Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
1ª Edição
Copyright © 2021 de Universidade Católica de Pernambuco
Copyright © 2021 de UNICAP DIGITAL
Sumário
Unidade 1 4
Objetivos da Unidade 5
2. O conceito de polis e a filosofia grega: Platão e Aristóteles 9
3. Evolução do Pensamento Político: na antiguidade, na idade média, na
idade moderna e na contemporaneidade. 18
Refêrencias 24
Unidade 2 26
Objetivos da unidade 27
1. O cristianismo e o pensamento político medieval 28
2. Os principais aspectos filosóficos das teorias polícas modernas 31
3. A contemporaneidade e a crise política 39
Síntese da Unidade 43
Referências 44
Unidade 3 46
Objetivos da unidade 47
1. Política, liberdade e autonomia 48
2. As teorias do Estado e a questão das Classes Sociais 52
3. Marxismo, Liberalismo e Globalização 59
3.1 Marxismo e política (Marcos) 59
3.2 Liberalismo político 64
3.2.1. Liberalismo ou Liberalismos? 65
3.2.2 O Liberalismo Político 66
3.3 Globalização e política 68
3.3.1 O que é a globalização? 68
3.3.2 Globalização e Ação Política 70
Referências 71
Unidade 4 73
Objetivos da unidade 75
1. Estado, Sociedade, Poder e Violência 76
2. Ideologias e partidos políticos 83
3. Democracia, sociedade civil e consciência crítica 87
Síntese da Unidade 94
Referências 95
Unidade 1
Filosofia política e seus parâmetros conceituais
Olá!
Refletir sobre a filosofia a partir da visão do homem como um ser político implica
considerar a necessidade de uma tomada de consciência como ser social porque,
cada vez mais, o homem necessita relacionar-se com os demais. E, por isso, numa
sociedade democrática, o conhecimento sobre a dimensão político-cidadã se faz
urgente. O cidadão deve tomar consciência da responsabilidade política e ser capaz
de acompanhar o desempenho dos seus governantes.
A Unidade 1 vai apresentar conceitos básicos para que você possa perceber e destacar
diferenças e relações. Além disso, faremos um retorno às origens gregas, a partir de
filósofos como Sócrates, Platão e Aristóteles. Eles são centrais na filosofia social,
política, antropológica e ética da Filosofia Antiga. Veremos que são sistematizações
que ajudam na compreensão do tema filosofia política no decorrer da História da
Filosofia na Idade média, na Idade Moderna e na Contemporaneidade.
Boas aprendizagens.
Objetivos da unidade
Vamos começar nosso estudo sobre a Filosofia Política. Lanço três questões. 1. Nosso
tempo exige das pessoas uma consciência crítica, principalmente, uma consciência
crítica político-cidadã? 2. Para nos relacionar em sociedade, requer-se que tenhamos
atitudes mais analítico-críticas? 3. Requer-se desenvolver a sensibilidade capaz de
perceber o valor do homem como um ser social e político?
E o homem como um ser político significa que está aberto para lutar em prol de
mudanças reais na sociedade para que haja mais dignidade e mais humanidade o
sentido de solidariedade e justiça social. O que eu estou pontuando neste início de
nossa conversa é para que a nossa disciplina possa, de fato, ser mais uma
possibilidade de reflexão na qual cada um se sinta mais atraído para a realidade
política como pessoa e como cidadão e cidadã.
Então, cabe a nós começarmos a fazer uma distinção entre ciência política e filosofia
política. É isso que vamos fazer agora. Cada um pode perguntar-se o que é ciência e o
que é ciência política? O que podemos dizer?
E Ciência Política? Então, vamos entender agora esse conceito, mas, antes de
conceituar, vale apenas destacar que o cientista Herbert Baxter Adams (16.04.1850 a
30.07.1901), foi o primeiro a cunhar o termo ciência política em 1880. A Ciência Política
é o campo das ciências sociais que estuda as estruturas que moldam as regras de
convívio entre as pessoas em agrupamentos. Dedica-se a entender e moldar as
noções de Estado, governo e organização política, e pode estudar também outras
instituições que interferem direta ou indiretamente na organização política como
ONGs, Igreja, empresas, etc. Alguns teóricos restringem o estudo da ciência política ao
6
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Estado, outros defendem que o seu objeto é mais amplo, sendo o poder, em geral, aquilo
que deve ser estudado por essa área. (https://mundoeducacao.uol.com.br/sociologia/
ciencia-politica.htm). Outra concepção nos mostra que a ciência política é a parte das
ciências sociais que se dedica a tentar entender, exclusivamente, as formações
políticas estruturais que o ser humano criou para garantir o convívio em grandes
sociedades. Também, a ciência política é responsável por entender e moldar as
questões relativas ao poder na sociedade, estabelecendo normas e preceitos para o
pleno funcionamento das instituições sociais, da economia, do Estado e do sistema
jurídico. Fica a cargo da ciência política a provisão intelectual e a teórica de meios de
ação do ser humano e das instituições que beneficiem a vida coletiva (IBIDEM).
Thomas Giles começa a entender a Filosofia a partir de questionamentos como: Por que
existo? Por que há algo em vez de nada? Como posso saber? Que devo fazer? É em torno
de tais interrogações, que se encontram na encruzilhada da práxis, ou seja, a minha
forma de pensar e de fazer as coisas, que o homem começa a filosofar (1979, p. 3).
Para Nalini, “A filosofia cuida não só daquilo que é – a teoria –, mas também da sede
de Justiça – que é a ética e, finalmente, do caminho da salvação – o amor à
sabedoria” (2013, p. 26).
Segundo Cassiano Cordi, “A filosofia são explicações que visam responder aos
questionamentos sobre o sentido da vida, a natureza do homem e do universo, assim
como justificar as normas políticas, éticas e religiosas da própria comunidade” (1995,
p. 9). Pois, a Filosofia é concebida como uma visão globalizadora da reflexão sobre a
totalidade e não a particularidade, que é própria da Ciência.
Como cada um de nós já entendeu que a Filosofia pode ser compreendida por vários
ângulos, então, a nossa tarefa agora é conhecer sobre o que é e do que trata a
Filosofia Política.
É importante que você passe a entender que o ideal da Filosofia Política consiste no
prolongamento da Filosofia Moral que julga o homem como ser livre, responsável e
criador do seu destino através das suas instituições constituintes, que se situam
concretamente no cerne de contradições históricas, situações essas que exigem uma
sucessão de opções, pois a política é essencialmente ação e se compreende como
ação. Também, numa noção mais pragmática “Política consiste no conjunto das relações
de poder vividas na sociedade” (CORDI, 1995, p. 133). Por sua vez, Santos destaca, que
7
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Logo, a Filosofia Política nos conclama a evitar que qualquer ordem existente se
petrifique em absoluto e assim se torna estímulo à consciência crítica e à reflexão
atuante. Pois, a política é essencialmente uma arte de decisão, o que exige por parte
de quem exerce o poder (GILES, p. 180).
Hannah Arendt, com seu olhar crítico vê a Filosofia Política como “a tentativa de
subordinar o conhecimento da coisa pública à Filosofia: tratar-se-ia de pensadores de
vida contemplativa que, tratando do negotium, o estariam subordinando
ao otium” (RIBEIRO, 1998).
Você sabia que tanto a palavra octium quanto a palavra negotium vêm dos
romanos? Hoje, quando falamos ócio, significa um lazer banalizado, e o negócio
como um conjunto de atividades que envolvem o ganhar dinheiro.
Como vemos, a Filosofia Política nos envolve e nos abre a consciência para ver a
realidade e, por isso, nos torna compromissados com ações práticas na vida em
sociedade e nos impulsiona a lutar por uma vida melhor. E é a partir da
responsabilidade de quem está exercendo o poder que cada um de nós como ser
político nos comprometemos a cobrar e exigir que os bens públicos sejam cuidados e
administrados para o público, para a sociedade e para o cidadão. Por isso, não se trata
de um lazer nem de um negócio, mas de uma atividade social e política para que a
sociedade se torne mais unida, fraterna e justa.
Em terceiro lugar, diante do que lemos até agora, podemos relacionar Ciência
Política com Filosofia Política. Primeiro, precisamos entender que os filósofos
pensam o mundo como deveria ser, enquanto os cientistas pensam o mundo tal qual
ele é. A Filosofia Política teve início com Sócrates, Platão e Aristóteles, mas vieram
muitos outros pensadores até hoje refletindo e produzindo conhecimento sobre a
8
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Filosofia Política, por exemplo, pensadores como Marco Aurélio, Santo Agostinho,
Montesquieu, Immanuel Kant, Norberto Bobbio (MATOS, 2015).
Você sabia que o que fizeram e fazem os cientistas políticos foi descrever as coisas
como devem ser, ou seja, usam a realidade para explicar a própria realidade.
Saiba também que a Filosofia Política estipula como as coisas devem ser e a Ciência
Política descreve como elas são, é preciso um mecanismo que descubra se elas
devem permanecer como são ou se devem mudar (IBIDEM). Assim, podemos
entender que ao tratar da democracia a Filosofia Política remete sempre aos
pensadores modernos, porque o sentido atual de democracia, é diferente do que
pensavam Platão e Aristóteles. A Ciência Política é aquela que está sempre presente
diante daquilo que o Estado representa pelas suas ações. Mas, como o Estado varia de
acordo a realidade de cada país e da própria forma de governo, então, tudo passa a
ter seu jeito próprio de condução dos processos eleitorais e seus sistemas partidários.
Para nós, brasileiros tudo é muito diferente da maioria dos países, mesmo sendo
democráticos, e podemos afirmar que, o Estado muda de acordo com as realidades
como o tempo e o espaço.
Enfim, é bom que tenhamos uma definição mais conclusiva sobre Filosofia Política,
então, vamos recorrer a Mario Bunge que assim conclui:
A pergunta que não pode calar: “Ficou clara a diferença entre Ciência Política e
Filosofia Política”? Ainda, outra questão pertinente e inquietante que cada um possa
fazer pessoalmente: “Qual a importância do estudo da Filosofia Política?”.
Certamente você já deve ter estudado um pouco sobre política ou mesmo ouvido
muitos comentários a respeito da política e, dessa forma, já discutira várias vezes sobre
a política, principalmente, quando se trata de política partidária. Talvez você não
soubesse que a palavra polis tem sua origem do grego de onde derivou as cidades-
Estado, como também, à política. Por isso, veja bem, polis vem de poli ou polus que
tem vários significados na língua portuguesa, daí podemos, assim, entender que
significa polir, dar polimento, dar brilho, clarear, alvejar, branquear. Sendo assim quem
mora na polis é chamado de politês, isto é, o homem polido, educado. Então, quando
se fala de política partidária, logo se entende que é necessário o candidato. Candidato
tem origem da expressão cândida que significa claro, alvo, branco, puro. Daí, o
candidato deve ser uma pessoa honesta, correta, justa, pura, translúcida, transparente.
Por sua vez, a política apresenta-se como a arte de bem governar.
9
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Quando cada um de nós fala de política não pode esquecer-se dessa primeira
concepção, pois é assim que Chauí chama a atenção para explicar que “A mutação
qualitativa produzida sobre as formas de organização social e política herdadas e que
permitiu aos gregos aquilo que o historiador Moses Finley lhes atribui como um dos
traços mais marcantes e inovadores: a invenção da política” (1994, p. 21). Sendo assim,
passamos a compreender melhor como a vida política se tornou essencial para que
houvesse a invenção da vida social numa perspectiva da vida em comunidade humana.
Outra ideia fundamental que é preciso saber, ou seja, o pensamento mítico e a
organização sóciopolítica antecederam o aparecimento da polis.
Vamos pensar a filosofia política grega a partir, em primeiro lugar, de Sócrates (469-
399 a.C.), pois ele fez a experiência política, no sentido prático, ao desempenhar
alguns cargos políticos se mostrou muito eficiente e irrepreensível como um bom
cidadão, porque sua preocupação primeira era despertar nos homens a preocupação
com os interesses da própria alma para adquirir a sabedoria e a virtude que estão
interligadas ao conhecimento de uma verdade suprema e de uma lei moral absoluta
à procura da verdade, por isso, preocupou-se em
10
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
A forma de governo que nós expusemos [...], apesar de que seja possível designá-la por
dois nomes. Pois, se entre os magistrados há um homem que se sobrepõe aos outros,
chamamos esta forma de monarquia; se a autoridade é compartilhada por vários
homens, chamamos de aristocracia. Mesmo assim, afirmo que se trata de uma única
espécie de constituição. Pois, quer o mando esteja nas mãos de um só homem, quer
nas de vários, isto não altera as leis fundamentais da cidade, se estiverem vigorando os
princípios de educação e de instrução que nós descrevemos.
Uma tal forma de governo boa e correta, tanto para a cidade como para o homem, e
julgo as outras más e defeituosas, se aquela for correta, quer objetivem a
administração das cidades, quer a organização do caráter no indivíduo.
