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GRUPO ENQUANTO POSSIBILIDADE TERAPÊUTICA À PACIENTES AMPUTADOS

PASCHOALINI, M. E1,2; TARTARO, G.K.1,2; OLIVEIRA, B. M1,2; BAPTISTA, A. S. D.1,3;


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Centro Universitário Hermínio Ometto – UNIARARAS, Araras, SP.; Discente; Orientador.
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maria.paschoalini@hotmail.com, kastien.gustavo@gmail.com, martinsb297@gmail.com

INTRODUÇÃO

Mediante vivências durante a atuação enquanto alunos de um projeto de extensão, foram


suscitadas algumas ideias de trabalho voltadas ao público amputado, este trabalho não
consiste em um relato de experiência, mas sim uma revisão de literatura não sistemática
que busca abordar brevemente a temática grupo dentro do campo da psicologia,
compreendendo que, dentre as possíveis configurações grupais, perpassam algumas
temáticas como saúde, alimentação, esporte, lazer, dificuldades, alegrias, dentre outras que
possam surgir dentro destas relações trazendo a possibilidade de diferentes
ressignificações. Pensando nisso, propõe-se a pensar grupo enquanto um modo de
propiciar essas discussões, assim como compartilhar experiências e identificações.
(CARDOSO, 2009).
A proposta do grupo se dá devido a diferentes questões relacionadas ao preconceito que
emergem no social em relação ao público amputado, sendo este responsável por atravessar
no sujeito o estigma, termo proposto por Goffman (1891) apud Nunes (2009), que pode ser
compreendido: deformidades físicas; as culpas de caráter individual (características do
sujeito como desonestidade por exemplo); estigmas relacionados à etnia, nação e religião.
Todos esses aspectos se referem a símbolos que, de certa forma, identificam o sujeito,
sendo construída na intersecção da identificação social com a identificação pessoal,
geralmente induzida a uma forma negativa. Esse conceito não é uma característica de
perda do trânsito social, mas a forma como a sociedade lida com essas características
determina a perda do trânsito social, ou seja, a sociedade enquanto reprodutora de
padronizações e normas, pode estigmatizar um sujeito que não se “encaixa” nos modelos
oferecidos. Portanto, pode-se dizer que muitas vezes, as pessoas que vivem sob as
condições de uma amputação, e consequentemente, se tornam deficientes físicos, são
afetadas por isso, principalmente pela própria terminologia na qual é empregada; afinal,
existem as “pessoas” e existem os “deficientes físicos”, há uma distinção entre os dois.

OBJETIVO

Este trabalho tem como objetivo abordar a formação grupal como possibilidade de oferta
terapêutica à pacientes amputados podendo servir à um processo de ruptura de estigma,
com base em produções dentro do campo da psicologia.
REVISÃO DE LITERATURA

Segundo D’elbeoux Diogo (2002), Chini e Boemer (2007), a amputação pode ocasionar
diferentes modos de percepções sobre que incidem sobre a imagem corporal e o modo de
disposição em relação ao mundo, a vivência da amputação é uma experiência singular e
que pode por vezes levar a adoecimento psicológico quando não são ofertados suportes
necessários para a devolução de autonomia, neste sentido: “Algumas pesquisas indicam
que o bem-estar subjetivo não reside somente no efeito direto de como as pessoas se
sentem fisicamente, mas também no que sua saúde permite que elas façam” (DIOGO,
2003, p. 398)
O grupo pode ser compreendido como algo maior que coletividade, deste modo ele não
significa apenas o plural de indivíduos. Uma compreensão ampliada do conceito de grupo
pode acrescentar o entendimento de que este possui o potencial para a constituição de um
ambiente de trocas, no qual, existem sujeitos que interagem entre si de modo a promover
aprendizagens e por vezes conflitos, que se geridos de maneira positiva podem trazer bons
resultados, neste sentido o todo passa a ser maior que a soma de todas as partes. Bastos
(2010), baseado na Teoria de Grupos de Pichon-Rivieri (1988), afirma que:

[...] A aprendizagem centrada nos processos grupais coloca em evidência a


possibilidade de uma nova elaboração de conhecimento, de integração e de
questionamentos acerca de si e dos outros. A aprendizagem é um processo
contínuo em que comunicação e interação são indissociáveis, na medida
em que aprendemos a partir da relação com os outros. (BASTOS 2010,
p.161)

Apesar da tendência de pensarmos os indivíduos de modo fragmentado, sabe-se que sua


constituição é biológica, psicológica espiritual e sobretudo social, desta forma, boa parte da
satisfação seja de suas necessidades internas quanto externas provém do contato com
outros interlocutores, deste modo:

[...]A constituição do sujeito é marcada por uma contradição interna: ele


precisa, para satisfazer as suas necessidades, entrar em contato com o
outro, vincular-se a ele e interagir com o mundo externo. Deste sistema de
relações vinculares emerge o sujeito, sujeito predominantemente social,
inserido numa cultura, numa trama complexa, por meio da qual internalizará
vínculos e relações sociais que vão constituir seu psiquismo. (BASTOS,
2010, p.162)

Assim, a inserção em grupo possibilita o olhar para si e para o outro favorecendo a


possibilidade de rompimento com as prisões internas, relacionadas tanto à imagem corporal
quanto à pensamentos e percepções por vezes negativas sobre si e mundo, uma vez que o
diálogo e a interlocução entre diferentes pessoas permitem a ruptura com o que está
instituído abrindo margem ao novo. O conhecimento de si provém de um outro que lhe
possibilite a afirmação enquanto ser existente, deste modo, Cardoso (2009) valendo-se de
uma leitura gestáltica sobre os processos grupais afirma que:

[...] Quanto mais a pessoa se conecta com sua experiência presente, maior
sua possibilidade de estabelecer um contato pleno. Esse conceito é
fundamental no trabalho com grupos, pelo fato destes se constituírem num
campo onde a pessoa se defronta com a diversidade nos mais variados
aspectos, estabelece relações, experimenta o inesperado e revê sua
própria referência. (CARDOSO 2009, p.126)

Neste sentido, o grupo pode oferecer a possibilidade de uma nova perspectiva diante da
condição do sujeito, que muitas vezes já está estigmatizado pelos laços sociais. Estigma,
termo utilizado pela primeira vez pelos gregos e que se perpetua até hoje, se apresenta
enquanto um símbolo carregado de significados. Goffman (1891), apresenta em sua obra
“Estigma - notas sobre a manipulação da identidade deteriorada”, uma reflexão acerca do
conceito de estigma. Ele apresenta a ideia de que o próprio social determina modos de
categorizar as pessoas o os atributos que são considerados naturais e comuns para os
respectivos componentes de cada uma das categorias:

[...] Os ambientes sociais estabelecem as categorias de pessoas que têm


probabilidade de serem neles encontradas. As rotinas de relação social em
ambientes estabelecidos nos permitem um relacionamento com "outras
pessoas" previstas sem atenção ou reflexão particular. (GOFFMAN, 1891,
p. 5)

Deste modo, quando nos deparamos com um estranho, imediatamente já observamos


alguns aspectos que nos fazem prever sua categoria e seus atributos, ou seja, a sua
“identidade social”. Tendo como base essas pré-concepções, “nós as transformamos em
expectativas normativas, em exigências apresentadas de modo rigoroso”. Essas
expectativas normativas e as exigências, que por sua vez, se apresentam de forma rigorosa
no campo social, nos dá a perspectiva de que somos categorizados pelo que somos,
criando uma ideia de cristalização de nossa identidade. E a partir disso, é esperado de nós
aquilo que já está pré-estabelecido. (GOFFMAN, 1891, p. 5)
Trazendo essa temática para a realidade das pessoas que vivenciam a amputação, é
possível ocorrer a cristalização da própria identidade através da percepção entre a figura do
corpo anterior e do corpo atual, bem como, o estranhamento em relação a esta fase da
vida. É possível a ocorrência de processos de alienação ou de identificação em relação aos
estigmas pré-estabelecido socialmente, mas, as vivências alteritárias, sobretudo em grupo,
como mencionado possuem potencial para que haja conexões com o tempo presente (aqui
e agora), junto a outros que possam servir como apoios no contato em relação ao mundo e
à si mesma que favorecem a tomada de consciência. Nas palavras de Cardoso (2009)

