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PARCIAL 01 – DIREITO PROCESSUAL PENAL III

GRUPO 04 – GAMA: Isabella Rondon, Isabella Ribeiro, Mariana Estevao,


Pedro Amilton, Ana Clara, Yasmim Carlota, Jonathan Risonho, Maria Eduarda
Viana, José Eduardo Viegas, Gabriel Luís, Vinicius Chaves, Gabriel Farias,
Giulio Borges.

CASO PRÁTICO 01:

SENTENÇA

1. Relatório:

O Ministério Público Estadual, com base no incluso


procedimento inquisitorial, ofereceu denúncia contra JOÃO DA SILVA (A) e
JOSÉ DE SOUZA (B), qualificados nos autos, pela prática do delito descrito no
art. 155, § 1º e § 4º, I e IV, do Código Penal, com as implicações do art. 61, I,
do Código Penal apenas em relação ao acusado JOSÉ DE SOUZA (B).

Narra a exordial acusatória:

“No dia 10 de setembro de 2022, por volta de 22h40min, os


acusados João da Silva (A) e José de Souza (B)no interior da
residênciada vítima Josué Viana, situada na rua Marechal de Moraes,
bairro Duque de Caxias, nesta Capital, os denunciados subtraíram
para si, mediante concurso de pessoas e rompimento de obstáculo,
um veículo automotor modelo XRE 300 2020, cor vermelha, placa
BRA20E4, pertencentes à citada vítima.

Ressai dos autos que no dia e hora dos fatos, a senhora Maria
de Jesus, moradora de um prédio próximo à referida residência foi
capaz de visualizar toda a empreitada criminosa realizada pelos
acusados, oportunidade em que ligou para a polícia, mas tendo em
vista a demora ocasionada pelo denso número de ocorrências a
viatura policial não foi capaz de localizar os acusados quando ainda
estavam na parte interna da residência.

No entanto, assim que a mencionada vizinha visualizou que a


guarnição policial compareceu ao local do crime, onde já não se
encontravam mais os denunciados, esta se dirigiu até a residência e
informou aos policiais a direção e a descrição do veículo em que os
acusados teriam empreendido fuga.

Posteriormente, diante das informações fornecidas pela


testemunha ocular, a guarnição policial logrou êxito em localizar e
deter os criminosos após, aproximadamente, 30 minutos de ronda,
próximo ao bairro Novo Colorado, também nesta Capital, ainda sob
posse da res furtiva”

A denúncia foi recebida no dia 15 de novembro do ano de


2022.

No curso da Instrução Criminal, colheram-se as oitivas da


testemunha policial Willian Risonho, bem como da vítima Josué Viana e da
testemunha Maria de Jesus, além dos interrogatórios dos acusados JOÃO DA
SILVA (A) e JOSÉ DE SOUZA (B). Na mesma oportunidade, afere-se que as
partes desistiram da oitiva da testemunha policial Cleyton Chaves, que embora
devidamente requisitada, não compareceu a solenidade.

Em sede de Alegações Orais Finais, o Ministério Público


Estadual pugnou pela parcial procedência dos pedidos formulados na
denúncia, entendendo que os acusados devem ser condenados nas penas
cominadas do artigo 155, § 4°, IV, do Código Penal, com as implicações do art.
61, I, do Código Penal apenas para o acusado JOSÉ DE SOUZA (B).

A Defensoria Pública Estadual, por sua vez, em


consonância com o parecer ministerial, pleiteou pelo afastamento da majorante
do repouso noturno, prevista no art. 155, §1°, do Código Penal, assim como
requereu seja reconhecida a atenuante da confissão espontânea em favor dos
acusados, compensando-a com a agravante da reincidência em relação ao réu
JOSÉ DE SOUZA (B), uma vez que estas são consideradas preponderantes e,
por isso, se compensam entre si, ademais, requereu a fixação da pena-base no
mínimo legal, estabelecendo-se como regime inicial para cumprimento da pena
o semiaberto para ambos os denunciados.

É o relatório. Fundamento e Decido.


Conforme consignado, trata-se de Ação Penal movida
pelo Ministério Público Estadual em desfavor de JOÃO DA SILVA (A) e JOSÉ
DE SOUZA (B), qualificados nos autos, pela prática do delito descrito no art.
155, § 1º e § 4º, I e IV, do Código Penal, com as implicações do art. 61, I, do
Código Penal apenas em relação ao acusado JOSÉ DE SOUZA (B).

