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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS

PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO
ESCOLA DE CIÊNCIAS SOCIAIS E DA SAÚDE
CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

GIOVANA MARTA DA SILVA MOMBELLI

ENVELHECIMENTO POPULACIONAL E A QUESTÃO DO CUIDADO

GOIÂNIA, 2020
GIOVANA MARTA DA SILVA MOMBELLI

ENVELHECIMENTO POPULACIONAL E A QUESTÃO DO CUIDADO

Monografia apresentada ao curso de Serviço


Social da Pontifícia Universidade Católica de
Goiás, como requisito parcial para obtenção do
grau de Bacharel em Serviço Social sob a
orientação da Prof.ª Drª. Margot Riemann Costa e
Silva.

GOIÂNIA, 2020
GIOVANA MARTA DA SILVA MOMBELLI

ENVELHECIMENTO POPULACIONAL E A QUESTÃO DO


CUIDADOR INFORMAL

Monografia defendida no curso de Serviço


Social da Pontifícia Universidade Católica de
Goiás para obtenção do grau de bacharel em
Serviço Social.
Aprovada em.....................pela seguinte Banca
Examinadora:

_____________________________________________________
Prof.ª Drª. Margot Riemann Costa e Silva
PUC Goiás
(Presidente)

Profª Drª. Maria Conceição Padial


PUC Goiás
_____________________________________________________
(Membro)

_____________________________________________________
Profª. Mª. Marly Bento
PUC Goiás
(Membro)
AGRADECIMENTOS

Compreendo que na existência humana, não há quem realize nada sozinho. De forma
obrigatória, direta ou indiretamente, em todo caso, haverá algum ou alguns que viabilizarão as
conquistas.
Por isso agradeço, primeiramente, a Deus, que é o primeiro viabilizador de tudo de
bom que se pode existir, uma vez que tudo se deu e se dá a partir dele.
Agradeço aos meus pais, Angela Maria Bezerra e Derli Mombelli, que me deram a
vida, e fizeram muito por mim e minha formação, em especial minha mãe, a qual foi, depois
de Deus, foi a maior viabilizadora da minha educação.
Agradeço aos meus avós maternos, Maria José Bezerra e Stélio Silva (in memoriam),
os quais me deram amor e cuidado, enquanto fora possível.
Agradeço ao apoio de minhas tias, tio e padrinho de batismo religioso: Maria do
Socorro Bezerra, Maria Margarete Bezerra, Regiani Mombelli, Francisco Bezerra e Claudio
José dos Santos, também ao meu padrasto Tancredo Gonçalves que me apoiaram na minha
trajetória acadêmica.
Agradeço à minha avó paterna, Dileta Bombardelli, pelo cuidado que recebi.
Nascida na região amazônica, mudei-me para Goiás no ano de 2018. Fiz alguns
amigos, que foram grandes estimuladores pessoais e não poderia deixar de mencioná-los:
Eliana Vasconcelos, José Neves e Dayse Fleury.
Agradeço à professora e querida alemã, Margot Riemann, a qual auxiliou na
construção desse trabalho.
Agradeço às professoras que participarão da banca, Maria Conceição Padial e Marly
Bento.
Agradeço a todos os professores que participaram da minha formação, desde a mais
tenra infância. Em especial, aos que foram mais marcantes.
Deixo os meus sinceros agradecimentos a todos que, direta ou indiretamente,
viabilizaram este trabalho.
"A nobreza de nosso ato profissional está em acolher aquela pessoa por inteiro, em conhecer
a sua história, em saber como chegou a esta situação e como é possível construir com ela
formas de superação deste quadro. Se reduzirmos a nossa prática a uma questão urgente, a
uma questão premente, retiramos dela toda a sua grandeza, pois os deixam de considerar,
neste sujeito, a sua dignidade humana".
(Maria Lúcia Martinelli)
RESUMO

O objetivo dessa pesquisa foi analisar as novas demandas advindas do processo de


envelhecimento populacional, visando em especial identificar os desafios e dificuldades
encontradas pelos cuidadores informais de idosos. A pesquisa baseou-se em revisão de
literatura de livros e artigos impressos ou publicados em meios eletrônicos. Identificou-se que
o idoso precisará ser cuidado e que essa necessidade de cuidado, para a sociedade, será cada
vez mais forte, devido a transição demográfica e epidemiológica, em decorrência do crescente
envelhecimento populacional. Os resultados apontam para a ideia de que maioria dos
cuidadores do tipo informal são mulheres, com vínculo familiar. O número crescente do
percentual de idosos demandará serviços públicos especializados que será reflexo do
planejamento e das prioridades atuais das políticas públicas sociais.

Palavras-chave: Envelhecimento Populacional; Idosos; Cuidador Informal.


ABSTRACT

The objective of this research was to analyze the new demands arising from the population
aging process, aiming in particular to identify the challenges and difficulties encountered by
informal caregivers of the elderly. The research was based on literature review of books and
articles printed or published in electronic media. It was identified that the elderly will need to
be cared for and that this need for care, for society, will be increasingly strong, due to the
demographic and epidemiological transition, due to the growing population aging. The results
point to the idea that most of informal caregivers are women, with family ties. The growing
number of elderly people will demand specialized public services that will reflect the current
planning and priorities of social public policies.

Keywords: Population aging; Seniors; Informal Caregiver.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Pirâmide Etária Relativa % - Brasil 1970................................................................23


Figura 2 - Pirâmide Etária Relativa % - Brasil 2010................................................................24
Figura 3 – Participação de idosos (60 anos ou mais) na população total % Brasil...................26
Figura 4 – Distribuição da população por sexo e grupo de idade e raça...................................29
Figura 5 - As principais dificuldades enfrentadas pelos cuidadores, Estratégia de Saúde da
Família (ESF) Seringal. Ananindeua, PA, 2010-2011..............................................................45
Figura 6 – Pessoas que realizaram cuidados de idosos: Por tipo de cuidado............................47
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.......................................................................................................................10

1 ENVELHECIMENTO POPULACIONAL E A NECESSIDADE DE CUIDADO......12


1.1 Evolução da estrutura demográfica no Brasil................................................................13
1.2 Transição Demográfica e Epidemiológica Brasileira: Causas e Características do
Envelhecimento Populacional................................................................................................14
1.3 Impactos do Envelhecimento: aumento da demanda por cuidados.............................19

2 COMO É O CUIDADO COM O IDOSO NO BRASIL...................................................22


2.1 A história (evolução) do cuidado para com o idoso no Brasil, em termos de legislação
e políticas públicas..................................................................................................................24
2.2 Como é a legislação para o cuidado ao idoso no Brasil, hoje?......................................27
2.3 O risco para a legislação existente, oriundo do ataque do neoliberalismo..................31

3 AUMENTO DA POPULAÇÃO IDOSA E OS DESAFIOS PARA O CUIDADOR


INFORMAL............................................................................................................................35
3.1 Os desafios vivenciados pelos cuidadores informais de idosos em domicílios.............35
3.2 O cuidador informal de idosos, desafio para o conjunto da sociedade .......................40

CONSIDERÇÕES FINAIS....................................................................................................43

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................................44
10

INTRODUÇÃO

O Brasil tem vivenciado nas últimas décadas, o aumento da expectativa de vida, em


que a realidade do envelhecimento da população tornou-se um dos principais desafios da
modernidade. É possível dizer que o cenário se agrava mais quando é somado as
desigualdades sociais, aliadas a falta de informações, o preconceito e o desrespeito à pessoa
idosa.
Outro fator que desencadeia novos desafios, é o estado de saúde no envelhecimento,
pois ocorrem alterações que comumente exigem cuidados físicos, psicológicos e sociais.
Inclui a atenção às doenças crônicas não transmissíveis às quais podem contribuir para
ocasionar ou agravar o estado de dependência dos idosos. Um desfecho comum é a
incapacidade física e mental, definida como dependência de outras pessoas para condução de
importantes tarefas e atividades da vida essenciais ou pessoais.
Com o aumento da polução idosa e os problemas de dependência por motivos de
saúde, surge a necessidade de cuidado, o qual é prestado por alguém, o cuidador. Dessa
forma, o cuidador de idosos é aquele que convive diariamente com o idoso, prestando-lhe
cuidados higiênicos, ajudando com a alimentação, administrando medicação e estimulando-o
com as atividades reabilitadoras, interagindo assim, com a equipe terapêutica. O cuidador,
portanto, é uma peça imprescindível na qualidade da atenção ao idoso, contudo ele passa por
inúmeras dificuldades diariamente por falta de informações, de suporte financeiro, técnico e
social.
A pesquisa teve como objetivos principais, analisar as novas demandas sociais
oriundas do processo de envelhecimento populacional, visando ainda identificar os principais
desafios e dificuldades encontradas pelos cuidadores informais de idosos.
Os objetivos específicos desta monografia foram: pesquisar o envelhecimento
populacional e a necessidade de cuidado; como é o cuidado para com o idoso no Brasil e o
aumento da população idosa e os desafios para o cuidador informal.
A metodologia desta pesquisa foi de caráter bibliográfico. Para a revisão de literatura,
foram consultados artigos científicos e livros impressos ou disponíveis em plataformas
eletrônicas.
Assim, o primeiro capítulo aborda algumas reflexões sobre o envelhecimento
populacional e a necessidade do cuidado, relacionando-as com os processos de transição
demográfica e epidemiológica. O cenário atual observado no Brasil é de redução do número
11

de crianças, em virtude da queda acentuada no número de fecundidade e do progressivo


aumento no grupo dos idosos, com elevação da expectativa de vida. A qual é de 72, 8 anos
para homens e 79,9 anos para mulheres. A expectativa de vida brasileira aumentou de 30,4
anos entre os anos de 1940 e 2018. (OLIVEIRA, 2019) e (IBGE, 2019).
O segundo capítulo “Como é o cuidado com o idoso no Brasil”, traz análises do
cuidado com o idoso em termos de legislações que, através da promulgação dos direitos
sociais dos idosos previstos na Constituição Federal de 1988, e nas legislações posteriores
como a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), de 1993, que regula o Benefício da
Prestação Continuada (BPC). Como Política Social Especial, é promulgada a Política
Nacional do Idoso através da Lei 8.842, de 4 de abril de 1994, e regulamentada pelo Decreto
1.948, de 3 de julho de 1996, cujo objetivo é promover a garantia dos direitos sociais do
idoso, criando condições para a promoção da sua autonomia, integração e participação efetiva
na sociedade. Neste capítulo destaca ainda a importância de discutir e socializar sobre o risco
para a legislação existente, oriundo do ataque do neoliberalismo.
Tendo o intuito de identificar e analisar os desafios e dificuldades vivenciadas pelos
cuidadores informais de idosos, o terceiro capítulo destaca a diferença entre o cuidado formal
e o cuidado informal. O cuidado formal é exercido por profissional e pessoal especializado de
acordo com um protocolo e um Código de Ética. Já o cuidado informal, na maioria das vezes
é despendido em casa, entre familiares, amigos ou alguém que presta serviços de maneira
informal mesmo sem ter vínculo familiar ou afetivo com o idoso. Apontando que o cuidado
domiciliar proporciona uma série de pontos positivos para todos os envolvidos no tratamento:
para o idoso, a proximidade do ambiente familiar acelera o processo de recuperação e evita o
deslocamento de familiares para o hospital; para a família, o fato de poder estar
constantemente com o idoso, poder tratá-lo com mais atenção, ter a oportunidade de fazer o
que acredita ser melhor, mantém e reforça laços afetivos.
Em suma, os resultados da pesquisa apontam que a nova realidade demográfica do
país, resultará em desafios socioeconômicos. Uma população mais envelhecida, necessita de
cada vez mais cuidado e para conduzir esse conflito de maneira vitoriosa, políticas públicas e
o envolvimento de todas as esferas sociais, são necessários.
12

