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Cooperação Intersetorial e Responsabilidade Social: Do Discurso a

Ação na Geração de Trabalho no Turismo!


Marialva Tomio Dreher1
Rachel Aparecida de Oliveira Rueckert2
Universidade Regional de Blumenau – FURB
Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC

Resumo: Este estudo descreve, numa leitura crítica, o processo de cooperação


intersetorial que ocorre entre a Universidade Regional de Blumenau (FURB), a
Fundação Fritz Muller (FFM) e o Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares
de Blumenau e Região (SIHORBS) na promoção das parcerias para a disseminação da
Responsabilidade social no turismo da região. Para isso, analisou-se por meio do
método qualitativo e metodologia descritiva, o projeto de extensão na área de
responsabilidade social, que visa à inserção de jovens no mercado de trabalho turístico
na região de Blumenau (SC). Os resultados evidenciam que a cooperação intersetorial é
uma estratégia que pode contribuir, pelas ações de responsabilidade social, na formação
profissional, provocando a inserção de jovens em atividades de início de carreira,
evidenciadas nas demandas das organizações turísticas da região.

Palavras-chave: Intersetorialidade; Responsabilidade Social; Turismo.

Introdução

O turismo difere de outras atividades produtivas em que um produto pode ser


consumido isoladamente, por isso estimula o desenvolvimento de várias atividades
econômicas (entretenimento, comércio, transporte, hospedagens, agências de viagens,
artesanato, serviços de apoio e equipamentos), além do desenvolvimento de infra-
estrutura (estradas, aeroportos, saneamento, energia, etc.). Desse modo, o turismo é
dependente da cultura e do ambiente sustentável, da geração de renda e da criação de
emprego local. (CUNHA; CUNHA, 2005). De acordo com Dreher (2010), o

1
Professora do Curso de Turismo e Lazer e Pesquisadora dos Programas de Pós-graduação Mestrado em
Administração e Doutorado em Ciências Contábeis e Administração da Universidade Regional de Blumenau-FURB.
marialva@furb.br
2
Professora do Curso de Turismo e Lazer da Universidade Regional de Blumenau – FURB, Doutoranda em
Geografia pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. racheloliveira@terra.com.br
desenvolvimento local da atividade turística sugere cooperação entre os setores público,
privado e terceiro setor (intersetorial) para a formação de trabalhadores qualificados,
empregando os residentes das próprias localidades turísticas, como forma de valorizar o
capital social.

A atividade turística pode contribuir, tanto para a melhoria da qualidade de vida das
comunidades, como também, para a qualificação dos serviços prestados. No entanto,
torna-se necessário que ações sejam direcionadas para tal fim. Neste sentido, observa-se
que o crescimento da atividade turística tem apresentado, comumente, alguns gargalos
exigindo a atenção dos agentes deste setor. Um exemplo é a carência na oferta de mão-
de-obra qualificada. Na região do município de Blumenau (SC), reconhecida
turisticamente, tal realidade é notória. Há um déficit referente à demanda de empregos
em cargos operacionais, tanto nos meios de hospedagem como na área de alimentos e
bebidas (A&B).

Não é foco deste estudo uma análise pormenorizada das razões pelas quais ocorre tal
fato, e sim, que ações estão sendo realizadas para resolver ou amenizar tal dificuldade.
Cabe aqui destacar que a Universidade Regional de Blumenau – FURB localiza-se neste
município e oferece desde 1998 o Curso de graduação em Turismo e Lazer. Insere-se
neste contexto um grupo (docentes e discentes) que vem desenvolvendo pesquisas e
extensão em parceria aos Programas de Pós-Graduação stricto sensu em Administração
com as organizações do Núcleo de Responsabilidade Social da Associação Comercial e
Industrial de Blumenau (Núcleo RS/ACIB) e organizações públicas, terceiro setor e
privadas envolvidas com o desenvolvimento do turismo regional. Destes movimentos e
experiências surgiu à oportunidade de conduzir um projeto de extensão que contribuísse
com as demandas da sociedade e do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e
Similares da região de Blumenau (SIHORBS) e suas organizações conveniadas, para a
geração de trabalho no turismo, como um ato condizente com as ações de
responsabilidade social que vem sendo discutidas na região.

