Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Introdução
1
Professora do Curso de Turismo e Lazer e Pesquisadora dos Programas de Pós-graduação Mestrado em
Administração e Doutorado em Ciências Contábeis e Administração da Universidade Regional de Blumenau-FURB.
marialva@furb.br
2
Professora do Curso de Turismo e Lazer da Universidade Regional de Blumenau – FURB, Doutoranda em
Geografia pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. racheloliveira@terra.com.br
desenvolvimento local da atividade turística sugere cooperação entre os setores público,
privado e terceiro setor (intersetorial) para a formação de trabalhadores qualificados,
empregando os residentes das próprias localidades turísticas, como forma de valorizar o
capital social.
A atividade turística pode contribuir, tanto para a melhoria da qualidade de vida das
comunidades, como também, para a qualificação dos serviços prestados. No entanto,
torna-se necessário que ações sejam direcionadas para tal fim. Neste sentido, observa-se
que o crescimento da atividade turística tem apresentado, comumente, alguns gargalos
exigindo a atenção dos agentes deste setor. Um exemplo é a carência na oferta de mão-
de-obra qualificada. Na região do município de Blumenau (SC), reconhecida
turisticamente, tal realidade é notória. Há um déficit referente à demanda de empregos
em cargos operacionais, tanto nos meios de hospedagem como na área de alimentos e
bebidas (A&B).
Não é foco deste estudo uma análise pormenorizada das razões pelas quais ocorre tal
fato, e sim, que ações estão sendo realizadas para resolver ou amenizar tal dificuldade.
Cabe aqui destacar que a Universidade Regional de Blumenau – FURB localiza-se neste
município e oferece desde 1998 o Curso de graduação em Turismo e Lazer. Insere-se
neste contexto um grupo (docentes e discentes) que vem desenvolvendo pesquisas e
extensão em parceria aos Programas de Pós-Graduação stricto sensu em Administração
com as organizações do Núcleo de Responsabilidade Social da Associação Comercial e
Industrial de Blumenau (Núcleo RS/ACIB) e organizações públicas, terceiro setor e
privadas envolvidas com o desenvolvimento do turismo regional. Destes movimentos e
experiências surgiu à oportunidade de conduzir um projeto de extensão que contribuísse
com as demandas da sociedade e do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e
Similares da região de Blumenau (SIHORBS) e suas organizações conveniadas, para a
geração de trabalho no turismo, como um ato condizente com as ações de
responsabilidade social que vem sendo discutidas na região.
Faz-se mister destacar que, como forma de responsabilidade social, muitas organizações
turísticas vêm desenvolvendo atuações para fomentar a participação da sociedade
regional na geração de trabalho e renda por meio do turismo. No entanto, este é um
desafio que remete a necessidade de preencher as vagas de emprego, mas ao mesmo
tempo de oferecer serviços de qualidade e, ainda, promover o capital social local. Nesta
complexidade surge a seguinte pergunta de pesquisa que este estudo pretende
responder: Como as relações intersetoriais podem cooperar com a inserção de novos
trabalhadores no turismo da região de Blumenau, numa perspectiva inerente as
propostas da responsabilidade social? Desse modo, o objetivo que norteou este estudo
foi: descrever como ocorre a cooperação intersetorial entre a universidade e as
organizações turísticas da região de Blumenau (SC) num projeto coletivo de
responsabilidade social que visa à inserção de jovens de escolas públicas no mercado de
trabalho turístico.
Félix (2003) afirma que a mudança de comportamento, por parte das organizações, se
deu por um conjunto de fatores históricos, que correlacionados e paralelos, contribuíram
para atitudes de responsabilidade social. Em primeiro lugar, a globalização,
caracterizada por um processo de encurtamento das distâncias, imprimiu um aumento
do fluxo do comércio internacional e das atividades financeiras, o que fortaleceu as
organizações não-estatais. Essa mudança fez com que o Estado perdesse o controle dos
processos e, passasse a se concentrar na garantia da estabilidade econômica interna, em
detrimento das políticas públicas de caráter social. Se por um lado, o Estado deixa sua
posição de propiciador do bem-estar e realizador de políticas de cunho social, por outro
lado, as organizações de interesse privado percebem que são, em parte, responsáveis
pela situação de exclusão e injustiça social. A globalização, portanto, na medida em que
influencia na evolução das tecnologias de informação, influi na conduta destas
organizações, já que seus atos passam a ser cada vez mais públicos, o que demanda um
cuidado maior com a imagem transmitida para a sociedade.
