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Cosmovisão Reformada
Por que os nossos primeiros pais foram levados ao pecado em uma atmosfera
perfeita?4 Talvez devido ao “interesse existencial”5 do problema é que esta pergunta
tem atravessado os séculos. A resposta, para mim, é simples e me contento com
ela. Não pelo prazer da ignorância, antes, como uma confissão de meu limite dentro
da esfera do revelado na Escritura: não sei. O meu não saber não invalida o fato,
nem elimina a razão de sua existência, apenas, resume uma ignorância pessoal. 6 E
1
Anthony A. Hoekema, Criados à Imagem de Deus, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1999, p. 101-102.
2
F.A. Schaeffer, O Deus que intervém, São Paulo: Cultura Cristã, 2002, p. 256.
3
J.I. Packer, Vocábulos de Deus, São José dos Campos, SP.: Fiel, 1994, p. 78.
4
“Apesar de ter sido colocado num Paraíso, cercado de abundantes bênçãos de Deus, o homem escolheu
resistir ao direito de Deus de governar sobre ele” (Steven J. Lawson, Fundamentos da Graça, São José dos
Campos, SP.: Editora Fiel, 2012, v. 1, p. 76).
5
Veja-se: G.C. Berkouwer, Doutrina Bíblica do Pecado, São Paulo: ASTE., 1970, p. 14-15.
6
“A impossibilidade de se explicar a origem do pecado, portanto, não deve ser entendida como um
desculpa, um refúgio para a ignorância. Em vez disso, deve-se dizer aberta e claramente: estamos,
aqui, nos limites de nosso conhecimento. O pecado existe, mas nunca será capaz de justificar sua
existência. Ele é ilícito e irracional” (Herman Bavinck, Dogmática Reformada, São Paulo: Cultura
Cristã, 2012, v. 3, p. 71-72).
Tentando pensar e viver como um Reformado: Reflexões de um estrangeiro residente - Rev. Hermisten – 02/11/2023 – 2
A Palavra relata que Adão e Eva, criados em perfeita retidão, tendo perfeita
liberdade de escolha optaram por desobedecerem a Deus e comeram da árvore do
bem e do mal que lhes fora expressamente proibida por quem tinha poderes para
fazê-lo (Gn 2.15-17).7
No Paraíso, Satanás, que por sua própria existência é uma ironia de toda lógica
racional, tentou os nossos primeiros pais por meio do desejo, que certamente de
alguma forma cultivavam, de serem iguais a Deus. A própria existência de Satanás é
uma ironia de toda lógica humana. Eles se esqueceram de todo o histórico de sua
relação com o Deus fiel, amoroso, justo e sábio; 8 o seu desejo falou mais alto aos
seus corações. O desejo ainda que por vezes momentâneo tende a eternizar-se na
brevidade de seu ardor. Aqui eles conceberam o que pode ser chamado de mal
moral.9
7
“15 Tomou, pois, o SENHOR Deus ao homem e o colocou no jardim do Éden para o cultivar e o guardar. 16 E o
SENHOR Deus lhe deu esta ordem: De toda árvore do jardim comerás livremente, 17 mas da árvore do
conhecimento do bem e do mal não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás”
(Gn 2.15-17).
8
“O pecado original foi o pecado de esquecer Deus. Adão e Eva deram as costas a Ele – daí os problemas”
(David Martyn Lloyd-Jones, Uma Nação sob a Ira de Deus: estudos em Isaías 5, 2. ed. Rio de Janeiro:
Textus, 2004, p. 47).
9
“Mal moral é o mal resultante das escolhas e das ações dos seres humanos” (Ronald H. Nash, O Problema do
Mal: In: Francis J. Beckwith, et. al. eds. Ensaios Apologéticos, São Paulo: Hagnos, 2006, p. 247).
10
Ocorre 5 vezes no NT.: Lc 20.23; 1Co 3.19; 2Co 4.2; 11.3; Ef 4.14.
11
e)capataw * Rm 7.11; 16.18; 1Co 3.18; 2Co 11.3; 2Ts 2.3; 1Tm 2.14.
