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CULTURA

Sermos humanos é mais do que pertencermos a uma espécie de seres com uma determinada biologia e
estrutura corporal: depende da participação em contextos sociais e culturais particulares da nossa espécie,
onde aprendemos formas de ser e de nos comportarmos.
As capacidades dos seres humanos de transformar o meio onde vivem, adaptando-se a ele, levou à
construção de um mundo inter-humano, que constitui o seu ambiente de suporte e proteção, e das suas
formas de vida.
Fatores importantes no processo do tornar-se humano:
- As características dos seres humanos são as capacidades para produzir e lidar com símbolos e para criar e
servir-se de instrumentos;
- Estas competências específicas, possibilitadas pela rede neuronal complexa do cérebro, desenvolvem-se no
convívio com as outras pessoas, através de aprendizagens feitas com os outros;
A sociabilidade torna-se uma necessidade radical, pois é na interação com os outros que adquirimos
condutas capazes de compensar a pobreza biológica da espécie humana, desprovida de instintos.
Para além da estrutura anatómica e fisiológica, herdamos a abertura aos outros -> Ser humano como animal
gregário.
Existe no ser humano uma predisposição genética para a sociabilidade, relacionando-se com outras
predisposições inatas presentes logo à nascença:
- Competências percetivas (órgãos sensoriais para captar o mundo, mediante estímulos visuais, auditivo,
tácteis, olfativos, etc.)
- Competências cerebrais (maturação pré e pós-natal dos mecanismos corticais em correlação com o
desenvolvimento de uma rede complexa de neurónios, que permite a manifestação de capacidades
especificamente humanas)
- Competências simbólicas (entre as capacidades no património hereditário, existe a predisposição para a
criação de sistemas linguísticos, essencial para a interação)
- Competências relacionais (Predisposição para se relacionar com os outros)
Estas capacidades não são entregues de modo acabado, necessitando de um meio social propício ao seu
desenvolvimento.
O caso das “crianças selvagens” mostra que o ser humano só consegue completar a sua natureza no convívio
com os outros, pois ao tentar reeducá-las, só se conseguiram resultados parciais, visto que o
desenvolvimento das potencialidades hereditárias ficou comprometido devido à ausência de estimulação
social e humana durante os primeiros tempos de vida, que são os mais importantes.
O desenvolvimento social ocorre através de dois aspetos:
- Integração – O desenvolvimento social permite que o individuo se integre num grupo, ajustando as suas
condutas às regras sociais.
- Diferenciação - O desenvolvimento social permite que o indivíduo construa a sua identidade de modo
único, cujas experiências pelas quais ele passa irão moldar.

