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XXII Encontro Nacional de Engenharia de Produção

Curitiba – PR, 23 a 25 de outubro de 2002

A EMERGÊNCIA DA MESOANÁLISE COMO FORMA DE


AVALIAÇÃO DE CADEIAS PRODUTIVAS E DA
COMPETITIVIDADE EMPRESARIAL SISTÊMICA

FRANCISCO JOSÉ KLIEMANN NETO, Dr.


Universidade Federal do RGS – UFRGS Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção – PPGEP
Praça Argentina, 9, sala 405 – Centro – Porto Alegre – RS CEP 90040-020 e-mail: kliemann@ppgep.ufrgs.br

PETER BENT HANSEN, M.Sc.


Universidade Federal do RGS – UFRGS Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção – PPGEP
Praça Argentina, 9, sala 405 – Centro – Porto Alegre – RS CEP 90040-020 e-mail: hansenpb@orion.ufrgs.br

Abstract - This paper analyses the evolution, during the last decades, of new forms of enterprise’s
relationships, searching for growth in competitiveness in a globalized competition scenery. These
new forms involve different types of enterprise´s arrangements as Filières, Clusters, Supply Chains
and Flexible Networks, each one with specific characteristics. Considering this situation, several
studies have been made searching for ways to understand how strategies must be developed and
how competitive position can be achieved through the mentioned types of enterprise´s
arrangements. In this context, the article discusses and compares some of these studies and their
results in terms of competitive analysis. In the sequence, it proposes a general structure to
analyse the competitiveness of the various types of enterprise´s relationships and, finally, presents
some commentaries about the matter.

Key-Words: Enterprise’s Relationships, Competitiveness, Analysis.

1. INTRODUÇÃO
As últimas décadas têm sido marcadas por profundas modificações no cenário sócio-
econômico mundial. Diversos fenômenos tem contribuído para esta situação. Entre estes,
destacam-se, no segmento industrial, a difusão da filosofia Just-in-Time e do movimento pela
Qualidade, a evolução da informática de base microeletrônica e dos sistemas de telecomunicações,
a redução de barreiras alfandegárias, a conformação de blocos econômicos regionais, o surgimento
de novos e poderosos produtores no cenário internacional, que contribuíram decisivamente para o
processo de globalização econômica. Neste contexto, de aceleração da concorrência inter-
capitalista e busca de novas formas de acumulação de capital, a palavra de ordem passou a ser a
“competitividade”.
Tal processo de mudanças, crescentemente acelerado, tem conduzido a uma evolução
continuada das lógicas e técnicas de gestão empresarial, num primeiro momento focalizadas nas
próprias empresas e organizações e, atualmente, dirigindo-se para as relações inter-empresariais.
Talvez o maior exemplo de mudanças nas relações inter-empresariais, seja a padronização
das relações de suprimento/fornecimento, representadas pelas normas ISO – série 9.000. Além
desta referida padronização, outras mudanças, mais profundas diga-se de passagem, também têm se
mostrado presentes conduzindo a uma verdadeira “desfronteirização” das empresas envolvidas
nestas relações comerciais.
Desta forma, emergiram novos arranjos ou aglomerados empresariais, de características
variadas, cujo estudo e análise tem se mostrado crescente ao longo das últimas décadas. Entre
estes, destacam-se os conceitos de Filière (fila), os Clusters (aglomerados empresariais regionais),
Supply Chain (cadeia de suprimentos) e as Redes Flexíveis de pequenas empresas.
Diversos autores tem buscado formas de análise e avaliação da competitividade de tais
arranjos empresariais. Assim, verifica-se a busca da avaliação destes arranjos com base em uma