2. Fundamentação:

Compulsando os autos, convenço-me que restaram


sobejamente demonstradas a autoria e a materialidade do delito de furto
qualificado mediante concurso de pessoas, previsto no art. 155, § 4º, IV,
imputado aos réus JOÃO DA SILVA (A) e JOSÉ DE SOUZA (B).

2.1. Materialidade:

A materialidade está caracterizada pelo Auto de Prisão


em Flagrante Delito, Boletim de Ocorrência, Termo de Apreensão e Entrega,
Termos de Depoimento, Termo de Declaração, Termo de Qualificação Vida
Pregressa e Interrogatório.

2.2. Autoria:

Quanto à autoria delitiva atribuída aos acusados JOÃO


DA SILVA (A) e JOSÉ DE SOUZA (B), compulsando os autos, entendo que
resta estreme de dúvidas que os ora denunciados praticaram o crime em
julgamento, conforme demonstrado pelo conjunto probatório juntado aos autos.

A testemunha Maria de Jesus relatou que:

“Que se recorda dos fatos. Que estava fumando um cigarro na


sacada do seu apartamento no momento do ocorrido. Que como o
prédio fica em uma região mais alta que a residência e por ela morar
no 11º ela tinha plena visão da casa da vítima. Que visualizou dois
homens entrando na residência. Que por já conhecer a vítima, que
morava ali há anos, estranhou a forma como os homens entraram na
casa. Que os suspeitos aparentavam estar com pressa. Que
indagada pelo promotor de justiça se teria visto a forma como
adentraram a residência. Que respondeu que entraram pelo
portãozinho da frente. Que não precisaram fazer força para
acessarem a casa. Que provavelmente a vítima teria esquecido o
portão na data do fato e por isso os sujeitos conseguiram entrar
facilmente. Que tentou ligar por vezes para Josué, mas o mesmo não
atendia. Que ligou para a polícia. Que passou todas as informações
para a atendente. Que disseram que logo uma viatura seria enviada
ao local. Que continuou vigiando a atividade suspeita. Que os
suspeitos estavam mexendo na motocicleta da vítima. Que após um
tempo conseguiram ligar a moto. Que subiram na moto e saíram pelo
portão que entraram. Que ficou preocupada e ligou novamente para a
polícia e foi informada sobre o grande número de ocorrências, mas
que uma viatura já estaria se dirigindo ao local. Que por volta de 10
minutos depois a viatura chegou ao local. Que foi até a residência
informar os policiais sobre o que acompanhou. Que passou todas as
informações referentes ao modelo da motocicleta, tempo e direção
que os sujeitos empreenderam fuga. Que os policiais agradeceram e
foram a procura dos sujeitos. Que ligou novamente para o Josué e
finalmente conseguiu falar sobre o ocorrido. Que o deixou ciente de
tudo. Que ele a informou que estaria voltando imediatamente para
sua casa.”

Em continuidade, a vítima Josué Viana narrou sua


versão fática da seguinte maneira:

“Que se recorda dos fatos. Que no dia do acontecido teria ido a um


bar com um velho amigo que passava pela cidade. Que se lembra de
ter saído do trabalho por volta de 19:30 e ter dirigido rapidamente até
sua casa, pois seu amigo o buscaria em sua casa. Que estava
atrasado e acredita que por esse motivo acabou esquecendo o portão
menor aberto. Que não estava atento ao celular, pois estava na
companhia de seu amigo, por isso não visualizou as primeiras
chamadas feitas por Maria de Jesus. Que se lembra de estar indo ao
banheiro do referido bar e pegar o celular para dar uma olhada nas
mensagens. Que só então percebeu as chamadas feitas por Maria.
Que neste momento estava o ligando. Que Maria o contou que dois
rapazes teriam invadido sua casa e levado sua motocicleta. Que ficou
desesperado e contou ao seu amigo. Que foram embora do bar
imediatamente. Que seu amigo o deixou em sua casa e foi embora.
Que começou a fazer uma vistoria geral na casa para ver se algo
mais havia sido levado. Que certificou que realmente havia esquecido
o portão menor da frente aberto em razão de sua pressa. Que
verificou que nada mais foi levado. Que posteriormente recebeu a
notícia de que os sujeitos foram detidos. Que foi intimado para
comparecer à delegacia para verificar se a motocicleta realmente era
a sua. Que confirmou se tratar do veículo que fora furtado em sua
residência.”