O Instituto Ethos (2010) afirma que, a RS está relacionada com a ética e a transparência
na gestão dos negócios, e deve refletir-se nas decisões cotidianas, que podem causar
impactos na sociedade, no meio ambiente, e no futuro dos próprios negócios. Dizem
respeito à maneira como as organizações realizam seus negócios, os critérios que
utilizam na tomada de decisões, e suas prioridades e relacionamento com os públicos
que interagem.
Diante dessa complexidade, pode-se assim, inferir que em geral, não há definições
precisas para o termo responsabilidade social, possibilitando, posicionamento e
conhecimentos teóricos com diferentes conceituações. Num posicionamento crítico, é
vista como obrigação social (FRIEDMAN, 1970); como tambem, como aprovação
social (DAVIS e BLOOMSTROM, 1975); e ainda, como abordagem sistêmica perante
os stakeholders (ZADEK, 1998). Por isso, independente do setor, a responsabilidade
social pode ser traduzida como um meio de minimizar as distâncias históricas
construídas entre as organizações, a sociedade e o ambiente.
Desenvolver estratégias para amenizar ou sanar os problemas sociais tornou nos dias de
hoje, uma questão de sobrevivência. Neste sentido Dowbor (2002, p.33) enfatiza que
diante das novas tecnologias, da ampliação da urbanização e conseqüente
complexificação dos problemas sociais, é redefinido em profundidade as funções dos
espaços sociais e econômicos. Neste contexto, destacam-se as ações de
intersetorialidade como um modelo capaz de contribuir para amenizar estas
problemáticas.
Austin (2001, p. 22) tem uma opinião reservada sobre esta questão. Primeiro ele nos diz
que “diferentes forças estão criando um ambiente propício à colaboração intersetorial
para a atuação social”. Em seguida destaca que no nível macro, a necessidade de
cooperação deriva de mudanças estruturais, geradas por forças políticas, econômicas e
sociais. Neste sentido, vem tornando-se cada vez mais difícil que soluções sustentáveis
sejam encontradas isoladamente. Tal posicionamento pode ser reforçado com Fischer ao
afirmar que tais ações podem se constituir em um dos mais eficazes mecanismos de
garantia da sustentabilidade e eficácia das ações, integrando diversos agentes
econômicos no esforço do desenvolvimento social. (FISCHER, 2002, p. 28).
Por fim, é fundamental ressaltar que as ações de intersetorialidade consistem num
amplo contexto, em oportunidades e possibilidades de atuação para as organizações
envolvidas em processo coletivos de decisões. Isto não significa que o processo seja
simples ou unidimensional, pelo contrário, trata-se de uma ação abstrusa, na qual
emergem inúmeros desafios e empecilhos.
Metodologia da pesquisa
Ora, se há essa defasagem de emprego, por outro lado, existe na região o superávit de
oferta de empregos na área da hotelaria e A&B. Assim, o que o projeto de extensão aqui
estudado propõe numa ação de responsabilidade social é a oferta de cursos gratuitos –
nas áreas de governança, garçom, recepcionista e mensageiro, com o objetivo posterior
de inserção dos jovens no mercado turístico como mais uma possibilidade de inclusão
social. Para tanto, priorizou-se a participação de jovens estudantes de colégios públicos,
considerados mais pobres do ponto de vista do acesso a educação, ou ainda estes
estudantes desempregados.
Desse modo, até o presente momento, 29 escolas públicas e uma estimativa de 1260
alunos de 15 a 24 anos de vários bairros da região (Blumenau, Gaspar e Pomerode)
foram envolvidos na divulgação dos cursos de formação propostas pelo projeto. Esta
atividade foi realizada pela equipe formada por oito integrantes que visitou todas estas
escolas e informou os detalhes necessários a oferta e construção dos trabalhos teóricos e
práticos oferecidos nos cursos de formação.
Durante a divulgação percebeu-se que, do ponto de vista dos alunos das escolas
visitadas, os fatores considerados negativos nas funções a serem desenvolvidas pelo
projeto e no mercado turístico após a formação foram: o horário integral de trabalho, a
dedicação as empresas nos finais de semana, bem como, o caráter “serviçal” que as
atividades contemplam. Um exemplo citado num relato foi: “trabalhar no turismo é
difícil, pois um restaurante não fecha aos finais de semana... Tenho que trabalhar
domingo, geralmente das 18h00min ás 04h00min ou até mesmo até o último cliente
sair”. Estas questões foram percebidas com surpresa para a equipe que desenvolve o
projeto, uma vez que a população estudantil envolvida é na maioria pobre e
desempregada. Outro relato intrigante foi: “não desejo ser faxineira de hotéis”. Nessas
observações foi verificado que o fator salário não foi objeto de reclamação.