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perspectiva de análise empresarial, estendida para além das fronteiras da empresa, no que se
convencionará chamar de microanálise, de forma similar à microeconomia. Por outro lado,
também tem sido conduzidos estudos com base em uma perspectiva macroeconômica, buscando as
relações dos arranjos empresariais com fatores regionais, nacionais e globais, dentro do que se
convencionará chamar de macroanálise. Finalmente, e de forma mais recente, uma outra
perspectiva de análise destes arranjos empresariais igualmente vem sendo utilizada, a qual parece
ser a mais adequada ao contexto, que incorpora a análise das relações inter-empresariais, além das
relações com o mercado atendido e outras instituições vinculadas, de acordo com o que se
convencionará chamar de mesoanálise.
Neste sentido, o presente artigo pretende discutir as diferentes formas de análises da
competitividade mencionadas, a partir de uma visualização inicial dos diferentes tipos de arranjos
inter-empresariais, ou aglomerados empresariais, comentando suas características e propondo a
adoção de uma sistemática para a referida mesoanálise.

2. FORMAS RECENTES DE ARRANJOS EMPRESARIAIS


Conforme anteriormente abordado, as novas formas de arranjos ou aglomerados
empresariais, centrados na busca de ganhos de competitividade, e sobrevivência das empresas
participantes nos mercados em que atuam, levaram a um aprofundamento do interesse e do estudo
destas novas relações.
Uma das primeiras formas estudadas que aborda os aglomerados industriais, é o conceito
de Filière (fila), estudada por diferentes autores (KLIEMANN, 1985) (DE BANDT, 1991)
(BATALHA, 1997), e que teve os primeiros estudos desenvolvidos ao longo do final dos anos
sessenta e meados da década de setenta, principalmente na Europa, especialmente na França,
envolvendo cadeias de empresas de transformação de bens e produtos. Neste sentido, a análise de
Filière mostra-se a mais abrangente, envolvendo desde a origem dos recursos transformadores e de
transformação até o fornecimento dos bens e serviços ao mercado consumidor final. A análise de
cadeias produtivas de acordo com a abordagem de Filière propicia a identificação de questões
significativas para a melhoria de desempenho e de sua competitividade, a partir da identificação
dos chamados “nós”, os quais se constituem nos pontos chaves onde são estabelecidas as políticas
de toda a cadeia. Ainda se pode identificar os chamados estrangulamentos, ou fraquezas da cadeia,
que são os elos que comprometem o desempenho da cadeia como um todo pelas suas
características específicas, assim como também os pontos fortes existentes.
Na seqüência, ao longo da década de oitenta, desenvolveu-se o conceito de Cluster,
centrado na análise das formas de relações inter-empresariais vinculadas à existência de alguns
aglomerados industriais regionais de sucesso em termos mundiais. Este tipo de aglomerado
industrial também tem despertado o interesse de diferentes autores como PORTER (1985 e 1998) e
RUAS (1995). De forma diferenciada do caso anterior, os Clusters são típicos de determinados
segmentos e regiões e não genéricos, como pode ser observado no Vale do Silício e em Hollywood,
ambos na Califórnia, EUA. Por outro lado, envolvem tanto características de cooperação como de
competição. Normalmente, estes tipos de aglomerados ou cadeias se expandem em direção aos
clientes e canais de distribuição e atraem para si empresas fabricantes de produtos complementares
e serviços afins. Assim, em que pese a globalização comercial dos dias de hoje, os Clusters
apresentam algumas características que os estimulam, como sejam o maior acesso à fornecedores, o
acesso a sistemas de informações especializados, o marketing vinculado à fama, o acesso
equivalente a instituições e bens públicos, o estímulo à inovação pela competição existente e a
melhoria da avaliação de desempenho das empresas participantes.
A globalização da economia e dos mercados, associada também à evolução das tecnologias
informacionais de base micro-eletrônica, criou as condições necessárias para a focalização
acentuada dos aspectos logísticos, que evoluiu para a logística integrada nas relações comerciais,
levando a um novo conceito de relação inter-empresas denominada como Supply Chain ou cadeia
de suprimentos. Este tipo de aglomerado industrial e comercial tem ganhado notoriedade ao longo
dos últimos anos, tendo se transformado em objeto de diversos estudos (LAMBERT, 1998),
(WOOD e ZUFFO, 1998), (SILVA e FISCHMANN, 1999). A proposta de arranjo inter-empresas
denominado Supply Chain está vinculado à análise das relações entre fornecedores e clientes
internos das cadeias de suprimentos de materiais, insumos e componentes de uma determinada
cadeia produtiva, ou seja, voltada a um mercado consumidor específico, na busca de otimizar o