12
“Se formos vigilantes contra Satanás em um ponto da muralha de nosso viver, ele tentará rompê-la
em outro ponto, esperando por um momento quando nos sentirmos seguros e felizes, e quando,
provavelmente, nossas defesas estarão fracas. Assim prosseguem os seus ataques, o dia inteiro e
todos os dias” (J.I. Packer, Vocábulos de Deus, São José dos Campos, SP.: Fiel, 1994, p. 83).
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Satanás enganou Adão e Eva. Após isso, os fez crer que a mentira em que
creram era a verdade. Satanás, que tem pretensões divinas, fez com que Eva o
seguisse e Adão seguisse a Eva. Ninguém seguiu a Deus. O caos se instalara.
Nossos primeiros pais demonstraram que acompanharam um novo senhor. As
consequências viriam de forma intensamente perceptíveis. A proximidade de
Satanás os afastaria cada vez mais de Deus, e, no tempo próprio, que não
demoraria, eles se esconderiam da presença do Senhor (Gn 3.8-10).
As direções nas quais o nosso pensamento pode se dirigir não são tão
numerosas quanto supomos ou imaginamos. Em nossos pensamentos e
ações, somos todos determinados pela peculiaridade de nossa natureza
humana, e também cada indivíduo por seu próprio passado e presente, pelo
seu caráter e ambiente. E não é raro que aqueles que parecem liderar os
16
outros são, antes, liderados por eles.
Temos aqui uma suspeita moral sobre a integridade do ser de Deus. Ele –
começam a inferir – não é tão santo, justo e bondoso como quer nos fazer crer (Gn
3.1-5). Houve um pacto simbiótico pecaminoso entre os olhos e o coração (Gn
3.6/Jó 31.7). O caminho do crescimento, pensam Adão e Eva, é o da desobediência.
Isso consumado, instalou-se o caos na sua vida, em suas relações e na criação. (Gn
3.7-24). A paz da criação estabelecida por Deus foi quebrada ali, 19 ainda que antes,
já estivera trincada no coração do homem e da mulher.
As Escrituras nos mostram com insistência, que é Deus mesmo quem nos instrui
(Sl 32.8-9).20 No entanto, curiosamente, nossos primeiros Pais que tinham a
17
Robert D. Knudsen, O Calvinismo como uma força cultural: In: W. Stanford Reid, ed. Calvino e sua
influência no mundo ocidental, São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1990, p. 20.
18
Devo parcialmente essa observação ao Rev. Ricardo Rios que, em correspondência privada (08.06.18), disse:
“A minha tese é que o ateísmo é uma resposta aos ditames de Deus. Como eu não posso seguir suas
ordenanças, eu nego que elas existam. A autonomia é uma deificação humana”.
19
Cf. P. Tripp, Admiração, São Paulo: Cultura Cristã, 2017, p. 22.
20
“Instruir-te-ei (( )ׂשכלśâkal) e te ensinarei o caminho que deves seguir; e, sob as minhas vistas, te darei
conselho” (Sl 32.8). A palavra aqui traduzida por “instrução”, é traduzida também por “entendimento” (Gn
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Narra Moisés: “Vendo a mulher que a árvore era boa para se comer, agradável
aos olhos e árvore desejável para dar entendimento (( )ׂשכלśâkal), tomou-lhe do fruto
e comeu e deu também ao marido, e ele comeu” (Gn 3.6). Eles desejavam o
sucesso por seus próprios meios, mas, conheceram o fracasso por serem guiados
simplesmente por suas sensações em oposição à ordem divina.
O entendimento proposto por Deus nunca pode começar por um ato de falta de
entendimento que se concretize em desobediência à sua Palavra. Antes, deve
começar pela obediência aos seus preceitos. Na obediência, amadurecemos no
processo de aprendizado que se deparará com novos desafios e situações novas
com as quais teremos de lidar em nossa caminhada.