Após, a testemunha policial Willian Risonho foi ouvida.


Seguem abaixo trechos da sua oitiva:

“Que recebeu o chamado da ocorrência no rádio. Que estava


acompanhado de seu companheiro Cleyton Chaves. Que informaram
que dois elementos haviam invadido uma casa próximo ao mercado
Big Lar. Que estavam atendendo outra ocorrência no momento. Que
findada a ocorrência se dirigiram ao local. Que ao chegarem
visualizaram que o portão da frente estava apenas encostado. Que
entraram na residência para fazer uma vistoria. Que não encontraram
nada. Que após alguns minutos a moradora do prédio vizinho
apareceu. Que se tratava da pessoa de Maria de Jesus. Que esta os
informou que visualizou toda a cena. Que dois homens furtaram uma
moto que se encontrava na garagem da casa. Que haviam saído não
muito tempo após a chegada da viatura. Que apontou a direção em
que os suspeitos foram. Que empreenderam esforços para localizar
os dois sujeitos. Que por volta de 30 minutos depois localizaram os
dois dirigindo a mesma moto descrita pela testemunha. Que
abordaram os sujeitos. Que os sujeitos não resistiram e nem tentaram
empreender fuga do local. Que os levaram até a delegacia. Que na
delegacia ambos haviam confessado a prática delituosa.”.

Por fim, os acusados foram interrogados, oportunidade


em que confessaram ter praticado o crime que lhes é atribuído, expondo que:

JOÃO DA SILVA (A):

“Que realmente cometeu o crime. Que ele e seu comparsa estavam a


procura de uma casa para roubar. Que passaram em frente à casa da
vítima e visualizaram que o porta da frente estava apenas encostada.
Que empurraram a porta e realemente estava aberta. Que entraram
na casa. Que tentaram abrir a porta principal da casa, mas estava
trancada. Que desistiram de invadir o interior da casa. Que a
motocicleta estava na garagem da casa. Que decidiram levar a moto
apenas. Que tentaram por um bom tempo fazer ligação direta na
moto até que conseguiram. Que montaram na moto e foram embora
do local. Que ele estava dirigindo e José estava na garupa da moto.
Que foram dar um “role” pelo bairro Novo Colorado. Que quando
estavam decididos a irem embora para suas casas a polícia os
abordou. Que ali mesmo já sentia que tudo teria ido por água abaixo.
Que foram levados para a delegacia. Que confessou ter furtado a
moto”.

JOSÉ DE SOUZA (B):

“Que confirma os fatos narrados por seu comparsa. Que invadiram a


casa pois visualizaram que o portão está encostado, logo seria de
fácil acesso. Que tentaram ver se a porta da frente da casa estava
aberta, mas não estava. Que desistiram de invadir o interior da casa e
decidiram levar apenas a moto. Que conseguiram ligar a moto. Que
então foram embora do local. Que acreditavam que ninguém tinha
visto nada em razão do horário. Que estavam dando umas voltas por
alguns bairros próximos. Que logo quando já estavam prestes a irem
embora para suas casas foram abordados pela polícia. Que só
desceram da moto e ficaram em silencia. Que foram levados até a
delegacia. Que confessa ter furtado a moto junto ao seu comparsa.
Que está arrependido.”.

Deste modo, resta absolutamente comprovada a autoria


do crime que é atribuído aos acusados, tendo em vista que os próprios
confessaram de forma espontânea a prática delituosa em sede policial e
confirmaram tal registro durante a realização dos interrogatórios de ambos em
Juízo, além disso, as versões fáticas narradas pelas demais testemunhas
ouvidas no curso da Instrução Criminal são consonantes com as declarações
dos acusados, agregando ainda mais robustez acerca da autoria do delito.

Curial destacar que o depoimento da testemunha policial


Willian Risonho em Juízo, reveste-se de especial relevância no caso em
epígrafe, em razão da função pública que exercem, sendo estes elucidativos e
harmônicos, correspondentes com o momento da detenção dos acusado,
assim como todo o conjunto fático anterior à localização dos denunciados.
É imperioso ressaltar também acerca da oitiva colhida da
testemunha Maria de Jesus, que foi capaz de visualizar toda a dinâmica
criminosa em suas minúcias, desde o momento em que os denunciados
entraram pelo portão menor da residência com extrema facilidade, pois como
confirmado pela própria vítima o portão realmente teria ficado aberto à época
do fato, até o instante em que empreenderam fuga do local do crime já em
posse da res furtiva.

