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CAPA//INQUÉRITO REFORMA

Viver com que


reforma?
A MAIORIA DOS PORTUGUESES
ativos não está a preparar
financeiramente a reforma, e mais
de metade dos reformados afirma Perfil dos
que a pensão não é suficiente para
as despesas, revela um inquérito
65-84
anos
da DECO PROTESTE
Texto Myriam Gaspar & Filipa Rendo Perfil dos

A
os 20 e 30 anos, ninguém pensa
25-65
anos
na reforma. É compreensível.
É um desígnio longínquo. Aos
40 e 50, a sustentabilidade da
Segurança Social é aflorada em jantares
de amigos. Haverá dinheiro para pagar
as pensões no futuro?, questiona-se.
Ao chegar aos 60, faltam poucos anos
para deixar de cumprir horários e ordens
superiores. A reforma é aguardada com
expectativa. Mas será a pensão suficiente
para manter o nível de vida? Com o
objetivo de auscultar as perspetivas e os
conhecimentos em matéria de reforma
dos portugueses que estão ainda no ativo,
bem como sondar a experiência dos
atuais pensionistas, a DECO PROTESTE
elaborou um inquérito entre abril e
maio de 2022. Este estudo conjunto com
as associações de consumidores suas
congéneres na Bélgica, em Itália e em
Espanha incidiu sobre duas amostras
representativas da população: uma dos
25 aos 65 anos e outra abrangendo a faixa
etária dos 65 aos 84 anos. Comecemos
por quem ainda está na vida ativa.

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PERFIL DOS 25
As expectativas dos que têm MOTIVO PRINCIPAL PARA POUPAR PARA A REFORMA
menos de 65 anos
De acordo com o mais recente Ageing
Report, da Comissão Europeia, a
diferença entre o último salário no

56% 19% 9% 5%
ativo e a pensão (conhecida por taxa de
substituição) baixará, gradualmente,
dos atuais 74% para menos de metade Ter Poder pagar Ter dinheiro Ter dinheiro para
do último salário, a partir da década de independência as despesas para ajudar um lar ou cuidados
2050. Uma consequência do aumento financeira de saúde os filhos de saúde em casa
da esperança de vida e do cada vez
menor número de trabalhadores por
cada pensionista (sete em cada dez, em
2050). Por essa razão, a pergunta “está
atualmente a preparar financeiramente
a reforma?” é relevante. A resposta, 5%
Pagar outras despesas
3%
Poder
2%
Para hobbies e
1%
Pagar cuidados
contudo, não é animadora. A maioria
dos inquiridos entre os 25 e os 65 anos (gastos com o carro, viajar atividades sociais pessoais ou da
a casa, etc.) casa, se precisar
admitiu não estar ainda a fazê-lo (61%),
sendo a tendência transversal aos quatro
países do estudo. Como argumento
principal, alegam não terem dinheiro PRINCIPAL RAZÃO PARA NÃO ESTAR A PREPARAR
suficiente. Todavia, em Portugal, a FINANCEIRAMENTE A REFORMA
percentagem é mais expressiva, fruto,
porventura, dos baixos salários. Não tenho dinheiro Sou muito novo
Os restantes motivos variam de acordo 31% e é ainda cedo 7%
suficiente
com as faixas etárias. Por exemplo,
Tenho outras despesas O empregador paga um
entre os 25 e os 34 anos, 12% dos 23% sistema complementar 4%
nacionais inquiridos consideram serem prioritárias
muito novos para se preocuparem com Não sei como 13% Outras 2%
esse assunto, enquanto 15% não sabem
como fazê-lo. Dos 35 aos 49 anos, um Considero a minha
Vou ter dinheiro
quarto argumenta ter outras despesas pensão legal suficiente 10% suficiente na reforma 1%
prioritárias. Não me preocupo
Entre os que poupam, os belgas são
com isso
9%
os que iniciam mais cedo (37 anos)
e os portugueses mais tarde (42 anos).
No que toca às aplicações, os depósitos a
prazo são o produto eleito pela maioria, NÍVEL DE CONHECIMENTO SOBRE O VALOR Não
sabe
confirmando o conservadorismo DA PENSÃO LEGAL QUE IRÁ RECEBER
dos nacionais. Tendo em conta as taxas
65% 69%
de juro praticadas pelos bancos, não é, 63%
de todo, a solução ideal.
Sim,
Questionados sobre se o valor aproxima-
amealhado será suficiente para 45% 47% damente

satisfazer as necessidades, apenas uma


percentagem mínima de portugueses 31% 31% 28%
Sim, com
afirmou ser mais do que suficiente exatidão
(2 por cento). O “sim” e o “não” têm
valores próximos. O nosso país tem, 8% 4% 6%
porém, das maiores percentagens de 3%
inquiridos a responderem que não sabem
(23 por cento). Bélgica Itália Portugal Espanha

