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AS ESFERAS DA VIDA

Nascer, crescer e morrer – este é o ciclo natural da vida. Nascer, crescer, desenvolver e morrer – este é o
ciclo da vida humana e é o que nos diferencia de outras espécies, nos tornando mais belos e complexos.
Chegamos indefesos, dependentes, inconscientes. Somos recebidos por um seio que inicia o primeiro
processo de socialização, o da esfera familiar. Crescemos um pouco mais e logo adentramos no mundo da
educação, estamos na esfera acadêmica. Nela conhecemos nossos primeiros amigos e também os primeiros
desafios de nos relacionar com ‘estranhos’. Adoramos brincar, jogar, passear, descobrir o mundo. Disputamos,
ganhamos, perdemos e aprendemos o tempo todo. É na esfera social que descobrimos um pouco mais sobre nós
mesmos, como ‘funcionamos’ perante os outros.
Nosso corpo continua espichando e junto com ele, nos despertamos para o novo, é hora de escolher o que
queremos ser. Somos lançados na esfera profissional, ainda sem saber quem somos e, nem mesmo, o que
queremos. Dúvidas, medos, desejos, sonhos, crenças, valores… Um verdadeiro universo particular se forma em
nosso ser humano. Então, emerge a esfera espiritual que traz algum conforto, mas que também vem dependente da
nossa capacidade de acreditar no potencial infinito que temos para realizar e transformar o mundo.
E assim, iniciamos e finalizamos os vários ciclos da vida… Uns começam e acabam outros se misturam e
parecem nunca passar… outros ainda se mostram distantes ou inexistentes. Fazemos parte de alguns grupos, nos
separamos de outros, lideramos outros. Vamos amadurecendo por dentro e por fora, começando a entender os
porquês intensamente incompreendidos. Buscamos tranquilizar as emoções da juventude para aprender a lidar com
a chegada da maturidade.
É quando, então, percebemos que somos todas esferas da vida, juntas e separadas. Que somos o que podemos
ser e que isso é simplesmente tudo.

O QUE É SER JOVEM?


Para a filosofia, jovem é quem tem um coração banhado por um ideal de juventude. A juventude
não se mede pela idade, e sim pela capacidade de protagonismo e de enxergar (e viver) nobres ideais.
O que Sócrates pensava sobre a juventude?
Não foi apenas Sócrates que reclamou desde a antiguidade da geração mais jovem; outras antigas queixas
são frequentemente descritas: Esta juventude está podre no fundo do coração. Os jovens são maus e
preguiçosos. Nunca serão como a juventude de outros tempos.

Qual é a frase mais famosa de Platão?


Platão (427-347 a.C.)

Tente mover o mundo - o primeiro passo será mover a si mesmo.


Qual é a frase mais famosa de Sócrates?
Só sei que nada sei

Sócrates

O que deve caracterizar a juventude é a modéstia, o pudor, o amor, a


moderação, a dedicação, a diligência, a justiça, a educação. São estas as
virtudes que devem formar o seu carácter.

Qual a frase mais marcante de Platão?


“Tente mover o mundo, mas comece movendo a si mesmo.” “Não eduques as crianças nas várias disciplinas
recorrendo à força, mas como se fosse um jogo, para que também possas observar melhor qual a disposição natural
de cada uma.” “Muitos odeiam a tirania apenas para que possam estabelecer a sua.”
Qual é a frase mais famosa de Aristóteles?
“O sábio nunca diz tudo o que pensa, mas pensa tudo o que diz.”
Cícero , Marcus

Assim como gosto do jovem que tem dentro de si algo do velho, gosto do
velho que tem dentro de si algo do jovem: quem segue essa norma poderá ser
velho no corpo, mas na alma não o será jamais.

