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Teoria da organização industrial e regime jurídico do

agronegócio

TEORIA DA ORGANIZAÇÃO INDUSTRIAL E REGIME JURÍDICO DO


AGRONEGÓCIO
Industrial organization theory and the legal status of the agribusiness
Revista de Direito Empresarial | vol. 13/2016 | p. 275 - 285 | Jan - Fev / 2016
DTR\2016\538

Renato Macedo Buranello


Doutor em Direito Comercial pela PUC-SP. Professor do Insper. Membro da Câmara de Crédito e
Comercialização do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Advogado com
atuação nas áreas do Direito do Agronegócio, Direito Bancário e do Mercado de Capitais.
rburanello@demarest.com.br

Área do Direito: Comercial/Empresarial


Resumo: O presente artigo trata da nova conceituação do agronegócio e de seu regime jurídico
atual, através da Teoria da Organização Industrial e dos estudos relativos aos custos de transação.

Palavras-chave: Agronegócio - Teoria da Organização Industrial - Custos de transação - Sistema


agroindustrial - Mercado agrícola - Direito do agronegócio.
Abstract: This article deals with the new concept of agribusiness and its current legal framework,
through the Theory of Industrial Organization and surveys of transaction costs.

Keywords: Agribusiness - Industrial organization theory - Transactions costs - Agribusiness system -


Agricultural market - Agribusiness law.
Sumário:

1 Economia dos custos de transação e a organização dos sistemas agroprodutivos - 2 Mercado


agrícola e o estado como agente regulador - 3 Desenvolvimento agroindustrial e regime jurídico do
agronegócio - 4 Bibliografia

1 Economia dos custos de transação e a organização dos sistemas agroprodutivos

Os custos de transação são aqueles necessários para se colocar o mecanismo econômico e social
em funcionamento. São custos não diretamente ligados à produção, mas que surgem à medida que
os agentes econômicos se relacionam entre si e os problemas de coordenação de suas ações
emergem. Frequentemente, não há garantias ao perfeito funcionamento dessas atividades não
diretamente ligadas à produção, nem, tampouco, possibilidade de controle sobre elas.
Consequentemente tornam-se mais relevantes as análises relacionadas aos custos de transação.

Assim, com o surgimento de problemas de coordenação das ações dos agentes econômicos, os
elementos das organizações se tornam mais relevantes, pois permitem a redução de custos
associados a essa coordenação. Além disso, as organizações podem representar o papel de
instrumentos de coordenação, representando menores custos de desenvolvimento. A Teoria de
Organização Industrial1 analisa como os processos de mercado orientam as atividades dos
produtores no sentido de atender a demanda dos consumidores. Assim, a teoria visa compreender
como esses processos falham, se ajustam ou podem ser ajustados, de sorte a alcançarem um
desempenho mais próximo possível de um padrão ideal.

Portanto, defende-se que as atividades produtivas e a demanda da sociedade são harmonizadas por
meio de algum mecanismo organizacional no livre mercado. Variações e imperfeições neste
mecanismo afetam o grau de sucesso alcançado pelos produtores em satisfazer os desejos da
sociedade em termos de bens e serviços. É possível que se faça uma invenção governamental, para
se ajustar esse mecanismo organizador, visando aproximar o desempenho do ideal competitivo.

A aplicação dos "custos de transação" exigem um conhecimento detalhado da indústria/sistema a ser


estudado, uma vez que as condições de incerteza, especificidade de ativos e outros atributos são
diferentes a cada transação. Temos como exemplo o fato de que mesmo considerando apenas o
agronegócio existe uma diversidade considerável entre os produtos, tornando impraticável uma
análise genérica da organização das transações.

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agronegócio

O atributo mais notável dos produtos agrícolas é sua perecibilidade, que lhes confere especificidade
temporal. As variações na estabilidade inerente dos produtos agrícolas e nos custos de sua
preservação assumem importância decisiva nas formas organizacionais de suas transações.
Também, a baixa relação valor-peso de grande parte dos produtos, que torna a localização
geográfica altamente específica à medida que o processamento reduz essa relação.