1 ENVELHECIMENTO POPULACIONAL E A NECESSIDADE DE CUIDADO

O envelhecimento populacional significa um crescimento mais elevado da população


idosa em relação aos demais grupos etários. Isso é resultado de suas mais altas taxas de
crescimento, dada a alta fecundidade prevalecente no passado, comparativamente à atual, e
também à redução da mortalidade. Isso se traduz no aumento do número absoluto e relativo
de idosos, no tempo vivido por eles, no envelhecimento de certos segmentos populacionais,
como a População Economicamente Ativa (PEA), no envelhecimento das famílias
(crescimento do número de famílias nas quais existe pelo menos um idoso) e na mudança nos
arranjos familiares (CAMARANO, 2010).
Existem hoje leis que apoiam e dão segurança ao idoso e o Estatuto do Idoso a Lei
10.741 de 2003 é um marco nesse campo.
Como mostra o Art. 2° desta lei,

Art.2 O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana,


sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se lhe, por lei
ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua
saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em
condições de liberdade e dignidade.

Segundo este mesmo artigo do Estatuto do Idoso, a pessoa quando atinge a velhice
tem as mesmas garantias de um jovem, sendo que a do idoso tem mais proteção e garantia dos
demais.
O dever de amar, cuidar e proteger a pessoa idosa é semelhante ao que é garantido
para uma criança. No art. 3º da Lei 10.741 de 2003, encontra-se referência a esta
responsabilidade:
É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar
ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à
liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.

A lei é clara no tocante ao cuidado, pois, fica entendido que ao envelhecer, os papeis
devem se inverter, pois, quem primeiro ofertou carinho, amor, segurança e proteção, agora se
encontra na posição contrária, debilitado e incapaz de realizar ações antes desempenhadas
com maestria.
13

1.1 Evolução da estrutura demográfica do Brasil

O Brasil é um dos países da América Latina que tem experimentado um dos maiores
aumentos em relação a sua proporção de idosos na população total. Isto significa uma
acelerada tendência de envelhecimento populacional. De acordo com Miranda; Mendes; Silva
(2016) nas últimas décadas constata-se esta afirmação ao longo dos Censos e das projeções
realizadas até 2040, conforme tabela abaixo.
No atual contexto em relação à população idosa brasileira, por exemplo, a projeção
aponta que, a partir de 2039, o Brasil terá mais pessoas acima de 65 anos do que crianças de
até 14 anos. E em 2060, o país terá 67,2% de cidadãos considerados dependentes da força de
trabalho dos adultos (acima dos 65 ou abaixo dos 15 anos) para cada cem pessoas em idade de
trabalhar. (MINAYO, 2019).
O quadro dos idosos dependentes foi traçado pela Pesquisa Nacional de Saúde (PNS)
realizada em conjunto pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Ministério
da Saúde (MS) em 2013. Os dados analisados por autores como Lima-Costa et al (apud
MINAYO, 2019), mostram o seguinte: foram ouvidas 23.815 pessoas, numa amostra
nacionalmente representativa de toda a população acima de 60 anos.
Do conjunto, 56,4% eram mulheres, reafirmando sua predominância no processo de
longevidade; 32,8% eram analfabetos; 46,5% tinham de um a oito anos de estudo e 21,7%
possuíam curso superior; 14.9% viviam sozinhos; 35,6% moravam com uma pessoa e 42,3 %
com duas ou mais. Foi encontrada a prevalência 30.1% de pelo menos uma limitação para as
atividades da vida diária (AVD), chegando a 43,0% entre os analfabetos; a 29% entre os que
tinham instrução primária e 13,8 % entre as pessoas com formação superior. (MINAYO,
2019). Esses últimos dados assinalam, de um lado, a elevada proporção de idosos com perda
de autonomia; de outro, os efeitos da desigualdade, expressos nos grupos de analfabetos e
com apenas educação elementar.
A partir das análises dos dados estatísticos citados, percebe-se uma urgência por parte
do Estado e da sociedade quanto ao enfrentamento dos desafios que virão juntamente com
aumento do envelhecimento populacional. O país já tem um importante percentual de idosos,
que será crescente nos próximos anos, demandando serviços públicos especializados que será
reflexo do planejamento e das prioridades atuais das políticas públicas sociais.
14

1. 2 Transição Demográfica e Epidemiológica Brasileira: Causas e Características do


Envelhecimento Populacional

O Brasil está passando, em termos demográficos, por um período de grandes


transformações, que resultarão em um impacto significativo para a situação social e
econômica do país nas próximas décadas. O envelhecimento populacional possui estreitas
ligações com os processos de transição demográfica e transição epidemiológica, com a
mudança do comportamento demográfico da população, com a variação dos níveis de
natalidade e de mortalidade, além dos movimentos migratórios. O cenário atual observado no
Brasil é de redução do número de crianças, em virtude da queda acentuada no número de
fecundidade e do progressivo aumento no grupo dos idosos, com elevação da expectativa de
vida. A qual é de 72, 8 anos para homens e 79,9 anos para mulheres. A expectativa de vida
brasileira aumentou de 30,4 anos entre os anos de 1940 e 2018. (OLIVEIRA, 2019; IBGE,
2019).
É interessante para a apreensão da mensagem, realizar um comparativo entre as
pirâmides etárias do Brasil, e observar a mudança na estrutura demográfica. Ao realizar esta
análise, é possível verificar diferenças entre as bases e os topos. Abaixo seguem as pirâmides
etárias do Brasil, referentes aos anos 1970 e 2010, respectivamente, cujos dados para a
elaboração das mesmas foram extraídos, dos censos 1970 e 2010, realizados pelo IBGE.
Figura 1 – Pirâmide Etária Relativa % - Brasil 1970.

Pirâmide Etária Relativa % - Brasil 1970


80+
Homens Mulheres
75 a 79 anos

70 a 74 anos

65 a 69 anos

60 a 64 anos

55 a 59 anos

50 a 54 anos

45 a 49 anos
15

Figura 2 – Pirâmide Etária Relativa % - Brasil 2010.

Pirâmide Etária Relativa % - Brasil 2010


80+
Homens Mulheres
75 a 79 anos

70 a 74 anos

65 a 69 anos

60 a 64 anos

55 a 59 anos

50 a 54 anos

45 a 49 anos
8 6 4 2 0 2 4 6 8

É possível verificar que de 1970 para 2010, houve um afunilamento na base da


pirâmide, o que indica uma redução no número de nascimentos. E um alargamento no topo, o
que indica um crescimento da população idosa.
Ao longo do texto, discorrer-se-á a respeito de características do envelhecimento
populacional brasileiro, de suas causas e seu movimento ao longo da história do país, a partir
do século XX.
Uma das características específicas do envelhecimento populacional brasileiro, é a
velocidade com a qual ele está ocorrendo. De acordo com a Organização Mundial da Saúde
(OMS), projeta-se que até 2025, o Brasil será o sexto país no ranking mundial, em termos de
população idosa. Isso se deve à fecundidade elevada em um passado recente e à queda da
mortalidade em todas as idades. (CAMARANO, 2014).
O contexto histórico da transição demográfica ocidental, teve início nos países
capitalistas centrais logo após a Revolução Industrial. Seus determinantes foram: o progresso
das estratégias de produção e distribuição de alimentos, a melhoria das condições sanitárias e
de habitação e os programas de saúde pública e de erradicação de doenças. Reduzindo o
impacto da tuberculose e cólera. A queda da mortalidade, especialmente a infantil, resultou
diretamente no aumento da expectativa de vida, haja vista, que o maior obstáculo para
alcançar os 60 anos era superar as doenças da infância. Nos países em desenvolvimento, no
entanto, a mortalidade começou a declinar somente após o desenvolvimento dos antibióticos e
imunizações, na segunda metade do século XX (CHAIMOVICZ, 2013).
No Brasil, o declínio da mortalidade, principalmente entre as crianças, iniciou-se na
década de 1940, com o advento da estreptomicina, penicilina, imunizações e a terapia de
reidratação oral. A expectativa de vida aumentou significativamente e em 1970, já se
16