Frases de Freud
Somos feitos de carne, mas temos de viver como se fôssemos de ferro. ...
Como fica forte uma pessoa quando está segura de ser amada! ...
Um homem que está livre da religião tem uma oportunidade melhor de viver uma vida mais normal e
completa. ...
A felicidade é um problema individua

Schopenhauer , Arthur

Vista pelos jovens, a vida é um futuro infinitamente longo; vista pelos velhos,
um passado muito breve.
Bacon , Francis

Os jovens estão mais aptos a inventar que a julgar; mais aptos a executar que
a aconselhar; mais aptos a tomar a iniciativa que a gerir.

As três esferas da existência humana. O nascer da cultura. O fazer da história.


Abro este texto com uma citação famosa de Brecht, de que nada é natural, que tudo é cultural. Diz a frase:
"Nada é impossível de mudar. Desconfiai do mais trivial, na aparência do singelo. E examinai, sobretudo, o que
parece habitual. Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de
desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada
deve parecer natural nada deve parecer impossível de mudar". Conclusão da história. O cultural é uma invenção
humana. Se foi feito de um jeito, também o poderá ser de outro. O cultural e o histórico são invenções humanas.

Freud, em O futuro de uma ilusão, nos dá uma bela conceituação de cultura: "Como se sabe, a cultura
humana - me refiro a tudo aquilo em que a vida humana se elevou acima das condições animais e se distingue da
vida dos bichos; e eu me recuso a separar cultura (Kultur) e civilização (Zivilization) - mostra dois lados ao
observador. Ela abrange, por um lado, todo o saber e toda a capacidade adquiridos pelo homem com o fim de
dominar as forças da natureza e obter seus bens para a satisfação das necessidades humanas e, por outro, todas as
instituições necessárias para regular as relações dos homens entre si e, em especial, a divisão dos bens acessíveis".
Quem quiser aprofundar a questão, indicaria a leitura de Marx e Engels - A Ideologia Alemã. Me permitam uma
pitada de ironia. Para não provocar nenhuma confusão com aqueles promotores de São Paulo, confirmo que os
autores são mesmo Marx e Engels e não Marx e Hegel. Marx e Hegel nada escreveram em conjunto. Marx
aproveitou sim, conceitos hegelianos e os levou adiante em suas análises.