Há uma organização dos sistemas produtivos, que são definidos como um conjunto de relações
verticais estabelecidos por contratos. Esses contratos, formais ou informais, representam estruturas
de governança intersegmentos e formam uma ordenação lógica. A organização está associada às
características das transações que se estabelecem entre os segmentos do sistema produtivo
(atividades econômicas relacionadas) em um dado ambiente institucional.2

A análise conjunta do direito, da economia e das organizações tem relevância por possibilitar
entendimento mais profundo da complexidade da realidade de determinados segmentos. Sendo
assim, o Direito e a Economia exercem papel fundamental na formação de instituições e
organizações. Estas, por sua vez, influenciam a transformação do sistema jurídico e a consecução
de resultados econômicos. Portanto, o direito, ao estabelecer regras de conduta que modelam as
relações intersubjetivas, deverá levar em conta os impactos econômicos que delas derivam, pois
gera efeitos sobre a distribuição ou alocação dos recursos e os incentivos que influenciam o
comportamento dos agentes econômicos privados.3

Na forma atual e compreendendo os estudos mais avançados sobre o tema, entende-se que um
Sistema Agroindustrial (SAG) específico é composto por firmas com distintos níveis de coordenação
vertical. Os SAGs compreendem os segmentos antes, dentro e depois da porteira da fazenda,
envolvidos na produção, transformação e comercialização de um produto agrícola básico até chegar
ao consumidor final. Aqui, convergem os conceitos de filiére na tradição francesa e de ACS (
Agribusiness Commodity System) na tradição americana, dentro de concepções teóricas distintas.
Enquanto o conceito francês privilegia as relações tecnológicas, o de ACS enfatiza a coordenação.

No início dos anos 1990, o conceito de sistemas ou cadeias de agronegócios difundiu-se no Brasil.
Universidades revisaram os seus departamentos de Economia Agrícola e também foi alterado o
tradicional enfoque das políticas públicas. Concomitantemente, o Programa de Estudos de Negócios
do Sistema Agroindustrial (Pensa), da USP, buscou inserir o papel das instituições e dos custos de
transação nas cadeias agroprodutivas. Esta perspectiva gerada pela visão sistêmica tem contribuído
para o desenvolvimento do agronegócio através da organização de arranjos cada vez mais
complexos, mas invariavelmente mais eficientes e cooperativos.

Dessa forma, o agronegócio pode ser definido como o conjunto organizado de atividades
econômicas que envolve a fabricação e fornecimento de insumos, a produção, o processamento e
armazenamento até a distribuição para consumo interno e internacional de produtos, subprodutos e
resíduos de valor econômico de origem agrícola, pecuária, de reflorestamento e aquicultura, ainda
compreendidas as bolsas de mercadorias e futuros e as formas específicas de financiamento,
sistematizadas por meio de políticas públicas específicas. Os sistemas agroindustriais (SAG)
relacionam todos os participantes envolvidos na produção, processamento e marketing de produto
específico. Estes podem ser analisados em diferentes segmentos: 'antes da porteira', 'dentro da
porteira' e 'depois da porteira'.

Então, o que anteriormente era entendido como uma exploração econômica de propriedades rurais
isoladas é parte de um amplo aspecto de inter-relações e interdependências produtivas, tecnológicas
e mercadológicas. Hoje as propriedades rurais são entendidas como organizações agroindustriais. É
a conotação profissional e organizada dada ao termo agronegócio à responsável por essa mudança
de paradigma.4 Outro fator que colaborou para a mudança na estrutura produtiva dos negócios
rurais, são as exigências impostas pelo mercado de elevados padrões de qualidade e produtividade.

O elemento que dá unidade às diversas atividades dos complexos agroindustriais é que todas elas
são atividades do capital, com uma regulação macroeconômica mais geral. As relações do
agronegócio não são apenas técnicas, mas, sobretudo financeiras. Um conceito-chave por trás
desse padrão mais recente de desenvolvimento da agricultura é o de integração de capitais, isto é, o
processo de centralização de capitais industriais, bancários, agrícolas, etc. Com isso, este
financiamento não será mais feito a partir de agentes isolados, e sim através do sistema financeiro
instalado, o qual se torna o elemento essencial que irá soldar o agronegócio com o movimento geral
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da economia.