Nesse contexto, foram realizadas somente 65 inscrições e foram formados até o presente
momento apenas 41 alunos, ressaltando que haverá só mais uma oferta de curso com 30
vagas. Comparado ao número de envolvidos (1260) na divulgação verifica-se um
alarmante baixo interesse de atuação no turismo por parte dos jovens das escolas
públicas da região de Blumenau. Em muitas (60%) escolas públicas visitadas houve a
participação dos professores e diretores como um incentivo a participação dos alunos
ressaltando as oportunidades oferecidas pelo projeto, como no relato de uma diretora:
“Gente é de graça, será parte do seu currículo, uma chance de emprego”. Contudo, em
outras (30%) não foi possível nem conversar com os alunos apenas houve entrega do
material de divulgação. Este fato foi alegado, conforme exemplificado em um relato de
um diretor: “a oferta de cursos atrapalha a condução da aula pelos professores”. Mesmo
havendo agendamento antecipado, isso atrapalhou o contato para esclarecimento de
dúvidas e até mesmo para valorizar a proposta. Quanto à temática das escolhas pelos
cursos, a maioria optou pela formação em recepcionista seguida por garçom,
governança e mensageiro. Devido a este resultado o último curso a ser ofertado será em
recepcionista e o público alvo será os alunos de escolas públicas constantes no cadastro
socioeconômico das prefeituras dos três municípios.
Durante o processo, ocorreu outro acontecimento interessante, houve três (3) alunos
inscritos de escolas particulares que souberam dos cursos por intermédio dos cartazes e
divulgação em rádio e TV, e solicitaram participação. Como havia vagas disponíveis
não preenchidas pelos alunos das escolas públicas, houve aceitação dessas inscrições,
visto que a turma não estava completa. O maior motivo dessa demanda foi o grau de
interesse dos solicitantes em atuar nessas áreas em momentos de intercâmbio, ou seja,
em outros locais inclusive no exterior, conforme relato de um aluno: “no exterior uma
formação como esta é valorizada e um garçom é muito mais valorizado pelas gorjetas”.
Considerações finais
Este estudo descreveu por meio de uma abordagem qualitativa descritiva um esforço
intersetorial que ocorre na região de Blumenau para formar novos trabalhadores no setor
turístico. Além disso, por meio da análise de um projeto de extensão efetivado pela
Universidade Regional de Blumenau (FURB), a Fundação Fritz Muller (FFM) e o
Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Blumenau e Região (SIHORBS)
verifica a intenção de inserção proposta neste projeto, baseada na responsabilidade
social pela inserção de jovens de escolas públicas como ingressantes no mercado de
trabalho do turismo.
Observou-se no decorrer desta pesquisa que este desafio foi iniciado com o propósito de
possibilitar a estes jovens uma chance de trabalho no turismo, bem como conciliar esta
oportunidade com as demandas ofertadas pelas organizações turísticas da região que
carecem de profissionais qualificados para atuarem neste setor. Isto é visto pelos
pesquisadores e parceiros como união em prol do diálogo dos diversos setores na
questão relativa ao desenvolvimento do turismo. A intenção não incide no
aproveitamento dos jovens como “mão-de-obra barata”, mas sim, como um movimento
articulado de valorização da sociedade local participante desse processo de
desenvolvimento. É óbvio que no início da inserção dos jovens, pela falta de
experiência no setor, os cargos ocupados são aqueles considerados como operacionais.
REFERÊNCIAS
CASTRO, Jorge A.; AQUINO, Luseni. (Org.) Juventude e políticas sociais no Brasil
– texto para discussao do IPEA. Brasília: Ipea, 2008.
CUNHA, Sieglinde Kindl; CUNHA, João Carlos. Tourism Cluster Competitiveness and
Sustainability: Proposal for a Systemic Model to Measure the Impact of Tourism on
Local Development. Brazilian Administration Review (BAR), v. 2, n. 2, art. 4, p. 47-62,
july/dec. 2005. Disponível em: <http://www.anpad.org.br/bar>. Acesso em: 10 mar.
2010.
DREHER, Marialva T.; SOUZA, Vanessa de Souza Fraga de; NORILER, Ida Luciana
Martins. Estratégias de participação pública e privada: um estudo da intersetorialidade
como fator de ordenação da responsabilidade social empresarial. In: Colóquio
Internacional de Poder Local. X, 11 a 13 de Dezembro, 2006. Salvador, BA. Anais...
Salvador: 2006.