A cultura é uma herança social constituída por condutas, ideias, costumes, sentimentos, atitudes e tradições
comuns a um grupo social que vão sendo transmitidos às gerações seguintes. É uma totalidade em que se
conjugam, de forma dinâmica, diversos elementos materiais e simbólicos: conhecimentos, crenças, valores,
leis e normas, formas de arte e expressão, costumes e práticas sociais, assim como objetos e construções
produzidas.
A cultura tem uma profunda influência na forma como cada um pensa, sente e se comporta. Não somos,
todavia, produtos diretos dessas influências culturais: somos também produtores de cultura, agentes da sua
construção, transmissão e transformação.
Todas as comunidades humanas possuem cultura. As culturas refletem as diferentes maneiras como as
diversas comunidades se organizaram e integraram os acontecimentos da sua história, as suas necessidades
de sobrevivência e as exigências do meio onde vivem, em formas de ser e viver em conjunto.
Padrão cultural é o conjunto de práticas, crenças e valores comuns aos membros de uma cultura, às formas
particulares e padronizadas de ser e viver de uma comunidade ou grupo social específico.
O facto de as comunidades obedecerem a padrões culturais contribui para homogeneizar as pessoas dentro
de uma cultura, diferenciando-as das pessoas de outras culturas. Cada cultura tem um lugar geográfico,
social e histórico próprio e, consequentemente, os membros que lhe pertencem apresentam formas de
conduta específicas.
Os padrões culturais facilitam a adaptação dos indivíduos à comunidade e são úteis pelo seu poder preditivo,
pois antecipam-nos acerca dos hábitos, gostos, preferências da sociedade em que vivemos, permitindo que
atuemos de acordo com o que ela espera de nós;
Um padrão cultural não é uma realidade estática: cada padrão cultural encontra-se em constante mudança,
não só pela ação criadora, produtora de cultura de cada um dos seus membros, mas também através do seu
contacto com outras culturas.
A aculturação é o conjunto dos fenómenos resultantes do contacto contínuo entre grupos de indivíduos
pertencentes a diferentes culturas, assim como as mudanças que dele decorrem nos padrões culturais de
ambos os grupos.
Cada padrão cultural ajuda a definir as expetativas comportamentais que podem ser encontradas numa
determinada comunidade. Os padrões de cultura permitem prever, até certo ponto, os comportamentos
daqueles o partilham.
A socialização é um processo dinâmico de integração de um indivíduo numa dada cultura ou grupo social.
Refere-se às formas como a pessoa interioriza e aprende os elementos socioculturais e como vai adquirindo
as atitudes, as crenças e os valores mais significativos dessa cultura e assumindo-os como seus.
O indivíduo faz uma aprendizagem dos traços da cultura da sociedade em que vive. É um processo de
interiorização de atitudes, costumes, valores, normas e modos de agir característicos de uma comunidade,
que tendem a ser reproduzidos pelas gerações seguintes.
Esta socialização é feita de forma espontânea e ocorre ao longo de toda a vida: diferentes acontecimentos,
contextos e tipos de relações exigem às pessoas novas adaptações, novas aprendizagens e a criação de novas
formas de ser.

Distingue-se:
- socialização primária: ocorre fundamentalmente durante a infância e a adolescência, tem por objetivo a
aquisição de um conjunto de hábitos necessários para uma adaptação às mais diversas situações da vida (Ex.
hábitos de alimentação, habituação no domínio da linguagem);
- socialização secundária: ocorre ao longo de toda a vida, quando temos que nos adaptar a novas situações e
adotamos novas atitudes e comportamentos, que nos permitem continuar a viver integrados na comunidade;
ocorre quando existem alterações significativas na condição social das pessoas (entrada no mundo do
trabalho, mudança de estado civil)
Apesar da sua influência mútua e fundamental, aquilo que nos tornamos a cada momento das nossas vidas
não é só determinado pelo que somos em termos físicos e biológicos nem pelo que nos rodeia em termos
socioculturais.
É necessário ter em conta a autonomia e a auto-determinação dos seres humanos e rejeitar a possibilidade
de um determinismo, seja biológico ou cultural, quando se procura conhecer a forma como cada um de nós
sente, pensa e age.

A história pessoal como um contínuo de organização entre fatores internos e externos