INTRODUÇÃO
No presente trabalho, trataremos da concepção de público e privado segundo a filosofia política aristotélica.
Como texto basilar, tomaremos A Política, do próprio Aristóteles, de onde brota a questão central desta pesquisa.
Serviremo-nos também da iluminação filosófica de Hannah Arendt que, com base no ensinamento do aristotelismo,
realizou um estudo político da sociedade em sua obra A Condição Humana, utilizada por nós.
Veremos que “a distinção entre uma esfera de vida privada e uma esfera de vida pública corresponde à
existência das esferas da família e da política como entidades diferentes e separadas.” (ARENDT, 2007, p. 37).
Diferentemente de Platão, que sustentava não haver diferença entre esfera particular e coletiva, Aristóteles não
apenas afirmava essa distinção, como tomava por ideal o universo público da polis.
E hoje, conforme Hanna Arendt (2007) nos esbarramos com a dificuldade de compreender a separação
decisiva entre as esferas pública e privada e entre as atividades pertinentes a um mundo comum e as que o são à
manutenção da vida.
Num primeiro instante, analisaremos a esfera privada da família, abordando seus elementos e relações
internas. À medida que formos nos familiarizando com o pensamento de Aristóteles, progrediremos no
entendimento dos fatores que levaram o filósofo a proclamar a distinção radical dos ambientes da família e da
cidade. Analisaremos, ainda no âmbito da família, por que Aristóteles postulou essa esfera como pré-política, e
quais implicações essa classificação acarretou na vida dos indivíduos.
Avançando na filosofia aristotélica, chegaremos à sociedade política ideal, ou seja, a polis grega, na qual nos
deteremos com cautela, tamanha importância representava o tema na Grécia Antiga. Partindo do conceito
de eudaimonia, estudaremos o objetivo a que se propunha a polis e qual era papel do indivíduo na sua constituição.
De modo geral, nesse breve estudo político teremos diante dos olhos a provocação vinda do próprio
Aristóteles: “será mais proveitoso ocupar-nos dos negócios públicos e deles participar, ou libertar-se de todo
político e viver como estranho no Estado?”. (2009, p. 232).
Iniciemos, respondendo tal questão a partir do universo privado da família.
1. A ESFERA PRIVADA
No pensamento Aristotélico, a esfera privada é inferior à esfera pública, precedendo-a no tempo e no espaço.
Ela constitui-se pela família, ambiente responsável por desenvolver em seus membros uma ética individual,
necessária nas relações distintas existentes no lar e, posteriormente, na polis.
Aristóteles constatou que o homem é um “animal político” (zoon politikon), salientando a naturalidade com
que os homens criaram seus sistemas políticos. Entretanto, a polis grega só pôde ser formada mediante o
agrupamento de diversas famílias. É com base nessa afirmação que o filósofo desenvolve sua tese política. A ética
particular e a administração da casa formados na esfera privada é a que possibilitou a constituição dos componentes
da sociedade pública.
1.1 A formação da família e sua relação com a polis
Ao observarmos a natureza, percebemos que os animais reúnem-se por instinto, enquanto os homens o faz
conscientemente, ou seja, ele escolhe viver em sociedade. Essa escolha é natural e revela uma forte inclinação
humana à convivência com seres semelhantes a si.
A família, portanto, originou-se da necessidade do ser humano em relacionar-se de forma a manter sua
espécie e garantir sua sobrevivência. Tal conveniência serviu de subsídio para a construção de uma comunidade
relativamente simples, que serviu de célula inicial para outros tipos de aglomeração. Hannah Arendt, em sua obra A
Condição Humana, escreve sobre a origem da cidade-estado à luz da filosofia política de Aristóteles. Assim afirma:
a vida, para sua manutenção individual e sobrevivência como vida da espécie, requer a companhia de outros.
O fato de que a manutenção individual fosse a tarefa do homem e a sobrevivência da espécie fosse a tarefa da
mulher era tido como óbvio; e ambas estas funções naturais, o labor do homem no suprimento de alimentos e o
labor da mulher no parto, eram sujeitas à mesma premência da vida. Portanto, a comunidade natural do lar decorria
da necessidade: era a necessidade que reinava sobre todas as atividades exercidas no lar.” (ARENDT, 2007, p. 40).
Percebemos, com tal elucidação, que na família grega, havia a união por necessidade, ou seja, era
conveniente ao homem unir-se com um ser da mesma espécie que lhe garantisse a procriação e suprisse suas
necessidades mais básicas. Conforme Simões Francisco (2007), a análise arendtiana expõe os aspectos aristotélicos
referentes à esfera privada. São eles: a primazia da necessidade e a ausência de liberdade na família? a sua
destinação à perpetuação da espécie e do indivíduo? a desigualdade nas relações humanas, tanto na relação servil
quanto na conjugal? e a justificação da dominação pela desigualdade dos relacionamentos.
É possível notar que o homem é carente por estabelecer relações e, a partir delas, leis e regras. É nesse