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processo logístico e de transferência de bens inter-empresas, de forma a melhorar os seus fatores


competitivos em nível de mercado consumidor.
Por fim, menos referidas mas também relevantes em termos de novas formas de arranjos de
aglomerados empresariais, tem sido discutidas e estudadas as redes de pequenas e médias
empresas, conforme CASAROTTO FILHO e PIRES (1998), AMATO NETO (2000), entre outros
autores. Esta forma de cadeias produtivas, baseia-se nas mudanças no cenário competitivo global
que tornaram as condições de sobrevivência das pequenas e médias empresas extremamente
difíceis, quase que obrigando as mesmas a estabelecerem alianças com vistas a acessar os recursos
e a tecnologia necessárias à sua manutenção e sobrevivência nos mercados atuais. A partir da
realização da análise estratégica, as opções básicas para as pequenas e médias empresas seriam
constituídas pela sua inclusão em uma rede topdown (rede formada de cima para baixo) , na
condição de fornecedoras de uma grande empresa, ou participar de redes flexíveis (redes de
pequenas empresas com flexibilidade) de empresas de porte similar ao seu. Verifica-se, por outro
lado, que a existência das redes flexíveis é mais comum nos países ditos desenvolvidos.

3. FORMAS DE ANÁLISE DA COMPETITIVIDADE


Na busca de entender e avaliar a competitividade de uma forma sistêmica, e analisar a
adoção de estratégias para alcançar este objetivo, diversos autores tem formulado propostas e
desenvolvido modelos, voltados a apoiar e permitir uma melhor compreensão do assunto. Entre os
mencionados autores, podemos citar PORTER (1990 e 1998), ESSER et al. apud ROSSETTO e
ROSSETTO (2001), COUTINHO e FERRAZ (1995), CASAROTTO FILHO e PIRES (1998), que
desenvolvem a análise da competitividade e das estratégias para seu atingimento dentro de
enfoques próprios. Visando uma melhor visualização da proposta de mesoanálise inicialmente
mencionada, abordaremos a seguir os principais enfoques relativos à questão da competitividade.

3.1 A Análise de PORTER


A visão de PORTER (1990) relativamente à análise competitiva, baseia-se no fato de que a
estratégia de negócios deve ser baseada na estrutura de mercado na qual as empresas operam.
Assim, o autor identifica cinco forças no ambiente de uma organização que influenciam a
concorrência e, consequentemente, a competitividade da mesma. O cenário de análise proposto é a
indústria de forma genérica (por segmentos). Tais forças são: Ameaça de novos entrantes; Poder
de barganha dos fornecedores; Poder de barganha dos clientes; Ameaça de produtos substitutos;
Intensidade da rivalidade entre empresas concorrentes.
As peculiaridades, características e interação entre estas cinco forças, determinam as
estratégias competitivas adotadas pelas empresas. Considerando estas condicionantes, PORTER
(1990) avalia que as empresas podem adotar três estratégias básicas para atingir um desempenho
competitivo. São elas: Liderança em custo, Diferenciação, Foco (em determinado segmento de
mercado).
Ainda segundo PORTER, as estratégias que podem ser adotadas pelas empresas para obter
um desempenho competitivo frente as forças do cenário onde as empresas atuam, são postas em
prática através da chamada “cadeia de valor”, a qual é composta pelas atividades primárias
(diretamente envolvidas no fluxo de produtos até o cliente) e pelas atividades de suporte (existem
para suportar as anteriores). Assim, a cadeia de valor constitui a área básica de atuação da
administração das empresas para colocação das estratégias competitivas em prática.
Observando-se a abordagem de PORTER até o presente momento, verifica-se que se trata
de uma abordagem da microanálise, onde o foco central são as empresas que atuam em um
segmento industrial determinado. Apesar de eventualmente poder ser expandida para cadeias
produtivas a análise aqui proposta, este não é seu foco principal, o que poderá levar à
desconsideração de aspectos vitais.
Por outro lado, PORTER aborda, numa extensão da análise inicialmente proposta, um
contexto mais amplo de avaliação de empresas de determinada indústria. Neste caso, interpreta que
a cadeia de valores de uma empresa está inserida em um contexto mais amplo de atividades, ao que
o autor denominou de “sistema de valores”. Este sistema de valores, inclui fornecedores que
proporcionam insumos, passando pelos canais de distribuição, até atingir o comprador final. As
ligações não só conectam as atividades dentro de uma empresa, como também criam
interdependências entre a empresa e seus fornecedores e canais. Desta forma, “uma companhia