Os fatos, portanto, estão devidamente legitimados, as


provas são uníssonas e bem revelam a autoria imputada aos réus.

2.3. Qualificadoras:

2.3.1. Da Qualificadora do Rompimento de Obstáculo:

No que se refere à qualificadora descrita no inciso I, do §


4º, do art. 155, do Código Penal (rompimento de obstáculo), é notório que esta
não se confirgurou, uma vez que tanto a vítima e as testemunhas corroboram
da mesma narração fática explicitada pelos acusados, qual seja a de que não
houve qualquer arrombamento exercido pelos acusados para que lograssem
êxito em invadir o local do crime e, consequentemente, tornar possível a
subtração dos bens, rememorando-se que os acusados tiveram apenas que
empurrar o portão da parte externa da residência, circunstância que de maneira
alguma caracterizaria o reconhecimento da qualificadora em comento.

Neste sentido, comungo do mesmo entendimento do


Superior Tribunal de Justiça acerca do tema:

“HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. FURTO


QUALIFICADO. ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO. AFASTAMENTO
DA QUALIFICADORA. LEVANTAMENTO FOTOGRÁFICO. EXAME
INDIRETO. PROVA IDÔNEA. AUSÊNCIA DE EXAME PERICIAL.
IRRELEVÂNCIA. PRECEDENTES QUINTA E SEXTA TURMA
DESTA CORTE. RÉU REINCIDENTE. REGIME SEMIABERTO.
CABIMENTO. HABEAS CORPUS DENEGADO. 1. Nos termos da
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a falta de laudo
pericial no local do delito não impede o reconhecimento da
qualificadora do rompimento de obstáculo quando “realizada perícia
indireta, além do mais as fotografias e filmagens juntadas aos autos
comprovam o modus operandi da ação (AgRg no REsp n.
1.715.910/RS, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe
25/6/2018).” (AgRg no REsp 1.823.838/RS , Rel. Ministro
SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em
05/03/2020, DJe 16/03/2020). 2. No caso, além da confissão do
Réu, o auto de verificação do local e o acervo fotográfico existente
comprovam o arrombamento de uma das portas da residência da
vítima. 3. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça, ao réu reincidente condenado à pena inferior a quatro anos
de reclusão aplica-se o regime prisional semiaberto, se
consideradas favoráveis as circunstâncias judiciais previstas no
art. 59 do Código Penal. Súmula n. 269/STJ. 4. Ordem de habeas
corpus denegada. (HC 583.044/SC, Rel. Ministra LAURITA VAZ,
SEXTA TURMA, julgado em 22/09/2020, DJe 06/10/2020)”

No caso em epígrafe, verifica-se que não foi realizado o


Laudo Pericial competente, bem como não foi justificada a impossibilidade de
realização da perícia técnica nos autos, sendo assim, é evidente o dever do
afastamento da referida qualificadora, uma vez que inexistem nos autos
elementos capazes de atestar a ocorrência do rompimento de obstáculo no
presente caso.

Sendo assim, AFASTO a qualificadora do rompimento de


obstáculo, prevista no art. 155, §4°, I, do Código Penal, com base nos
fundamentos ora expostos.

2.3.1. Da Qualificadora do Concurso de Pessoas:

No que diz respeito a esta, verifico que está presente,


também, a qualificadora prevista no inciso IV, do § 4º, do art. 155, do Código
Penal, ante o concurso de pessoas plenamente caracterizado nos autos, ao
passo que restou fartamente evidenciado que os acusados agiram em conjunto
para praticar o ato delituoso descrito na exordial acusatória, conforme
manifestado pelas testemunhas Maria de Jesus e Willian Risonho e, por
derradeiro, confirmado no intermédio de realização do interrogatório.
Ante o exposto, RECONHEÇO a qualificadora do
concurso de pessoas nos autos em epígrafe.

2.4. Atenuantes e Agravantes:

Verifico a presença da circunstância agravante da


reincidência em desfavor do acusado JOSÉ DE SOUZA (B), descrita no art.
61, I, do Código Penal, uma vez que o acusado possui duas condenações
criminais transitadas em julgado por fato anterior ao que está sendo julgado.

