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1 - Conceito Básicos

Para avançar no entendimento do texto é importante conhecer algumas


definições trazidas pela LRF[2] em relação à dívida e endividamento, que
serão detalhadas mais adiante, bem como outras que se relacionam com
os controles de dívida:

Operações de Crédito

Operações de crédito correspondem a compromissos assumidos com


credores situados no País ou no exterior, em razão de mútuo, abertura de
crédito, emissão e aceite de título, aquisição financiada de bens,
recebimento antecipado de valores provenientes da venda a termo de
bens e serviços, arrendamento mercantil e outras operações
assemelhadas, inclusive com o uso de derivativos financeiros.

Despesas de Capital

Para entender a chamada Regra de Ouro constitucional é importante


conhecer o conceito de Despesas de Capital que são aquelas despesas
orçamentárias efetuadas pela Administração Pública com a intenção de
adquirir ou constituir bens de capital (máquinas, veículos, equipamentos,
imóveis, entre outros) que enriquecerão o patrimônio público ou serão
capazes de gerar novos bens e serviços. Também são despesas de capital
aquelas referentes a amortizações de dívidas. Assim, de acordo com o
classificador orçamentário as despesas de capital estão divididas em três
grupos de natureza da despesa:

A) Investimentos: são despesas relativas ao planejamento e à


execução de obras públicas, inclusive as destinadas à aquisição de
imóveis necessários à realização destas últimas, bem como para os
programas especiais de trabalho, aquisição de instalações,
equipamentos e material permanente e a constituição ou aumento
do capital social de empresas que não sejam de caráter comercial
ou financeiro.

B) Inversões Financeiras: são dotações destinadas a aquisições de


imóveis, ou de bens de capital já em utilização na economia;
aquisição de títulos representativos do capital de empresas ou
entidades de qualquer espécie, já constituídas, quando a operação
não importe aumento do capital social; e constituição ou aumento
do capital de empresas ou entidades que buscam objetivos
comerciais ou financeiros, inclusive operações bancárias ou de
seguros.

C) Amortização da Dívida: Despesas com o pagamento e/ou


refinanciamento do principal e da atualização monetária ou cambial
da dívida pública interna e externa, contratual ou mobiliária.

2 - Regra de Ouro

A Constituição Federal de 1988 adota uma visão realista diante do déficit


orçamentário. Nas classificações orçamentárias brasileiras, é possível
verificar que o déficit pode aparecer embutido nas contas públicas por
meio das contas denominadas Operações de Crédito.

Essas operações acabam se transformando em operações de longo prazo


com a colocação de títulos e obrigações emitidos pelos tesouros das três
esferas de governo.

Art. 167. São vedados


.................

III - a realização de operações de créditos que excedam o montante das


despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos
suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo
Poder Legislativo por maioria absoluta; (Grifo Autor)

No exemplo anterior as operações de crédito somam $1.000 unidades


monetárias e o montante das despesas de capital é nulo. Assim, caso um
determinado ente propusesse um orçamento nos moldes da situação I,
este seria considerado inconstitucional, pois estaria violando a Regra de
Ouro estabelecida na Constituição.

É importante salientar que a Regra de Ouro não veda a utilização de


receitas oriundas de operações de crédito para realização de despesas
correntes, mas determina que o montante das operações de crédito não
pode exceder o montante das despesas de capital. Nesse sentido,
poderíamos ter a seguinte situação:

Exemplo

RECEITAS DESPESAS

Correntes 2.000 Correntes 1.900

Impostos 900 Pessoal 900

Taxas 300 Juros da Dívida

Contribuições 800 Outras Despesas Correntes 1.000

Capital 1.000 Capital 1.100

Alienação de Bens Investimento 300

Operações de Crédito 1.000 Inversão Financeira

Transferências de Capital Amortização da Dívida 800

Total 3.000 Total 3.000

No exemplo, a utilização da receita de operações de crédito para


realização de outras despesas correntes foi compensada pela utilização de
receitas de taxas e contribuições para despesas de investimento e
amortização da dívida, respectivamente.

Nesse caso o montante das despesas de capital ($1.100) é maior do que as


receitas de operações de crédito ($1.000). Portanto, o ente estaria
cumprindo a Regra de Ouro, apesar de estar aplicando receitas de
operações de crédito em despesas correntes.
A essência da Regra de Ouro é estabelecer que o ente poderá se
endividar, mas em montante que não seja superior aos valores previstos
para investimento, inversão Financeira e amortização de dívidas. Isso não
significa que as receitas de operações de crédito somente possam ser
gastas para estes grupos de despesas.

Para entender melhor pode-se fazer o seguinte paralelo com a família.


Imagine que o pai de uma determinada família decidiu tomar um
empréstimo (operação de crédito) de $40 mil unidades monetárias, junto
à uma instituição financeira para comprar um carro (investimento) e no
dia 10 o gerente da instituição financeira informou que o dinheiro do
empréstimo havia sido depositado na conta bancária. Entretanto, o pai ao
chegar em casa viu que necessitava fazer compras para alimentação da
família e o único dinheiro disponível no momento era oriundo do
financiamento. Decidiu, diante da situação, utilizar $1.000 unidades
monetárias do saldo bancário para fazer as compras do mês. No dia 20,
quando recebeu o salário retirou os $1.000 para juntar com o saldo do
empréstimo e comprou o carro. Sob a ótica de controle das finanças da
família o pai fez algo de errado ao utilizar dinheiro de endividamento para
fazer compras no supermercado? Não, pois o que interessa para análise é
o montante, e neste caso o valor do financiamento é menor ou igual ao
valor do investimento (carro). O que aconteceu na prática foi apenas uma
troca de fonte de recursos e neste contexto o pai estaria cumprindo a
Regra de Ouro.

Autor: Paulo Henrique Feijó - Professor, Escritor e Contador

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