Surgiu, após varias discussões em conjunto, o projeto de extensão intitulado


Responsabilidade Social na Interação da Universidade com as Organizações Turísticas:
Esforços na formação e inserção de Jovens no Mercado de Trabalho na Região de
Blumenau (SC), sendo a concepção e condução deste, o objeto de estudo deste artigo.
Este projeto busca oferecer a comunidade regional possibilidades de adequação da
demanda turística com a oferta de serviços. Sobretudo, na área de hotelaria e
restaurantes, pretendendo unir esta intenção com a contribuição social pela inclusão de
jovens no mercado de trabalho turístico. O foco centraliza-se no desenvolvimento de
novas habilidades ou competências específicas para estes jovens.

Faz-se mister destacar que, como forma de responsabilidade social, muitas organizações
turísticas vêm desenvolvendo atuações para fomentar a participação da sociedade
regional na geração de trabalho e renda por meio do turismo. No entanto, este é um
desafio que remete a necessidade de preencher as vagas de emprego, mas ao mesmo
tempo de oferecer serviços de qualidade e, ainda, promover o capital social local. Nesta
complexidade surge a seguinte pergunta de pesquisa que este estudo pretende
responder: Como as relações intersetoriais podem cooperar com a inserção de novos
trabalhadores no turismo da região de Blumenau, numa perspectiva inerente as
propostas da responsabilidade social? Desse modo, o objetivo que norteou este estudo
foi: descrever como ocorre a cooperação intersetorial entre a universidade e as
organizações turísticas da região de Blumenau (SC) num projeto coletivo de
responsabilidade social que visa à inserção de jovens de escolas públicas no mercado de
trabalho turístico.

Na busca da compreensão da problemática e na tentativa de responder ao objetivo


proposto apoiou-se no método qualitativo e na metodologia descritiva no
desenvolvimento deste estudo. Assim sendo, buscou-se retratar os esforços da
cooperação intersetorial que ocorre entre as parceiras desta ação: Universidade Regional
de Blumenau (FURB), a Fundação Fritz Muller (FFM) e o Sindicato de Hotéis,
Restaurantes, Bares e Similares de Blumenau e Região (SIHORBS) para a disseminação
da Responsabilidade social no turismo da região.

O diálogo entre os parceiros do projeto analisado demonstra que os novos trabalhadores


estão envolvidos em formações de recepcionista, garçom, governança e mensageiro,
demandas decididas coletivamente, que pudesse vislumbrar a real inserção nas vagas de
trabalho atualmente não preenchidas. A participação da universidade é vista conforme
Rapini (2007), não como apenas responsável pelo treinamento, mas como fornecedora
do conhecimento crucial para a evolução de alguns setores, permanecendo como fonte
crucial e primordial na geração de conhecimento.

Ressalta-se que a relevância deste estudo se dá a partir do momento em que descreve


um projeto de responsabilidade social, que representa um esforço intersetorial o qual
pretende valorizar a participação da sociedade na relação com o turismo. No entanto,
representa uma leitura critica que vislumbra a possibilidade de “exploração” dos jovens
como mão-de-obra “barata”. Ao mesmo tempo esta união e cooperação intersetorial
poderá resultar numa real inclusão, visto que haverá uma valorização dos atores (os
jovens) envolvidos neste projeto. Importante destacar o papel da Universidade neste
contexto visto que o direcionamento dos discentes envolvidos nesta ação contribui para
o desempenho de seu papel como cidadão antes do seu papel de profissional, bem como
a possibilidade de ampliarem seus currículos com a participação em trabalhos de cunho
social.

Responsabilidade Social: Desafios e Perspectivas

A temática da Responsabilidade Social (RS) ganhou destaque principalmente no final


do século XX, cenário no qual as organizações passaram a enfatizar com muito mais
afinco as preocupações sócio-ambientais. Uma das principais finalidades da RS é a
mudança no modo de administrar os relacionamentos interpessoais e intersetoriais, uma
vez que é fundamentada em decisões éticas para benefícios coletivos. Em muitos casos,
no sentido de atuação nas organizações o termo da RS pode ser adjetivado com
corporativo (RSC) e/ou empresarial (RSE), porém, neste estudo, adota-se o mesmo
sentido sem adjetivação somente como Responsabilidade Social (RS). (DREHER,
2010).