Agora vamos tratar da figura de Platão (427-347 a.C.), que é um dos expoentes que
marca a história da Filosofia até hoje. Sua atitude reflexiva é de grande importância
para a solidificação da Filosofia no ocidente. Politicamente, precisamos entender que
Platão não era a favor da democracia, pois o poder não emanava do povo. O povo
para ele era constituído por aqueles que vivem fora da cidade, o homem do campo,
logo, não conhecia a vida nem os costumes da polis. Então, como pode haver um
governo do povo? Para Platão, o conceito de povo tem um sentido pejorativo. Cotrim
destaca que
11
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Você sabia que Platão, já naquele tempo, gostava de viajar e fez muitas viagens?
Passou um longo tempo, a convite de um imperador indiano para educar o seu filho
herdeiro do trono. Principalmente, Platão fez várias viagens à Sicília de onde sonhava,
idealizava ver concretizar-se uma sociedade justa. Na sua obra a República, ele
destaca no livro V, o valor do rei e/ou do soberano como filósofo e vocacionados a
buscar realizar a imagem de um Estado perfeito. Nos diálogos, Platão destaca
sempre um valor essencial à vida como: no Fedro e no Banquete, o primeiro lugar é
da Beleza; no Filebo, da Unidade; no Sofista, do Ser; na República, da Bondade. Tudo
isso significa que é através do conhecimento que se busca a verdade. Eis aí o papel
do filósofo na administração da Cidade.
Enquanto os filósofos não forem reis nas cidades, ou aqueles que hoje denominamos
reis e soberanos não forem verdadeira e seriamente filósofos, enquanto o poder
político e a filosofia não convergirem num mesmo indivíduo, enquanto os muitos
caracteres que atualmente perseguem um ou outro destes objetivos de modo
exclusivo não forem impedidos de agir assim, não terão fim, [...], os males das cidades,
nem, conforme julgo, os do gênero humano, e jamais a cidade que nós descrevemos
será edificada. Eis o que eu hesitava há muito em dizer, prevendo quanto estas
palavras chocariam o senso comum. De fato, é difícil conceber que não haja felicidade
possível de outra maneira, para o Estado e para os cidadãos (Domínio Público).
12
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Sem sombra de dúvidas que Platão concebia e, ao mesmo tempo, entendia que os
cidadãos deviam ser formados para a política, porque a política, afirmava, é uma
virtude. Dessa forma, porém, destacava três formas de governo e seus antagonismos,
ou seja, a democracia e seu oposto a anarquia; a aristocracia e sua oposição a
oligarquia e a monarquia tendo como contradição a tirania.
Assim, podemos compreender melhor que é com Platão que se dá, de fato e de
direito, o início ao pensamento político no Ocidente considerando-se que os regimes
políticos são distintos a partir dos que governam ou daqueles que detêm o poder
(krátos). Mondin ressalta que em Platão
O Estado tem sua origem no fato de que o indivíduo não basta a si mesmo. Ninguém
pode, com efeito, ser ao mesmo tempo alfaiate, sapateiro, professor, advogado, dentista,
camponês, artesão, etc. Para satisfazer a todas as suas necessidades o homem deve, por
isso, associar-se a outros homens e dividir com eles as várias ocupações. Dividindo os
encargos e o trabalho, poderá ele satisfazer a todas as necessidades do melhor modo
possível, porque cada um se torna um especialista no seu campo (1981, p. 75).
Por sua vez, o Estado, em busca de sua organização social e política necessita de uma
forma adequada de governo. E, é assim que, em Platão, surge a ideia da monarquia
como a forma ideal e/ou perfeita de governar. Sendo assim, Marilena Chauí (1994),
passa a explicar as formas de governo e o que cada uma representa, ou seja,
começando pela monarquia, na qual o poder pertence a um só e a honra é a
qualidade do governante. Por outro lado, na aristocracia, o poder pertence a um
pequeno grupo considerado uma elite ou os melhores, os escolhidos (áristoi) que
tem a qualidade é a areté ou excelência. Por último, a democracia, o poder pertence
ao povo (dêmos), cuja qualidade é a igualdade ou isonomia.
13
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
É fundamental entender que a política para o grego era tudo desde o fundamento da
vida comunitária como cuidar do bem comum, ou seja, a política é algo que
enobrece porque ela própria é nobre. Para o grego, a política define a sua cidadania
por ser “o bem propriamente humano” (CHAUÍ, 1994, p. 249).
14
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Para HÖFFE, Aristóteles, no início da Política, aparece em conexão com três outras
afirmações: a polis é a comunidade perfeita, ela é natural, e por natureza, anterior à
casa e aos indivíduos (2008, p. 212). É uma preocupação ética por parte de Aristóteles
a preocupação em encontrar no Estado a mais perfeita forma de sociedade, onde o
cidadão encontra a felicidade educando-se na virtude. Pois, segundo ele, “o Estado é
uma criação da natureza e que o homem é por natureza um animal político. Se
alguém, por natureza e não só acidentalmente, vive fora do Estado, é superior ou
inferior ao homem”. “Quem é incapaz de viver em sociedade, ou não precisa dela por
ser auto-suficiente, deve ser um animal ou um Deus” (MONDIN, 1981, p. 103).
Para o político a prática das virtudes é essencial, pois, o homem virtuoso é aquele que
coloca em prática princípios ético-morais fundamentais à vida em comunidade
humana, ou seja, reconhece a educação como fundamental ao desenvolvimento
intelectual e moral do cidadão. A preocupação de Aristóteles com a ética consiste em
que ela conduz a prática do bem comum e torna o homem sábio. “O homem deve
viver com a sua essência, isto é, de acordo com a sua razão, a sua consciência
reflexiva. E, orientando os seus atos para uma conduta ética, a razão o conduzirá à
prática da virtude” (COTRIM, 2002, p.104).
Enfim, a ética está presente na política como aquela que é o fundamento primeiro
para a ação prática humana, digna e justa da política. Dessa forma, é que, para
Aristóteles, as virtudes éticas são essenciais e não podem estar ausentes da vida
política e da vida do político e, isso significa dizer que
Eis quem é o cidadão e quem é o político na vida comunitária da polis: aquele que tem
equilíbrio interior. Domínio interior e fortaleza de espírito. Enfim, a virtude traz ao homem
a Felicidade. Por isso, na concepção de Aristóteles, a res publica, a coisa pública deve ser
administrada por quem tem integridade. Segundo Cortella, “A Integridade é o cuidado
para manter inteiro, completo, transparente, verdadeiro, sem máscaras cínicas ou
fissuras” (2011, p. 137). Ou seja, o indivíduo íntegro é feliz e faz o outro também ser feliz,
porque a singularidade grega, principalmente, em Aristóteles, tem como finalidade
perceber a realização pessoal como um bem público, ou seja, “de todos”. E isso faz com
que Aristóteles não admita que
15
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
O ANALFABETO POLÍTICO
O pior analfabeto
é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, não participa
dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida,
o preço do feijão, do peixe, da farinha,
do aluguel, do sapato e do remédio
dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro
16
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Aristóteles teve essa preocupação em relacionar a ética ao Estado por meio da ação
política tanto do que dirige quanto de quem vive a consciência cidadã. Só assim
podemos compreender que o Estado é esse sujeito permanentemente presente da
política e daqueles que a governam. Devemos considerar que a constituição política
não é senão a estrutura dos habitantes que compõem o Estado, mas não esquecer
que o mérito do que comanda é a prudência como virtude fundamental. Eis um
princípio ético, por excelência, para aquele que pretende governar.
17
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
A Filosofia Política grega, por si só, tornou-se o ponto referencial para que o
pensamento político tivesse uma evolução constante no Ocidente, considerando a
influência socrática, platônica e aristotélica. Uma primeira característica trata-se de
uma visão ideal da cidade-Estado e, uma segunda visão, do Estado é a dimensão
prática, objetiva da ação prática humana a partir do cotidiano do cidadão.
O que importava nesse momento era o uso da razão, pois ela esperava com
princípios, definições e demonstrações. Formulava juízos sobre as coisas para
alcançar a unidade superior, que é a dos gêneros e espécies, o conceito verdadeiro. A
Cidade é aquela que combina as qualidades de seus cidadãos para que todas as
funções essenciais sejam preenchidas da melhor maneira possível pelos seus
próprios cidadãos.
O pensamento político na idade média evolui a partir de dois fatos, isto é, o período
compreendido entre a queda do Império Romano do Ocidente em 476 e a tomada
de Constantinopla pelos turcos em 1453. Esses são os dois eventos político que
18
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
perpassaram dez séculos. Essa realidade, na idade média, não pode ser confundida
com o movimento cristão. Temos a influência dos árabes e judeus. O resultado de
tudo é que há várias Idades Médias. As tradições linguísticas e literárias, como a
francesa, que começa no final do século IX e termina no final do século XV. A Idade
Média Judaica com a expulsão dos judeus da Espanha.
Com Justiniano (séc. VI), ocorreu o século mais crucial. Considerado século da
reconquista, da suprema afirmação da romanidade bizantina, da reconstituição da
unidade de Império de Constantino. Nessa época, o poder político cristão decide
erradicar a filosofia cristã. Justiniano toma a decisão de unificação do Império e a
unidade religiosa é um meio essencial e indispensável da política imperial (LIBERA,
2004, p. 15).
Santos (2015) aponta Cícero como o pensador romano que se preocupou em divulgar
a Filosofia ao mundo romano, mas comenta que “Muitas pessoas há que não
apreciam as letras gregas, mais ainda são as que detestam a filosofia, e as restantes,
ainda que não condenem o interesse por estes estudos, pensam pelo menos que não
é coisa adequada às principais figuras do Estado a participação em debates
filosóficos” (Lúculo, II, 5). Assim, Cícero escreve seus tratados filosóficos, entre eles, os
sobre a Política. Professa um ceticismo estoico de cunho platônico. Nunca se poderá
chegar ao conhecimento absoluto. O máximo que a Filosofia pode é deduzir o
provável. Não obstante, o filósofo deve ser guiado pelo entendimento das
necessidades da cidade.
Outro pensador importante na Idade Média é Santo Agostinho (354 – 430: comenta
que o diálogo é uma obra de arte. Através dele é possível destacar o que é
politicamente saudável. Duas outras tradições que influenciaram o pensamento
medieval que são a judaico-cristã e a neoplatônica, pois elas só reforçaram a
tendência espiritualizante e ético-moral da filosofia cristã.
Para Santo Agostinho, a política tem inicialmente uma concepção negativa da função
estatal e, se não houvesse o pecado, o mal e se todos os homens praticassem a justiça,
o Estado seria inútil. E, afirma que é impossível o Estado chegue a uma autêntica
justiça se não se reger pelos princípios morais do cristianismo. Ainda, em Santo
Agostinho a construção de uma moral política deve ser fundada numa utopia, isto é, a
partir da fé cristã na busca de um mundo mais justo. Logo, o caminho é a prática do
amor comum fundamento da ordem social, para que se torne o Estado de Deus.
19
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
É assim que, em sua obra A Cidade de Deus o que se sobressai é a ideia de uma
imagem escatológica do Reino de Deus, ou dos Céus, que se realizará a partir da
promessa de Deus a Abraão , nessa perspectiva, ressalta a presença de Igreja como
aquela que aqui na Terra deve representar o Reino dos Céus ou a Cidade Celeste. Não
é possível reivindicar uma constituição ideal, divinamente inspirada para orientar e
dirigir os Estados nas suas realizações políticas, econômicas, sociais e jurídicas. A
Cidade de Deus é uma obra política? Não no sentido de um tratado ou de um ensaio
especificamente político. Ela se desenvolve antes como uma filosofia da história ou,
mais propriamente, uma teologia da história (ALMEIDA, 2018). Por isso, na Cidade de
Deus, Agostinho mostra, através da história da humanidade, o desenvolvimento do
plano divino, para cuja execução livremente concorrem bons e maus como
instrumentos nas mãos da Providência Divina. Assim, há duas cidades: a Cidade
terrena e a Cidade de Deus ou celestial que sempre se misturaram e coexistiram. Não
podemos afirmar que a Cidade terrena se confunde com o Estado nem a cidade de
Deus com a Igreja. Então, existem aqueles que amam os bens terrenos e que estão
presos à Cidade terrena e os que amam e fazem o bem e pertencem à cidade celeste.
20
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Em sua obra, De Regimine Principum, Santo Tomás comenta que, quando seres livres
reunidos em sociedade têm um soberano que zela pelo bem comum da sociedade, o
governo é reto, justo e convém a homens livres. Quando, pelo contrário, não é o bem
comum, mas o individual que o soberano tem em vista nos seus atos, o governo é
injusto e mau.
O homem não se ordena à comunidade política segundo toda a sua pessoa e todas as
suas coisas, e por isso não convém que todos os seus atos sejam meritórios ou
demeritórios com relação à comunidade política. Antes, tudo o que o homem é, tudo
do que ele é capaz e tudo o que ele tem deve ordenar-se a Deus.