aproximava dos 54 anos. A manutenção de altas taxas de fecundidade nas décadas que se
seguiram à queda da mortalidade, determinou significativo crescimento da população. Assim,
a população brasileira saltou de 41 para 93 milhões de pessoas entre 1940 e 1970, crescendo
quase 30% a cada década. No entanto, os jovens representavam ainda mais de 40% da
população e os idosos, menos de 3%. (CHAIMOVICZ, 2013).
Até os anos 1970, os elevados níveis de fecundidade, acompanhados pela queda
progressiva da mortalidade, contribuíram para o crescimento da população com grande
participação de crianças e jovens. O país já iniciava o processo de envelhecimento
populacional, no entanto, o número de nascimentos e a entrada de crianças na população,
reduzia o peso do grupo dos idosos. Assim sendo, durante muito tempo o Brasil foi chamado
de país do futuro, isso ocorria devido ao grupo etário das crianças (0-14 anos) ser bem
expressivo frente ao grupo dos jovens e adultos e dos idosos. O país ainda possui uma grande
massa de crianças em sua população, no entanto, diante da queda do crescimento populacional
no Brasil, o grupo de 0 a 14 anos vem apresentando sucessivas quedas (OLIVEIRA, 2019).
É nesse contexto de redução da natalidade e da participação populacional do grupo de
0 a 14 anos, que pode ser observada, uma maior participação do grupo de idosos. De acordo
com os dados do censo IBGE (2000 e 2010) sobre a participação dos idosos na população
brasileira, observa-se um movimento constante de crescimento na mesma, no gráfico
elaborado por Oliveira (2019).
De acordo com Camarano (2020), o crescimento acentuado da população em idade
mais avançada, ocorre em um contexto de transformações nas famílias, decorrentes, entre
outros, de da queda da fecundidade, e do ingresso generalizado das mulheres no mercado de
trabalho. Este ingresso afetou os contratos tradicionais de gênero. Onde a mulher era a
cuidadora, e o homem, o provedor. Hoje, a mulher brasileira está assumindo cada vez mais o
papel de provedora, sua renda foi responsável por 40,9% da renda das famílias brasileiras em
2009, mas ainda mantém a responsabilidade pelo cuidado dos membros dependentes.
No que tange à redução das taxas de fecundidade, Oliveira (2019) aponta que, o
número médio de filhos por mulher caiu mais da metade em 30 anos. Sendo essa queda
reflexo de mudanças comportamentais das mulheres, do ingresso das mulheres no mercado de
trabalho, da melhoria e do acesso à métodos contraceptivos, da intensificação do processo de
urbanização e do aumento do nível de instrução, que avançou muito, especialmente nos anos
2000.
Assim sendo, Oliveira (2019) ressalta que, a queda da fecundidade provocou a redução
da participação das crianças na população total, ampliando a participação de jovens e adultos.
17

O declínio da mortalidade e a elevação da expectativa de vida, fizeram com que a população


ficasse mais envelhecida.
Figura 3 – Participação de idosos (60 anos ou mais) na população total % Brasil.

65+
60+

De acordo com Oliveira (2019), em termos de transição epidemiológica, pode-se


observar que com o envelhecimento populacional as principais doenças que acometem a
população e levavam à morte, se modificam. Saímos de um quadro em que predominavam as
doenças infecciosas e parasitárias que atingiam em sua maioria os mais jovens e passamos a
um cenário em que as doenças crônicas e degenerativas assumem um peso maior. As doenças
típicas do envelhecimento já são as principais responsáveis pela maior parte das mortes
observadas no Brasil e apresentam uma evolução ao longo dos tempos. Oliveira (2019)
enfatiza que essa mudança nas patologias no Brasil, é a razão pela qual a epidemiologia do
país alterou-se. A rede de assistência médica brasileira ainda é muito pautada em ações
curativas e terá que adaptar-se para o atendimento de um contingente maior de idosos
portadores de enfermidades que não são solucionadas com a aplicação de uma vacina ou com
a ingestão de um medicamento.
Há mudança no perfil de mortalidade, redução dos óbitos oriundos de doenças
infecciosas e o aumento da participação daqueles provocados por causas vinculadas à doenças
crônico degenerativas, o que associa-se diretamente aos processos de envelhecimento
populacional, desenvolvimento econômico, industrialização e urbanização. (CAMARANO,
2014).
De acordo com Chaimovicz (2013), grande parte dos óbitos, anteriores à transição
epidemiológica, ocorriam dentre as crianças, principalmente por doenças transmissíveis,
associadas à pobreza e desnutrição, como o sarampo, a gastroenterite aguda, as pneumonias e
18

a tuberculose. As principais causas de mortalidade - as doenças transmissíveis – eram também


as principais causas de morbidade.
Ainda segundo Chaimovicz (2013), há uma correlação direta entre os processos de
transição demográfica e epidemiológica. A queda inicial da mortalidade se concentra dentre
as doenças infecciosas e tende a beneficiar a população mais jovem. Estes “sobreviventes”
tornam-se adultos e passam a conviver com fatores de risco para doenças crônico-
degenerativas, como por exemplo, a hipertensão arterial e o AVC. Dessa forma, o
envelhecimento populacional, que é um fenômeno crescente, emerge para a sociedade, com
abundância de doenças características do envelhecer. Essa é uma das explicações para a
transição epidemiológica.
Em concordância com Oliveira (2019), pode-se observar que, as mudanças no
comportamento demográfico do país, iniciadas a partir dos anos 1970, contribuíram para a
intensificação do envelhecimento da população do Brasil, que ocorre em vista a queda dos
nascimentos e da mortalidade. A expectativa de vida se eleva e já está ocorrendo o
envelhecimento dentro do grupo dos idosos, com destaque para o crescimento do número de
idosos com 80 anos ou mais.
De acordo com Chaimovicz (2013), outra característica do envelhecimento
populacional é o aumento da proporção de idosos com mais de 80 anos entre os próprios
idosos. Estes idosos constituem uma população bastante distinta dos idosos mais jovens, se
considerarmos a prevalência de doenças e o grau de dependência funcional; os mesmos
provocam grande impacto sobre a dinâmica familiar, social e econômica.
Esse é o grupo etário que mais vem crescendo no Brasil. Em 1975 os idosos com 80
anos ou mais representavam 12% de todos os idosos. Chaimovicz (2013) mostra ainda que em
2030 representarão 21% dos idosos, ou 2,7% da população dos brasileiros. Em 2030, o Brasil
contará com 5,5 milhões de octogenários. Isto porque a mortalidade dos idosos jovens (de 60
a 74 anos) vem caindo progressivamente.
Outra característica que compõe o envelhecimento populacional é a feminização do
mesmo. Segundo Chaimovicz (2013), uma tendência crescente e generalizada no mundo é a
maior longevidade das mulheres. A taxa de mortalidade dos homens é mais alta que das
mulheres em todas as faixas etárias e para a maioria das causas de morte. Possivelmente
associa-se à maior exposição dos homens a fatores de risco como álcool e fumo, aos
acidentes de trabalho, aos homicídios e ao aumento da mortalidade por câncer de
pulmão e doenças cardiovasculares. Porém, a aparente vantagem das mulheres é
19

torna-se menor pela maior incidência de demências, depressão e dependência


funcional.

1. 3 Impactos do Envelhecimento: aumento da demanda por cuidados

Dessa forma, entende-se que o envelhecimento populacional é um fenômeno crescente


na contemporaneidade, bem como suas causas e características. Segundo Camarano (2020)
em termos de transição epidemiológica, as causas de mortalidade e morbidade se
modificaram, já que as doenças crônicas se tornaram as principais causadoras de morbidade e
mortalidade. Partindo-se desse pressuposto, discorrer-se-á sobre o impacto do envelhecer.
De acordo com a OMS (2018 apud CAMARANO, 2020), em um nível biológico, o
envelhecimento resulta do impacto da acumulação de uma grande variedade de danos
moleculares e celulares ao longo do tempo. Isso leva a uma diminuição gradual da capacidade
física e mental, um risco crescente de doenças e, em última instância, à morte. Enquanto
algumas pessoas com 70 anos gozam de uma saúde extremamente boa e funcional, outras com
a mesma idade são frágeis e requerem uma ajuda significativa de outras pessoas.
Há o reconhecimento de que a idade avançada traz perdas cognitivas, físicas e
mentais, que podem afetar o desempenho das atividades do cotidiano, requerendo cuidados de
longa duração (CDLs), essas perdas são por vezes resultantes de doenças crônicas não
transmissíveis (DCNTs), às vezes múltiplas, o que torna esse grupo mais fragilizado.
(CAMARANO, 2020).
Pode-se observar que a população com mais de 60 anos no Brasil, corresponde à 30,2
milhões de habitantes. Sendo os Estados brasileiros com maior concentração de idosos: Rio
de Janeiro e Rio Grande do Sul, ambos com 18,6% da população com 60 anos ou mais.
Enquanto o estado com a menor população idosa do país, é o Amapá, com 7,2% da
população. (IBGE, 2017).
É possível verificar a distribuição da população brasileira por sexo e idade, cor ou
raça, no ano de 2017, por meio de dois gráficos elaborados pelo IBGE no mesmo ano.
Figura 4 – Distribuição da população por sexo e grupo de idade e raça.
20

Ao verificar a problemática de saúde enfrentada pela população idosa, em decorrência


do processo de envelhecer, é possível verificar que, esse fenômeno apresenta demandas
singulares para o idoso. Como por exemplo: a necessidade de cuidado.
Muitos idosos tendem a desenvolver patologias, pois existem doenças específicas da
terceira idade. Eles ficam impossibilitados de compartilhar momentos, de usufruir do
convívio social, ou até mesmo exercer atividades. Diante disso, surgem limitações, as quais
são oriundas do processo de envelhecer e do estado de saúde, e que exigem que o idoso seja
acompanhado por uma pessoa, para ajudá-lo na execução de suas atividades da vida diária
(AVDs). Esta pessoa torna-se o seu cuidador. (ANDRÉ, 2011).
A população muito idosa é a mais exposta às doenças e problemas crônicos não
transmissíveis, muitos deles culminando com sequelas que comprometem a qualidade de vida,
21

gerando situações de dependência e consequente necessidade de cuidado. O que se pode


esperar, portanto, é um aumento da população que demandará cuidados, o que pode vir
acompanhado de um tempo maior passado na condição de demandantes de cuidados.
(CAMARANO, 2014).
De acordo com Duarte, Berzins e Giacomin (2016), o cuidado deve ser compreendido
como eixo da essência humana, parece razoável supor que o ato de cuidar seja uma
consequência da revolução da longevidade. Trata-se de um fenômeno universal, presente na
vida do ser humano desde a antiguidade e responsável por sua sobrevivência. Sem o cuidado
ao longo da vida, desde o nascimento até a finitude, o homem se desestruturará, definhará, sua
vida perderá o sentido, resultando na morte. Portanto, em um mundo que envelhece
progressivamente, o cuidado e o cuidar adquirem dimensões especiais.
Ainda de acordo com Duarte, Berzins e Giacomin (2016) o cuidado envolve um
conjunto de atividades específicas, cultivadas pelos indivíduos para desenvolver, conservar e
recuperar nossos corpos, nosso ser e nosso ambiente, ou seja, tudo o que buscamos para tecer
uma rede complexa de sustentação da vida, a qual nos permite viver tão bem quanto possível.
22

