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O método criado para lidar com o hospital colônia, designando funcionários, técnicos e

estagiários do setor tinha como objetivo discutir alternativas para os problemas, encaminhar
propostas aprovadas pelos designados, mas principalmente “dar voz ao paciente”. Surge-se então
a questão: como damos voz as pessoas que estão internadas no local, por décadas, até se
tornarem de avançada idade? Que já perderam seus vínculos sociais externos as paredes do
hospital-colônia, visto que a campanha tinha em mente ressocialização dos pacientes? A falta de
contato com o exterior apenas ajudava a explicitar outro problema nos pacientes, a falta de
perspectiva de um futuro, como ressocializar pessoas se a proposta da instituição é ocultá-las
para os indivíduos externos a parede do hospital?
Observa-se então uma não clareza quanto a proposta do grupo. Dividir-se em grupo, mas
para que, transformar a instituição? Entender os pacientes para melhor os controlar, ou apenas
uma terapia grupal? Toma se então por necessidade explicitar o foco do trabalho, se era para o
pavilhão, o grupo, a instituição ou o indivíduo?
Isso logo culmina na pesquisa da representatividade grupal, o que cada grupo se tornou.
Foi observado que cada grupo assumia uma postura enviesada nas características de seus
coordenadores, o que gerava vários grupos diferentes: grupo para terapia individual, grupo
operativo e assim por diante. A pesquisa aponta que a representação do grupo varia de acordo
com a escala de poder na instituição, separando técnicos de alto nível de estagiários, isso então
gera reflexões acerca do nível socioeconômico dos participantes, e sua convivência, (técnicos e
estagiários tinham como representação algo que propicia mudanças nas suas relações sociais),
(Pacientes e funcionários tinham como representação um espaço livre para a expressão e
reinvindicação, referentes ao seu dia-a-dia, tornando-os imediatistas.
O pavilhão que agora será discutido (Pavilhão das Paralíticas) ainda não possuía um
técnico, os coordenadores não possuíam vínculo com a instituição, tendo suas tarefas de curso e
as da instituição. Decidiram então por um esquema de alternância de três coordenadores
(Psicólogo, Psiquiatra, Estagiário de psicologia)
Ao iniciarem seus trabalhos no pavilhão, foram de encontro a um grupo de senhoras, e
explicaram a proposta de realizar um grupo conversa, (funcionários do pavilhão também
participariam). As demandas iniciais das senhoras eram por objetos materiais como, dinheiro
roupas e comida, mas essa demanda não poderia ser atendida pelos coordenadores, então veio a
segunda demanda, a solidão dos pacientes. Há um atrito gerado por duas expectativas diferentes,
a da instituição, que exigia uma transformação, e a dos pacientes, que queriam preencher sua
solidão, o que forçou com que os coordenadores tomassem uma decisão, focar mais nas escutas
ao paciente, tentando fazer um resgate de suas intersubjetividades, e não focar tanto nos
problemas da instituição.
As queixas geradas nos grupos de conversa pelos pacientes, dirigiam-se também aos
funcionários, também participantes dos grupos de conversa, em contraofensiva, eles se
defendiam, falando que os pacientes eram difíceis de lidar, ou que a instituição não cobria todas
as necessidades dos pacientes. Extraiu-se desse atrito a ideia de incentivar a participação dos
funcionários, porém mais tarde, fazer uma escuta separada para avaliar propostas, encaminhá-las,
e refletir sobre os assuntos. os resultados foram positivos, porque conseguiam refletir e fazer
cisão do quanto algo dizia sobre as dificuldades particulares do paciente, as carências da
instituição, e logo mais a fundo, a relação no contexto social mais amplo.
Foi detectado um paralelo entre a vida pessoal de alguns funcionários e os pacientes
internados. Os funcionários se preocupavam na sua obsolescência para seus filhos, por se
tornarem mais independentes, gerando preocupação com a perda de suas funções. Assim como o
ponto de vista capacitista levava a crer que as pacientes não poderiam organizar uma festa
sozinhas, tornando os funcionários obsoletos por causa da autonomia.