Aqui temos também outra lição preciosa para nós que muitas vezes tendemos a
trocar a instrução de Deus por outra, estranha à sua Palavra. Esta é uma tendência
normal do homem pecador. Portanto, todos nós sem exceção estamos, ainda que
por vezes de modo sutil, dispostos a substituir o Criador pela criatura (Rm 1.25), 22
criando e cultuando a deuses afeitos aos nossos desejos e circunstâncias.
3.6; Sl 14.2; 53.2; 2Cr 30.22); “inteligência” (Jr 3.15); “atentar” (Sl 106.7); “prudência” (1Sm 18.5; Sl
2.10; 94.8; 111.10; Is 52.13); “êxito” (1Sm 18.14,15,30; 2Rs 18.7); “discernimento” (Sl 36.3); acudir (Sl
41.1). A palavra se refere “à ação de, com a inteligência, tomar conhecimento das causas. (...) Designa o
processo de pensar como uma disposição complexa de pensamentos que resultam numa abordagem sábia e
bastante prática do bom senso. Outra consequência é a ênfase no ser bem-sucedido” (Louis Goldberg, Sakal:
In: R. Laird Harris, et. al., eds. Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, São Paulo: Vida
Nova, 1998, p 1478). Vejam-se: William Gesenius, Hebrew-Chaldee Lexicon to the Old Testament, 3. ed.
Michigan: WM. Eerdmans Publishing Co. 1978, 789-790; Louis Goldberg, Sakal: In: R. Laird Harris, et. al.,
eds. Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1998, p. 1478-1480;
Robert B. Girdlestone, Synonyms of the Old Testament, Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, (1897),
Reprinted, 1981, p. 74, 224-225.
21
“Ele [Jesus Cristo] tornou-se o Autor de nossa salvação, visto que se fez justo aos olhos de Deus, quando
remediou a desobediência de Adão através de um ato contrário de obediência” (João Calvino, Exposição de
Hebreus, São Paulo: Paracletos, 1997, (Hb 5.9), p. 137-138).
22
“20Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua própria divindade,
claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que foram
criadas. Tais homens são, por isso, indesculpáveis; 21porquanto, tendo conhecimento de Deus, não o
glorificaram como Deus, nem lhe deram graças; antes, se tornaram nulos em seus próprios raciocínios,
obscurecendo-se-lhes o coração insensato. 22Inculcando-se por sábios, tornaram-se loucos 23 e mudaram a
glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, bem como de aves,
quadrúpedes e répteis. 24 Por isso, Deus entregou tais homens à imundícia, pelas concupiscências de seu
próprio coração, para desonrarem o seu corpo entre si; 25pois eles mudaram a verdade de Deus em mentira,
adorando e servindo a criatura em lugar do Criador, o qual é bendito eternamente. Amém!” (Rm 1.20-25).
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23
Vejam-se: F. Nietzsche, Gaia Ciência, São Paulo: Abril Cultural (Os Pensadores, v. 32), 1974, § 343, p. 219-
220; F. Nietzsche, O Anticristo: Ensaio de uma Crítica do Cristianismo, São Paulo: Abril Cultural (Os
Pensadores, v. 32), 1974, § 16, p. 357-358; F. Nietzsche, Assim Falou Zaratustra, São Paulo: Hemus, 1977,
p. 238-239, 264-265.
24
Cf. P. Tripp, Admiração, São Paulo: Cultura Cristã, 2017, p. 22.
25
“A forma extrema da idolatria é o humanismo, que vê o homem como a medida de todas as coisas”
(R.C. Sproul, O que é a teologia reformada: seus fundamentos e pontos principais de sua soteriologia,
São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 33). Veja-se também: R.C. Sproul, A santidade de Deus, São
Paulo: Cultura Cristã, 1997, p. 205. Na provável primeira carta que Calvino escreveu depois de ter se
fixado em Genebra (1536), alegra-se com o avanço da Reforma e a consequente diminuição da
superstição e idolatria. Então diz: “Deus permita que os ídolos sejam erradicados também do
coração” (Carta escrita ao seu amigo Francis Daniel no dia 13 de outubro de 1536. In: João Calvino,
Cartas de João Calvino, São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 30). Veja-se também: João Calvino,
Instrução na Fé, Goiânia, GO: Logos Editora, 2003, Cap. 8, p. 22.