2 Mercado agrícola e o estado como agente regulador

Os mercados como os locais em que se encontram diversos compradores e vendedores que


interagem, por meio de negociações, analisando o preço, quantidade e qualidade de produtos,
resultando a possibilidade de troca ou transação. O mercado é regulado por diversos institutos
jurídicos que garantem suas operações mercantis, sempre voltadas para objetivos econômicos. O
mercado serve como um meio governar as transações econômicas e possibilita que, através da
análise do preço das mercadorias, os produtores possam determinar quando devem produzir e em
qual quantidade. A principal atividade do mercado é garantir a segurança da circulação de riquezas e
a estabilidade das relações jurídicas, de modo a promover a produção ou circulação de produtos e
serviços, satisfazendo as necessidades da sociedade com a criação de riquezas.

Atualmente, verifica-se a existência de dois mercados distintos dentro do complexo agroindustrial, o


agroalimentar e o agroindustrial não alimentar. O primeiro consiste no conjunto das atividades que
concorrem à formação e a distribuição dos produtos alimentares e, em consequência, o cumprimento
da função de alimentação. Já o segundo mercado é o conjunto das atividades que concorrem à
obtenção de produtos oriundos do agronegócio, não destinados à alimentação, mas aos sistemas
energético, madeireiro, couro e calçados, papelão e têxtil. Importa, ainda, que os produtos agrícolas
apresentam diversos atributos, além da perecibilidade, a influência de fatores biológicos, doenças e
pragas, homogeneidade, sazonalidade de oferta, susceptibilidade climática, baixa elasticidade da
demanda, rigidez da oferta (no curto prazo), variabilidade de preços e dispersão da produção. Todos
estes fatores influem diretamente na qualidade do produto, financiamento dos insumos e na sua
forma de comercialização.

Conforme nosso ordenamento, na regulação dos mercados, o Estado exercerá as funções de


fiscalização, incentivo e planejamento com base na lei, que estabelecerá as diretrizes e bases do
planejamento do desenvolvimento nacional equilibrado. Tendo em vista analisar minuciosamente as
atribuições que o Estado terá, apontamos que:

a) Fiscalizar significa prover a eficácia das normas produzidas e medidas encetadas, pelo Estado, no
sentido de regular a atividade econômica, sob a égide do princípio da legalidade;

b) Incentivar segue ao uso dos instrumentos de intervenção em consonância com as leis que regem
o funcionamento dos mercados, capaz de induzir os destinatários a adoção de uma opção
econômica de interesse coletivo e social; e

c) Planejar qualifica a intervenção do Estado sobre e no domínio econômico, na medida em que esta,
quando consequente ao prévio exercício dele, resulta mais racional. Sendo assim, entendemos que
o planejamento não configura modalidade de intervenção.

Nesse contexto, as instituições (regras do jogo) estabelecem o ambiente no qual as transações


ocorrem e interferem tanto na definição dos objetivos das organizações quanto nas estruturas de
governança adotadas. A Constituição Federal estabelece os princípios que regem as transações
econômicas. Em seu art. 170, a Constituição Federal determina como princípio, a ordem econômica,
o trabalho humano, a livre iniciativa, a existência digna, a soberania nacional, a propriedade privada,
função social da propriedade, a livre concorrência, a defesa do consumidor, a defesa do meio
ambiente, redução das desigualdades regionais e sociais, a busca do pleno emprego e o tratamento
favorecido para as empresas de pequeno porte.

