Cláudio, casado há 10 meses, 23 anos, católico, almoxarife apresenta-se ao serviço de psicologia
de uma policlínica encaminhado por um serviço de pronto atendimento. No encaminhamento, o clínico geral classifica-o como possível transtorno de ansiedade e orienta que faça psicoterapia. Ao ser indagado sobre seu problema, Cláudio afirma ser muito católico e que ultimamente (há mais ou menos 1 mês) vem sentindo muito medo de estar sendo influenciado ou perseguido por forças sobrenaturais (espíritos malignos e o diabo). Diz que isso começou quando teve uma briga com a esposa no meio da noite e pensou na hipótese de matá-la, ao ponto de sentir-se incomodado de tal modo com a ideia que passou a se angustiar toda vez que tinha esse tipo de pensamento. Segundo ele, o nível de ansiedade estava tão forte que passou a ter ânsia de vômito, a faltar o trabalho (afirma estar desmotivado quanto à esta questão), medo de ficar sozinho e a evitar de pegar objetos cortantes como a faca de cozinha afirmando que “se eu me cortar e o sangue cair no chão, o diabo vai me pegar.” Ilustrando para o psicólogo como vem lidando com essas situações, Cláudio afirma que quando esses pensamentos (matar a esposa) vêm a sua mente, inclusive em situações no trabalho nas quais geralmente está esperando o caminhão ser carregado de materiais, diz acreditar que é um pecador por pensar essas coisas e que certamente irá para o inferno. O estopim da última crise foi quando, em seu trabalho, foi exposto a um vídeo de whatsapp de uma sessão de descarrego. Diz que não assiste mais jornal, fantástico, programas religiosos, filmes de suspense e terror. O psicólogo trabalhou alguns pensamentos no atendimento seguinte, mas ainda continuou a buscar informações sobre a história de vida de Cláudio e foi assim que descobriu que ele, apesar de muito católico, chegou a frequentar uma igreja evangélica neopentecostal levado por alguns parentes. Afirmou que lá ouviu muito sobre histórias de possessões e indivíduos sendo influenciados por forças do mal, ao ponto de chegarem a cometer atos criminosos. Ao lembrar desses fatos, Cláudio chega a dizer para o terapeuta que se pensa em matar a esposa é porque no fundo é um assassino influenciado pelo demônio, assim como os casos dos indivíduos que ouvia quanto frequentava esta igreja. Sobre sua saída desta congregação, ele afirmou que passou a se sentir mais incomodado e paranoico quando vinha dos cultos. Ainda investigando sobre a história de vida deste paciente, o psicólogo descobriu que Cláudio sempre teve muito medo quando criança (de fantasmas principalmente e do escuro) e que nunca assistia filmes em que tinham vampiros, zumbis e múmias. Ressaltou que na adolescência o medo em relação a essas coisas diminuiu, entretanto após ocorrer um episódio em que, ao estar em uma festa bebendo com os amigos, ele discutiu com um deles e pensou em matá-lo. Diz que após a discussão, foi para a casa e, no dia seguinte, soube que o amigo havia sido assassinado. A partir daí, Cláudio diz que começou acreditar que o mal influenciava seus pensamentos ao ponto de torná-los realidade. Por fim, Cláudio afirmou que vem enfrentando problema de sobrepeso que, constantemente, é motivo de discussão entre ele e sua esposa. Não está fazendo uso de nenhum medicamento para ansiedade e afirma que o que mais quer é saber o “por que” dele pensar tanto sobre o sobrenatural, se está louco ou não.