sentido que Aristóteles afirma categoricamente que o homem não pode viver sozinho, alheio ao relacionamento em
comunidade.
Entretanto, a necessidade é uma característica encontrada apenas no universo particular. Tendo por
finalidade obter a satisfação individual, esse atributo familiar não é capaz de identificar com precisão o objetivo
maior de uma vida comunitária. Desse modo, a filosofia aristotélica vai conferir à vivência citadina o ideal de
sociedade, pois se empenha na construção de uma vida feliz, com todos os seus indivíduos vivendo em harmonia.
a cidade é para Aristóteles a comunidade perfeita, a única que se basta a si mesma e que pode propiciar ao
homem seu desabrochar moral perfeito. Essa comunidade pressupõe outras comunidades, mais simples, enraizadas
ainda mais profundamente na natureza humana e, por isso, mais necessárias, mais estáveis, porém menos perfeitas.
(PHILIPPE, 2002, p. 83)
A família é, pois, pressuposto necessário para o estágio da polis. “Historicamente, é muito provável que o
surgimento da cidade-estado e da esfera pública tenha ocorrido às custas da esfera privada da família e do lar.”
(ARENDT, 2007, p. 38). Entretanto, ela não é a expressão máxima da vida política e não pode afirmar-se como a
plenitude dos relacionamentos humanos.
1.2 Relações familiares
Sendo de fundamental importância para a existência da polis grega, a família ocupa lugar destacado na
filosofia política de Aristóteles, merecendo uma abordagem própria. Nela são analisados os tipos de relações
presentes no seio familiar: entre esposo e esposa; entre pais e filhos; entre senhor e escravo. Segundo Aristóteles
(2009, p. 17) a família “para ser completa, deve compreender escravos e indivíduos livres”. Compreendamos, pois,
cada uma dessas classes de indivíduos.
1.2.1 A relação entre senhor e escravo
Segundo a Política, a divisão entre senhor e servo é natural, necessária e útil à sobrevivência da cidade.
Assim como na própria natureza há a existência da autoridade e da obediência, as relações humanas devem pautar-
se de forma hierárquica.
Para Aristóteles, alguns nascem para mandar e outros para obedecer. E isso não implica desigualdade social,
mas um equilíbrio necessário à sobrevivência. Há homens que apresentam razão pouco desenvolvida, sendo a sua
força física o que de melhor podem desenvolver. Estes têm facilidade em obedecer e, portanto, nascem para viver a
condição de escravos.
Por não possuir a plenitude da razão, o escravo é visto como aquele que não se pertence, e que precisa de
alguém que o comande. Para ele, é justo e útil viver na servidão, pois por meio do labor sua razão é condicionada a
desempenhar bem suas potencialidades.
Assim sendo, a escravidão não se apresenta como realidade questionável, mas uma imposição natural justa.
Não havia nenhuma imoralidade na existência da classe escrava na Grécia Antiga, pois ela inseria-se no coração da
família, sob uma ética. O senhor só poderia comandar seu escravo amando-o, o que revela o primado da ética sobre
o puro interesse de adquirir propriedades. Existe uma amizade recíproca entre ambos, pois se unem tendo em vista
o mesmo interesse.
1.2.2 A relação entre esposo e esposa, pai e filho
Ainda segundo Aristóteles, todo ser masculino é superior ao feminino, existindo no lar a submissão da
mulher a seu esposo. Da mesma forma, o pai exerce toda a autoridade sobre o filho, pois governa com amor,
visando o crescimento e a educação de sua prole. Apesar de ser da mesma espécie que seu filho, o pai traz consigo
características que facilmente o distingue, como sua maior experiência de vida em relação à idade. Segundo
Aristóteles (2009, p. 15), “uma casa é administrada pelo membro mais velho da família, que tem uma espécie de
poder real”.
No que tange ao grau de valores presentes em cada indivíduo do lar, Aristóteles afirma que as virtudes são
exigidas de ambos: do pai, da esposa, dos filhos e mesmo dos escravos, que na Grécia também eram parte da
família. Cada qual as apresenta a seu modo, conforme o estabelecido pela própria natureza. Ao que ordena, são
necessárias qualidades como a justiça, a coragem e a sobriedade, por exemplo, para que governe bem. Já àquele
que obedece, há a necessidade das mesmas virtudes, para que cumpra bem sua função.
O homem livre dá ordens de forma diferente para seu escravo, sua esposa e seu filho. A alma destes últimos
apresenta, cada qual, virtudes em graus distintos, segundo a intensidade necessária para que cada um possa realizar
seu encargo. O escravo é totalmente despojado de vontade; a mulher a possui, mas esta lhe é debilitada; o filho
também a possui, mas de forma ainda incompleta.
Portanto, a virtude do amo e do marido servem para mandar, enquanto a do servo e da esposa, para executar
prescrições, ainda que de formas diferentes. O filho é um ser comparado ao pai, mas ainda incompleto. Somente no
poder patriarcal subsiste a totalidade da faculdade de querer, em todos os seus atos.
2 A ESFERA PÚBLICA
No mundo grego e, consequentemente, na política aristotélica, o homem nasceu para viver em sociedade,