Félix (2003) afirma que a mudança de comportamento, por parte das organizações, se
deu por um conjunto de fatores históricos, que correlacionados e paralelos, contribuíram
para atitudes de responsabilidade social. Em primeiro lugar, a globalização,
caracterizada por um processo de encurtamento das distâncias, imprimiu um aumento
do fluxo do comércio internacional e das atividades financeiras, o que fortaleceu as
organizações não-estatais. Essa mudança fez com que o Estado perdesse o controle dos
processos e, passasse a se concentrar na garantia da estabilidade econômica interna, em
detrimento das políticas públicas de caráter social. Se por um lado, o Estado deixa sua
posição de propiciador do bem-estar e realizador de políticas de cunho social, por outro
lado, as organizações de interesse privado percebem que são, em parte, responsáveis
pela situação de exclusão e injustiça social. A globalização, portanto, na medida em que
influencia na evolução das tecnologias de informação, influi na conduta destas
organizações, já que seus atos passam a ser cada vez mais públicos, o que demanda um
cuidado maior com a imagem transmitida para a sociedade.
O Instituto Ethos (2010) afirma que, a RS está relacionada com a ética e a transparência
na gestão dos negócios, e deve refletir-se nas decisões cotidianas, que podem causar
impactos na sociedade, no meio ambiente, e no futuro dos próprios negócios. Dizem
respeito à maneira como as organizações realizam seus negócios, os critérios que
utilizam na tomada de decisões, e suas prioridades e relacionamento com os públicos
que interagem.

A idéia básica da RS é que a organização e a sociedade estão entrelaçadas, ao invés de


estarem separadas, portanto, a sociedade possui expectativas sobre o comportamento
empresarial e seus resultados. Entretanto, existem alguns princípios específicos nesta
relação gerados em relação às expectativas: a expectativa depositada em todas as
organizações devido ao seu papel enquanto instituições econômicas; a expectativa
depositada nas organizações sobre o que elas são e o que elas fazem; e as expectativas
depositadas nos gestores como atores morais das empresas. Estas expectativas geram
três níveis de análises distintas em relação a RS: institucional (princípio da
legitimidade), organizacional (princípio da responsabilidade pública) e individual
(princípio da prudência gerencial). O princípio da legitimidade refere-se ao poder e
legitimidade que a sociedade confere à organização e seus negócios; o princípio da
responsabilidade pública expõe que as organizações são responsáveis pelos resultados
gerados na sua relação com a sociedade; o princípio da prudência gerencial expõe que
os gestores são agentes morais, obrigados a serem prudentes nos negócios, a fim de
obter resultados responsáveis. Baseado nestes princípios é possível avaliar a RS nos
processos organizacionais como: diagnóstico ambiental, a gestão da relação com os
stakeholders e a gestão de questões sociais (WOOD, 1991).

Neste ínterim pode-se reportar a Friedman (1970) que apresenta um posicionamento


numa linha contraditória baseado nos preceitos de que a direção corporativa, como
agente dos acionistas, não tem o direito de fazer nada que não atenda ao objetivo de
maximização dos lucros, mantidos os limites da lei. Agir diferente é uma violação das
obrigações morais, legais e institucionais da direção da corporação. Este autor esclarece
que “É claro que, na prática a doutrina da responsabilidade social é freqüentemente um
pretexto de ações que são justificadas por outros motivos e não uma razão para essas
ações. (FRIEDMANN, 1970, p.5). Porter; Kramer (2002) ao analisarem tal
posicionamento de Friedmann (1970) destacam a importância de se alinhar as metas
econômicas e sociais da empresa. Dreher, Souza e Noriler (2006) explicam que a
responsabilidade social abrange toda a sociedade e suas organizações, por meio de todos
os sujeitos que nela atuam. Devido a isso, muitas organizações têm se preocupado com
essa questão; entre elas, as organizações empresariais. A responsabilidade social discute
e trabalha nas relações das empresas com a minimização de demandas sociais nas mais
variadas áreas, como: ambiente, saúde, inserção social, conflitos raciais, fome, educação
entre outras que assolam a sociedade contemporânea. Neste estudo o foco ocorre na
educação profissional.

Diante dessa complexidade, pode-se assim, inferir que em geral, não há definições
precisas para o termo responsabilidade social, possibilitando, posicionamento e
conhecimentos teóricos com diferentes conceituações. Num posicionamento crítico, é
vista como obrigação social (FRIEDMAN, 1970); como tambem, como aprovação
social (DAVIS e BLOOMSTROM, 1975); e ainda, como abordagem sistêmica perante
os stakeholders (ZADEK, 1998). Por isso, independente do setor, a responsabilidade
social pode ser traduzida como um meio de minimizar as distâncias históricas
construídas entre as organizações, a sociedade e o ambiente.

