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos”, dada a posição
especial conferida à Lei Complementar em nosso sistema jurídico. Se há preferência da regra
do Código Tributário Nacional, o dispositivo da Lei de 11.101/05 não o derroga. Por outro lado,
existem entendimentos de que a lei nova, específica e especial, teria derrogado a disposição do
Código Tributário Nacional, discussão superada, pois fato , que não houve inclusão de crédito
tributário na lista preparada pelas recuperandas, que está correta em relação a esse ponto.

b. MULTA POR INADIMPLEMENTO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO

No que tange à multa por inadimplemento de crédito tributário, o Administrador Judicial


entende que seu caráter é idêntico às demais penalidades administrativas, o que afasta sua
natureza de tributária, na linha da Súmula 565, do Supremo Tribunal Federal60 e da doutrina,
que inclusive encontra-se citada na manifestação do administrador judicial. Correta, portanto,
sua inclusão neste processo de recuperação.

60
Súmula 565/STF
A multa fiscal moratória constitui pena administrativa, não se incluindo no crédito habilitado em falência.
78

Assevera referido Administrador Judicial que o mesmo ocorreu com a inclusão dos
créditos decorrentes do encargo legal a que se refere o Art. 1º, do Decreto-Lei 1.025/6961 e, no
caso da ANATEL, o Art. 37-A, § 1º, que substituiu a condenação do devedor em honorários
advocatícios, decorrentes do exercício das cobranças de dívidas da autarquia.
Ora, não estamos, então, diante de um tributo cujas hipóteses estão previstas no Art.
145, da Constituição Federal de 1988. Nem mesmo de taxa, porque esta pressupõe o exercício
do poder de polícia ou a utilização de serviços prestados em benefício do contribuinte. Já a
cobrança do encargo legal decorre de um serviço prestado no interesse exclusivo da arrecadação
tributária. Assim, trata-se de crédito igualmente sujeito ao processo de recuperação judicial e
que deve figurar na classe de créditos quirografários, não dos trabalhistas, pois não tem por
destinatários diretos os servidores, mas um fundo, cuja função é fazer face não apenas a
honorários advocatícios, mas a despesas diversas decorrentes das atividades exercidas por
servidores que integram as carreiras jurídicas da União, suas autarquias e fundações, como já
foi reconhecido pelo Sodalício Superior Tribunal de Justiça em termos de Recursos Repetitivos
e de Repercussão Geral62.
Mais uma vez a questão que vem à tona aqui versa sobre quando o crédito tributário
inadimplido é acrescido de multa. No caso, o crédito titularizado pela ANATEL, nascido da
multa moratória, não ostenta a mesma natureza jurídica tributária da obrigação principal. A

61
Art. 1º É declarada extinta a participação de servidores públicos na cobrança da Dívida da União, a que se
referem os artigos 21 da Lei nº 4.439, de 27 de outubro de 1964, e 1º, inciso II, da Lei nº 5.421, de 25 de abril de
1968, passando a taxa, no total de 20% (vinte por cento), paga pelo executado, a ser recolhida aos cofres públicos,
como renda da União. (Vide Decreto-lei nº 1.407, de 1975) (Vide Decreto-lei nº 1.569, de 1977) (Vide Decreto-
lei nº 1.645, de 1978) (Vide Decreto-lei nº 1.893, de 1981) (Vide Decreto-lei nº 2.163, de 1984) (Vide Decreto-lei
nº 2.331, de 1987) (Vide Lei nº 7.450, de 1985).
(BRASIL. Decreto-Lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969. Fonte: Planalto. Disponível em:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del1025.htm>. Acesso em: 15.mai.2019).
62
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL.
ENCARGO DE 20% PREVISTO NO DECRETO-LEI 1.025/69. MASSA FALIDA. EXIGIBILIDADE.
PRECEDENTES DA PRIMEIRA SEÇÃO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO
543-C DO CPC E RESOLUÇÃO 8/STJ.
1. Hipótese em que se discute a exigibilidade do encargo de 20% previsto no Decreto-Lei 1.025/69 nas execuções
fiscais propostas contra massa falida, tendo em vista o disposto no artigo 208, § 2º, da antiga Lei de Falências,
segundo o qual "A massa não pagará custas a advogados dos credores e do falido".
2. A Primeira Seção consolidou entendimento no sentido de que o encargo de 20%, imposto pelo artigo 1º do
Decreto-Lei 1.025/69 pode ser exigido da massa falida. Precedentes: EREsp 668.253/PR, Rel. Ministro Herman
Benjamin; EREsp 466.301/PR, Rel. Ministro Humberto Martins; EREsp 637.943/PR, Rel. Ministro Castro Meira
e EREsp 448.115/PR, Rel. Ministro José Delgado.
3. Recurso afetado à Seção, por ser representativo de controvérsia, submetido ao regime do artigo 543-C do CPC
e da Resolução 8/STJ.
4. Recurso especial provido.
(SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp. nº 1.110.924/SP (2009/0016196-2). Primeiro Turma do Superior
Tribunal de Justiça. Rel. Min. Benedito Gonçalves. Julgado em: 10/06/2009).
79

natureza da multa é distinta da natureza da obrigação principal, ao menos para o direito da


insolvência. Esse entendimento foi pacificado, há muito tempo, pelo Supremo Tribunal Federal,
na já mencionada Súmula 565.
Por multa fiscal moratória entendemos a multa decorrente do inadimplemento de
tributo. Trata-se de pacífico entendimento a respeito da matéria. Embora a Súmula seja da
década de 1970, o Supremo Tribunal Federal já́ reafirmou sua aplicação na vigência da
Constituição de 1988:
A multa fiscal moratória, por qualificar-se como sanção de caráter
administrativo, não se inclui no crédito habilitado em falência. A Súmula
565/STF, por revelar-se compatível com a Constituição de 1988, foi por esta
integralmente recepcionada. Precedentes.
Recurso Extraordinário. Inadmissibilidade. Falência. Multa fiscal. Moratória.
Natureza administrativa. Inexigibilidade. Agravo regimental não provido.
Aplicação da Súmula 565. Precedentes. Não se inclui no crédito habilitado em
falência a multa fiscal moratória, que tem efeito de pena administrativa.
Sendo de natureza administrativa a multa a que se refere o art. 23, III, da Lei
de Falências (Súmula 565 do STF e não de débito tributário, despicienda, no
caso, a invocação, pelo agravante, dos artigos 150, §6o e 151, III, da
Constituição, eis que não se cogita, na espécie, da concessão de isenção ou
outro favor fiscal.

Esse entendimento era e ainda é válido para as falências decretadas sob a égide do
Decreto- Lei 7.661/45, que excluía, do processo falimentar, as “penas pecuniárias por infração
das leis penais e administrativas”. A discussão que se estabeleceu foi sobre a natureza jurídica
da multa decorrente do inadimplemento de tributo, discussão essa que foi pacificada com a
edição da Súmula 565, do Pretório Excelso acima citada.
Com a entrada em vigor da Lei nº 11.101/05, essas multas passaram, expressamente, a
ser incluídas no passivo falimentar, conforme o já descrito Art. 83, VII, da Lei 11.101/05.
Notamos aqui que a nossa lei concursal vigente discrimina, claramente, o crédito tributário que
é a obrigação principal da multa por inadimplemento, que está abaixo dos créditos
quirografários. Foi respeitada, evidentemente, a natureza jurídica dessa multa, estabelecida na
Súmula 565/STF, jurisprudência essa que cristalizou a noção de que multa por não-pagamento
de imposto não tem caráter tributário. A multa é, portanto, de diversa natureza jurídica, externa
e posterior à obrigação tributária e ao fato gerador.
A discussão sobre o caráter punitivo ou indenizatório da multa moratória não exerce,
atualmente, influência sobre a natureza do crédito dela decorrente. Essa discussão só tinha
relevância na vigência do Decreto-Lei nº 7.661/45, que excluía, da falência, o crédito que
representasse pena pecuniária por infração da lei administrativa, conforme dispunha o Art. 23,
80

parágrafo único, III63. Saber, então, se a multa tributária tinha caráter punitivo era relevante.
Agora, não é mais.
Vale consignar, apenas, que a lei dispensou, à multa, o mesmo tratamento processual
dado ao crédito tributário, não equiparando de forma alguma, substancialmente, crédito de
multa com crédito de tributo. Não houve, enfim, alteração da natureza jurídica da multa por
infração à obrigação tributária, seja na vigência da Constituição Federal de 1988, seja na
vigência da Lei nº 11.101/05. O que se deu, na lei vigente, foi, apenas, a expressa inclusão da
multa no passivo falimentar, o que antes estava excluído. Dada a natureza não tributária da
multa punitiva, à luz do quanto exposto, tem-se que crédito dessa natureza está submetido ao
processo de recuperação judicial.