Na passagem da Idade Média para a Moderna surgem dois pensadores que trazem
uma nova concepção da política: um é Nicolau Maquiavel (1469 – 1527) e o outro,
Thomas Hobbes (1588 – 1679). O primeiro, Maquiavel, fez sua experiência política
como secretário da Segunda Chancelaria, importante função em Florença. Para ele,
todos os Estados se dividem em repúblicas ou principados, estes últimos são
hereditários ou novos que resultam do desmembramento ou da junção de partes de
Estados antigos. Eles se adquirem ou pelas armas de outro ou pelas próprias armas,
pela sorte ou pela virtude.
21
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Assim, a república sempre resultará da rebelião contra o príncipe, sendo apenas mais
uma forma de governo, todas elas defeituosas. A forma mais eficaz é aquela em que
os legisladores, conhecendo os vícios de cada sistema de governo, escolhem um que
participa de todos eles. Mas, é sob a mesma constituição que haverá o príncipe, a
nobreza e o poder do povo. Essa presença dos três poderes torna a constituição
perfeita, tendo por princípio e fundamento o fato de eu todos os homens são maus e
estão sempre dispostos a mostrar a sua natureza viciosa todas as vezes que a
oportunidade se apresentar.
Quanto a Thomas Hobbes, seu pensamento político foi influenciado pelos filósofos
Francis Bacon, Aristóteles e Maquiavel. Era a favor da monarquia, mas foi considerado
um dos principais pensadores do contratualismo. Para ele, o Estado é responsável
para se tornar o meio de previdência e de preservação da pessoa humana e, assim,
tornar a vida mais feliz. Por isso, o Estado é resultado de um contrato social e não
existe ameaça que garanta a segurança aos seus cidadãos. Esse é o estágio de
superação daquela visão natural em que os homens são predadores entre si. Para
proteger os seus cidadãos da invasão dos outros povos é delegado a um só homem ou
a uma assembleia de homens que represente a todos os cidadãos. Comprometendo-se
em manter a paz e a segurança da sociedade. Diante disso, todos devem estar unidos
ao governante ou governantes a partir da delegação de seu poder e de sua vontade
autorizando o seu direito ao outro por um contrato de todo homem com todo homem.
Assim, a sociedade passa a se unir a uma só pessoa, que é chamada de Estado. Hobbes
chama isso de grande Leviatã, ou seja, aquele deus mortal, ao qual devemos, sob o
Deus imortal, nossa paz e defesa.
Também é fundamental que essa autoridade possa usar de todo poder e força possível
necessária para garantir a paz interna e a ajuda mútua contra os inimigos externos.
Quem assume todo esse poder e as vontades da população é o soberano e os demais
são simplesmente seus súditos. O soberano alcança o poder por força natural, por
guerra ou quando os homens concordam voluntariamente, confiando a serem
protegidos por ele contra todos os demais. Por esta última via constitui-se o Estado-
instituição. Da instituição do Estado derivam todos os direitos e faculdades daquele ou
daqueles que detém o poder que lhes foi conferido pelo consentimento do povo.
22
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
23
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Refêrencias
ALMEIDA, Rogério Miranda de. O pensamento político de Santo Agostinho. 2018. Disponível em: https://
fasbam.edu.br/2018/05/04/o-pensamento-politico-de-santo-agostinho/
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e MARTINS, Maria Helena Pires. Temas de filosofia. São Paulo: Moderna,
1992.
ARISTÓTELES. A política. São Paulo: Martin Claret. Domínio Público. Disponível em:
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4667987/mod_resource/content/1/A%20Politica%20-
%20Aristoteles.pdf
CAMPOS Leandro.. A política em Aristóteles e Santo Tomás. Resenho do livro. 2019.Disponível em:
http://www.ispabrasil.com/blog/resenha-de-livro-a-politica-em-aristoteles-e-santo-tomas
BOCAYUVA, Pedro Cláudio Cunca e VEIGA, Sandra Mayrink. Novo vocabulário político: hegemonia e
pluralismo. Vol. I. Petrópolis: Vozes, 1992.
BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989.
CHAUÍ, Marilena. Introdução à história da filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles. Vol. I. São Paulo:
Brasiliense, 1994.
COULANGES, Fustel de. A cidade antiga: estudo sobre o culto, o direito e as instituições da Grécia e de Roma.
São Paulo: Revista dos Tribunais,2011.
24
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
CORTELLA, Mario Sergio. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos e políticos. São Paulo:
Cortez, 2011.
COSTA, Affonso Henrique Vieira da (Org.). Manual de iniciação à filosofia. Petrópolis: Vozes, 2008.
COTRIM, Gilberto. Fundamentos da filosofia: história e grandes temas. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
FRANCA, Leonel. Noções de história da filosofia. 24ª ed. Rio de Janeiro: Agir, 1990.
GONCALES, Julio Cleber Cremonizi. Platão: formas e deformas de governo! Disponível em: https://
siteantigo.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/direito/platao-formas-e-deformas-de-governo/37675
MARTINS, Francisco. O pensamento filosófico e político de Santo Agostinho. 2014. Disponível em: https://
pontodemira.blogs.sapo.pt/o-pensamento-filosofico-e-politico-de-55305
MATOS, Francisco De Castro. Diferença entre ciência política e filosofia. Eldorado, 2015. Disponível em: https://
jus.com.br/artigos/39091/diferenca-entre-ciencia-politica-e-filosofia
MONDIN, Battista. O homem, quem é ele? Elementos de antropologia filosófica. São Paulo: Paulinas, 1980.
________. Curso de filosofia: os filósofos do ocidente. Vol. 1. São Paulo: Paulinas, 1981.
NALINI, José Renato. Por que filosofia? 3ª ed. São Paulo: Thonson Reuters, Ed. Revista dos Tribunais, 2013.
RIBEIRO, Renato Janine. Filosofia, ação e filosofia política. Revista Brasileira de Ciências Sociais. Rev. bras. Ci.
Soc. vol. 13 n. 36 São Paulo Feb. 1998. Disponível em:
https://doi.org/10.1590/S0102-69091998000100010
SANTOS, Bento Silva. Filosofia política I. Vitória: Universidade Federal do Espírito Santo, Secretara de Ensino a
Distância, 2015. Disponível em: https://www.ricardocosta.com/sites/default/files/livros/pdf/
web_filosofia_politica_i.pdf
SOUZA, Sônia Maria Ribeiro de. Um outro olhar: filosofia. São Paulo: FTD,, 1995.
25
Unidade 2
Evolução histórica do pensamento político
Objetivos da unidade
Com Constantino, início do século IV, precisamente, a partir de 313 com a ascensão do
imperador Constantino ao poder no Império Romano, ocorre o que se denominou de
Cristandade (aliança entre o Império Romano e a Igreja). Tal aliança trouxe, naquele
momento, uma relação política muito significativa que perdura quase toda a Idade
Média a aproximação entre Igreja e Estados. Porém,
Você sabia que ocorreram dois acontecimentos históricos que foram marcantes e
muito importantes nesse momento histórico? O primeiro trata-se da Reforma
Protestante com suas implicações religiosas e políticas. O segundo ocorre através de
uma atitude de sabedoria da Igreja, que, diante do conflito existente da época,
convocou a realização do Concílio de Trento, que trouxe várias mudanças e adaptação
às questões do seu tempo. Esses acontecimentos contribuíram para muitas
mudanças na Modernidade, tanto no pensamento político quanto religioso.
O início da Idade Média, por parte da Igreja, vai despertar duas situações de
relevância para o conhecimento e o pensar humano, ou seja, a Patrística e a
Escolástica. Por parte da Igreja, vamos ter a influência de Santo Agostinho no início
da Idade Média e tem uma importância fundamental, cabendo, portanto, relacionar a
cidade dos homens com a Cidade Divina, pois tudo tem como fim a felicidade
humana. Mas Agostinho tem uma preocupação, que é o homem agir a partir do livre
28
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
arbítrio, ou seja, a razão, por sua vez, é uma faculdade ou potência da alma, como
uma espécie de olho ou sol que ilumina a alma para ver e julgar as coisas. É
justamente por possuir a razão que o homem tem a capacidade de identificar ou
conhecer a “perfeita ordem” dos seres criados, estabelecida por Deus e, conhecendo-
a, poder escolher livremente (livre-arbítrio) entre respeitá-la, contribuindo, assim, para
a reta ordem, ou transgredi-la, gerando a desordem, ou o mal. Assim, diferentemente
dos demais seres do universo, que não têm a capacidade de escolher, mas estão
programados deterministicamente para agirem sempre de acordo com a ordem, o
homem é livre para seguir ou não a ordem estabelecida por Deus. “A liberdade
humana é própria da vontade não da razão” (COTRIM, 2002, p.121).
Assim, consciente, pela faculdade da razão, da “justa ordem” estabelecida por Deus, o
homem sabe, também, qual o caminho a ser seguido para alcançar a “verdadeira
felicidade”, a saber: Deus, o principal desejo ou finalidade última de todo homem veio a
este mundo, segundo Agostinho. Ou seja, pela razão, o homem sabe que o único bem
a ser perseguido, para alcançar a “verdadeira felicidade”, não se encontra entre os bens
mutáveis deste mundo, mas no Bem imutável e eterno – Deus. (cf. COSTA, 2002).
Logo, toda dimensão política do homem só se plenifica à medida que ele busca o
bem comum e a superação do mal para atingir a verdadeira felicidade, em Deus,
embora, para o homem, a liberdade humana é própria da vontade e não da razão.
Para Tomás de Aquino, existem verdades que conduzem à superação todo poder da
razão que há no ser humano. Embora outras verdades sejam pensadas por meio da
razão, mas estão para o intelecto do homem por suas capacidades naturais.
Exatamente porque “O homem é uma síntese do material e do imaterial, um
composto do corpo e alma racional. A alma racional é forma, o ato do corpo numa
união íntima. Ela depende do corpo para a experiência e para o
conhecimento” (GILES, 1979, p. 59).
29
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
imago. Homo creatum, mas sua essentia suorum operum principium; ele mesmo é o
ponto de partida de suas obras e guia de suas ações” (2009, p. 113). E acrescenta,
(...) na medida em que é determinado por Deus em seu ser, na medida em que Deus se
revelou no tempo e determinou concretamente o Dasein do homem na Igreja como
administradora e dispensadora da graça, o problema antropológico, no sentido da
liberdade, se concentra facilmente no problema da natureza e da graça (IDEM, p. 13-14).
A Igreja articula e relaciona o religioso com o político. Como não está somente na
sacristia, não está também somente na praça pública. Ela vai à praça pública, anuncia,
denuncia, se solidariza a partir da inspiração evangélica e de sua dimensão religiosa. Não
fala politicamente da política, mas fala evangelicamente da política (IDEM, p. 56-57).
Perceber que a Igreja tem uma dimensão política é fato, pois, desde o momento em
que apresenta com propriedade a consciência crítica da relação homem, natureza e
Deus, ela já assume uma relação com a política no sentido do bem comum.
30
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Para essa visão política medieval é bom que cada um veja a importância e o valor das
ações humanas, principalmente, a partir das reflexões tomistas voltadas para o
conceito de bem comum que não deve nem pode ser contrariado. Afinal, a
concepção de Deus em sua onipotência é fonte de soberania que justifica todos os
atos e procedimentos da razão. Por isso, a cidade está na ordem natural e a harmonia
é fruto da relação do homem em busca da sabedoria divina.
Fica claro que, a Idade Média é marcada por uma problemática política frequente
que consiste em incorporar e exprimir a luta ou tensão entre fé e razão. Segundo
Souza, “No período medieval, a Europa enfeudada conta com um elemento histórico
que fornecerá um novo quadro para a questão política. Ele está ligado à emergência
e à hegemonia que o Cristianismo logrou conquistar” (SOUZA, 1995, p. 158). Mas é
importante salientar que, na Idade Média, não houve a preocupação de elaborar
teorias das formas de governo porque, no dizer de Bobbio, “O Estado era visto como
um mal necessário derivada da queda do homem. Daí o símbolo da espada e a
salvação não pela polis, mas sim pela Igreja” (1985, p. 20). E acrescenta: “Todas as
formas de governo são más porque necessariamente despóticas, não existindo
Estados bons ou maus” (IBIDEM).
Vamos dialogar um pouco sobre alguns aspectos das teorias políticas modernas,
considerando que a Modernidade é um período consideravelmente significativo. A
transição política na Modernidade traz à tona muitas experiências de forma de
governo como, por exemplo, a democracia, o comunismo/socialismo/marxismo e
suas derivações imbricadas por um sistema econômico capitalista que,
polemicamente, gerou revoluções no mundo, principalmente, no ocidente.
As várias formas de governo não são apenas modos diversos de organizar a vida
política de um grupo social, mas também fases ou modos diversos e sucessivos,
geralmente concatenados, um descendendo do outro, pelo seu desenvolvimento
interno, dentro do processo histórico (1985, p. 36).