cuja maior representante da vida e das relações humanas era a polis. Ela era o ideal justamente por promover a
transição do universo particular para o público.
Com uma frase magistral, Aristóteles inicia sua Política explicitando o valor fundamental que o ambiente da
cidade exerce na formação do homem, alegando-o superior aos demais:
Sabemos que toda cidade é uma espécie de associação, e que toda associação se forma tendo por alvo algum
bem; porque o homem só trabalha pelo que ele tem em conta de um bem. Todas as sociedades, pois, se propõem
qualquer bem – sobretudo a mais importante delas, pois que visa a um bem maior, envolvendo todas as demais: a
cidade ou sociedade política. (ARISTÓTELES, 2009, p. 13, grifo nosso).
Nesse pequeno trecho, podemos notar o pensamento político que norteou a sua reflexão. Para o filósofo, toda
união realizada pelo ser humano dá-se em vista de um bem, e tanto a família, o vilarejo ou a polis apresentam
interesses específicos, que diferem quanto à mentalidade do homem em cada um desses momentos.
Num primeiro instante, esse bem é, como vimos, puramente individual, voltado para as necessidades de
sobrevivência e procriação, e se desenvolve no seio familiar. Ao evoluir no entendimento das relações, o homem
atinge o estágio do vilarejo, cujas convenções são diferentes das da família, e antecede imediatamente a polis. Na
etapa do vilarejo, a preocupação do homem volta-se para a administração dos bens e o culto religioso em comum.
Ao chegar à “sociedade política” por excelência – a cidade –, o homem está disposto a cooperar na
construção de um bem que não seja transitório ou particular. É a isso que Aristóteles chama de “bem maior”, pois é
comum a todos os cidadãos.
2.1 O objetivo da vida na polis
Os homens nascem com um uma finalidade em sua vida, havendo um bem para o qual tendem naturalmente.
A esse bem, existindo como um fim último, os gregos classificavam como eudaimonia, ou seja, a felicidade como
perfeição ética. Ela não poderia ser somente um momento ou estado, mas um estilo de vida. Em Aristóteles,
somente na polis o homem poderia ser verdadeiramente humano, e realizar-se plenamente como tal, alcançando o
fim para o qual nasceu. Por isso, a Ética aristotélica se subordina à Política, estando a seu serviço.
A sociedade constituída por diversos pequenos povoados forma uma cidade completa, com todos os meios
de se abastecer por si, e tendo atingido, por assim dizer, o fim que se propôs. Nascida principalmente da
necessidade de viver, ela subsiste para uma vida feliz. Eis por que toda cidade se integra na natureza, pois foi a
própria natureza que formou as primeiras sociedades. (ARISTÓTELES, 2009, p. 16).
Essa felicidade, para não ser passageira, não poderia ser buscada nos prazeres sensíveis, na honra, ou nas
riquezas. Além do mais, ela não podia ser algo metafísico, mas uma ação genuinamente humana. Assim, o bem
próprio do homem é a atividade da alma segundo a virtude.
A virtude mais importante para o ser humano é a justiça, pois, por meio dela, damos a cada um aquilo que
lhe é de direito. Na cidade ela é de valor fundamental, e atesta a necessidade do respeito aos direitos humanos
básicos.
Percebemos, de modo sistemático, que a causa material da polis eram as habitações e indivíduos nela
existentes. A causa formal, os regimes políticos e constituições de governo. Já a causa final, mais importante em
nossa análise, constituía-se em viver bem, por meio de uma vida justa. Esse era o bem comum da cidade,
responsável por humanizar o homem. É por isso que Aristóteles afirmou que o homem é “pior quando vive isolado,
sem leis e sem justiça” (2009, p. 17), ou seja, quando se nega à convivência no ambiente urbano.
Hannah Arendt, ao abordar o bem comum na polis, detectou que não é o simples fato de viver em
comunidade que leva o homem a pôr tudo em comum e abrir de mão de sua condição individual para aplicar-se aos
assuntos referentes à cidade. Inevitavelmente os cidadãos apresentavam entre si divergências de opiniões e
posições políticas, mas o que lhes garantia a unidade era o comum interesse que os interligava: a procura por uma
vida justa e ideal, segundo os moldes gregos.
Nas condições de um mundo comum, a realidade não é garantida pela “natureza comum” de todos os
homens que o constituem, mas sobretudo pelo fato de que, a despeito de diferenças de posição e da resultante
variedade de perspectivas, todos estão sempre interessados no mesmo objeto. (ARENDT, 2007, p. 67).
Com essa afirmação, percebemos a importância que a constituição citadina tinha para o povo grego e o elo
de amizade (no sentido aristotélico) que havia entre os cidadãos. Ao menos na teoria, a civilização grega foi
formada sobre a cultura, que propunha ao homem dispor-se à construção imaterial, seja pela filosofia, artes ou
política, ao contrário da cultura romana, que pregava tão somente a riqueza material.
Assim, na polis grega, salientava-se o bem comum de todos os cidadãos, apesar de poucos serem
considerados cidadãos. O bem da cidade devia estar acima do bem do indivíduo a fim de que a