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pode criar uma vantagem competitiva otimizando ou coordenando melhor essas ligações com o
lado de fora”. Neste ponto, constata-se a abordagem proposta por PORTER para o que se
convencionou denominar de mesoanálise. Porém, sua interpretação ainda deriva do foco original
de uma empresa e não da cadeia produtiva em si, com todas as vinculações existentes.
Em uma abordagem mais ampla da competitividade, PORTER (1990) analisa as razões que
conduzem um país a obter êxito internacional em uma determinada indústria. Neste aspecto o autor
avalia que a resposta se encontra em quatro amplos atributos que modelam o ambiente no qual as
empresas competem e promovem a criação de vantagem competitiva, quais sejam:
• Condições de Fatores – enfoca a posição do país nos fatores de produção, com trabalho
especializado ou infra-estrutura, necessários à competição em determinada indústria;
• Condições de Demanda – enfoca a natureza da demanda interna para os produtos ou serviços
da indústria;
• Indústrias Correlatas e de Apoio – enfoca a presença ou ausência, no país, de indústrias
abastecedoras e indústrias correlatas que sejam internacionalmente competitivas;
• Estratégia, Estrutura e Rivalidade das Empresas – enfoca as condições que, no país, governam
a maneira pela qual as empresas são criadas, organizadas e dirigidas, mais a natureza da
rivalidade interna.
Estes determinantes, segundo o autor, individualmente e como um sistema, criam o
contexto no qual as empresas de um país nascem e competem. Assim, as empresas conseguem
vantagem competitiva quando as suas bases nacionais permitem e apoiam a acumulação mais
rápida possível de bens e práticas especializadas.
Verifica-se nesta abordagem de PORTER, nitidamente, os contornos da denominada
macroanálise, ou seja, um enfoque amplo para a questão da competitividade em termos de país,
mas ainda voltado a busca da melhoria de desempenho de empresas de certo tipo de indústria.

3.2 O modelo de referência do IAD – Instituto Alemão de Desenvolvimento


O Instituto Alemão de Desenvolvimento – IAD propõe a análise da competitividade sob
um enfoque sistêmico (ESSER et al. Apud ROSSETTO, ROSSETTO; 2001), abordando que a
operacionalização da economia é baseada em um suporte pluri-dimensional e multinível. Neste
contexto, a competitividade das empresas baseia-se em uma organização social, que gera vantagens
competitivas em função da interação de múltiplos parâmetros e grupos de atores envolvidos. De
acordo com esta concepção, o desenvolvimento da competitividade sistêmica é, em realidade, um
projeto de transformação social, que se estende além de aspectos puramente macroeconômicos.
Para a construção desta rede de competitividade sistêmica, o modelo identifica quatro níveis de
fatores: o nível Meta (sociedade civil), o nível Macro (estado, política econômica de mercado), o
nível Meso (estado, políticas horizontais) e o nível Micro (empresa).
Para permitir uma visualização desta interpretação, os níveis de fatores mencionados são
descritos a seguir (ROSSETTO, ROSSETTO; 2001):
• Nível Meta – neste nível são abordados os aspectos referentes ao desenvolvimento da
capacidade nacional de condução. De acordo com ESSER et al. (Apud ROSSETTO,
ROSSETTO; 2001), a capacidade dos atores de estabelecer um padrão de organização jurídica,
política, econômica e macrosocial tende a permitir que se aglutinem as forças dos mesmos,
potencializando as vantagens nacionais de inovação, crescimento econômico e
competitividade, desencadeando processos de aprendizagem;
• Nível Macro – neste nível observa-se a existência (ou não) de condicionantes
macroeconômicos estáveis, que garantam as condições necessárias para permitir o
desenvolvimento da competitividade. Desta forma, os fatores essenciais que deverão existir
neste nível para permitir a melhoria da competitividade, são: ambiente macroeconômico
estável, condições financeiras favoráveis, política de concorrência que impeça a formação de
monopólios, uma política cambial que impeça os obstáculos as exportações e políticas
comerciais fomentadoras de integração;
• Nível Meso – neste nível são enfocadas as políticas seletivas (não abrangentes). Assim, busca-
se remover os entraves específicos para as empresas, envolvendo a infra-estrutura (transportes,
telecomunicações, energia) que afeta a competitividade das empresas, criação de políticas
dirigidas à pesquisa ou tecnologia, formulação de políticas comerciais e sistemas normativos

