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Pós-Graduação em

Análise Existencial
e Logoterapia Frankliana

A TESE DO OTIMISMO
TRÁGICO
Revisão e Direção Geral
Luis Enrique Paulino Carmelo

Transcrição e Resumo
Filipe Italiano Leal
Bruno Afonso Alves da Silva

Revisão Ortográfica
Ana Carolina Cenedesi Machado Bertolini

Diagramação e Edição
Em Rota Produções

Material exclusivo para alunos do curso de Pós-Graduação em


Análise Existencial e Logoterapia Frankliana.
SUMÁRIO
O PRAZER NÃO DÁ SENTIDO À VIDA | 5

OTIMISMO VS NEGAÇÃO DO FINALISMO | 6

O FENÔMENO DA “DESISTITE” | 7

A HOMEOSTASE EM FRANKL | 9

A CULPA | 10

A MORTE | 11

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS | 14
Pós-Graduação em Logoterapia e Análise Existencial

Neste módulo veremos a Tríade Trágica Positiva ou, como Viktor Frankl
apresenta, a Tese do Otimismo Trágico.
Existe uma certa tragédia neste mundo, nem tudo acontece da forma
como gostaríamos.Existem intempéries, frustrações, problemas; queremos
fazer o bem e acabamos fazendo o mal, etc.
Contudo, para além da tragédia, existe um bem neste mundo pelo qual
vale a pena lutar, e sem o qual a vida se tornaria um absurdo. E é porque há
um bem no mundo – porque de uma desgraça pode superabundar uma
graça – que não desistimos, mesmo quando tudo ao nosso redor parece
estar em ruínas.

O PRAZER NÃO DÁ SENTIDO À VIDA


Para Viktor Frankl, não é o prazer que dá sentido à vida.

“Pois bem: se o prazer não é capaz de dar sentido à vida humana,


também a ausência de prazer não é capaz de lho tirar.” (Viktor
Frankl)

A ausência de desconfortos físicos e a posse de todo tipo de bens em


abundância não nos faz, obrigatoriamente, felizes. Conhecemos pessoas que
têm tudo e vivem uma vida amarga, baixa. Um exemplo claro disso são as
crianças: se você proporciona a uma criança tudo o que ela quer, sem jamais
dizer não, ela não se humaniza, mas se animaliza.
Se o prazer fosse condição para encontrar o sentido, todos nós estaríamos
fadados ao fracasso, porque todos nós iremos experimentar - por diversas
vezes durante a vida - desconfortos, incômodos, intempéries.

“Não há um único ser humano que possa dizer que jamais sofreu,
que jamais falhou e que não morrerá.” (Viktor Frankl)

A culpa proveniente do erro que cometemos é dolorosa, bem como os


incômodos físicos e psíquicos que sentimos por conta das limitações físicas e
psíquicas que temos. Iremos chorar com muita dor e muito pesar a morte de
muitos entes queridos. Enfim, a existência humana é marcada por tragédias.
A tríade trágica positiva diz respeito a três realidades: a DOR, a CULPA e
a MORTE.
Frankl chama essas três realidades de tríade trágica positiva, pois
todos nós podemos, a depender do nosso comportamento, permanecer
otimistas diante delas. A tragédia não precisa, necessariamente, tornar-se

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angústia, desespero, tédio ou apatia; mas, diante dela, podemos alimentar


uma esperança e um certo otimismo.