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AOS 65 ANOS
EXPECTATIVA SOBRE A RELAÇÃO ENTRE O MONTANTE Embora as projeções da Comissão
DA PENSÃO E O ÚLTIMO SALÁRIO Europeia não sejam animadoras,
quase um terço dos inquiridos tem a
expectativa de vir a receber como pensão

10% 22% 30%


Entre metade
entre 50% e 75% do último salário. Cerca
de um quarto acredita mesmo que pode
Acho que não Inferior a metade ter entre 75% e 100 por cento. Quanto ao
terei pensão do último salário e menos de 75%
valor, a maioria desconhece quanto vai
do último salário
receber (63 por cento). Para ajudar a saber
quanto precisa de poupar e investir por

26%
Entre 75% e menos
9%
O mesmo que
3%
Mais do que
mês, de forma a manter o nível de vida,
a DECO PROTESTE disponibiliza uma
ferramenta em www.deco.proteste. pt/
de 100% do último o último salário o último salário
salário investe/reforma/calculadoras. Se tem
um PPR, compare-o com as Escolhas
Acertadas em www.ganhemaisnoppr.pt.
Chegado o momento crucial de saída
da vida ativa, é quase inevitável haver
MAIS DE UM QUARTO DOS PORTUGUESES ACREDITA uma redução no rendimento. Por razões
QUE RECEBERÁ DE PENSÃO UM VALOR APROXIMADO AO financeiras, mais de 50% da amostra
DO ÚLTIMO SALÁRIO. MAS ESTIMA-SE QUE CAIA PARA 43% portuguesa admite que terá de mudar
hábitos no que diz respeito à casa, ao
carro, a cuidados médicos e medicação,
a compras diárias, a roupa, a férias e
QUAL É A IDADE RAZOÁVEL OU IDEAL PARA SE REFORMAR? viagens, a hobbies e a atividades sociais.
Os portugueses são os que mais
0% 0% desejam reformar-se antes dos 60 anos
5% > 70 anos
5% > 70 anos (83 por cento). Mas, à semelhança dos
66-70 anos 15% 66-70 anos 21% italianos, quase metade admite que vai
40-55 anos 40-55 anos
fazê-lo apenas entre os 66 e os 70 anos:
21% muito provavelmente, para evitar
61-65 anos
uma penalização severa no montante
a receber.

33% Como vivem os atuais


61-65 anos 47% 53% reformados
56-60 anos 56-60 anos
Antes de se reformarem, cerca de 56%
dos inquiridos estavam convencidos
Bélgica Itália de que a pensão legal seria suficiente
para fazer face às despesas. Por esse
motivo, apenas 39% dizem ter preparado
0% 1%
3% > 70 anos 6% > 70 anos a reforma. Contudo, a principal razão
66-70 anos 11% por que quase metade dos portugueses
23% 66-70 anos
40-55 anos
14% 40-55 anos
não preveniram este período da vida
61-65 anos é a mesma dos que estão na vida ativa:
falta de dinheiro para poupar.
Infelizmente, para 43% dos nacionais,
a pensão legal será a única fonte de
37% rendimento. De acordo com as respostas
61-65 anos
obtidas, confirma-se a quebra do
60% 45% rendimento: 471 euros é a diferença
56-60 anos 56-60 anos
média entre o valor da pensão e o último
Portugal Espanha salário que receberam.

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PERFIL DOS 65
Se, por um lado, na entrada da ANTES DE SE REFORMAR, ACHAVA QUE
reforma, há despesas relevantes que Sim
A PENSÃO LEGAL SERIA SUFICIENTE?
se pressupõem desaparecer, como
a prestação do crédito à habitação, Não 63%
outras surgem em sua substituição.
54% 52% 52%
É caso de tratamentos médicos, que
44%
podem aumentar. Com efeito, 71% dos 38% 36%
inquiridos revelam que, se precisarem
de apoio, para, por exemplo, limpeza 27% Mais
do que
da casa, preparação de refeições ou 21% suficiente
cuidados de higiene pessoal, o valor
da pensão que recebem não permitirá 8% 4%
pagar essas “mordomias”. Muito menos
1%
suportar o pagamento de uma residência
para seniores, uma dificuldade sentida
Bélgica Itália Portugal Espanha
também nos outros três países, mas não
na mesma medida.
Devido à escassez financeira, quase
um quinto dos nacionais admite que MOTIVO PRINCIPAL POR QUE NÃO POUPOU PARA A REFORMA
teve de pedir apoio a familiares e amigos.
E, apesar de precisarem, 15% não o
fizeram, talvez por vergonha ou por não
terem a quem recorrer. Nos últimos dois
50% 22% 14%
Não tinha Pensei que o valor Tinha outras
anos, como pode ver nestas páginas, é
dinheiro da reforma seria despesas
considerável a lista de itens e atividades suficiente prioritárias
suficiente
a que uma percentagem significativa teve
de renunciar.
Não tivessem sido algumas decisões
tomadas (ou por tomar), o valor da
7% 5% 2%
Não me Outra A minha entidade
pensão que agora recebem poderia ser preocupei com razão patronal contribuiu
diferente, para melhor: há quem lamente o assunto para um sistema
ter trabalhado demasiado em atividades complementar
não declaradas (34%); não ter poupado
(33%); ter perdido uma oportunidade
de carreira com um salário mais elevado
(20%); ou ter feito uma interrupção RAZÃO POR QUE FOI PARA A PRÉ-REFORMA OU ANTECIPOU A REFORMA
na carreira (20 por cento).
Problemas de Já não me sentia
Para aferir se vivem agora melhor
saúde física 35% motivado 6%
ou pior, foi pedido aos inquiridos
que comparassem, em vários campos, A empresa fechou Problemas de
a sua vida antes e depois da reforma. ou foi à falência 16% saúde mental 6%
A saúde física foi o campo que sofreu
Pressão ou stresse Necessidades familiares
mais impacto: 76% dos inquiridos em excesso 14% (por exemplo, para tomar 5%
queixam-se de se ter agravado. Em menor conta de um familiar)
percentagem, os belgas, os italianos e os Fui despedido
espanhóis lastimam-se do mesmo (55%, ou convidado a sair 13% Despedimento coletivo 5%
60% e 51%, respetivamente). Já a situação Já não conseguia
Queria aproveitar a
financeira piorou nos quatro países. vida enquanto podia 9% adaptar-me aos requisitos
do trabalho
4%
Quanto à saúde mental, o panorama
também não é brilhante: quase metade Estava Falta de oportunidade
dos portugueses inquiridos diz estar pior, desempregado 8% para ser promovido 3%
contra 22% dos belgas, 23% dos italianos Outra
e 22% dos espanhóis. No cômputo geral, razão 8%