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(normas ambientais, técnicas, de segurança) que contribuam para a criação de vantagens


competitivas nacionais;
• Nível Micro – neste nível enfoca-se as melhores práticas organizacionais. Neste ponto são
fatores determinantes para a competitividade, a gestão efetiva de inovações organizacionais e a
gestão tecnológica eficaz. Assim, busca-se o fortalecimento dos elos entre as atividades das
empresas, bem como dos elos externos como fornecedores, prestadores de serviços e clientes,
visando o fortalecimento da cooperação que produza um efeito sinérgico na competitividade.
Analisando-se a abordagem apresentada acima, verifica-se que os referidos níveis meta,
macro e meso (parcialmente), encontram-se no patamar da chamada macroanálise, envolvendo
questões amplas, diferenciadas por aspectos culturais, políticos e sociais nacionais, regionais e
comunitários. O mencionado nível micro, encontra-se, por sua vez, no patamar de microanálise da
competitividade, mesmo que estendido, enfocando basicamente a empresa considerada e suas
relações diretas. A idéia anteriormente referida sobre a necessidade de um patamar de mesoanálise
competitiva, apesar de parcialmente abordada no nível meso, não se encontra bem focalizada,
acredita-se, no modelo apresentado.

3.3 Fatores Determinantes da Competitividade na Indústria - ECIB


O Estudo da Competitividade da Indústria Brasileira – ECIB (COUTINHO, FERRAZ;
1995), promoveu uma ampla pesquisa relativa aos fatores determinantes e as condições
competitivas atuais (1995) e esperadas na indústria brasileira. A partir deste levantamento de
dados e subseqüentes análises, os autores (coordenadores do estudo) abordam que “...parece
adequada a noção de competitividade sistêmica, como modo de expressar que o desempenho
empresarial depende e é também resultado de fatores situados fora do âmbito das empresas e da
estrutura industrial da qual fazem parte, como a ordenação macroeconômica, as infra-estruturas,
o sistema político-institucional e as características sócio-econômicas dos mercados nacionais.
Todos estes fatores são específicos a cada contexto nacional e devem ser explicitamente
considerados nas ações públicas ou privadas de indução da competitividade”.
Desta forma, o desempenho competitivo de uma empresa, indústria ou nação é
condicionado por um vasto conjunto de fatores, que pode ser subdividido naqueles internos à
empresa, nos de natureza estrutural, pertinentes aos setores e complexos industriais, e nos de
natureza sistêmica (COUTINHO, FERRAZ; 1995).
A interpretação destes fatores determinantes da competitividade é apresentada a seguir.
• Fatores Internos à Empresa – são aqueles que estão sob a esfera de decisão da empresa e
através dos quais esta procura se distinguir de seus competidores. Incluem os estoques de
recursos acumulados pela empresa, as vantagens competitivas que possuem e a sua capacidade
de ampliá-las. Inserem-se nesta categoria, a capacidade tecnológica e produtiva, a qualidade e
produtividade dos recursos humanos, o conhecimento do mercado, qualidade e amplitude dos
serviços de pós-vendas e as relações com usuários e fornecedores.
• Fatores Estruturais – são aqueles que, mesmo não sendo inteiramente controlados pela
empresa, estão parcialmente sob sua área de influência e caracterizam o ambiente competitivo
que ela enfrenta diretamente. Integram este grupo aqueles fatores relacionados: às
características dos mercados consumidores; à configuração da indústria em que a empresa atua;
à concorrência.
• Fatores Sistêmicos da Competitividade - são aqueles que constituem externalidades para a
empresa produtiva. Também afetam as características do ambiente competitivo e podem ter
importância nas vantagens competitivas que firmas de um país tem ou deixam de ter ante as
suas rivais no mercado internacional. Podem ser de diversas naturezas: macroeconômicos,
político-institucionais, regulatórios, infra-estruturais, sociais, regionais e internacionais.
Conforme pode-se observar na abordagem anterior, esta se aproxima bastante da
conceituação inicialmente proposta de análise da competitividade nos níveis micro, meso e macro.
Assim, encontra-se uma grande analogia, em termos de competitividade, entre o chamado nível de
microanálise e os fatores internos à empresa (centrados nas formas como a empresa gera resultados
competitivos), entre o chamado nível de mesoanálise e os fatores estruturais da competitividade,
que enfoca as questões situadas no entorno da empresa (mercados, fornecedores, clientes,
dimensões competitivas e outras) e entre o denominado nível de macroanálise e os fatores

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sistêmicos da competitividade, que envolvem aspectos mais globais e não específicos ao segmento
industrial analisado (políticas, economia, infra-estrutura e outros).

