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escuta

escuta
ouvir x escutar
Ouvir é um fenômeno fisiológico; escutar é um ato
psicológico. Pode-se descrever as condições físicas
da audição ( seus mecanismos ), recorrendo-se à
acústica e a fisiologia da audição: a escuta, porém, só
se pode definir por seu objeto, ou se preferirmos, sua
intenção.
escuta
três escutas
Barthes destaca a existência de três níveis de escuta:
territorial, de sentido e psicanalítica.
escuta
1a. escuta: territorial
Os antropólogos observam que o comportamento do
ser vivo para alimentar-se, está ligado ao tato,
paladar, olfato, e o comportamento afetivo ao tato,
olfato e a visão; a audição parece estar
essencialmente ligada à avaliação da situação
espaço-temporal. O homem a ela acrescenta a
visão, o animal o olfato.
escuta
1a. escuta: territorial
O espaço doméstico, da casa, do apartamento
(equivalente aproximado do território animal) é um
espaço de ruídos familiares reconhecidos, cujo
conjunto compõe uma espécie de sinfonia doméstica.
escuta
1a. escuta: territorial
Se o fundo auditivo invade todo o espaço sonoro (se o
ruído ambiente é demasiadamente forte), a seleção, a
inteligência do espaço já não é possível, a escuta é
lesada. O fenômeno ecológico que hoje é chamado
poluição e que está prestes a tornar-se um mito negro de
nossa civilização técnica, nada mais é do que a alteração
insuportável do espaço humano, na medida em que o
homem tenta nele reconhecer-se; a poluição fere os
sentidos através dos quais o ser vivo, do animal ao
homem, reconhece seu território, seu habitat, visão, olfato
e audição.
escuta
1a. escuta: territorial
a escuta é essa atenção prévia que permite captar
tudo o que pode vir perturbar o sistema territorial; é
uma defesa contra a surpresa; seu objetivo direto
(aquilo para cuja direção se volta) é a ameaça, ou, ao
contrário, a necessidade; o material da escuta é o
índice, seja por que revela o perigo, seja por que
permite a satisfação da necessidade.
escuta
1a. escuta: territorial
que aquilo que estava confuso e indiferente torne-se
distinto, pertinente, e que toda a natureza tome a
forma particular de um perigo ou de uma presa; a
escuta é a operação por excelência desta
metamorfose.
escuta
2a. escuta: sentido
a característica operatória da humanidade é
precisamente percussão rítmica longamente
repetida, como provam os calhaus e as bolas
poliédricas marteladas; através do ritmo, a criatura
pré–antrópica entra na humanidade dos
australântropos.
escuta
2a. escuta: sentido
através do ritmo, a escuta deixa de ser pura vigilância
para tornar-se criação. Sem o ritmo nenhuma
linguagem seria possível; o signo baseia-se em ir e
vir do marcado e do não marcado, que chamamos
paradigma. Simultaneamente serve para cifrar esta
realidade e para decifra-la.
escuta
2a. escuta: sentido
A comunicação implicada nesta segunda escuta é
religiosa; estabelece a ligação entre o indivíduo
ouvinte e o mundo secreto dos deuses.
escuta
2a. escuta: sentido
E o que a escuta tenta decifrar? Essencialmente, ao
que parece, duas coisas: o futuro (na medida em que
pertence aos deuses) ou o erro (na medida em que
provenha do olho de Deus). Escutar é, de maneira
institucional, procurar saber o que se vai passar.
escuta
2a. escuta: sentido
a escuta fechada e como que clandestina (entre duas
pessoas) constituiu, pois, um "progresso" (no sentido
moderno), pois que assegurou a proteção do indivíduo
(de seus direitos a ser um indivíduo) contra o domínio
do grupo.
escuta
3a. escuta: psicanalítica
O inconsciente, estruturado como uma linguagem, é
objetivo de uma escuta simultaneamente particular e
exemplar; a escuta do psicanalista

Corporalidade do falar, a voz situa-se na articulação


entre o corpo e o discurso e é nesse intervalo que o
movimento de vai-vem da escuta pode realizar-se.
escuta
3a. escuta: psicanalítica
O que é oferecido para ser ouvido por essa escuta é
exatamente aquilo que o indivíduo que fala não diz; a
trama inconsciente que associa seu corpo com o
espaço de seu discurso; trama ativa que reatualiza na
palavra do indivíduo a totalidade de sua história.O
psicanalista, ao esforçar-se por captar os
significantes, aprende a "falar " a língua que é o
inconsciente de seu paciente.
escuta
3a. escuta: psicanalítica
A relação psicanalítica é estabelecida entre dois
indivíduos. O reconhecimento do desejo do outro não
poderá em hipótese alguma ocorrer na neutralidade,
na benevolência ou no liberalismo.
escuta
nova escuta
Acredita-se que, para liberar a escuta, basta que o
indivíduo tome a palavra, ele mesmo - quando, na
verdade, uma escuta livre é essencialmente aquela
que circula, que permuta, que desagrega, por sua
mobilidade, a malha estabelecida que era imposta
à palavra; já não é possível imaginar-se uma
sociedade livre, aceitando de antemão nela preservar
os antigos espaços de escuta; do crente, do discípulo,
do paciente.
escuta
nova escuta
Ao "desconstruir-se", a escuta exterioriza-se, obriga o
indivíduo a renunciar a sua intimidade.
escuta
referência
BARTHES, Roland. O corpo da música. IN: O óbvio e
o obtuso.

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