31
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Mas, em se tratando de teorias políticas, o que vem o caso agora em nossa análise,
consideremos que as teorias estão relacionadas a um contexto de realidade que se
vai adequando de acordo com a evolução da própria esfera social. Significa afirmar
que é uma condição sine qua non a relação entre teoria e sociedade. Isso se explica
porque “A construção da realidade é um processo fundamentalmente
social” (JÚNIOR, 1995, p. 36).
Sendo assim, diante do que foi explicado acima, é possível entender, segundo
Faustino (2020), que “A Modernidade marca a transição entre o teocentrismo e o
antropocentrismo. Embora os dogmas da Igreja Católica continuem a influenciar o
modo de Governo, a razão conquista força, balizando as atitudes do governante”.
Tratemos, contudo, a partir deste momento introdutório de algumas teorias políticas e seus
expoentes que influenciaram da Modernidade até os dias atuais, pois seus pensamentos são
instigadores e impulsionadores às práticas políticas partidárias em suas variáveis que
adaptam aos contextos e as realidades da Modernidade à Contemporaneidade.
32
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Bobbio (1985) chama a atenção para a época de Maquiavel, porque já havia sinais de
repúblicas em Gênova, Veneza e Florença. Daí, o que diz ele historicamente marca o
campo das suas reflexões não a partir das cidades gregas, mas sim a partir da
república romana.
Vejamos que Maquiavel apresenta as ações do monarca que visa a manter uma
relação satisfatória do meio popular ou o interesse do público considerando o
bem comum como sendo o mais importante. Deixa transparecer que o príncipe
estaria autorizado e livre para praticar o que bem entendesse. Na introdução da
obra, O Príncipe apresenta o seguinte comentário: “A política não cabe nos
quadros dos juízos morais: pelo menos enquanto no jogo entram os meios, não os
fins” (1995, p. 17).
Para Maquiavel o poder pode ser conquistado pela virtú, que consiste em coragem,
valor, capacidade, eficácia política; pela fortuna na sorte, no acaso, na influência das
circunstâncias; pela violência e com o consentimento dos cidadãos. Segundo
Bobbio, “para Maquiavel, o que se consegue realizar não depende nem
exclusivamente da virtú nem só da “fortuna”, entende o curso dos acontecimentos
que não dependem da vontade humana” (1985, p. 87). Por isso, é de suma
importância que “o príncipe procure, [...] evitara as coisas que o tornem odioso e
33
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
desconsiderado, pois que, sempre que assim o faça, terá cumprido o que lhe cabe e
não ocorrerá perigo algum em relação aos outros defeitos” (MAQUIAVEL, p. 115, 1995).
Então, o ser político exige ser ético e fazer uso da prudência para poder administrar
em prol do bem público considerando que as violências prejudicam o bem público.
Por isso, é fundamental a criação da lei que seja favorável à liberdade do indivíduo,
enfim, de todos.
O poder do rei, além de ser absoluto, deve ser perpétuo. Entendia que o poder
absoluto e forte do rei deveria servir para o desenvolvimento da nação, para o
funcionamento da justiça e o bem comum dos habitantes da nação.
Bodin considera que, para cada forma de governo, como monarquia, aristocracia e
democracia, apresenta três formas opostas. “A monarquia pode ser real, despótica ou
tirânica. A aristocracia pode ser legítima, despótica e facciosa. A democracia pode ser
legítima, despótica e tirânica” (BOBBIO, 1985, p.102).
34
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Como Bodin, Hobbes admite o poder soberano como sendo absoluto sem ser
limitado pelas leis positivas e, assim, fundou uma filosofia política baseada na
construção racional da sociedade a partir da explicação do poder absoluto dos
soberanos. Assim, “a justificação de Hobbes para o poder absoluto é estritamente
racional e friamente utilitária, completamente de qualquer tipo de religiosidade e
sentimentalismo, negando implicitamente a origem divina do poder” http://
www.arqnet.pt/portal/teoria/hobbes.html.
[...] proteja os cidadãos, o poder é igual em todas as formas de governo e o pior dos
governos é preferível às misérias e calamidades da guerra civil ou àquela condição
dissoluta do homem sem governo, sem leis e sem o poder coercitivo que o proteja da
rapina e da vingança dos seus semelhantes (1979, p. 199).
Podemos entender que, em Hobbes, essa situação, por sua própria condição do ser
humano em busca de sua liberdade e de sua felicidade, busca uma condição na qual
o Estado esteja aberto a acolher o homem como portador do direito à vida porque
tudo que está na promoção da vida é um direito próprio do homem. É aqui que vem
o verdadeiro papel do Estado, porque “o Estado surge de um pacto que os indivíduos
assumem entre si, com o propósito de alcançar a segurança da sua vida pela sujeição
comum a um único poder” (BOBBIO, 1985, p.11).
Ora, é essa situação que faz com que Hobbes fortaleça a ideia do poder do monarca,
que deve ser indivisível por ser um poder absoluto do rei, que é ilimitado. Poder
irrevogável. Nesse sentido, deve ser mantido o poder soberano, que também se une
ao espiritual no intuito de manter certa unidade para que não haja estado de guerra.
35
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Mas Hobbes se preocupa com o direito natural e é a partir dessa concepção que
nasce a ideia do Contrato Social com o objetivo de manter a convivência social.
Bonjour e Baker, em suas reflexões, pontuam as questões das leis naturais e dos
contratos em Hobbes: descrevem que o Direito de Natureza também se chama de jus
naturale, é a liberdade que cada homem tem de usar o seu próprio poder, como ele
mesmo quiser, para a preservação da sua própria natureza, ou seja, da sua própria vida,
e consequentemente, de fazer qualquer coisa que, no seu próprio juízo e razão, ele
conceba como sendo os meios mais aptos para tanto (2010, p. 545).
O estado de natureza humana como momento de inaptidão natural para a vida social.
O contrato social como formação da comunidade humana que retira o homem de seu
estado de natureza;
Porém, não podemos esquecer que tudo está envolto por uma realidade física que se
chama estado civil e, a partir de então, seria possível estabelecer uma convivência
social harmônica e pacífica. É ai que o cidadão é capaz de abrir mão de sua liberdade
36
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
d) Montesquieu (1689-1755)
A corrupção dos governantes quase sempre começa com a corrupção dos seus
princípios.
Montesquieu
Por isso, Montesquieu propõe o problema de saber se há leis gerais que presidem a
formação e o desenvolvimento da sociedade humana, de modo geral, e das
sociedades, consideradas em particular. Sua dimensão é, sobretudo, espacial ou
geográfica e diante da variedade das sociedades humanas e seus respectivos
governos (BOBBIO, 1985).
“De modo geral, a lei é a razão humana enquanto governa todos os povos da
terra; e as leis políticas e civis de todas as nações não devem ser se não os casos
particulares em que se aplica essa razão humana”.
Por isso, Montesquieu tem como objetivo a construção de uma teoria geral da
sociedade considerando a possibilidade do maior número possível de sociedades
historicamente estruturadas.
Para Montesquieu, relata Bobbio, a filosofia política destaca que a variedade das leis
está em três categorias, são elas:
37
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
• O governo “republicano” é aquele no qual todo o povo, ou pelo menos parte dele,
detém o poder supremo. Por sua vez, na “república” temos tanto a aristocracia
quanto a democracia, na qual o governo exerce o poder pela maioria do povo ou
por uma parcela do povo. Quando na “república” todo o povo dispõe do poder
supremo, então, temos uma democracia. Do contrário, é só uma parcela do povo no
poder, logo, temos uma aristocracia.
• O governo “monárquico” é aquele em que o poder está centrado em uma só
pessoa, conforme as leis que foram fixadas, determinadas e estabelecidas. Para
Montesquieu, o poder soberano se identifica com o governo de um só e, no
governo de mais de uma pessoa, não importa se os governos são muitos ou
poucos.
• O governo “despótico” consiste naquele em que um só arrasta tudo e a todos a
partir de sua vontade e caprichos, “sem leis ou freios”.
O temor dos governos despóticos nasce por si só, entre ameaças e castigos; nas
monarquias, as paixões favorecem a honra, e são por ela favorecidas; mas a virtude
política é uma renúncia a si mesmo, sempre penosa. Podemos defini-la como o amor
das leis e da pátria – amor que, exigindo a preferência contínua do interesse público,
em oposição ao privado, produz todas as virtudes particulares, as quais não são mais
do que essa preferência (1985, p. 133).
38
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
máximas, o povo as segue por mais tempo do que aqueles que conhecemos como
homens de bons costumes. Raramente a corrupção se origina no povo (Ibidem).
A corrupção é uma quebra de decoro, de princípios éticos e morais que afeta toda a
sociedade, prejudicando-a. Como foi destacada anteriormente, a corrupção
raramente se origina no povo. Então, na atualidade, vivemos uma crise muito séria de
identidade e relativização dos valores. Principalmente os valores éticos, pois se prega
uma relativização de valores em todos os meios, considerando os Meios de
Comunicação Social de Massa. Tanto a televisão e as rádios como também e,
fundamentalmente, as redes sociais via internet. Cada um constrói a sua verdade e
propala uma de rede fake News desconstruindo os valores humanísticos e
criminalizando pessoas inocentes, na maioria das vezes.
39
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Max Weber
O pensamento de Max Weber nos coloca diante de uma dinâmica de escolhas, mas
tem de ser escolhas conscientes não falaciosas nem mentirosas. O faz de conta,
enganando-se a si mesmo. Weber vê o valor que tem a racionalidade na tomada de
decisão quando se quer alcançar um objetivo e quais critérios são escolhidos para
atingir determinados resultados das ações sociais do indivíduo na sociedade.
Como iniciamos este tópico falando da questão ética, precisamos pontuar que foi
Weber que procurou fazer uma distinção entre a ética da convicção e a ética da
responsabilidade, que é uma questão muito recorrente no momento.
Num primeiro momento, ele parte do Sermão da Montanha para dizer que “a ética
da convicção não é necessariamente religiosa: uma vez que se caracteriza
essencialmente pelo compromisso com um conjunto de valores associados a
determinadas crenças. Nesse caso, as intenções do agente são mais importantes que
as considerações dos resultados e do sucesso de seus atos”.
Sendo assim, Weber já demonstra a força e o poder da comunicação e ação humana por
uma ética que liberte o homem da dependência de si mesmo e do outro. E, por isso
mesmo, Weber destaca a relevância da vida como ela é concretamente. Nesse caso, a
ética da responsabilidade tem mais sustentação e consistência na sua aplicabilidade.
Agora é a vez de tratarmos outra abordagem, ou seja, vamos tratar de Paul Ricoeur
(1913-2005)
40
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Quero iniciar a nossa conversa com a explicação de Marcelo Tura, que faz a seguinte
afirmação:
Ricoeur possui uma visão diferente dos pensadores que defendem que a política não
possui uma racionalidade própria, sendo uma simples variável do econômico.
Também, evitando uma abordagem moralizante da política, propõe que a relação
entre a política e a ética seja vista a partir da interseção entre três círculos: o
econômico, o político e o ético.
http://www.saoluis.br/revistajuridica/arquivos/014.pdf
41
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Ser visto e ouvido por outros é importante pelo fato de que todos vêem e ouvem de
ângulos diferentes. É este significado da vida pública.
Hannah Arendt
O que mais marca a vida de Hannah Arendt é o seu dinamismo e entusiasmo por ser
uma lutadora da causa sionista. Sua obra é controversa e polêmica, pois escrevia de
forma clara e acessível para o leigo. O pensar era uma inspiração da experiência
pessoal. Pela sua exuberante vivência, adquiriu consistência e compreensão sobre
política. Siviero (2016) comenta que a política e a filosofia no pensamento de Arendt
não ocorre separada dos acontecimentos políticos do século XX. Fundamenta-se na
crítica ao modelo político negador da pluralidade humana e põe em relevo a
necessidade de garantia do espaço público e do amor ao mundo, em vista da
recuperação do sentido de realização da política e do ser humano.
A Condição Humana é sua obra de grande relevância e nela há uma expressão forte
do ser da política a partir da ação política, ou seja, “Que a ação política é a um tempo
imprevisível e irreversível. A ação é imprevisível porque cai em uma rede de relações
humanas e ninguém pode ter certeza antecipadamente de quão significante a ação
será ou por quanto tempo ela repercutirá na comunidade” (Ibidem). E é nessa
condição da ação política que ela vê em Santo Agostinho a questão do livre arbítrio
porque, segundo ela é o que permite ao ser humano escolher e exercitar a vontade,
por meio do amor, que é o único que consegue domesticar a vontade. A liberdade
conduz o homem à experiência política porque os seres humanos nasceram para a
liberdade. Só assim, é possível manter a confiança no homem e na sua capacidade de
transformar em poder um grupo de cidadãos pelo amor.
42
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
“[...] nenhum homem pode agir sozinho [...] devem agir de comum acordo, o que
seria trivial caso não houvesse sempre alguns membros da comunidade
determinados a desrespeitar o acordo e atentar, por arrogância ou desespero,
agir sozinhos. São esses os tiranos ou criminosos, dependendo do objetivo final
a que querem chegar; o que têm em comum e o que os isola do resto da
comunidade é que acreditam no uso de instrumentos de violência como
substitutos para o poder” (NALINI, 2013).