2 COMO É O CUIDADO COM O IDOSO NO BRASIL

É dessa conjuntura, de necessidade de cuidado para com a população idosa, que


emerge o papel imprescindível do cuidador de idosos. Conforme Alves e Monteiro (2015)
existem dois tipos de cuidadores, o formal e o informal. O primeiro realiza o cuidado por
meio de vínvulo empregatício, com ou sem formação específica para tal função. Enquanto o
segundo pode ser um membro da familia ou amigo, que realiza a função, na ausência de
vínculo empregatício.
Para Alves e Monteiro (2015) o cuidador familiar, faz parte do grupo maior,
denominado cuidador informal, assim sendo, é relevante trazer algumas estimativas acerca de
quantas famílias realizam esse cuidado. Logo, compreender-se-á sobre a grande quantidade de
pessoas que vivenciam esta faceta do envelhecer (necessidade de cuidado), e devido às
realidades demográfica e epidemiológica do país, comentadas no início deste trabalho, é
possível concluir que essa será uma problemática cada vez mais abundante, nas décadas
posteriores a 2020.
O OPAS (2018) aponta que até o ano de 2050, espera-se que a população mundial com
60 anos ou mais, chegue a 2 bilhões e ao realizar um comparativo, em termos de ritmo de
adaptação, é possível verificar que, a França teve quase 150 anos para se adaptar a uma
mudança de 10% para 20% na proporção da população com mais de 60 anos. No entanto,
países como o Brasil, China e Índia terão pouco mais de 20 anos para fazer a mesma
adaptação. (OPAS, 2018).
Em se tratando de famílias que prestam cuidados aos idosos no Brasil, o número de
familiares que se dedicavam a cuidados de indivíduos de 60 anos ou mais saltou de 3,7
milhões em 2016 para 5,1 milhões em 2019, contingente que representa 10,5% (1,5 ponto
percentual a mais que 2016) dos 49,1 milhões de pessoas que realizavam cuidados de
moradores, da residência, no ano passado (IBGE, 2020 apud Nery, 2020).
No que diz respeito à realidade brasileira, por estado, è possível constatar, de acordo
com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2020 apud Nery, 2020), o
percentual de pessoas que cuidam de idosos no total de pessoas que exercem cuidados é maior
em estados do Nordeste, como Rio Grande do Norte (15,2%), primeiro no ranking nacional,
Maranhão (12,3%), Ceará (11,9), Paraíba (11,7%), Piauí (11,3%), Bahia (11,3%) e da região
Norte, como Tocantins (11,5%) e Amazonas (11,4%). Outros destaques no Sudeste e Sul são
o Rio de Janeiro (12,3%) e o Rio Grande do Sul (10,7%), que concentram as maiores
proporções de idosos na população. (NERY, 2020).
23

O crescente envelhecimento populacional vivenciado no Brasil aponta que esse é um


movimento que, certamente, irá expandir-se de forma implacável. O que resultará em novos
desafios para todas as esferas sociais e especialmente para os cuidadores familiares, haja vista
que o papel do mesmo será cada vez mais necessário.
O Brasil tem vivenciado nas últimas décadas, o aumento da expectativa de vida, em
que a realidade do envelhecimento da população tornou-se um dos principais desafios da
modernidade. (REIS; et al, 2014). É possível dizer que o cenário se torna mais grave quando
se leva em conta as desigualdades sociais, a falta de informações, o preconceito e o
desrespeito a pessoa idosa. No cotidiano a velhice carrega os estigmas da incapacidade
funcional e social do individuo, reduzindo o idoso, muitas vezes, a um fardo para os seus
responsáveis, concorrendo assim, a exclusão familiar e social, e a violência intrafamiliar.
No campo legislativo, quem cuida da pessoa idosa legalmente é o Estatuto do Idoso
sendo baseado na Constituição Federal de 1988. Em seu art. 1º prevê como garante os
fundamentais da República Federal do Brasil, a cidadania e a dignidade humana (incisos I e
II).
O idoso deve ser contemplado por todos os instrumentos asseguradores da dignidade
humana, sem distinção. Deve ter seus direitos respeitados e cumprir com seus deveres.
No Estatuto do Idoso, o envelhecimento é um direito pessoal e sua proteção um direito
social, cabendo ao Estado garantir a proteção à vida e a saúde do idoso, sendo dever do
mesmo e da sociedade zelar pela dignidade da pessoa idosa, colocando-o a salvo de qualquer
tratamento desumano, aterrorizante, violento, vexatório ou constrangedor (REIS et al, 2014).
Diante das práticas de negligência e violência, caberá punição, na forma da lei, aos que
cometerem tais atos.
O idoso tem particularidades bem conhecidas de todos – mais doenças crônicas e
fragilidades, mais custos, menos recursos sociais e financeiros. Envelhecer, ainda que sem
doenças crônicas, envolve alguma perda funcional. Com tantas situações adversas, o cuidado
do idoso deve ser estruturado de forma diferente da que é realizada para o adulto mais jovem.
Um dos cuidados prestados ao idoso no atual contexto, é em relação a saúde, estes
serviços ocorrem de forma fragmenta na atenção ao idoso, com multiplicação de consultas de
especialistas, informação não compartilhada, inúmeros fármacos, exames clínicos e imagens,
entre outros procedimentos. Sobrecarrega o sistema, provoca forte impacto financeiro em
todos os níveis e não gera benefícios significativos para a saúde, nem para a qualidade de
vida. (VERAS; OLIVEIRA, 2018).
24

Veras e Oliveira (2018) aponta que o cuidado com a saúde do idoso, por exemplo,
deveria ser focado em prevenção, porém, os modelos assistenciais vigentes decorrem do foco
exclusivo na doença. Os autores enfatizam ainda que mesmo quando se oferece um programa
com uma lógica de antecipação dos agravos, as propostas são voltadas prioritariamente para a
redução de determinada moléstia, esquecendo que numa doença crônica já estabelecida o
objetivo não deve ser a cura, mas a busca da estabilização do quadro clínico e o
monitoramento constante, de forma a impedir ou amenizar o declínio funcional.
Diversos estudos evidenciam que a atenção deve ser organizada de maneira integrada,
e os cuidados precisam ser coordenados ao longo do percurso assistencial, numa lógica de
rede desde a entrada no sistema até os cuidados ao fim da vida. Para Veras e Oliveira (2018),
os adequados modelos de atenção à saúde para idosos, portanto, são aqueles que apresentam
uma proposta de linha de cuidados, com foco em ações de educação, promoção da saúde,
prevenção de doenças evitáveis, postergação de moléstias, cuidado precoce e reabilitação.
Veras e Oliveira (2018) esclarecem que o modelo de atenção a saúde do idoso deve ser
baseado na identificação precoce dos riscos de fragilização dos usuários. Uma vez
identificado o risco, a prioridade é a reabilitação precoce, a fim de reduzir o impacto das
condições crônicas na funcionalidade – busca-se intervir antes de o agravo ocorrer. A ideia é
monitorar a saúde, não a doença; a intenção é postergar a doença, a fim de que o idoso possa
usufruir seu tempo a mais de vida com qualidade. Assim, a melhor estratégia para um
adequado cuidado do idoso é utilizar a lógica de permanente acompanhamento da sua saúde,
tê-lo sempre sob observação, variando apenas os níveis, a intensidade e o cenário da
intervenção.

2. 1 A história (evolução) do cuidado para com o idoso no Brasil, em termos de legislação


e políticas públicas.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, traz como fundamentos a


dignidade do ser humano, por deliberação consensual dos Estados participantes, como aponta
(FALEIROS, 2007). Percebe-se que o Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais,
aprovado em 1966 e ratificado no Brasil em 1992, traz como referência a indivisibilidade dos
direitos econômicos, sociais e culturais, sem nenhuma discriminação de raça, sexo, religião,
língua, opinião política ou qualquer opinião, além da origem nacional, nascimento ou outra
situação discriminatória, fato este já presente em nosso país constitucionalmente.
25

Faleiros (2007) nos mostra também que o estabelecimento de direitos iguais, numa
sociedade desigual, para grupos específicos, é uma questão fundamental que articula
cidadania com democracia. No Brasil os direitos da pessoa idosa começaram a ser inscritos
na Constituição 1934 (inciso h do parágrafo 1º do artigo 121) sob a forma de direitos
trabalhistas e de uma Previdência Social “a favor da velhice”. Ao se tornar improdutivo no
trabalho industrial, o indivíduo era considerado velho. Já o trabalhador rural não tinha seus
direitos trabalhistas reconhecidos, pois pertencia à esfera do “aluguel de mão-de-obra”, sob a
tutela da oligarquia rural.
Entretanto, a garantia de direito só é estabelecida de fato com a Constituição de 1988,
no capítulo da Ordem Social, no que se refere ao idoso e à pessoa com deficiência, o artigo
203, estabelece o direito a um salário mínimo em situação de falta de meios de subsistência.
Esse artigo foi regulamentado pela Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS – Lei
n.8.742/03).
Ao analisar alguns estudos e pesquisas percebe-se que há uma preocupação com o
processo do envelhecimento da população, embora seja uma atitude recente na sociedade
brasileira. As necessidades e limitações apresentadas pelos idosos que antes eram assistidos
pela caridade de instituições assistenciais confessionais e filantrópicas começam a figurar na
agenda pública governamental como prioridade somente no ano de 1988 na Constituição
Federal, como já mencionado anteriormente. O texto constitucional em seu capítulo VII, da
Ordem Social, Art. 30, reconheceu “o dever da família, da sociedade e do Estado de amparar
as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e
bem-estar social e garantindo-lhes o direito à vida”. (BRASIL, 1988).
Para compreendermos a história ou evolução do cuidado com o idoso no Brasil, em
termos de legislações e políticas públicas se faz necessário uma retomada no processo de
industrialização capitalista, que no Brasil ocorre em um período que o capitalismo
monopolista se torna mundialmente dominante e sua economia já está consolidada. Alguns
teóricos chamam de capitalismo tardio (NETTO, 1994 apud ALVES, 2014), ou capitalismo
retardatário (MELLO, 1994 apud ALVES, 2014). No Estado Novo, incorporar a
reivindicação dos setores populares foi a forma encontrada para legitimar o governo e garantir
a disciplina da classe trabalhadora para dar continuidade ao projeto de desenvolvimento
industrial. Os direitos sociais dos trabalhadores eram divulgados como doações, até serem
materializados na legislação trabalhista, previdenciária e sindical, onde se pôde detectar uma
estratégia político-ideológica de combate à pobreza e de superação dos graves problemas
socioeconômicos do país (GOMES, 1999 apud ALVES, 2014).
26