A intersetorialidade como estratégia para a Responsabilidade Social

Desenvolver estratégias para amenizar ou sanar os problemas sociais tornou nos dias de
hoje, uma questão de sobrevivência. Neste sentido Dowbor (2002, p.33) enfatiza que
diante das novas tecnologias, da ampliação da urbanização e conseqüente
complexificação dos problemas sociais, é redefinido em profundidade as funções dos
espaços sociais e econômicos. Neste contexto, destacam-se as ações de
intersetorialidade como um modelo capaz de contribuir para amenizar estas
problemáticas.

Verifica-se que há diferentes conceituações para o termo intersetorialidade. Em muitos


casos percebe-se a utilização de expressões tais como parcerias, cooperação,
colaboração, alianças entre tantas outras para designar atividades que proporcionam
benefícios mútuos. Mas o que há de comum nestes termos? É possível perceber que
além da complexidade que o próprio tema propõe há uma clarividência que os tipos de
ações intersetoriais são tão variados como o são suas interpretações e que as
dificuldades para classificar e construir definições são as mesmas encontradas em
muitos outros termos. Neste trabalho optou-se pela adoção do termo intersetorialidade
como a “articulação de saberes e experiências para a solução sinérgica de problemas
complexos.” (INOJOSA, 2001, p.103).

Fischer (2002) demonstra que pesquisadores de diversas partes do mundo estão


percebendo a importância deste fenômeno e começam a estudar os diferentes
acontecimentos de parcerias em suas regiões, e quais as implicações que elas trazem
para a complexa relação entre Estado, Mercado e Terceiro Setor.

A intersetorialidade ganhou destaque no Brasil a partir da década de 90, quando a


globalização e a queda de barreiras protecionistas fizeram com que os empresários e
pesquisadores percebessem o benefício mútuo que poderia advir da interação entre
empresas e universidades (IBICT, 1998). Vale destacar que “para o campo das
organizações o que se quer, muito mais do que juntar setores é criar uma nova dinâmica
para o aparato governamental, com base territorial e populacional.” (INOJOSA, 2001,
p.105).

Segundo Junqueira (2004, p.25) as ações de intersetorialidade permitem integrar


saberes, experiências e organizações que atuam nas políticas públicas proporcionando
também, a constituição de redes sociais. Esta ação constitui-se como uma possibilidade
de gerir problemas que incidem sobre uma mesma população que ocupa um
determinado território. Na prática, essas articulações dependem de uma relação
dialógica que irão estabelecer acordos de cooperação, alianças e reciprocidade entre os
atores envolvidos. É possível ainda ressaltar que a gestão intersetorial “ocasiona a
criação de respostas novas aos problemas sociais, tornando mais eficaz à gestão social,
que se caracteriza por ser intersetorial, articulando instituições e pessoas para
construírem projetos, recuperar a vida e a utopia.” ( JUNQUEIRA, 2004, p.30).

Austin (2001, p. 22) tem uma opinião reservada sobre esta questão. Primeiro ele nos diz
que “diferentes forças estão criando um ambiente propício à colaboração intersetorial
para a atuação social”. Em seguida destaca que no nível macro, a necessidade de
cooperação deriva de mudanças estruturais, geradas por forças políticas, econômicas e
sociais. Neste sentido, vem tornando-se cada vez mais difícil que soluções sustentáveis
sejam encontradas isoladamente. Tal posicionamento pode ser reforçado com Fischer ao
afirmar que tais ações podem se constituir em um dos mais eficazes mecanismos de
garantia da sustentabilidade e eficácia das ações, integrando diversos agentes
econômicos no esforço do desenvolvimento social. (FISCHER, 2002, p. 28).
Por fim, é fundamental ressaltar que as ações de intersetorialidade consistem num
amplo contexto, em oportunidades e possibilidades de atuação para as organizações
envolvidas em processo coletivos de decisões. Isto não significa que o processo seja
simples ou unidimensional, pelo contrário, trata-se de uma ação abstrusa, na qual
emergem inúmeros desafios e empecilhos.