O ser humano possui:
- Identidade específica – permite que nos vejamos como pertencentes à espécie humana, graças aos
carateres que nos assemelham, mas que nos distinguem das outras espécies;
- Identidade sociocultural –torna-nos semelhantes aos seres humanos da nossa cultura, através de um
conjunto de normas e padrões que nos distanciam das outras culturas;
- Identidade individual – leva-nos a pensar em cada um de nós como um ser único, dotada de carateres que
nos diferenciam de todos os demais.
É enquanto corpo biológico e social que encontramos significados para os nossos pensamentos, emoções e
ações, e participamos na sua determinação: de nós próprios e dos contextos em que vivemos.
Tudo o que nos acontece ao longo da vida, positivo ou negativo, vai deixando marcas na nossa forma de ser.
As experiências dependem do caráter subjetivo com que cada um as vive e por isso, fazemos uma
interpretação que mais ninguém pode fazer, em virtude da projeção do nosso universo psicológico sobre as
situações, tornando-as vivências exclusivas.
Todos os episódios marcantes são interiorizados, passando a integrar a nossa identidade.
Pode dizer-se que a experiência do mundo, dos outros de nós mesmos é um elemento fundamental da vida
psicológica. A ligação que cada um estabelece com estas experiências faz-se através do significado.
É no significado atribuído que se realiza a síntese entre a singularidade de cada um e a sua situação ou
contexto: físico, biológico, sociocultural e histórico.
A realidade que cada um vive não é só física, mas também uma realidade interpessoal, construída a partir de
compreensões partilhadas e comunicadas entre as pessoas.
A história de cada um escreve-se num diálogo entre o que cada um é em cada momento, a forma como
compreende o que acontece e o significado que cada experiência adquire.
A história pessoal desenrola-se no diálogo entre o que percebemos (objetivamente) de nós, dos outros, do
mundo, do que os outros percebem e o que (subjetivamente) construímos – acerca de nós, dos outros e do
mundo.
Os seres humanos são auto-organizados, isto é, são seres que organizam eles próprios o seu fluxo de
experiências e o tornam compreensível. É dessa forma que se constroem, agindo no mundo, organizando-se
a si mesmos no seu envolvimento com o mundo.
Nas suas atividades, histórias, e na teia das suas relações e interações, as pessoas são agentes não só da
transformação de si e dos outros, mas também agentes de transformação das suas comunidades, sociedades e
culturas.
Autoorganizando-se, a pessoa vai construindo a sua identidade de modo autónomo; tal construção é feita
com ajuda das situações por que passa e dos acontecimentos que vivencia, deixando sinais que ficam a fazer
parte integrante do eu. É na interação com os outros que cada um desenvolve a sua identidade, a par da
interiorização dos modos de ver, pensar, sentir e agir dos grupos com que interage.
A adaptação dos seres humanos não pode ser encarada de uma forma passiva, como se fosse resposta a uma
ordem e a um ambiente preexistentes. O seu papel é ativo no que diz respeito à sua participação nos
ambientes e às suas capacidades de auto-organização e autonomia.
Pelo facto de nos desenvolvermos no interior de uma cultura em que vigoram padrões, normas, crenças e
valores, o meio social torna-se um condicionamento significativo na formação psicológica, social e moral do
nosso eu; nós, seres ativos que produzimos cultura, somos simultaneamente por ela produzidos.
A relação dialética entre ser vivo e ambiente leva a que, o processo de adaptação, resulte do desenrolar de
múltiplas histórias evolutivas. Aí reside o caminho de mudança e transformação, quer dos seres humanos,
quer dos seus contextos de vida.
O ser humano partilha um conjunto de características próprias da espécie: locomoção bípede, polegar
oponível, cérebro muito desenvolvido. (hereditariedade específica)
A hereditariedade individual assegura que somos únicos, dotados de um património genético único.
(diversidade biológica).
Desde o nascimento que se fazem sentir os efeitos do meio através das diferentes expressões culturais.
É no contexto das relações com o meio, com uma determinada sociedade e cultura, que cada ser humano se
desenvolve com características próprias (diversidade cultural).
É na confluência da biologia (património genético) e da cultura (influência social) que cada ser humano se
auto-organiza.
Ao acumular e ordenar de experiências vividas, ao atribuir e organizar os significados ao que vai
acontecendo, cada ser humano constrói a sua história pessoal (diversidade individual)
É na diversidade, na diferença de cada um a realizar e organizar as várias dimensões que reside a riqueza do
ser humano.
A diversidade humana é fator de aprendizagem, o convívio com pessoas diferentes multiplica as hipóteses
de novas aprendizagens, fator de abertura e tolerância, à descoberta de valores diferentes dos nossos; fator
de desenvolvimento intelectual e fator de progresso cultural, porque possibilita a renovação das culturas.

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