O parelelo permite que o trabalho passe a ser percebido como uma tentativa de articular
três propostas,
-História pessoal
-Realidade institucional
-Influência do contexto social maior na determinação da realidade institucional
Daí, começa a representação do grupo frente aos grupos e à instituição
O processo de discernir o Pavilhão das Paralíticas dos demais grupos operando na
instituição, a percepção do grupo como distinto dos outros, como “individuado”, a percepção de
grupo como identidade se forma por uma representação subjetiva mínima, comum aos membros,
entre outras coisas que só adquirem seus significados dentro do contexto social do grupo.
Frisa-se a importância de que o grupo também precisa ser reconhecido como um grupo
também para os observadores que estão fora dele.
O Pavilhão das Paralíticas já implicava por seu próprio nome, uma diferença dos demais
grupos, porém a meta era que os demais observassem o Pavilhão das Paralíticas e entendessem
não só como outro grupo do Hospital-Colônia, mas como o Pavilhão. Um processo de tomada de
lugar, frente a uma realidade de não poder transformar a instituição como um todo, solidificando
suas características próprias, implicações estruturais, dinâmica institucional, e contexto social
maior,
A decisão advinda da vontade de se diferenciarem dos demais grupos, foi uma tentativa
de ser reconhecida como a formação de um lugar comum àquelas do pavilhão das paralíticas, a
possibilidade do reconhecimento da existência de um grupo, frente a homogeneidade dos demais.
Como dito no texto: A tomada de consciência do “diferente, possibilitou ao grupo
reafirmar uma identidade como a coesão decorrente ao surgimento de processos grupais cada vez
mais complexos e que com o tempo, iria forçar uma mudança (ou pelo menos explicitar a
necessidade) na instituição, especificamente no núcleo onde se situava o “Pavilhão das
Paralíticas”.
O Pavilhão das Paralíticas levou outros pavilhões a se perceberem também, como sujeitos
desejantes, que levou a dois movimentos dentro da instituição
a) Um boicote as tentativas de reafirmação dos grupos, como retirada de membros mais
participativos/ acréscimo de tarefa para funcionários e pacientes
b) Um movimento de reinvindicação, manifestado pelo desejo dos pacientes de ser como
o Pavilhão das Paralíticas.
Trata-se então os limites de mudança dentro de um grupo, já que como grupo, o pavilhão
havia maturado, e que sua maturação chegava a um novo limite no qual as mudanças
deviam ter em conta uma mudança institucional ainda maior, e a existência do grupo
dependia de não sucumbir aos boicotes, gerava o perigo de comodismo com a situação, e
a tarefa de modificar a instituição para crescer mais dependeria da coesão grupal e
percepção da possibilidade de sucesso de suas propostas.
Isso remonta ao início, onde a mudança parecia impossível, mas o sucesso demonstrou
que ali havia algo diferente, que podia mudar algo lá dentro.
Sucessos de coisas como datas de celebração desempenhavam papel importante, porque
fornecia nova perspectiva do presente, oferecendo meios de reavaliação da história de
cada um, dentro ou fora do hospital, e deu a possibilidade de imaginar novos projetos pro
futuro.
Mais tarde com a saída do coordenador, o texto implica a ideia de que para ser um
coordenador, necessitava estar fora da instituição, como mediador entre interno e externo,
mas pelo conceito de transversalidade, sabemos que é possível estar numa instituição,
mas operar para que haja uma mudança, afinal, transversalidade é a linha de fuga de um
sujeito desejante.
O movimento do “Pavilhão das Paralíticas” foi de extrema importância dentro da
instituição, como um farol para os barcos, o pavilhão tomou aquilo que os tornava únicos
e reivindicou seu lugar de grupo, demonstrando diferença, possibilitando a reinvindicação
de sua identidade, demonstrando sua coesão interna, tornando-se assim referencial para
os demais pavilhões da instituição, que por sua vez, permanece estática.

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