4. PROPOSTA DE ABORDAGEM DA MESOANÁLISE DA COMPETITIVIDADE


DAS CADEIAS PRODUTIVAS
De acordo com PIRES (2001), “...a mesoanálise da competitividade busca preencher uma
lacuna existente entre os dois grandes corpos da teoria econômica: a microeconomia, que estuda
as unidades de base da economia (a empresa, os consumidores, etc...), que utiliza as “partes para
explicar o todo”, e a macroeconomia que “parte do todo (o Estado, os grandes agregados, etc...)
para explicar o funcionamento das partes”. Um enfoque mesoanalítico permite responder as
questões sobre o processo de concorrência e sobre as estratégias das empresas, bem como o
processo produtivo entre os agentes econômicos”. Ainda, segundo este autor, verifica-se que
“...pode-se dizer que o conceito de cadeia produtiva contribui para explicação e compreensão das
estruturas de geração de produtos e serviços, e participa de forma efetiva na criação de um espaço
mesoanalítico”.
A partir deste enfoque constata-se a existência e a emergente necessidade de consideração
do contexto mesoanalítico da competitividade empresarial e regional. Tal cenário de análise,
deverá ser centrado na abordagem da cadeia produtiva estudada, constituindo assim uma
diferenciação em relação à macroanálise (aspectos macroeconômicos, político-institucionais,
regulatórios, infra-estruturais, sociais, referentes à dimensão regional, nacional e internacional) e à
microanálise (aspectos internos à empresa, seus clientes e mercado específicos, a concorrência
direta, fornecedores e outras instituições com envolvimento direto).
A comparação deste cenário de mesoanálise da competitividade com aqueles anteriormente
abordados pelos diversos autores citados, constata-se a existência de uma convergência de opiniões
no sentido de se incorporar a abordagem na análise da competitividade sistêmica, apesar do
enfoque não ser exatamente o mesmo aqui proposto.
Considerando agora a questão de avaliação da competitividade no cenário mesoanalítico,
pode-se evidenciar a necessidade de enfocar alguns aspectos relevantes, entre os quais tem-se: o
desempenho competitivo da cadeia junto ao mercado consumidor, a sustentabilidade competitiva
das empresas da cadeia e da própria, e os direcionadores competitivos, focalizando as relações
(processos) entre as empresas integrantes da cadeia. Esta abordagem é discutida a seguir.
Inicialmente, considerando o desempenho competitivo, a mesoanálise da competitividade
de uma cadeia produtiva deve basear-se no seu desempenho junto ao mercado consumidor final
(elo final da cadeia), identificando claramente os fatores competitivos que os usuários finais
valorizam e seu grau de atingimento. A compreensão das características do mercado consumidor,
suas demandas e potencialidades, permitirão verificar também as estratégias adotadas, em termos
da governança da cadeia e sua adequação ao cenário existente. Como extensão desta análise, deverá
ser levantada a forma pela qual os referidos fatores competitivos são gerados ao longo da cadeia de
valor que integra a cadeia produtiva. A constatação da existência ou não de relacionamento entre