c. CRÉDITO DECORRENTE DE MULTA ADMINISTRATIVA

Grande parte do vultoso crédito é decorrente de multa administrativa. Há certa


divergência sobre o valor e também sobre a submissão do crédito à recuperação judicial, o que
exige um exame mais aprofundado. Adiantamos, desde logo, que esse crédito, com mais razão
ainda do que o crédito decorrente de inadimplemento de tributo, é sim submetido ao processo
de recuperação. É o que se passa a demonstrar. A dívida ativa, pela legislação (Lei 4.320/64),
que estatuiu normas gerais de direito financeiro, pode ser dividida em dívida ativa tributária
e dívida ativa não tributária da seguinte forma:
Art. 39 Os créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não
tributária, serão escriturados como receita do exercício em que forem
arrecadados, nas respectivas rubricas orçamentárias.
[...]
§ 2º - Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza,
proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e
multas, e Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda
Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios,
contribuições estabelecidas em lei, multa de qualquer origem ou natureza,
exceto as tributárias, foros, laudêmios, alugueis ou taxas de ocupação, custas
processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos,
indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis

63
Art. 23. Ao juízo da falência devem concorrer todos os credores do devedor comum, comerciais ou civis,
alegando e provando os seus direitos.
Parágrafo único. Não podem ser reclamados na falência:
[...]
III - as penas pecuniárias por infração das leis penais e administrativas.
(BRASIL. Decreto-Lei nº 7.661, de 21 de junho de 1945 (Lei de Falências). Fonte: Planalto. Disponível em:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del7661impressao.htm>. Acesso em: 05.nov.2018).
81

definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em


moeda estrangeira, de subrogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia,
de contratos em geral ou de outras obrigações legais.64

Na ampla rubrica da então denominada Dívida Ativa Não-Tributária estão recolhidos


todos os demais créditos titularizados por entes públicos que não sejam oriundos de tributo. Da
definição legal transcrita, que se afeiçoa ao Art. 2º, da Lei 6.830/80, grifamos o crédito
decorrente de indenização, para chamar a atenção ao seguinte ponto: o crédito de
indenização é crédito quirografário, na recuperação judicial e na falência. Ainda que o credor
seja ente público, esse crédito, com ou sem inscrição na dívida ativa, será́ quirografário e tal
classificação, pela obviedade com que se caracteriza, dispensa auxílio de interpretação e
aplicação.
Essa exemplificação inicial é relevante para nos indicar o caminho a ser trilhado no
itinerário desta manifestação. O que importa é a natureza jurídica do crédito e não o titular do
crédito. É isso que precisa ser investigado para o bom esclarecimento da questão. A ANATEL
centra sua argumentação, principalmente, no já mencionado Art. 29, da Lei nº 6.830/80.
A locução “dívida ativa”, como já vimos acima, é pouco esclarecedora, pois ampla o
suficiente para albergar tanto o crédito tributário titularizado pela Fazenda Pública, como o
crédito regido pelo direito privado. Essa designação - dívida ativa - não leva em conta o que é
decisivo no campo do direito concursal, que é a essência do crédito, ou a sua natureza. Segundo
a conceituação da doutrina, Dívida ativa é débito regularmente inscrito na repartição
administrativa competente, cujo credor é a própria Administração pública, depois de esgotado
o prazo, legal ou judicial, fixado para o respectivo pagamento. A Lei 6.830 dá abrangência
ampla ao conceito de Dívida Ativa e admite a execução fiscal como procedimento judicial
aplicável tanto à cobrança dos créditos tributários como dos não tributários. Até mesmo as
obrigações contratuais, desde que submetidas ao controle da inscrição, podem ser exigidas por
via da execução fiscal.

d. DÍVIDA ATIVA TRIBUTÁRIA

64
BRASIL. Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964. Fonte: Planalto. Disponível em:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4320.htm>. Acesso em: 05.nov.2018.
82

A inscrição na dívida ativa é atividade interna e exclusiva da Fazenda Pública e tem a


finalidade de controle interno de legalidade, no qual podemos assim conceituar:
A inscrição na dívida desempenha, assim, uma função garantística de
representar um controle suplementar efetuado por órgão distinto do órgão de
lançamento, evitando a propositura pela Fazenda de execuções indevidas, em
homenagem aos princípios da reserva legal e da proteção da propriedade
privada.65

Atividade interna e exclusiva essa que culmina na formação de um estoque de dívida


cobrável em juízo, pelo rito da execução fiscal. Dívida ativa é expressão da quantidade de
crédito identificada pela Fazenda Pública sob um procedimento próprio, melhor dizendo,
dívida ativa é locução que identifica a quantidade de crédito que passou pela inscrição e não
tem o condão de, por si só, revestir os créditos (inscritos) de prerrogativas excepcionais66, muito
menos que torná-lo negociável ou não, ou sujeitos ou não à recuperação judicial.
Nem mesmo em uma ginástica hermenêutica em que alguns autores entendem que a
expressão “dívida ativa” relevante no âmbito da administração pública não assume nenhum
significado prático no âmbito dos processos de insolvência do devedor. Trazem eles o contexto
normativo e uma assim chamada “elipse”, no Art. 29, da Lei 6.830/80. Com “elipse” querem
dizer que há no enunciado da norma a supressão de um termo que pode ser, talvez, subentendido
pelo contexto linguístico ou pela situação.
Ou seja, a percepção dessa “elipse” que permitiria a melhor compreensão do dispositivo
no sistema jurídico, aliada a uma interpretação sistêmica, de harmonia entre o Código Tributário
Nacional e a Lei de Execução Fiscal, traria o entendimento de que não é sujeita a concurso de
credores “a cobrança judicial da dívida ativa tributária...”, pois a locução (dívida ativa), do texto
do dispositivo legal, nada tem de esclarecedor em termos de direito material e essa interpretação
insere termo fundamental de especificidade onde a lei generalizou pelo disposto no Art. 29.
Desta forma, nos termos do mencionado Art. 29, da Lei 6.830/80, não podemos deduzir
diretamente que a dívida ativa tributária é ou não é sujeita à recuperação judicial. No processo
concursal, aliás, é dispensável, para a Fazenda Pública, a existência de inscrição na dívida ativa,

65
XAVIER, Alberto. Do Lançamento: Teoria Geral do Ato, do Procedimento e do Processo Tributário. Rio
de Janeiro: Editora Forense, 1997, p. 403.
66
Cf. PORTELLA, André. Comentários ao Código Tributário Nacional. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008,
p. 503.
Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Lei de Execução Fiscal. São Paulo: Editora Saraiva, 2011, p. 37.
83

conforme já decidiu o Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, com relatoria do


Desembargador Neves Amorim:
Falência. Habilitação de crédito pela União Federal. Crédito previdenciário
decorrente de sentença trabalhista (art. 114, VIII da CF). Desnecessidade da
inscrição do título judicial na dívida ativa. Sentença reformada. Extinção
afastada.