OTIMISMO VS NEGAÇÃO DO FINALISMO


Nicola Abbagnano, em seu Dicionário de Filosofia, fala sobre o otimismo
da seguinte forma: “o oposto do otimismo não é o pessimismo, mas sim
a negação do finalismo, com um reconhecimento do caráter imperfeito,
acidental e problemático das ordens observáveis do universo”. Ou seja, o
contrário do otimista é a pessoa que nega que há uma ordem no mundo. Ora,
se existe ordem existe também uma finalidade, que ordena e estrutura tudo.
A pessoa que não é otimista não crê que possa haver um sentido escondido
por trás de tudo aquilo que se faz, inclusive das dificuldades, das intempéries
e das tragédias da vida.
Neste mundo existe uma inteligência que aponta para um estado de
perfeição e de graça. Só consegue ser otimista aquele que crê que há neste
mundo um sentido e que se percebe como um ser livre que caminha em
direção a esse sentido. Viktor Frankl era extremamente otimista, pois ele
perseguia o sentido; a vida, para ele, não poderia ser, sob nenhuma hipótese,
tão somente um processo de combustão e oxidação.
O otimismo é a nossa capacidade de extrair o melhor de cada situação,
de entender que de um mal aparente é possível tirar um bem permanente.
A pessoa otimista crê que onde abunda o pecado superabunda a graça,
que não há nada neste mundo que fique isento de sentido, que tudo aponta
para uma finalidade que ordena o cosmos.
▶ A pessoa que nega o finalismo não nega que as ações humanas
são possíveis de serem feitas, ou seja, a ideia da conquista e da motivação
humana existem, mas apontam para a finitude, para o nada.
▶ O pessimista está em um nível inferior, pois não só não acredita que as
coisas apontem para um fim, mas sequer acredita que exista algum sentido
de ser aqui e agora.

“Ao falar de uma tríade “trágica”, não quero levar o leitor a pensar
que a logoterapia é pessimista, assim como o existencialismo
tem fama de ser. A logoterapia é, muito mais, uma abordagem
otimista da vida, ao ensinar que não há nenhum aspecto negativo
da existência que não possa ser transmutado em conquistas
positivas, em tudo, a depender da atitude que se venha assumir”
(A Vontade de Sentido, pg. 94)

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Como, na prática, é possível extrair o melhor das situações mais difíceis?


Como mesmo estando em um mundo em que existe a culpa, a dor e a morte e
eu permaneço otimista? Como pode a vida conservar o seu sentido potencial
a partir desta visão de Frankl e apesar dos seus aspectos frágeis? Os santos
são modelos que, por excelência, nos demonstram como é possível carregar
com alegria, amor e esperança. São Josémaria Escrivá dizia: “Nenhum dia
sem cruz”.
Certa vez, Viktor Frankl escuta seus companheiros de campo se indagando
se sairiam dali com vida, pois, caso contrário, todo aquele sofrimento não
faria sentido. Frankl os corrige dizendo que a questão não era se sairiam
dali com vida, caso contrário todo o sofrimento não faria sentido; a questão
era saber se todo aquele sofrimento teria sentido, caso contrário não faria
sentido sobreviver ao campo. Se o sofrimento não esconder um sentido, não
nos levar a uma experiência profunda de crescimento, a vida se transforma
em um absurdo.

O FENÔMENO DA “DESISTITE”
Em Frankl, a pessoa humana, por definição, é homo patiens, um
homem sofredor. Mas o homem é capaz de sofrer amando, transformando
dor em amor, fazendo uma experiência profunda e rica com o sentido da
vida.
Em contrapartida, para Frankl, deixar de lutar, entregar os pontos, sucumbir
diante da dor é sinal claro de patologia. A este padrão de comportamento em
que a pessoa desiste de resistir diante da dor e do sofrimento – algo que se
podia verificar bastante nos campos de concentração ou em acampamentos
de prisioneiros de guerra –, os soldados americanos chamaram de “desistite”.