Esse processo de produção de consentimento incluiu a criação de instituições sócio-


assistenciais e previdenciárias, esses espaços representavam a institucionalização de
concessões políticas em resposta às lutas da classe trabalhadora por garantias na velhice, bem
como acordos com o empresariado na execução de ações sociais direcionadas aos segmentos
subalternizados, dentre eles os idosos. (IAMAMOTTO, 2007 apud ALVES, 2014).
Início do século XX, a concepção que predominava no Brasil, era a de segregação das
pessoas idosas, com internações em asilos, entidades estas que proliferaram nesse período,
prática estas que ocultavam os aspectos sociais, políticos e econômicos. (VERAS;
OLIVEIRA, 2018).
No ano 1960, o Serviço Social do Comércio (SESC), inaugurou um trabalho pioneiro
voltado para pessoas idosas, em um cenário no qual predominava o assistencialismo. O
primeiro reflexo no Brasil, no que se refere às mudanças radicais da visão do envelhecimento
impactando a legislação, foi na Constituição Federal promulgada em 1988, na qual os
movimentos constituintes imprimiram o conceito de “participação popular”. (VERAS;
OLIVEIRA, 2018).
É sabido que a década de 1980 foi marcada por lutas e reivindicações no caminhar do
processo de redemocratização brasileira, significou o retorno de uma velha luta em torno da
desigualdade e da miséria no fim da vida. Foi um momento que abriu espaço para discussão
através dos movimentos e repercutiu numa visão mais ampla da velhice. Um exemplo foi o
movimento em defesa da previdência: segundo Haddad (1993 apud ALVES, 2014), o
Movimento de Aposentados e Pensionistas já estava consolidado em todo território nacional
em 1985, discutindo os caminhos para,

[...] a formulação das suas demandas, a luta por melhoria de condições de vida, em
um contexto que a exploração econômica se concretiza na sociedade brasileira pela
ação do grande capital, e na política econômica do Estado que cria, garante e
expande as condições de dominação (HADDAD, 1993, p. 104 apud ALVES, 2014,
p. 51).

Esse período de redemocratização brasileira que desaguou na Constituição de 1988 foi


marcado por controvérsias de cunho neoliberal em relação à política econômica que se
instaurava nos países desenvolvidos. É certo que a Constituição trouxe uma renovação para a
luta pelo direito à velhice, formulando desafios para a manutenção do caráter democrático na
gestão das políticas propostas. É nessa conjuntura que surge a necessidade de se questionar as
bases de sustentação da Geriatria e Gerontologia Social.
27

De acordo com Veras e Oliveira (2018) a Constituição reverteu a política


assistencialista em curso na década de 1980, passando assistencialismo a direito social, essa
década representou um período significativo para a organização dos idosos e a comunidade
científica, com a realização “de inúmeros seminários e congressos, sensibilizando dessa forma
os governos e a sociedade para a questão da velhice”. A garantia dos direitos dos idosos na
Constituição Federal está expressa em diversos artigos, versando sobre irredutibilidade dos
salários de aposentadoria e pensões, garantia do amparo pelos filhos, gratuidade nos
transportes coletivos e benefício de um salário-mínimo para aqueles sem condições de
sustento. A influência das diretrizes e orientações internacionais na Constituição Federal são
evidentes.
Nesse contexto, as políticas sociais direcionadas às necessidades da classe
trabalhadora, inspiradas na ideologia do social-liberalismo, são repensadas em moldes de
combate à pobreza e às desigualdades sociais. A direção dos investimentos está em políticas
sociais de transferência de renda focalizadas e compensatórias, a exemplo do Benefício da
Prestação Continuada (BPC), que usa de condicionalidades que selecionam apenas aqueles
mais pobres. Segundo Castelo (2012 apud ALVES, 2014), a natureza da questão social‖ e a
contradição entre capital e trabalho são reduzidas ao pauperismo absoluto e passam a ser
solucionadas via políticas sociais assistencialistas, empoderamento dos indivíduos e
distribuição equitativa do ativo educação.

2.2 Como é a legislação para o cuidado ao idoso no Brasil, hoje?

Há no Brasil, uma preocupação pública com as necessidades acarretadas pelo processo


do envelhecimento foi forçada em grande parte pela organização social dos idosos no país,
realçando-se o protagonismo do movimento social dos trabalhadores aposentados na luta pela
garantia de direitos conquistados pela dedicação a sociedade devido ao trabalho prestado em
prol do crescimento e do desenvolvimento da sociedade. (SILVA; YAZBEK, 2014).
Nos anos de 1990, essa prioridade se reafirma com a adoção de algumas medidas de
políticas públicas por parte do Estado no sentido de garantir proteção social como direito de
cidadania, principalmente àqueles idosos que não detinham os meios recursos necessários
para se auto sustentarem, e que nem a família possui condições financeiras para cuidar de um
familiar idoso.
28

De fato, esse movimento social contribuiu para oportunizar as pessoas idosas a


fazerem parte da cena pública os idosos como um novo sujeito político e protagonista que
reivindicava direitos sociais e principalmente a uma velhice digna. Essa luta dos idosos pelo
reconhecimento de seus direitos traz embutido um novo sentido de ressignificação do
envelhecer na realidade brasileira como um tempo de poder atribuir melhor qualidade aos
anos acrescidos à existência humana (SILVA; YASBEK, 2014).
É bom lembrar que em todas as esferas sociais de garantia de direitos não apenas para
a pessoa idosa, mas para qualquer cidadão que vive em situação de risco social, a conquista e
a garantia de muitos direitos e benefícios conquistados se deram mediante muita luta e por
meio de reivindicações por parte da sociedade civil e profissionais das áreas sociais, educação
e saúde. (SILVA; YASBEK, 2014).
No campo das políticas destinadas ao público idoso, foi promulgada em 1994 a
Política Nacional do Idoso (PNI), Lei n. 8.842, de 04 de janeiro, que traz no seu artigo 1º
como objetivo a necessidade de se “assegurar os direitos sociais do idoso, criando condições
para prover a sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade” (BRASIL,
2010), tendo a família, a sociedade e o Estado iguais responsabilidades na provisão de
condições que permita a esse segmento social o exercício pleno de sua cidadania. Antes da
promulgação da PNI, em 1993 a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), Lei, n. 8.742, de
7 de dezembro, já reconhecia a pessoa idosa como um dos segmentos que necessita de
atenção prioritária e especial.
Silva e Yazbek (2014) esclarecem ainda que a LOAS determina no artigo 2º, que a
assistência social tem entre os seus objetivos: “a garantia de um benefício mensal de um
salário mínimo à pessoa com deficiência e ao idoso que não possuir meios de prover a própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família” (BRASIL, 2010), realidade concretizada com
o Benefício de Prestação Continuada (BPC).
As autoras mostram que como desdobramento da lei Orgânica de Saúde, aprovada em
1990, Lei n. 8.8080/1990 assegurou a pessoa idosa o direito universal e integral à saúde,
estabelecida em 1999, com a Política Nacional de Saúde do Idoso, mediante Portaria
Ministerial n. 1.395/1999 e regulamentada pela Portaria n. 2.528 de outubro de 2006 que a
renomeou como Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa, estabelecendo como uma de
suas diretrizes a promoção do envelhecimento ativo e saudável, de acordo com as
recomendações da Organização as nações Unidas.
Fica percebido assim, que regulamentaram leis e documentos em defesa dos direitos
da população idosa no nosso país. Diante disso, cabe às famílias, a sociedade civil e os órgãos
29

públicos e também ao próprio idoso cobrar pela efetivação desses direitos socialmente
conquistados.
Outra garantia importante destacada por Silva e Yazbek (2014), está concretizada com
a criação, pelo governo brasileiro em 2003, do Estatuto do Idoso, Lei n. 10.741, de 1 de
outubro, com o objetivo de regular os direitos assegurados às pessoas idosas com idade igual
ou superior a 60 (sessenta anos). O referido Estatuto prevê: Artigo 2º que o idoso goza de
todos os direitos fundamentais inerentes á pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral
de que trata esta lei, assegurando-se lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e
facilidades, para a preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral,
intelectual.
Esse estatuto deve ser algo utilizado por familiares dos idosos, profissionais das áreas
de direito, serviço social, educação e saúde, e não deve ser visto como um documento para
ficar engavetado, pois este dará o norte e os esclarecimentos sobre os direitos básicos da
pessoa idosa.
Observa-se que esse processo de ressignificação do envelhecimento coloca, como
exigência, o redirecionamento da agenda pública no sentido de fortalecer as oportunidades de
debate sobre a problemática enfrentada pela terceira idade e por outro, incorporar medidas
efetivas que visem o atendimento de suas necessidades sociais.
É possível então dizer, que a defesa de direitos presentes nas legislações LOAS, PNI e
Estatuto do Idoso, vem somar-se em 2004, a Política Nacional de Assistência Social (PNAS),
em cujas diretrizes passa a figurar a proteção social básica e proteção social especial,
destinadas aos segmentos sociais prioritários entre os quais se inclui os idosos. As ações
caracterizadas por esses dois níveis de proteção passam a ser reguladas pelo Sistema Único de
Assistência Social, com atribuições e competências definidas em cada ente federativo e sob a
supervisão geral do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate á Fome (MDS).
(SILVA; YASBEK, 2014).
É importante destacar que a PNAS vem materializar o disposto no texto constitucional
acerca da área da assistência social, política que integra junto á saúde e a previdência social o
famoso tripé da seguridade social brasileira, Silva (2012 apud SILVA e YAZBEK, 2014), nos
mostra que:
As três áreas que compõem as políticas de seguridade social se encontram
permeadas pelas necessidades dos idosos enquanto sujeito social que transita pelas
três políticas sociais conformando direitos. Na área da saúde lhes é assegurado a
prevalência do atendimento fundamentado no princípio do direito universal; na
assistência social é assegurada a proteção social básica e especial através de ações
que tem por objetivo assegurar a provisão de suas condições de vida e garantir a sua
30

defesa em situações de violação de direitos; na área da previdência social lhes é


assegurado o benefício social diante de uma jornada laboral completada. (SILVA,
2012, p. 8, apud SILVA e YAZBEK, 2014, p.7).