26
Kevin J. Vanhoozer, A Trindade, as Escrituras e a função do teólogo: contribuições para uma teologia
evangélica, São Paulo: Vida Nova, 2015, p. 99. Lembrei-me da figura empregada por Barth (1886-1968):
“Não se pode despedir-se da vida e da sociedade. Elas nos cercam por todos os lados; elas nos impõem
questões; elas nos confrontam com decisões. Nós devemos sustentar nossa base. O fato de que hoje nossos
olhos estão mais amplamente abertos às realidades da própria vida se dá porque desejamos algo mais. Nós
gostaríamos de estar fora desta sociedade, e em outra. Mas isto é apenas um desejo; nós ainda estamos
dolorosamente cônscios de que, a despeito de tudo, as mudanças sociais e as revoluções, tudo é como era
antigamente. Se fora desta situação nós perguntamos: ‘Vigia, o que há na noite?’, a única resposta que
carrega alguma promessa é, ‘O cristão’.” (Karl Barth, A Palavra de Deus e a Palavra do homem, São Paulo:
Novo Século, 2004, p. 207-208)
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27
Alister E. McGrath, Paixão pela Verdade: a coerência intelectual do Evangelicalismo, São Paulo: Shedd
Publicações, 2007, p. 68.
28
“Os homens pecaminosos nunca se dispõem a andar dentro das fronteiras que Deus impõe às suas criaturas.
Em sua arrogância, declaram sua suposta liberdade e reivindicam ser senhores de seus próprios destinos”
(Allan Harman, Comentário do Antigo Testamento ‒ Salmos, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, (Sl 2), p. 79).
29
Bonhoeffer, com argúcia, disse que “Também Satanás sabe empregar a Palavra de Deus como arma na luta”
(D. Bonhoeffer, Tentação, Porto Alegre, RS.: Editora Metrópole, 1968, p. 52).
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“Satanás, furtivamente, se move sobre nós e gradualmente nos alicia por meio de
artifícios secretos, de modo tal que quando chegamos a extraviar-nos, não nos
apercebemos de como o fizemos. Escorregamo-nos, gradualmente, até finalmente
nos precipitarmos na ruína”, comenta Calvino.31
O alvo constante de Satanás é a Palavra de Deus. Ele procura tirá-la de nós, ou,
senão, dar-nos uma visão distorcida do seu teor. No seu argumento, sempre há algo
de verdadeiro, contudo a sua dialética, que pode se valer das Escrituras, tem um
referencial totalmente excludente onde ele dilui muito bem a fim de dar-nos a
impressão de que a sua conclusão é coerente com a Palavra. 32 Como bem disse
Bonhoeffer (1906-1945): “A fraude, a mentira do diabo consiste na sua tentativa de
fazer o homem acreditar que poderia viver sem a Palavra de Deus”.33
Com esse propósito, ele também age por intermédio de falsos mestres, dizendo-
nos que pode nos levar à verdade plena muito superior à que nos é proposta pela
Escritura. Foi isto que ocorreu na igreja de Corinto: os falsos mestres usados por
Satanás fizeram muitos crentes acreditarem que o apóstolo Paulo era desprezível,
portanto, não poderia dar-lhes ensinamento profundo. Nós, hoje, sabemos quanto
sofrimento o fato trouxe à Igreja e a Paulo, quanta dor e desvios doutrinários e,
consequentemente, um distanciamento de Deus ocasionou. Satanás sempre
objetiva nos afastar de Deus e, quando creditamos as suas insinuações, ele
consegue o seu objetivo.
Na narrativa bíblica da Criação, lemos: “Do solo fez o SENHOR Deus brotar toda
sorte de árvores agradáveis à vista e boas para alimento; e também a árvore da vida
no meio do jardim e a árvore do conhecimento do bem e do mal ([r;)(ra`)” (Gn 2.9).