Nesse sentido e como muito bem colocou o Administrador Judicial do Grupo OI, a
justificativa na distinção pretendida pela ANATEL sobre o crédito integrar ou não a dívida
ativa, sendo esta apenas um instrumento de organização financeira dos entes públicos que,
inclusive, contempla a distinção entre créditos tributários ou não tributários.
Não é o fato de estar ou não inscrito em dívida ativa que torna o crédito negociável ou
não, sujeito ou não à recuperação judicial. É, antes, a natureza do crédito público: se tributário
ou não. Tanto assim que o Art. 38, parágrafo único, da Lei de Mediação67, cujo inciso I a própria
ANATEL invoca para justificar a tese da intransigibilidade de créditos inscritos na dívida ativa
prevê as competências como, por exemplo, justamente a de "desistir, transigir, acordar e firmar
compromisso nas ações de interesse da União, nos termos da legislação vigente".
Por esses motivos, os créditos de natureza não-tributária participam e não podem ser
excluídos, ao menos com o fundamento da ANATEL, da recuperação judicial, e seguem na
mesma linha os precedentes do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo68. AI 2207236-

67
Art. 38. Nos casos em que a controvérsia jurídica seja relativa a tributos administrados pela Secretaria da Receita
Federal do Brasil ou a créditos inscritos em dívida ativa da União:
I - não se aplicam as disposições dos incisos II e III do caput do art. 32;
II - as empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias que explorem atividade econômica de
produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços em regime de concorrência não poderão exercer
a faculdade prevista no art. 37;
III - quando forem partes as pessoas a que alude o caput do art. 36:
a) a submissão do conflito à composição extrajudicial pela Advocacia-Geral da União implica renúncia do direito
de recorrer ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais;
b) a redução ou o cancelamento do crédito dependerá de manifestação conjunta do Advogado-Geral da União e
do Ministro de Estado da Fazenda.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não afasta a competência do Advogado-Geral da União prevista nos
incisos VI, X e XI do art. 4º da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, e na Lei nº 9.469, de 10 de
julho de 1997.
(BRASIL. Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015 (Código de Processo Civil). Fonte: Planalto. Disponível:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm>. Acesso em: 20/11/2018).
68
RECUPERAÇÃO JUDICIAL. Indeferimento de pedido para que os créditos decorrentes das multas
administrativas sejam habilitados no processo de recuperação. Multa administrativa aplicada pelo PROCON.
Natureza não-tributária. Inteligência do artigo 49 da Lei n. 11.101/05. Inaplicabilidade da restrição do artigo 187
do CTN. Possibilidade de prosseguimento da recuperação com a habilitação dos créditos do PROCON. Recurso
provido.
84

63.2015.8.26.0000, Rel. Des. Francisco Loureiro, j. em 10.12.2015; AI 2073639-


95.2015.8.26.0000, Rel. Des. Francisco Loureiro, j. em 26.8.2015.

e. SOBRE A DISPENSA DA PRÉVIA INSCRIÇÃO

A dispensa da prévia inscrição pode ocorrer, também, se a Fazenda Pública dispuser de


documento, privado, que prove a origem do crédito alegado, esse é o requisito básico para
participar do processo concursal tanto da recuperação judicial como da falência. E nesse sentido
já́ se orientava a doutrina nos debates sobre a vigente lei de execução fiscal69.
Por isso, mais do que se fundar na lei ordinária, como faz a ANATEL, o caso exige que
se olhe para o disposto no muitas vezes já mencionado Art. 187, do Código Tributário Nacional.
É o crédito tributário e não o produto de um procedimento administrativo que culmina
na formação da dívida ativa que conta com privilégio de natureza substancial. É certo que a
ANATEL também invoca o disposto no Art. 6º, § 7º, da Lei 11.101/05, de modo que a natural
interpretação a ser extraída do dispositivo é a de que a execução fiscal em referência é aquela
que veicula a cobrança de tributo, por isso a expressa referência, no texto legal, e não poderia
ser diferente, ao Código Tributário Nacional, Código esse que só́ cuida de tributos. O termo
fiscal tem caráter dúbio70. Já́ se disse que “fisco é, assim, tudo aquilo que se relaciona a
tributação”71. Mas também a palavra fisco serve para identificar a pessoa de direito público.
Entendemos que “Fisco”, consequentemente, é o próprio Estado fiscalmente considerado.

f. EXECUÇÃO FISCAL TAMBÉM PODE COBRAR CRÉDITO DECORRENTE DE

INDENIZAÇÃO

(TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO. AI 2207236-63.2015.8.26.0000. 1ª Câmara Reservada de Direito


Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo. Rel. Des. Francisco Loureiro. Julgado em: 10/12/2015).
RECUPERAÇÃO JUDICIAL. Habilitação de crédito. Multa administrativa aplicada pela Prefeitura Municipal.
Natureza não-tributária. Inteligência do artigo 83, VII da Lei n. 11.101/05.Inaplicabilidade da restrição do artigo
187 do CTN. Possibilidade de prosseguimento do incidente. Recurso provido.
(TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO. AI 2073639-95.2015.8.26.0000. 1ª Câmara Reservada de Direito
Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo. Rel. Des. Francisco Loureiro. Julgado em: 26/08/2015).
69
FLACKS, Milton. Comentários à Lei da Execução Fiscal. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1981, pp. 23-4.
70
A locução “crédito fiscal”, quando utilizada nos textos legais, não tem sentido unívoco, tanto podendo significar
débito de origem tributária, como débito de um modo geral, para com o poder público, devendo o intérprete se
socorrer do contexto onde se encontra inserida.
71
[Repertório enciclopédico do direito brasileiro, v. 23, verbete fisco, p. 23]
85

Execução fiscal também pode cobrar crédito decorrente de indenização; como nada a
respeito será encontrado no Código Tributário Nacional, tem-se que se trata de crédito
submetido ao processo de recuperação, pois a suspensão não se operará. O artigo 6º, § 7º, da
Lei 11.101/05 é claramente endereçado às execuções fiscais destinadas à cobrança de tributo,
somente, que não são suspensas. Por elementar interpretação a contrário sensu, que se afeiçoa,
por sua vez, com o comando oriundo da Lei Complementar que é o Código Tributário Nacional,
suspendem-se as execuções fiscais destinadas à cobrança da dívida ativa não tributária. E a
razão da suspensão é uma só́ : a dívida ativa não tributária submete-se ao processo de
recuperação judicial.
É importante considerar, neste ponto, que o instrumento utilizado pela Fazenda Pública
para cobrar em juízo o seu crédito, que é a execução fiscal, ou seja, uma execução por quantia
certa contra devedor solvente com algumas particularidades procedimentais, não é o fator
estruturante de sua posição jurídica. A ferramenta processual denominada execução fiscal, nada
ou pouco diz sobre a situação do crédito público na recuperação judicial. E não é à toa que a
jurisprudência vem reconhecendo a submissão do crédito não tributário da Fazenda Pública ao
processo de recuperação judicial. O Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu a submissão
de multa administrativa, por descumprimento da legislação sanitária, ao processo de
recuperação judicial.
Como se sabe, nos termos do Art. 39, § 2º, da Lei nº 4.320/1964, os créditos inscritos
em dívida ativa podem ser tributários ou não. Os créditos tributários constituem a Dívida Ativa
Tributária e abrangem os tributos, adicionais e multas. Os créditos que não sejam tributários
formam a Dívida Ativa não-Tributária.
Nessa linha de raciocínio e considerando que a natureza do crédito se sujeita à
recuperação judicial, nos termos do Art. 49, da Lei nº 11.101/2005, não se enquadra o caso em
tela na exceção prevista nos §§ 3º e 4º, desse mesmo artigo.
Foi decisiva, para a conclusão do v. acordão, a natureza jurídica do crédito, já tratada
no capítulo anterior, que é o critério necessário e suficiente para o bom desfecho da
controvérsia. As proclamadas garantias e privilégios do crédito tributário, que procuram
86