De acordo com as autoras, apesar dos avanços significativos do texto constitucional


vigente em termos dos direitos sociais, a concepção de seguridade social incorporada ainda se
coloca aquém dos anseios que mobilizaram os movimentos sociais na década de 1980 que
pontuavam a universalidade como princípio e a redistribuição de renda como critério de
igualdade e de superação da desigualdade social.
E ainda há um predomínio do entendimento da proteção social dentro da concepção
que define o sistema como meritocrático e particularista e submetido às metas do plano de
estabilização e ajuste econômico, baseando nos méritos individuais e não olham e zelam pela
coletividade.
Sendo assim, envelhecer no século XXI não terá, pois, o mesmo significado que teve
no século XX, mesmo que o cidadão tenha trabalhado e contribuído para o crescimento
econômico e social. Vê-se que mesmo os direitos já adquiridos são questionados diante do
processo de transição demográfica, da política neoliberal de redução de direitos sociais e da
mudança nas condições de vida da família e da sociedade.
A emergência dos direitos sociais para as pessoas idosas é um processo diferenciado,
que foi adquirindo mais visibilidade nas lutas pela Previdência Social. Com efeito, os grupos
de idade não são iguais ao longo da história, mas variam conforme a maior ou menor presença
das crianças, jovens, adultos e velhos e com o processo de urbanização. Sabemos que na
modernidade a velhice está assumindo novos significados diante do aumento da longevidade e
da alteração do impacto da velhice sobre o Estado e sobre a vida da sociedade e dos
indivíduos. (SILVA; YASBEK, 2014).
A garantia e a efetivação do acesso aos direitos como: aposentadoria, saúde,
escolarização e lazer para as pessoas idosas precisam ser descutidas com a participação dos
próprios idosos e de seus familiares, pois na maioria das vezes as pessoas idosas encontram
alheias à participação na esfera pública e acabam recorrendo à vida privada.
É preciso que os direitos universais sejam assegurados a todos os cidadãos e cidadãs
(sejam idosos, pessoas com deficiência, crianças, adolescentes e todos aqueles que vivem à
margem da sociedade, em situação de vulnerabilidade social) pois só mediante essa garantia
teremos uma sociedade mais digna, que respeita a participação de todos, pois a construção da
cidadania se articula num processo dialético e democrático. (SILVA; YASBEK, 2014).
31

Em síntese, a legislação para o cuidado ao idoso no Brasil, hoje, as demandas da


sociedade civil e dos movimentos populares foram relativamente integradas, através da
promulgação dos direitos sociais dos idosos previstos na Constituição Federal de 1988, e nas
legislações posteriores como a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), de 1993, que
regula o Benefício da Prestação Continuada (BPC). Como Política Social Especial, é
promulgada a Política Nacional do Idoso através da Lei 8.842, de 4 de abril de 1994, e
regulamentada pelo Decreto 1.948, de 3 de julho de 1996, que tem por objetivo assegurar os
direitos sociais do idoso, criando condições para promover sua autonomia, integração e
participação efetiva na sociedade.

2.3 O risco para a legislação existente, oriundo do ataque do neoliberalismo.

Na década de 1990, a sociedade vivenciava diversas expressões da questão social


provocadas principalmente pela lógica neoliberal, onde se estabelece a ausência do Estado e
assumencia da sociedade civil no que se refere ao atendimento a população em políticas
públicas. IAMAMOTO (2002). Trata‐se de um contexto em que são apontadas alternativas
privatistas e refilantropizadas para questões relacionadas à pobreza e à exclusão social.
Cresce com isso o denominado terceiro setor, amplo conjunto de organizações e iniciativas
privadas, não lucrativas, sem clara definição, criadas e mantidas com o apoio do voluntariado
e que desenvolvem suas ações no campo social, no âmbito de um vastíssimo conjunto de
questões, em espaços de desestruturação (não de eliminação) das políticas sociais, e de
implementação de novas estratégias programáticas como, por exemplo, os programas de
Transferência de Renda, em suas diferentes modalidades. (YAZBEK 2016).
Os governos neoliberais, com a logo do Estado mínimo, se estabelecem pela
participação efetiva da sociedade civil a assumir as tarefas e responsabilidades com as
demandas sociais como: saúde, atendimento aos idosos institucionalizados, população de rua,
pobreza, educação. E o Estado onde as necessidades do mercado, com leis de austeridades, e
diminuição dos direitos, como trabalhistas ou previdenciários. Para que essas ideias
neoliberais possam tomar corpo, o Estado vem se afastando, diminuindo os gastos sociais e
buscando a desconstrução e revogação dos direitos garantidos constitucionalmente na década
de 1980. (IAMAMOTO, 2002).
Sabemos que a Previdência Social se constitui como importante fonte de renda a uma
enorme parcela da população, principalmente a idosa - seja por meio das aposentadorias e/ou
das pensões. A partir dos dados emitidos pelo IBGE (2018 apud QUEIROZ, 2019), é
32

possível verificar que os be-nefícios previdenciários são responsáveis pela manutenção de


uma parte considerável da população. Só em 2015, cerca de 27.430.418 pessoas tiveram
acesso a algum tipo de benefício previdenciário emitido pelo Regime Geral da Previdência
Social - RGPS. (QUEIROZ, 2019). Desses, aproximadamente 35,59% recebe-ram
aposentadoria por Idade; 19,81%, aposentadoria por tempo de contribuição; e, em média
27,02%, pensão por morte. Pode-se verificar que os benefícios de pensão e aposentadoria
corresponderam, no ano de 2015, a cerca de 82,4% dos benefícios previdenci-ários emitidos.
Por essa razão, eles são os principias alvos da contrarreforma previdenci-ária no
Brasil. Portanto, os benefícios de aposentadoria e pensão por morte são essenciais para a
manutenção da população idosa, segundo os dados do IBGE (2015), no ano de 2015, cerca
de 75,5% da população idosa recebeu algum desses benefícios, no âmbito do Regime Geral
da Previdência Social - RGPS e/ou Regimes Próprios de Previdência Social - RPPS.
Atualmente, segundo Silva (2015, p.145 apud QUEIROZ, 2019, p. 128), “[…] tem-se
uma previdência social diminuta, estratificada em relação aos direitos, conforme seja a
participação direta de seus segurados no custeio do sistema”. Porém, concomitantemente as
previdências privadas crescem e se desenvolvem. O Brasil em 1990 apresentou altos índices
de desemprego e aprofundamento da pobreza, conforme aponta Silva (2018 apud QUEIROZ,
2019), resultado da crise estrutural que vinha se aprofundamento e das medidas do projeto
neoliberal que se expandiam.
Ainda, na década de 1990, o governo Fernando Henrique diante do endividamento
público e do baixo crescimento econômico cedeu totalmente às pressões do Fundo Monetário
Internacional, do Banco Mundial e dos investidores institucionais, comprometendo-se com o
projeto neoliberal e a política de austeridade fiscal, adotando medidas restritivas de direitos e
realizando um amplo processo de privatizações. Foi em seu governo que o movimento de
contrarreforma da previdência social iniciou, tendo na Emenda Constitucional (EC) nº 20 a
sua principal expressão (SILVA, 2018, p.3 apud QUEIROZ, 2019, p. 129).
Uma das primeiras medidas de contrarreforma na previdência social após a
Constituição Federal de 1988 foi a Emenda Constitucional n.º 20 de 1998, que, Segundo
Silva (2018 apud QUEIROZ, 2019) promoveu mudanças significativas no âmbito do RGPS.
Entre as principais medidas estão: exclusão do acidente de trabalho do rol de benefícios;
exclusão do garimpeiro do regime de economia familiar; aposentadoria por tempo de
trabalho se converte para aposentadoria por tempo de contribuição; a criação de um teto para
os benefícios; a filiação passa a ser obrigatória; o sistema passa a se submeter ao equilíbrio
financeiro e atua-rial, entre outras medidas.
33

De acordo com Queiroz (2019) no período de 2003 a 2013, nos governo de Lula e
Dilma, houve um prosseguimento do projeto neoliberal, articulado com medidas de
ampliação de alguns direitos sociais, como os inerentes a transferência de renda, inserção das
donas de casa no âmbito do Regime Geral da Previdência Social - RGPS e/ou Regimes
Próprios de Previdência Social - RPPS, entre outros. Porém, também houveram medidas de
cunho restritivo, demonstrando os reais interesses de prosseguimento do desmonte do
sistema de seguridade social, diversas medidas que restringiram o acesso às políticas sociais
e à emancipação política; porém, também foram desenvolvidas algumas medidas favoráveis
à classe trabalhadora, demonstrando o caráter contraditório e de relativa autonomia do Estado
no capitalismo.
Apesar de um prosseguimento do projeto neoliberal no governo Lula e Dilma houve
uma relativa melhora no que se refere as condições de vida, principalmente para a população
mais pobre. Também foram efetivadas medidas que facilitaram ampliar o acesso as
universidades públicas, ampliando a inserção da população pobre, negra e indígena.
(QUEIROZ, 2019).
Em 2016, o então presidente Michel Temer, criou as bases necessárias para
intensificar as medidas restritivas do projeto neoliberal no Brasil. (QUEIROZ, 2019). Este
quadro auxiliou o avanço das ideias e valores disseminados pela extrema direita, tendo como
porta-voz Bolsonaro e sua demagogia amparada pela elite brasileira ligada aos setores rurais,
industriais, financeiros, religiosos e midiáticos, como aponta Laval (2018 apud QUEIROZ,
2019).
As medidas de contrarreforma na previdência social, o governo Temer submeteu a
Proposta de Emenda Constitucional nº 287 de 2016. Esta é uma das medidas mais
devastadoras tomadas desde o início das ações de contrarreforma na previdência social, após a
Constituição Federal de 1988. A Proposta de Emenda Constitucional nº 287 consolida as
principais orientações estimuladas pelo projeto neoliberal as quais ainda não tinham sido
aprovadas nos governos anteriores, conferindo um duro golpe para o sistema de seguridade
social, em especial para a previdência social.
Seguindo essa tendência, o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de
Ensino Superior – ANDES-SN (2018 apud QUEIROZ, 2019) ressaltou a grande
possibilidade de que o governo Bolsonaro venha com medidas mais agressivas de
contrarreforma (ataques) a legislação que garante a previdência social. Segundo o ANDES-
SN (2018 apud QUEIROZ, 2019) o banqueiro Armínio Fraga – presidente do Banco Central
no período de 1999 a 2003 – apresentou ao presidente eleito Bolsonaro uma proposta mais
34

severa de contrarreforma na previdência social do que a submetida pelo governo Temer, na


qual privilegia o sistema financeiro. O objetivo central do governo Bolsonaro, de acordo com
ANDES-SN (2018 apud QUEIROZ, 2019), é a extinção da previdência social por regime de
repartição simples para um sistema de previdência social pautada no regime de capitalização,
como realizado no Chile no governo Pinochet. Outra proposta é a unificação dos RGPS e do
RPPS; desvinculação dos benefícios previdenciários do valor do Salário Mínimo; e
finalização do BPC por outro benefício com regras e princípios mais flexíveis (ANDES-SN,
2018 apud QUEIROZ, 2019). Portanto, essas medidas de contrarreforma na previdência,
oriunda do ataque neoliberal incidirão na redução da cobertura previdenciária, restringindo a
emancipação política e social da pessoa idosa, e principalmente colondo em risco a legislação
atual que garante os direitos dos cidadãos.
35