Por outro lado, estando presente a circunstância


atenuante da confissão espontânea (art. 65, inciso III, alínea “d”, do Código
Penal), esta deve ser levada em consideração, tendo em vista que ambas são
consideradas preponderantes e, portanto, se compensam entre si.

No que concerne ao acusado JOÃO DA SILVA (A), o


próprio não ostenta qualquer condenação criminal anterior ao fato em
julgamento e, confessou de forma espontânea a prática delitiva perante a
autoridade policial, bem como ao longo de seu interrogatório, razão pela qual
deve ser reconhecida a atenuante da confissão espontânea, tipificada no art.
65, inciso III, alínea “d”, do Código Penal, em favor deste.

2.5. Do repouso noturno (art. 155, § 1º, do Código


Penal):

Quanto a majorante do repouso noturno, prevista no art.


155, § 1º, do Código Penal, entendo como pertinente o AFASTAMENTO desta
no caso em questão, atentando-me à tese fixada no julgamento do Tema
Repetitivo n. 1087 do Superior Tribunal de Justiça, a qual versa que “a causa
de aumento prevista no § 1° do art. 155 do Código Penal (prática do crime de
furto no período noturno) não incide no crime de furto na sua forma qualificada
(§ 4°)”, neste contexto, trago recente julgado do Superior Tribunal de Justiça:

“RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA.


DIREITO PENAL. FURTO. PRECEDENTE JUDICIAL
VINCULATÓRIO. REEXAME DE ORIENTAÇÃO
JURISPRUDENCIAL. NECESSIDADE. HERMENÊUTICA JURÍDICA.
NÃO INCIDÊNCIA DA MAJORANTE DO REPOUSO NOTURNO NO
FURTO QUALIFICADO. AUMENTO DE PENA EM RAZÃO DE
FURTO COMETIDO DURANTE O REPOUSO NOTURNO.
DESPROPORCIONALIDADE. 1. Na formulação de precedente
judicial, sobretudo diante de sua carga vinculatória, as orientações
jurisprudenciais, ainda que reiteradas, devem ser reexaminadas para
que se mantenham ou se adéquem à possibilidade de evolução de
entendimento. 2. A interpretação sistemática pelo viés topográfico
revela que a causa de aumento de pena relativa ao cometimento do
crime de furto durante o repouso noturno, prevista no art. 155, § 1º,
do CP, não incide nas hipóteses de furto qualificado, previstas no art.
155, § 4º, do CP. 3. A pena decorrente da incidência da causa de
aumento relativa ao furto noturno nas hipóteses de furto qualificado
resulta em quantitativo que não guarda correlação com a gravidade
do crime cometido e, por conseguinte, com o princípio da
proporcionalidade. 4. Tese jurídica: A causa de aumento prevista
no 1° do art. 155 do Código Penal (prática do crime de furto no
período noturno) não incide no crime de furto na sua forma
qualificada (§ 4°). 5. Recurso especial parcialmente provido.” (g.n)

Além disso, a fim de agregar ainda mais robustez à tese


firmada, exponho que o egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso,
responsável por reexaminar decisões proferidas em primeira instância, partilha
do mesmo entendimento superior assentado em meio a toda discussão
doutrinária divergente, sendo assim, exponho o corrente julgado:

“APELAÇÃO CRIMINAL – ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA –


ABSOLVIÇÃO – IRRESIGNAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO –
CONDENAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – ELEMENTARES DO TIPO
PENAL DESCRITO NO ART. 288 DO CP NÃO CONFIGURADAS –
MERO CONCURSO DE AGENTES – TENTATIVA DE FURTO
QUALIFICADO PRATICADO DURANTE O REPOUSO NOTURNO –
DOSIMETRIA – PENA-BASE – CULPABILIDADE – NECESSIDADE
DE VALORAÇÃO NEGATIVA – MAIOR CENSURABILIDADE DO
ATO – PREMEDITAÇÃO – TENTATIVA – ALTERAÇÃO DA FRAÇÃO
DE 1/2 ADOTADA NA SENTENÇA – ITER CRIMINIS QUE SE
AMOLDA À FRAÇÃO MÍNIMA DE REDUÇÃO – CAUSA DE
AUMENTO DO REPOUSO NOTURNO– EXCLUSÃO DE OFÍCIO –
REPETITIVO 1.087 DO STJ – RECURSO CONHECIDO E
PARCIALMENTE PROVIDO.
Para a devida caracterização do delito de associação criminosa,
tipificado no art. 288 do CPP, faz-se necessária, além da reunião de
três ou mais pessoas, que a associação tenha estabilidade e
permanência, ou seja, caráter relativamente duradouro. A
premeditação constitui fundamento idôneo para a majoração da pena-
base em decorrência da maior culpabilidade da ação delituosa
(Enunciado 49 das Câmaras Criminais Reunidas). Se o iter criminis
percorrido pelos réus muito se aproximou da consumação,
imperiosa a modificação da fração de redução adotada para 1/3.
Consoante a tese fixada no julgamento do tema repetitivo n.
1.087 do STJ, a causa de aumento do repouso noturno não
incide no crime de furto na sua forma qualificada (art. 155, § 4º,
do CP), dado que o § 1º se refere à pena de furto simples. (N.U
0000305-69.2019.8.11.0055, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS,
PEDRO SAKAMOTO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em
21/09/2022, Publicado no DJE 23/09/2022).” (g.n)

3. Dispositivo:

Por todo o exposto, JULGO PARCIALMENTE


PROCEDENTE a pretensão contida na denúncia formulada pelo Ministério
Público Estadual para CONDENAR os acusados JOÃO DA SILVA (A) e JOSÉ
DE SOUZA (B), qualificados nos autos, respectivamente, pela prática do delito
descrito no art. 155, § 4º, IV, c.c art. 65, III, alínea “d”, ambos do Código Penal,
e art. 155, § 4º, IV, do Código Penal c.c art. 61, I, c.c art. 65, III, alínea “d”,
todos do Código Penal.

4. Dosimetria:

Passo, consequentemente, à dosimetria da pena.

4.1. Circunstâncias judiciais:

a) Culpabilidade:

A culpabilidade, neste momento de dosimetria de pena,


representa o grau de reprovabilidade social da conduta concretamente
considerada, levados em conta elementos não expressamente tratados como
circunstâncias judiciais ou legais.
Do exame dos autos, verifico que inexistem elementos
suficientes para a valoração desta circunstância judicial.

b) Antecedentes:

Os antecedentes de determinada pessoa correspondem


aos fatos criminais que permearam o seu passado, precedendo, portanto, a
prática do delito em julgamento.

Vale sempre lembrar que não se pode utilizar os


Inquéritos Policiais e as Ações Penais em curso para agravar a pena-base, nos
termos da Súmula 444 do STJ.

No caso em comento, verifico que o acusado JOSÉ DE


SOUZA (B) possui duas condenações criminais com trânsito em julgado
anterior à data do fato em comento, motivação pela qual conduzo-me ao
entendimento da valoração desta circunstância judicial, explicitando que um
dos decretos condenatórios já transitados em julgado será utilizado para
compensação em face do reconhecimento da agravante da reincidência em
desfavor do acusado, bem como já explicitado no corpo desta sentença. Em
contraste, pondero que a outra condenação criminal servirá como elemento
justificador para a valoração desta circunstância judicial, atento à diretriz do art.
59 do Código Penal e do entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de
Justiça no julgamento do AgRg no HC 460.900/SP, j. 23/10/2021, na qual
entendeu que a exasperação da pena base deve se dar pelo quantum de 1/6
(um sexto) para cada circunstância judicial valorada negativamente.

c) Conduta Social:

Compulsando os autos, verifico que não há elementos


capaz de embasar a valoração desta circunstância judicial.

d) Personalidade:

Analisando atentamente os autos, inexistem elementos


cristalinos para valoração desta circunstância judicial, motivo pelo qual deixo de
fazer sua valoração.

e) Motivos:

Os motivos são os fatores que animaram o agente a


praticar o delito (qual a razão?). Eles não se confundem com o dolo ou culpa,
tampouco com a finalidade, mas estão ligados à causa da conduta, que podem
ser nobres ou vis, e poderão ser valorados quando não constituírem elementos
inerentes ao crime, isto é, quando ultrapassarem os normais da espécie e não
constituírem outras circunstâncias do crime como qualificadoras, majorantes
etc.