Síntese da Unidade
43
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Referências
ABREU, Hugo Valente de. O Conflito Ético-Político em Paul Ricoeur. Dissertação de Mestrado em Filosofia:
Investigação orientada pela Doutora Maria Luísa Portocarrero F. Silva, apresentado ao Departamento de
Filosofia, Comunicação e Informação da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 2015.
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e MARTINS, Maria Helena Pires. Temas de filosofia. São Paulo: Moderna,
1992.
SORELL, Tom. Hobbes. In: Nicholas Bunnin e E. P. Tsui-James, E. P. (Orgs.). Compêndio de filosofia. São Paulo:
Loyola, 2002.
COTRIM, Gilberto. Fundamentos da filosofia: história e grandes temas. Petrópolis, Vozes, 2008.
COSTA, Marcos Roberto Nunes. O problema do mal, na polêmica antimaniquéia de Santo Agostinho. Porto
Alegre, 2002.
FAUSTINO, André. Teorias sobre as formas de governo e o conflito de sua aplicação na pós-modernidade,
2020. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/cadernos/filosofia/teorias-sobre-as-formas-de-governo-e-
o-conflito-de-sua-aplicacao-na-pos-modernidade/
HEIDEGGER, Martin. História da filosofia, de Tomás de Aquino a Kant. Petrópolis: Vozes, 2009.
JÚNIO, João Francisco Duarte. O que é realidade. São Paulo: Brasiliense, 1995.
44
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
NALINI, José Renato. Por que filosofia? 3. Ed. Ver, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.
PINSKY, Jaime e PINSKY, Carla Bassanezi. História da cidadania. São Paulo: contexto, 2003.
Portal da História: teoria política. Disponível em: http://www.arqnet.pt/portal/teoria/montesquieu.html
POTIER, Philippe. Paul Ricoeur e a questão política. Disponível em: Paul Ricoeur e a Questão Política1.
SIVIERO, Iltomar. Política e filosofia no pensamento de Hannah Arendt: aproximações críticas desde a
memória dos acontecimento políticos. Tese de Doutorado. São Leopoldo: UNISINOS, 2016. Disponível em:
http://www.repositorio.jesuita.org.br/handle/UNISINOS/5378?show=full
TURA, Marcelo Félix. Reflexão sobre a crise da política na contemporaneidade: Paul Ricoeur e Hanna
Harendt. Disponível em: http://www.saoluis.br/revistajuridica/arquivos/014.pdf
45
Unidade 3
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Cabe a nós, nesta terceira unidade, desenvolver mais uma reflexão analítico-crítica,
através de uma atitude filosófica responsável e comprometida com a formação da
consciência crítico-cidadã do indivíduo na sociedade.
Contudo, para que isso aconteça, é necessária uma educação para formar a criança, o
adolescente, o jovem e o cidadão em suas dimensões moral e intelectual. Significa
uma educação que tenha como objetivo a formação integral, continuada, consciente
e crítica, considerando o homem um ser para a liberdade.
Diante do que nos propomos a analisar a partir da filosofia política, implica levantar,
nesse momento, quais os dilemas e problemas politicamente são enfrentados pela
sociedade, mas a reflexão é filosófica para poder perceber e entender uma realidade
complexa e, por demais, desafiadora. Então, a Filosofia Política nos mostrará muitas
chaves de leitura para podermos analisar, interpretar e conhecer melhor a realidade e
a dinâmica do homem como um ser político.
Objetivos da unidade
47
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Num segundo significado, partindo de Aristóteles: “Está claro que existe uma ciência
à qual cabe indagar qual deve ser a melhor constituição: qual a mais apta a satisfazer
nossos ideais sempre que não haja impedimentos externos, e qual a que se adapta às
diversas condições em que possa ser posta em prática [...]” (IBIDEM).
48
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
E assim, vejamos que, considerando o termo Política, porém, começou a ser usado a
partir de Auguste Comte identificando-a com a sociologia, porque os fenômenos
políticos estão sujeitos a leis invariáveis. Isso respalda a sociedade se caracterizar
como política e como global; Como auto-suficiente, independente, soberana, o que
conduz a sociedade a se tornar provida de meios para assegurar o sucesso na busca
de seu fim específico e última razão de ser: o bem comum público, isto é, o conjunto
de condições, de naturezas diversas, que permita a todos os seus integrantes
(pessoas, grupos de pessoas) alcançar sua própria perfeição, cada qual mais plena e
facilmente (IDEM, p. 605).
Cada um vai construindo o seu ser político diante dos mais variados papéis que a
própria sociedade condiciona. Essa experiência se reporta a todo um processo de
dominação política, exatamente, por ser condicionado pelos aparelhos constituintes
de dominação. Por isso, o Estado se vê numa posição tão autoritária que determina
ideológica e socialmente projetos de ordem social que obriga a todos aceitarem, do
contrário, são reprimidos os que se opuserem.
49
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Mas é preciso considerar que a Política, ao se afirmar por meio da política partidária,
faz parte do Estado, que tem como direito e dever reconhecer os direitos do cidadão
e, por isso mesmo, Bobbio afirma que,
Esta é a grande utopia de Bobbio: uma democracia cósmica. Mas, como o homem é
um eterno sonhador, então, a utopia alimenta e impulsiona a continuar buscando e
lutando em prol do melhor. A democracia, realmente, é um sistema de governo por
excelência, porque tem a liberdade como princípio fundante.
Agora é a hora de fazer uma passagem, ou seja, a questão do poder está associada
à LIBERDADE do indivíduo, portanto, é preciso que entendamos, o homem como
um ser social e político e que encontra, nessa razão de ser, os fundamentos para
expressar seu direito de participação no meio social. Por isso, na tradição do
liberalismo, o valor maior e/ou supremo é a liberdade individual. Ferre e Álvarez
afirmam que “A sociedade pode usar o poder coercitivo da lei para limitar a
liberdade somente quando as ações do indivíduo podem causar prejuízo a outra
pessoa” (2005, p. 51-52). E é o outro, segundo Levinas, que “[...] não se opõe a mim
como uma outra liberdade, mas semelhante à minha e, por conseguinte, hostil à
minha” (1980, p.153). Então, a liberdade do indivíduo está numa relação
profundamente interativa com os demais. Por outro lado, no cenário da política
democrática se faz necessário entender que na
vigência efetiva de tais liberdades políticas para o conjunto dos membros da classe
explorada. Advirta-se que a vigência dessas liberdades não leva, necessariamente, à
emergência de antagonismos no seio da classe exploradora. Quanto à direção a ser
impressa a política de Estado, nem a consequente formação de “facções” ou
“partidos” (SAES, 1987, p. 25).
50
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Quem é bom é livre, ainda que seja um escravo; quem é mau é escravo, ainda que seja
um rei.
Santo Agostinho
Vejamos que a dimensão da política tem sua abrangência também pela contribuição
da liberdade com implicação na AUTONOMIA do indivíduo. Pois, o conceito de
autonomia tem sua origem na teoria política. Segundo Ferrer e Álvarez,
Quando alguém fala que é uma pessoa autônoma, pode significar que ela tem a
capacidade de se autodeterminar e de se reger por si mesma, ou seja, nesse caso,
pode ser tomada uma decisão só por ignorância, fruto de alguma coisa que está
acontecendo interna ou externamente. Pode acontecer também que pessoas com
autonomia limitada podem ter uma decisão também limitada, mas válida.
É preciso entender que uma ação autônoma toma três direções moralmente dizendo age:
1) intencionalmente;
2) com compreensão e
3) sem influências externas que determinem ou controlem sua ação (IDEM, p. 24).
Porém, vale destacar, para nosso melhor aprendizado, que ser autônomo
não significa dizer que o indivíduo é respeitado em sua autonomia.
Pensemos o que acontece com os autoritários e com os paternalistas,
simplesmente eles negam às pessoas autônomas o direito de agir conforme
seus valores e suas decisões.
51
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Ferrer e Álvarez chamam a atenção para três pontos significativos e afirmam que o
respeito pela autonomia do sujeito moral, isto é, a pessoa que é capaz de agir e
decidir autonomamente, deve ser vista a partir
Somos convidados a mergulhar um pouco nesta questão das teorias do Estado, tão
pertinentes à nossa realidade humana, considerando que vivemos realidades de
governos na atualidade que, ao perpassarem a própria história humana, deixaram
muitas marcas e marcas indelevelmente fortalecidas pelas teorias que foram
surgindo e se solidificando por poderes fortemente estruturados por ideologias que
se manifestaram de várias formas junto a tais teorias ou, especificamente, formas de
governo em torno do fortalecimento dos Estados ou do Estado.
A nossa conversa agora parte de um grande debate, mas o nosso espaço aqui é
exíguo para deliberar uma reflexão mais extensa. Portanto, vamos fazer algumas
considerações que têm o objetivo de abrir as expectativas de poder, assim, realizar
buscas e aprofundamentos. Consideremos, porém, que se faz necessário, nesse
momento, temos como ponto de partido a reflexão e/ou destaques do pensamento
de Nicolau Maquiavel.
A teoria de Nicolau Maquiavel (1469 – 1529), palmilha sobre o Estado dirigido por um
monarca. Mas vale salientar que ele substituiu a visão clássica da tripartição
aristotélica da monarquia, aristocracia (oligarquia) e res publica pela bipartição
52
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Maquiavel faz uma diferença significativa entre a Teoria do Estado que ele consolidou
dizendo exatamente que
53
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Um terceiro pensador de não menos relevância que precisamos tratar um pouco foi
Giambattista Vico (1668 – 1744), com a sua teoria histórica e sua influência da teoria
tradicional das formas de governo. Vico procura destacar o percurso histórico para
demonstrar a ação das nações e a barbárie ocorrida na civilização. Então, surgem três
formas de governo clássicas, ou seja, a aristocracia, a democracia e a monarquia.
Entendamos, portanto, que, com Vico, passa-se a entender, no império romano, a lei
de sucessão dos Estados, daí significar o surgimento de uma república aristocrática.
Como resultado, tem-se a concessão dos direitos públicos à plebe. O resultado é a
constituição de uma república popular.
54
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Depois de Vico, Hegel (1870 – 1931), vai ser a expressão da atitude filosófica que
observou o fundamento geográfico do processo histórico mundial. No entanto,
seguiu o pensamento de Montesquieu quanto às formas de governo, quando se trata
do jovem Hegel, que as acha relevantes, isto é, o despotismo – oriental; a república
dos antigos; a monarquia moderna.
Bobbio (1985, p. 147-149), apresenta várias reflexões referentes a Hegel e suas ideias
quanto às formas de governos instituídas e vivenciadas como sendo correlacionadas
a Montesquieu. Então, Hegel explica que a constituição é a “porta pela qual o
momento abstrato do Estado penetra na vida e na realidade”, e que a primeira
determinação que assinala a passagem da ideia abstrata de Estado as forma concreta
e histórica é “a diferença entre quem governa e quem é governado”. E aprofunda
mais um pouco: “Com razão, portanto, as constituições têm sido classificadas
universalmente nas categorias de monarquia, aristocracia e democracia. É preciso,
porém observar, em primeiro lugar, que ‘a própria monarquia pode ser distinguida
em desportismo e em monarquia como tal’”.
“De fato o Estado é um todo orgânico, no qual todas as articulações são necessárias,
como num organismo. Ele é um todo orgânico de natureza ética. O que é livre não
tem indivíduos: concede-lhes momentos de construção, e, não obstante, o universal
conserva a força que mantém essas determinações unidas a si”. A forma de governo é
a estrutura política de uma sociedade bem determinada, cada sociedade possui sua
própria constituição – e não pode ter uma outra. Mas há uma anotação preciosa de
1818, onde Hegel faz a seguinte afirmação: “Monarquia constitucional, única
constituição racional/Constituição a) em grandes Estados b) onde o sistema da
sociedade civil já se desenvolveu/Democracia em pequenos Estados”.
Então, vejamos como a ideia de Hegel é influenciada por Montesquieu e chega à conclusão
de que a monarquia constitucional é aquela que, na Filosofia do Direito, cujas ideias sobre a
família e a sociedade civil se sobressaem. O Estado moderno tem como excelência a
monarquia constitucional.
Tratemos agora Karl Marx (1818 – 1883) que, com certeza, está sempre presente em
nossas reflexões diante das questões por ele levantadas e que trouxeram muitas
análises no âmbito da filosofia política e da ciência política e já foi lido várias vezes.
Pois, Marx procurou desenvolver mais do que uma teoria: preocupou-se mais com a
formação histórica do estado, daí se entendem suas ideias sobre o marxismo
dialético, histórico e econômico. Porém, com isso, Marx descreve a uma concepção
negativa o Estado a partir de duas considerações, ou seja,
55
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Mediante essas visões e/ou concepções de teorias de Estado, não poderíamos deixar
de conversar a respeito das CLASSES SOCIAIS, pois refletem como as sociedades, ao
se estruturarem politicamente, foram-se subdividindo em estratos sociais como em
castas indianas, estamentos na Idade Média e classes sociais no capitalismo moderno/
contemporâneo. Assim podemos visualizar no quadro abaixo.