“Uma vez que a busca de sentido por parte do indivíduo é


bem sucedida, isto não só o deixa feliz, mas também lhe dá a
capacidade de enfrentar o sofrimento. E o que acontecerá se
a procura de sentido por parte da pessoa tiver sido em vão?
O resultado pode ser uma situação fatal. Quero lembrar, por
exemplo, o que aconteceu algumas vezes em situações extremas
como campos de concentração ou acampamentos de prisioneiros
de guerra. Nestes, como ouvi de soldados americanos, surgiu um
padrão de comportamento que eles chamavam de “desistite”.
Nos campos de concentração, esse comportamento encontrava
paralelo naqueles que, determinada manhã, às cinco horas,
recusavam-se a levantar e a ir trabalhar, preferindo ficar na
cabana, sobre a palha molhada de urina e fezes. Nada – nem
advertências, nem ameaças – podia induzi-los a mudar de

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comportamento. E então ocorria algo típico: puxavam um cigarro


do fundo de um bolso qualquer, onde o haviam guardado, e
começavam a fumar. Naquele momento, nós sabíamos que,
durante as próximas quarenta e oito horas, iríamos observá-
los morrer. A percepção de sentido havia desaparecido e,
consequentemente, a busca do prazer imediato havia tomado as
rédeas.” (Em Busca de Sentido, pg. 162)

A “desistite”, então, é o padrão de comportamento que a pessoa assume


quando não quer sofrer, a fim de não ter que enfrentar as dificuldades que
se lhe impõem. Assim, a pessoa acaba por escolher um caminho muito mais
fácil. Nos campos de concentração, esse caminho mais fácil era exatamente
o caminho da morte. Na medida em que o sentido desaparece do campo de
visão, surge a vontade de prazer ou a vontade de poder.
Nos dias atuais – fora dos campos de concentração e dos acampamentos
de prisioneiros de guerra – muitos não querem cumprir com os seus deveres,
nem suportar as suas cruzes. São pessoas de uma geração fraca, que não
conseguem suportar um “não”, viver uma contrariedade, suportar um
pequeno desconforto; querem, a todo custo, encontrar algo que as desonerem
das responsabilidades da vida, que tirem delas qualquer elemento de culpa,
de desconforto.
Uma história que vale a pena conhecer é a de Jerry Long, que é um nome
icônico na história da Logoterapia. Após um acidente que o deixou paralisado
do pescoço para baixo, acabando com sua promissora carreira no beisebol,
Jerry Long descobriu Viktor Frankl e o livro “Man’s Search for Meaning” (“Em
busca de sentido”, na versão em português). Ele escreveu uma carta para
Frankl e os dois logo se tornaram bons amigos. Com respeito a sua condição
de paralisia, ele costumava dizer: “eu quebrei meu pescoço, ele não me
quebrou”. Grandes esforços nos tornam pessoas maiores, grandes lutas
forjam o nosso caráter.

“Ora, é fato que o homem das ruas entende como mais valiosa
a ideia de um homem que carrega a própria cruz com uma
coragem indomável do que a de alguém que simplesmente é
bem sucedido, até mesmo se estamos falando de uma pessoa
extremamente bem sucedida.” (Vontade de Sentido)

Uma pessoa com muito sucesso pode estar desesperada. Em


contrapartida, uma pessoa pode estar no campo do insucesso (não foi
reconhecida pelo seu trabalho, não tem muito dinheiro, está em um
momento de reposicionamento profissional, etc.) e estar extremamente

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satisfeita, vivendo isso tudo com muito otimismo e esperança.


É mentira que o sofrimento nos nivela. O que acontece é que o sofrimento
nos revela: diante do sofrimento, aquele que já tem uma potência para ser
um grande santo se torna um grande santo, enquanto aquele que já leva
uma vida muito rebaixada, muito animalizada, esse acaba por parecer cada
vez mais com os porcos.
Precisamos nos atrever a sofrer, pois o sofrimento é uma mola propulsora
que nos leva aos nossos amores; o sofrimento é uma graça, pois nos salva da
apatia. “Assim como o ouro é provado no fogo, o justo é provado na dor” (Pr
17, 3). Atrever-se a sofrer (os sofrimentos inevitáveis) é algo extremamente
salutar, pois esse sofrimento nos purifica, de fato.
Superar os desafios da vida, saber transformar as tragédias em triunfos,
saber sofrer com dignidade, tudo isso é treinável. Frankl chama isso de
“desempenho”. Uma vez que é certo que vamos sofrer os sofrimentos inevitáveis
da vida, podemos nos impor pequenos sofrimentos, deliberadamente, no
ímpeto de nos prepararmos para quando eles vierem, para nos tornar mais
fortes (exemplo: levantar da cama ao primeiro toque do despertador, tirar o
açúcar do café, fazer jejuns, etc.).