verdadeira eudaimonia se estabelecesse.
O bem do indivíduo é da mesma natureza que o bem da Cidade, mas este “é mais belo e mais divino” porque
se amplia da dimensão do privado para a dimensão do social, para a qual o homem grego era particularmente
sensível, porquanto concebia o indivíduo em função da Cidade e não a Cidade em função do indivíduo. (REALE;
ANTISERI, 2012, p. 208).
Está explícita, no excerto acima, a sujeição da vida privada à vida comunitária na polis.
2.2 O exercício do poder
No interior da família, Aristóteles vê a insurgência e estabelecimento do poder. A administração da casa
(economia) requeria a presença de escravos e artesãos, bem como o senhorio do homem em relação à mulher e aos
filhos. Entretanto, tais vínculos de poder eram exclusivos da esfera privada, não sendo permitidos na polis.
Por exemplo, a relação entre marido e esposa, com a dominação masculina, era permitido na família, pois o
que reinava era o poder patriarcal, ao passo que na cidade o que valia era a decisão comunitária. Ainda na família, a
violência se estabelecia por necessidade, devido ao primado da opinião individual. Somente neste ambiente ela era
justificada. Na sociedade política era inconcebível a utilização da violência, pois a necessidade dá lugar à liberdade.
O que todos os filósofos gregos tinham como certo [...] é que a liberdade situa-se exclusivamente na esfera
política; que a necessidade é primordialmente um fenômeno pré-político, característico da organização do lar
privado; e que a força e a violência são justificadas nesta última esfera por serem os únicos meios de vencer a
necessidade – por exemplo, subjugando escravos – e alcançar a liberdade. Uma vez que todos os seres humanos são
sujeitos à necessidade, têm o direito de empregar a violência contra os outros; a violência é o ato pré-político de
libertar-se da necessidade da vida para conquistar a liberdade no mundo. Esta liberdade é a condição essencial
daquilo que os gregos chamavam de eudaimonia. (ARENDT, 2007, p. 40).
Vemos que no governo da polis havia o ideal de liberdade, ao contrário da família. O triunfo desse elemento
sobre a necessidade que regia o lar foi a condição necessária para o agrupamento e permanência dos homens em
uma cidade.
Independente da forma de governo, a polis precisa ser regida pela ética. Deve-se unir à sua administração a
coerência de vida daqueles que a governam. Não está em jogo apenas a vida pública do político no que se refere à
boa condução de seu governo, mas sim o seu caráter. Um político vicioso não pode, absolutamente, integrar o
governo, da mesma forma como a corrupção não pode tornar-se algo natural aos olhos da sociedade. Deve-se exigir
do político atos de virtude que tornem sua vida apta a satisfazer as condições requeridas de um governante.
Conforme Aristóteles (2009), um indivíduo que não possuísse coragem, sabedoria, inteligência ou sentimentos da
justiça, e se entregasse aos excessos deveriam ser descartados de qualquer possibilidade política.
Referindo-se à consumação do bem, o filósofo relaciona o cidadão em particular à sua polis, visto que ambos
participam dos mesmos efeitos gerados pela busca da eudaimonia.
É impossível ser feliz quando não se pratica o bem, e o bem jamais é possível tanto para um homem como
para um Estado, sem a virtude e a razão. Ora, na sociedade civil, a coragem, a justiça e a razão produzem, sob a
mesma forma, o mesmo efeito que no indivíduo, do qual elas fazem um homem justo, sensato e prudente.
(ARISTÓTELES, 2009, p. 231).
A conclusão a que chegamos é a de que em abas as esferas políticas – privada e pública – deve haver o
mesmo ideal de vida. A virtude só é alcançada mediante atos virtuosos. Por isso, Aristóteles (2009) diz que “um
homem não se pode tornar justo e prudente só por obra do acaso.”. É preciso que sua vida pública seja reflexo da
vida privada, comprometida com a ética.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a análise proposta da filosofia de Aristóteles, percebemos que a sociedade política na qual o homem
pode desenvolver-se e realizar-se plenamente é a cidade. Formada a partir da união de diversas famílias, ela
promove a transição da necessidade para a liberdade. Nesse contexto, a esfera pública revela-se a plenitude das
relações humanas, sendo o espaço privado um estágio pré-político.
Arendt, ao longo de suas investigações políticas, desenvolve a ideia de que a cidade é expressão maior da
coletividade humana, pois supõe a opinião comunitária. Esse espaço não permite a utilização da repressão ou
violência e, por isso, é lugar propício para o florescimento de uma vida virtuosa.
A concepção aristotélica de eudaimonia também guiou nossa pesquisa, a tal ponto de compreendermos que o
objetivo final e o bem supremo dos cidadãos que habitam a polis é a virtude; e a maior delas no contexto político é
a justiça, que faz-nos dar a cada um aquilo que lhe é por direito.
Em linhas gerias, percebemos que, apesar de a cidade ser superior à família, em ambos os espaços deve
haver a primazia da ética, a fim de se estabelecer relações justas.
REFERÊNCIAS