Casta
É uma forma de estratificação social caracterizada: pela endogamia; pela
transmissão hereditária de um estilo de vida que, frequentemente, inclui um
ofício (profissão), status ritual numa hierarquia e interações sociais
consuetudinárias (habituais); e pela exclusão baseada em noções culturais de
pureza e poluição...
Sociedade Estamental
É uma forma de organização social na qual a sociedade é dividida em grupos
sociais separados uns dos outros por privilégios, sendo a estratificação social
garantida pelo próprio Estado.
56
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Ainda, as classes sociais são agrupamentos que se formam a partir das desigualdades
sociais nas sociedades. No capitalismo, as estruturas jurídicas afirmam que, perante a
lei, todos os cidadãos são formalmente iguais. Isso significa dizer que não se pode
pertencer a uma classe por direito.
Porém, a definição clássica de classes implica ainda uma relação entre elas como
realidade econômica e função social da divisão do trabalho e, de maneira mais ampla,
por elementos de consciência, linguagem e representação política.
A identificação imediata das classes sociais leva a um critério excessivo voltado para
os critérios econômicos da exploração e da apropriação do excedente ou sobrevalor
econômico. O critério para se discernir as classes sociais passa pela relação entre
proprietários e não-proprietários dos meios de produção. Entretanto,, também são
necessários critérios culturais e avaliação das formas de consciência e dos modelos de
ação e comportamento para identificarmos esses agrupamentos humanos em
movimento, que são as classes sociais.
57
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Sendo assim, podemos entender que o momento da força e da ação política reflete
sobre a ação da sociedade em sua superestrutura, mas que a sociedade civil é que
tem de tomar posições em luta por melhores condições dignas de sobrevivência,
então, as classes sociais operária, estudantil, rural (pequenos agricultores), etc. têm o
direito a lutar contra a ideologia dominante e as relações políticas de poder, para que
haja mais equidade social.
58
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
A lista é encabeçada por Jorge Paulo Lemann, sócio do fundo 3G Capital, que possui
participações nas empresas AB InBev (bebidas), Burger King (fast food) e Kraft Heinz
(alimentos). Eis a lista:
59
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Neste ano emblemático (1989) foi decretada, não sem certa pressa, a falência geral do
socialismo. Na sua esteira, como era de se esperar, promulga-se a morte do marxismo. Uma
lógica preside a ótica pela qual é apreciado esse funeral. O marxismo foi, incontestavelmente,
a estrela-guia das sociedades socialistas do Leste Europeu. Desaparecidos esses países,
enquanto modo de produção socialista, nada leva a crer que seus fundamentos teóricos
pudessem manter-se ativos. (MAGALHÃES, 2006, p. 228)
Voltando nossa atenção para as razões de ordem teórica que “justificariam” uma
posição de distanciamento e rejeição tomadas para com o marxismo e sua tradição
ao debate atual sobre a democracia e sua efetividade, temos que essas razões se
60
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Como afirmamos acima, trata-se de uma das razões aduzidas para o alijamento das
contribuições do Marxismo ao debate político sobre a democracia atual. De início,
afirmamos que o “determinismo histórico”, atribuído dogmaticamente ao marxismo,
diz respeito a um tipo de leitura (entre tantas possíveis) que denominamos “leitura
liberalista”, que não considera as vicissitudes e mesmo as ambiguidades de seu
conteúdo para o próprio Karl Marx.
Não pretendemos aprofundar agora o tema da Filosofia da História com seu pretenso
“determinismo histórico” em Marx (e suas repercussões na problemática da liberdade),
cuja negação da existência pura e simplesmente seria uma ingenuidade e cuja
absolutização seria uma maldade, no mínimo. Pois, como já dito, a existência de um
“determinismo”, em Marx, foi sempre problemático até mesmo para o próprio Marx:
61
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Podemos nos perguntar, neste momento, o que vem a ser o proletariado para Marx e
como devemos entender sua proposta da “ditadura do proletariado”. Claro, apesar da
complexidade encerrada nessas categorias, o fundamental é ter presente que essas
diferentes denominações querem expressar uma única e mesma realidade, a saber:
...o “proletariado” – o grande sujeito revolucionário de Marx – não constitui, realmente, uma
classe. Ela é, antes de qualquer coisa, um conjunto de trabalhadores assalariados, explorados
pelo capital que, pela sua situação específica no mundo da reprodução, representa o setor
mais avançado e progressista da sociedade e, portanto, o segmento com maior
possibilidade de produzir as transformações sistêmicas. (MAGALHÃES, 2011 p.100)
Ante de tudo, convém deixar claro uma coisa: a “ditadura do proletariado” sempre foi
pensada por Marx (e Engels) como uma “etapa de transição”, um “meio” para se
chegar a um “fim” (qualitativamente melhor), ou seja, “a ditadura do proletariado
representa um ‘estado de coisas’ ou uma ‘situação’ e não uma forma de governo”.
Essa “etapa de transição” seria marcada pelo controle do poder político e seus
instrumentos coercitivos; isto para evitar a “reação burguesa” frente ao fim de seus
privilégios. Neste sentido julgamos de grande importância o que nos diz Juarez:
62
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Uma dificuldade adicional para se entender essa categoria marxista foi a identificação
estabelecida por Lenin entre dois conceitos que se relacionam mais não se igualam.
Lenin confunde um conceito substancialista (o modo de operar o domínio de classe)
com a maneira pela qual o poder é exercido (forma de governo). Ele associa,
simultaneamente, a ditadura à revolução transformando um meio para alcançar um
objetivo no próprio objetivo. (MAGALHÃES, 2011, p. 83)
Outro dado importante que podemos trazer à baila é o fato de não quererem ver, os
que fazem uma “leitura liberalista” de Marx, que ele – Marx - trabalha com dois modelos
de “ditadura do proletariado”, que oscilam de sentido: um modelo próximo à Comuna
de Paris (1871), mais republicano/democrático, visto que a mesma foi eleita por sufrágio
universal; e outro modelo mais centralizado e logo, para muitos, “autoritário”. O
demasiado e exclusivo crédito à interpretação marxista-leninista, a efetiva
materialização histórica do sistema comunista russo (1917) e seu posterior “fracasso”,
fizeram prevalecer este segundo modelo (o despótico), razão pela qual o marxismo não
teria mais nada a dizer à democracia dos nossos dias.
A partir da literatura, a qual tivemos acesso nesta pesquisa inicial, pudemos constatar
e sintetizar algumas contribuições que o Marxismo, não um Marxismo dogmático,
mas um Marxismo crítico e sua tradição podem trazer ao enriquecimento do debate
sobre a democracia em nossos tempos.
Outro campo no qual o marxismo crítico e sua tradição podem dar importantes
contribuições, diz respeito ao secular e profícuo debate (muito explorado na Filosofia
e na Ciência Política) sobre as relações entre o Estado e a Sociedade Civil. É bem
63
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
verdade que não há uma teoria explícita e sistemática de Marx sobre o Estado
(sempre visto como um aparelho coercitivo a serviço de uma minoria exploradora).
Neste particular o Marxismo crítico e sua tradição contribuem com o resgate da
importância do protagonismo da Sociedade Civil que contrabalancearia o poder
centralizador do Estado. Neste sentido podemos fechar este ponto com a
contundente posição de Guimarães:
Introdução:
Entendemos que neste contexto formativo, do nosso curso, o presente material quer
ser mais um texto de convite à leitura e de motivação ao estudo-aprofundamento
pessoal do que mesmo um tratado técnico, especializado e exaustivo sobre o tema. É
com este espírito que desejamos compartilhar algumas ideias.
64
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
O estudo do liberalismo nos mostra que, desde as suas origens, esse foi um movimento
plural e multifacetado. Dessa forma, seria mais adequado falarmos de liberalismos (no
plural) e não de liberalismo (no singular), tendo também em vista a diversidade tanto de
teorias (doutrinas) como de práticas concretas consideradas liberais.
65
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Do visto até o momento, pudemos constatar que o termo “liberalismo” apresenta alto
grau de polissemia (muitos significados), pois também entre outras coisas, a sua
formação e maturação como doutrina econômica, social, jurídica e política foi-se
configurando em um longo período temporal, que vai do Séc. XVII ao Séc. XX. Período
de alta “agitação” sociopolítica e econômica, que assistiu ao surgimento do Estado
Nação (ou também chamado “Estados-Nacionais”), à ascensão da classe burguesa, ao
ressurgimento do mercado como principal instituição econômica, ao nascimento da
“imprensa livre”, à luta pela tolerância religiosa e pelo fim dos absolutismos
monárquicos de caráter divino.
Como no diz Bobbio (1994, p. 14): “Historicamente, o Estado Liberal nasce de uma
contínua e progressiva erosão do poder absoluto do rei e, em períodos históricos de
crise aguda, uma ruptura revolucionária (exemplares os casos da Inglaterra do século
XVII e da França do fim do século XVIII)”. Essa referência geográfico-temporal é
imprescindível para a boa compreensão da história do liberalismo político. Pois,
temos que, o mesmo é um fenômeno histórico que se manifesta na Idade Moderna e
que tem seu “epicentro” na Inglaterra do século XVII. Como também nos diz
Guilherme MERQUIOR (1993, p. 13): “a teoria liberal foi e em grande parte continua
sendo um invento anglo-saxônico, apoiado em uma prática institucional
singularmente contínua – o que, na fala popular, se chama ‘instituições livres’”.
Um “detalhe” interessante que devemos saber é que o termo (“o nome”) liberal, como
verbete político, só surge no Séc. XIX: nasceu nas cortes espanholas no ano de 1810,
em um Parlamento em rebelião contra a opressão exercida por Napoleão Bonaparte
(1769-1821) àquele país. No entanto, por consenso dos historiadores, o liberalismo (“a
coisa” não “o nome”), nasce como já dissemos na Inglaterra do Séc. XVII, na luta
político-religiosa de setores da população inglesa, da aristocracia e pequena nobreza
protestante inglesa contra o absolutismo monárquico do rei Jaime II (1633-1701), que
culminou na chamada Revolução Gloriosa de 1688/89.
66
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Para o “Pai do Liberalismo Político”, poder do soberano é limitado pela lei. Se este não
respeita a lei torna-se um tirano, pois assim como a usurpação consiste em exercer
um poder a quem um outro tem direito, a tirania consiste em exercer o poder além
do direito legítimo. Da ideia de governo da lei se materializam, hoje, os atuais Estados
Constitucionais ou como dizem os juristas, o Constitucionalismo estatal.
67
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Considerações Finais:
Outro tópico de grande importância social e que está intimamente relacionado com
a política é a globalização e todas as questões que a envolvem. Trata-se de um tema
bastante atual e, certamente, você já escutou ou mesmo leu algo sobre ele. Mas, o
que é a globalização, e qual a sua relação com a política?
Concebida como um processo dinâmico, embora haja boas justificativas para admitir
que a globalização é um processo relativamente recente, é possível verificar que, na
história humana, houve várias tentativas de implantação da globalização. É possível
68
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Além disso, um esboço de globalização também pode ser verificado nas chamadas
“Grandes Navegações”, que foram frutos da Expansão Marítima pioneiramente
iniciada pelos portugueses, no século XV, e imitado por outros países europeus em
todo o século XVI. A ideia era a de que as “descobertas” e conquistas de diversas
regiões e de novas terras ainda desconhecidas pelos europeus abririam novas
possibilidades de expansão da cultura e do comércio. Nós, brasileiros, por exemplo,
somos frutos de um dessas conquistas.
Fonte: https://images.educamaisbrasil.com.br/content/banco_de_imagens/guia-de-estudo/D/as-primeiras-
grandes-navegacoes.jpg
69
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Não é fácil fazer uma análise detalhada sobre os aspectos que caracterizam o
fenômeno da globalização. Contudo, a partir dos traços que esse fenômeno
apresenta, podemos destacar alguns deles. Primeiramente, importa destacar que,
embora haja os opositores ferrenhos, tal como nos é até agora apresentada, a
globalização é um processo dinâmico que é entendido como irreversível. Ou seja, é
um movimento cuja realidade é inegável, que já faz parte do nosso dia a dia, e que
cada vez mais se fortalece e se solidifica.
Esse quadro nos permite defender a ideia de que a globalização é, sem dúvidas, um
fenômeno que incide diretamente nos diferentes âmbitos das relações sociais, ora
contribuindo de forma positiva, ora contribuindo de forma massiva para o aumento
das desigualdades e da precarização das condições de vida das milhões de pessoas
que não foram integradas nesse fenômeno mundial. Quando consideramos o
conjunto de propostas das políticas internacionais, vemos que a globalização se
impõe como um desafio a ser superado. Porém, a cada dia que se passa, fica mais
evidente a incapacidade de tais políticas, e das ações decorrentes delas, de
superarem os desafios postos. E, se considerarmos a velocidade das mudanças
70
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Diante disso, o que de fato precisamos é de uma ação política internacional que seja
capaz de reconhecer os problemas existentes e, após isso, implementar práticas
políticas tragam não meros paliativos emergenciais para a resolução dos problemas,
mas que sejam capazes de superá-los numa direção que leve em conta os elementos
básicos dos valores e direitos humanos, e os princípios fundamentais de uma ética
responsável, global e igualitária.