as prioridades competitivas dos diversos elos da cadeia, permitirá identificar, como decorrência, o
alinhamento estratégico das diversas empresas integrantes da mesma. O presente enfoque
considera, em sua proposição as abordagens de SLACK et al. (1998) e PORTER (1990). Por outro
lado, esta análise concentra-se, em especial, na situação presente.
A seguir, considerando agora a sustentabilidade competitiva, a mesoanálise da
competitividade da cadeia deve enfocar a condição de sobrevivência e manutenção das empresas,
enquanto participantes da cadeia. Assim, devem ser analisados diversos aspectos do grau de
sucesso da empresa nas suas atividades, envolvendo resultados econômico-financeiros, capacidade
produtiva, volumes de produção, participação no mercado e outros fatores, que permitam avaliar a
consistência de atuação das empresas. Esta interpretação parece fundamental à luz do
entendimento da competitividade implicar, simultaneamente, no atendimento dos requisitos do
mercado, e na sobrevivência e manutenção da empresa em si. De forma semelhante ao enfoque
anterior, a sustentabilidade competitiva também foca a situação presente das empresas envolvidas.
Posteriormente, considerando o enfoque dos direcionadores competitivos, aqui deverão ser
abordadas as relações entre as empresas integrantes da cadeia e entidades externas diretamente
vinculadas à cadeia estudada. Assim, no que tange as relações entre as empresas, o enfoque de
análise a ser dado é semelhante ao proposto por LAMBERT (1998) no estudo de Supply Chain

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Management – SCM (gestão da cadeia de suprimentos), centrado na avaliação dos oito processos
inter-empresariais do SCM, envolvendo o grau de integração dos mesmos, grau de gestão destes e
do fluxo de informações que os viabiliza. De maneira semelhante, no que tange as relações da
cadeia com outras instituições de apoio direto, também deverão ser avaliados os processos de apoio
que afetam direta e significativamente a competitividade da cadeia objeto de estudo. Os
direcionadores competitivos, conforme pode ser observado, apesar de envolverem a análise da
situação presente, permitem evidenciar potencialidades futuras da cadeia e a manutenção de sua
competitividade futura.
Ainda é relevante considerar, em termos de mesoanálise da competitividade empresarial de
uma cadeia produtiva, a avaliação da cadeia produtiva em estudo perante sua concorrência.
Observando-se o que foi anteriormente exposto, a conjugação das análises do desempenho
competitivo e dos direcionadores competitivos, permitem o desenvolvimento do Benchmarking
competitivo, tanto em termos setoriais (tipos de empresas elos da cadeia), bem como em termos de
relações inter-empresariais e logísticas (processos inter-empresariais). Desta forma, obtém-se
informações consistentes para o que poder-se-ia chamar de grau de competitividade frente as
cadeias concorrentes.
Visando uma visualização mais objetiva da mesoanálise da competitividade empresarial
aplicada a cadeias produtivas, apresenta-se no Quadro 1 abaixo um resumo dos aspectos abordados.