A HOMEOSTASE EM FRANKL
A Psicologia moderna surge num momento de grandes tensões (final
do século XIX, começo do século XX), tendo diante de si um homem
extremamente marcado pela dor, pela dificuldade e pela guerra. Diante disso,
ela tenta proporcionar um consolo e um alívio para esse homem maculado.
Apesar de ser compreensível, dadas as circunstâncias, Viktor Frankl diz que
essa visão da Psicologia – que julga que o que a pessoa precisa e busca, de
fato, é a homeostase, a tranquilidade, a ataraxia – é uma visão equivocada.
A Psicologia presta, assim, um grande desserviço quando propõe esse
caminho como um caminho propriamente humano, pois, ao fazer isso, erra
o contorno antropológico, abre mão de uma proposta filosófica densa e
começa a propor como terapêutica coisas muito baixas, que bestializam a
pessoa.

“Houve poucos lugares no mundo com mais estresse do que em


Auschwitz, e exatamente ali desapareceram praticamente as
doenças psicossomáticas que com tanto gosto e frequência são
consideradas condicionadas pelo estresse.” (Frankl)

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É mentira que a dor e o stress nos adoecem. Adoecemos porque nos falta
o sentido, porque não temos um porquê viver. Há no estresse uma tensão
que pode ser fecunda e nos promover, nos fazer melhores.

A CULPA

(“Não há um único ser humano que possa dizer que jamais


falhou”)

Toda a noção de culpa em Viktor Frankl remonta ao filósofo Max Scheler.


Inevitavelmente nós erramos. O erro gera um estado de dor, de frustração.
Pecar é errar o alvo, se desviar do caminho que promove, que dignifica,
que leva a pessoa a fazer a experiência com o sentido. Não podemos tirar a
possibilidade dos outros de se perceberem culpados. O homem tem o direito
de ser considerado culpado.

“O arrependimento é o ato natural que Deus empresta à alma


para que esta regresse a Ele, se dEle se afastou.” (Max Scheler)
“É prerrogativa do ser humano – e parte constituinte de sua
existência – a capacidade de definir-se e redefinir-se. Em outras
palavras, é privilégio do homem a possibilidade de culpa, bem
como sua responsabilidade em superá-la.” (A vontade de sentido)

No livro “A Vontade de Sentido” há um relato de Frankl falando aos prisioneiros


da Penitenciária de San Quentin. Após a sua palestra, Frankl teve a convicção
de que, pela primeira vez, os prisioneiros se sentiram compreendidos: “eles
(os prisioneiros) compreenderam que era uma prerrogativa humana fazer-
se culpado e que, também, era uma responsabilidade do homem superar
essa culpa.” (A Vontade de Sentido, pg. 16).
Somos culpados pelo que fizemos, mas somos também responsáveis
pelos nossos próximos atos.

“Explicar totalmente o crime de alguém seria o mesmo que


eliminar a sua culpa e vê-lo não como uma pessoa livre e
responsável, mas como uma máquina a ser consertada. Até
os próprios criminosos detestam esse tratamento e preferem
ser considerados responsáveis pelo que fizeram.” (Em Busca de
Sentido)
“Os psicólogos, ao contrário de Frankl, sempre nos interrogam
a respeito da nossa infância e a respeito das coisas horríveis do
nosso passado – sempre o passado. É como uma pedra de moinho
que carregamos pendurada ao pescoço. A maioria de nós não
quer saber de escutar os psicólogos. Eu vim só porque sabia que

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Frankl tinha sido prisioneiro como nós.” (Um sentido para a vida) –
Palavras de um prisioneiro após escutar a palestra de Frankl.