Metodologia da pesquisa

Neste artigo utilizou-se como método a pesquisa qualitativa e como metodologia a


descritiva. O método qualitativo se justifica, pois se pretende responder às questões
mais específicas, em contextos também mais determinados. Trata-se de uma pesquisa
caracterizada pela interação entre pesquisadores e membros das situações investigadas,
envolvendo posições valorativas. De acordo com Goldenberg (2001) os métodos
qualitativos enfatizam as particularidades de um fenômeno em termos de seu
significado é como um mergulho em profundidade dentro de um grupo “bom para
pensar” questões relevantes para o tema estudado. A contribuição da metodologia
descritiva amplia a possibilidade de entendimento, para Dencker (1998), a pesquisa
descritiva utiliza técnicas padronizadas de coletas de dados e sua forma mais comum de
apresentação é o levantamento.

A população envolvida foram os oito integrantes do projeto estudado. Os procedimentos


de coleta de dados envolveram análise documental (atas, relatórios, e anotações de
relatos etc.) e entrevista informal aplicada aos atores envolvidos na condução do
projeto, bem como a observação in loco das ações realizadas pela equipe do projeto. A
análise dos dados foi amparada pela abordagem qualitativa e representada pela técnica
descritiva dos dados. Procurou-se desta maneira, preparar os dados para que de modo
ordenado pudessem apresentar uma melhor compreensão do problema desta pesquisa e
responder seu objetivo.

Do discurso a Ação na Geração de Trabalho no Turismo na região de Blumenau

A região de Blumenau (SC) localiza-se no interior de Santa Catarina e está dividida, de


forma política e geográfica, em nove municípios. Porém, o recorte deste estudo foi
composto somente pelos municípios de Blumenau, Gaspar e Pomerode, inseridos no
Roteiro turístico integrado do Vale Europeu. Esta região recebe considerável número de
turistas durante o ano, no entanto, apresenta-se, como em boa parte dos municípios
brasileiros, em fase de desenvolvimento o que leva os diferentes atores envolvidos com
o setor buscarem freqüentemente ações para adequar as deficiências que vão se
apresentando. Uma destas necessidades que o Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares
e Similares da região de Blumenau (SIHORBS) já vinha atuando diz respeito à
insuficiência de mão-de-obra qualificada em setores operacionais da hotelaria e da área
de alimentos e bebidas (A&B). Foi a partir desta demanda que emergiu o diálogo de
formação profissional nas discussões dos projetos de responsabilidade social que vem
sendo desenvolvidos na região.

A partir disso, a proposta envolveu a Universidade Regional de Blumenau (FURB), o


SIHORBS e a Fundação Fritz Muller (FFM) que fomentou a proposta por meio de
incentivo financeiro em um edital público de pesquisa e extensão. Deste modo, foi
possível organizar o projeto intitulado “Responsabilidade Social na Interação da
Universidade com as Organizações Turísticas: Esforços na formação e inserção de
Jovens no Mercado de Trabalho na Região de Blumenau, SC”. As intenções
convergiam com os interesses das organizações e atores envolvidos, cujo objetivo maior
atendia aos princípios de responsabilidade social para sanar os diferentes problemas
percebidos, dentre os quais, o alto número de jovens desempregados ou em necessidade
do primeiro emprego.

A pesquisa “Juventude e Políticas Sociais no Brasil” realizada pelo Instituto de Pesquisa


Econômica Aplicada (CASTRO; AQUINO, 2008) demonstra que os brasileiros de 15 a
24 anos representam quase a metade das pessoas sem emprego no Brasil. Entre os dez
países pesquisados, o Brasil é o que apresenta a maior taxa de jovens desempregados,
com 46,6%. Neste estudo foi verificado, também, que o desemprego entre os jovens
brasileiros é 3,5 vezes maior que entre os adultos acima dos 24 anos. Um dos fatores
relaciona-se ao fato das empresas optarem sempre por demitir os trabalhadores mais
jovens que, além do baixo custo, são considerados menos “essenciais” por causa da falta
de experiência. Uma preocupação importante deste contexto deve-se ao fato de que o
desemprego juvenil contribui, muitas vezes, para o aumento da violência, o consumo de
drogas, a prostituição e a ampliação da pobreza, tornando-se um grande problema
social.