Quadro 1 – Resumo da proposta de mesoanálise da competitividade empresarial aplicada a


cadeias produtivas
Tipo de Análise Foco da Análise Objetivos da Análise
Desempenho Fatores competitivos no mercado e Definir a competitividade da cadeia
Competitivo estratégia de governança da cadeia no mercado
Fatores competitivos das empresas da Avaliar a estratégia e governança
cadeia e estratégia das empresas empregadas
Avaliar o alinhamento estratégico das
empresas
Sustentabilidade Resultado final da cadeia Avaliar a sustentação, manutenção e
Competitiva Resultado das empresas da cadeia sobrevivência da cadeia e das
empresas integrantes
Direcionadores Relações entre empresas da cadeia Avaliar o desempenho dos processos
Competitivos Relações entre empresas e instituições inter-empresariais
de apoio Avaliar os processos de apoio
institucional à cadeia
Benchmarking Dados do desempenho competitivo Comparar o desempenho da cadeia e
Competitivo Dados dos direcionadores competitivos empresas com os concorrentes
Comparar o desempenho dos
processos da cadeia com os dos
concorrentes

5. COMENTÁRIOS FINAIS
A partir do que foi exposto neste artigo, alguns comentários finais referentes ao tema de
análise da competitividade de aglomerados empresariais parecem adequados.
A expansão da formação de novos arranjos industriais, como Filière, Clusters, Supply
Chains, Redes Flexíveis de pequenas empresas e outros tipos de aglomerados, parece constituir um
processo irrefutável que deverá ser expandido ao longo das próximas décadas, principalmente em
função de aspectos como a globalização, a expansão da informática de base microeletrônica e das
telecomunicações, a busca de concentração das empresas nas suas principais competências e o
acirramento da competição inter-capitalista.
Esta presumível expansão dos diferentes tipos de arranjos empresariais, implicará na
necessidade de revisão dos conceitos e métodos utilizados para avaliação de sua competitividade e
estratégias possíveis de empregar, pelas características que estes arranjos apresentam, afastando-os
das abordagens micro e macroeconômicas, geralmente utilizados para análise de empresas
individuais e tecidos industriais regionais ou nacionais. Esta interpretação já é clara na visão de

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diversos autores, que desenvolveram, de diferentes formas, propostas e métodos de análise de


aglomerados empresariais.
O presente artigo propõe um enfoque de abordagem da competitividade sistêmica dos
aglomerados empresariais, derivado dos conceitos de micro e macroeconomia, cuja denominação
proposta é de mesoanálise de competitividade. Ainda, esta abordagem envolve a identificação e
utilização de alguns fatores de análise competitiva, denominados como fatores de Desempenho
Competitivo, Sustentabilidade Competitiva, Direcionadores Competitivos e Benchmarking
Competitivo.
A proposta contida no presente trabalho não pode ser interpretada como conclusiva ou
como tendo exaurido o tema em análise. Deve ser encarada, isto sim, como uma proposta de
discussão relativamente a um tema que oferece diversos desdobramentos para os anos vindouros
em termos de escopo da engenharia de produção.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMATO NETO, João. Redes de Cooperação Produtiva e Clusters Regionais. Editora Atlas,
São Paulo, SP, 2000.

BATALHA, Mário Otávio. Gestão Agroindustrial. Vol.1, Editora Atlas, São Paulo, SP, 1997.

CASAROTTO FILHO, Nelson & PIRES, Luís Henrique. Redes de Pequenas e Médias
Empresas e Desenvolvimento Local. Editora Atlas S.A., São Paulo, SP, 1998.

CHRISTOPHER, Martin. Logística e Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos. Editora


Pioneira, São Paulo, SP, 1997.

COUTINHO, Luciano & FERRAZ, João C. (coord.) Estudo da Competitividade da Indústria


Brasileira. Editora da Universidade Estadual de Campinas - Papirus, 3ª Edição, Campinas, SP,
1995.

DE BANDT, Jacques. La Filière comme Méso-Système. In : ARENA, Richard et al. Traité


dÉconomie Industrielle. 2 Ed., Econômica, Paris, France, 1991.

FLEURY, Paulo Fernando. Supply Chain Management: Conceitos, Oportunidades e Desafios


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