assegurar a sua satisfação, não têm o condão de alterar a natureza jurídica do crédito público.
É o próprio Código Tributário Nacional que assim estatui, conforme seu Art. 18372.
O precedente acima referido, que admite a submissão do crédito não tributário ao
processo de recuperação judicial, segue exatamente o critério preconizado pelo Código
Tributário Nacional, de que a natureza jurídica do crédito é inalterável. Ainda que com
argumentação distinta, mas em essência idêntica, e igualmente correta, isto é, levando em
consideração a natureza do crédito, a partir do exame do Art. 83, VII, da Lei nº 11.101/05, já
tendo decidido o Tribunal de Justiça de São Paulo sobre o assunto73, ao verificar que a natureza
do crédito relativo a multa titularizada pelo ente público e, então, reconheceu a submissão ao
processo de recuperação judicial.
Voltemos, então, ao Art. 187, do Código Tributário Nacional, inspiração do Art. 29, da
Lei 6.830/80. Apesar de pretender ser norma protetiva da Fazenda Pública, pois quer afastar o
crédito tributário dos processos concursais, autorizando o prosseguimento da execução fiscal
contra entidade em recuperação judicial ou falida, essa proteção já foi alvo de acomodação
jurisprudencial importante, que cumpre destacar. Com efeito, a jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça é firme no entendimento de que a falência superveniente do devedor não
tem o condão de paralisar o processo de execução fiscal, nem de desconstituir a penhora
realizada anteriormente à quebra. Outrossim, o produto da alienação judicial dos bens
penhorados deve ser repassado ao Juízo universal da falência para apuração das preferências.
E assim de fato o é, segundo a jurisprudência consolidada do STJ, pouco ou nenhum
significado prático tem o tal privilégio instituído pelo Código Tributário Nacional e reproduzido
na Lei de Execução Fiscal. O prosseguimento da execução fiscal não resulta em seu benefício,
senão que, sendo o produto entregue ao juízo universal, o montante servirá para pagar os
credores trabalhistas e eventuais credores extraconcursais; essa era a antiga proposta de Rubens

72
Art. 183. A enumeração das garantias atribuídas neste Capítulo ao crédito tributário não exclui outras que sejam
expressamente previstas em lei, em função da natureza ou das características do tributo a que se refiram.
Parágrafo único. A natureza das garantias atribuídas ao crédito tributário não altera a natureza deste nem a da
obrigação tributária a que corresponda.
(BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional). Fonte: Planalto. Disponível
em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172.htm>. Acesso em: 22.dez.2019).
73
AGRAVO DE INSTRUMENTO – Recuperação Judicial – Multa administrativa – Decisão que classifica o
crédito como extraconcursal – Pretensão das recuperandas à sujeição a recuperação judicial – Cabimento (LREF,
art. 83, VII) – Decisão singular reformada – Agravo provido neste ponto.
AGRAVO DE INSTRUMENTO – Recuperação Judicial – Multa administrativa – Decisão que classifica o crédito
como extraconcursal – Divergência quanto aos valores – Ausência de análise no Juízo Singular – Determinação
de verificação na origem para evitar supressão de instância.
(TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO. AI 2047000-40.2015.8.26.0000. 2ª Câmara Reservada de Direito
Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo. Rel. Des. Ricardo Negrão. Julgado em: 17/02/2016).
87

Requião, que acabou por se consagrar na jurisprudência. Exatamente por isso a doutrina explica
que:
[...] deva haver habitação do crédito cobrado na execução fiscal naquele juízo,
para que se proceda à sua classificação, sob pena de tal crédito não ser
satisfeito quando da realização dos pagamentos. A necessidade da habilitação
decorre justamente da obrigação de entrega do produto arrecadado ao juízo
falimentar, para que sejam observadas as preferências legais.74

O dito “privilégio” processual fica isolado ao âmbito da execução fiscal, sem


repercussão no processo concursal. E, em se tratando de tributo, há um direito de natureza
material, em favor da Fazenda Pública, instituído pelo Código Tributário Nacional. Tanto a lei
de execução fiscal, como a lei concursal, comungam da mesma solução, como não poderia
deixar de ser. Por isso, deve ficar claro, para dar correto desfecho a esta divergência da
ANATEL, que é preciso saber a natureza do crédito e não quem é o seu titular. A ontologia é o
caminho interpretativo que nos permite apresentar a solução correta na esteira da modificação
levada a cabo em 2005, no Código Tributário Nacional75, para adequá-lo às novas disposições
da lei de insolvência de nosso país.
Depreende-se, facilmente, que a concessão da recuperação judicial não depende de
apresentação de prova de quitação de dívidas para com o Fisco que não sejam dívidas
tributárias. No caso concreto, a existência de dívida relativa a multa administrativa, não
tributária, não é de forma nem de matéria obstáculo à concessão da recuperação judicial; o que
o Código Tributário Nacional exige é a prova de quitação de “todos os tributos”. E não impede
justamente porque o respectivo crédito está submetido ao processo de recuperação.
Para fins de concessão da recuperação judicial, o Código Tributário Nacional e a Lei nº
11.101/05 contentam-se com a exigência de prova de quitação de tributos, sem quitação de
multa administrativa ou outras dívidas não tributárias mantidas com o ente público. Isso
significa, claramente, como exposto até aqui, que somente os créditos tributários, na sua
essência, estão excluídos do processo de recuperação judicial. Os demais créditos, são créditos
sujeitos a esse processo, sem dúvida nenhuma, em interpretação que decorre do próprio Código
Tributário Nacional, que em consonância temos o já mencionado Art. 57 da Lei nº 11.101/05.

74
ALVES, Renato de Oliveira. Execução Fiscal - Comentários à Lei 6.830/80. Belo Horizonte: Editora Del Rey,
2008, p. 224.
75
Art. 191-A. A concessão de recuperação judicial depende da apresentação da prova de quitação de todos os
tributos, observado o disposto nos arts. 151, 205 e 206 desta Lei.
(BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional). Fonte: Planalto. Disponível
em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172.htm>. Acesso em: 15.mai.2019).
88

Justamente porque o crédito tributário não é submetido ao processo de recuperação


judicial, a apresentação de certidão é o meio concebido pela lei (e não se entra no mérito do
acerto ou desacerto dessa fórmula) para a satisfação do crédito decorrente do inadimplemento
de impostos; sem que exista qualquer exigência em relação aos outros créditos titularizados
pela Fazenda Pública, pois passíveis de submissão ao processo de recuperação judicial.
O critério aqui adotado coincide com o esposado pela União Federal em outra
oportunidade. É o que ocorreu na insolvência da Viação Área São Paulo (VASP), inicialmente,
no período da recuperação judicial, depois convertida em falência. O caso merece mais
destaque, bastante resumido, feito em seguida. Para o que interesse ao exame desta
controvérsia, a VASP, ainda como sociedade de economia mista, captou recursos no exterior.
A União Federal foi garantidora da dívida da VASP, que não honrou suas obrigações
financeiras perante os credores externos. A União Federal foi chamada a pagar a dívida – de
natureza contratual, privada. Dois fenômenos importantes ocorreram. De um lado, a
renegociação da dívida externa do Brasil e, de outro, a privatização da VASP. Para a efetivação
da privatização, o Estado de São Paulo obrigou-se a pagar a dívida externa da empresa.
Houve, com isso, a atuação, perante a recuperação judicial da VASP, de divergência de
crédito por parte da Fazenda Pública Estadual e também por parte da União Federal. Com efeito,
a União Federal, por meio da Divergência autuada sob no 583.00.2005.070715-0/001218-000,
perante a 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais do Foro Central da Comarca da Capital
do Estado de São Paulo, apresentou-se como titular de crédito expressivo e, em suas palavras,
“para fins de participação nas deliberações da Assembleia Geral de Credores”, requereu a
retificação do valor do crédito, “para aumentar o peso da posição da União nas deliberações da
Assembleia de Credores”.
Vê-se que a União Federal não viu obstáculo à participação em Assembleia de Credores,
como de fato não há. Nesse caso, a União Federal postulou sua vigorosa presença na assembleia
de credores, em franca concordância com os termos da Lei nº 11.101/05.
Já a Fazenda Pública Estadual, por meio da Divergência no 583.00.2005.070715-
8/001184-000, apresentada na Recuperação Judicial da VASP, envolvendo o crédito já́ referido,
afirmou o seguinte: “Insta ressaltar, neste momento, a natureza contratual da dívida em questão,
sujeita à recuperação judicial na classe de credores quirografários”. Tampouco a Fazenda
Pública de São Paulo viu qualquer entrave à sua participação na assembleia de credores, apesar
de a dívida estar inscrita na tão falada e dívida ativa. Em conclusão, a multa administrativa
submete-se ao processo de recuperação judicial, sem qualquer dúvida, e o fato de o credor ser
ente público não altera esse entendimento.
89