ARENDT, H. A Condição Humana. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.
ARISTÓTELES. A Política. 2. ed. Bauru: Edipro, 2009.
PHILIPPE, M. D. Introdução à filosofia de Aristóteles. São Paulo: Paulus, 2002.
REALE, G.; ANTISERI, D. História da Filosofia v.1. São Paulo: Paulus, 2012.
SIMÕES FRANCISCO, M. F. Aristóteles enquanto fonte das concepções de espaço público e espaço
privado de Hannah Arendt. 2007. Dissertação – Faculdade de Filosofia da Educação, USP, 2007.
A vida humana é constituída de três camadas, em outras palavras ela funciona em três esferas. A primeira é a
esfera espiritual, a segunda a esfera psíquica e a terceira é a esfera física densa. Os seres humanos renovam suas
aflições na esfera espiritual através de seus esforços pessoais. Devemos fazer sempre esforços sinceros para nos
desenvolver-mos."
14 capítulos maravilhoso de filosofia.

Mas é num manual de filosofia que encontramos uma explicação, cuja síntese seria a de que a cultura é a
soma das relações que o ser humano estabelece com a natureza, com os outros e consigo mesmo. Esta explicitação
está no livro de Antônio Joaquim Severino, Filosofia, logo no seu primeiro capítulo. Vejamos:

As três esferas da existência humana.

O quadro a seguir busca representar o que foi descrito e exposto neste capítulo. As esferas da existência
humana e sua inter-relação. (O quadro se refere a um círculo, onde aparecem as três relações, ou práticas, que são
as seguintes):

Prática produtiva: Pelo trabalho, os homens interferem na natureza com vistas a prover os meios de sua
existência material, garantindo a produção de bens e a reprodução da espécie (a cultura em sua parte técnica,
material).

Prática social: Ao produzir seus meios de subsistência, os homens estabelecem entre si relações que são
funcionais e caracterizadas por um coeficiente de poder (a cultura em suas instituições).

Prática simbolizadora: As relações produtivas e sociais são simbolizadas em nível de representação e de


apreciação valorativa, no plano subjetivo visando a significação e a legitimação da realidade social e econômica
vivida pelos homens (a cultura em sua valoração, simbolização, representação e imaginário). Depois seguem as
explicitações.

Com efeito, vimos que a existência humana, a partir do momento em que vai se
tornando especificamente humana, ela se desenvolve em três dimensões. A dimensão básica é, sem dúvida, aquela
da prática produtiva. É a esfera das relações de troca que o homem estabelece com a natureza, sem o que,
obviamente, não poderia nem mesmo existir. O homem é uma parte da natureza, uma organização de elementos
dessa natureza, e para sobreviver, física e biologicamente, precisa manter com ela um fluxo contínuo de trocas de
elementos, sobretudo sob a forma de alimentação e de respiração. Para retirar da natureza esses elementos, o
homem intervém sobre ela, agindo sobre seus processos, modificando-a, adaptando-a às suas necessidades. Essa
atividade fundamental é o trabalho, prática produtiva através da qual provê os meios de sua subsistência.

Mas o desenvolvimento dessa atividade produtiva repercute sobre as relações dos homens entre si. A atividade
produtiva representada pelo trabalho não pode se reduzir a uma prática puramente individual. É como se o
homem/indivíduo isolado não conseguisse prover sua subsistência sozinho, ao contrário do que ocorre com os
animais, que podem cuidar de sua sobrevivência mesmo individualmente isolados, contando com a habilidade
instintiva para retirar da natureza os elementos para sua sobrevivência sem interferir no seu processo. Assim sendo,
ao mesmo tempo que produzem seus bens naturais, os homens passam a se organizar de maneira sistemática,
estruturada: eles instalam o modo social de viver, superando o modo puramente gregário de ajuntamento dos
animais. A nova forma de agrupamento vai distribuir os indivíduos em grupos e subgrupos, dividindo e atribuindo
as funções que cada um deve exercer em benefício do conjunto formado pelo grupo abrangente que é
a sociedade como um todo. Os indivíduos e grupos não apenas são estruturados mas também hierarquizados, de tal
forma que haverá tento uma divisão técnica das funções como uma divisão política do poder, no sentido de que
alguns podem mais que outros.

Mas ocorre ainda a instauração de uma terceira dimensão, intrinsecamente vinculada às duas primeiras: acontece
que ao mesmo tempo que produzem e se organizam socialmente, os homens desenvolvem, no plano de sua
subjetividade, uma representação simbólica das condições de uma existência. Pela prática simbolizadora da
consciência, eles criam conceitos e valores mediante os quais representam e avaliam essa realidade social e
econômica.

Essas três dimensões se articulam entre si, de tal modo que o desenvolvimento de cada uma repercute sobre as
outras duas, num fluxo e num contrafluxo permanentes. Assim, se o modo de produção, de um lado, repercute no
mundo da formação social e se ambos repercutem sobre o modo da representação subjetiva dos homens, de outro,
as suas representações mentais interferem na sua organização social e na sua atividade produtiva, como ainda
teremos oportunidade de ver mais aprofundadamente no capítulo 12. Páginas 26-28.

Em 2017, um encontro com Antônio Joaquim Severino, na UFPR.

(O capítulo 12 tem o seguinte título: A atividade simbolizadora do homem: produção e organização da cultura.
Também recomendaria, dentro da especificidade do tema, o capítulo 10. O homem, a natureza e o trabalho: a
ordem econômica da sociedade e o 11. O homem na ordem política da sociedade: poder e dominação. Aliás, o livro
de Severino é um dos melhores livros didáticos de filosofia de que dispomos. Deixo a referência: SEVERINO,
Antônio Joaquim. Filosofia. São Paulo: Cortez Editora, 1997). Com certeza, existem edições mais novas.

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