Mais especificamente, aqui, a Lei 8.171/1991 fundamenta a Política Agrícola definindo os objetivos e
as competências institucionais, prevendo as fontes de recursos e, ainda, estabelecendo as ações e
instrumentos da política agrícola, relativamente às atividades agropecuárias, agroindustriais e de
planejamento das atividades pesqueira e florestal. O art. 2.º da referida Lei, aponta que:

"Art. 2.º A política fundamenta-se nos seguintes pressupostos:

I - a atividade agrícola compreende processos físicos, químicos e biológicos, onde os recursos


naturais envolvidos devem ser utilizados e gerenciados, subordinando-se às normas e princípios de
interesse público, de forma que seja cumprida a função social e econômica da propriedade;

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II - o setor agrícola é constituído por segmentos como: produção, insumos, agroindústria, comércio,
abastecimento e afins, os quais respondem diferenciadamente às políticas públicas e às forças de
mercado;

III - como atividade econômica, a agricultura deve proporcionar, aos que a ela se dediquem,
rentabilidade compatível com a de outros setores da economia;

IV - o adequado abastecimento alimentar é condição básica para garantir a tranquilidade social, a


ordem pública e o processo de desenvolvimento econômico-social;

V - a produção agrícola ocorre em estabelecimentos rurais heterogêneos quanto à estrutura


fundiária, condições edafoclimáticas, disponibilidade de infraestrutura, capacidade empresarial,
níveis tecnológicos e condições sociais, econômicas e culturais;

VI - o processo de desenvolvimento agrícola deve proporcionar ao homem do campo o acesso aos


serviços essenciais: saúde, educação, segurança pública, transporte, eletrificação, comunicação,
habitação, saneamento, lazer e outros benefícios sociais."

A política agrícola será planejada e executada na forma da lei, com participação do setor de
produção, envolvendo produtores e trabalhadores rurais. Ao Estado caberá a função de planejar,
promover, incentivar, regular, fiscalizar, controlar, avaliar atividades e suprir necessidades, visando
aumentar a produção e produtividade agrícolas. Conforme o art. 4.º da Lei 8.171/1991:

"Art. 4.º As ações e instrumentos de política agrícola referem-se a:

I - planejamento agrícola;

II - pesquisa agrícola tecnológica;

III - assistência técnica e extensão rural;

IV - proteção do meio ambiente, conservação e recuperação dos recursos naturais;

V - defesa da agropecuária;

VI - informação agrícola;

VII - produção, comercialização, abastecimento e armazenagem;

VIII - associativismo e cooperativismo;

IX - formação profissional e educação rural;

X - investimentos públicos e privados;

XI - crédito rural;

XII - garantia da atividade agropecuária;

XIII - seguro agrícola;

XIV - tributação e incentivos fiscais;

XV - irrigação e drenagem;

XVI - habitação rural;

XVII - eletrificação rural;

XVIII - mecanização agrícola;

XIX - crédito fundiário.

Parágrafo único. Os instrumentos de política agrícola deverão orientar-se pelos planos plurianuais."

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A Política Agrícola visa promover a descentralização dos serviços públicos de apoio ao setor rural,
buscando a atuação complementar dos Estados, Distrito Federal, dos Territórios e Municípios,
devendo estes adequarem os diversos instrumentos às suas necessidades e recursos. Ainda, nos
termos do art. 3.º da Lei 8.171/1991:

"Art. 3.º São objetivos da política agrícola:

I - na forma como dispõe o art. 174 da Constituição, o Estado exercerá função de planejamento, que
será determinante para o setor público e indicativo para o setor privado, destinado a promover,
regular, fiscalizar, controlar, avaliar atividade e suprir necessidades, visando assegurar o incremento
da produção e da produtividade agrícolas, a regularidade do abastecimento interno, especialmente
alimentar, e a redução das disparidades regionais;

II - sistematizar a atuação do Estado para que os diversos segmentos intervenientes da agricultura


possam planejar suas ações e investimentos numa perspectiva de médio e longo prazos, reduzindo
as incertezas do setor;

III - eliminar as distorções que afetam o desempenho das funções econômica e social da agricultura;

IV - proteger o meio ambiente, garantir o seu uso racional e estimular a recuperação dos recursos
naturais;

V - (Vetado);

VI - promover a descentralização da execução dos serviços públicos de apoio ao setor rural, visando
a complementariedade de ações com Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios, cabendo a
estes assumir suas responsabilidades na execução da política agrícola, adequando os diversos
instrumentos às suas necessidades e realidades;