g. CRÉDITO DENOMINADO DE ENCARGO LEGAL

O encargo legal é um tributo? A resposta positiva leva à exclusão do crédito do processo


de recuperação judicial. Imprescindível então, examinar a sua natureza jurídica. O encargo
legal foi instituído por meio do Decreto-Lei 1.025/1969, cujo artigo 1o rezava: “É declarada
extinta a participação de servidores públicos na cobrança da Dívida da União, a que se referem
os artigos 21 da Lei no 4.439, de 27 de outubro de 1964, e 1o, inciso II, da Lei no 5.421, de 25
de abril de 1968, passando a taxa, no total de 20% (vinte por cento), paga pelo executado, a ser
recolhida aos cofres públicos, como renda da União”.
A partir de 1969 o destinatário do dinheiro pago pelo executado mudou - antes, o
servidor público e, agora, a União Federal e, desde então, a quantia paga pelo executado
ingressa nos cofres da União Federal. Em 1978, o DL 1.64576 estabeleceu que o encargo legal
“substitui a condenação do devedor em honorários de advogado e o respectivo produto será́ ,
sob esse título, recolhido integralmente ao Tesouro Nacional”. Nesse exato sentido foi editada,
pelo extinto Tribunal Federal de Recursos (TFR), a Súmula 168, segundo a qual, “o encargo de
20% do Dec.-lei 1.025, de 1969, é sempre devido nas execuções fiscais da União e substitui,
nos embargos, a condenação do devedor em honorários advocatícios”.
Em se falando de processo, isto é, para fins de solucionar a responsabilidade pelos ônus
financeiros decorrentes da derrota no processo, esclareceu-se que o encargo legal substitui a
condenação do devedor em honorários no âmbito dos embargos à execução. Em razão do
encargo legal, portanto, não havia condenação em honorários advocatícios de sucumbência nos
embargos à execução. No campo da distribuição dos ônus financeiros do processo judicial, a
solução encontrada pela jurisprudência, para não onerar ainda mais o contribuinte, foi substituir
o encargo legal pelos honorários de sucumbência. Tal é a orientação que prevalece até hoje.
Algumas normas, sem interesse para a compreensão do nosso assunto, ofereceram vantagem

76
Art. 3º. Na cobrança executiva da Divida Ativa da União, a aplicação do encargo de que tratam o art. 21 da lei
no 4.439, de 27 de outubro de 1964, o art. 32 do Decreto-lei no 147, de 3 de fevereiro de 1967, o art. 1o, inciso II,
da Lei no 5.421, de 25 de abril de 1968, o art. 1o do Decreto-lei no 1.025, de 21 de outubro de 1969, e o art. 3o do
Decreto-lei no 1.569, de 8 de agosto de 1977, substitui a condenação do devedor em honorários de advogado e o
respectivo produto será́ , sob esse título, recolhido integralmente ao Tesouro Nacional. (Vide Decreto-lei no 1.893,
de 1981) (Vide Decreto-lei no 2.331, de 1987).
Parágrafo Único. O encargo de que trata este artigo será́ calculado sobre o montante do débito, inclusive multas,
monetariamente atualizado e acrescido dos juros de mora.
(BRASIL. Decreto-Lei nº 1.645, de 11 de dezembro de 1978. Fonte: Planalto. Disponível em:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1965-1988/del1645.htm>. Acesso em: 15.dez.2019).
90

segundo a espécie tributária ou no âmbito de parcelamento de dívida (Decreto-Lei 1.407/1975,


art. 3o do Decreto-Lei 1.569/1977), outro benefício de redução do encargo foi instituído em
1981, pelo Decreto-Lei 1.893, cujo artigo 1o dispensou o encargo para a multa tributária e
redução para multa de outra natureza. O mesmo ocorreu com o Decreto-Lei 2.163/1984. Como
medida de “incentivo à arrecadação federal”, o Decreto-Lei 2.331/1987 dispensou o pagamento
de juros sobre o encargo legal e estabeleceu parcelamento da dívida, agora em Recurso Especial
1143320, da Primeira Seção do STJ, j. 12/05/2010, rel. Min. LUIZ FUX, tomada em sede de
recurso repetitivo. Outra particularidade digna de nota é que a cobrança do encargo legal pelas
autarquias federais, em cuja qualificação se insere a ANATEL, é fruto de norma própria, qual
seja, a Medida Provisória 444/2008, convertida na Lei 11.941/2009, que alterou o artigo 37-a
da Lei 10.522/2002, para constar:
Art. 37-A – Os créditos das autarquias e fundações públicas federais, de
qualquer natureza, não pagos nos prazos previstos na legislação, serão
acrescidos de juros e multa de mora, calculados nos termos e na forma da
legislação aplicável aos tributos federais.
§ 1º - Os créditos inscritos em Dívida Ativa serão acrescidos de encargo legal,
substitutivo da condenação do devedor em honorários advocatícios, calculado
nos termos e na forma da legislação aplicável à Dívida Ativa da União.
§ 2º - O disposto neste artigo não se aplica aos créditos do Banco Central do
Brasil.

A norma em tela não inova, pois a jurisprudência, desde o antigo TRF, já entendia que
o encargo legal substitui os honorários advocatícios, e, nesse panorama, com diversas leis se
sucedendo no tempo, volta-se à questão central da análise deste crédito: qual a natureza jurídica
do encargo legal?. Nos parece realmente oscilante, a jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça, que ora vê̂, no encargo legal, o caráter tributário (ainda que com pouca clareza), e ora
o vê̂ como substitutivo de honorários de sucumbência, ou como receita de um Fundo Contábil.
Faremos, por amor à argumentação um exame breve das vertentes. O encargo legal não pode
ser tributo, não obstante o artigo 1o do Decreto-Lei 1.025/69 faça expressa referência a taxa, e
taxa, tal como prevista na Constituição Federal, pressupõe:

(i) exercício do poder de polícia ou


(ii) prestação de serviço público (art. 145, II, da CF).
91

Ou seja, taxa é um “tributo contraprestacional”77 achando-se vinculada a uma atividade


estatal específica em benefício do particular. Por outro lado, não houve exercício algum de
poder de polícia, tal como definido no artigo 78 do Código Tributário Nacional; tampouco foi
prestado serviço público ao contribuinte. O que se tem, em vez da contraprestação, é a atuação
estatal para benefício próprio (do próprio poder público), jamais em benefício do particular.
Assim, a inscrição na dívida ativa seria o fato gerador da taxa, que, todavia, é ato tomado em
detrimento do (suposto) devedor.
O encargo legal não se traduz em proveito ou vantagem ao futuro executado; antes, a
atividade de inscrição na dívida ativa, com o aumento de 20%, investe contra os interesses do
devedor. A taxa fundada na prestação de serviço tem como fundamento alguma atividade
prestacional do Estado ao particular; algum serviço fruível pelo particular. No caso, tomar
providências para expropriar o particular não se traduz, de forma alguma, em atividade
prestacional que lhe beneficie. Aliás, se dependesse do devedor, jamais haveria a inscrição na
dívida ativa, de sorte que jamais ocorreria a cobrança do encargo legal. Entendemos que a taxa
depende de ato voluntário do interessado, que, em decorrências de atuação estatal solicitada,
tem de paga-la e isso não é o que ocorre com o encargo legal. Tampouco o encargo legal é
imposto, pois, na definição do artigo 16 do CTN, o imposto pressupõe fato gerador relativo ao
contribuinte, isto é, “atividade realizada pelo contribuinte”78. No caso do encargo legal, não há
nenhuma atividade realizada pelo (suposto) contribuinte, o que há, é apenas a ação do Estado,
que movimenta a sua máquina administrativa com vistas a cobrar o devedor. A inscrição na
dívida ativa é um dever do provocado. A taxa é um tributo contraprestacional, posto que
vinculado a uma prestação estatal específica em favor do contribuinte e para Geraldo Ataliba
explica a taxa pela “referibilidade a uma concreta atuação do estado, diretamente relacionada
com o contribuinte”79 cuja tese é sufragada pelo Supremo Tribunal Federal. Por exemplo, no
julgamento do AG no RE com Agravo 925.652, voto do Min. Edson Fachin.