Ora, se há essa defasagem de emprego, por outro lado, existe na região o superávit de
oferta de empregos na área da hotelaria e A&B. Assim, o que o projeto de extensão aqui
estudado propõe numa ação de responsabilidade social é a oferta de cursos gratuitos –
nas áreas de governança, garçom, recepcionista e mensageiro, com o objetivo posterior
de inserção dos jovens no mercado turístico como mais uma possibilidade de inclusão
social. Para tanto, priorizou-se a participação de jovens estudantes de colégios públicos,
considerados mais pobres do ponto de vista do acesso a educação, ou ainda estes
estudantes desempregados.

A união entre formação qualificada e inclusão no mercado de trabalho turístico é um


fenômeno que a região de Blumenau tenta equilibrar nos esforços cotidianos e, pode ser
vislumbrada nas propostas que a responsabilidade social sugere. Por isso, esta proposta
de integração entre as políticas de formação profissional, às políticas de intermediação
de mão-de-obra, em parceria com o Sindicato (SIHORBS) poderia facilitar a
contratação, pelo mercado de trabalho, do jovem ao final da formação para as atividades
de governança, garçom, recepcionista e mensageiro.

Desse modo, até o presente momento, 29 escolas públicas e uma estimativa de 1260
alunos de 15 a 24 anos de vários bairros da região (Blumenau, Gaspar e Pomerode)
foram envolvidos na divulgação dos cursos de formação propostas pelo projeto. Esta
atividade foi realizada pela equipe formada por oito integrantes que visitou todas estas
escolas e informou os detalhes necessários a oferta e construção dos trabalhos teóricos e
práticos oferecidos nos cursos de formação.

Durante a divulgação percebeu-se que, do ponto de vista dos alunos das escolas
visitadas, os fatores considerados negativos nas funções a serem desenvolvidas pelo
projeto e no mercado turístico após a formação foram: o horário integral de trabalho, a
dedicação as empresas nos finais de semana, bem como, o caráter “serviçal” que as
atividades contemplam. Um exemplo citado num relato foi: “trabalhar no turismo é
difícil, pois um restaurante não fecha aos finais de semana... Tenho que trabalhar
domingo, geralmente das 18h00min ás 04h00min ou até mesmo até o último cliente
sair”. Estas questões foram percebidas com surpresa para a equipe que desenvolve o
projeto, uma vez que a população estudantil envolvida é na maioria pobre e
desempregada. Outro relato intrigante foi: “não desejo ser faxineira de hotéis”. Nessas
observações foi verificado que o fator salário não foi objeto de reclamação.

Nesse contexto, foram realizadas somente 65 inscrições e foram formados até o presente
momento apenas 41 alunos, ressaltando que haverá só mais uma oferta de curso com 30
vagas. Comparado ao número de envolvidos (1260) na divulgação verifica-se um
alarmante baixo interesse de atuação no turismo por parte dos jovens das escolas
públicas da região de Blumenau. Em muitas (60%) escolas públicas visitadas houve a
participação dos professores e diretores como um incentivo a participação dos alunos
ressaltando as oportunidades oferecidas pelo projeto, como no relato de uma diretora:
“Gente é de graça, será parte do seu currículo, uma chance de emprego”. Contudo, em
outras (30%) não foi possível nem conversar com os alunos apenas houve entrega do
material de divulgação. Este fato foi alegado, conforme exemplificado em um relato de
um diretor: “a oferta de cursos atrapalha a condução da aula pelos professores”. Mesmo
havendo agendamento antecipado, isso atrapalhou o contato para esclarecimento de
dúvidas e até mesmo para valorizar a proposta. Quanto à temática das escolhas pelos
cursos, a maioria optou pela formação em recepcionista seguida por garçom,
governança e mensageiro. Devido a este resultado o último curso a ser ofertado será em
recepcionista e o público alvo será os alunos de escolas públicas constantes no cadastro
socioeconômico das prefeituras dos três municípios.

Durante o processo, ocorreu outro acontecimento interessante, houve três (3) alunos
inscritos de escolas particulares que souberam dos cursos por intermédio dos cartazes e
divulgação em rádio e TV, e solicitaram participação. Como havia vagas disponíveis
não preenchidas pelos alunos das escolas públicas, houve aceitação dessas inscrições,
visto que a turma não estava completa. O maior motivo dessa demanda foi o grau de
interesse dos solicitantes em atuar nessas áreas em momentos de intercâmbio, ou seja,
em outros locais inclusive no exterior, conforme relato de um aluno: “no exterior uma
formação como esta é valorizada e um garçom é muito mais valorizado pelas gorjetas”.