VII - compatibilizar as ações da política agrícola com as de reforma agrária, assegurando aos
beneficiários o apoio à sua integração ao sistema produtivo;

VIII - promover e estimular o desenvolvimento da ciência e da tecnologia agrícola pública e privada,


em especial aquelas voltadas para a utilização dos fatores de produção internos;

IX - possibilitar a participação efetiva de todos os segmentos atuantes no setor rural, na definição dos
rumos da agricultura brasileira;

X - prestar apoio institucional ao produtor rural, com prioridade de atendimento ao pequeno produtor
e sua família;

XI - estimular o processo de agroindustrialização junto às respectivas áreas de produção;

XII - (Vetado);

XIII - promover a saúde animal e a sanidade vegetal;

XIV - promover a idoneidade dos insumos e serviços empregados na agricultura;

XV - assegurar a qualidade dos produtos de origem agropecuária, seus derivados e resíduos de


valor econômico;

XVI - promover a concorrência leal entre os agentes que atuam nos setores e a proteção destes em
relação a práticas desleais e a riscos de doenças e pragas exóticas no País;

XVII - melhorar a renda e a qualidade de vida no meio rural."

3 Desenvolvimento agroindustrial e regime jurídico do agronegócio

Em Outubro de 1945, a Organização Mundial das Nações Unidas (ONU) lançava um esforço
mobilizador para impulsionar a agricultura nos países pobres e em desenvolvimento. No mesmo ano
foi criada a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO). Nas décadas
que se seguiram à Revolução Verde, os preços foram influenciados pelos choques de oferta. Os
ganhos de produtividade, com a incorporação de novas tecnologias, eram repassados para o preço
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final, de modo que o custo da cesta básica sofria queda no seu valor real. Com a globalização dos
mercados e a emergência econômica de países populosos, os preços dos alimentos começaram a
ser guiados pela demanda.

Desde a criação da FAO, o número de pessoas no mundo triplicou. Sabemos que há 1 bilhão de
famintos no planeta, e a população mundial vai ganhar mais 2,2 bilhões de pessoas nas próximas
décadas. Essa expansão econômica e populacional continuará levando preocupação às nações no
mundo todo por alimentos e energia. Como forma de suprir a demanda que está por surgir, até 2050,
o Brasil deverá ser responsável por 40% do volume de alimentos e bioenergia produzido no mundo.
Entre 1970 e 2013, a produção brasileira de grãos teve uma expansão de quase 8 vezes, resultante
dos ganhos contínuos de produtividade. Isso é devido à incorporação de novas tecnologias ao
processo produtivo. O país é, hoje, um dos maiores produtores mundiais de alimentos, fibras e
energias renováveis. Mas no cumprimento desse contínuo desafio, a agricultura brasileira
demandará sistemas de inteligência capazes de capturar, organizar e qualificar dados e informações
cada vez mais sofisticados, para apoiar a tomada de decisões.

De acordo com a ONU, segurança alimentar é "a situação na qual as pessoas têm, a todo momento,
acesso físico e econômico a alimentos seguros, nutritivos e suficientes para satisfazer as suas
necessidades dietéticas e preferências alimentares, a fim de levarem uma vida ativa e saudável."5
Em âmbito nacional, em 2006 foi promulgada a Lei 11.346/2006, que, em seu art. 3.º, conceitua
segurança alimentar como: "a segurança alimentar e nutricional consiste na realização do direito de
todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem
comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares
promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural,
econômica e socialmente sustentáveis".6

Levando em conta a diversidade e a complexidade que atualmente caracteriza a moderna


agricultura, os avanços até agora alcançados dificilmente garantirão a competitividade com
sustentabilidade no futuro. A integração dos conceitos de alimentação - nutrição - saúde aparenta ser
um caminho inevitável no futuro. Isso causará o estabelecimento de uma base científica e
tecnológica radicalmente nova. Serão necessárias tecnologias mais eficientes para atender as
demandas de alimentos, fibras, energia e outras matérias-primas para as indústrias de
transformação e de química verde, e de excedentes de produção para exportar, de modo a garantir a
segurança alimentar e energética global.