77
A doutrina afirma tal característica. Nesse sentido: “Daí afirmar-se que a taxa é a contraprestação de serviço
público, ou de benefício feito, posto à disposição, ou custeado pelo Estado em favor de quem a paga, ou por este”.
(BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1986, p. 325).
78
Neste sentido: “No caso dos impostos, o fato que desencadeia a aplicação da norma de incidência tributária é
necessariamente uma atividade realizada pelo contribuinte, sem que para tanto seja necessária a intervenção de
sujeitos ou entidades públicas. O contribuinte atua como um agente econômico, seja auferindo renda, detendo a
propriedade, comprando ou vendendo produtos, entre outros atos de mercado”. (PORTELA, André. Comentários
ao Código Tributário Nacional. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008, p. 59).
79
ATALIBA, Geraldo. Sistema Constitucional Tributário Brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
1968, p. 139.
92

Diz a doutrina que imposto é exigido de quem tenha realizado, independentemente de


qualquer atividade estatal, em seu benefício, o fato descrito em lei elaborada de acordo com a
competência especificamente outorgada pela Constituição. Ora, qual seria então o fato descrito
em lei, passível de prática pelo particular, com vistas à incidência da norma? Não há. E não há
por que o fato gerador é anterior à cobrança do encargo legal, seja o fato gerador um tributo,
seja uma multa punitiva. Não há hipótese tributária nem fato jurídico tributário. Como a
inscrição na dívida ativa é ato praticado pela própria administração pública, em razão da
ocorrência anterior de fato gerador, tem-se que esse ato administrativo não é o evento do mundo
físico apto a ser qualificado como fato gerador de tributo; não há atuação do particular.
Como encarece a doutrina, “...o fato gerador do imposto não está ligado a nenhuma
atividade estatal. Não é um ‘agir’ do Estado, mas sim uma manifestação de capacidade
econômica por parte do cidadão contribuinte”80. Ora, o encargo legal decorre, exclusivamente,
do agir do Estado, com a inscrição na dívida ativa, e posterior cobrança. Trata-se de um agir
unilateral, no interesse da arrecadação tributária; a inscrição na dívida ativa, enquanto
necessidade do Estado para fins de cobrança, é atividade administrativa vinculada, cuja omissão
pode até caracterizar improbidade administrativa81. Esse ato interna corporis não pode, sequer
em tese, ser eleito como fato gerador de tributo, sob pena de ofensa ao artigo 16 do CTN.
O inadimplemento de tributo gera multa, algo que se acrescenta ao valor originário;
outro acréscimo é pretendido pelo Estado, por meio do encargo legal, que também é algo que
se acrescenta ao valor originário, esse sim constituído por tributo. O encargo legal é externo ao
tributo e com ele não se confunde. Trata-se de imposição pecuniária a quem não honrou outra
obrigação pecuniária que o Estado entende fazer jus; e isso, como visto, não é tributo. A
atividade financeira do Estado, regida pelo princípio da estrita legalidade, enquanto conjunto
de ações do Estado para a obtenção da receita e a realização dos gastos para o atendimento das
necessidades públicas, dá-se por meio de tributos, por meio de receitas oriundas de seu
patrimônio (receitas patrimoniais) e receitas em razão da emissão de títulos públicos. O encargo
legal não se enquadra em nenhuma das hipóteses de atividade financeira do Estado, e, por isso,
e com a devida vênia, é inconstitucional.

80
SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Código Tributário Nacional. Anotações à Constituição, ao Código
Tributário Nacional e as Leis Complementares 87/1996 e 116/2003. São Paulo: Atlas, 2009, p. 143.
81
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO. AI 0060928-15.2003.8.26.0000. 11ª Câmara de Direito Privado
do Tribunal de Justiça de São Paulo (Extinto 1° TAC). Rel. Des. Urbano Ruiz. Julgado em 11/09/2003.
93

O custo administrativo com a inscrição na dívida ativa deve ser suportado pelos
impostos, e não pode ser cobrado do particular. A inconstitucionalidade dessa cobrança foi
notada há muito tempo. Todavia, o Administrador judicial, enquanto auxiliar do Juízo, no
âmbito de atividade administrativa, não goza da prerrogativa de deixar de aplicar a lei sob o
argumento da inconstitucionalidade. Por isso, na apreciação da divergência de crédito da
ANATEL, apesar da inconstitucionalidade, o Administrador Judicial entende que o crédito, a
título de encargo legal, deve ser incluído no passivo da recuperação judicial. Resta saber em
que classe deve ser alocado o respectivo crédito.

h. OUTROS CRÉDITOS: MULTAS ESTIMADAS

A ANATEL relaciona ainda outros créditos decorrentes de multa, em valores que ela
mesmo chama de “estimados”. Esses créditos, no valor total de R$ 4.583.085.046,45, decorrem,
diz a Agência, de multas em PADOS admitidos em TACs. Narra ainda a existência de
procedimentos recentes, que podem ensejar sanção pecuniária. As rubricas a esse título são: a)
qualidade, universalização e ampliação do acesso; b) direitos e garantias dos usuários (DGU);
c) interrupção; d) fiscalização e irregularidades técnicas. Desta feita, para as recuperandas, a
dívida relativa ao item “a” é de R$ 901.422.785,63, valor esse já́ incluído na declaração inicial.
Em relação aos demais itens, afirma que são objeto de tratativas, ainda não aprovadas pela
Diretoria da ANATEL. Reconhece apenas dois créditos, no valor, cada, um de R$ 50.629,60 e
outro de R$ 104.038,40, na posição de sucessora da Amazônia Celular Ltda. E, como são
créditos decorrentes de multas, aplica-se o entendimento exposto no item III.2 da manifestação
do Administrador Judicial. Entretanto, explica o administrador, é descabida a inclusão de
crédito ainda pendente de apuração, não obstante, pelo disposto no artigo 49 da Lei 11.11/05,
sejam créditos submetidos ao processo de recuperação judicial, pois nascidos antes da data da
distribuição do pedido de recuperação.

4.1.5.4 CONCLUSÃO DO ADMINISTRADOR JUDICIAL

A título de conclusão, expõe o Administrador Judicial o seguinte: “Diante do exposto,


o Administrador Judicial mantém o crédito da ANATEL na lista de credores, na classe III. O
valor total do crédito, consideradas as verbas acima referidas, é de R$ 11.093.373.667,13, e
daqui é gerada a decisão judicial que extraímos do interior teor:
94

Retifico, portanto, o valor dado à presente impugnação para que passe a ser
R$ 4.559.656.053,12, diferença entre os R$ 15.653.029.720,25, montante que,
de acordo com a ANATEL, corresponde ao mínimo que lhe seria devido pelas
recuperandas, e os R$ 11.093.373.667,13 que constam do edital do AJ.