Lemos também a respeito da proibição divina aos nossos primeiros pais: “16E o
SENHOR Deus lhe deu esta ordem (hw”c') (tsavah): De toda árvore do jardim
comerás livremente, 17mas da árvore do conhecimento do bem e do mal ([r;)(ra`) não
comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás” (Gn 2.16-17).
30
Outro mal contemporâneo é aquilo que MacArthur chama de “teologia da autoestima” e “psicologia da
autoestima” (Ver: John MacArthur Jr., Sociedade sem Pecado, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2002, p.
74ss).
31
João Calvino, Exposição de Hebreus, (Hb 6.4), p. 151-152.
32
“O credo alternativo do diabo contém, frequentemente, alguns elementos da verdade, escolhidos com
cuidado – mas sempre diluídos e totalmente misturados com falsidades, contradições, deturpações, distorções
e qualquer outra perversão imaginável da realidade. E, somando tudo isso, o resultado final é uma grande
mentira” (John F. MacArthur, Jr., A Guerra pela Verdade: lutando por certeza numa época de engano, São
José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2008, p. 71).
33
D. Bonhoeffer, Tentação, p. 60.
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Observe a ênfase dada à ordem divina. Somente Deus tem autoridade para
estabelecer leis e critérios para a sua criação. Na realidade, pouco importaria para
Deus o que o homem comeria no Jardim do Éden, exceto pelo fato dele estabelecer
a sua proibição como sinal de sua autoridade absoluta, demarcando o limite que
caracterizaria a obediência ou não do homem e da mulher, suas criaturas.35
Quando de seu estado [original] decaiu Adão, não há mínima dúvida de que
por esta defecção se haja alienado de Deus. Pelo que, embora concedamos
não haja sido nele aniquilada e apagada de todo a imagem de Deus, foi ela,
todavia, corrompida a tal ponto que, o que quer que resta, é horrenda
38
deformidade.
34
“E a Adão disse: Visto que atendeste a voz de tua mulher e comeste da árvore que eu te ordenara
(hw”c') (tsavah) não comesses, maldita é a terra por tua causa; em fadigas obterás dela o sustento
durante os dias de tua vida” (Gn 3.17). O contraste posterior com Noé é evidente. Este, fez tudo
quando o Senhor ordenara (hw”c') (tsavah) (Gn 6.22, 7.5,9,16). Os mandamentos de Deus são para
serem literalmente cumpridos: “Tu ordenaste (hw”c') (tsavah) os teus mandamentos, para que os
cumpramos à risca” (Sl 119.4).
35
Veja-se: Steven J. Lawson, Fundamentos da Graça, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2012, v. 1, p.
73.
36
Herman Bavinck, Teologia Sistemática, Santa Bárbara d’Oeste, SP.: SOCEP., 2001, p. 18.
37
Veja-se: Anthony A. Hoekema, Criados à Imagem de Deus, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1999, p. 87.
38
João Calvino, As Institutas, I.15.4. Em outro lugar, escreve Calvino: “O primeiro homem foi criado por Deus
em retidão; em sua queda, porém, arrastou-nos a uma corrupção tão profunda, que toda e qualquer luz que
lhe foi originalmente concedida ficou totalmente obscurecida. (...) Só quando aliado ao conhecimento de
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Deus é que alguns dos dotes a nós conferido do alto se pode dizer que possui alguma excelência real. À parte
disso, eles se acham viciados por aquele contágio do pecado que não deixou sequer um vestígio no homem
de sua integridade original” (João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, v. 2, (Sl 62.9),
p. 579). “Tão logo Adão alienou-se de Deus em consequência de seu pecado, foi ele imediatamente
despojado de todas as coisas boas que recebera” (João Calvino, Exposição de Hebreus, São Paulo:
Paracletos, 1997, (Hb 2.5), p. 57). “É verdade que ela (a imagem de Deus no homem) não foi totalmente
extinta; mas, infelizmente, quão ínfima é a porção dela que ainda permanece em meio à miserável subversão
e ruínas da queda” (João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, v. 1, (Sl 8.5), p. 169).