Não há outra forma de execução das atividades agroindustriais senão no contexto e regime de
empresa, atividade tecnológica, organizada e sistêmica. A rede de contratos comerciais que formam
os sistemas agroindustriais ganham relevância jurídica na medida em que encontram os critérios de
organicidade e economicidade. Basta, para que exista empresa, que se verifique a prévia
organização dos meios de produção, a critério do empresário, realizada através de determinados
instrumentos materiais e imateriais. Ainda, na economia contemporânea, não se pode mais conceber
a empresa de forma isolada. Essa visão, que a confina nas próprias fronteiras, desliga-a do
funcionamento do mercado. A empresa é agente econômico, que interage com o mercado através de
contratos. É preciso adquirir insumos, distribuir produtos, associar-se para viabilizar o
desenvolvimento de novas tecnologias, financiar a produção e fornecê-los globalmente. As empresas
dos SAGs passaram a se valer, cada vez mais, de formas híbridas, afastadas das fórmulas
tradicionais oferecidas pelo ordenamento jurídico para acomodar interesses em empreendimentos
comuns.

O perfil social do mercado reserva ao direito outra função, além da preservação do sistema de
produção, ela foca também a implementação de políticas públicas com o escopo de dar concreção
aos objetivos sociais constitucionalmente fixados, mas sem com isso afastar os elementos privados
de execução contratual da atividade. Nos contratos agroempresariais, as partes, patrimonialmente
autônomas, mantêm áleas distintas, embora interdependentes. Somando a ótica da Economia das
Organizações, um contrato do agronegócio significa instrumento de coordenação às transações,
provendo incentivos para os agentes atuarem de maneira coordenada de sua produção, o que
permite planejamento de longo prazo.

Por fim, na importância central desse estudo, sabemos que ainda os princípios próprios para o
Direito do Agronegócio não estão suficientemente difundidos na doutrina (ementas e programas
acadêmicos), assim também na jurisprudência os precedentes relacionam os negócios
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privados-empresariais aos preceitos do Direito Agrário, cujo foco repousa sobre a atividade de
produção no campo, um dos elos da cadeia, no cumprimento de sua função social ('dentro da
porteira'). Entendemos que regime atual das relações no agronegócio se insere nos preceitos e
institutos do Direito Comercial e que transcende à limitação das relações públicas relativas aos bens
imóveis rurais para fins de promoção da política agrícola ("estabelecimento rural"). Trata-se, portanto,
de um microssistema na noção intuitiva da expressão, nos desdobramentos do Direito Comercial a
uma particular atividade econômica.

4 Bibliografia

Atiyah, P.S. An introduction to the law of contract. Oxford: Clarendon Press, 1995.

Buranello, Renato M. Sistema privado de financiamento do agronegócio: regime jurídico. São Paulo:
Quartier Latin, 2011.

Jensen, Michel C. A Theory Of The firm: governance, residual claims and organization forms.
Cambridge: Harvard University Press, 2000.

Posner, Richard A. Economic analysis of law. Chicago: Aspen Publishers, 2007.

Tirole, J. The theory of industrial organization. The MITT Press, 1988.

1 Tirole, J. The theory of industrial organization, The MITT Press, 1988.

2 Atiyah, P.S. An introduction to the law of contract. Oxford: Clarendon Press, 1995. p. 3.

3 Posner, Richard A. Economic analysis of law. Chicago: Aspen Publishers, 2007, p. 23.

4 Jensen, Michel C. A theory of the firm: governance, residual claims and organization forms.
Cambridge: Harvard University Press. 2000.

5 Tal conceito de segurança alimentar da ONU foi publicado na Declaração de Roma através da
Cúpula Mundial sobre Segurança Alimentar de 1996.

6 A Lei 11.346/2006 foi elaborada com base nos textos publicados pela II Conferência Nacional de
Segurança Alimentar e Nutricional, ocorrida em 2004, em Olinda.

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