“Ante o exposto, recebo e conheço a presente impugnação, para:


(i) retificar de ofício o valor dado à causa, para R$ 4.559.656.053,12, que é o benefício
econômico buscado pela Agência;
(ii) rejeitar a preliminar de inépcia da petição inicial suscitada pelas Recuperandas;
(iii) indeferir o pedido de suspensão da presente impugnação;
(iv) julgar parcialmente procedente o pedido (a) da inicial, no sentido de determinar que se
continue observando a prerrogativa de intimação pessoal dos órgãos de representação judicial
da autarquia, nos endereços eletrônicos mencionados na vestibular, salvo quando a LRF
estipular modo diverso de intimação, como é o caso da publicação por edital prevista no art.
7o, § 2o;
(v) julgar integralmente improcedente o pedido (b) da inicial, pelas razões acima expostas; e
(vi) acolher o pedido (c) da inicial, determinando-se que as recuperandas sejam intimadas para
detalhar a natureza e a origem do crédito apontado em sua lista, com a indicação dos números
dos processos administrativos e judiciais que dão origem a tal montante, no prazo de 5 dias.
Após a apresentação pelas recuperandas das informações sobre o crédito listado, abra-se vista
pelo prazo de 5 dias para a ANATEL detalhar a natureza e a origem do crédito que entende ser
credora, com a indicação dos números dos processos administrativos e judiciais que dão origem
a tal montante. Com a vinda dessas informações, intime-se o Administrador Judicial e o
Ministério Público. Providencie o cartório a juntada nos autos dessa impugnação do parecer do
AJ que consta às fls.198.966/198.998 do processo principal.”
ANEXOS temporais e atualizações:

4.1.5.5 ASPECTOS ATUAIS DE TRATAMENTO AO CRÉDITO TRIBUTÁRIO E PÚBLICO

Atualmente o crédito tributário tem sido objeto de inúmeras e acaloradas discussões,


tecidas as definições e distinções necessárias nos capítulos anteriores, no tocante ao crédito
tributário, ou seja, o tributo, diferenciando-as das sanções aplicadas pelo descumprimento seja
da obrigação principal ou acessórias, bem como os créditos de natureza não tributária como por
exemplo aqueles provindos de autarquias ou de agencias reguladores, é importante discorrer
sobre as medidas atuais criadas para adimplemento destes créditos.
95

Ao se tratar de empresa em recuperação judicial, o entendimento pacífico no sentido de


que o crédito tributário não se sujeita ao instituto da Recuperação Judicial, eis que há previsão
para tanto na Lei de Execuções Fiscais, no Código Tributário Nacional, bem como na própria
norma de insolvência (Lei n. 11.101/2005), hoje, é objeto de vastas discordâncias, inclusive
pela inexistência de parcelamento eficaz de forma a sanar a determinação prevista no §3º do
artigo 155- A do Código Tributário Nacional.
Ao falarmos de Recuperação Judicial e Crédito Tributário, estamos tratando de um
“movimento pendular” que sempre se amolda ao lado dos interesses do Fisco, pois de um lado
encontra-se o instituto da recuperação judicial visando o restabelecimento da saúde financeira
dessa empresa e seu soerguimento em condições factíveis de continuar no mercado, baseado
em princípios como o da função social da empresa, e, do outro lado, o Fisco, com sua fúria
arrecadatória, buscando por inúmeros meios o pagamento de seu suposto crédito, podendo
assim tornar infrutífero todos os esforços despendidos para a continuidade da atividade
empresarial.
Após a questão em comento ser objeto de inúmeras discussões, chegou-se a conclusão
de que não há como tratar da recuperação judicial de uma empresa sem olhar para seu próprio
passivo tributário, visto que cuidar da questão de forma apartada é o mesmo que “dar com uma
mão e tirar com a outra”.
O Art. 155-A do Código Tributário Nacional que determina a criação de um
parcelamento especial para empresas em recuperação judicial, ensejou a criação do
parcelamento previsto no art. 10-A da Lei 10.522 de 2002, incluído pela Lei nº 13.043, de 2014,
ocorre que este nunca fora e não é suficiente para quitar o passivo de uma empresa já em
situação de grande dificuldade, bem como a Lei em comento trata apenas do passivo federal,
devendo cada estado e municipalidade criar o seu próprio parcelamento. Tendo em vista a
insuficiência desta medida para quitação do passivo, outros institutos foram criados ou
adaptados para tratar do adimplemento destes créditos.
O Negócio Jurídico Processual, com previsão no artigo 190 do Código de Processo
Civil, § 13 do artigo 19 da Lei 10.522 de 2002, incluído pela Lei nº 13.874 de 2019 e já
regulamentado pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), é um dos meios
inovadores criados para a quitação do passivo federal, sem fazer qualquer diferenciação entre
o crédito tributário, o crédito não tributário, inclusive incluindo a possibilidade de quitar os
débitos provindos de FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço). Aliás, notadamente,
tal norma diferencia os créditos públicos que estão contidos na cobrança do crédito “tributário”,
inscrito na dívida ativa ou não.
96

A Transação encontra previsão no artigo 171 do Código Tributário Nacional, devendo


nos termos do parágrafo único a lei indicar a autoridade competente para autorizar a transação,
e após mais de 50 (cinquenta) anos, fora criada Lei 13.988 de 2020, já regulamentado pela
PGFN, tratando modalidades diversas para quitação do crédito. Em ambos os casos, tanto no
Negócio Jurídico Processual ou na Transação, é concedido a empresa em recuperação judicial
situação diferenciada, inclusive na qualificação dos créditos a serem adimplidos, tratando estes
como “irrecuperáveis ou de difícil recuperação”.
Na mesma toada, o Projeto de Lei nº 4458, de 2020 (Câmara dos Deputados PL
6229/2005) que pretende alterar a Lei nº 11.101/2005 e a Lei 10.522 de 2002, trouxe condições
especiais para o parcelamento e pagamento em definitivo do crédito tributário, inclusive
fazendo menção a Lei nº 13.988 de 2020, que prevê a possibilidade de transação. A lição do
professo Daniel Carnio Costa vem, em bom tempo, modernizar o atual senário da recuperação
judicial, há saber:

“A substancial reforma da Lei nº 11.101/2005,


operacionalizada pela Lei n 14.112/2020, criou um novo sistema
de insolvência empresarial que merece ser estudado a fundo. As
novas ferramentas jurídicas trazidas pela reforma modernizaram
a legislação brasileira, colocando-a em linha com os mais
modernos diplomas legais do mundo82.”

Ocorre que, ao mesmo tempo que estão sendo criados meios inovadores para o
adimplemento do passivo em cobro pelo Fisco, não sendo ainda possível de mensurar ainda sua
eficácia, estes meios também trazem maiores desconforto e preocupação a empresa celebrante,
como por exemplo, o previsto no inciso IV do §4º do artigo 10-A que altera a Lei 10.522 de
2020, prevê a faculdade de a Fazenda Nacional requerer a convolação em falência caso ocorra
o rompimento do parcelamento.
A situação acima abarcada traz duas grandes preocupações; a primeira é que a Lei nº
10.522 de 2020, refere-se apenas ao parcelamento no âmbito federal e por este motivo a
faculdade de pleitear a convolação em falência é unicamente e exclusiva da Fazenda Nacional,

82
COSTA, Daniel Canio. Comentários à Lei de Recuperação De Empresas E Falências. 1ª ed. – Curitiba:
Juruá, 2021.
97

a questão que paira é se após a criação pelos estados e municipalidades de lei que estabelece o
parcelamento especial para empresas a recuperação judicial, estas também poderão se assim
entenderem pleitear a convolação em falência da empresa recuperanda.
A segunda preocupação é no sentido de que, mesmo que a empresa esteja cumprindo
devidamente o plano de recuperação judicial se, por algum motivo, seja por falta de caixa ou
até se por um lapso deixar de adimplir com o parcelamento e este vier a romper, mesmo estando
em dia com as obrigações previstas na Lei de Recuperação Judicial e Falência, estará suscetível
a possível convolação em falência. Um exemplo prático é o da recuperação judicial da OI, que
após vasta discussão aderiu a transação individual para adimplir os créditos proveniente de
multa da ANATEL, mesmo que a empresa esteja em dia com suas obrigações, caso venha por
qualquer motivo ser excluída, estará vulnerável ao pedido do fisco de pleitear sua convolação
em falência.
Ocorre que, com a alteração prevista no PL nº 4458, de 2020, o Fisco continua não se
sujeitando a recuperação judicial e mesmo assim pode pleitear a convolação da recuperação
judicial em falência, tornando-se desproporcional os poderes a este concedido, anti-isonômico
inclusive causando enorme dano aos credores sujeitos a Recuperação Judicial.
Não obstante a todas as preocupações trazidas pelo PL nº 4458, de 2020, que aguarda
apenas sanção ou veto presidencial83, ainda encontra-se em discussão no Supremo Tribunal
Federal a exigência da apresentação de CND para empresas em recuperação judicial
(Reclamação nº 43.169), anteriormente dispensada pelo Superior Tribunal de Justiça, em
decisão liminar do Ministro Luiz Fux, este entendeu pela necessidade de apresentação da
certidão, sendo revogada pelo Ministro Dias Tofolli ao assumir a relatoria do processo após o
Ministro Fux tornar-se presidente da Corte. Em que pese a revogação da decisão liminar que
exigia a apresentação de CND, esta ainda não causa segurança, visto que o fundamento aplicado
pelo Ministro Tofolli para revogar a decisão anterior fora que a matéria é infraconstitucional,
devendo ser apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça, sem adentrar ao mérito da discussão.
Todos os institutos aqui elencados possuem o intuito de adimplir o crédito devido ao
fisco, porém além de não haver comprovação de que este é suficiente para quitação do passivo
sem inviabilizar o caixa da empresa em recuperação, que precisa pagar os credores sujeitos a
recuperação, comprar matéria prima para o desenvolvimento da atividade, pagar seus