Para tal, deve-se buscar uma maior compreensão, união e cooperação dos países
para combater os desafios comuns que marcam a realidade do nosso século. Para
concretamente agir nas instâncias mundiais, a política internacional deve-se articular
de tal modo que seja capaz de pensar ações que girem em torno dos direitos
humanos e dos valores morais universais.
Referências
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fonte, 1998.
______. Nem com Marx, nem contra Marx. Trad. Marco Aurélio Nogueira. São Paulo: UNESP, 2006.
_______. Qual Socialismo? Discussão de uma Alternativa. 3. ed. Trad. Iza de Salles Freaza. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1983.
_______. Liberalismo e Democracia. 6 ed. Trad. Marco Aurélio Nogueira. São Paulo: Brasiliense, 1994.
BOCAYUVA, Pedro Cláudio Cunca e VEIGA , Sandra Mayrink. Novo vocabulário político. Vol.1. Petrópolis: Vozes,
1992.
DOERING, Detmar; ERKENS, Rainer (Org.). Leituras sobre o Liberalismo. 2 ed. São Paulo: Instituto Firedrich
Naumann, 2009.
FERRER , Jorge José e ÁLVAREZ, Juan Carlos. Para fundamentar a bioética: teorias e paradigmas teóricos na
bioética contemporânea. São Paulo: Loyola, 2005.
FREITAG, Bárbara e ROUANET, Sérgio Paulo (Orgs.). Habermas: sociologia. São Paulo: Ática, 1990.
HOBSBAWN, Eric. A era dos extremos: o breve século XX. 2. ed. Trad. de por Marcos Santarrita. São Paulo:
Companhia das Letras, 2004.p. 401
LEVINAS, Emmanuel. Totalidade e infinito. Biblioteca de Filosofia Contemporânea. Lisboa: Edições 70, 1980.
LOCKE, John. Carta Sobre a Tolerância. Trad. João da Silva Gama. Lisboa: Edições 70, 1987.
71
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
_______ . Segundo Tratado Sobre o Governo Civil e outros escritos. Trad. Magda Lopes e Maria L. da Costa.
Petrópolis: Vozes, 1994. (Coleção Clássicos do Pensamento Político, n. 14).
MARX, K. & ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. Org. COGGIOLA, Osvaldo. São Paulo: Boitempo,
1998.
MERQUIOR, José Guilherme Merquior. Liberalismo viejo e nuevo. Trad. Stella Mastrangelo. México: Fondo de
Cultura Económica.1993.
ROCHA, José Miguel de Sacadura. Sociologia geral e jurídica: fundamentos e fronteiras. 4ª Ed. Rio de Janei2015.ro:
Forense,
SMITH, Adam. Teoria dos sentimentos morais. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
VILLA, Mariano Moreno (Org.). Dicionário de pensamento contemporâneo. São Paulo: Paulus, 2000.
72
Unidade 4
Política e problematização filosófica (II)
É sobre a questão dos fins do agir humano que a Filosofia Política adquire sua
relevância, sobretudo quando se trata de discutir como devem ser coordenadas as
ações que visem à organização política das sociedades atuais. Sob esse aspecto, a
Filosofia Política deve propor questões e insinuar possíveis respostas que firmem o
entendimento claro sobre o papel do Estado, em meio aos interesses conflitantes da
sociedade. Questões cruciais com relação aos direitos humanos, à promoção da
inclusão social, ao respeito à diversidade e ao meio ambiente, bem como à
educação universal inclusiva que promova o acesso ao conhecimento e aos bens
culturais, condição para formação da cidadania, devem estar bem definidas e
assentadas como políticas públicas de Estado e executadas com o envolvimento da
sociedade civil.
Objetivos da unidade
Nesta nossa quarta unidade, queremos enfrentar algumas questões que têm acento
politicamente significativo para as sociedades democráticas. E faremos isso
começando pelo conceito de Estado para, em seguida, relacioná-lo com os conceitos
de sociedade, poder e violência, haja vista a relevância desse entrelaçamento na
construção sistemática do pensamento filosófico político.
76
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Governo seria apenas uma das instituições que compõem o Estado, com a
função de administrá-lo. Os governos são transitórios e apresentam diferentes
formas, que variam de um lugar para outro, enquanto os Estados são
permanentes (ao menos enquanto durar o atual sistema capitalista).
Ter consciência política significa participar da política não como espectador, mas
como cidadão que analisa, reflete, propõe, luta pela cidadania, pelo bem comum.
Segundo Nascimento, “A grande utopia humana é que toda a busca de soluções em
prol do bem estar social sejam realizadas ética e bioeticamente como questões de
preservar a vida e vida com qualidade levando em consideração a dignidade
humana”. (2015, p. 269).
Então, a Filosofia Política passa a ser uma identificação do homem no mundo e com
o mundo, que nos conduz a entender como o homem sentiu a necessidade de criar e
estabelecer para sua convivência parâmetros de relacionamentos sociais, que
dessem a ele a condição de se expressar diante dos demais, a capacidade de viver
socialmente em comunidade, em sociedade. Sendo assim, fez-se necessário criar as
estruturas sociais e suas instituições culminando na estrutura maior denominada de
Estado. O Estado passou a ser o ponto central e de apoio político como expressão de
toda e qualquer ação humana para melhor situar-se no tempo e no espaço.
Daí por diante, vamos nos deparar com uma escalada crescente de conceitos em
torno do ser social e político do homem, como por exemplo, as notáveis noções de
público e privado. Na modernidade, as esferas da sociabilidade se farão mais
complexas, emergindo dimensões outrora inexistentes, a exemplo da sociedade civil.
Inicialmente, civil é toda a esfera que não é política, religiosa ou pública. Na sequência
de seu desenvolvimento sociedade civil passa a ser identificada com o mundo do
trabalho e o predomínio das relações econômicas; neste momento, emerge uma
nova dimensão a economia política.
77
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Essa realidade, afirma Bobbio (Cf. 1991), parte da concepção ou modelo hobbesiano,
consequentemente, tem suas implicações em dois elementos fundamentais: o
estado (ou sociedade) de natureza e o estado (ou sociedade) civil. Essa visão gera
uma dicotomia entre o homem que vive no estado de natureza ou no homem que
vive no estado civil. Porém, torna-se óbvio que diante dessa dicotomia, a própria
história humana das sociedades é balizadora para poder compreender toda a vida
social do homem e mostra que o estado de natureza tem um valor negativo
enquanto o estado civil tem um valor positivo. Então, Bobbio conclui que
o estado natural é o estado não político, e o estado político é o estado não natural.
Em outras palavras, o estado político surge como antítese do estado natural, do qual
tem a função de eliminar os defeitos, e o estado natural ressurge como antítese do
estado político, quando esse deixa de cumprir a finalidade para a qual foi instituído.
(Ibidem, p. 38).
Mas, é diante do consenso que se tem o despertar para o ser político pela carga de
responsabilidade pessoal e social em que vivemos e nos comprometemos com a
causa da justiça e suas implicações sociais e políticas. Todavia, o que esperamos e o
78
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
que cremos, consiste no homem ser considerado coautor no criar e recriar de sua
própria realidade política e de sua história. O homem é o construtor da história e de
mundos. Logo, é um ser político.
É interessante como, para a maioria dos filósofos modernos, inclusive Hegel, a forma
mais moderna de domínio é a monarquia constitucional, caracterizando-se por um
poder de natureza tal que “fora dele as diversas esferas devem ter sua própria
autonomia”. (BOBBIO, 1990, p. 16). Por isso, na modernidade, surgiram as teorias
pluralistas da sociedade e do Estado como uma grande evolução e explosão da
sociedade civil como também eclodiu uma visão nova de socialização do Estado.
Bobbio (1990) destaca que do pluralismo político surgiram os três mais significativos
sistemas ideológicos, quais sejam, o socialismo, o cristianismo social e o liberalismo
democrático. O primeiro é conhecido como o socialismo sindicalista a partir da
concepção de Proudhon com a ideia do socialismo autonomista e libertário. O segundo
afirma que, a vida humana se desdobra num certo número de sociedades, as quais são:
a família, as associações profissionais e de qualquer outra natureza, a Igreja e a sociedade
internacional. Por sua vez, o terceiro pluralismo é o liberal-democrático representado em
sua maioria na sociedade norte-americana que se inspirou e se firmou a partir de uma
Constituição inspirada em três princípios como: a autoridade limitada; a autoridade
equilibrada e o pluralismo político. E a partir desse pluralismo tem-se a ideia de que o
único soberano legítimo é o povo, mas o povo não deve nunca ser soberano absoluto.
Eis a regra do jogo, o Estado democrático como aquele que respeita a liberdade do
indivíduo em sua autonomia como expressão ímpar da sua liberdade. O Estado
Democrático de Direito tem por princípio preservar a liberdade como maior
expressão do livre-arbítrio. É essa consciência que deve motivar o homem a “Uma
liberdade para a qual existisse algo de verdadeiramente exterior, algo de
verdadeiramente estranho, não seria uma liberdade”. (MÜLLER, 2002, p. 130).
É de se considerar que a guerra não valida a batalha pela batalha, mas lhe confere o
ato de lutar como a expressão de quebra de uma aliança entre a preservação da
segurança e da manutenção da vida. Entretanto,
79
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
[...] nenhum instrumento para mover e remover as coisas que exigem muita força,
nenhum conhecimento da face da Terra, nenhum cômputo de tempo, nenhuma arte,
nenhuma literatura, nenhuma sociedade e, o que é pior de tudo, um medo contínuo e
um perigo de morte violenta, e a vida do homem é solitária, pobre, sórdida,
embrutecida e breve. (BONJOUR; BAKER, 2010, p. 544).
Eis o que coloca o homem todo e todo homem na luta contra o ato de ser injusto,
desumano, violento, ao mesmo tempo, diante do paradoxo das paixões que
impulsionam e inclinam os homens a uma paz como resultado do medo da morte, o
desejo das coisas que os conduzem a uma vida mais cômoda e de esperança como
possibilidade de atingi-la pela condição humana do seu trabalho.
80
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Essa posição do Estado pressiona a sociedade para uma submissão pacífica de forma
que seja indiferente ao que os governantes maquiavelicamente sejam convincentes
demonstrando que são sensíveis à problemática existente, no entanto, utilizam os
organismos do Estado para demonstrar que estão agindo e,
81
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
“coerção jurídica” e os ARE exercem uma “coação física”. (Cf. ROCHA, 2015, p. 164).
Portanto, os órgãos e instituições estão sempre a serviço do poder repressivo e
ideológico do Estado. Nas sociedades modernas/contemporâneas, o controle de poder
dos Estados é tão forte que a sociedade civil não consegue implementar nenhuma
representação governamental que esteja a seu favor, mas as elites tradicionais,
principalmente, conseguem manipular e dominar as consciências e as vontades da
maioria para se perpetuar no poder.
Essa realidade é pertinente ao contexto da sociedade atual, mas não se reduz a isto,
pois, segundo Michel Foucault, há uma disseminação do poder e a repressão que
vem dele, se espalham por todas as instâncias da sociedade, não as ICS e AIE, mas
invadindo os interiores das instituições regionais e das instituições locais. O que
82
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
vemos é o poder e sua violência se espalha numa forma de dominação e punição que
ultrapassam os limites do próprio direito e dos poderes centrais. Sendo assim temos
uma atuação do Estado disseminado por todas as instâncias sociais gerando formas
particulares de poder, dominação e violência. Os dois modelos acima são
significativos para demonstrar como a sociedade se torna refém do poder
dominante. Para Bittar, violência, poder e comunicação caminham juntos, pois os
mesmos e, principalmente, a violência,
A filosofia deverá, portanto, mudar sua forma de se relacionar como mundo e com as
pessoas (grifo nosso). Deverá agora ser uma filosofia que parte “da terra para o céu”, do
material para a ideia. Ela não poderá mais ser uma filosofia abstrata, que tem como
objetos apenas ideias que não se ligam ao mundo das relações humanas, deve
permitir ver o mundo tal como e: um palco no qual a justiça não está presente na
83
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
distribuição da terra, nas relações de poder. Ela dá elementos para pensar a ação
transformadora sobre o mundo. (Ibidem, p. 138).