3 AUMENTO DA POPULAÇÃO IDOSA E OS DESAFIOS PARA O CUIDADOR


INFORMAL

O crescimento da população idosa é um fenômeno mundial, que não pode ser ignorado
e, no Brasil, ocorre de forma acelerada, exigindo assim medidas políticos sociais urgentes
para enfrentamento do desafio relativo a essa mudança.
O cuidador informal representa, dentro do núcleo familiar, a referência e o elo entre o
idoso, e o profissional de saúde. Garbaccio e Tonaco (2019) mostram que é a partir do
cuidador que inúmeras informações relativas à saúde do idoso são obtidas contribuindo para
diagnósticos e tratamentos mais precisos. A presença do cuidador é de suma importância na
qualidade da atenção ao idoso, mas na prática o cuidador enfrenta inúmeras dificuldades no
dia a dia por falta de informações, de suporte financeiro, técnico e social.

3.1 Os desafios vivenciados pelos cuidadores informais de idosos em domicílios

Com o envelhecimento da população e consequente aumento do número de idosos que


vivenciam um processo de doença crônica e incapacitante, tornando-se dependentes, vem
crescendo a preocupação sobre o cuidador familiar que, por vezes, não se encontra
adequadamente preparado para essa prática, podendo acarretar processos deletérios no cuidar
desses idosos.
O cuidador de idosos é aquele que convive diariamente com o idoso, prestando-lhe
cuidados higiênicos, ajudando com a alimentação, administrando medicação e estimulando-o
com as atividades reabilitadoras, interagindo, assim, com a equipe terapêutica, conforme
esclarece Araujo et al (2013).
O familiar vivencia a sobrecarga física, emocional e socioeconômica, e é fundamental
o treinamento adequado para que ele se torne mais seguro e preparado para assumir as
responsabilidades no cuidado do familiar dependente.
A literatura vem demonstrando que a tarefa de cuidar de idosos dependentes pode
ocasionar efeitos adversos, gerando impactos negativos e sobrecarga no âmbito físico,
psicológico, social e financeiro, devendo ser desenvolvidos programas destinados a prevenir
esses efeitos e a trabalhar na busca da qualidade de vida do cuidador. (MOREIRA; CALDAS,
2007).
As necessidades das famílias relacionadas ao cuidado ao idoso dependente são, de um
modo geral, de orientação sobre como deve ser desenvolvido esse cuidado, como ocorre o
36

tratamento do processo que gera a dependência, além da necessidade de poder compartilhar as


dúvidas e outras questões com os profissionais.
O sucesso do cuidado ao idoso no domicílio depende de quem irá realizá-lo e o quão
preparado estará esse familiar. Cabe ao profissional de saúde avaliar a rede de suporte do
idoso antes de conceder-lhe a alta hospitalar, sendo necessário o acompanhamento domiciliar
para a avaliação do cuidado e do suporte adequado. (MOREIRA; CALDAS, 2007).
No Brasil, dados do censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
revelam que 14,5 milhões de indivíduos se encontram com mais de 60 anos de idade e
necessitam diretamente de cuidadores. Hoje no país, entretanto, pouco se conhece sobre os
cuidadores de idosos, pois a maioria das literaturas foca nas estratégias de enfrentamento para
os idosos dentro de patologias como câncer, acidente vascular cerebral e demências
funcionais, ficando a figura de seus cuidadores em segundo plano. Araujo et al (2020).
Araujo et al (2020), em pesquisa realizada sobre o perfil dos cuidadores de idoso, bem
como sua importância e principais dificuldades no ato de cuidar do idoso, os autores
descreveram as principais dificuldades enfrentadas pelos cuidadores, Estratégia de Saúde da
Família (ESF) Seringal. Ananindeua, PA, 2010-2011.
Figura 5 - Principais dificuldades enfrentadas pelos cuidadores, Estratégia de Saúde da
Família (ESF) Seringal. Ananindeua, PA, 2010-2011.

Conforme mostra a figura acima, a maior parte dos entrevistados referenciou que as
principais dificuldades encontradas durante os cuidados com os idosos foram a falta de
formação para cuidadores e a falta de paciência. Ressaltou a complexidade da função e o
37

despreparo dos cuidadores revelados por meio de incertezas e de imprevisibilidades de


cuidados, abalando a moral e a crença do cuidador, pois este não sabe se proporciona um
cuidado digno ao idoso. (ARAUJO, et al, 2020).
Ao analisarmos a realidade do cuidado para com os idosos, Minayo (2019) afirma que
no Brasil, do ponto de vista da seguridade social, felizmente chegou-se a um estágio consi-
derado bom, pois 84,3% das pessoas idosas recebem aposentadoria, pensão, o chamado
benefício de prestação continuada ou alguma forma de ajuda oficial. E, recentemente, o
Superior Tribunal de Justiça em sua primeira seção do dia 22/08/2018 fixou a tese de que,
comprovada à necessidade de assistência permanente de terceiro, é devido o acréscimo de
25%, previsto no artigo 45 da Lei 8.213/199113, a todas as modalidades de aposentadoria,
estendendo o benefício que antes era concedido apenas aos aposentados por invalidez.
(MINAYO, 2019).
Araujo et al (2013) mostra que o cuidado com idoso na realidade vivenciada pelo
idoso e o cuidador, ocorre por meio de diversas dificuldades e desafios, de ambas as partes, no
entanto, é preciso que o cuidado seja realizado com o intuito de garantir que o idoso tenha
uma velhice saudável, através da prevenção a um quadro de doença, onde a sociedade
organizada busque unir forças buscando a criação e a execução de políticas públicas que
garantam esta prevenção, para que o cuidado do idoso seja realizado de forma íntegra e este
envelheça de maneira saudável.
Segundo Araujo et al (2013) a maioria dos sujeitos cuidadores de idosos era formada
por mulheres casadas, filhas dos idosos e que não dispunham de nenhuma renda para
efetivação do exercício de cuidar. Consideraram o idoso sob seu cuidado como saudável,
tendo suas principais dificuldades para o ato de cuidar a falta de paciência e a falta de
formação para exercer a função.
Cabe ressaltar que o cuidado domiciliar proporciona uma série de pontos positivos
para todos os envolvidos no tratamento, pois para o idoso, a proximidade do ambiente
familiar acelera o processo de recuperação e evita o deslocamento de familiares para o
hospital; para a família, o fato de poder estar constantemente com o idoso, poder tratá-lo com
mais atenção, ter a oportunidade de fazer o que acredita ser melhor, mantém e reforça laços
afetivos. Além disso, há maior humanização no cuidado do paciente pelos cuidadores.
38

Segundo Nery (2020) monitorar ou fazer companhia dentro do domicílio (83,4%),


auxiliar nos cuidados pessoais (74,1%) e transportar ou acompanhar para escola, médico,
exames, parque, praça, atividades sociais, culturais, esportivas ou religiosas (61,1%), são as
principais atividades requeridas pelos idosos.
Figura 6 – Pessoas que realizaram cuidados de idosos: Por tipo de cuidado.

Já em pesquisa realizada com cuidadores informais Garbaccio e Tonaco (2019)


apontam que dentre os principais motivos elencados pelos cuidadores para executar essa
função foi o grau de parentesco (6%) seguido do prazer em cuidar do outro (7%) e por último
a necessidade financeira (3%) por não haver condições do contrato do cuidador formal.
Tendo em vista a dedicação diária como cuidador, 25 (35,7%) afirmaram exercer os
cuidados por um período igual ou inferior a quatro horas/dia, 20 (28,6%) executam em tempo
integral, 14 (20%) em até oito horas/dia e 11 (15,7%) em um período de até doze horas/dia.
(GARBACCIO; TONACO, 2019).
No que concerne à capacitação técnica para o desempenho dos cuidados, 59 (84,3%)
dos respondentes relataram não possuir curso algum, exercendo assim suas funções de acordo
com o conhecimento adquirido na prática cotidiana. A principal dificuldade apontada pelos
39

cuidadores foi o lidar com as alterações cognitivas do idoso. (GARBACCIO; TONACO,