83
SENADO FEDERAL. Projeto de Lei n° 4.458, de 2020. Disponível em:
<https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/144510>. Acesso em: 20.nov.2020.
98

funcionários, dentre outras despesas necessárias, ainda a coloca em grave risco, visto que
qualquer erro que enseje no rompimento seja do parcelamento ou negociação por meio de
Transação ou ainda Negócio Jurídico Processual, torna a empresa vulnerável ao pedido de
convolação em falência.
99

5 LIÇÕES E PRÓXIMOS PASSOS (CONCLUSÃO)

Diante de todo o exposto, resta claro que, a legislação de insolvência é boa e deve ser
aplicada. Contudo, para que seus efeitos sejam devidamente obtidos, mesmo com suas lacunas,
devemos nos apoiar em magistrados corajosos, que dão a melhor interpretação aos seus artigos
em face de cada situação a ser conhecida e interpretada pelo nosso Poder Judiciário.
Ora os tributos vencidos e vincendos, são uma barreira a ser vencida pelas recuperandas.
Veja, durante muitos anos, as recuperandas, mesmo antes da pandemia – COVID-19, vêm se
alavancando financeiramente no tocante a falta de pagamento dos tributos devidos. Ocorre que
a atual recuperação judicial resolve todos os “problemas” com os credores privados ante a
aprovação do plano de pagamentos dos créditos sujeitos aos efeitos do citado PRJ. Contudo, os
créditos tributários (sejam vencidos ou vincendos) se tornarão um monstro a ser tratado após a
concessão da Recuperação Judicial – Não obstante a apresentação de Certidão Negativa ou
Certidão positiva com efeitos de negativa de Créditos Tributários.
Quando falamos em “monstro” a locução não é errada, eis que aos créditos tributários
vencidos, não há qualquer tratamento satisfatório que se coadune ao soerguimento da empresa
em recuperação judicial quanto aos créditos tributários e créditos públicos. Ora, mesmo que
aprovado ao plano de recuperação judicia, os créditos tributários (erroneamente) não estão
sujeitos aos efeitos do processo de recuperação judicial na legislação vigente, portanto,
mantêm-se livres para continuar seu rito de ataque aos ativos da empresa recuperanda.
Assim a melhor interpretação da norma recuperacional é no sentido de evitar a que o
ônus da dívida sujeita (ou não) aos efeitos da recuperação judicial sejam suportado por apenas
uma das partes, sejam elas credoras ou devedoras. A corroborar com este entendimento está a
Teoria da Divisão Equilibrada de Ônus, Superação do Dualismo Pendular e Gestão
Democrática de Processos, criada pelo professor Daniel Carnio Costa. “Tem-se, portanto, que
a boa aplicação dos institutos trazidos pela Lei no 11.101/05 somente será alcançada através da
interpretação de seus institutos pela teoria da supe-ração do dualismo pendular, entendendo-se
a eficiência de resultados como elemento integrante dos processos de falência e a recuperação
judicial. Deve o magistrado conduzir as soluções de forma ágil e democrática, aplicando
modelo de gestão processual diferenciado e cuidando para distribuir equilibradamente os ônus
que cada um dos agentes atuantes nesses processos de insolvência deve suportar, de modo a
garantir o sucesso da prestação jurisdicional em benefício do interesse público e social.
100

Ora, se o bem jurídico a ser protegido pela Lei n. 11/101/2005 é exatamente a


sobrevivência da atividade empresarial que gera empregos, proporciona o pagamento das suas
dívidas e promove a atividade econômica, que por sua vez, dá ensejo a incidência das normas
tributárias criando as obrigações tributárias, nada mais correto do que haja a efetiva superação
do dualismo pendular que sempre pende para o lado do fisco. Nesse sentido, a lição do professor
Daniel Carnio Costa, que propõe a “necessidade de superação desse dualismo pendular,
deslocando-se o foco da interpretação para a busca da finalidade útil do instituto jurídico. A
finalidade do instituto e o bom funcionamento do sistema jurídico devem prevalecer sobre a
proteção do interesse de um dos polos da relação de direito material.”

O Projeto de Lei nº 4458, de 2020 (Câmara dos Deputados PL 6229/2005), convertido


na Lei nº 14.112/2020 que alterou a Lei nº 11.101/2005 e a Lei 10.522 de 2002, que prevê o
parcelamento em especial para empresas em recuperação judicial, aprovado pela Câmara e pelo
Senado, traz alterações importantes relacionadas ao crédito tributário aumentando o leque das
possibilidades de parcelamento porém facultando a Fazenda Nacional a requerer a convolação
da recuperação judicial em falência.
Nem se diga que o parcelamento especial traz solução à questão dos débitos tributários.
Seu modelo é pior do que “todos” os programas de parcelamento e pagamento dos créditos
tributários. Veja-se, por exemplo, o PERT., que concede redução das multas e juros e
parcelamento em várias parcelas durante anos, sendo assim, hoje temos uma péssima situação
quanto à inviabilidade de adimplir o crédito tributário com o parcelamento especial ofertado e,
futuramente, caso seja sancionado o Projeto de Lei em comento, o risco é não conseguir a
adimplir um parcelamento “supostamente mais benéfico” e ser surpreendida com o pedido de
falência por parte da Fazenda Nacional.
Não obstante, por conta da alta carga tributária que o contribuinte é obrigado a suportar,
acarretando muitas das vezes em um estrondoso passivo tributário, as empresas são
impossibilitadas de apresentar Certidão Negativa de Débitos, nem se quer CPEN (Certidão
Positiva com Efeito de Negativa), pois ao se tratar de empresa em Recuperação Judicial o
parcelamento ofertado é ineficaz, sendo a exigência de CND recente motivo de discussão no
Supremo Tribunal Federal, o Ministro Luiz Fux prolatou decisão entendendo pela exigência da
CND para empresas em recuperação judicial, a qual fora revogada pelo Ministro Dias Toffoli,
ao assumir a relatoria do caso após Fux tornar-se presidente da Corte, entendendo que a matéria
é infraconstitucional.
101

Nesse sentido, o presente trabalho é bastante importante no sentido de demonstrar que


os efeitos da recuperação judicial devem “atingir” os créditos públicos que não sejam de
natureza tributária. Tal sujeição dos valores decorrentes dos encargos pelo não pagamento
espontâneo dos tributos devidos, ou seja, dos créditos públicos de natureza não tributária, torna
a recuperação judicial factível.
O atual cenário demonstra que sem uma solução factível para os créditos tributários
existentes à época do pedido de recuperação judicial, bem como, aqueles devidos durante o
período em que o processo recuperacional esteja em vigor, não haverá o efetivo soerguimento
da crise econômico-financeiro que assola a empresa recuperanda.
Para tanto, o desafio é demonstrar aos operadores do direito que devem separar os
créditos tributários (tributos) que não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial, dos
demais créditos públicos (multas, juros, encargos e etc). A separação dos créditos públicos
(tributários dos não tributários) pode trazer verdadeiro benefício para toda a sociedade, na
medida em que o Estado receberá os valores devidos à título de débitos tributários em sua
integralidade e os consectários, por não terem natureza tributária, podem ser quitados na forma
do plano de recuperação judicial, conforme ocorrido no caso da recuperação judicial do “Grupo
Oi” e o tratamento dado às multas - créditos públicos não tributários, que se sujeitaram aos
efeitos do plano de recuperação judicial aprovado.
102

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