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AOS 84 ANOS
DE QUE DECISÕES SE ARREPENDE, POR TEREM IMPACTO NEGATIVO apenas um quinto dos nacionais admite
NO VALOR DA PENSÃO? que a sua vida melhorou. Para 28%,
manteve-se igual.

Preparar a reforma é essencial


Ao compararmos as duas amostras deste
inquérito, concluímos que os inquiridos

34% 33% 20% 20%


entre os 25 e 65 anos estão, com razão,
mais pessimistas relativamente à pensão
Ter trabalhado Não ter poupado Ter perdido uma Ter feito uma que os espera: apenas 36% (contra 52%
demasiado em ou investido para oportunidade interrupção dos que têm mais de 65 anos) consideram
atividades não a reforma de carreira com na carreira que será suficiente. A alteração de hábitos
declaradas salário mais elevado de vida será inevitável.
Em resumo, sem poupar, dificilmente
será possível obter uma almofada que
lhe permita manter o nível de vida a
que se habituou ao longo dos anos.
NÃO POSSO OU É PROVÁVEL NÃO VIR A PODER PAGAR ESTES SERVIÇOS O erro que salta mais à vista, e transversal
COM A MINHA PENSÃO a todos os países, é começar a aforrar
tarde. Em Portugal, apenas 39% estão
a preparar a reforma. Considerando
que um estudo recente da Nova SBE, de
Carcavelos, reforça as conclusões do
Ageing Report, o ideal seria começar a

72% 72% 71% preparar a reforma o mais cedo possível,


logo no início da vida profissional.
Cuidados de saúde Permanência num lar Serviços ao domicílio Com efeito, quem tem agora entre
ao domicílio de idosos (refeições, limpeza 30 e 40 anos de idade, previsivelmente,
da casa, cuidados
irá obter, mais tarde, uma taxa de
de higiene, etc.)
substituição de apenas 43 por cento.
O excesso de conservadorismo na
escolha dos produtos financeiros é
outro erro comum. Depósitos a prazo
NOS ÚLTIMOS DOIS ANOS, DE QUE TEVE DE ABDICAR DEVIDO e contas de poupança são ainda os
A QUESTÕES FINANCEIRAS? produtos favoritos: 22% optam,
exclusivamente, por estas soluções.
Comprar Por sua vez, os fundos de pensões têm
Fazer férias 72% e reparar 59% pouca expressão em Portugal, sendo
e viagens eletrodomésticos os planos de poupança-reforma (PPR)
Frequentar Contratar o produto específico com maior peso.
restaurantes 69% empregado 56%
doméstico Mas, segundo dados oficiais, os PPR
sob a forma de seguro, que garantem
Comprar 69% Pagar apoio 54% o capital, são os mais comuns e também
carro domiciliário
os que proporcionam menor rendimento.
Comprar 68% Usar o 52% As empresas (e os fundos de pensões)
roupa carro têm um papel residual no planeamento
Fazer manutenção das pensões entre nós. Por fim, o
Realizar obras 67% e reparação 46%
em casa montante poupado é inferior a metade
do carro
do que se aforra na Bélgica e em Itália.
Ajudar Pagar cuidados
financeiramente 67% médicos e 37% Não chega.
familiares medicamentos
Ter hobbies e Fazer uma DOSSIÊ TÉCNICO Ana Almeida e António Ribeiro
atividades sociais
64% alimentação 36%
saudável

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