[...] na medida que a pessoa aumenta seu contato consigo mesma e com o
mundo, ela amplia também sua capacidade de awareness, definida como
uma força integradora da estrutura da experiência imediata, seja no nível
sensorial, muscular, vegetativo ou afetivo. As alienações, os bloqueios e as
resistências geram desconexões entre a pessoa e o mundo, diminuindo sua
capacidade de reconhecimento de si nas relações. ...Não existe na língua
portuguesa uma palavra que exprima o significado de awareness, a palavra
mais próxima é conscientização, mas ela não explicita o sentido de contato,
excitação, fluxo e livre formação de gestalten, implícito neste conceito.
Assim, o objetivo maior da abordagem gestáltica é ajudar a pessoa a
restabelecer sua capacidade de se tornar aware. (CARDOSO, 2009 p.125-
126.)
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho se propôs a pensar no grupo enquanto possibilidade terapêutica à pacientes


amputados, levando em consideração a questão do estigma proposto por Goffman (1891).
Diante da ideia de que o estigma pode se apresentar à todo e qualquer ser humano,
observa-se que nas relações sociais podem surgir dificuldades em lidar com tais
problemáticas, portanto, conclui-se que o de grupo é uma possibilidade de proporcionar um
enfrentamento dos conflitos que podem emergir em um sujeito que vivencia a amputação ou
quaisqueres outras formas de a dificuldade física.
O grupo, desde que carregado de maturidade suficiente, pode proporcionar outras
perspectivas que vão além da condição física, pois, quando nos deparamos com alguém
que é diferente e o aceitamos em sua diferença, temos a oportunidade de deixá-las de lado
nos situando como semelhantes, nas mais diversas particularidades. Estar em grupo pode
ser representativo de aceitação e assimilação da diferença enquanto possibilidade de
existência autêntica.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BASTOS, Alice Beatriz B. Izique. A técnica de grupos-operativos à luz de Pichon-Rivière e


Henri Wallon. Psicol inf., São Paulo , v. 14, n. 14, p. 160-169, out. 2010 . Disponível em
<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-
88092010000100010&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 03 ago. 2018.

CARDOSO, Claudia Lins. Grupos terapêuticos na abordagem gestáltica: uma proposta de


atuação clínica em comunidades. Estud. pesqui. psicol., Rio de Janeiro , v. 9, n. 1, abr.
2009 . Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-
42812009000100010&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 03 ago. 2018.

CHINI, Gislaine Cristina de Oliveira; BOEMER, Magali Roseira. A amputação na percepção


de quem a vivencia: um estudo sob a ótica fenomenológica. Revista Latino-Americana de
Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 15, n. 2, p. 330-336, apr. 2007. ISSN 1518-8345.
Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/rlae/article/view/2435>. Acesso em: 03 aug.
2018. doi:http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692007000200021.

DIOGO, Maria José D’Elboux. Satisfação global com a vida e determinados domínios entre
idosos com amputação de membros inferiores. Rev Panam Salud Publica/Pan Am J Public
Health 13(6), 2003. Disponível em: <https://www.scielosp.org/pdf/rpsp/2003.v13n6/395-
399/pt> Acessos: 02. Ago. 2018.

GOFFMAN, E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de


Janeiro: Zahar, 1981.

NUNES, Everardo Duarte. Goffman: contribuições para a Sociologia da Saúde. Physis, Rio
de Janeiro , v. 19, n. 1, p. 173-187, 2009 . Available from
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-
73312009000100009&lng=en&nrm=iso>. access on 03 Ago. 2018.
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-73312009000100009.
PICHON-RIVIÈRE, E. Teoria do vínculo. São Paulo: Martins Fontes, 1988

PALAVRA-CHAVES: Amputados, Estigma, Grupo.

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