2019).
Levando em consideração a principal dificuldade encontrada pelos cuidadores
explicitada em como lidar com os distúrbios cognitivos do idoso (50%), evidencia-se que o
declínio funcional decorrente da doença traz grandes consequências para a vida do sujeito e
de seus familiares, visto que para a prestação dos cuidados torna-se cada vez mais necessária
a obtenção de informações suficientes acerca da doença/tratamento, bem como de um suporte
emocional profundo. Garbaccio e Tonaco, (2019) apontam que as ações psico educativas
concretas podem reduzir o estresse resultante do impacto da doença, melhora o sentido de
competência e autoestima dos cuidadores, reduz ansiedade, sintomas depressivos além de
ajudar a gerir emoções e a usar estratégias mais eficazes de resolução de problemas. As
demências, especialmente em estágio mais avançados, apresentam freqüentes distúrbios
comportamentais como agitação, deambulação excessiva, discurso repetitivo, agressão verbal
e física que elevam os níveis de estresse, sobrecarga física e insatisfações aos cuidadores.
(GARBACCIO; TONACO, 2019).
Diante disso, percebe-se uma grande vulnerabilidade do cuidador informal, a julgar
pela ausência de orientações satisfatórias, por exercer simultaneamente à sua rotina as
atividades do idoso, e também pelas condições clínicas por eles apresentadas, sendo que os
mesmos afirmaram possuir uma ou mais patologias, sobressaindo a hipertensão (30%), a
depressão (15,7%), seguido de diabetes, doenças reumáticas e a insuficiência cardíaca
congestiva. (GARBACCIO; TONACO, 2019). A literatura aborda entre cuidadores graus
médios a elevados de ansiedade, estresse e doenças crônicas sistêmicas como hipertensão e
diabetes.
Faz-se necessário, a realização de estudos que visem elucidar as principais
dificuldades encontradas pelos cuidadores de idosos em domicílio, pois assumem a
responsabilidade pelo cuidado sem treinamento prévio. A orientação do cuidador sobre
situações que podem implicar em maiores riscos a saúde dos idosos, além de ampliar o
cuidado, o torna mais humanizado e diminui a sobrecarga sobre o cuidador.
Colocam-se em questão as implicações advindas culturalmente, socialmente,
demograficamente, bem como as orientações fornecidas pelos profissionais de saúde da
Unidade Básica de Saúde (UBS), além das condições clínicas tanto dos cuidadores quanto dos
idosos, visto que todos esses fatores atuam como facilitadores ou complicadores, refletindo
assim significativamente na assistência prestada ao idoso. (GARBACCIO; TONACO, 2019).
40

Levando em consideração a complexidade do processo do envelhecimento e a


problemática de um cuidador informal comumente sem formação técnica e científica para
conduzir os cuidados ao idoso, constata-se uma suscetibilidade à sobrecarga física,
psicológica, financeira, bem como social, seja devido aos distúrbios cognitivos que de modo
habitual estão presentes com o avançar da idade, ou em consequência do nível de dependência
do idoso, além do tempo dispensado aos cuidados. (GARBACCIO; TONACO, 2019).
Diante disso, torna-se necessário a existência de políticas públicas voltadas para os
cuidadores informais de idosos e também de uma qualificação adequada dos profissionais que
trabalham especificamente com a população idosa, tendo em vista os possíveis impactos na
assistência como um todo.

3.2 O cuidador informal de idosos, desafio para o conjunto da sociedade

O cuidar está relacionado à questão social. Às questões de gênero, idade e cultura, aos
laços de parentesco ou de muita proximidade. O cuidado formal é exercido por profissional e
pessoal especializado, de acordo com um protocolo e um Código de Ética. O cuidado
despendido em casa ou entre familiares e amigos é denominado cuidado informal, sendo na
maioria das vezes representado como obrigação, entretanto comporta também a expressão de
afeto, proteção, reciprocidade e gratuidade (MARQUES; TEIXEIRA; SOUZA, 2012 apud
HEDLER; et al, 2016). Além de ser uma tarefa motivada por normas sociais, o cuidador se
sente cumpridor de uma obrigação social e moral em que predomina um dever de
reciprocidade, necessidade de evitar o sentimento de culpa e uma relação empática e afetiva
entre o cuidador e o idoso.
Segundo Mioto (2010 apud HEDLER, et al, 2016), uma das críticas a respeito da
centralidade familiar, como provedora de proteção aos seus membros, está relacionada ao
retrocesso da atuação do Estado nas garantias de direitos sociais, quando a política pública de
caráter universal passa a ser uma política pública focalizada, fortalecendo a atuação do
mercado como provedor da proteção social, com objetivo do cobrir a sua falta na garantia dos
direitos sociais.
É importante refletirmos que há uma ausência do Estado e culpabilização da família na
discussão do cuidado. Essa questão relacionada ao cuidado com as pessoas idosas perpassa
ainda pela questão de gênero, cabendo a indagação de quem são os cuidadores familiares
41

desse público. Nestas três vertentes faz-se necessário compreender as representações sociais
da sua atividade, o cuidado, e da imagem, o cuidador familiar.

Cuidar de uma pessoa idosa da família pode trazer outras consequências, como
conflitos no âmbito emocional, pois o cuidador pode experimentar sentimentos
positivos como satisfação por cuidar de uma pessoa idosa da família e ao mesmo
tempo sentimentos negativos como: sensação de impotência, tristeza, solidão e
preocupação. (HEDLER, et al, 2016, p. 3).

Outra questão para se observar em relação ao cuidado com o idoso, refere-se aos
novos arranjos familiares advindos da redução do número de filhos, menor taxa de
fecundidade, aumento da longevidade, exigência do mercado de trabalho e pobreza
(FALEIROS, 2014 apud HEDLER, et al, 2016) questiona-se a extrema vulnerabilidade
psicológica e situacional em que se encontram tanto o cuidador quanto o idoso, quando se
trata de uma díade onde o cuidador não possui muitas vezes as condições materiais, físicas e
psicológicas para exercer esse cuidado. Até onde vai a responsabilidade da família, até onde
vai a responsabilidade do Estado?
As desigualdades de gênero e a desigualdade das distribuições das tarefas
condicionam a realidade do cuidado familiar. O cuidado familiar é atribuído às mulheres, seja
o cuidado das crianças, de pessoas dependentes, de idosos ou de pessoas deficientes, pois a
maternagem é naturalizada como capacidade feminina.
Constatou-se que o convívio familiar impõe a um dos familiares a responsabilidade
pelo cuidado, uma vez que a maioria dos cuidadores familiares assume essa tarefa por razões
afetivas, culturais, de parentesco, entre outras. Na maioria das vezes, quando tem uma pessoa
idosa com dependência funcional, a família é obrigada a assumir a tarefa do cuidar, pois não
dispõe de recursos financeiros para contratar o cuidador formal, bem como outros aparatos
necessários ao cuidado da pessoa idosa. Geralmente quem assume esse papel na família é a
mulher, pois, historicamente e pela lógica dos programas sociais de família, o cuidado é
delegado à figura feminina.
Para Hedler, et al (2016) o Estado, por sua vez, não estabelece e executa políticas de
suporte familiar, assegurando precariamente a atenção à saúde no SUS e uma remuneração
previdenciária desigualmente distribuída. Para atender as necessidades reais das famílias, a
organização familiar é ampliada, por exemplo, incorporando um amigo, outro parente ou um
membro da família mais diretamente ligado a pessoa idosa para assumir esse papel.
42

Acredita-se que muitas vezes esse rearranjo familiar não é pensado, é imposto por
problemas econômicos ou é emergente, pois cuida quem possui amor, tempo e
disponibilidade para fazê-lo.
Os cuidadores familiares cuidam com amor dos idosos, uma vez que esse elemento foi
prioritariamente evocado. Na análise de conteúdo das falas do cuidador familiar e do cuidado,
esse sentimento é apresentado como motivador para a realização dos cuidados com a pessoa
idosa. No entanto, é importante salientar que esses cuidadores precisam de atenção por parte
do Estado e da sociedade, pois o contexto no qual estão inseridos constitui-se de um cenário
complexo, uma vez que não há diretriz em lei ou regulação na política nacional de proteção ao
idoso que oriente a atividade do cuidador familiar de pessoas idosas, deixando esse sujeito
sem suporte, sozinho e na maioria das vezes despreparado para realizar a tarefa de cuidador.
(HEDLER, et al, 2016). Ainda que existam algumas iniciativas de ações sociais por parte de
instituições públicas e privadas que, são ações focalizadas, e não são suficientes para atender
as necessidades dos cuidadores familiares, a importância de realizar estudos que investiguem
o perfil de cuidadores familiares e as implicações que norteiam a atividade realizada por esses
sujeitos, se dá na medida em que podem possibilitar a criação de políticas públicas, as quais
ofereçam uma rede de suporte e amparo a esses cuidadores, contribuindo para sua qualidade
de vida para assim prestarem serviços dignos e de qualidade para com as pessoas idosas.
43

CONSIDERÇÕES FINAIS

A pesquisa identificou que o cenário populacional no contexto atual brasileiro é de


redução do número de crianças, em virtude da queda na fecundidade e do progressivo
aumento no grupo dos idosos, com elevação da expectativa de vida. A qual é de 72, 8 anos
para homens e 79,9 anos para mulheres. A expectativa de vida brasileira aumentou de 30,4
anos entre os anos de 1940 e 2018. Oliveira (2019) e IBGE (2019). O aumento da expectativa
de vida e a realidade do envelhecimento da população tornou-se um dos principais desafios da
modernidade. Percebe-se que o cenário se torna mais agravante em nosso país, porque o
envelhecimento ocorre somado às desigualdades sociais, aliadas a falta de informações, o
preconceito e o desrespeito à pessoa idosa.
Foram apresentadas legislações que, através da promulgação dos direitos sociais dos
idosos previstos na Constituição Federal de 1988, e nas legislações posteriores como a Lei
Orgânica da Assistência Social (LOAS), de 1993, que regula o Benefício da Prestação
Continuada (BPC). Como Política Social Especial, é promulgada a Política Nacional do Idoso
através da Lei 8.842, de 4 de abril de 1994, e regulamentada pelo Decreto 1.948, de 3 de julho
de 1996, cujo objetivo é promover a garantia dos direitos sociais do idoso, criando condições
para a promoção da sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade.
Destacou-se o risco existente para a continuidade da legislação existente, oriundo do
ataque do neoliberalismo. Pois, sabemos que na atualidade o Estado atua segundo os preceitos
do neoliberalismo, operando sob a lógica de políticas sociais precárias e focalizadas, abrindo
espaço para que a iniciativa privada e o “terceiro setor” assumam o papel de promotor dessas
políticas. Portanto, é fundamental estimular a sociedade, com foco nos idosos, ao
conhecimento e a participação popular nos espaços de decisão política.
O envelhecimento remete a alterações que comumente exigem cuidados físicos,
psicológicos e sociais. Inclui a atenção às doenças crônicas não transmissíveis as quais podem
contribuir para ocasionar ou agravar o estado de dependência dos idosos. Contata-se que esse
é um desfecho comum e sério da situação de cronicidade e longevidade da terceira idade é a
incapacidade física e mental, definida como dependência de outras pessoas para condução de
importantes tarefas e atividades da vida essenciais ou pessoais. Diante desses fatores,
percebeu-se a necessidade do cuidador. Existem, portanto, novas demandas advindas do
processo de envelhecimento populacional e um conjunto de desafios e dificuldades
encontradas pelos cuidadores de idosos, em especial os informais. Uma profissão que possui
baixa valorização social, mas de extrema importância para a sociedade.
44

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