É importante fazermos exames de consciência, se possível diariamente:


como temos agido, o que temos feito? O melhor que podemos extrair da
culpa é a capacidade de recomeço, de superação, de pedido de perdão, de
emenda. A questão não é ficar achando a culpa dos outros, mas as nossas
próprias e fazer o mea culpa. Se começamos a nos tratar com mais seriedade,
com mais comprometimento, começamos também a levar o outro mais a
sério. Por outro lado, se eu não me levar a sério, vou acabar colocando panos
quentes para justificar os erros dos outros. A questão é como a partir da culpa
é possível trazer o elemento de redenção, de esperança, para que a coisa não
se torne só uma auto-acusação, mas uma confissão, com um firme desejo
de não mais fazer, de se emendar, de se tornar mais responsável.

A MORTE

“Não há um único ser humano que possa dizer que não morrerá.”

É possível dizer sim a vida apesar de toda a sua transitoriedade. Não é a


finitude que faz com que não se possa dizer um grande e belo sim à vida.

“Agora podemos notar o sentido com que a Logoterapia contrapõe


um ‘otimismo do passado’ ao ‘pessimismo do presente’ proposto
pelo existencialismo. Uma vez exprime a diferença entre os dois
pelo exemplo seguinte: O pessimista é como um homem que
observa com inquietação e tristeza ir afinando-se a cada dia
que passa, seu calendário, do qual toda manhã destaca uma
folha. No outro extremo, a pessoa que enfrenta ativamente os
problemas da vida é como o homem que destaca día a día cada
folha de seu calendário e a arquiva cuidadosa e carinhosamente
com as anteriores, depois de ter anotado em seu verso algumas
linhas diárias. Ele pode espelhar-se com prazer e alegria em toda
a vida que viveu plenamente. O que significa para ele perceber
que está envelhecendo? Tem ele algum motivo para invejar aos
jovens que vê, ou para ter saudades de sua juventude perdida?
Que motivos tem ele para invejar os jovens? Pelas possibilidades
abertas aos jovens, o futuro para ele já é história? ‘Não, obrigado!’,
pensará ele. ‘Em vez de possibilidades eu tenho realidades em
meu passado, não apenas a realidade do trabalho realizado e do
amor amado, mas também do sofrimento sofrido com coragem.
Esses sofrimentos são as coisas de que mais me orgulho, ainda
que sejam realidades que não inspirem inveja a ninguém.’” (Um
sentido para a vida)

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Podemos ter uma atitude pessimista ou otimista diante da transitoriedade


da vida. De fato, a nossa vida está acabando. Viver, de algum modo, é ir
morrendo aos poucos. Os existencialistas estão certos ao dizerem que o
homem caminha para a morte, mas erram ao considerarem que a morte é
um nada, uma angústia.
Frankl diz que os velhos têm muito pouco para invejar dos jovens. Os jovens
tem, diante de si, um futuro com muitas possibilidades. Em contrapartida,
um velho tem um passado, uma história. As possibilidades vêm e vão e
posso tanto acertar quanto errar; o que está eternizado, porém, não muda.
Uma história bem vivida é uma história que não se apaga, pois não sofre
a caducidade do tempo (aquilo ninguém lhe tira). O passado é como um
celeiro repleto de grãos, diz Frankl.