A Filosofia Política tem o espaço garantido para que suas ideias perpassem fronteiras
no próprio interior do indivíduo já que deve levar à consciência que o princípio “vida”
está em primeiro lugar e que, por isso, intrinsecamente, está o princípio, “qualidade
de vida”. Este é o grande dilema das ideologias dos últimos tempos, uma ideologia
utilitarista capitalista que visa somente ao indivíduo somente a partir do interesse
econômico, instrumentalizando-o e/ou coisificando-o. Essa ideologia impõe uma
ditadura do consumo acima de tudo e, por isso, a pessoa humana passa a ser
mercantilizada, enquanto o objeto, a mercadoria, o dinheiro, o capital são
personificados. Daí a busca desenfreada pelo ter no sentido de que “os fins justificam
os meios”. È um pensamento que se deve ao poeta romano Ovídio que se encontra
em sua obra Heroides. Concomitantemente, a visão liberal, conforme Rawls, a ideia
fundamental do utilitarismo é que “a sociedade está ordenada de forma correta e,
portanto, justa quando as suas instituições principais estão dispostas de forma a
alcançar o maior saldo líquido de satisfação resultante de todos os indivíduos que a
pertencem.” (Apud MACKENZIE, 2011, p. 90).
Essa divergência razoável entre as pessoas faz com os interesses, vontades e valores de
indivíduos e grupos se cruzem e choquem em diferentes esferas da vida em
sociedade. Com isso, os conflitos na vida social e política se tornam incontornáveis. Se
não existirem princípios e regras que assegurem a convivência, coordenem as ações e
estabeleçam parâmetros públicos para julgar as reivindicações nos casos de conflito,
perde-se a própria autonomia dos indivíduos livres. (WERLE, 2018, p. 262).
84
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
o valor geral de algum objetivo parece justificar impor até custos bastante altos sobre
os outros”. (BIRD, 2011, p. 76).
Por outro lado, podemos nos perguntar como Marx via o Socialismo? Quanto ao
socialismo, entendia que dois conceitos básicos seriam necessários: a) a luta de
classes, o conflito entre proprietários e despossuídos, a burguesia e o proletariado.
Um segundo sentido, parte da visão de que; b) a práxis revolucionária e a ação dos
explorados e oprimidos na luta para abolir a propriedade privada e a sociedade de
classes e, assim, se autolibertar. (MEDEIROS, 2018).
Essas rápidas considerações sobre ideologia nos fazem compreender que a ideologia
dominante consiste num conjunto de ideias nucleares ou básicas, em torno das quais
uma classe dominante exerce a tentativa de convencer as demais classes sobre a
racionalidade e a justeza do seu próprio domínio. Mais ainda, a ideologia é sempre
uma maneira de racionalização do contexto social existente à luz dos valores e das
normas de uma classe para garantir o funcionamento menos conflitivo do seu modo
de produção. Então podemos salientar que todo esse sistema é produzido pela
intelectualidade burguesa e difundido pela pequena burguesia através de aparelhos
ideológicos e do conjunto mais vasto de todas as atividades sociais. (BOCAYUVA;
VEIGA, 1992).
Os partidos não existem por si sós, mas estão ligados a um projeto maior, ou seja, a
um projeto de sociedade. O grande desafio e o impasse é a falta de clareza para que
o partido. Na prática não existe um projeto de sociedade para ser seguido, mas
existem vários planos de governo sem determinação lógica e consistente, por isso, os
partidos não conseguem representar, de fato, uma sociedade e seus interesses. Na
realidade, existe um lobismo muito forte e determinante daqueles que representam
os partidos. Consequentemente, não é o bem comum que está em pauta, mas
interesses de grupos hegemônicos, principalmente, econômicos. na era da
globalização com uma economia determinando e ditando a regra do jogo. A pessoa
humana, contudo, é coisificada enquanto a mercadoria é reificada.
85
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Esse desgaste político merece atenção, um olhar especial em torno das liberdades
civis e políticas. Como afirma Bobbio,
O problema fundamental parece ser ‘”quem deve ter o poder” e “com quem deve
estar o poder”, não o “usá-lo para obter certos resultados e não outros”. Se se dessem
conta, pelo menos, de que o público está de olhos voltados para eles, na melhor das
hipóteses olhando com diferença, mas, segundo uma hipótese mais realista, com
crescente apreensão! (1990, p. 194).
Nessa expectativa, vivemos numa sociedade como a brasileira, que busca se firmar
enquanto democracia, considerando que ainda vivemos uma democracia
desarranjada, que necessita de transformações radicais , principalmente, quanto às
estruturas dos três poderes merecendo reformas que possam viabilizar a organização
política e tornando possível uma demanda de partidos com aos projetos sociais para
todos e, não num fortalecimento sem precedentes, sem embasamento políticos,
somente para satisfazer pequenos grupos aristocráticos que se dão no direito de
outorgar para si um poder que é de todos na democracia. Bobbio é bastante
contundente em suas proposições e destaca que,
86
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Para começarmos a compreender mais e melhor, vamos dar destaques ao que dizem
os críticos da democracia. Então, podemos começar com um olhar todo especial a
Norberto Bobbio que tanto sonhou com uma democracia cósmica. Assim ele inicia
sua explicação, definindo a democracia se posicionando da seguinte maneira:
Até mesmo as decisões de grupos são tomadas por indivíduos (o grupo como tal não
decide). Por isto, para que uma decisão tomada por indivíduos (um, poucos, muitos,
todos) possa ser aceita como decisão coletiva é preciso que seja tomada com base em
regras (não importa se escritas ou consuetudinárias) que estabeleçam quais são os
indivíduos autorizados a tomar as decisões vinculatórias para todos os membros do
grupo, e à base de quais procedimentos. (Ibidem).
87
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Diante dessa compreensão, mais uma vez é possível afirmar que é pela educação
que se pode alcançar e adotar o espaço público de conteúdo, por sua vez, envolvendo
de forma relacional a educação e a participação na vida pública. Só assim, na
democracia, a transparência é basilar e fundamentalmente expressiva para que os
indivíduos se manifestem por meio de suas ações e atos, também com suas palavras.
Norberto Bobbio (1989) destaca que a democracia, sem sombra de dúvida, nasceu
da concepção individualista, atomista, da sociedade, não há dúvida (de onde
nasceu o individualismo é um outro problema mais difícil de resolver, pois são
muitos os aspirantes ao papel de fundadores). Também não há dúvida de que a
democracia representativa nasceu do pressuposto (equivocado) de que os
indivíduos, uma vez investidos da função pública de escolher os seus
representantes, escolheriam os “melhores”.
88
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
89
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Precisamos ter sempre presente que liberdade e igualdade são princípios básicos que
norteiam as práticas democráticas ou deveriam ser. Numa democracia desarranjada
como a nossa, isso parece estranho porque na realidade há um abuso no poder sobre
o ser ético, então, assistimos uma expansão da corrupção de forma abrupta em toda
sociedade dificultando a prática da democracia. Esse é um perigo iminente que corre
a sociedade. Diante disso, não podemos de um ideal democrático enquanto
expressão da dimensão igualitária.
As democracias liberais nasceram com ideais conflitantes em seu seio e tiveram que
sustentar uma batalha constante de ideias contra detratores elitistas – até ao ponto de
tentar incorporar tais críticas à la Mil – e, em consequência disso, a democracia
enfrenta hoje diversos críticos internos e externos, de ousadia talvez crescente. O
infortúnio comum das democracias liberais dos nossos dias tem sido e continua sendo
uma fonte de preocupação para os pensadores democráticos da filosofia política.
(Ibidem, 121-122).
Eis os prós e os contra da democracia que temos. É nisso que está o valor da
liberdade na democracia e interpretar a liberdade política impulsiona-nos a ter um
ponto de vista mais próximo da realidade e criticamente estabelecer parâmetros
democráticos para a vida. Colin Bird cita Jack Lively porque ele destaca alguns pontos
significativos quando o “governo pelas pessoas” poderia significar pelo menos:
90
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Bobbio comenta que o uso de sociedade civil como Estado, embora como uma
forma de estado, corresponde ao significado tradicional de societas civilis, no
qual civilis de civitas é sinônimo de pólis; e traduz exatamente a expressão
Koinonéia politiké.
Bobbio, no livro O Marxismo e o Estado, diz que Marx e Engels utilizam a expressão
“sociedade civil’ no sentido forte da esfera das relações econômicas, contrapondo-se
às esfera das relações políticas. E aqui faz a observação de que os marxistas limitam a
“sociedade civil” em Hegel ao momento do sistema das necessidades, enquanto os
não-marxistas sabem que o sistema das necessidades é apenas o início da sociedade
91
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
que a sociedade civil na Filosofia do Direito de Hegel não significa absolutamente uma
sociedade econômica contraposta ao Estado, mas sim uma primeira manifestação do
Estado, que o próprio Hegel denomina Estado do intelecto ou da necessidade. Quem
reduz a sociedade civil hegeliana à esfera das necessidades foge a uma das
características mais originais e problemáticas da teoria do Estado de Hegel. (BOBBIO,
1979, p. 20).
A sociedade civil em Marx se identifica com a esfera das relações econômicas, que, na
visão hegeliana, existem as instituições políticas de onde ela é subjacente. Daí a
complexidade hegeliana que dificulta a interpretação da sociedade civil
apresentando três momentos que a caracterizam: o sistema das necessidades, a
administração da justiça e da política. Por isso, dizer que “a interpretação da
sociedade civil hegeliana como lugar cuja anatomia política é parcial, e no que se
refere à compreensão do genuíno pensamento de Hegel, acaba por levar a
descaminhos. (Ibidem, p. 41).
Portanto, é em A Ideologia alemã, segundo Portelli, que Marx e Engels são bem
precisos quando afirmam que a sociedade civil é o verdadeiro centro, o verdadeiro
palco da História [...]. Ela abrange o conjunto das relações materiais dos indivíduos no
interior de um estágio de desenvolvimento determinado das forças produtivas.
Abrange o conjunto da vida comercial e industrial de uma etapa. Portelli conclui que
“a sociedade civil é, pois considerada por Marx como o conjunto da estrutura
econômica e social de um período determinado: refere-se à concepção hegeliana
que compreende na sociedade civil, o complexo das relações econômicas e a
formação das classes sociais”. (1977, p. 20).
92
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
93
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Síntese da Unidade
No segundo momento da reflexão, a práxis política passa pelo papel das ideologias e de
onde elas emanam, considerando que os partidos políticos numa democracia surgem
a partir dos interesses das classes sociais e partidos formados com seus projetos e/ou
programas de governo onde se ressaltam questões como reestruturação social,
política, econômica, cultural e, ao mesmo tempo em que as ideologias são
evidenciadas para justificar as possíveis concretizações e realizações dos desejos das
94
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
Referências
BITTAR, Eduardo C. B. Teoria do estado: filosofia política e teoria da democracia. 5. ed. rev. atual. e modificada. São
Paulo: Atlas, 2016.
______. Curso de ética jurídica: ética geral e profissional. 14. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 20018.
BOBBIO, Norberto; BOVERO, Michelangelo. Sociedade e estado na filosofia política moderna. 3. Ed. São Paulo:
Brasiliense, 1991.
______. O futuro da democracia. Uma defesa das regras do jogo. 4. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989.
BOCAYUVA, Pedro Cláudio Cunca; VEIGA, Sandra Mayrimk. Novo vocabulário político: hegemonia e pluralismo.
vol. I, Rio de Janeiro: 1992.
BONJOUR, Laurence; BAKER, Ana. Filosofia: textos fundamentais comentados. Porto Alegre: Artimed, 2010.
CHAUÍ, Marilena. Introdução à história da filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles. Vol. I. São Paulo: Brasiliense,
1994.
FERRARI, Sônia Campaner Miguel. Marx, um pensador em sintonia com seu tempo. In: FERRARI, Sônia
Campaner Miguel (Org.). Filosofia política. São Paulo: Saraiva, 2019.
95
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Filosofia Política
MÜLLER, Marco Lutz. O direito natural de Hegel: pressupostos especulativos da crítica ao contratualismo. In:
DOMINGUES, Ivan; PINTO, Paulo Roberto Magalhães; DUARTE, Rodrigo (Orgs.). Ética, política e cultura. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2002.
NASCIMENTO, Ermano Rodrigues do; ANTÔNIO, Marcos. Bioética e o avanço da ciência nas descobertas das
células-tronco: células-tronco estaminais e embrionárias. In: COSTA, Danilo Vaz-Curado R. M.; EFKEN, Karl-Heinz
(Orgs.). Normas, máximas & ação. Porto Alegre: Editora Fi, 2015. p. 246-271.
PORTELLI, Hugues. Gramsci e o bloco histórico. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.
ROCHA, José Manuel de Sacadura. Sociologia geral e jurídica: fundamentos e fronteiras. 4. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2015.
TOMAZI, Nelson Dacio (Coord.). Iniciação à sociologia. São Paulo: Atual, 2000.
WERLE, Denilson Luis. O liberalismo contemporâneo e seus críticos. In: RAMOS, Flamarion Caldeira; MELO Rúrion;
FRATESCHI, Yara (Coods.). Manual de filosofia política: para cursos de teoria do estado & ciência política, filosofia e
ciências sociais. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
VAZ, Henrique C. de Lima. Sociedade civil e estado em Hegel. Síntese, nº 19, vol. VII, maio/agosto, 1980, p. 22-23.
96