De um modo geral, o processo foi conduzido de maneira adequada a sua proposta,


oferecendo um viés de compromisso social com a comunidade regional, mas vinculado
também as necessidades das organizações turísticas.

Esta união entre as organizações numa cooperação intersetorial ordenada para a


minimização dos problemas sociais dos jovens é um resultado que merece destaque
numa sociedade que carece de discussões coletivas e de participação da sociedade na
solução dos seus problemas. É necessário, portanto, valorizar o resultado deste projeto
como uma transformação social, porem embrionária que gera reflexões no modo como é
conduzido o desenvolvimento do turismo, em especial com relação aos atores
envolvidos no processo. Surgem algumas questões pertinentes: A comunidade estará
disposta a trabalhar com o turismo? As empresas turísticas consideram os fatores desejo
e motivação na oferta das vagas e na evolução das carreiras? Estas questões remetem ao
fato de que a responsabilidade social, na sua essência, permeia a valorização dos
sujeitos no desenvolvimento como uma legítima inserção social.

Considerações finais

Este estudo descreveu por meio de uma abordagem qualitativa descritiva um esforço
intersetorial que ocorre na região de Blumenau para formar novos trabalhadores no setor
turístico. Além disso, por meio da análise de um projeto de extensão efetivado pela
Universidade Regional de Blumenau (FURB), a Fundação Fritz Muller (FFM) e o
Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Blumenau e Região (SIHORBS)
verifica a intenção de inserção proposta neste projeto, baseada na responsabilidade
social pela inserção de jovens de escolas públicas como ingressantes no mercado de
trabalho do turismo.

Observou-se no decorrer desta pesquisa que este desafio foi iniciado com o propósito de
possibilitar a estes jovens uma chance de trabalho no turismo, bem como conciliar esta
oportunidade com as demandas ofertadas pelas organizações turísticas da região que
carecem de profissionais qualificados para atuarem neste setor. Isto é visto pelos
pesquisadores e parceiros como união em prol do diálogo dos diversos setores na
questão relativa ao desenvolvimento do turismo. A intenção não incide no
aproveitamento dos jovens como “mão-de-obra barata”, mas sim, como um movimento
articulado de valorização da sociedade local participante desse processo de
desenvolvimento. É óbvio que no início da inserção dos jovens, pela falta de
experiência no setor, os cargos ocupados são aqueles considerados como operacionais.

No entanto, como muitas outras formas de inserção no mercado de trabalho, este


aprendizado é visto como importante para o crescimento e conhecimento dos
profissionais, ou seja, conhecer detalhadamente as funcionalidades de uma empresa
turística. Alem disso, há na condução, como professores dos cursos oferecidos no
projeto estudado, turismólogos mestres recém formados nos cursos de pós-graduação
stricto sensu da região de Blumenau, que também são considerados como ingressantes
na carreira docente. Dessa maneira, verifica-se uma junção de novos aprendizados que
giram em torno das demandas do desenvolvimento turístico da região e abertura de
trabalho aos jovens envolvidos.
Pelo recorte proposto neste estudo pode-se afirmar que houve a cooperação intersetorial
entre as organizações parceiras que discutiram coletivamente as diretrizes das ações e
investiram no projeto com conhecimentos e recursos. Todavia, os resultados desse
movimento intersetorial provocaram satisfatoriamente a inserção social dos atores
locais, fato evidenciado no baixo número (41) de alunos que efetivamente concluiu os
cursos até o momento.

Decorre disto, a necessidade de novas investigações que possam ampliar o escopo de


compreensão desse fenômeno, em especial, é necessário verificar qual a razão de jovens
pobres e desempregados recusarem formação gratuita e chance de trabalho quase
imediata. Por fim, destaca-se que este movimento se trata de uma primeira ação
coletiva, envolvendo a Universidade, a FFM e o SIHORBS, na promoção de uma ação
de responsabilidade social relacionada à geração de trabalho nesta região. Acredita-se
que ao final dessa experiência será possível encaminhar novas propostas de ação, que
possivelmente poderão resultar em novas práticas de colaboração intersetorial nos
projetos de responsabilidade social.

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