“Contudo, apenas as possibilidades – as oportunidades de fazer


qualquer coisa com relação à situação real – são passageiras.
Desde que tenhamos realizado a possibilidade oferecida
pela situação, desde que tenhamos dinamizado o sentido
que a situação tem em si, nós teremos transformado aquela
possibilidade em uma realidade e teremos agido assim de uma
vez para sempre. A coisa não estará mais sujeita à transitoriedade.
Nós, por assim dizer, a libertamos dentro do passado. Nada nem
ninguém pode privar-nos ou furtar-nos aquilo que salvamos
e asseguramos no passado. No passado, alguma coisa é
irremediavelmente e irreparavelmente perdida, mas cada coisa
é guardada para sempre. Em geral é verdade, as pessoas só
enxergam o campo de restolhos da transitoriedade; não veem
as tulhas cheias de grãos nas quais depositaram os frutos de
suas vidas: as ações praticadas, as obras realizadas, os amores
amados, os sofrimentos corajosamente sofridos. Nesse sentido
podemos compreender o que o Livro de Jó diz sobre o homem: que
ele chega ao túmulo “como um feixe de trigo maduro colhido no
tempo certo”.” (Um sentido para a vida)

Se vivermos como devemos, nossa vida, ao final, não será outra coisa,
senão um monumento. A beleza da vida não está na sua duração, na
quantidade de coisas que se eternizam, mas no que se eternizou naquela
vida. A vida, para Frankl, é dramática, pois tudo que nós fazemos se torna, de
algum modo, eterno.
O homem decide no presente o que ele vai arrancar a golpes (ou seja,
realizando valores) do futuro, para lançar no passado. A linha da presente é
onde se encontram kronos e kairós.

“Quantas vezes não nos vem dizer que a morte põe em dúvida o

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sentido da vida inteira! Quantas vezes nos dizem que, em última


análise, tudo carece de sentido, já que a morte, no fim, tudo
destrói! Ora bem: poderá a morte realmente corroer esse sentido
que caracteriza a vida? De maneira nenhuma! Pelo contrário:
porque, que aconteceria se a nossa vida não fosse finita no tempo,
mas antes temporalmente ilimitada? Se fôssemos imortais,
poderíamos, com razão, adiar cada uma das nossas ações até o
infinito; nunca teria a menor importância o realizá-las agora, neste
momento preciso, podendo muito bem realizá-las amanhã, ou
depois de amanhã, ou daqui a um ano ou dez.. Em compensação,
tendo em vista a morte como fronteira infranqueável do nosso
futuro e limite das nossas possibilidades, vemo-nos obrigados a
aproveitar o tempo da vida de que dispomos e não deixar passar
em vão as ocasiões irrepetíveis que se nos oferecem, ocasiões
essas cuja soma finita representa precisamente a vida toda.”
(Psicoterapia e Sentido da Vida)

Nunca saberemos quando estaremos diante da nossa última possibilidade.


O que sabemos é que, até lá (neste momento), podemos nos comprometer
a viver uma vida que valha a pena. Não podemos editar o nosso passado,
tudo está consumado. O que podemos é aprender com o passado e mudar
a nossa postura no presente.
Pensar sobre a morte é refletir com muita seriedade sobre a vida. A forma
com a qual muitos monges se saudavam, “Carpe diem, memento mori”, nos
coloca diante da lembrança da morte e da necessidade de viver a vida de
forma menos relapsa, mais comprometida, mais instalada na realidade.

“A máxima da análise da existência, poderíamos então revesti-la


da seguinte forma imperativa: Vive como se vivesse pela segunda
vez e como se da primeira vez tivesse feito tudo tão falsamente
como agora estás quase a fazer.” (Psicoterapia e Sentido da Vida)

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
▶ Dicionário de filosofia (Nicola Abbagnano)
▶ Arrependimento e renascimento (Max Scheler)
▶ A arte de aproveitar as próprias falhas (Joseph Tissot)
▶ A paz da alma (Fulton Sheen)
▶ Preparação para a morte (Santo Afonso Maria de Ligório)
▶ Os 7 hábitos das pessoas altamente eficazes (Stephen R. Covey)
▶ Livro de Jó

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