Assim sendo, verifico que não há elementos para


valoração desta circunstância judicial.

f) Circunstâncias:

As circunstâncias são os elementos do fato delitivo,


acessórios, ou acidentais, não integrantes do tipo, embora relacionadas ao
delito. Quando as circunstâncias estão expressamente previstas na lei,
denominam-se de “legais” (agravantes e atenuantes). Quando genericamente
previstas, devem ser fundamentadas pelo juiz, denominam-se de “judiciais”.
Portanto as circunstâncias judiciais têm caráter residual, ficando delas
excluídas as circunstâncias qualificadoras, as agravantes e as causas de
aumento. Compreendem, portanto, as singularidades do fato, as quais cabem
ao juiz valorar.

Deste modo, inexistem elementos capazes de alicerçar a


valoração desta circunstância judicial.

g) Consequências do crime:

A exasperação da sanção com base nas consequências


da conduta apenas será possível quando tais consequências extrapolarem,
transcenderem os limites esperados pelo tipo penal.

No caso em questão, as consequências do crime não


foram graves e não ultrapassaram os elementos do tipo penal.

Assim, deixo de valorar esta circunstância judicial.

h) Comportamento da vítima:

No caso dos autos não houve qualquer comportamento


significativo para valoração desta circunstância judicial.

Assim, fixo a pena inicial do acusado JOÃO DA SILVA


(A) em 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Quanto ao acusado JOSÉ DE SOUZA (B), fixo a pena-


base deste em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 11 (dez)
dias-multa.

4.2. Circunstâncias legais:

a) Agravantes e atenuantes:

Verifico a existência da circunstância agravante da


reincidência apenas em desfavor do acusado JOSÉ DE SOUZA (B), prevista
no art. 61, inciso I, do Código Penal, uma vez que o acusado possui
condenação criminal transitada em julgado por fato anterior ao que está sendo
julgado.

Por outro lado, estando presente a circunstância


atenuante da confissão espontânea (art. 65, inciso III, alínea “d”, do Código
Penal), esta deve ser levada em consideração, tendo em vista que ambas são
consideradas preponderantes e, portanto, se compensam entre si.

Deste modo, mantenho a pena do réu JOSÉ DE SOUZA


(B) no patamar de 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 11
(dez) dias-multa.

No que tange ao acusado JOÃO DA SILVA (A),


mantenho a pena deste em 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.
5. Pena Definitiva:

TORNO DEFINITIVA a pena do acusado JOÃO DA


SILVA (A), qualificado nos autos, em 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez)
dias-multa, fixado o valor do dia-multa em 1/30 do salário mínimo vigente.

TORNO DEFINITIVA a pena do acusado JOSÉ DE


SOUZA (B), qualificado nos autos, em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de
reclusão e 11 (dez) dias-multa, fixado o valor do dia-multa em 1/30 do salário
mínimo vigente.

6. Regime:

Com relação ao acusado JOSÉ DE SOUZA (B), assento


que a reprimenda será cumprida em regime inicial SEMIABERTO, com fulcro
no art. 33, §2°, “c”, do Código Penal, em razão da valoração de uma das
circunstâncias judiciais desfavorável ao réu (art. 59 do Código Penal).

Já o acusado JOÃO DA SILVA (A) cumprirá a


reprimenda em regime inicial ABERTO, nos termos do art. 33, §2°, “c”, do
Código Penal

7. Deliberações finais:

Restituam-se os objetos pessoais e os objetos


apreendidos, caso não compareçam em 15 (quinze) dias para retirada dos
objetos que possuem valor econômico, declaro desde já o perdimento dos
bens. Encaminhem-se para destinação.

No mais, deixo de condenar o réu nos termos do art. 387,


IV, do Código de Processo Penal, em razão da ausência de debate processual
a respeito do valor dos danos a serem eventualmente reparados e provas
suficientes a sustentá-los, primando, assim, pelo devido processo legal.
Outrossim, saliente-se que nada impede que a vítima postule o ressarcimento
do prejuízo em tela na esfera cível.
Isento o acusado do pagamento das custas e despesas
processuais.

Intimem-se as vítimas, conforme determinação constante


no artigo 201, § 2º do CPP.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Cuiabá/MT, data da assinatura.

(assinado digitalmente)
PAULO CÉZAR ALVES SODRÉ
JUIZ DE DIREITO

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